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GYM TYCOON: EXPLORANDO O POTENCIAL DO JOGO DIGITAL PARA O

DESENVOLVIMENTO DE COMPETÊNCIAS EM ADMINISTRAÇÃO E GESTÃO


ESPORTIVA
Marcelo Sabbatini 1
1. Estudante do curso de Bacharelado em Educação Física do Centro Universitário Internacional
UNINTER

Grupo de trabalho: GT 2 - EDUCAÇÃO E NOVAS TECNOLOGIAS

RESUMO

Entendendo os jogos digitais como uma expressão comunicativa e interativa capaz de representar
certos aspectos da realidade e ao mesmo tempo proporcionar oportunidades para a aprendizagem
de conceitos, num campo de experimentação livre, relacionar as competências relacionadas à
Administração e Gestão, no âmbito dos Bacharelados em Educação Física, com um jogo digital de
simulação do gênero tycoon, no qual o jogado assume o papel de gestão de uma academia de
ginástica. Através de uma metodologia qualitativa, baseada na análise de três camadas do jogo - sua
jogabilidade, sua estrutura e dinâmica e seu mundo - encontramos pontos de conexão entre estas
competências e conteúdos relacionados aos princípios gerais da Administração e à gestão
mercadológica, ainda que o fator afetivo seja limitado. Ao assumir alguns dos Princípios da Boa
Aprendizagem estabelecidos por Gee, tal experiência de aprendizagem é amplificada. Como
conclusão, vislumbramos um potencial relativo de aplicação deste jogo para a formação dos
profissionais da Educação Física, principalmente se considerarmos sua inserção em processos
pedagógicos que estimulem a reflexão e o debate, potencializados pela mediação docente.

Palavras-chave: tecnologia educacional; formação em Educação Física; simulação.

INTRODUÇÃO

Como fenômeno cultural relativamente recente, os jogos digitais são hoje


objetivo de uma ampla diversidade de pesquisas acadêmicas, incluindo seus efeitos
individuais, culturais e sociais. Neste contexto, é recorrente o argumento de que o
uso dos jogos digitais auxilia o desenvolvimento das “competências do século XXI” e
dessa forma inspira o surgimento dos serious games (jogos sérios, em inglês), com
suporte do setor produtivo em termos de incentivos e políticas de inovação
tecnológica (CHARSKY, 2010; FOSTER, 2009). Outra categoria que chama a
atenção são os jogos de simulação que apesar de sua amplitude, representando
todas formas de atividade humana, é identificada à possibilidades educacionais,
inclusive em termos profissionais (KIRRIEMUIR, J.; MCFARLANE, 2003).
Por outro lado, o uso dos jogos digitais no contexto educacional é marcado
por programas elaborados para este fim e que, frequentemente, possuem pouco
apelo em termos de engajamento dos estudantes, devido a sua baixa complexidade
e jogabilidade. Assim, os jogos “puros”, ou comerciais, passam a ser considerados
(GEE, 2009).
. Entre estes, os jogos de simulação relativamente simples, os do gênero
tycoon (magnata, em inglês) são frequentemente utilizados; unindo estratégia e
simulação, operam sobre contextos modelados que exigem o uso de interpretação
de informações, uso da lógica, discussão e avaliação por parte dos jogadores.
Já as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para os cursos superiores de
Educação Física, e especificamente para o Bacharelado, sinaliza para conteúdos
“relacionados à formação na área de políticas públicas e gestão para o
desenvolvimento das pessoas, das organizações, da economia e da sociedade”,
considerando “aprendizado em ambiente de prática real, considerando as políticas
institucionais de aproximação a ambientes profissionais” (BRASIL, 2018). Como
objetivo geral de pesquisa, buscamos portanto relacionar as competências
relacionadas à Administração e Gestão, no âmbito dos Bacharelados em Educação
Física como as identificadas por Rocha e Bastos (2011), com um jogo digital do
gênero tycoon. Especificamente, buscamos relacionar as situações e ações
relacionadas ao desenvolvimento destas competências e avaliar o potencial e
desafios de sua aplicação.

METODOLOGIA

Para a realização destes objetivos foi utilizada uma abordagem qualitativa, de


enfoque indutivo, buscando a identificação e a compreensão dos significados
presentes no jogo digital, considerando este o elemento natural a partir do qual
foram inferidos uma construção da realidade, que se mostra subjetiva. No âmbito
dos jogos digitais, seguiremos a metodologia de análise proposta por Aarseth
(2003), baseada em três camadas diferentes: a jogabilidade, composto pelas ações
dos jogadores e suas respectivas estratégias, a estrutura do jogo, incluindo suas
dinâmicas e regras e, finalmente, o mundo do jogo, constituído por sua narrativa,
topologia, níveis e textos que em conjunto compõe a simulação.
Como campo de pesquisa foi identificado o jogo Gym Tycoon, lançado em
novembro de 2020 pela produtora Green Forest Games. Segundo o texto de venda,
o game convida os jogadores a “Construir & gerenciar sua própria academia.
Comece pequeno e trabalhe em direção ao topo. Evolua seu negócio para uma
academia única de renome mundial capaz de treinar clientes vencedores de
prêmios” (GREEN FOREST GAMES, 2020). No momento em de escrita (setembro
de 2021) trata-se de um “jogo com acesso antecipado”, isto é, ao adquiri-lo o
jogador pode iniciar a jogar, ao mesmo tempo que participa de seu
desenvolvimento, sabedor de que não se trata de uma obra completa e que esta
sofrerá alterações no futuro. Esta participação da comunidade na elaboração do
jogo é citada como a principal razão para produtora (consistindo em um único
indivíduo) iniciar a comercialização nesta modalidade. Na atualidade o jogo conta
com 90% de avaliações positivas, de um total de 41 realizadas.
A coleta de dados ocorreu ao longo de aproximadamente quatro horas de
jogo, por um único jogador. Para o registro de elementos gráficos e de certas
situações de jogo foi utilizado um aplicativo de captura de tela, gerando imagens
estáticas. Não foram utilizados registros dinâmicos, isto é, de ações desenvolvidas
ao longo do tempo. Por último, foi utilizado um caderno de campo para o registro
das observações e identificação das categorias de análise.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

No panorama da estrutura e dinâmica do jogo, o primeiro aspecto que


podemos relacionar com as competências em gestão é o uso do espaço físico, com
opção pela interface em três dimensões (3D), com repercussões para a satisfação
dos membros, no sentido de atender suas necessidades, como na capacidade de
ampliação e busca por novas adesões. O elemento principal da gestão é a
aquisição dos equipamentos, categorizados em “cardio”, “força” e “atenção e foco”,
além dos elementos de “higiene” e “decoração” e a ferramenta “alunos”com a
gestão dos clientes, de sua evolução em condicionamento físico e de seus níveis de
satisfação. Finalmente, a ferramenta gestão possibilita o acompanhamento de um
fluxo de caixa simplificado, em termos de gastos e receitas, com a visualização
desta evolução num gráfico temporal de linha.
Em relação aos Princípios da Boa Aprendizagem esquematizados por Gee
(2009) destacamos a “Agência”, com o controle por parte do usuário jogador das
ações realizadas. Neste ponto, como experiência subjetiva, o jogo proporciona
engajamento e o sentimento de responsabilidade -e mesmo de ansiedade – pelas
decisões tomadas na construção e gestão de uma academia que passa também por
um sentido de pertença. Logo, identificamos o princípio de “Pensamento
Sistemático”, no sentido de o jogo leva a uma compreensão de causa-efeito na
experimentação das variáveis relevantes. A repetição, por outro lado, ampara o
princípio de “Consolidação” (mais do que desafio), com a aprendizagem através da
rotina. Já os princípios da “Boa ordenação dos problemas” e do “Explorar, pensar
lateralmente, repensar os objetivos” possuem presença bastante limitada devido à
narrativa linear do jogo, enquanto as “”Ferramentas inteligentes e conhecimento
distribuído” são limitados a poucos recursos.
De forma geral, portanto, podemos aferir que o modelo de simulação em
Gym Tycoon é relativamente simples, ancorado na relação entre espaço físico,
equipamentos e clientes e a satisfação das necessidades destes, individual ou
coletivamente. A dinâmica de jogo também estabelece uma relação de causa e
efeito simples entre as decisões tomadas a satisfação alcançada, com o único
desafio aparente sendo o uso equilibrado dos recursos disponíveis. Em nossa
avaliação faltam variáveis que trariam maior complexidade, principalmente se
estivessem inter-relacionadas como por exemplo seriam: o uso de custos fixos e
variáveis, a inclusão de impostos e outras obrigações da pessoa jurídica, a taxa de
ocupação da academia, maior diversidade de fontes de receita, incluindo
mensalidades e planos de longa duração e, principalmente, a gestão de pessoas.
No âmbito do modelo de simulação utilizado, também não identificamos
elementos narrativos que poderiam trazer o aspecto de desafio, na forma de
problemas a serem solucionados pelo jogador e que estariam relacionados às
competências administrativas e a própria natureza imprevisível, em termos de
contingências, da realidade. Estas limitações nos levam então à confrontação com
os princípios teóricos da utilização de jogos digitais na Educação, assim, como dos
resultados obtidos de pesquisa.
De forma geral, este jogo de simulação possui uma curva de aprendizagem
pouco íngreme e demanda a interpretação de informações e o uso da lógica,
proporcionando uma oportunidade sobre a aprendizagem de conteúdos, sobretudo
aqueles relacionados aos princípios gerais da Administração e às quatro funções
básicas administrativas (planejar, organizar, dirigir e controlar) e a conceitos do
Marketing, como são as necessidades e a satisfação do cliente. Por outro lado, no
que se refere aos conteúdos de gestão financeira, o modelo adotado pelo jogo é
bastante simples, reduzindo-se a uma análise entre custos e receitas, mas de forma
limitada. Já a dimensão afetiva é relativa; se por um lado o assumir o pertencimento
de um negócio próprio direciona à motivação e ao engajamento como êxito do
empreendimento (o qual por sua vez pode ser relacionado com os objetivos de
disciplinas de Empreendedorismo), o ritmo do jogo, sua previsibilidade, a ausência
de narrativa e desafios acabam por miná-la.

CONCLUSÕES

A partir de explorações iniciais de jogos digitais com temáticas próximas a da


Administração e Gestão Esportiva, especialmente no gênero da simulação e do
gênero tycoon, analisamos nesta pesquisa um título específico, de publicação
recente, Gym Tycoon, com a utilização de uma metodologia qualitativa.
De acordo com nossa premissa inicial, encontramos pontos de conexão entre
este meio comunicativo digital e as competências esperadas no âmbito dos
Bacharelados em Educação Física, conforme a aprendizagem de conteúdos
relacionados aos princípios gerais da Administração e à gestão e planejamento de
marketing esportivo foram contemplados, ainda que a dimensão afetiva tenha se
mostrado ambígua. A relativa simplicidade do modelo também limitou a utilização
dos Princípios da Boa Aprendizagem estabelecidos por Gee (2009), assim como
ocasionou a ausência de desafios e, especificamente de conflitos éticos, que
enriqueceriam a experiência de jogo-aprendizagem.
Entretanto, e de acordo com a experiência e com o conhecimento acumulado
a respeito do uso de jogos digitais na Educação, consideramos o potencial do uso
deste jogo relativo, em termos do desenvolvimento de competências, dada as
limitações do modelo de simulação utilizado, que refletem sobre sua estrutura e
dinâmica. O mesmo pode ser dito em relação a uma reflexão sobre o papel social
dos empreendimentos esportivos, mais além de uma ótica puramente
mercadológica.
Particularmente, interpretamos as diversas limitações apontadas no modelo
utilizado como uma oportunidade, no sentido de que elas oferecem circunstâncias
para se desenvolver o letramento sobre as simulações (TURKLE, 1997), a partir de
seu debate e reflexão, e mesmo sobre os conteúdos do jogo relacionados à
Administração e Gestão no campo da Educação Física. Neste ponto, consideramos
a intervenção docente como um elemento indispensável para que este processo
ocorra no âmbito educacional.
Neste sentido, entendemos que um jogo digital com estas características
pode servir como ferramenta auxiliar, a ser incorporada em processos pedagógicos
estruturados e mediados pela figura docente, possivelmente como uma atividade
introdutória nas diversas disciplinas relacionadas ao campo, numa perspectiva de
inovação pedagógica de aproximação à cultura digital/jovem.

REFERÊNCIAS

AARSETH, E. Playing research: methodological approaches to game analysis.In:


DAC conference, 2003.

BRASIL. Resolução CNE/CES nº 6, de 18 de dezembro de 2018. Institui Diretrizes


Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação em Educação Física e dá outras
providências.

CHARSKY, D. From edutainment to serious games: a change in the use of game


characteristics. Games and Culture, v. 5, n. 2, p. 177–198, 2010. Disponível em:
http://dx.doi.org/10.1177/1555412009354727

FOSTER, A. N. Gaming their way: learning in strategy video games. Tese de


Doutorado. Michigan State University, 2009.

GEE, J. P. Bons videogames e boa aprendizagem. Perspectiva, v. 27, n. 1, p, 167


-178, jan./jun. 2009.

GREEN FOREST GAMES. Gym Tycoon, STEAM, 2020. Disponível em:


https://store.steampowered.com/app/1339500/Gym_Tycoon/

KIRRIEMUIR, J.; MCFARLANE, A. Use of computer and video games in the


classroom. In: Proceedings of the Level Up Digital Games Research
Conference, Universiteit Utrecht, Netherlands, 2003.

ROCHA, C. M. da; BASTOS, F. da C. Gestão do esporte: definindo a área. Revista


Brasileira de Educação Física e Esporte, v. 25, n. esp., p. 91–103, dez. 2011.

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