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LIVRO II » perante a sia de o escutarem, comegou a discorrer do seguinte modo CIPIAO: ‘Vou referir um dito do velho Cato", a quem, como sabeis, apreciei particularmente € por quem tive a maxima admiracdo. A ele, tanto por decisdo de meus dois pais" como por desejo pessoal, me dediqh talmente desde a adolescéncia'. Das suas palavras ito eu nunca me saciava. Havia naquele homem uma enorme experiéncia da Coisa Publica, que em paz € na guerra dirigira com tanta perfeigéo quanta dura- ao", moderagao no discurso, um misto de beleza € gravidade, uma extrema preocupagio em aprender em ensinar, € um modo de vida inteiramente con- gruente com 0 seu discurso. Costumava ele dizer que a forma da nossa constituigéo, era superior as restantes constituigdes, pela seguinte nestas, fora praticamente sé um deles quem organizara 0 Estado com leis e institu dos Cretenses, Minos; 0 dos Lacedeménios, Licurgo; © dos Atenienses, que com frequéncia sofrera trans- formagées, sucessivamente ‘Teseu, Dricon, Sélon, 24 Como todos aprovaram, continuou (se. C Clistenes € muitos outros, até, finalmente, 0 douto vardo Demétrio de Faleros o salvar, ja exangue ¢ pros- trado™, Porém, 0 nosso Estado fora onganizado nio pelo génio de um 36, mas de muitos, e ndo em vida de um homem, mas em alguns séculos e geragées. Com efeito, dizia Catdo que jamais tinha existido um génio tao grande ou alguém a quem nada escapasse; ¢ que Them todos os génios reunidos num s6 a tanto pode- riam prover, num momento determinado, que tudo pudessem abarcar sem a experiéncia das coisas e sem lum certo amadurecimento. Por esse motivo, tal como ele costumava fazer, também agora 0 meu discurso recordaré a origem do povo Romano ~ ¢ de bom grado estou mesmo a usar um termo de Catéo"™. Mais facilmente, porém, eu satisfa- rei o nosso propésito se vos mostrar o nosso Estado a nascer, a crescer, adulto ¢ jé firme e robusto, do que se criar um para mim, como Sécrates em Platéo!™. 0} ue inicio de instituigdo de um Estado temos tao ilustre e de todos tao conhecido como 0 comeso, lan- sado por Rémulo, da fundaco desta urbe? Nascido de Marte ~ fagamos esta concessio a voz corrente do Povo, nao s6 porque esta particularmente arreigada, mas também porque foi sabiamente wansmitida pe- los antepassados a crenga de que os benfeitores da comunidade também so de raga divina e ndo apenas de génio divino™ -, Romulo, logo que nasceu, foi, segundo se diz, mandado expor junto do Tibre, com seu irmao Remo, por Amilio, rei Albano, no receio da desagregaco do reino', Ai, sustentado pelos ‘iberes de um animal selvagem, uns pastores 0 reco- theram e o criaram nos costumes e trabalhos do cam- po", Conta-se que cresceu € que era to superior aos restantes em forga fisica e ferocidade de animo que todos os que entio cultivavam os campos onde hoje fica esta urbe, de bom grado e de livre vontade the bula aos factos, tendo-se apresentado como chefe as suas tropas, relata-se que subjugou Alba Longa, uma cidade forte € poderosa nessa época, e que matou 0 rei Amilio. Alcangada tal gloria, diz-se que, depois de consultar os auspicios, decidiu fundar e tornar firme um Estado™. Ora, para a urbe, escotheu um lugar com inerivel fel cidade ~ coisa que deve ser com a méxima diligéncia providenciada por quem procura implantar um Estado duradouro. E nao a aproximou do mar ~ e era-Ihe fa- limo, com a forca militar e os recursos que possuia, fundar uma cidade avangando sobre o territério dos Ratulos ou dos Aborigenes, ou para a for do Tibre, lugar onde, muitos anos depois, 0 rei Anco estabele- ceu uma col6nia (sc, Ostia). Pois este vardo, dotado de excelente visdo do futuro", intuiu e percebeu que os locais junto do mar nao sio muito adequados para os que fundam cidades com esperanca de perduragio € de um império, antes de mais porque as cidades ma- imas esto expostas a perigos nao s6 variados mas até invisiveis. E que a terra firme denuncia antecipadamente, com muitos indicios e como que por um fragor € por um ruido préprios, a aproximagao de inimigos, tanto 8 esperados como os inesperados. E nenhum ini- migo consegue avancar rapidamente por terra sem conseguirmos saber nao s6 que se aproxima, mas m € e donde vem. Porém, um inimigo nbarcado consegue aproximar-se an- ém poder suspeitar que se aproxima. De 6, donde vem ou 0 que quer, enfim, por nenhum sinal se pode discernir e concluir se é pacifico ou hostil. Por outro lado, as urbes maritimas tém também uma certa tendéncia pi costumes: elas s40 corrup¢io e a mudanga de adidas por novas linguas e dou- 4 importagéo nao apenas de mercadorias do estrangeiro, mas também de costumes, de modo que, 5 ,, nada consegue permanecer Além disso, os habitantes dessas urbes nao se fixam na sua residéncia, pois sio constantemen- te atraidos por esperancas € projectos voliveis para bastante longe de casa, € mesmo quando permane- ccem fisicamente, em seu Animo, porém, ausentam-se € vagueiam. E, na verdade, nenhum outro. m acabou por derrubar Cartago, ha muito enfraqueci- a, e Corinto, mais do que este erro € dissolugao dos cidadaos que, pela ambigio de mercandejar € nave- gar, haviam abandonado 0 cultivo dos campos ¢ das armas", De igual modo, do mar afluem a essas cidades nume- ros0s e perniciosos incitamentos ao luxo, que ou sio produtos de saque ou importacdes. Por outro lado, © seu proprio encanto encerra muitos convites para paixdes dispendiosas e ociosas! Eo que disse de Corinto, no sei se 0 nao poderia dizer com toda a © Peloponeso no ha outros povos cujo ten © mar, ¢, fora do Peloponeso, s6 os Enanes, os Dérios jo nao confine com gregas? Cercadas pelas vagas, elas préprias como que Alutuam juntamente com as instituigées e costumes das suas cidades. Ogque acima referi diz respeito a Grécia antiga. Quanto as colénias instaladas pelos Gregos na Asia, na Tricia, na Itlia, na Sicilia, na Africa, exceptuando © caso tinico da Magnésia, qual delas nao € banhada pelas ondas? Assim, como que orlando o territ6rio dos Barbaros, a costa como que parece pertencer & Grécia. Na verdade, de entre os Barbaros, outrora nenhuns ram maritimos, excepto 0s Etruscos € 0s Péinicos, uns pelo comércio, os outros pelo latrocinio™. E esta é a timas que hd pouco abordei de forma muito répida Contudo, a par desses inconvenientes est a grande jodidade de, por mar, se poder trazer para a urbe que se habita o que por toda a parte se produz e, por outro lado, de se poder levar e exportar para as tertas que se quiser, aquilo que os seus campos produzem. Como podia Romulo tirar as vantagens do mar e evitar (8 seus inconvenientes de forma mais divina do que si- tuando a sua cidade na margem de um rio de aguas pe- renes € iguais e que corria com largueza para o mar?” ‘icene Por ai poderia a urbe ou receber do mar o que necessi tava ou exportar 0 que tinha em abundancia e, através do mesmo rio, abastecer-se das coisas mais a subsisténcia & cultura, recebendo nao s6 as impor- tadas do mar, mas também as transportadas por terra. Assim, Parecee qe de Pes maior d impérrios; de fan, nao poderia a urbe deter com mais facilidade tl poderio sobre as coisas se situa- dda nalguma outra parte da Ielia, ‘Quanto is defesas naturais da propria urbe, quem serd tio distrafdo que nao as tenha com seus olhos notado ¢ inteiramente apreciado? A extenséo € o tracado das suas muralhas sio tais que, quando pela sabedoria de Romulo € dos restantes reis foram delimitados com Aificeise escarpadas colinas por todos 0s lados, a tini- ca entrada, que ficava colocada entre o Esquilino e a colina do Quitinal, era cingida por um enorme e ame- acador baluarte e por um fosso muito profundo. Assim fortificada, a cidadela reluzia com o seu perimetro es- mo que cavado na rocha, a ponto de até calamidade da invasio dos Gauleses per- ‘manecer inclume e intacta”®, E R6mulo escolheu um ugar abundante em fontes salubre, embora numa regio pestilenta, De facto, ha colinas que, ao mesmo tempo que sao arejadas, também lancam a sua sombra sobre os vales"™. E concretizou isto com extrema rapide. De facto, fun- dou uma urbe, a que, do seu nome, imps o nome de Roma, e, para tornar firme a nova cidade, tomou uma deliberacio nova e um tanto nistica, mas de um grande | hhomem e de quem jé entio antecipadamente tomava providéncias para aumentar os recursos do seu reino € do seu povo: mandou raptar as Virgens Sabinas nas- cidas de boas familias, que tinham vindo a Roma por ituido para se celebrarem no circo, pela primeira vez, nas Consualias, casio dos jogos anuais que ele havia inst ‘Tendo os Sabinos declarado guerra aos Romanos por esse motivo e sendo a sorte do cor certa € du- vidosa, perante as stiplicas das préprias matronas que haviam sido raptadas, Rémulo firmou uma alianga com Tito Ticio, rei dos Sabinos; com essa alianga re- cebeu os Sabinos na cidade, associando os ritos, e par- tilhou o seu reino com o rei deles"™, Mas depois do desaparecimento de Técio recaiu sobre le (c. Rémulo) todo o dominio. E embora, juntamen- te com Tacio, tivesse escolhido cidados de primeira para un conselho régio —os quais, pela sua afi ram chamados pate ‘pais, senadores'~ ¢ tivesse a que deu o seu nome, o de Tacio e o de Lucumdo", que morrera na luta contra 0s Sabinos como aliado de Romulo, ¢ em trinta cirias ~ clirias que designou pelo nome das virgens Sabinas que posteriormente haviam sido as suplicantes da paz € da alianga'” -, embora estas decisdes tivessem sido tomadas em vida de Técio, contudo, depois da morte mais apoio do nnadores. ido 0 povo em trés tri deste, R6mulo reinou ainda com mui conselho e da autoridade dos pares Com tal decisio, antes de tudo Rémulo viu deci- diu o mesmo que Licurgo pouco ae ‘che Espar regidas sob o comando de um s6 e sob um poder régio se, & forga dessa dominagio, fosse associada a autori- dade de algo éptimo (sc. aristocratico). Assim apoiado que as cidades seriam melhor governadas € € munido com esse conselho ¢ quase senado, nao s6 {fez muitas guerras com os vizinhos, com todo o suces- E isto deve ser to mais admirado em Rémulo quan- to os restantes, que, segundo se diz, de homens foram transformados em deuses, viveram em séculos da huma- nidade menos instruidos, quando a razio era inclinada A ficgio, por os ignorantes serem facilmente levados & credulidade. Pelo contrario, verificamos que a época de a6 nenhuma parte do saque, jamais cessou de enriquecer 08 cidadaos. Ja entéo Rémulo observou afincadamente os auspi- ios, que ainda hoje respeitamos, para grande bem- -estar do Estado. Na verdade, no s6 ele proprio ~ facto que constituiu o comego do Estado ~, fund idade depois de consultar os auspicios, como ai da, para a abertura de todos os actos piil t icos, coop dugures, um por tribo, para o assistirem nos aus- picios™. E determinou dos cidadios de pri a plebe em clientelas ira” posse de loci “terras’, daf as designagées de pecuniasi‘ricos em pecuaria’ e locupletes “ricos em terras’ ~ que castigava, nao pela violéncia € estes dois egrégios € 0 senado, do de ser visto por 0% Sol, se acreditou que el a0 de um sibito eclipse do fora colocado no niimero dos deuses. Tal reputacio, jamais mortal algum a poderia alcangar sem a eximia gloria da sua vireude™, 7 | € cigncias bem arreigadas estava erradicado aquele antigo erro, proprio de uma vida de homens sem cul- tura. De facto, se, como foi investigado pelos anais dos Gregos, Roma foi fundada no segundo ano da sétima (Olimpiada™, entéo a época de Rmulo cai no mesmo século em que a Grécia jé estava repleta de poetas € de mitisicos ¢ dava menos crédito as fabulas, excepto sobre coisas antigas. Ora a primeira Olimpiada, que alguns, Por confusio de nomes, consideram fundada por esse mesmo Licurgo, foi fixada cento € oito anos depois que Licurgo determinou passar as leis a escrito™. Além disso, 5 que vo por uma diferenca minima, vatam Homero de quase trinta anos antes da época de Licurgo. Dai poder entender-se que Homero viveu muitfssimos anos antes de Romulo, dificilmente havendo ocasiio para esses mesmos homens, ja doutos, e esses tempos, ja instrufdos, criarem qualquer ficgdo. E verdade que a antiguidade acolheu fabulas, por vezes até * + secu ne>to, como alguns afirm-am, filho de uma fitha sua‘, mes>mo no em que nasgésima ta
    impia (se. em 556). Isto mais facilmente se poder que [jé] existia a crenga na imortalidade de Rélo, quando j4 a vida hu- mana estava arreigada € investigada e conhecida. Mas havia nele, realmente, tal forca de génio ¢ de a Préculo Juno, um homem do campo, num acon- tecimento em que, muitos séculos antes, ninguém acreditaria acerca de qualquer outro mortal. Por instigagdo dos patres ‘patricios, senadores’ — para de si afastarem a aversio pelo desaparecimento de Rémulo —, segundo se conta, este Préculo afirmou numa assembleia que Rémulo Ihe tinha aparecido na colina que agora se chama Quirinal e que Ihe tinha pedido que propusesse ao povo que lhe fizes- sem um templo nessa colina, pois era um deus ¢ chamava-se Quirino. Estais, pois, a ver como, por deliberagao de um tinico homem, ndo s6 nasceu um novo povo, mas até que ele ndo foi deixado no bergo ainda com seus vagidos, mas ja crescido e quase pubere? Respondeu LELIO: E claro que estamos, e também te vemos lancado num debate com nova argumentacdo, que em nenbum li- vro grego se encontral De facto, aquele principe (sc. da Academia, Platdo) que, com seus livros, a todos foi superior, escolheu para si um espaco para af construir uma cidade a seu gosto, uma cidade sem divida muito ilustre, mas da vida e dos costumes dos homens apar- tada. (Os restantes discorreram sobre os tipos ¢ sobre as te- orias das constituigdes sem qualquer exemplo defini- do e sem um modelo concreto de Estado'™. A mim, parece-me que estés fazer ambas as coisas. De fac- to, pela maneira como comecaste, preferes atribuir a outros 0 que tu proprio aduzes, a fazer como faz 0 localizagao da cidade, transformas em plano racional aquilo que por Romulo foi feito por forga do acaso ou da necessidade. E, no debate, nao usas um discurso errante, mas fixo num tinico Estado. Por isso, conti- nua como comecaste. Pareco entrever ja, na tua de- talhada exposigao sobre os restantes reis, um Estado quase perfeito. Prosseguiu CiPIAO Portanto, quando esse senado de Rémulo — que era ‘composto de optimates ‘aristocratas’ a quem 0 rei deu tais distingdes que decidiu que fossem chamados pa- tres ‘pais, senadores' e os filhos patricii ‘patricios’ —, tentou, depois do desaparecimento de Rémulo, ser ele proprio a reger o Estado, sem um rei, 0 povo nao tolerou tal coisa e, saudoso de Rémulo, nao cessou de reclamar um rei, Prudentemente, esses cidadios de primeira inventaram entio um plano novo € nunca ouvido entre as restantes nagdes — introduzir um in- terregno. Assim, até ser proclamado um rei em de- finitivo, nem a cidade ficava sem rei ou com um rei ‘inico por longo tempo, nem se incorria no perigo de alguém, com o poder enraizado, se tomar ou dema- siado relutante em depor o poder ou demasiado forte para o manter. aaa Nesse preciso momento, apesar de novo, esse povo viu aquilo que tinha escapado ao Lacedeménio Licurgo quando este determinou que um rei ndo devia ser elei- to — se é que tal decisdo podia depender de Licurgo —, mas aceite, fosse ele quem fosse, desde que tives- se nascido da estirpe de Hércules. Ora estes nossos se devia procurar virtude e sabedoria reais, ndo a li- nhagem. E como corria a fama de que Numa Pompilio nelas era ‘eminente, preteridos os seus concidadaos, por propos- ta dos patres ‘pais, senadores’, o proprio pov adoptou, para si, um rei vindo de fora e, a esse homem Sabino, chamou-o de Cures para Roma, para reinar. Logo que aqui chegou, € embora 0 povo o tivesse nomeado rei 1, ele proprio propés as ctirias ‘uma lei sobre o seu poder. E mal viu que os Romanos cram, por designio de Romulo, fervorosos adeptos das artes mi nos comicios das ct ‘ares, considerou que eles deviam ser ligeira- mente afastados desse costume. Assim, primeiro repartiu pelos cidadaos, por cabe- Ga, as terras que R6mulo conquistara na guerra e ensinou que, sem razias € sem saque, cultivando os campos, eles podiam ter em abundancia todas as comodidades, ¢ instilou neles 0 amor ao écio ¢ A paz!™, com os quais muito facilmente se fortalecem a justica e a confianga, com cujo patrocinio melhor se defende 0 cultivo dos campos e a colheita da sua producao. Da mesma maneira, depois de criar os aus- picios maiores", Pompilio nao s6 acrescentou dois 4ugures ao ntimero primitivo como pés a frente dos Depois de Cipiao cultos cinco pontifices escolhidos entre os cidadaos de primeira. Com 0 estabelecimento destas leis, que conservamos em monumentos", mitigou com ce- riménias religiosas os animos inflamados pelo cos- tume e pela ansia de guerrear. E acrescentou-lhes ainda os Flamines, os Sélios ¢ as Virgens Vestais, € Mas, quanto aos rituais em si, quis que a observancia fosse dificil, 0 aparato muito facil. De facto, estabele- ceu muitas coisas, umas para serem bem sabidas, ou- tras bem executadas, mas todas sem despesa. Assim, aumentou a complexidade das praticas religiosas, mas eliminou os gastos. E também criou 0s merca- dos, os festivais e todas as ocasides para reunido € celebragoes. Com tais instituigd para a humanidade e para a brandura os animos de homens ja tornados desumanos € ferozes devido as artes de guerrear. Assim, tendo reinado trinta € nove reencaminhou anos em maxima paz € concérdia — e sigamos de pre- feréncia o nosso excelente Polibio, cuja diligéncia na investigagao das datas ninguém ultrapassou —, Numa despediu-se da vida com duas coisas absolutamente eficazes para a perduragao de um Estado, a religiao € ademénci LI. Ser verdade, 6 Africano, o que foi transmitido até & nossa meméria — que este rei Numa foi discipulo do proprio Pitégoras ou pelo menos pitagérico? E 0 que frequentemente ouvimos da boca dos mais ve- Ihos e apercebemo-nos de que é assim que o vulgo 220 ppensal Mas o certo € que ndo vemos que isso esteja suficientemente demonstrado pela autoridade dos Anais Pablicos! Respondeu CiP\AO: E que é completamente falso, Manilio, e nao € s dal E, em suma, no se devern tolerar mentiras que claramente vemos que nio s6 séo inventadas, mas € a essas regides (x. do Sul) da Italia quando Liicio ‘Tarquinio 0 Soberbo jé ia no quarto ano de reinado! De facto, a sexagésima segunda Olimpfada assinala simultaneamente 0 infcio do reinado do Soberbo e a vinda de Pitigoras! Dai se pode concluir, contando os anos de realeza, te Pitagoras tocou pela primeira vez de cento ¢ quarenta anos depois da morte de Numa. E isto jamais foi posto em divida por aqueles que, com a maxima diligéncia, compuseram os anais des- ses tempos!" Exclamou MANILIO: Deuses imortais! Quio grande € quao arreigado esté esse erro entre os homens! Por outro lado, sinto-me ali- viado por nao termos sido educados com artes ultra- ‘marinas ou importadas, mas com virtudes genuinas € domésticas! Respondeu o AFRICANO: E entretanto com muito mais alivio isso reconhecerds | se olhares para 0 nosso Estado a progredir e a chegar, ‘como que por um caminho € um percurso naturais, a sua melhor condigio. Concluirds ainda que se deve lowar a sabedoria dos nossos antepassados exacta- mente pelo facto de, como irés compreender, muitas das coisas de outros recebidas, entre nés se tornarem. para aqui sido trazidas e onde primeiramente haviam surgido. E compreenderds que nio foi fortuitamente que 0 povo Romano se afirmou, mas pelo disc la disciplina, apesar de a forana lhe no ser adversa!®, Morto o rei Pomptlio, sob proposta do inter-rei, 0 povo elegeu Tulo Hostilio como rei nos comicios das cirias este, a exemplo de Pompilio, consultou 0 povo, por ciirias, acerca do seu poder. Foi excelsa a sua gloria na rea militar e dele sobressaem grandes feitos guer~ reiros. ‘Também construiu e cingiu com uma cerca 0 io € a Ciria™, gracas ao produto do saque, € fundou 0 direito pelo qual as guerras seriam declara- das, invengio por si mesma justissima, que ele sancio- nou com o rito fecial: assim, qualquer guerra que ni fosse anunciada e declarada, era consideradainjusta € impia®™, E para que em vosso esp biamente jé os nossos reis perceberam que algo devia, ser atribuido ao povo — e muitas coisas por nés hao- -de ser ditas a esse propésito —, Talo no ousou se- is reais sendo por ordem do povo. lo fazer-se preceder de doze lictores com seus fasces*™ « {Fate o ere lo do code Xl] 232 Ora, acerca de Tillio Hostilio, que foi o terceivo rei a contar de Romulo, também ele atingido por um raio, diz. 0 mesmo Cicero, nesses mesmos livros, que ele ndo foi igualmente consi- derado recebido entre os deuses, com tal morte, pelo facto de os Romanos provavelmente ndo quererem tornar trivial, ou seja sem valor, se também fosse facilmente atribuido a outrem agui- Jo que, no caso de Rémulo, estava de crenga (Santo Agostinha, A Cidade de Deus, 3.15). aa (LELIO?) + no comeco da tua exposicao, o nosso Estado rasteja, voa para a sua melhor condicio. (CIPIAO), Depois dele (sc. de Talo Hostilio), um neto de Numa Pompil a sua, Anco Marcio, foi feito rei pelo povo e também ele propos as ctirias uma lei sobre © seu poder: E apés ter derrotado os Latinos em guer- que conquistara e transformou em propriedade pi- blica todas as lorestas costeiras que conquistara ¢ fun- uma cidade na foz do Tibre, que fortaleceu com nos", Morreu depois de reinar vinte ¢ trés anos. Entio LELIO: fambém este rei merece ser louvado. Mas a histéria romana é obscura, pois se temos a mie deste rei, des- conhecemos o pai! Respondeu (CIPIAO): Assim é! Mas, desses tempos, quase s6 0s nomes dos wram tornados célebres. Mas nese momento pela primeira vez a nossa cidade parece ter-se tornado mais douta gracas a conhecimen- tos transplantados™. Efectivamente, correu da Grécia para esta urbe, nao um ténue riacho, mas 0 caudalo- io daquelas suas disciplinas e artes. Na realidade, conta-se que havia um certo Demarato de Corinto, de © primeiro da sua cidade em honra, autoridade seus grandes cabedais e transferi a cidade mais florescente da Etraria, E ao ouvir que a dominagio de Cipselo se consolidava, este homem livre e forte renegou a sua patria e foi adoptado como cidadao pelos Tarquinienses e desta cidade fez seu do- micilio € morada. Aqui, tendo dois filhos de uma ma- trona de ‘Tarquinios, instruiu-os em todas as artes, de acordo com a educacdo dos Gregos [ott iio sexta do caderno XV) (cIPiAo} «= facilmente recebido na cidade, gragas 4 sua humani- dade e ciéncia, tornou-se intimo do rei Anco, a ponto de ser considerado participante em todas as del rages e quase associado @ realeza. Além disso, havia nele uma grande afabilidade e também uma enorme facilidade de assisténcia, auxilio, protecgao e liberal dade para com todos os cidadaos. Em conseque' morto Marcio, com todos os sufrigios do povo, foi elei- to rei Liicio Tarquinio. E que ele de tal modo afastara 0 seu nome do nome grego que em tudo parecia imitar © costume deste nosso povo™. E, logo que propds ak sobre o seu poder, primeiramente duplicou o pri 0 —t4ae ‘TAATADG DA REPUALICA Cietne \imero de patres ‘pais, senadores’ e aos mais antigos chamou patres de ‘gentes maiores', aos quais pedia pa- recer em primeiro lugar; aos por ele adscritos, chamou- hes patres de ‘gentes menores’®”, De seguida, organizou a cavalaria nos moldes que até ‘Bes de Ticienses e Ramnenses Liiceres™, apesar de ‘0 desejar, porque Ato Navio, um dugure de suma gloria, Ihe ndo deu 0 apoio da sua autoridade. E também veri- ico que outrora os Corintios, para a atribuigio de cava- los piblicos ¢ sua alimentacéo, diligenciaram a tributa- ‘Gao de drfa0s e viivas. Contudo, ao acrescentar outros tantos cavaleiros aos anteriores, Tarquinio perfez 1.800 cavaleiros e assim duplicou o seu mimero™. Depois, por meio da guerra, submeteu a grande e feroz nagio dos ‘Equos, a qual ameagava os interesses do povo Romano. Do mesmo modo, tendo repelido os Sabinos das mura- Ihas da urbe, dispersou-os com a cavalaria e venceu-os nessa guerra. Também nos foi transmitido que foi ele 0 primeiro a fazer os Jogos Maximos, que so chamados Romanos*, e que, em guerra contra os Sabinos, a meio do proprio combate, prometeu construir um templo no Capitélio dedicado a Jupiter Optimo Maximo. Morreu depois de reinar trinta e oito anos". 10 LELIO: Torna-se agora mais claro aquele dito de Catio: que a constituigéo do Estado nio foi obra de um s6 10 ou de um s6 homem. E, de facto, evidente quo grande se torna o acréscimo de coisas boas € titeis, por cada rei, * Mas segue-se aquele que, de todos, segun- do me parece, mais visio teve no Estado. 14a Atalhou CIPIAO: Assim é, Depois dele (sc. de Tarquinio), Sérvio Talio foi o primeiro, segundo consta, a reinar sem manda- to do povo. Dele se diz que nasceu de uma escrava ‘Tarquiniense, fruto de uma relagdo com um cliente do rei. E como ele, criado com os outros domés despercebida a centelha de génio que jé em crianca nele brilhava, tao habil era em qualquer funcao ou conversa*”, Por isso, Tarquinio, que tinha filhos ain- da bastante pequenos, de tal modo apreciava Sérvio, que 0 vulgo 0 tinha por seu filho. E educou-o com todo 0 empenho em todas as artes que, segundo © requintado habito dos Gregos, ele préprio tinha aprendido. Ora, tendo Tarquinio sucumbido numa cilada dos fi- Ihos de Anco, Sérvio comegou a reinar, ndo por um mandato, como atris referi, mas © consentimento dos cidadaos*"s E que, falsamente se estava convalescente de um fe- ando dizendo que ‘Tarqui rimento mas que estava vivo, Sérvio, adminis © direito com aparato régio, liberando os insolv com o seu préprio dinheiro, usando de grande afa- bilidade para garantir que administrava a justica por ordem de Tarquinio, nao se confiou aos patres ‘pais, senadores’; pelo contrario, sepultado Tarquinio, ele proprio consultou 0 povo acerca da sua pessoa e, man- datado para reinar, propés as ciirias uma lei sobre 0 seu poder*, Para comegar, vingou com a guerra as injarias dos Etruscos. Dessa guerra, com gran #

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