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A Administração Pública nunca foi politicamente neutra (porque a AP executa a lei, e esta é
resultado da vontade da maioria). O poder político sempre procurou instrumentalizar a ação das
estruturas administrativas, colocando-as ao seu serviço e configurando a sua atividade como
tendo natureza executiva.
Administrar é executar as linhas políticas definidas pelo legislador: a lei é sempre
outorgada por quem tem o poder público, sendo a AP protagonista de um poder executivo
encarregue de conferir eficácia aplicativa a essas opções políticas tomadas pelo legislativo.
Administrar é executar a vontade política do parlamento, sendo a lei a expressão da
vontade geral – fundamento legitimador da atividade administrativa.
(I) É o que sucede em França desde 1958 – matérias que situando-se fora do domínio da
reserva de lei do parlamento, traduzem uma reserva de poderes regulamentar a favor
do governo: a Administração goza, aqui através do governo, de um espaço de decisão
de natureza normativa que se fundamenta diretamente na Constituição, sem mediação
ou subordinação legislativa.
(II) É o que acontece a Constituição portuguesa de 1976: artigo 18º/1 vincula as entidades
administrativas à aplicabilidade direta dos preceitos institucionais, permitindo o
exercício de uma atividade não executiva da lei. Também o artigo 199º/g habilita o
Governo a desenvolver uma atividade administrativa diretamente fundada na
Constituição.
(I) Lei como produto de duas vontades: do legislador e do monarca (que pode sancionar ou
vetar em termos absolutos).
(II) Poder legislativo partilhado por dois órgãos: parlamento e rei (a quem cabe a última
palavra).
(III) Acolhimento constitucional em Portugal através da CC de 1826.
Tal politização também pode manifestar-se pela preparação técnica do conteúdo das soluções a
consagrar nas leis, pois, possuindo a informação e os técnicos especializados, encontra-se melhor
preparada para efetuar escolhas e propor critérios decisórios.
(i) Em vez de serem estas a ter a conduta ditada pela lei, é antes a lei que recebe as soluções
que os técnicos da AP fornecem ao poder legislativo.
(ii) Participando na definição do conteúdo, goza de uma força política determinante do
próprio sentido da lei a que, num momento posterior, ficará vinculada.
Significado político:
(i) É a própria Administração que autora das propostas as apresenta ao parlamento,
deixando-lhe a decisão final de aprovação – passará a plasmar em lei a proposta do
executivo.
(ii) Em tal cenário, será antes o legislativo a andar a “reboque” das opções políticas
apresentadas pelo executivo.
(iii) A existência de casos de reserva de iniciativa legislativa a favor do executivo (lei do
orçamento de Estado) revela a existência do protagonismo do executivo na definição
das opções políticas a executar pela AP.
Num Estado pluralista, a politização da AP passa também pelo reforço da legitimidade política as
diversas estruturas administrativas, segundo um modelo assento em quatro regras nucleares:
(i) Fundamentação democrática dos critérios de administração.
(ii) Representatividade politico-democrática do decisor administrativo.
(iii) Responsabilidade política do decisor e da decisão administrativa.
(iv) Preferência pela maior legitimidade política do decisor administrativo e da respetiva
decisão.
(i) Os principais titulares dos órgãos de direção destas entidades são eleitos ou resultam de
um processo eleitoral plural, envolvendo a apresentação de programas políticos,
definindo prioridades, metas e objetivos.
(ii) Os dirigentes das diferentes entidades públicas podem ser sempre politicamente
responsabilizados.
(iii) O referendo local traduz uma forma de decisão política sobre matérias administrativas.
(iv) Necessidade de cada uma das entidades públicas aprovar o seu orçamento
consubstancia uma escolha política feita pela Administração.
É em cada ser humano vivo e concreto que a AP encontra o sujeito e o fim da sua atividade:
(i) Interesse público existe e deve ser prosseguido em função da dignidade da pessoa
humana.
(ii) Não há, nem pode haver interesse público contra a dignidade humana.
(iii) O respeito pela dignidade humana como parâmetro do bem comum.
(iv) Respeito pela juridicidade e eficiência da gestão administrativa como garante da
proteção da dignidade humana.
A administração pública civil nunca poderá fazer prevalecer a prossecução do interesse público
sobre o núcleo indisponível da dignidade humana.
(i) Nunca existem razões de interesse público que justifiquem ou habilitem que o ser
humano seja tratado com indignidade pela AP.
(ii) Os direitos fundamentais e as liberdades inerentes ao núcleo essencial da dignidade
humana são insuscetíveis de ceder perante todo e qualquer interesse público.
(iii) Só a dignidade humana limita ou condiciona a dignidade humana.
(iv) A dignidade humana envolve sempre uma prevalência do ser sobre o ter.
(v) O respeito pela dignidade humana constitui critério teleológico de interpretação e
adequação da prossecução do interesse público.
(vi) O decisor administrativo tem a obrigação de tomar em consideração os efeitos ou
resultados da decisão ao nível da garantia da dignidade humana.
Poderá, desta forma, dizer-se que o interesse público tem de se curvar perante a dignidade
humana.
(i) Todas as pessoas têm um direito absoluto e inalienável ao respeito da sua dignidade
pela AP.
(ii) A AP tem o dever de proteção da dignidade de quem não tem ainda, de quem já não
tem ou de quem nunca teve consciência da sua própria existência ou dignidade e ainda
de quem a pode ver ameaçada.
(iii) Não existem posições jurídicas adquiridas contra a dignidade da pessoa humana.
(iv) Ninguém pode ser privado da sua dignidade.
(v) Numa sociedade de vigilância total, numa absolutização da segurança, o respeito pela
dignidade humana nunca poderá conduzir a uma “dessubjetivação” do indivíduo – o
ser humano é sempre um fim em si mesmo.
(vi) Todas as violações do núcleo da dignidade humana geram atos feridos de inexistência
jurídica.
1. A ponderação feita pelo legislador, ao abrigo da reserva de lei, entre a dignidade da pessoa
humana e a prossecução do interesse público goza de uma presunção de
constitucionalidade que só excecionalmente pode ser afastada pelas estruturas
administrativas.
Constituição Administrativa
Todos os textos constitucionais contêm disposições referentes à AP e às suas relações com
os cidadãos: esse conjunto de regras e princípios traduzem a designada “Constituição
Administrativa”.
Reúne todas as normas da Constituição que têm por objeto a AP e as posições jurídicas
dos particulares como cidadãos administrativos, isto é, o relacionamento destes últimos com a
AP ou desta com eles.
Num modelo plural, podem surgir conflitos normativos entre a Constituição administrativa
nacional e a Constituição normativa transnacional.