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Atelier de Artes Visuais: Desenho

Aula 5

Prof. Jack de Castro Holmer

CCDD – Centro de Criação e Desenvolvimento Dialógico


Conversa Inicial
Além de representar o mundo fenomênico, o desenho dá forma e
materialidade para coisas, previamente, inexistentes. Os artistas partem de
ideias já estabelecidas para compor novas propostas e usam a criatividade
para executar este processo. Na aula de hoje, veremos um pouco mais sobre o
processo criativo e como ele implica no planejamento de um desenho, visando
aperfeiçoar o modo como comunicamos uma mensagem por meio dele.

Contextualizando
No final do século XIX, a fotografia analógica impressionava os artistas e
cidadãos europeus pela verossimilhança das imagens geradas pelo aparelho
fotográfico. A imagem fotográfica tem um alto grau de semelhança com a
realidade material e isto se dá pelos mecanismos físicos e composições
químicas da máquina que as produz. O desenho e a pintura foram por muito
tempo referência por sua semelhança com a realidade, mas com o advento da
fotografia esta característica não era mais exclusiva.
Por este motivo vemos uma diferenciação das Artes criadas no final do
século XIX. Libertos do cânone clássico, os artistas se dedicavam, agora, ao
estudo da linguagem artística pessoal, focando não somente na representação
do mundo, mas, também, no estudo dos elementos internos da Arte, como
forma, cores e composições.
O período das vanguardas modernistas foi um período descrito pela
grande criatividade dos artistas daquela época e mudou, definitivamente, a arte
ocidental. Mas o que eles colocavam em suas obras no lugar da semelhança
com o mundo? A resposta é complexa, mas podemos começar a entender a
totalidade por dois motivos mais simples: a expressão e a metalinguagem.
A expressão individual do artista começou a ser mais relevante para a
produção artística, a qual era demonstrada por meio de sua pesquisa poética,
original e desafiadora. Esta expressão individual está muito ligada com o
contexto sociocultural no qual o artista está inserido. É um desejo de

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comunicação particular, uma visão de mundo diferenciada, o que gera uma
poética (uma pesquisa em Arte) única. A faceta metalinguística dos artistas
modernos está no fato de que a obra de arte fala do próprio sistema da Arte,
suas teorias plásticas e a própria história.
O que veremos, na aula de hoje, são alguns apontamentos sobre como
descobrir e melhorar nosso processo criativo, bem como a maneira de aplicar
estas técnicas para nossos desenhos.

Tema 1: Processo Criativo


Para o artista, muitas vezes, o processo de criação é mais prazeroso do
que o término de uma obra, pois no processo é onde as descobertas são feitas,
conexões são desveladas e formas novas são criadas. Mas a criatividade não é
exclusividade dos artistas. Todos somos criativos de uma maneira ou outra,
seja melhorando uma receita culinária ou descobrindo o problema mecânico de
um carro. Ser criativo pode ser definido como achar soluções diferenciadas
para aplicá-las em problemas recorrentes. No caso das artes, o problema maior
e persistente consiste no modo de representação do mundo, suas estratégias
de composição e melhor escolha dos materiais. Um desenhista terá que ser
criativo ao combinar seus materiais com o tema do desenho, assim como uma
artista digital manipula de modo otimizado programas e efeitos virtuais. Além
dos processos individuais de criatividade, podemos destacar algumas
características comuns: O que se quer comunicar com a obra? Como posso
comunicar isso materialmente? Quais são as técnicas e os recursos que devo
usar?
As respostas certas passam pela tentativa e pelo teste de várias
possibilidades técnicas, e ao estudo do que já existe relacionado ao tema,
como estamos fazendo aqui. Ser criativo é conhecer seu objeto de estudo a
fundo, pensando em novos modos de arranjar os elementos e materializá-los.
É, também, conhecer suas habilidades motoras e intelectuais:

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Todo o processo criativo engloba três momentos de elaboração: insight,
operacionalização e avaliação, que devem ser compreendidos como integrados. Os
três momentos são independentes, mas possuem ‘elos hierárquicos’ que possibilitam a
interpretação do pensamento como todo, permitindo entender o pensamento como
fruto de operações lógicas, complexas e auto estruturadas.
(LAURENTIZ, Paulo de. 1991)

Para Saber mais sobre o pensamento de Laurentiz leia o Capítulo 2 do


seu livro, disponível em:
http://www.hrenatoh.net/curso/textos/txt_paulolaurentiz.pdf

O insight, geralmente associado com a figura arquetípica do artista, não


é um processo espontâneo. Ele emerge de um emaranhado de conhecimentos
prévios que o indivíduo possui, sendo a ligação lógico/material de pedaços de
ideias espalhadas pelo mundo. Veja como Steven Johnson explica de onde
vem as ideias, conferindo o vídeo disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=BtgnozUgc58

Tema 2: Desenho no Período Clássico


Por meio destes processos criativos, os artistas reconheceram seu modo
de criar e evidenciaram o seu ponto de vista do mundo.
No Renascimento, podemos reconhecer o início do fortalecimento da
individualização da arte, atestado pelas assinaturas e características
singulares, tanto de traço como, também, pelo modo de representação da
realidade.
Albrecht Dürer foi um dos vários desenhistas do período Renascentista.
Ele estudava a natureza utilizando o desenho para se apropriar dos detalhes
da forma dos animais e das plantas. Na imagem abaixo podemos ver o modo
particular que ele olhava e retratava os animais:

Figura 01: Desenho de um Rinoceronte por Albrecht Dürer

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Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/D%C3%BCrer%27s_Rhinoceros

Dürer, além de estudar animais e plantas, era um excelente retratista,


colocando em suas obras não só a semelhança das pessoas que retratava,
mas, também, a personalidade de cada indivíduo.
Para Saber Mais sobre Albrecht Dürer, confira:
https://www.google.com/culturalinstitute/beta/entity/m0z6n?categoryId=artist&hl
=pt-br
O Desenho Clássico (desenvolvido na Renascença e baseado nos
cânones gregos do período clássico) é importante, hoje, pois nele se
encontram diferentes técnicas de representação, como a perspectiva e a
anatomia.
A perspectiva trazia toda a precisão da matemática árabe e os conceitos
de anatomia do corpo humano, revelados nos estudos de medicina
desenvolvidos naquela época. Esta relação entre medidas corpóreas e o poder
de representação da perspectiva fizeram com que a Renascença tenha
características visuais bem específicas e diferentes dos períodos anteriores da
Arte. O Cânone Clássico (esta relação de proporções pré-definidas do corpo
humano) pode ser visto, hoje, em várias obras de arte, dada sua potência
representativa. As Novelas Gráficas e Artes Sequenciais utilizam muito bem

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destes recursos para apresentarem imagens de rápido entendimento, somado
ao modo narrativo linear de contar a história.

Tema 3: Desenho Moderno e Contemporâneo


Como explicado no início da aula, a modernidade trouxe a
representação do mundo para outro nível, com a utilização dos métodos
mecânicos e, mais tarde, eletrônicos, de registro visual. O desenho passa de
registro da realidade e de técnica de apoio, para sua emancipação mais liberta
e expressiva. Depois da segunda guerra mundial, movimentos artísticos e
escolas, como a Bauhaus na Alemanha, trouxeram a formalidade como tema
central do desenho e os estudos de linguagem se fortaleceram. Novos
materiais industriais foram anexados aos clássicos, trazendo novas
possibilidades de criação.
Pablo Picasso foi um dos pioneiros, neste novo modo de desenhar. Ele
trazia seu traço particular, acentuando as deformações da figura em prol da
expressividade da cena. Além dos vários desenhos sobre papel, Picasso
desenhava gestualmente com a luz, o que seria o embrião das Artes de “ação”
que consideravam o movimento do corpo inteiro do artista no ato de desenhar.
Usando uma máquina fotográfica como suporte/anteparo, o artista desenhava
com uma lanterna, imprimindo o registro do movimento do ponto de luz sobre o
filme fotográfico, gerando desenhos fotográficos únicos e uma técnica que hoje
é conhecida como Light Painting.
Para Saber mais sobre o Desenho com luz de Picasso, leia o artigo
‘Light paint de Picasso em 1949’, por Eme Viegas, disponível em:
http://www.hypeness.com.br/2012/01/light-paint-de-picasso-em-1949/

Recomendamos também o livro: ‘Os Pioneiros Do Desenho Moderno’,


de Nikolaus Pevsner.

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Outro artista que destaco como exemplo do desenho na
contemporaneidade é Marcel Duchamp. Ele ficou conhecido por seus trabalhos
conceituais e suas apropriações de objetos, já existentes no mundo. Duchamp
utilizava o desenho como base para toda a sua produção, misturando desenho
técnico/projetivo com o desenho livre artístico, procurando lógicas de sistemas
de significação e operação de significados.
Veja a obra que representa um sistema imaginário onde desejos e
vontades se transformam em ações e movimento.
http://www.m2jc.fr/wp-content/uploads/2014/09/19.-Marcel-Duchamp-La-
Mari%C3%A9e-mise-%C3%A0-nu-par-ses-c%C3%A9libataires-m%C3%AAme-
%C2%A9-ADAGP-Paris-20141.jpg

Para entender a fundo as questões do desenho contemporâneo,


propomos a leitura do texto ‘Desmaterialização e Campo Expandido: dois
conceitos para o Desenho Contemporâneo’, de Helena Elias & Maria
Vasconcelos, disponível em:
http://conferencias.ulusofona.pt/index.php/lusocom/8lusocom09/paper/vi
ewFile/200/177

Na Prática
Vamos à prática! Produza um desenho com materiais “alternativos” (não
clássicos) que reforcem o tema escolhido.
Primeiro escolha um entre os três temas abaixo:
a) Natureza (paisagem);
b) Como me vejo (retrato);
c) Meu objeto preferido (natureza morta).

Agora que escolhemos o tema, vamos escolher os melhores materiais


que possam ajudar ou reforçar a mensagem que queremos passar:

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 Se você escolheu Natureza, pode se utilizar de pigmentos naturais,
terra, carvão, óleos vegetais.
 Se você escolheu “Como eu me vejo”, desenhará um autorretrato com
materiais que utiliza no dia a dia, ou seja, canetas e lápis que estão
disponíveis em sua casa.
 E, por último, se você escolheu “meu objeto preferido”, irá utilizar
materiais que sejam afins com o objeto escolhido, que tenham as
mesmas cores e que ajudem a construir a natureza morta proposta.

Síntese
Como vimos, à criação artística envolve várias reflexões, tanto
conceituais quanto práticas. A busca pela melhor técnica passa por estudos
aprofundados e testes de materiais. A criatividade acaba sendo a soma da
manipulação de conhecimentos em arranjos particulares, que criam tensões e
relaxamentos estéticos. Para criar melhor, deve-se ter um olhar cuidadoso e
curioso sobre seu tema/motivo, a investigação é um caminho necessário para o
desenvolvimento de uma poética sólida.

Referências

ARNHEIM, R. Arte & percepção visual, uma psicologia da visão criadora.


8. ed. São Paulo: Livraria Pioneira, 1994.

DERDYK, E. (Org.). Disegno. Desenho. Designio. São Paulo: Senac, 2007.

DEXTER, Emma. Vitamin D – New perspectives in drawing. Londres:


Phaidon, 2005.

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LAURENTIZ, Paulo. A holarquia do pensamento artístico. São Paulo:
Editora UNICAMP, 1991.

OSTROWER, Fayga. Criatividade e processos de criação. Petrópolis:


Vozes, 2002.

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