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Tel SleCM ilies Mato) Oh) A no proces iativo MURMUR) ccHeMsteIN|IELUSK MA CAFE MUC ML sti (3 4 edicao A presente obra, resultado de pesquisa efe- tuada no curso de pds-graduacao da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Sao Paulo (FAU-USP) para obtencao do titulo de Tinea come] Del Re cae Oe Ore eM UO Sre tee = OL NL) publicacdo, permitindo 0 acesso nao sé ao publi- co especializado, como também ao iniciante e aos CLS ren eM WM oasis | eau eel Nore ment (eK rely cores ou tém curiosidade sobre o assunto. DEMO oUeteen einen Melee Meg ale US sobre a Bauhaus em nosso meio académico, na maioria das vezes leituras relacionadas ao dese- nho industrial e suas questées metodolégicas Peel ct res Temos agora algo de que careciamos, ou seja, 0 estudo da cor como processo criativo pela Bauhaus. Partindo das visdes de Itten, Klee, Kandinsky e Albers, a autora traca com grande Ee Cer msm CCE SIT COLTON Color LiMo RN ee AEN eA ACLU Ey teorias e metodologias da Bauhaus. Trata-se de uma obra fundamental, sobretudo Peo ek eke ener Lt SoMt ela eo) ecto el eMInTeli el ee Mel) (cle eRe LOR U cioas Feel (erster ae aM een Ye arel¢ Fe (OSSMNLUTNN SIR Osc} graficos didaticos estabelecidos pelos mestres da EST Are USMS eel ee Mom PUD) ea] eCeL ont Met Jodo Evangelista B. R. da Silveira Eola es Lee ORO PL LAC) oe aU eRy (emt eso em Oe era Oe Uo MUNCIE ea enc ur 0} A cor no processo criativo Um estudo sobre a Bauhaus e a teoria de Goethe edigdo: 2006 3! ediedo: 2007 Reimpresséo: 2008 3 edigdo revista: 2009 at edigao: 201 Dados Internacionais de Catalogacio na Publicagao (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Barros, Lilian Ried Miller A cor no proceso criativo : um estudo sobre a Bauhaus e a teoria de Goethe / Lilian Ried Miller Barros, ~ $80 Paulo : Editora Senac Sao Paulo, 2006. Bibliografia ISBN 978-85~7359-877-3 1. Bauhaus 2, Cor — Estudo e ensino 3. Cor na arte 4, Goethe, Johann Wolfgang von, 1749-1852.Doutrina das cores ~ Critica e interpretagdo_ 1. Titulo. 05-8136 CDD-701.85 indice para catalogo sistematico: 1. Cor no proceso criativo : artes 701.85 LILIAN RIED MILLER BARROS A cor no processo criativo Um estudo sobre a Bauhaus e a teoria de Goethe 4 edicdo ADMINISTRACAO REGIONAL DO SENAC NO ESTADO DE SAO PAULO Presidente do Conselho Regional: Abram Szajman Diretor do Departamento Regional: Luiz Francisco de A. Salgado Superintendente Universitario e de Desenvolvimento; Luiz Carlos Dourado EDITORA SENAC SAO PAULO Conselho Fditorial: Luiz Francisco de A. Salgado Luiz Carlos Dourado Darcio Sayad Maia Lucila Mara Sbrana Sciotti Jeane Passos Santana Gerente/Publisher: Jeane Passos Santana (jpassos@sp.senac.br) Editora Executiva: Isabel M. M. Alexandre (ialexand@sp.senac.br) Assistente Editorial: Pedro Bartos (pedro. barros@sp.senac. br) Edigdo de Texto: Luciana Garcia Preparacao de Texto: Valdinei Dias Batista Revisao de Texto: Adalberto Luis de Oliveira, Edna Viana, Ivone P. B. Groenitz, Jussara Rodrigues Gomes, Luiza Elena Luchini, Maria de Fatima C. A. Madeira, Oswaldo Cogo Filho Projeto Grifico. Antonio Carlos De Angelis Fditoracao Eletrénica: Antonio Carlos De Angelis e Fabiana Fernandes Capa: Lilian Ried Miller Barros Impressdo e Acabamento: Salesianas Comercial: Rubens Goncalves Folha (rfolha@sp.senac.br) Administrativo: Carlos Alberto Alves (calves@sp.senac. br) Proibida a reprodugao sem autorizagao expressa. Todos os direitos desta edicao reservados 4 Editora Senac Sao Paulo Rua Rui Barbosa, 377 — 1° andar — Bela Vista — CEP 01326-o10 Caixa Postal 1120 — CEP 01032-970 — Séo Paulo — SP Tel. (11) 2187-4450 — Fax (11) 2187-4486 E-mail: editora@sp.senac.br Home page: http://www.editorasenacsp.com. br © Lilian Ried Miller Barros, 2006 Sumario Nota do editor, 7 Apresentacao — Sylvio Barros Sawaya, 9 Agradecimentos, 13 Introducao, 15 1—Bauhaus, 25 2—Johannes Itten, 57 3 —Paul Klee, 107 1, — Wassily Kandinsky, 149 5 —Josef Albers, 211 6 — Wolfgang von Goethe, 265 Conclusao, 305 indice geral, 329 Nota do editor Com 0 intuito de proporcionar uma analise séria e com- plexa do fendmeno das cores em diversas areas do conheci- mento, a autora retorna as raizes dessas investigagdes, quando renomados artistas comegaram a manifestar um interesse es- pecifico sobre o assunto. A Bauhaus, escola alema que prezava a liberdade de ex- pressdo e a formacao completa do aluno—incentivando tam- bém a interseccdo da arte com o processo industrial —, surge como referéncia central para o desenvolvimento de todo e qualquer estudo, assim como 0 tripé cores, natureza e ho- mem estabelecido por Wolfgang von Goethe. Apresenta-se neste livro, portanto, uma base tedrica sdli- da que considera as complexas linhas cientificas da quimica, da fisica, da biologia e da psicologia, e possibilita sua unido com os diversos recursos tecnoldgicos disponiveis na atualidade a fim de potencializa-los para que a selegao das cores deixe de ser apenas um acaso ou uma combinacao ba- seada em padrées estéticos convencionais — muitas vezes equivocados — para se tornar uma escolha consciente e in- fluente. O Senac Sao Paulo, ciente da importancia do estudo das manifestac6es culturais, publica mais um titulo de referéncia para as areas de arte, design e comunicagao Apresentacao Esta apresentacao é mais uma conversa sobre a Lilian, “Lix”, aluna querida e aplicada que me pediu uma fala sobre o li- vro que escreveu. Tudo comecou com 0 nosso encontro que ocorreu por ocasido do seu trabalho de graduacao interdisciplinar, quan- do passei a ser seu orientador. A vontade de trabalhar com as questdes visuais e a cor ja eram evidentes. A arquitetura e seu projeto eram um desafio para alguém que se orientava deci- didamente para as artes plasticas Queria projetar uma danceteria e, por querer enfrentar 0 projeto, surgiu nosso encontro e didlogo. Pesquisa das danceterias existentes, encontro do local e aproveitamento de suas circunstancias urbanas, criagdo de espacos muito ricos e diversificados, tudo isto se deu com grande empenho e brilho. Surgiu, com uma liberdade muito grande de projetar, um objeto ludico, rico de visuais e de locais para 0 encontroe a danga, uma expresséo muito forte desse momento da vida, cheio de energias e de procuras. © trabalho culminou em uma linda apresentacdo, toda colorida, envolvente e com muita garra. 0 desafio tinha sido enfrentado, e a Lix saira vitoriosa. A razdo desse enfrentamento com sucesso se encontrava na propria Lix, em uma educa¢ao cuidada e primorosa, com condigdes plenas para a afirmagao pessoal, e na Escola Waldorf, inspirada em Rudolf Steiner em que se formara. Formada, a Lix logo me espantou novamente ao se propor a fazer o mestrado. Conversando, encontramos na professora Elide Monzeglio a orientadora, que a acolheu e, com grande abertura de espirito, a compreendeu e a apoiou em todo o seu percurso na realizagéo de sua dissertagéo que se trans- formou neste livro. A escolha da professora Elide Monzeglio nao foi por aca- so; também minha professora, ensinou-me a desenferrujar a méo, a acreditar em meu desenho e, desde entao, a utilizar esse instrumento Unico de expressdo e comunicacao. A gra- tiddo que tenho por essa querida professora se soma a um respeito também agradecido de muitos dos alunos da Facul- dade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Sao Paulo (FAU-USP) que tiveram o privilégio Unico de té-la como mestra, como pesquisadora, como participante e produtora de eventos e mesmo como administradora. A cor no proceso criativo 10 Este livro, que trata da sensibilidade através da cor como seu objeto de atencdo, fala desse encontro entre uma aluna e sua professora, incorpora as experiéncias e as diretrizes ob- tidas em sua formagao voltada para a subjetividade e para a liberdade do espirito humano e coloca a importancia dessa subjetividade como elemento central da relagéo do homem consigo mesmo, com os demais homens e com o mundo. Quatro séculos de objetividade e de racionalismo levaram a uma visdo pejorativa da subjetividade concreta, transfor- mando-a em subjetivismo e sentimentalismo. Uma oposi¢do aessa reducao tem em Goethe um marco fundamental na sua visdo mais amplae livre da condigao humana, tem em Rudolf Steiner um discipulo brilhante e heterodoxo, tem nos pinto- res da Bauhaus uma militancia atualizadora e atual, os quais nos deram a oportunidade de nao nos fecharmos em uma visdo sé objetiva, logica e desvitalizada dos seres e das coi- sas. E dessa saga que fala este livro. Desejo ao leitor um grande proveito desse texto, e espero que nele desperte a mesma garra, ao acreditar em seus sen- timentos, propondo um mundo mais rico e vivo. Sylvio Barros Sawaya Professor titular do Departamento de Projeto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de a0 Paulo apresentagio Agradecimentos Agradeco a todos os alunos e amigos que me encorajaram e colaboraram na realizacado deste trabalho, com destaque especial aos meus mestres: professora doutora Elide Monzeglio, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Uni- versidade de Sao Paulo (FAU-USP), que foi minha orientadora na pesquisa de mestrado; professor doutor Sylvio Barros Sawaya, também da FAU-USP, querido mestre da graduacdo; e professor doutor Jodo Evangelista Barbosa Romeo da Silveira, da Escola de Comunica¢ao e Artes da Universidade de Sdo Paulo (ECA-USP). Também ficam aqui meus agradecimentos a equipe da Editora Senac Sao Paulo, durante toda a revisdo do livro, e 4 minha querida familia: Hilno, Roxania e Karen 13 Introdugao A cor éum fendmeno fascinante. Sua presenga no mundo visivel exerce incontestavel atracdo sobre nés, despertando sensacoes, interesse e deslumbramento. Todos aqueles que trabalham com imagem, criagdo de ce- narios e comunicacdo visual sabem disso. A cor representa uma ferramenta poderosa para a transmissdo de ideias, atmosferas e emocées, e pode captar a atencao do puiblico de forma forte e direta, sutil ou progressiva, seja no projeto arquiteténico, industrial (design), grafico, virtual (digital), cenogréfico, fo- tografico ou cinematogrdfico, seja nas artes plasticas. Sabemos que a cor oferece infinitas possibilidades de ser trabalhada como elemento criativo. Dentro do espectro visi- vel, temos a liberdade de combinar os tons, misturando os matizes e produzindo composi¢ées atrativas, impactantes ou tranquilizantes. 15 No entanto, a complexidade do trabalho com a cor é mui- to maior do que se imagina a principio. Hoje, com todos os recursos de que dispomos, seja a computacao grafica, sejam os inumeros tons oferecidos pelas indistrias de tintas, entre muitos outros avancos da nossa era, a tarefa de combinar as cores e de escolher os tons adequados para um contexto es- pecifico continua a representar um grande desafio. Ainda paira no ar a sensagdo de que essa tarefa requer, como a criagdo do artista, uma inspiracdo, uma intuigéo ou um ta- lento nato. Encontra-se uma certa dificuldade em se estudar a cor. Se, por um lado, é facil nos interessarmos por esse assunto, por outro, aprofundar os conhecimentos sobre o fendmeno das cores acaba por se tornar um trabalho muito abrangente, que envolve desde a composi¢do quimica dos pigmentos, os estudos da fisica da luz e da fisiologia do nosso aparelho visual até as questées psicolégicas da sua interpretacado e assimilagao. Isso sem mencionar outras formas de aproxima- ¢do relativas a questdes estéticas e associacdes simbdlicas. 0 maior obstaculo para os estudos da cor talvez seja a sua na- tureza efémera; ndo podendo ser considerada matéria (pig- mento), j4 que depende da luz e dos nossos olhos para exis- tir. A constatagéo da sua instabilidade diante das oscilagées da luz e das influéncias das superficies vizinhas contribui para criay uma sensa¢do de inseguranca em relacdo ao con- trole dos seus efeitos visuais. Assim, a cor pode ser objeto de pesquisa em todas essas areas de estudos, assumindo, por um lado, uma conotagao técnica, associada a fisica Optica e 4 quimica dos pigmentos, e, por outro, o carater subjetivo da percepcao fisioldgica e psicolégica. Arte e ciéncia se alternam quando 0 assunto é a cor. Existe hoje uma compreensdo de que os nossos processos intelectuais nado separam totalmente as sensa¢ées visuais do nosso raciocinio. A educacao visual, na qual podemos inserir o estudo das cores, exerce importante influéncia na nossa formagao e capacidade criativa. Entretanto, o ensino da cor, entendido como disciplina didatica em escolas e universidades, resume-se, na maioria dos casos, a uma breve passagem teorica sobre as questdes fisicas da luz e nocdes sobre as misturas dos matizes no cir- culo cromatico. Nao é raro encontrarmos no aluno interessado em apro- fundar os seus conhecimentos sobre as cores a preocupacao em aprender uma “receita de harmonia”. Alguns imaginam que combinar as cores seja uma questdo de estudar certas tegras basicas e objetivas. Outros evitam tal aprendizado, pois temem a assimilagao de preconceitos que poderiam li- mitar sua criatividade e liberdade composicional. Com certeza esses fantasmas que envolvem o ensino das cores provém de cursos mal estruturados, diretrizes genera- lizadoras, ou abordagens unilaterais, desprovidos de um con- tetido realmente util 4 aplicacao da cor nas artes visuais. Isso mostra quanto necessitamos voltar nossa atencao para os momentos iluminados da historia do ensino das artes, introducio 7 revivendo metodologias didaticas transformadoras, para res- gatar praticas eficazes que ficaram perdidas no tempo, mas que, nem por isso, se tornaram obsoletas aos propdsitos de uma escola atual. Na busca dessas referéncias para um estudo fundamenta- do sobre as cores, acabamos recaindo na Bauhaus. A Bauhaus, famosa escola alema cujo objetivo era a demo- cratizacdo da obra de arte por meio da sua integracdo com a producdo industrial, realizou uma verdadeira modernizagao no ensino artistico. Os seus mestres tiveram total liberdade para criar novos métodos didaticos que contribuissem para a formacao de um profissional socialmente integrado. Com o objetivo de estudar a cor sob o enfoque do pro- cesso criativo, reunimos neste trabalho informacées sobre as teorias e metodologias didaticas que constituiram o ensino da cor na Bauhaus, entre 1919 € 1933. As abordagens dos mestres da cor da Bauhaus, por sua vez, acabaram revelando a influéncia de um estudo ainda mais antigo: a Doutrina das cores de Johann Wolfgang von Goethe (1810). Dessa forma, além das metodologias didaticas da Bauhaus, anexamos, ao final deste livro, um resumo da doutrina das cores de Goethe, enfocando os aspectos que tiveram maior influéncia sobre o pensamento dos mestres da cor da Bauhaus. Compromissado com a qualidade artistica do ensino na Bauhaus, Walter Gropius — primeiro diretor e idealizador da escola — buscou cercar-se dos processos criativos que pos- 1S Le eprosatee cistiva sibilitassem o bom design, encorajando 0 desenvolvimento de teorias da composigao plastica pelos mestres que com- punham o corpo docente. Grande parte dos professores con- vidados a lecionar na escola Bauhaus eram pintores que des- pontavam em movimentos artisticos da vanguarda europeia. Entre eles encontramos Paul Klee e Wassily Kandinsky. Esses mestres da cor procuraram oferecer aos alunos ins- trumental para uma linguagem universal do design, evitan- do limitar 0 aprendizado das cores aos aspectos técnicos da mistura de pigmentos. Isso resulta do esforg¢o para superar os padrées arcaicos que provinham dos métodos de ensino praticados nas academias de arte. Os mestres da Bauhaus, coma sua sensibilidade artistica, procuraram encontrar na interpretacdo das formas e das co- res os simbolos universais da comunicacao visual. Esses ar- tistas buscaram nas origens mais puras da forma e da cor, livrando-se de todos os preconceitos estilisticos, as ferra- mentas basicas para uma resposta atualizada as exigéncias modernas da sociedade de sua época. As conquistas no design, obtidas com as pesquisas ela- boradas nessa escola, revelam a importancia dos cursos pre- liminares de forma e cor para a realizagdo de um desenho industrial sem precedentes. A originalidade surgida no inte- rior da Bauhaus, aplicada ao design de mobilidrio, utensilios domésticos e projetos arquiteténicos, vincula-se de alguma maneira aos exercicios praticos propostos pelos mestres da cor e da forma. Introdugao 19 Klee viu na cor um processo continuo de transformacio. Para Kandinsky, ela é 0 canal para a expressdo de uma reali- dade interior, através da evocagdo das emocoes, traduzin- do-se numa linguagem universal que relaciona movimentos, temperatura e sons musicais. Klee e Kandinsky desenvolveram na Bauhaus verdadeiras teorias da criagéo. Estudaram as tensdes das cores e das for- mas, resgatando sua forca comunicativa, mesmo quando desvinculadas do objeto e da representacao naturalista Além das teorias de Paul Klee e Wassily Kandinsky, tam- bém abordamos as metodologias didaticas para o ensino da cor propostas e praticadas por Johannes Itten e Josef Albers. Veremos como a proposta de sintese estética da Bauhaus, elaborada por seus mestres da cor, principalmente na fase expressionista de fundagao da escola, esta de alguma forma vinculada as associagdes entre as cores, a natureza e 0 ho- mem que encontramos na obra Doutrina das cores de Goethe. A teoria das cores de Goethe, até hoje pouco conhecida, principalmente quando a comparamos a sua obra literdria, surgiu aproximadamente um século antes da fundacao da Bauhaus. Veremos, nos ultimos capitulos, como esse texto, negligenciado pela visdo cientificista de sua época, acabou se tornando referéncia importante, confirmada por muitas reflexdes no meio artistico. A sua influéncia é mais evidente a partir da metade do século XIX, quando a cor comeca a ad- quirir autonomia na pintura, desvinculando-se progressiva- mente do seu compromisso com 0 objeto. 20 tmestudo's Os mestres da cor na Bauhaus buscaram referéncias no li- vro de Goethe para a fundamentagao tedrica de suas mani- festacdes artisticas e para o desenvolvimento de suas teorias e metodologias didaticas. A teoria das cores de Goethe, publicada em 1810, repre- senta um ponto de partida para todo o aprofundamento do estudo das cores. Ele procura democratizar esse conhecimen- to, mostrando seus desdobramentos em diversas areas do conhecimento, abordando o fenémeno fisiolégico da visdo das cores, as associacdes psicoldgicas da percepcao visual e as qualidades estéticas das cores. E sempre com especial re- veréncia que Goethe dedica varios trechos de sua obra aos pintores. A revolucao tecnolégica, causada pelo advento da infor- matica, langa a todo momento novas perspectivas para o ensino das artes. A rapidez com que podemos hoje, por meio dos softwares de computagao grafica, observar resultados e efeitos visuais, alterando instantaneamente a cor nas ima- gens, é algo que dinamiza todo o processo de aprendiza- gem. Esse aumento geométrico das nossas possibilidades experimentais precisa, entretanto, de um fio condutor — um conceito estruturado de ensino, um objetivo, para que possa nos levar a resultados concretos que satisfagam as nossas necessidades sociais, culturais e humanas. O ferramental de trabalho composto dos softwares e hardwares de ultima geracao oferece novos caminhos a ques- Introdugao «= DT tao educacional. Ao mesmo tempo, metodologias didaticas ultrapassadas, pautadas em visdes limitadas e parciais, as- sociadas ao mero manejo dos comandos de um programa, podem empobrecer o ensino em vez de amplia-lo. Certamente ndo encontraremos nas metodologias didaticas dos mestres da Bauhaus todas as respostas para as nossas necessidades atuais. Entretanto, podemos nos espelhar na pesquisa de seus mestres e alunos e encontrar novos rumos e métodos para a reflexdo sobre as cores e 0 desenvolvimento do design. 0 fio condutor do raciocinio tedrico e didatico que se desenvolveu nesta escola pode, dessa forma, nos ser muito util. Assim, acreditamos que as informagées aqui reunidas pos- sam nos ajudar no ensino do futuro, para que possamos uti- lizar todo o dinamismo transformador oferecido pela tecno- logia em favor de uma educacdo engajada e geradora de resultados. Iniciamos este livro com uma apresentacdo da Bauhaus, que tem por objetivo situar os enfoques de ensino da cor que serdo 0 tema dos capitulos seguintes. Cada um dos qua- tro mestres da cor da Bauhaus é abordado num capitulo a parte. A partir de apontamentos biograficos que expéem bre- vemente os fatos de suas vidas, aproximando-os da questao da cor, descrevemos suas teorias e metodologias didaticas, amplamente ilustradas com demonstracdes de seus modelos cromaticos e exercicios propostos aos alunos. no proceso criativo No ultimo capitulo ena “Conclusdo”, apresentamos a Dou- trina das cores de Goethe e uma anilise da sua influéncia no pensamento e no desenvolvimento das teorias e metodologias didaticas praticadas na Bauhaus. Introdugio 2 3 |. Bauhaus A escola Bauhaus Para tratarmos do ensino da cor na Bauhaus, é preciso que tenhamos uma visao global dos objetivos e contextos envol- vendo essa escola, que representa um marco na historia do ensino das artes. A Bauhaus surge no inicio do século XX como resultado da fuséo da Academia de Belas Artes de Weimar (Weimar Hochschule fur bildende Kunst) com uma escola de artes e oficios — a Kunstgewerbeschule —, que havia sido dirigida pelo pintor e designer belga Henry van de Velde (1863- 71957). "Van de Velde foi um dos pionetios na implementacao do trabalho integrado entre arte e indiistria. Segundo Frank Whitford. ele realizou 0 sonho da cooperacdo entre artistas, artesdos e industriais seis anos antes da fundacdo da Werkbund e vinte anos antes da Bauhaus. Cf. Frank Whitford, Bauhaus (Londres: Thames & Hudson, 1995). Bauhaus 27 O nome da nova instituic¢do de ensino — Casa da constru- cao — remete as Bauhtitten medievais (corporacdes de artesaos), demonstrando o desejo de Walter Gropius, seu fun- dador, de criar ali um ambiente educacional diferenciado: democratico, baseado em um espirito de trabalho comuni- tario, integrado a industria. Esse objetivo da Bauhaus tam- bém foi compartilhado por outras escolas que surgiam nesse periodo na Inglaterra e na Alemanha, opondo-se ao sistema de ensino vigente nas academias, onde prevalecia o distan- ciamento do ensino artistico.’ Gragas 4 unido de forgas, 4 atuagdo e ao entusiasmo de artistas e arquitetos da vanguarda europeia, pedagogos e idealistas, a Bauhaus desenvolveu um programa de ensino avancado, que pretendia sintonizar-se com as perspectivas * Com a emancipagio do individuo, no final da Idade Média, a formagdo artistica separa-se cada vez mais da esfera das oficinas e desloca-se para institutos de apren- dizagem especializados, as academias. A sofisticagao e a elitizagao do ensino aca- démico atingem seu auge nas academias francesas do século XVIII. Surge a nogso de carreira, garantida pelos estudos nas academias consagradas. Cf. Rainer Wick, Pedagogia da Bauhaus, trad. Jodo Azenha Jr., Colegio (Sio Paulo: Martins Fontes, 1989), p. 66. £ a partir desse momento que se afirma a distingdo, 0 preconceito, entre ‘arte vulgar” e “arte elevada”, diferenciagdo que persiste até hoje, gerando polémica, apesar de todas as transformagées ocorridas nas escolas de artes, A Bauhaus é criada no momento em que as academias comecam a ser criticadas como instituicdes ca~ racterizadas pelo distanciamento em relacdo a vida € pela oposigao ao progresso tecnolégico. Passa-se entdo a questionar a utilidade social da separacao e a distin- 40 entre artesdos e artistas. Enquanto os primeiros ainda adquiriam suas habilida- des em um sistema de aprendizado que remontava & época das grandes catedrais, os artistas formavam-se numa atmosfera refinada, recebendo “instrugdes baseadas no estudo dos antigos e dos velhos mestres"; as academias estavam “cegas ao espetacular sucesso da vanguarda, especialmente na Franga, acreditando que elas sozinhas conservavam os valores artisticos definitivos”. Cf. Frank Whitford, Bauhaus, cit., p. 7 2B hextso,pocese cat de desenvolvimento social, econdmico e tecnoldgico de sua época, sem perder de vista 0 fator qualitativo que envolve os processos criativos. A Bauhaus, segundo Argan, baseava-se na “tese funda- mental da indispensavel substituicaéo da concentracdo do valor estético numa categoria privilegiada de bens (as obras de arte) por uma experiéncia estética difundida pelo projeto urbanista-construtivo-industrial”.* Essa democratizacao da arte, por meio da sua aplicacdo na producao industrial, requeria completa modificacdo na formagao do artista, exigindo novas concepgées de ensino. Entre essas alteragdes, estavam a participagao dos artistas em atividades ligadas ao design e a implantacdo de oficinas de producao no processo educativo, que, em Ultima instan- cia, tinham o objetivo de integrar arte, artesanato, desenho industrial e construgao. Rainer Wick mostra como a “orientagdo da producado es- tética segundo as necessidades de uma faixa mais ampla da populacao e nao exclusivamente segundo a demanda de uns poucos, privilegiados social e economicamente”, represen- tava uma sintese social, que por sua vez se unia a outro objetivo da Bauhaus: a sintese estética — a integracao de to- dos os géneros artisticos numa linguagem sem fronteiras.* 0 objetivo de Gropius em 1919 era “reunir aqui [na Bauhaus] > Giulio Carlo Argan, Arte moderna: do iluminismo acs movimentos contemporaneos, trad. Denise Bottmann & Frederico Carotti (S40 Paulo: Companhia das Letras, 1996), p. 279. * Rainer Wick, Pedagogia da Bauhaus, cit., pp. 83-84, Bauhaus 29 uma pequena comunidade, através da quebra do isolamento de cada um”, uma comunidade que passaria a ser a célula- ~mae de uma nova ordem social, mais humana, mais justa socialmente, e baseada no conceito da harmonia.° Neste ambiente, o ensino da cor foi concebido paralela- mente ao ensino da forma. A criacao desse novo conteudo didatico surge como tentativa de isolar os elementos basicos da composi¢do, procurando oferecer aos alunos as ferramen- tas para uma linguagem universal. Uma linguagem que ser- visse aos novos objetivos da vida moderna. Percebemos aqui quanto a Bauhaus estava a frente de seu tempo. Inserida no contexto entreguerras, seus ideais universalistas antecipavam uma visdo globalizada, liberta de fronteiras terrestres e culturais, que hoje, quase um século mais tarde, comecgamos a experimentar; embora seja preciso dizer que nao foram superadas as desigualdades econdmicas e sociais, 0 que impede o acesso da grande maioria aos be- neficios que a tecnologia e o design oferecem. Fundada em 1919, a Bauhaus manteve-se por catorze anos na Alemanha, até ser extinta pelo governo nazista em 1933, quando as obras de seus mestres e alunos foram considera- das arte degenerada e bolchevista pela politica cultural do partido. Ao ser extinta na Alemanha, seus colaboradores refugia- ram-se em outros paises da Europa e nos Estados Unidos, * Ibidem. A cor no proceso criativo 30 disseminando suas ideias avancadas em outras instituigdes de ensino. As fases da Bauhaus: a evolucdo de suas metodologias didaticas Historiadores e criticos tém dividido a Bauhaus em fases para explicar suas modificacdes internas e evolugao. Embora sua existéncia tenha sido relativamente curta (ca- torze anos), a escola passou por diversas alteracdes desde a sua fundagdo em 1919 até o seu encerramento em 1933, descrevendo uma historia de transformagdes em sua postura ideolégica e permitindo uma abordagem sob diversos pontos de vista. O quadro a seguir foi construido com o objetivo de rela- cionar algumas dessas formas de classificagdo da escola, lo- 1919 1933 Bauhaus 920 1921 1822 1929 1904 1925 1926 1907 1020 1829 1900 1991 1902 Cidades em que a escola teve sua sede said Diretores ‘Mestres da cor Quanto aos aspectos -estilisticos primarios ‘Expressionista, ‘Fase formal, “Funcional, (bor Wit Hereogenrath) J insist que ina | queeslatzns spomara ase per cbjeto asfomees —— dotatahe cent Ou peed d ee bee ia Wet recon? Sandestin a @ Rainer Wick*) "periogo de uma escoa de ate” egies rominteas | redfinigdo | “econ seus ese um enaqcinnt de avtonpressto Sooper, | ensamerion efuineas prises coro atistica, temperando para as demandas consequibncia, uma perca da idealemo con} Ge indtria realsme ‘qualidade espetua! da Baunaus Figura 1, Fases da Bauhaus. Bauhaus 31 calizando os mestres da cor, os diretores e as cidades na Ale- manha onde a Bauhaus se estabeleceu Fica claro que, a partir de 1928, com a transferéncia da diregao da escola para Hannes Meyer, a Bauhaus muda dras- ticamente seus principios metodoldgicos. Segundo Rainer Wick, a Bauhaus se afasta dos seus objetivos iniciais, na me- dida em que abandona a ideia de uma escola de artes e as- sume uma funcdo de carater puramente social-utilitario-fun- cional.° Durante o periodo precedente, também chamado de era Gropius, a escola descreve um percurso progressivo e coe- rente para o desenvolvimento de uma metodologia de ensi- no voltada para o design industrial. Gropius entende esse design como o produto do diadlogo entre arte e técnica. Na arte esta embutido o coeficiente humano — a qualidade —, ao passo que, pelas técnicas e pelos processos industriais, é possivel alcancarmos a quantidade e a rapidez necessarias & producdo € ao progresso econdémico. Sem perder de vista 0 seu compromisso com a qualidade artistica, Gropius busca cercar-se dos processos criativos que levem ao bom design, e, por isso, possibilitem o desenvolvi- mento de teorias de composicao plastica pelos mestres pintores. A partir dos objetivos idealistas da sua fase de fundagao, aBauhaus caminha progressivamente na direcado de uma maior © Ibid, p. 57 32 A cor no procesto criativo objetividade, rumo a sua fase funcional. Num primeiro mo- mento ela aplica as teorias didaticas utilizadas por Johannes Itten na sua concep¢ao do curso preliminar, que buscava, na expressao individual e subjetiva dos alunos, os tragos genui- nos da criagao artistica. Essa fase expressionista na fundagdo da Bauhaus parece ter sido importante para libertar as forcas criativas dos paradigmas que envolviam os padrées estilisticos da produc¢ao artesanal do mobiliario, dos utensilios e da or- namentacdo na arquitetura. Mas nao podemos tachar essa fase inicial expressionista de utdpica e sonhadora sem entendermos suas razées. Para Argan, inserido na situagao historica do pds-guerra e do irracionalismo politico, o “funcionalismo arquiteténico ale- mao” (desenvolvido na Bauhaus) nasce a partir do movimento expressionista, “no qual se refletiam simultaneamente a cons- ciéncia da catastrofe e a ansia, ndo por uma vinganga brutal, e sim por um renascimento ideal”.” Inicialmente, de acordo com Frank Whitford, eram trés os objetivos basicos da Bauhaus, definidos em seu manifesto de fundagdo e no Programa da Bauhaus, em Weimar, escritos por Walter Gropius em 1919: 1. Promover o trabalho conjunto de artesdos, pintores e es- cultores em projetos cooperativos, reunindo suas espe- cialidades, libertando todas as artes do isolamento — de- mocratizar a arte! Giulio Carlo Argan, Arte moderna: do iluminismo aos movimentos contemporaneos, cit, p. 269 Bauhaus 33 2. Derrubar as barreiras entre “arte vulgar” e “arte elevada”. 3. Estabelecer a parceria entre arte e industria.® A crenga na importancia da criagdo de uma arte total e sintética levou Gropius a convidar novos mestres da forma, em sua maioria pintores expressionistas, para integrar 0 cor- po docente da Bauhaus entre 1920 e 1922. O pensamento ar- tistico de vanguarda vinha ao encontro dos ideais de Gropius: a liberdade para criar um novo conceito de educacao artisti- ca a servico de uma sociedade mais evoluida.? Por causa de algumas criticas recebidas a partir de 1922, relacionadas a radicalismos nas metodologias de ensino da escola (especialmente dirigidas a Johannes Itten pela exces- siva aderéncia do mestre aos principios Mazdaznan — culto teligioso que seguia principios orientais de comportamen- to), Gropius adverte o corpo docente contra o “romantismo selvagem” e contra 0 culto de um isolamento excessivo, in- centivando o compromisso com o mundo la fora. Convencido Segundo Whitford, o terceito objetivo da Bauhaus, ou seja, estabelecer “um contato constante entre os artifices e as induistrias do pais", era uma questao de sobrevivén- cia econémica. A Bauhaus esperava se livrar gradualmente da dependéncia do sub- sidio estatal, vendendo seus produtos e design ao piiblico e industria. Ao mesmo tempo, 0 contato com 0 mundo externo evitaria que a escola se tornasse uma torre de marfim ¢ integraria seus estudantes na vida pratica. Cf. Frank Whitford, Bauhaus, cit. p. 2 A politica de contratacdo de mestres adotada por Gropius corresponde precisamen- te & nogéo de uma ‘fecundacao do artesanato por artistas inovadores’, na medida em que, ao lado dos mestres artesdos, Gropius convidava para a Bauhaus, na condigo de mestres da forma, aqueles artistas de cuja criatividade ele pudesse esperar ino- vagées, sobretudo nas esferas artesanal e industrial.” Cf. Rainer Wick, Pedagogia da Bauhaus, cit., p. 78. 34 de que era necessario prover alguma independéncia econé- mica para a Bauhaus, o diretor passou a defender com vee- méncia a associa¢ao do trabalho criativo ndo apenas ao arte- sanato, mas também ao design industrial. Mais tarde, mediante as novas adesdes a Bauhaus, parti- cularmente com as contribuicdes de Paul Klee e Wassily Kandinsky, 0 esforco para superar os padrdes arcaicos dos estilos académicos encontra saida na busca de uma lingua- gem universal e sintética. Com o desenvolvimento de verda- deiras teorias da criacdo, surge uma espécie de gramatica das formas e das cores, associando a esses elementos basi- cos da composi¢ao simbolos universais de comunicagao das imagens. Assim, durante o periodo de Gropius, a crenga no poten- cial da arte para transformar a humanidade, a fé na interli- gacao das artes e o enfoque na abstracdo geomeétrica como expressao de pureza e espiritualidade persistiram na Bauhaus. A busca da transcendéncia pela arte continuou a prevalecer. Verificou-se mais tarde que essas teorias da criagdo coin- cidiam com muitos dos principios da psicologia da Gestalt. Essa fase, na qual metodologias para o ensino das proprie- dades comunicativas das formas e das cores foram conside- radas altamente importantes para o design, corresponde a fase formal da Bauhaus, de acordo com a classificagdéo de Wulf Herzogenrath. A originalidade surgida no interior da Bauhaus, aplicada ao design de mobilidrio, de utensilios domésticos e de Bauhaus 35 projetos arquitetdnicos, nao pode ser desvinculada das teo- rias da criagao e dos exercicios praticos propostos pelos mestres da cor e da forma.” A base de formacao desses profissionais, que podemos considerar como os primeiros designers da historia, cons- truiu-se a partir das teorias da composi¢ao, da nogao dos elementos formais abstratos e da cor como ferramenta de criagdo. Uma boa referéncia do espelhamento das aulas sobre cor e forma na produgao do design de mobilidrio é 0 berco de Peter Keler, projetado em 1922 para 0 filho de Johannes Itten Keler, entao aluno da Bauhaus, se utiliza das correspondén- cias entre cores e formas geométricas basicas para a compo- sigdo do berco. E importante salientar, entretanto, que a didatica da cor na Bauhaus ndo se limita a essa correspondéncia entre cores e formas bisicas. As aulas de Itten, como veremos, levam a uma conscientizagao das potencialidades da cor como fer- ramenta de criagdo, nos seus aspectos subjetivos e objetivos. Da mesma forma, as teorias dos outros mestres da cor reve- "© Ao descrever a criacdo da cadeira de Marcel Breuer, Argan mostra que suas fontes de inspiragéo tebrica estavam associadas ao curso de Paul Klee: “Breuer deve em parte a famosa invencdo da cadeira de tubos de aco cromado aos ensinamentos de Klee: construgio rarefeita, filiforme, de linhas em tensao, que percorre 0 espago em vez de ocupa-lo, anima o ambiente com a agilidade de um ritmo grafico, substitui a consisténcia maci¢a do objeto pela quase imaterialidade do signo”. Cf. Giulio Carlo Argan, Arte moderna: do iluminismo aos movimentos contemporneos, cit., p. 320. "O mével metalico de Breuer era, pois, a primeira sintese operacional e funcional das artes, a primeira grande vitéria do ‘desenho industrial”. Ibid., p. 279. 36 Acor no pro} Figura 2. Berco criado por Peter Keler, aluno da Bauhaus. Ilustragdo baseada em Frank Whitford, Bauhaus (Londres: Thames & Hudson, 1995), p. 104. a> > po een Figura 3. Correspondéncia entre formas e cores basicas exploradas por Kandinsky ¢ Itten nas aulas da Bauhaus. lam uma abordagem criativa e instigante do fendmeno, sem se limitar, como muitas vezes se acredita, a paralelos entre cores e formas geométricas. Suas teorias contribuiram para o desenvolvimento do processo criativo dos alunos da Bauhaus, refletindo-se em seus trabalhos mesmo quando essas cor- respondéncias nao faziam parte dos projetos. Bauhaus 37 Mesmo apos o desligamento de Cropius da direcdo da escola, uma vez que essas sementes ja haviam sido langadas, os efeitos dessas teorias e metodologias didaticas no desen- volvimento de uma linguagem universal criativa, funcional e contempordnea aparecem no design de seus produtos. A ultima fase da Bauhaus caracteriza-se pelo retrocesso em seus métodos de ensino, com énfase unilateral no setor produtivo e funcional e segregacao das teorias artisticas. Nessa fase, Itten ja se desligara da escola, e mestres como Klee e Kandinsky tiveram suas teorias das cores limitadas as classes livres de pintura." Os quatro mestres selecionados neste livro para compor 0 quadro das teorias e metodologias didaticas mais represen- tativas do ensino da cor na Bauhaus sao: Johannes Itten (1888- 1967), Paul Klee (1879-1940), Wassily Kandinsky (1866-1944) e Josef Albers (1888-1976). Podemos observar uma distingdo basica entre as suas con- tribuigdes. Enquanto Kandinsky e Klee desenvolveram ver- dadeiras teorias sobre a composi¢ao plastica e seus elemen- Segundo Rainer Wick, dez anos depois da criagdo do Vorkurse por Johannes Itten, "o curso preliminar persegue uma educacdo voltada para a conformidade, no sentido do conceito de criagéo predominante na Bauhaus, e com isto cai em um novo academicismo. [...] A esta oferta de cursos obrigatérios somam-se nos tltimos se- mestres as chamadas classes livres de pintura, oferecidas voluntariamente por Kandinsky ¢ Klee, sendo [...] um sensivel retrocesso frente ao conceito original de sintese formulado por Gropius”. Cf. Rainer Wick, Pedagogia da Bauhaus, cit., pp. org. 38 A cor no processo criativo m estudo sobre a Bauh tos (entre os quais, a cor), Itten e Albers ocuparam-se com o desenvolvimento de metodologias de ensino, mais preocu- pados com os processos de assimilacao e resposta dos alu- nos, com a efetiva vivéncia dos fendmenos abordados e com as questdes que envolvem a percepcao visual. E importante lembrar que o trabalho desses quatro mes- tres nao se restringe ao periodo em que estiveram na Bauhaus. Johannes Itten ja havia montado sua escola de artes, onde experimentava técnicas didaticas avangadas, quando Gropius o convidou para juntar-se 4 escola recém-formada, em 1919. Além disso, Itten continuou suas investigacées didaticas sobre o ensino artistico e sobre as cores aps 0 seu desligamento da Bauhaus. Prova disso ¢ que so veio a publi- car o seu livro Kunst der Farbe ("A arte da cor”) muito mais tarde, em 1961, depois de sua vivéncia em outras escolas de arte. A adesao de Kandinsky e Klee a Bauhaus também ocorreu num momento em que suas produgées pictoricas e convic- Ges plasticas ja se destacavam no meio artistico. Kandinsky ja havia inclusive publicado sua primeira obra tedrica — Uber das Geistige in Kunst ("Sobre o espiritual na arte”), em 1912, em que langa os alicerces da sua teoria sobre as cores. No caso de Albers, sua metodologia didatica para o ensi- no da cor sé viria a amadurecer depois da sua passagem pela Bauhaus. Com o fechamento da escola pelo partido nazista, em 1933, Albers emigra para os Estados Unidos. E 14, em ou- tras instituigdes de ensino, que ele consolida suas ideias. Bauhaus 39) Mas ndo podemos, da mesma forma, desconsiderar a im- portancia da passagem desses mestres pela Bauhaus. 0 pa- pel da escola como polo aglutinador de todos esses artistas deve-se sem divida a énfase de Gropius na contribuigdo da arte para a formagdo desses novos profissionais — os dese- nhistas industriais/designers. A receptividade do diretor para as novas propostas e métodos educativos, assim como para as manifestagdes das vanguardas artisticas, foi essencial. O contato com esse ambiente aberto, além do acesso as varias fontes de informagao que para ali confluiam democratica- mente, como a ciéncia, a arte e a emergente psicologia, cer- tamente teve grande influéncia nos resultados alcangados por todos esses mestres. Assim, seja na passagem por essa escola, seja na consoli- da¢ao de algumas teorias dentro do seu contexto, novas metodologias didaticas e teorias para o ensino das artes eda cor tiveram suas origens ali. A Bauhaus desempenhou papel importante, na medida em que criou condigées para que es- sas novas ideias se firmassem ou fossem concebidas para seu desenvolvimento posterior. Apresentamos a seguir um resumo introdutério das con- tribuigdes trazidas por esses quatro mestres da cor da Bauhaus, procurando identificar suas caracteristicas tedricas ou metodologicas mais relevantes. A descricdo e a analise detalhadas do trabalho desenvolvido por esses mestres, acompanhadas de uma biografia resumida, encontram-se nos capitulos 2, 3, 4e 5. 40 O Vorkurse e as cores subjetivas de Johannes Itten Itten foi um dos primeiros professores da Bauhaus. Fle encontrou na escola em formagdo um caminho livre para a implementagao de suas teorias didaticas e ideias inovado- ras: “Eu estava particularmente atraido pelos estudios e workshops, e pelo fato de a Bauhaus ainda estar vazia, de forma que algo novo poderia ser construido sem a necessi- dade de destruigdo do velho”.” Segundo Itten, o perfil das primeiras turmas de alunos da Bauhaus era bastante heterogéneo. Os estudantes, vindos de escolas comuns de artes e oficios, assim como de academias, apresentavam background historico educacional muito di- versificado, além de vicios, padrdes e técnicas que oculta- vam a sua expressividade. Ao deparar com tal publico, Itten sente grande dificulda- de em avaliar o talento dos alunos mediante um teste de ad- missao, e propde a Gropius que todo aluno que mostrasse interesse em arte deveria ser admitido provisoriamente por um semestre. Esse periodo de experiéncia foi nomeado curso preliminar (Vorkurse), 0 equivalente ao curso basico na Bauhaus. Com a aprovacao de Gropius, Itten consegue total liber- dade para estruturar 0 curso preliminar, que, como veremos, tinha entre seus objetivos identificar as aptidées do aluno, orientando-o em sua vocagao. A proposta educacional da "= Johannes Itten, Design and Form: the Basic Course at the Bauhaus (Nova York: Reinhold Publishing Corporation, 1964), p. 7. Bauhaus 41 Bauhaus previa que, apds a realizacdo bem-sucedida do Vorkurse, os alunos optassem por uma especializacdo — um oficio. Os cursos da Bauhaus prosseguiam como encaminhamento do aluno para oficinas e workshops, altemnando aulas tedri- cas e praticas. Como podemos observar no diagrama a se- guir, nos trés anos de especializagao que os alunos cursavam apds concluirem o curso preliminar, continuavam a figurar estudos sobre composi¢ao, cor e forma, somados a pratica com materiais, ferramentas e técnicas construtivas. 0 objetivo era proporcionar aos estudantes uma formagao completa, ca- pacitando-os para projetos que uniam arte e técnica. Dessa forma, eles eram treinados para a futura cooperacdo com a industria. é Pra) 8 29, oe? Minifielo das tortie “Minar dos mate” cular da Bauhaus. Ilustracdo baseada em R Pedagogia da Bauhaus, trad. Jodo Azenha Jr., Colepdo “a” (Sao Paulo: Ma 850 criativo 0 Vorkurse de Itten, concebido para receber os alunos que ingressavam na escola, apresentava algumas metas que se resumiam em libertar as forcas criativas individuais para um trabalho genuino e auténomo, incentivar a orientagdo vocacional por meio de exercicios e integrar os principios objetivos e subjetivos dos elementos do design (veja capi- tulo 2). Esse objetivo de libertar a criatividade e a subjetividade dos alunos traduzia-se nos exercicios que Itten propunha em suas aulas. Entre suas propostas, ha exercicios fisicos (coreo- grafias) cuja pretensdo era unir corpo e mente, desenhos rit- micos e desenhos livres de observacao onde o traco de cada estudante, preciso, firme ou suave, era respeitado como um indicador de sua personalidade. Sua metodologia didatica refletiu-se também no ensino das cores. Na sua busca de indicios individuais expressivos, Itten antecipa-se a psicologia, ao utilizar as preferéncias de cor dos seus alunos para diagnosticar sua personalidade e habilidades. A descoberta das cores subjetivas representava para ele um passo na direcao do autoconhecimento. Itten identifica ainda tensdes subjetivas e objetivas no mundo das cores. 0 equilibrio entre essas forcas levaria ao trabalho funcional e expressivo. No capitulo sobre a metodologia didatica de Itten, essas duas vertentes de interpretacdo da cor serio aprofundadas e veremos como orientaram os trabalhos dos alunos. Bauhaus Outro ponto importante da sua metodologia é a percep- ¢do visual através dos contrastes cromaticos, que permeou toda a didatica de Itten na Bauhaus, influenciando os outros mestres da cor. Os sete tipos de contraste cromatico adotados por Itten na Bauhaus remetem a sua formacao com Adolf Hélzel, na academia de Stuttgart. Logo o curso preliminar de Johannes Itten, em razao das metas que estabelecia e do desenvolvimento da sua meto- dologia didatica, transformou-se num elemento estavel da doutrina da Bauhaus. Seus métodos de ensino da cor e da forma difundiram-se, tornando-se familiares em muitas es- colas de artes no mundo. Talvez por isso seja dificil perceber hoje qudo original e imaginativo ele foi para o seu tempo. Segundo Wick, o curso preliminar assumiu um carater de ritual de iniciag¢ao dentro da Bauhaus. Além de purificar o aluno das concep¢des académicas de arte, propunha a livre expressdo da personalidade, levando ao autoconhecimento, a0 mesmo tempo que apresentava aos estudantes uma “lin- guagem formal que transcendesse ao individualismo”, com- preendida por todos os membros da escola." A critica negativa tem visto 0 Vorkurse como um tipo de lavagem cerebral, em que se apagava tudo que os estudan- tes tinham aprendido previamente para tornd-los receptivos as novas ideias e métodos. Os adeptos de Itten, por outro lado, defendem o curso preliminar como um meio de liber- tacdo do potencial latente criativo em cada aluno. 3 Rainer Wick, Pedagogia da Bauhaus, cit., p. 49. hh A cor no processo criativo Aatuacéo de Itten na Bauhaus é sempre relacionada 4 fase expressionista de fundagao da escola. Apos ter sido obriga- do a sair por forca da critica externa e interna as suas convic- cdes misticas, seu curso deu lugar a atitudes didaticas mais racionalistas, “cientificas” e construtivistas. John Gage defende uma postura mais objetiva de Itten, lembrando que o pintor também se preocupou em “desco- brir — em resposta aos ensinamentos de Hélzel — 0 vocabula- tio basico formal da arte e, em particular, a gramatica das cores”. As primeiras associacées entre cores e formas basi- cas na Bauhaus foram sugeridas por Itten, embora saibamos que ele possa ter sofrido a influéncia do livro de Kandinsky, publicado dez anos antes. As principais fontes de Itten para o desenvolvimento de uma metodologia didatica para o ensino das cores na Bauhaus foram Adolf Hélzel, seu professor na Academia de Stuttgard, eo modelo cromatico de Philip Otto Runge. Klee: a cor como processo dinamico de transforma¢ao Gracas ao esforco de Gropius em convencer os pintores da sua funcao educativa, tivemos acesso a incriveis teorias da criagao, como foi o caso do trabalho desenvolvido na Bauhaus por Paul Klee e Wassily Kandinsky.'® * John Gage, Color and Culture: Practice and Meaning from Antiquity to Abstraction (Berkeley/Los Angeles: University. of California Press, 1993), p. 260. 's "L...] para Klee, assim como para Kandinsky, a arte é operacdo estética, e a operagao estética 6 comunicagdo intersubjetiva, com uma clara fun¢do formativa e educativa. Bauhaus 5 A funcdo formativa e educativa da arte foi levada a cabo por Klee. Ele se dedica com empenho 8 atividade de mestre na Bauhaus por onze anos (1920-1931). Aos 42 anos, ao ingressar na Bauhaus como mestre convi- dado, Klee viu-se obrigado a traduzir sua intuicdo estética num sistema tedrico que pudesse ser transmitido aos alunos. Isso representou para ele a conscientizagdo dos seus métodos de trabalho e dos objetivos da sua pintura: a busca das leis primordiais na natureza, a importancia das forgas formadoras/ geratrizes em vez das formas acabadas, o movimento cosmico transcendente que esta por tras de todas as coisas, a luta contra 0 aspecto finito das aparéncias. Para Argan, é na Bauhaus que Klee “transforma sua poética em teoria, a teoria em método didatico”."* Todo o seu trabalho como mestre da Bauhaus caracteri- zou-se como um dos menos dogmaticos. Seu objetivo como educador era, antes de tudo, mostrar aos seus alunos 0 ca- minho dessas forcas geratrizes das formas para que cada um pudesse criar livremente, sem nenhum modelo de cor ou de forma preestabelecido. Uma caracteristica inovadora da didatica da Bauhaus, entre outras, era o estimulo da imaginacdo. Embora seu objetivo central fosse a formagdo de desenhistas industriais Toda a sua obra se diria inspirada, mesmo em seus aspectos Itidicos evidentes, no conceito de educarao estética como educagao para a liberdade, do grande roman- tico que foi Schiller.” Cf. Giulio Carlo Argan, Arte modeima: do iluminismo aos movi- mentos contemporaneos, cit., p. 321 Ibid., p. 320. 46 A cor no processo criativo e arquitetos, exercicios e eventos em areas diversificadas, como cenografia, diregao, coreografia, ago cénica e dan- ¢a, também eram incentivados. Nesse sentido, essas teorias da criagio desenvolvidas pelos mestres pintores também ofereciam aos alunos um visdo nunca antes explorada: o processo de formacao. Ao incentivar 0 aluno a percorrer o proprio caminho na busca de formas e cores que atribuissem um valor auténtico & imagem, Klee se propés criar 0 que Argan denomina de comunicacao visual intersubjetiva: A arte é justamente o modo de pensamento pelo qual a experiéncia do mundo realizada através dos sentidos assume um significado cognitivo, pelo qual o dado da percepcdo se apresenta instantanea- mente como forma. E nessa passagem extremamente delicada que a contribuicdo de Klee a didatica da Bauhaus foi fundamental, preser~ vando-a do perigo de conformar-se ao racionalismo mecanico da tecnologia industrial; inteiramente dedicado a perscrutar as profundezas do ser para captar as raizes primeiras e mais secretas da consciéncia, Klee nunca sucumbe a vertigem, nunca perde 0 fio de Ariadne do pensamento. Nao traduz a imagem em conceito, o que equivaleria a destrui-la; limita~se a tornd-la visivel, pois apercepcao ja é consciéncia.” Em 1924, Klee, entao com quatro anos de docéncia, come- ava a reunir suas anotagdes de aula, documentando assim suas ideias sobre os elementos basicos da criagdo. Em 1964, " Mbid., p. 272. Bauhaus 7 J. Spiller editou esse material com o titulo de Pedagogical Sketchbook: the Thinking Eye. E justamente no ultimo capi- tulo desse trabalho que encontramos a abordagem teérica de Klee sobre as cores. Tanto a forma quanto a cor, nos seus processos de conti- nua transforma¢do, interessam a Klee. Nas teorias da criacdo da Bauhaus, especialmente na de Klee, 0 processo de con- cep¢ao das formas (a formacao) é 0 ponto central do méto- do projetual.'® Do mesmo modo, a preocupacao maior de Klee era com os processos das misturas dos tons, e nao com as propriedades de cada cor isoladamente. A teoria das cores de Klee é permeada pela poética que caracteriza sua visdo de mundo. 0 movimento césmico uni- versal, explicagéo para muitas das suas consideracées sobre as formas, volta a aparecer na sua concep¢ao do circulo cro- matico, interpretado por ele como a mais pura representa- ¢do de movimento: um canone musical. Por sua luta contra a feicao finita das aparéncias, Klee vé as cores ndo como elementos estaticos, mas em sua constan- te transformagao. Os pares de cores complementares (em contraste) sio apresentados como polos, entre os quais o pintor descreve um movimento pendular, cujo equilibrio acontece no ponto central do circulo — 0 cinza. * “OQ método projetual da Bauhaus, porém, ndo ¢ um método para encontrar a forma correta, a gute Form: estimulante para os processos psiquicos da consciéncia é a forma que nao se apresenta como dada, mas ¢ captada em sua formarao, isto &, no dinamismo que a produz. Tao importante quanto o problema da forma (Gestalt) é 0 da formacio (Gestaltung)." Ibidem. eB ASTRE presse criatve Klee, assim como Kandinsky, associa a cor 4 musica na sua abordagem tedrica e poética do circulo cromatico. Seu mo- delo visual para representar essa visio cosmica das cores é 0 canone da totalidade cromatica, no qual ele apresenta as trés primarias como vozes de um coro que se intercalam alterna e infinitamente no perimetro do circulo. Kandinsky: gramatica dos elementos basicos da criagdo Antes de ingressar na Bauhaus, ao escrever o seu primeiro livro, Kandinsky ja havia concebido uma teoria das cores. Decisiva para o desenvolvimento da sua pintura abstrata, essa teoria aparece muito cedo na carreira do pintor e propée, como em Klee, uma visdo de mundo subjetiva, ao pretender tornar visivel uma realidade interior baseada em sua expe- riéncia pessoal com a cor. Suas associacdes simbdlicas relacionadas ao tema das co- res sofreram varias influéncias. Veremos adiante como é for- te a semelhanca das suas teorizagdes com a doutrina das co- res de Goethe. Abordagens espiritualistas das comunidades teosdficas de Munique, como a antroposofia de Rudolf Steiner, também receberam a atencao de Kandinsky, principalmente por explicarem suas experiéncias sinestésicas, envolvendo cores e sons. Todas essas posturas antipositivistas — como a cromo- terapia, que estudava as propriedades terapéuticas das co- res — interessaram ao artista e alimentaram suas associa- Bauhaus LQ

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