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RESENHA / REVIEW / RESENA PIERRE BOURDIEU E AS TATICAS PARA ENFRENTAR AINVASAO NEOLIBERAL PIERRE BOURDIEU AND THE TACTICS TO DEAL WITH ‘THE NEOLIBERAL INVASION PIERRE BOURDIEU Y LAS TACTICAS PARA ENFRENTAR ALA INVASION NEOLIBERAL ALDERLANDIA a Siva MACIEL Doutoranda em Bducacao pelo Programa de Pés-Graduacao em Educacio (PPCE) da Universidade Mevodista de Piracicaba (UNIMEP), Professora do Centro de Educagio, Letras ¢ Artes da Universidade Federal de Acre (UFAC) alder ae@hotmaitcom BOURDIEU, Pierre. Contiafigestticas para enfrentara invasto neoliberal. iad. Lucy Maga- Ihies. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. 151 p. R$ 26,00. ISBN 85-7110-476-X Catedritico de sociologia do Collage de France, Pierre Bourdieu. (1930-2001) é considerado um dos grandes intelectuais da Franga. Tomou-se famoso, em 1964, 20 publicar, com Jean-Claude Passeron, Les Héritiers ("Os Herdciros"), obra na qual os autores faziam uma critica fundamental ao ensino superior francés. Em 1996, findou a associagio Liber Raisons dAgir (Liber/Razées de Agir), editora de livros militantes de dentincia do neoliberalismo. Além de defensor do movimento antiglobalizacio, Pierre Bourdieu era um critico e influcnciador da teoria da arte e da cultura. Cultivava a pole mica como instrumento de intervencio social e, nos tiltimos anos de sua vida tentou recuperar o sentido do intelectual combativo, Seus trabalhos abrangeram um vasto campo de conhecimentos nas Areas da politica, educacio, midia c literatura, Além disso, ‘manteve-se ligado a atividade politica e ao apoio as classes trabalhadoras, o que o tornou um intelectual de referéncia para a esquerda. De sts obras traduzidas no Brasil, desta cam-se A Economia das Trocas Simbélicas (1974), A Reprodugao (1975), O Poder Sinibélico (1989), A Miséria do Mendo (1997), Fscritos de Educagio (1998), entre outras. Contafogos ~ Teticas para Enfrentar a Invasiio Neoliberal (1998) e Contrafogos 2 — Por un Movimento Social Europew (2001) sao partes das tiltimas obras do autor. No primeiro livro, Pierre Bourdieu retine entrevistas concedidas e varios textos, alguns jé publicados outros (COMUNICAQOES - Revita do Progam ds Pi Graco cm Elcasiods UNDUE + Ano 14.2 1I-O8 jude 2007 104 inéditos, sendo a maioria deles interveng6es feitas pelo autor em diferentes circunstin- cias, por exemaplo, greves, discursos para trabalhadores, encontros culturais e outros. Analisando questoes empiricas sobre os efeitos do neoliberalismo, apresenta, a0 longo do livro, algumas possibilidades de resisténcias para enfrentamento dessa concepcio, ou seja, conirafogas, que quer dizer fogo ateado ao encontro de outro fogo para impedir~ Ihe a propagacio: fogo de encontro. Na primeira parte do livro, por meio de uma entre vista, o autor faz referéncia a uma pesquisa realizada na Franca, a qual demonstra o nivel de insatisfacao de algumas pessoas de forma individualizada, contradigSes vividas sob forma de dramas pessoais, mas que, em tilkima instincia, sio reveladas, de forma cole- tiva, no mundo social em que vivemn. So problemas identificados, cada vez mais, pela retirada do Estado de certo ntimero de setores da vida social piblica, como a habitacio, escola, os hospitais, etc. A partir desse mal-estar coletivo, o autor identifica, no ambito do Fstado, um grupo de pessoas que ele denomina mio esquerd do Estado, que se mostra impotente diante das limitagoes que a mao direta do Estado Ihe impoe..A mao esquerda do Estado €, para Bourdieu, o conjunto dos agentes dos ministérios ditos “gastadores”, que representam 0 vestigio, no seio do Estado, das lutas sociais do passado, “[...] sip os cha~ smados ‘rabathadores socias’:assstenes sociais, educadores, magistrados e também, cada vez mais, docentese professoresprimérios”.(p. 10). Esse grupo no consegue realizar suas agBes (Soci ais) pela dimninuigao cada vez maior dos recursos financeiros (e menosprezo pelos ser- viigos piblicos essenciais, como educagao e satide) para as politicas piiblicas sociais ¢ devido ao enfraquecimento de sua forga politica, A mao direita do Estado (burocratas do Ministério das Finangas, dos bancos pablicos ou privados e dos gabinetes ministeriais), em nome de uma ligica de mercado, justifica, de forma muito contundente, a retirada paulatina da obrigacio do Estado de servicos essenciais aos quais 0 cidadio tem direito, © autor menciona que a midia tem sido competente na divulgacio do discurso que exime o Estado de responsabilidade com os servigos puiblicos ¢ enaltecido, fortemente, 605 servicos privados. Enfatizando que os proprios “guardides” do Estado se constitut- ram, em grande parte, nos principais opositores dos interesses coletivos das pessoas que, de fato, requerem ¢ necessitam dos servicos sociais, Bourdieu ressalta a importin- ia do contrapoder critico e chama, para o enfrentamento da mao direita do Estado, todos aqueles que compartilham desse ideal: “deseo que os escritores, os artists, os fldsofos € 03 cien- tistas possame se fazer ouvir dreiamente em todos os dominios da vida pitblica em que so competen~ tes” (p. 18). Seria findamental, segando 0 autor, que os “criadores” pudessem exercer sua fiungio de servigo piblico, pois todo mundo teria muito a ganhar se a légica da vida intelectual, da argumentacio ¢ da refutagio se estendesse também a vida ptiblica. “No ‘momento em que as grandes utopias do século XIX revelaram toda a sua perversao, & urgentecriar as condigées para um trabalho coletivo de reconstrugdo de urn universo de ideas realstas, capazes de mobilizar as vontades, sem mistficar as consciéncias” (p. 19). Nos attigos “O mito da mundi- alizagio e o Estado social europeu” (p. 42) e “O neoliberalismo, utopia (em via de rea- lizagio) de uma exploracio sem limites (p. 135), Bourdieu enfatiza novamente o papel dos intelectuais que defendem a idéia de “estado minimo’” c o espago reservado a eles na grande imprensa, que tanto os ajudou (e ajuda) a divulgar e justificar a concepcio neo liberal como tinica via possfvel para realidade atual dos Estados. Apresenta, no entanto, a importante contribuigio que os pesquisadores podem dar com. wim discurso que se M2 COMUNICAGOES + Reva do Programade ie Grado en Buco ds UNDER * Ano 14+ m. 2p OLS» jubdee 20? contraponha a todas essas constatagdes que parecem inquestionaveis. Uma das formas possiveis de desmistificar esse “mito” seria a dentincia das conseqiiéncias negativas que a concepio neoliberal produz. Tomando, particularmente, como referéncia os paises — Inglaterra ¢ os Estados Unidos ~ que sio considerados “bergos” do desenvol- vimento bem-sucedido do neoliberalismo, o autor apresenta elementos que apontam para a involugao do Estado. Ainda que pareca paradoxal, o Estado representa, em certa medida, a conquista de direitos sociais, pois “O estado é uma realidade ambigua. Nao se pode apenas dizer que € um instrumento a servico dos dominantes” (p. 48), ¢ 6 no priprio Estado que o movimento social pode encontrar apoio para. resisténcia as poli= ticas neoliberais, ou seja, na sua mao exquerda, Criticando a globalizagao e as “verdades” sobre a dominagio dos paises que detém o controle econémico mundial, Bourdieu analisa as conquistas culturais adquiridas, ¢ que sao ameacadas pelas suas bases econé- micas ¢ sociais. Destaca, também, o controle das ages que comandam os paises mais pobres, retirando-lhes sua autonomia financeira e deixando-os cada vez mais depen- dentes dos paises ricos. Apés apresentar questdes que desmontam a idéia de consenso com relagio 20 neoliberalismo, o autor apresenta alguns elementos importantes que possibilitariam um confronto com as chamadas “prioridades” do Estado na sociedade contemporanea. Entre esses elementos, enfatiza o contrapoder dos intelectuais, sindicatos € associacdes, que pode contribuir para a desmistificacio da hegemonia do denominado pensamento tinico. Entre as intimeras publicagdes existentes sobre o neoliberalismo e a globalizaco, o que nos chama a atencio nesta pequena/grande obra € a forma como © autor aborda as transformagées oriundas da nova ordem econdmica e as evidéncias de como essas transformagées afetaram, na esfera politico-ideoldgica, a organizacio, o contetido, as formas e a disposicio dos intelectuais, sindicatos, etc. O livro traz signifi cativas contribuigées para repensarmos o momento de retracio e redefini¢io dos movi-~ mentos sindicais e sociais como um todo, propiciando-nos elementos para reflexes sobre o papel, as possibilidades ¢ os limites do intelectual combative diante desse contexto, * Recebimento do artigo: 14/8/2008 COMUNICAQOES + Revista ds Progama de PCr cm Ee oda Unmute + Ano +n 2p W1AON «aber UT 5

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