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Silvia Ancona-Lopez A PORTA DE ENTRADA Da entrevista de triagem a consulta psicolégica Doutorado - Psicologia Clinica PONTIFICIA UNIVERSIDADE CATOLICA DE SAO PAULO 1996 T Tiagem, do francés triage, significa “selegio, escola; separacao” e tradicionalmente esta tem sido a finalidade destas entrevista. Seus ~ verificar se 0 cliente se adequa aos tipos de atendimento que a instituicao oferece; ~ inscreve-lo no setor apropriado; * ~ encaminh4-lo para outra agéncia de atendimento, se for 0 caso, Em instituigdes de atendimento ratuito, normalmente a populacdo que as procura nao tem condigdes de arcar com os gastos de um acompanhamento Psicolégico particular. O encaminhamento, portanto, torna-se extremamente dificil pois o problema da demanda excessiva é antigo e geral Nestas instituigdes, as entrevistas de triagem costumam ser a porta de entrada do cliente, Eo momento em que eles vem necessitados de ajuda, feito rapidamente. Paralelamente, porém, hd um certo desanimo ¢ desesperanca porque, com frequéncia, estas pessoas viveram atendimentos ineficientes, encaminhamentos intiteis e esperas intermindveis. For sua vez os psicdlogos os atendem freqiientemete carregados de ansiedade Por saberem de antemao que terao dificuldade em dar-lhes o encaminhamento adequado, Porque a procura é muito maior do que as vagas disponiveis. Esta realidade, que no Brasil atinge niveis dramaticos (seis meses a dois anos de espera), também ndo deixa de existir em paises do Primeiro mundo, como atestam trabalhos de Freund, Russel e Schweitzer, (1991), Folkins (1980), e Shueman (1960) Nestes casos, porém, fala-se em diag de esperal : Em levantamento feito em clinicas-escola de Sao Paulo que, acredito, refletem a situacdo geral das instituigdes de satide, Ancona-Lopez, M. (1986) coloca: “¢ ttto ¢ que os clientes sto encaminhados para outras instituipces Rare mee gro, nous ‘nema eds ceed vente norma ga ss toe prop dee. porque néo podem ser atendidos naquela que procuraram, mas sem nenhuma garantia de que a situacko que encontrario no novo local serd diferente. O sucesso das indicagées néo é verificado por quem as faz. Serd o encaminhamento realizado na crenga de que poderd ser efetivo?” (p58). Prossegue a autora: “parece-nos que o encaminhamento é a saida que o profissional encontra diante da impossibilidade de responder ‘satisfatoriamente ao pedido de atendimento: indicar outro local funcionaria como forma de apaziguamento deixando o protissional com a sensacao de ter feito algo pelo cliente.” (idem p 56) Uma mudanga de atitude dos psicdlogos que atuam em instituigdes que enfrentam o problema da demanda pode levé-los a ver nas entrevistas de triagem uma oportunidade de engajarém os clientes no seu proprio atendimento, tornando-os responsaveis pelo seu problema e -ndo iludi-los com a possibilidade, que vai sc mostrar irreal para a maioria, de encaminhamento para um atendimento de longa duracao. Além disso, facilitar, propiciar ou estar disponivel para que o algo aconteca durante estas entrevistas podera tornd-las um momento importante na vida do cliente influenciando inclusive seu percurso e stu destino dentro e fora daquela instituigao. A atitude usual* nas entrevistas de triagem é considerar esta atividade pouco mais que uma coleta de dados sobre os quais se organiza um sumario taciocinio clinico que vai orientar 0 encaminhamento. Nas palavras de Vilarinho: “os pedidos de atendimento distribuem-se em duas categorias distintas: os pedidos elegiveis que atendem aos critérios institucionais - as pessoas serao inscritas como clientes, como num ritual de passagem - e aguardarao a chamada para inicio do atendimento e, os néo-elegiveis, que nao atenderam aos critérios estabelecidos ¢, portanto, seréo encaminhados ou reencaminhados para outras instituigoes” (Vilarinho, 1992). A escuta e o olhar do psicdlogo triador tomiam-se selecionadores e ele ficara ocupado, fazendo um levantamento das praticas psicolégicas oferecidas pelas instituigdes que conhece (a sua e as outras), para poder decidir em que fila de espera colocaré a pessoa que esta a sua frente. Ele nao consegue ver o novo que Ihe € trazido pois habituou-se a pensar de forma fragmentada, privilegiando mais as especialidades que tem a oferecer do que as necessidades do cliente. Pode-se, aqui, fazer um paralelo com o que Jurandir Freire Costa relata em seu livro Historia da Psiquiatria no Brasil (1989): “ O psiquiatra nao mais se dispée a ouvir. Ele passa a falar antes de escutar, a buscar, antes de scr procurado, Nao mais acompanha a loucurs, de oy 998 ps rf mise met icoiie Ye ends pnt cs pronto genset trea pl Dr haar Beer Sas Sapte comes ‘Meio inn nan ete Qu Cae a ea «ges ase cat cnc mn antecipa-a. Corre em frente, monta o hipogrif’ e promete reconduzir, a todos quantos 0 seguirem, ao lugar onde se encontra a razio perdida.” (p64) Evidentemente que, dedicando-se a esta contabilidade mental, o pobre psicdlogo nao tera oportunidade de acolher o pedido do cliente e a entrevista tera pouco sentido ou interesse para este ultimo. Assim, a situagao de triagem é um momento de transicao, Passaporte para o atendimento posterior, este sim tido como significativo, no qual o cliente encontraré acolhida para suas duvidas ou sofrimento. Deste modo, a relacdo que se estabelece nestas entrevistas estara mediada pelo profissional ausente, (aquele a quem o cliente sera encaminhado) 0 que prejudicard a aproximacao entre “psicdlogo e cliente durante o atendimento. Na medida em que o psicdlogo entender que o papel de entrevistador é diferente do de terapeuta, tenderd a se distanciar durante a entrevista de triagem, evitando uma intervengéo mais eficaz, mantendo uma atitude investigativa e resguardando suas impresses sobre o cliente. Neste caso, acredito que o processo perderd muito de seu sentido e mesmo de interesse ou utilidade para o cliente. - Como tive a oportunidade de desenvolver em trabalho anterior (Ancona- Lopez, S., 1995), a meu ver, toda atuacdo psicolégica é uma acho de intervencdo cujo significado sera dado pelo campo relacional que se estabelece entre as partes e que ¢ exclusivo ¢ peculiar Aquele momento e aquela relacao. No entanto, de acordo com o pensamento psicolégico tradicional, para que a relacdo psicolégica - Se assim a podemos chamar - se transforme em uma relacdo significativa pressupde-se que deva ser longa e duradoura. Paralelamente, hd também nesta tradigdo a idéia de que um caso 86 € rico ¢ interessante para 0 psicélogo se for dificil ¢ necessitar de muitas horas de acompanhamento. Esta postura, que comeca a ser repensada, tem a influéncia da psicandlise, embora 0 prdprio Freud (em Andlise Terminavel e Interminavel, 1937) , se tenha questionado sobre o tema da duracao da psicandlise. Escreveu ele: “A experiencia nos ensinou que a terapia psicanalitica - a libertacao de alguém de seus sintomas, inibigdes ¢ anormalidades de cardter neuroticos - é um assunto que consome tempo. Dat, desde o comego, tentativas terem sido feitas para encurtar a duragao das andlises.”(p247). “Eu mesmo adotei outro modo de acelerar um tratamento analitico, inclusive antes da guerra. (..) Nesse dilems, recorni 4 medida hersica de fixar um limite de tempo para a andlise.” (248) Someeraia nlm! rbakeso, monsto iad metade eval, metade grid, BUABQUE DE HOLANDA (1887 732). Gri =“ animal fable de cxbepa cde agri eparras dela (ihe, p703) Neste trabalho as reflexdes do autor se estendem pelos temas complexos do é ino da andlise” ¢ das possibilidades profilticas da psicandlise. Todo o texto é permeado Por um certo ceticismo quanto a eficdcia da psicandlise no sentido de provocar mi Permanentes, alertando para a ingenuidade dos que esperam que seus clientes atinjam “am nivel de normalidade Psiquica absoluta” (o251) mesmo apés muitos anos de terapia. AS citagdes acima, no entanto, no negam que com relacdo A psicanilise,: we, flitsermos stender is exigéncias mais rigoroeas feitas 4 lerapia anulitica, nossa estrada nio nos conduzird a um abreviamento de tua durapio, nem passard por ele.” como lembra Freud no mesmo texto(p23s) te, no entanto, o autor demonstra claramente seu desconforic. “ \ abreviar a duragdo inconvenientemente longa do tratamento analitico...” (267). Assim como no caso da psicandlise, fa literatura que trata das Psicoterapias, de modo geral as quesiées sobre alta, duragao © mudances ccorridas no decorrer de um atendimento psicolégico referem-se sempre aos Processos psicoterapéuticos, rgramente mencionando as entrevistas ou consultas. Portanto, nao € facil relacionar mudanca psicologica com entrevistas de triagem. Como lembra Mahfoud (1887), no momento de uma primeira entrevista, confrontado com as dificuldades do cliente “. @ tresposta padrao’ do sicdlogo é (encaminhar para) psicoterapia .-” (p76) pois no Ihe ocorre Posicionar-se de outra forma frente ao cliente, percebendo que alguma coisa bsicoterdpicos de seguimento continuo ¢/ou ‘prolongado” (ps1) Mas mudancas esto ocotrendo. As psicoterapias breves (PB)__<¢ Fompen comesolver © dilema da duracdo apontado por Freud __ fenitam Gilliéron diz, ainda, que o momento em que o cliente procura atendimento Soettima refetir uma crise na sua situacdo existencial, crise, que o terapeuta deve reconhecer. FE, portanto, um momento que favorece rearranjos no equilibrio intrapsiquico e interpessoal, pois o cliente, impulsionado pelas suas dificuldades, vern em busca de transformagdes. Do mesmo modo Spoer| (apud Peter, 1992) propde que se aproveite a carga emocional particularmente forte da primeira consulta, por considerd-la como uma psicoterapia de intervencao inca, focalizando a sessio sobre o problema principal, segundo 0 conceito do enriquecimento da personalidade gracas a crise. Peter (1992) diz que na sua abordagem (PB de inspiracdo psicanalitica), se a primeira entrevista levar o cliente a ressignificar algum(uns) momento(s) de sua vida e a apropriar-se de seu sintoma, serao eliminadas as fronteiras entre 0 diagnéstico e a psicoterapia e estard criado o enquadre necessério para que uma psicoterapia possa se instalar-se. O mesmo autor conclui que “se a primeira sessao e as intervengdes psicoterapéuticas breves permitirem criar as condigdes preliminares para a mudanga (..) clas terao preenchido seus objetivos”. (p263)s Nao pretendo falar em cura numa entrevista de triagem, mas refletir sobre © fato de que, se acontecimentos significativos podem ocorrer no decorrer de uma sess4o, porque nao buscar as condigde¥ que possam facilitar seu aparecimento para transformar estas entrevistas em uma referéncia- existencial? Além disso, se o cliente ndo se sentir mobilizado pelo primeiro atendimento, ao ser encaminhado, provavelmente nao conseguira dar Prosseguimento ao seu pedido de ajuda. Como as entrevistas de triagem se dao no ambito das instituigdes isto Thes imprime um caréter particular e as diferencia, dificultando a comparacdo com qualquer outra primeira entrevista que se dé nos atendimentos Particulares, embora nestas iltimas também ocorra uma avaliacao informal, uma acdo interventiva ou um ericaminhamento. Segundo Maida (1991) “para que o atendimento nas instituigdo se torne realmente efetivo, é necessdrio promover uma espécie de desaprendizagem voltada para o exercicio da pritica em cada situacao especifica” e “para que o profissional esteja preparado para o trabalho nas instituigdes (6 necessdrio) evitar a repeti¢ao mecanica do conhecimento tedrico estabelecido” (pa). Na verdade, estamos tratando aqui de uma visdo ampla da psicologia, visio que nao limita a intervencio psicolégica a situagées determinadas, nem ™esmo apenas a pritica clinica. E uma maneira de pensar a psicologia como uma atuacao que exige uma _atitude flexivel, inventiva e responsavel por Parte do psicélogo que devera transitar entre a teoria e a pratica com certa desenvoltura. A medida que o profissional acreditar que todo contato seu com um cliente pode ( a meu ver deve) ser urn momento significativo, sem Tadao lve. as duvida ele se vera obrigado a rever muitos dos conceitos que norteiam sua © relacionamento psicolégico serd significativo quando criar um campo favoravel para o deflagrar de impulsos mobilizadores que podem resultar em questionamentos, elaboragdes ou mesmo mudangas de atitude ou de perspectivas vivenciais. Como aponta Bleger (1979) “na entrevista se um campo, € com isto queremos significar que entre os participantes se estrutura uma relacdo da qual depende tudo o que nela acontece” (p14)’. Este campo favordvel surge na e da experiéncia vivida na relacdo psicslogo/cliente, qualquer que seja a denominacao dada a este atendimento (triagem, Psicodiagnéstico, psicoterapia). Quando 0 cliente vem 4 procura de um psicdlogo, ele quer ser’ atendido em suas necessidades, pouco importando sob que nome este atendimento se efetue * Na pratica, no entanto, © que acontece com freqtiéncia é que, por nomear sua pratica, o psicdlogo deixa de fazer a sua parte, postergando sua intervengdo ¢ empobrecendo um encontro rico de possibilidades. Dentre todas as modalidades de atendimento em instituigdes de atendimento psicolégico gratuito, as entrevistas de triagem como as proponho, parecem~me ser as que exigem maior flexibilidade e inventividade por parte do psicdlogo. A variedade dos casos a serem atendidos, as situages inesperadas que ocorrem e o fato de que, muito provavelmente, aquela sessio sera tnica, levam o Psicdlogo a um constante questionamento tedrico, obrigando-o a buscar os mais variados recursos técnicos ¢ principalmente pessoais. No entanto, como lembra Figueiredo ( 1993a), no é possivel confiar ape: no conhecimento pessoal jé que este, “pela sua natureza pré-reflexiva é muito vulnerdvel 4 rotinizagao e A repetitividade” (p93). Por outro lado, ater- sea uma teoria como esteio dentro de um campo movedico pode afastar o Psicdlogo de suas experiéncias e vivéncias, bloqueando’ sta sensibilidade. A tarefa do psicélogo consiste nao em permitir que a teoria atue como camisa de forca limitante, o que desumanizaria 0 contato, mas encontrar seu estilo pessoal, como propde mais uma vez Figueiredo (19932), usando a teoria como fonte de questionamentos, incorporando-a como instrumento e nao como condigao para compreender ¢ determinar uma agao no mundo. J Testugto fre a i ss ra nae an cm tit cidade po Tereza Mit nF Encontro Ea Ste Picnic promvide pelo Nico de ‘Estado ¢ Peasusas das Priticas Clinicas da PUCSPc UNIP/ Objtivo,cmn Mage de 19s" Uma descrigéo pottica deste tipo de situaco pode ser encontrada em Fernando Pessoa: £u cumpro informes instrugoes de além, £ as bruscas frases que aos meus lébios véem Soam-me a um outro e anémalo sentido... Inconscientemente me divido Entre mim e a missao quie o meu ser tem, Ea giéria do meu rei dé-me o desdém Por este humano povo entre quem lido. © uma pista de como enfrentd-la em Alberto Caeiro, seu heterénimo: Procure despir-me do que aprendi, Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram, Eraspar a tinta com que me pintaram o sentidos, te Desencaixotar as minhas emogées verdadeiras, Desembrulhar-me e ser eu, (...)° Como lembra Schmidt (1991) “as relagées oriundas de um campo clinico praticado com liberdade” (p22) oem uma atitude de cepa interna maior do que aquela exigida pelas praticas i Jo BEEXANDO FISSOA.- Fle-Mesme. XII (cs) 1969 (622) Pecos de AUREETO CAIEIRD Caitiro XIVI leche) 1965 (p62) entrevistas costumam ser, portanto, situagdes tensas, de forte colorido emocional e com caracteristicas muito especiais. A partir da minha primeira experiéncia ¢ das posteriores, em conjunto com meus alunos-estagidrios, passei a sentir claramente que, mais do que qualquer outra atividade, a entrevista de triagem, nos moldes como a entendo, é uma oportunidade especial de crescimento pessoal e desenvolvimento profissional. estas entrevistas, é freqiiente nos intarmos: como adequar os conceitos tedricos as exigéncias do momento e a0 inusitado da situag&o que escapa ao enquadre tradicional? Este é um nivel da pratica psicolégica que leva 2 “teorizar com liberdade” e a “desorganizar 0 campo instifuido” (Schmidt, idem p1) criando e inovando de acordo com 0 campo inédito de cada relacao. _, © processo parece-me tao intenso e rico que o considero um campo privilegiado para perceber o acontecimento transformador, o algo que torna aquele encontro diferente dos outros. QDescrigito- do atendimento- Conforme ja mencionei, a atividade de triagem é caracteristica das instituigdes de atendimento gratuito como conseqiéncia dos vicios estruturais da organizacio dos servicos de satide, da_pouca flexibilidade da maioria dos profissionais que-neles atuam, da pressio da demanda ¢ a impossibilidade de absorvé-la. . Como meu campo de pesquisa e reflexdo se dard no ambito destas entrevistas, cabe-me aqui descrever como elas ocorrem na instituigéo onde atuo.! Esta instituigéo ¢ uma clinica-escola. Como tal, tem a dupla finalidade de dar atendimento gratuito a populagéo que a procura propiciando, paralelamente, est4gio supervisionado aos alunos do ultimo ano de Psicologia da Universidade a qual esta ligada. Oferece atendimento a adultos e criancas, sendo que, em todos ‘08 casos 0 primeiro passo é uma entrevista de triagem. Tais entrevistas ocorrem no momento em que o cliente procura a instituigao ou, apés algum tempo, a partir do contato pessoal ou telefonico quando é 7 Clinica Paicokigica Ske Marcas da Universidade Sto Marcos/UNTMAROO em Sto Pano - 82. informado sobre a data e o horario em que deve comparecer. Por atuar na 4rea infantil, minha clientela é composta pelos responsdveis (na grande maioria maes) que buscam atendimento para as criangas, No dia da entrevista, o procedimento é o que se segue: O cliente preenche uma ficha na recepgao com seus dados pessoais ¢ os da crianca que quer inscrever para atendimento. Em seguida, por ordem de chegada, é chamado por um dos estagidrios de psicologia para a entrevista. A sesso nfio tem duracao determinada, podendo variar de 30 a 60 minutos de acordo com seu desenrolar. © meu papel é 0 de acompanhar os atendimentos supervisionando os alunos-estagidrios; no entanto, a fim de obter as entrevisias para esta pesquisa, passei a atender alguns clientes. © que ocorre com freqiiéncia nestes encontros é que o cliente inicia relatando o motivo que o levou,a procurar a clinica - o que se convencionou chamar de queixa manifesta (em contraposigao a queixa latente).7 Como a procura é para o atendimento das criangas, com freqiiéncia estas queixas estao relacionadas a problemas escolares ou a distiirbios de comportamento. E comum os clientes virem encaminhados pela escola, médico ou outra instituicao “ sem estarem realmente motivados para o atendimento visto nao compreenderem sua necessidade e desconhecerem o que é um servico Psicolégico, uma vez que este tipo de trabalho nao tem repercussio em seu universo cultural e educacional”. (Larrabure, 1986 p 63). Nesse primeiro relato centralizado na crianga, freqiientemente 0 adultos e exime da responsabilidade de assumir a decisio de um atendimento psicolégico para sea filho, deixando esta tarefa para o psicdlogo que o atende. : ’ No decorrer da sesso, outras queixas vo surgindo e, normalmente, ligam-se mais diretamente aquele que fala. Ou seja, mesmo que o problema se refira a crianga, o significado que o adulto - que o esta expressando - The dé, passa a ter mais importancia. Assim € que, do ponto de. vista do psicdlogo, o trabalho se desenvolve, novamente, sobre duas vertentes: ~ A crianga que - motivo primeiro (ou pretexto) da procura ~ evidentemente nao pode ser esquecida: 6 preciso pensar que tipo de ajuda ela necesita e como se pode consegui-la. Uy Temes que a traccin prcoligica empresa de prcanilve¢ que comumass ix capregadsindependentemente da eriatac so - © cliente adulto que esta presente a sesso, ¢ que tem um problema, podendo ser o seu filho on algo mais. Na verdade, o que deve ser captado ¢ como seu filho ou o problema de seu filho aparece esta pessoa e como isto se insere em sua vida. Ou ainda, qual é a real demanda da pessoa naquele momento; que tipo de ajuda ela veio buscar, que muitas vezes encontra mascarada no pedido de atendimento 4 crianca. Eeste segundo ponto que enfatizo, seja na minha atuacdo seja ao falar com meus alunos-estagidrios,'* Se a atuacdo se ativer apenas 4 primeira vertente, as opgdes sero poucas € ocaminho seri mais fécil de vislumbrar, ou seja: encaminhar a crianca para psicodiagnéstico, terapia ou qualquer outro tipo de atendimento, seja na propria instituicdo, seja em outro local. A atuacao psicolégica sera, portanto, postergada ¢ delegada ao profissional que atuara no futuro. Repete-se aqui a situacao - ocorrida inicialmente no meu atendimento - em que a relacéo com o cliente fica mediada por um profissional ausente, criando-se assim a Evidentemente, mesmo quando a énfase é colocada sobre a crianga ¢ 0 seu problema, o adulto estard de algum modo envolvido no atendimento. O simples fato de ter ido em busca da ajuda mostra o quanto a sua vida e a da crianca estéo interligadas. Contudo, tanto este adulto quanto o psicélogo podem atuar nesta situacdo buscando atender apenas a primeira solicitacdo (queixa manifesta), diminuindo a ansiedade de ambos e aparentemente solucionando a dificuldade. Neste caso, coloca-se a questéo da responsabilidade do psiclogo em Telagdo a quem veio pedir ajuda, confiando em seus conhecimentos. Quando apenas encaminha o cliente, o profissional estard kafkianamente™ eliminando o seu problema, podendo até mesmo sentir-se feliz com a sensacdo de dever cumprido. Esta postura tarefeira traz ainda as implicacdes ja mencionadas € sobre as quais nao me estenderei, mas que se referem a demanda excessiva de clientes, a cadeia de encaminhamentos ineficientes, a Superlotacdo das agéncias que oferecem atendimento gratuito e A estrutura Viciada da organizacio dos sérvigos de saiide em geral. Por si s6 estes pontos (@ meu ver) devem levar 0 psicdlogo a refletir e buscar uma nova atitude frente a entrevista de triagem. °° inmereao doe icin na avd de riggem ¢ men tas mit ice com niameossppectne a sere cue ma. emcee ing econ ae fn ‘de EATKA (1996) o bomem-arsia¢ciminad porque ov outeat memente ma fami, no saber com Bae A outra maneira de atuar, que niio exclui necessariamente o enoaminhamento da crianga, é a que pretendo compresses explicitar através da minha propria vivéncia ea de meus clientes. Como ja mencionei poupando—o- da eaperiéneia pessodl, seret o-pior dos mesttes... imeira questo a que me propus responder no presente trabalho é: “Como dar novo sentido as entrevistas de triagem tornando o primeiro contato com o psicdlogo significativo para o cliente?” A resposta que agora posso dar é da mais extrema simplicidade: “Atendendo seu cliente”. Por mais primaria que esta frase possa parecer ela faz sentido (como ja vim discorrendo no desenrolar desta tese) no universo das instituigdes de)! wl) atendimento psicolégico, no que se refere a0 procedimento de entrada dos clientes, ou seja, nas chamadas entrevistas de triagem. Embora seja ébvio que o psicdlogo considere como cliente a pessoa que esta & sua frente, é comum (como j4_ comentei anteriormente) que no momento da primeira entrevista, o interesse da instituigdo pese mais do que o do cliente, Além disso, quando uma pessoa vem em busca de atendimento psicolégico para um terveiro (seja filho, amigo ou parente), a preocupacao de quem o atende costuma centrar-se na pessoa ausente, preocupado que esta o profissional em fazer um encaminhamento adequado para as necessidades de quem “motivou” a procura pelo servico. © que proponho é que os psicdlogos _procurem voltar-se primeiramente a0 cliente e em segundo lugar 4s injungdes institucionais rompendo os esquemas rigidos de procedimento que levam o profissional a falas racionais € obturantes conforme se pergunta Vilarinho (1992): “ A que, serve 4 triagem? Indubitavelmente, serve aos clientes, a wma fatia da populagio, e também serve 4 consecugdo dos objetivos da instituicho e dos seus protissionais especializados. Instituctonaliza formas de atendimento, ‘reproduz os modelos j# institucionalizados, privilegiando as especialidades que, por sua vez, revelum a fragmeniagao @ que estd submetido o ser Aumano. A triagem, calcada num modelo médico de autoridade torna-se, porlanto, um processo passive para o cliente ¢ ativo para # Instituigdo € 0 Funciona mais como uma pega para a engrenagem da instituigao poder se amovimentar”. (ps) Partindo deste raciocinio, sugeri a extingio das entrevistas de triagem, passando a compreendé-las como consultas psicolégicas com um fim em si aay mesmas independentemente do fato de que, a partir delas, pudessem ocorrer outras entrevistas ou se iniciarem outros procedimentos. A proposta € transformar 0 processo de_ selecionar ou “(es)colher” os clientes no momento da entrada na instituigio em momento de acolhimento em que todos os pedidos de ajuda interessem para a instituigao (Vilarinho, idem). Sem diivida, neste caso, havera a necessidade de rever varias praticas € procedimentos que interferirao nos modelos mais tradicionais de prestacao de_servigos psicoldgicos. Nao apenas do ponto de vista institucional modificagSes podem ser propostas. Manonni, psicanalista emérita, propde uma visio abrangente da primeira entrevista embora pressuponha ( é bem verdade que nos idos de 1965), que a esta entrevista devera seguir-se uma psicoterapia: “A primeira entrevista quase sempre néo passa de uina preparacéo, de uma ordenagéo de pegas de um jogo de xadrez. Tudo fica para se fazer mais tarde, mas as Personagens puderam ser postas em campo”! (103). Plenamente de acordo com a frase acima sugiro, apenas, transformar o tiltimo Periodo por: “As personagens puderam ser postas em campo e algo ja pode ser feito,” Na presente pesquisa, procurei exemplificar através de dois atendimentos de que maneira, na minha atividade Profissional, _ procuro romper as condutas mais usuais, principalmente nas isfttituigdes e como busco tornar 0 atendimento significativo para os clientes. Em contrapartida, foi também meu objetivo responder a outras duas questdes: E possivel identificar 0 acontecimento transformado? E possivel facilitar a eventualidade de encontros significativos? Estas duas perguntas imbricam-se a primeira sendo praticamente impossivel _respondé-las separadamente; no’ entanto, neste capitulo procurarei detalhar minha forma de atuagao refletindo sobre a influéncia deste modo de agir na nova maneira de _conceber as entrevistas de_triagem €, concomitantemente, _levantar questées acerca do acontecimento. Vou procurar relatar minha experiéncia na perspectiva de que podemos “compreender determinados momentos do tazer psicoldgico como aqueles nos quais dizer ¢ recothermos o que ‘Saltou em cima’, estendendo-o diartte do outro, E fazer este transite, propiciando que o outro passe pela mesma experiéncia pela qual estou passando, quina apresentacdo que garante o efémero, que abre um clanio como um relampago, sobre 0 qual ndo hd que argumentar”, (Cupertino, 1995 p 205) _ ‘Crile mes, Que a minha experiéncia sirva, portanto, apenas como disparador para reflexdes sobre a pritica clinica, pois a experiéncia do fazer psicoldgico ¢ o resultado de um améalgama pessoal ¢ singular que se da no entrelagamento dos saberes fedricos, tacitos e subsididrios (Figueiredo, 1995b). Dizendo de outro modo: “uur saber que se circunscreve no campo do representavel”, “uma disposigio para o uso e/ou incorporagao de determinadas habilidades, Parte do que sabemos sem saber que sabemos” (Cupertino, 1995p 219) ¢ “win outro conhecimento o subsididrie. Pano de fundo para a apreensio focal ¢ temitica de aspectos particulares do mundo, os quais organiza e retine, dando-lhes configurabilidade” (idem, 9214), Convern lembrar, outrossim, que a elaboracéo destes conhecimentos, engendra como lembra Figueiredo: “iferencas entre psicdlogos, mas, principalmente, diferengas de cada um para consigo mesmo ao longo do tempo.” (19936 p31).2 No préximo capitulo pretendo deter-me sobre as relagdes da pnitica clinica com 0 acontecimento transformador. Sinto-me sempre um pouco tensa ¢ ansiosa ao receber um cliente. A sala de atendimento’ me parece fria, um tanto inéspita, apesar de limpa e organizada de forma até mesmo incomum para uma instituigao de atendimento gratuito. Na maior parte das vezes, ponho duas cadeiras', face a face, préximas a uma mesa (sobre a qual coloquei o gravador nas sessbes que utilizei para esta pesquisa). Quando ha espelho de visao unilateral explico o que é, se havera alguém observando € por qué.' Este é 0 cendrio onde o acontecimento deve ocorrer, E possivel? Os clientes, mais freqientemente mulheres, também Parecem um pouco constrangidos na expectativa do que se vai passar. Sei que sAo pessoas em um momento de crise que vieram buscar ajuda. Ao olhd-los recebo o impacto de um corpo que vejo pela primeira vez, de determinada Postura ¢ expressio, que de modo sutil me afeta e me coloca em certa disposigao afetiva. Na * iors 2 Keto me sti om ven demehenie ct ie de tentane nt ‘has sri paral pve ean a aon esi, ea thes rai. "Rata arexnke sts pepe ts howe oes “ verdade somos duas pessoas expectantes: cu diante de uma pessoa que nao sei para que veio, aguardando a revelac&o do desconhecido e o cliente esperando algum tipo de ajuda. Estamos ambos suspensos, além de nds. Estaremos cumprindo nosso destino de ek-sistentes? Geralmente meu primeiro movimento em diregdo ao cliente se assemelha muito a ternura. Uma ternura peculiar e generalizada pelo meu cliente ja que, na verdade, ainda nem o conhego. Sinto-me responsavel por ele o que me leva a querer que se sinta bem atendido, que se sinta ajudado, que se abram novas possibilidades ¢ caminhos que possam conduzi-lo a alguma < mudanga. Quero que ele possa dizer que algo aconteceu, Nos momentos iniciais da sessiio, poderia descrever a sensagio que sinto como a imersao em um mundo onirico. Os sons de fora da sala_ parecem ficar abafados, os objetos em torno envollos em névoa ¢ minha cabeca um pouco pesada pelo esforgo de focar-me no cliente. Embora pareca concentrar-me totalmente no que vou ouvir e ver, costumo estar preocupada com meu desempenho ¢ meus conhecimentos dos quais, inevitavelmente, comeco a duvidar. A medida que vou escutando passo para uma fase em que fico profundamente interessada na narrativa, na histéria que o cliente esta me contando. Sinto-me curiosa, quero saber mais, preciso controlar meu impulso para perguntar coisas que satisfariam minha cumosidade mas nao scriam relevantes para ajudar o cliente. No meu encontro com Vanessa, por exemplo, passou-me pela cabeca perguntar: “A amante do seu pai é jovern? E bonita?”, “Quantos alunos tem sua escola?”. “As vezes fago algumas * perguntas deste jaéx que, geralmente, desviam o cliente_.do caminho que trilhava e raramente trazem um enriquecimento para a sessao. Minha curiosidade percorre uma gama variada de nuangas: desde a mais simples e «ha até a mais complexa, dificil de defimir, mas que sinto como sendo 0 motor que me move em diregao ao cliente. Euma curiosidade . insaciavel que nao se esgota, que esta sempre em falta. Ou seja: quero c= compreender, quero caplar o outro na sua totalidade, o que, apesar de ser | impossivel (Lévinas, 1992), me leva a querer saber mais, ir mais fundoe, ~~’ quem sabe, deparar-me com algo inesperado. £ 0 que Stern (1990) chama de “cortejar a surpresa”C...) “A curiosidade é a) imaginacao ¢ a disciplina que levam a ver aquilo que é questiondvel. Ser curios ¢ estar sensivel 4 possibilidade da pergunta. E a diivida constante de ‘ que a propria capacidade de pensar é aflitivamente inadequada, que se nostra de varias manciras, e que eventualmente se torna dolorosamente clara.” (p 12) Como atendo na iirea infantil retomo com freqiténcia, durante a sessio, a crianga que foi trazida como motivo para o pedido de atendimento. Fago isto visando captar: * de que maneira a queixa com relacdo a crianga esta vinculada iquilo que O cliente presente esta trazendo. Quais so as significagdes que as situacdes que relata tem para ele e de que maneira as colocagées sobre a crianca esclarecem a maneira de o cliente estar no mundo ¢ de estar com as outros. Além disto,as expectativas, as frustragdes ¢ os planos em relagdo a crianca com freqiiéncia apontam para o campo de possibilidades em que o cliente se situa e 0 quanto ele esta preso ou restrito a um determinado campo. As discrepancias entre 0 que é esperado ¢ planejado para um filho ¢ as atitudes, e desejos dos pais, costumam apontar para as possiveis aberturas ou para quais possibilidades se poderia abrir uma porta; * © quanto a crianga esta comprometida: dificuldades emocionais, intelectuais, motoras, etc...Se a crianga esti realmente necessitada de ajuda € © que se poderia fazer por cla. Nestes momentos, torno-me conselheira, orientadora de pais e psicéloga infantil que procura fazer um psicodiagnéstico rapido e eficaz. Atuando nestas duas vertentes (adulto: cliente-presente/crianca: cliente- ausente), 0 enfoque durante a sessio varia. Embora considere, prioritariamente, que o meu cliente é quem estd presente e é sobre cle ¢ 0 campo relacional que se estabelece entre nés que devo focalizar minha atengdo, quando volto a crianga, freqiientemente a tomo como cliente ou Procuro ser sua representante naquela sessio. Algumas vezes, fico especialmente intrigada ou preocupada com a crianga, Nestas ocasides sinto desencadear-se um certo “furor diagnosticante”: costumo crivar o cliente de Perguntas, quero fazer uma anamnese em poucd’minutos € nao raro a pessoa’ ali presente fica em segundo plano. Apenas quando me dou conta disto € que @ recoloco como cliente, chamo-a para compartilhar a compreensio comigo, ¢ © atendimento comega a deslanchar. Creio que a fase “diagnosticante” ‘ocorreu na primeira sesso com Lucilene. Este movimento de vaivém entre a crianca e 0 adulto interrompe de certo modo o fluxo da sesso, fazendo-a parecer truncada. Ao focar a crianca ou a queixa sobre ela, acontece de perder material importante trazido pelo cliente presente. Muitas Vezes isto acontece de forma consciente, Para que eu no me desvie da compreensdo que estou buscando; outras vezes, no entanto, acontece porque nao me dei conta de que o cliente me esta indicando um novo caminho, ou apontando para algo muito significative para ele. Saber a quem ou a que informacao dar prefertncia é uma tarefa dificil que exige atencllo e a tomada de decisées sobre que falas sto mais significativas no ue momento. Esta oscilacdo entre os pais € a crianca causa estranhamento pelas incongruéncias que se entremostram na fala do cliente. A compreensao vai se fazendo, na maioria dos casos, pelo preenchimento das lacunas que se evidenciam ¢ “diante delas temos que aguardar, que os sentidos se direcionem, ja que a verdadeira tarefa da terapia nao é tanto dar sentido aos dados, mas resistir 4 tentagdo de dar sentido a$8 dados”. (Cupertino, 1995 p< 252) Costuma ser a partir do meu inferesse pela histéria (a historia exterior A qual ja me referi) que comego a notar algumas dissonancias. Inicialmente é preciso conhecer 0 corriqueiro, 0 cotidiano, para chegar ao que esti além dele. Empresto as palavras de Stern (opcit pz): “analista ¢ paciente encontram seul caminho para dizer o familiar ¢ depois encontram naquilo que néo foi dito outras lacunas que podem ser colocadas em palavras, de tal maneira que 4 descrigao da expeniéncia se move sempre em direcdo a um grau maior de precisdo e sutileza”. £ a partir dai que, repentinamente, sinto ligar-se um “terceiro olho” ¢ “um terceiro ouvido”. E uma fase dificil pois, ao mesmo tempo em que relaxo ¢ embarco em um “fazer” quase que intuitivo (0 saber do oficio do qual fala Figueiredo, 19930) em que as falas fluem, é, também, a fase em que devo fazer escolhas ¢ decidir que intervencdes ¢ que caminhos seguirei, 0 que inevitavelmente afetard o desenrolar da sessao. Estas escolhas ndo sAo refletidas: vao-se dando, surgem do campo que se instituiu; é o que Amatuzzi (1989) descreve como “algo mais sentido do que sabido ou algo mais operative do que refletide” (p85). No entanto sei que sou responsavel pelas escolhas que faco e sdo elas que mais tarde me incomodarao: ao pensar em um atendimento ou ao discuti-lo com x colegas percebo as iniimeras possibilidades que deixei para tris e que, imimeras vezes, me parecem mais adequadas dos que as escolhidas por mim. Parto do principio de que nao posso pretender saber mais sobre o cliente do que ele mesmo e de que jamais compreenderei o outro na sua totalidade. Acredito que meu papel é 0 de clarear e reordenar o que cle sabe" e que nio estd podendo reconhecer como seu, ou seja, procure traduzir-lhe os significados que da as suas vivencias para, se for 6 caso, ressignifica-las. x Refiro-me ao que Porchat (1982) chama de “Jogo ou dialética do manifesto ¢ do encoberto’ na situagio psicoteripica” (pt18) em que “0 encoberto pode ser retomado por via de uma rearticulagéo dos contetidos present’s no ‘fact soc saat nv orcas trchame para. icoldats decrnace "Cfo de tore campo da consciéncia” ( p121). Espero que “0 encoberio se revele ao paciente através de seu proprio discurso” (dem, p 121) “ buscando o sentide do que foi ifesto” {ibidem 122). Esta nocao de encoberto se aproxima da nogio do Guia-me_o pressuposto de que meu conhecimento sobre o cliente sd podera vir 4 partir_do que ele me diz e do que eu puder perceber no campo relacional que se criar entre nos. As teorias psicolégicas que estudci, minhas vivéncias ¢ minha experiéncia profissional serfio auxiliares na minha tarefa de “tradutor”: “Minha profissto consiste basicamente em conversar com as pessoas e ver se com isso se cria a possibilidade de maior discernimento e mobilizagdo, de descoberta do sentido das vivencias e, ao mesmo tempo, a oportuntdade da criagdo de novos sentides, De crescimento, entim” (Amatuzzi, +989 p 11) Ha_porém uma outra dimensio presente_e, paradoxalmente, ausente durante a sessiio. Se a maior parte do tempo me dirijo aquilo que o cliente sabe mas ndo vé ou nfo sabe nomear: “uit desconhecido que se presume jd ter estado presente ‘no’ paciente”, (Stern, 1990, p5) ha algo que o cliente nao sabe, que nao foi _ “formulado, (e estd) parcialmente indeterminado ¢ realmente ausente”(dem). A expressdo deste ausente sera resultado de uma experiéncia compartilhada entre o cliente e o terapeuta e surgira do campo relacional ¢ das possibilidades da linguagem. Este ausente é 0 acontecimento que pode surgir inesperadamente 20 do campo terapéutico. E algo que me chama ¢ me interpela vindo da fala do cliente, alguma coisa que se diferencia de uma hipétese que eu possa estar construindo, embora algumas vezes possa se confundir com ela, £ mais forte, pois varias hipdteses surgem no decorter da sesso e slo abandonadas porque alguma coisa mais forte me atrai e me conduz, No caso de Lucilene, dentre todas as possibilidades de compreensiio, 0 que me interpelava em sua fala era seu desamparo frente aos outros, (principalmente sua irm ¢ a diretora da escola de sua filha) e, no caso de Vanessa, a estranheza que cla sentia a seu proprio respeito e a distancia que eu percebia entre suas acdes e sua fala. Foi a partir destes lugares que me senti instada a falar. Nao creio que possa induzir qualquer mudanga no cliente, mas que estas viréo dele mesmo se estiver disponivel para tanto. Entendo que o primeiro sinal de que existe alguma disponibilidade para a mudanga é sua vinda_ a consulta, mesmo com todas as resisténcias que possa trazer consigo. Concordo com Corréa (1996) quando diz: “..0s gamhos ao final do proceso jd esttio vinculados com o pedido cu com a demands reterida. Neste posso pensar que cada pessoa jt traz em si, talvez nao de forma clara, as possibilidades que tein naquele momento” (163) e ainda, “..as ganhos podem ser potencializados _quundo a motivacéo para 'a mudanca é identificada pelo terapeuta.”(p14) Costumo apontar tal motivacdo ao cliente ¢, geralmente, é a partir dai que comeca a se delinear algum movimento de abertura pois, como bem lembra C2elho Filho (1995), F uande demarcada @ incentivada pelo terapeuta, [a mtivacdo para a mudanea] propicia uma melhor compreensio do paciente sobre seus padrdes mmal-adaptativos, e, conseqilentemente, maior controle sobre eles."(p32) Posso dizer, com as palavras dt Forchat (1982), que me identifico com as “formas de psicoterapia |que} regataram ou puseram em primeiro plano, por assim dizet, os aspectos aJo transferenciais do comportamento vincular+(126). Isto €, embora ve em conta ¢ me aperceba de certos aspectos da transferéncia, niio costumo trazer para elaboracio, no plano atual, os conflitos infantis. Outra linha mestra que adoto ¢ a de compartilhar com o cliente meus Pensamentos, minhas opiniSes ¢ meu raciocinio sobre o que cstou pervebendo. Procuro nao desviar-me desta norma ¢ ser o mais transparente possivel. Considero que, se espezo que o cliente tenha a menor reserva possivel’e se revele a mim, nosso relacionamento sera mais justo e correto se cu corresponder da mesma maneiza, Nio ¢ uma atitude ética, que me levaria a prender-me a valores morais, mas a crenca de que estarei conservando aberto um canal de comunicagao que facilitar’ ao cliente desvelar-se a mim. Paralelamente, com esta postura mantenho-o informado de como o percebo se apresentando a mim, © que ¢ um corolirio de como ele se apresenta aos cutros_€ se situa no mundo. Busco o que na feliz expressio de Figueitedowpode ser chamado de enunciado apresentativo, que seria apresentar ao cliente o que ele me apresentou de forma que 0 apresentado se ilumine sob novo angulo. Compartilhando minhas percepyées ¢ meus conhecimentas com o cliente, cle poderd contesta-los de modo que poderemos construir juntos uma compreensao sobre ele proprio ¢ a problematica que ele traz. A contrapartida desta postura é que ela me leva a ser diretiva ou incisiva em alguns momentos embora, na maior parte do tempo, me mostre acolhedora ¢ compreensiva. Procuro acolher os sentimentos e dificuldades que os clientes trazem e Pautar-me pela compreensdo deles acerca das vivéncias que estio relatando 1 Memme em pena cos ign. reg Seo da cree pcm ce de ae tn wm cons Par sega “Are tat SEIN a ferguer Rarnn w ia AOPABIC 1 EAD " Comenscacto pened faa we decarrer de prope de ee nase pois estou plenamente convencida de que nao sou detentora do saber e de que niio posso apropriar-me de suas verdades. cliente é a tinica pessoa que conhece seu campo de experiéncias ¢ apenas ele podera relata-las, ¢ retirar seu sentido, a partir da constelagdo de suas vivéncias, percepgves, idéias, sentimentos e ‘memidrias. Seu relato pode manter-se em um patamar objetivo, pratico, exterior a ele ou pode partir de seus sentimentos, valores e do sentido que da as suas vivéncias pautando-se por um referencial interno subjetivo (Stiles, 1973). No primeiro caso, procuro ajuda-lo a caminhar do exterior para o interior na crenga de que confronta- lo com suas ambivaléncias, sentimentos inconsistentes e experiéncias desvalorizadas pode permitir que eles sejam reavaliados, aceitos e ressignificados. No segundo caso, procuro acompanhar seu relato buscando com ele o sentido que da as suas vivéncias. Conforme Gilliéron (1994) “ a idéia fundamental ¢ que win grande nitmero, de pacientes no espera obrigatoriamente uma mudarica profunda quando de sua vinda ao psiquiatra mas, mais freqlientemente, um alivio imedisto. Com efeito na grande maioria dos casos , 0 paciente decide consultar-se quando estd em crise. O modo como esta crise serd tratada é que é a questio. Face a qualquer crise, o paciente encontra-se dividido_entre duas tendéncias: a esperanga de reencontrar o estado anterior, solucdo mais filcil, e a esperanca de, finalmente, encontrar forgas para mudar.”(p193)" Acredito que cabe 40 cliente decidir qual destas duas opedes vai adotar, apés refletir sobre o que cada uma implicaria. Identifico-me com Yehia (1994) quando diz que: “chama a atencdo minha tentativa de salientar os aspectos positives, adaptativos, saudiveis [dos clientes] em detrimento dos patolégices’ (p142). Procuro o seu desenvolvimento ou, pelo menos, mostrar-lhes alguns dos potenciais que tém para que deles se apropriem e, quem sabe, possam cultiva-los e vé-los * desabrochar. Considero importante ajuda-los a acreditar nas suas percepgdes, ¢ sentimentos ¢ a darem importancia 4s suas intuigdes pré-reflexivas, Vejo-os, freqtientemente, chegarem desiludidos, decepcionados, descrentes de suas capacidades para manejar os fatos da vida e com um imenso sentimento de desvalorizacao de'si mesmos. Procuro mostrar-lhes o que vejo de positivo em suas atitudes, comportamentos ou sentimentos, E muito comum, também, que sé destaquem os aspectos negatives das pessoas com quem se relacionam ¢, quando isto é possivel, procuro mostrar- thes 0 que em seus discursos aponta para qualidades do outro que cles se Teng ver 1s recusam a reconhecer. Acredito que é a partir de uma base de confianga em suas sensagdes € percepgdes que seri possivel ressignificar suas vivéncias, experiéncias ¢ relagdes pessoais. Tenho sempre presente que um relacionamento harménico consigo mesmo, o que inclui aceitar suas potencialidades assim como suas limitagdes, é decisivo para iniciar um processo de desenvolvimento pessoal, ou seja, a ampliagdo de seu campo de possibilidades. Minha atitude costuma ser ativa e participante o que esta ligado ao fato de saber que terei um nttmero limitado de encontros. Isto me leva a priorizar um “foco” entre as possibilidades de temas que o cliente traz. Esta postura me aproxima das atuagSes mais ativas dos seguidores de algumas linhas da psicoterapia breve, como os mencionados por Yoshida (1990); Malan, Sifneos, Davanioo. £ igualmente meu modo de mostrar ao cliente que estou presente, que me interesso, que estou atento e participante naquela relacao. A proposta de um trabalho de curta duragio (como € 0 caso das consultas psicolégicas de que trato aqui) conduz a uma certa preméncia que, por sua. vez, leva a uma atitude mais ativa. Como explica Gilliéron (embora ele proprio nao adote tal postura), “o principio da atividade inspira-se na técnica ativa de Ferenczi, Implica que o terapeuta nao se contente emt seguir “passivamente” as associagdes limitando expressamente a duracho do tratamento, e que, através de controntagces ou de outros recursos técnicos facile ativamente o paciente a enfrentar suas anguistias” (1993, p283). Mostro-me, muitas vezes, diretiva o que ocorre, principalmente, em certas situagdes: quando ha necessidade de que se tome alguma atitude imediata como um laudo psicolégico, por exemplo, para manter a crianga na escola; quando percebo o cliente mal informado, desorganizado com os aspectos praticos de sua vida, ou com as diversas onentacdes que vem_recebendo nos seus pedidos de ajuda; quando o percebo sofrendo muito ou ansioso com o que estd vivendo. Nestes tiltimos casos penso que devo ajudé-lo a restabelecer uma certa tranqijilidade para que possamos iniciar um caminhar mais criativo. Ainda relacionado ao nimero limitado de encontros, ndo mantenho uma atitude de neutralidade que acompanha as associagoes do cliente. Percebo, a partir das reflexdes que desenvolvi neste trabalho, que no decorrer da sessa0 fago escolhas que terminam por eleger um /oco, dentre os temas trazidos, sobre o qual o cliente € eu dirigiremos nossa atencdo. A cleicao do foco resulta do desenvolvimento do didlogo e da interagio com o cliente que se estabelece a partir do campo relacional. Tomo de empréstimo as idéias de Gillieron (1993) que ndo adota a focalizagdo ativa mas “@ focalizagdo pelo piciente’” (p29), Isto é, ndo tomo _a questio do foco como tema ¢ penso que ele nao precisa ser explicitado a6 cliente, porque se vai constituindo no 14 campo terapéutico ¢ ali mesmo estar vigorando". Na maior parte das vezes niio tenho claro qual é. 0 foco embora ele possa ser entendido como a hipdtese ‘privada’ (Gilliéron, 1993) que vou fazendo a respeito do que o cliente traz e que, de algum modo, esta presente na minha escuta. Os clientes tendem a colocar em cena o conflito, que os trouxe 4 consulta, mesmo que (como nos casos das entrevistas que aqui relato) mascarado sob a queixa relativa ao filho. O conflito atual, na minha concepgao, reflete_o campo de possibilidades que o cliente veio constituindo no decorrer da sua vida. Isto é, na atualidade do conflito estarao implicados seu passado ¢ as possibilidades que antevé como futuras. Minha linguagem € corriqueira e cotidiana ¢ procuro aproximar-me da linguagem do cliente__que com freqiiéncia (em instituigdes) fala de forma muito simples ¢ concreta. Costumo utilizar-me de exemplos tirados da vida didria, buscando metaforas concretas para sentimentos, situagdes afetivas ou para questionar valores. Procuro cuidar que minhas observacSes s¢ apresentem como uma possibilidade ¢ ndo como explicagic, verdade ou norma (Corréa, 1996), Tenho disponibilidade para a auto revelagio (Bundza, 1973, Hendrick, 1987) 0 que, acredito, podera facilitar, em alguns casos, um movimento de abertura do cliente na diregao de um encontro comigo, diminuindo a distancia que poderia criar-se entre nos. Entretanto, com clientes como Vanessa, por exemplo, que procuram desalojar o terapeuta de seu papel, tento_manter-me mais reservada, pois, facilmente, cairiamos em uma conversa de “comadres”, que teria pouca validade terapéutica. Em virtude das caracteristicas de minha clientela muitas vezes procuro trawer & baila a questdo da cidadania. Lembro-me com freqiténcia das “.nogdes de ‘pessoas’, ‘meros individuos’ ¢ Sujeito’ ...” apresentadas por Figueiredo (1995a, p36). Segundo o autor as pessoas ocupam um lugar determinado ¢ “tém suas vidas reguladas pelas tradicées ¢ pelos costume?” (37), os’ meros individuos constituem a massa anénima e¢ indiferenciada e estdo submetidos 4 “uma lei impessoal que as transcende e deles nao imanou (.) € ndo tém unt lugar proprio que thes caiba de direite” (ps8) ¢ 0 sujeito que é “auto-subsistente ¢ auto-sustentado”(p0) se pressupde auténomo € independente, Meus clientes costumam situar-se_e ver-se como “meras individuos”, mergulhados no impessoal, sem direitos e submetidos a um niimero enorme de pessoas a quem atribuem autoridade e que com a maior facilidade \ Darts a entimente pce, mn main parted temp, log sick rm ar de ign sen ema ge ato acters, tye area ant mange rare de r cme ete wn wa fa ee 1750.0 tema scat riper ate ¢ se era contin «ponebalalt dea onlnctamemt, eam W8) + propre ass, chamam de “Doutor”. Ajudar os clientes a se perceberem como pessoas, com nome, sobrenome, familia, ¢ direitos, nao os desalojara, necessariamente, do impessoal € cotidiano onde vivem (vivemos) a maior parte do tempo, mas permitird que se sintam mais confortaveis_¢ nao fiquem “tinds ¢ basicamente 4 mercé dos caprichos das pessoas” (idem, p38, nota de rodapé, 14). Embora este tema possa conduzir a questdes que escapam ao Ambito desta pesquisa, devo acrescentar que considero importante para quem trabalha em instituigdes de atendimento gratuito (ao menos no Brasil) manter a capacidade de indignar-se'*, ou como diz Baptista (1995) a respeito do servigo social: “evitar 0 risco da banalizagao da vida humana, que pode ser provocado pela rotina, pelo trato do cotidiano de situagaes de segregacao, de injusti¢a. O risco da perda da capacidade da paixio da indignagao - motor necessdrio para uma a¢do comprometida - () que pode levar o profissional a viver sua pritica mecanicamente, procurando resultados, mas sem paixio”«p 13). Acredito que, se o cliente também se permitir sentir a paixto. da indignagdo, esta, como toda paixiio, podera leva-lo a ultrapassar os limites do cotidiano, desalojando-o e desterntorializando-o, obrigando-o a conquista de novos espacos. Percebo que quando meus clientes se dao conta de que podem se recolocar no mundo em uma postura mais critica, menos submissa ¢ alé reinvindicadora uma nova perspectiva se abre para eles. E novas perspectivas significam ampliacao de seu horizonte, abertura para um novo campo de possibilidades a partir do qual o acontecimento pode dar-se, sendo que esta | ampliagio ja é, algumas vezes, a propria abertura ou acontecimento. Devo reconhecer que muito da minha postura, que se aproxima da atitude acolhedora humanista, pode nao desalojar o cliente do seu habitual, do seu “acostumado”, dificultando o deflagrar do acontecimento transformador embora possa, igualmente, ser 0 inicio de uma construgdo gestatéria do acontecimento, _Instalar-sc no mundo como pessos, (lembrando, com Figueiredo, que todos nés constantemente alternamos as trés condigdes: meros individuos, pessoas e sujeito) pode permitir “am espaco de separacao recothimento, de protecdo, que nao encerre o existente em wina clausura mas the oferegs uma abertura limitada (portas ¢ janclas) a partir da qual sejam ossiveis encontros - saldas ¢ entradas - em que se reduzam os riscos dos ‘maus encontros’, dos encontros destrutives ¢ traumaticos. Portas e janelas por onde uma vendadeira alteridade possa insinuar-se ¢ eventualmente impor-se” (Figueiredo, 1995b p4s)."* Agcuas won +armaple traded cha pce imc uma se vet rates a io ae we pig attics paca a ovina r "Ne decorer ewan at shila mtr eu apenas sce Semen saber er nage ome Seem mene ce neha, peal coaram ce na ceded ere °° Cele de ato, Nese texte. ant deserve ure ace aseede we parse com a adiicacde de propria ncaa Ao término da iiltima__ sessio, costumo fazer uma sintese da minha compreensiio do que ocorreu naquele encontro. Nestas ocasides retomo o que foi dito (pelo cliente e por mim), que sentido teve para mim o que dissemos e que caminhos se abrem a partir dali. Busco entregar ou devolver ao cliente 0 que ¢ dele'*, procurando consclidar o que foi vivido durante a sesso, isto é, espero que o cliente _reviva as experiéncias que ocorreram durante aquele encontro. Procuro desta maneira fechar o atendimento, identificando-o como um Proceso completo com inicio, meio e um fim claramente delimitado a partir do qual o cliente devend tomar decisdes sobre 0 encaminhamento futuro. Ou seja, participo ativamente durante as consultas psicolégicas mas deixo claro ao final que apenas ¢ tdo-somente o cliente podera decidir o rumo a dar a sua vida. Paralelamente, porém, sempre deixo aberta a possibilidade de o cliente voltar a me procurar se assim o quiser. Ao refletir sobre minha atuagao como psicéloga, percebo que nao fica clara a abordagem que adoto em meu trabalho. No entanto, se devo filiar-me a alguma linha psicolégica, opto pela fenomenologia-existencial. Por que tal imprecisdo? Pelo fato de que entendo como invidvel a pureza tedrica na pratica clinica, ja que vejo cada teoria como um recorte i logico que da conta de apenas alguns aspectos do ser humano, sendo impossivel abarca-lo em toda sua riqueza e complexidade. Por outro lado a abordagem fenomenoldgico-existencial caracteriza-se muito mais por ser uma descrigdo (fenomenclégica, é clarol) do ser humano (0 ser que nés mesmos somos) do que uma teorizacao sobre ele. A fenomenologia é sempre muito mais filosofia do que psicologia e, como tal, questiona as diversas teorias, colocando-as em cheque ¢ constituindo pontos para reflexdo que poderdo incidir, sobre aquelas enriquecendo-as. x Entendo que, tanto minha postura na clinica psicoldgica quanto minha compreensdo dos casos que atendo tém embasamento tedrico fenomenoldgico-existencial mas ambas s&o, ainda mais, resultado das articulagdes possiveis entre o que sei de psicologia com contribuigdes da filosofia (principalmente a heideggeriana sob a ética de Figueiredo) e outras influéncias que considero quase tdo importantes quanto estas, que s4o a literatura, especialmente a poesia, e 0 cinema. Nao necessito retornar ao tema dos saberes existenciais imbricados em toda atuaglo: “zo menos na clinica, os psicdlogos estdo sempre, ou quase sempre, transitando, quando mais nito seja na medida em que o proceso de elaboragao - mio consciente e nao programado - do conhecimento tacito thes impée um movimento Naw me rfc ag ao ue anuaenrcte¢ cham de “devahtiva™ Ae devolatvas em gen, xan retctounian om pricnngnértice «Cem coma de ammenities fvaladee ee Om dt Coins en pe dave avreele. as itituo de metabolizugito: metabolizacdo de experiéncias, metabolizagto de tntormapces Woorcas.." igueteeten 1993¢ p91),

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