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NOTA “RÉ” - DE REPÚDIO

Deem licença para abrir a roda e a nota invocando o mestre: salve, João da Baiana - integrante ilustre
da santíssima trindade do samba que, por ter tido seu instrumento apreendido pela polícia na festa da
Penha, por pouco não cumpre seu maior feito: incorporar o pandeiro ao samba.
O ano era 1908 e os sambistas no Brasil eram perseguidos e presos por “vadiagem”.

Nós, grupos musicais de rua de Brasília, viemos a público manifestar o nosso total repúdio aos
atos ilegais cometidos pelos agentes do DF Legal nos últimos dias do feriado prolongado de
Carnaval em nossa cidade.
Como se temia, o DF Legal agiu seletivamente e de forma arbitrária. Primeiro multando e
fechando bares pelo simples motivo de eles estarem no trajeto de tocadas de alguns grupos
musicais de rua, causando prejuízo financeiro ao estabelecimento e seus trabalhadores. Um
estabelecimento específico, que não contava com atração artística ou musical e que, inclusive,
havia reduzido mesas para evitar aglomeração, teve seu bar multado em R$10 mil além de
notificação proibindo-o de abrir por 30 dias.
Em seguida, o DF Legal e a Polícia Militar agiram de forma violenta e arbitrária na Galeria dos
Estados contra pessoas que carregavam instrumentos e que já não mais tocavam quando a
fiscalização chegou. Autuaram os artistas de forma indevida, negando informações, documentos
e enquadrando os artistas como vendedores ambulantes. Na ocasião, foram apreendidos
ilegalmente: djembê, pandeiro, alfaia, triângulo, zabumba e capa contendo prato, chimbais,
correia de zabumba, kit de baquetas de zabumba, baqueta pente, triângulo e chave de afinação.
A abordagem truculenta da Polícia Militar envolveu também agressão física e assédio contra
mulheres que foram cercadas e intimidadas quando questionaram a arbitrariedade das ações.
No último dia dos protestos, multaram em R$10 mil um dos músicos como pessoa física,
imputando a ele, individualmente, a “organização de bloco carnavalesco”, pelo simples motivo
de não ter corrido da polícia para socorrer sua companheira depois da dispersão
desproporcionalmente violenta do protesto com gás de pimenta.

Não admitimos que o GDF use o combate à COVID-19 como desculpa casuísta para atacar
músicos independentes que, sem organização central e de forma absolutamente voluntária,
foram às ruas para, ao ar livre, tocar seus instrumentos como forma de protesto contra o decreto
de carnaval que permitia eventos e festas privadas enquanto prometia prender e multar
músicos e pessoas fantasiadas nas ruas e praças da cidades que compõem o Distrito Federal. Se a
preocupação fosse de fato a saúde das pessoas, não teríamos o decreto alterado logo em seguida
ao carnaval. Teríamos mais leitos de UTI, exigência de passaporte de vacinação e políticas
culturais e econômicas que resguardassem as pessoas e artistas que trabalham no carnaval.

Não aceitamos arbitrariedades da lei e da força policial contra quem quer que seja e não
aceitamos a criminalização do porte de instrumentos.

Salve o carnaval!
Salve os corpos e instrumentos de festa e luta que jamais deixarão de ocupar as ruas!

Brasília, março de 2022

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