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MIGA L H A S DE PESO

Certificação orgânica: responsabilidades e sanções


Pedro Henrique Gallotti Kenicke

A certificação não impõe sozinha a qualidade no produto orgânico, mas, sim, a comprovação de
que sua produção seguiu técnicas de cultivo sem agressão à natureza, o que não exclui
automaticamente a responsabilidade do comerciante em arcar com o pagamento dos seus
fornecedores rurais.

30/5/2019

Dando seguimento ao tema da certificação orgânica, vamos tratar das responsabilidades que os
integrantes da cadeia da produção orgânica possuem e as eventuais sanções que podem sofrer.
Segundo a lei 10.831/03, tanto produtores, quanto distribuidores, comerciantes e as próprias
entidades certificadores têm responsabilidade pela qualidade relativa às características
regulamentadas para produtos orgânicos.

Isso significa que esses atores da cadeia de produção devem zelar para que o produto orgânico
atenda aos critérios determinados nos atos regulamentares expedidos pelo Ministério da
Agricultura, de modo que, a princípio, se não houver regulamentação para determinada produção
orgânica específica, a responsabilidade pela qualidade não poderia ser invocada.

Caso emblemático foi o de produtores de cogumelos orgânicos em Botucatu/SP que, antes


mesmo da expedição da IN 37/11, que regulamenta a produção de cogumelos comestíveis e
Sistemas Orgânicos de Produção, obtiveram a certificação orgânica da sua produção por meio
de auditoria. Porém, passado algum tempo, sofreram fiscalização do MAPA e retirada da
comercialização dos cogumelos simplesmente porque não havia regulamentação específica
para aquele tipo de produção, o que não implicou em responsabilização direta pela qualidade do
produto.

O mesmo caso é interessante também para exemplificar a responsabilidade da autoridade


certificadora sobre as alterações regulamentares do MAPA. Tendo sido retirados os cogumelos
de circulação, os produtores paulistas ajuizaram ação indenizatória em face da certificadora,
pois, segundo eles, esta deveria conhecer a ausência da regulamentação específica e as
consequências negativas que a continuidade do empreendimento poderia trazer para os
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produtores. Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, a certificadora não teve
responsabilidade sobre o fato, uma vez que a obrigação se limitava a “a atestar a qualidade e a
conformidade de determinado produto ou serviço com normas técnicas estabelecidas por
institutos especializados, que podem ser de natureza governamental ou (...) credenciado pelos
órgãos oficiais competentes.”1

Voltando à legislação, os integrantes da cadeia produtiva orgânica podem responder penal e


civilmente por suas infrações e, administrativamente, podem ser sancionados a pagar multa de
até R$ 1 milhão, além de medidas como suspensão de comercialização, inutilização do produto,
suspensão de credenciamento, certificação, registro ou licença. As infrações e suas penalidades
são diversas, podendo ir desde a propaganda falsa de produto orgânico, passando pela
comercialização de produto não certificado, até à penalidade por não ter observado o período de
conversão da terra para produzir conforme regulamentação vigente.

Podemos trazer as mais comuns, e que afetam a vida de consumidores e comerciantes. Para
aquele que faça propaganda, publicidade ou apresentação de produto que contenha
denominação, símbolo, desenho, figura ou qualquer indicação que possa induzir a erro ou
equívoco quanto à origem, natureza, qualidade orgânica do produto ou atribuir características ou
qualidades que não possua, poderá haverá advertência, recolhimento do produto e aplicação de
multa. As mesmas sanções são aplicadas para aquele que comercializar produto que se afirme
orgânico sem certificação.

Um último ponto deve ser debatido: a  qualidade do produtor orgânico. Já se sabe que o
comerciante que adquiriu o 

produto também tem responsabilidade sobre a origem e sobre a qualidade daquilo que vende.
Daí porque se, for comprovada a fraude na certificação ou origem do produto adquirido, o
comerciante tem direito ao ressarcimento
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informativo e danos que sofreu em face do produtor.
Contudo, quando se trata da qualidade de alimentos orgânicos é alta a probabilidade de que o
alimento poderá ter qualidade reduzida em alguns itens, devendo as partes entabularem
contrato de fornecimento dos alimentos orgânicos com porcentagem mínima de qualidade. Para
além disso, se não houver tal tipo de acordo, não poderá o comerciante deixar de pagar o
produto já fornecido tendo por base sua suposta “má-qualidade”, e isso é o que tem entendido a
1ª Turma Recursal do Paraná,2 que já condenou comerciante a arcar com indenização por danos
materiais e danos morais para produtora de orgânicos. 

Dessa maneira, tendo em vista a legislação e a jurisprudência, o que se vê é que a certificação


orgânica impõe obrigações para os integrantes da cadeia produtiva, incluindo comerciantes e
entidades de auditoria, especialmente na seara administrativa. Portanto, a certificação não
impõe sozinha a qualidade no produto orgânico, mas, sim, a comprovação de que sua produção
seguiu técnicas de cultivo sem agressão à natureza, o que não exclui automaticamente a
responsabilidade do comerciante em arcar com o pagamento dos seus fornecedores rurais.

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1 EMPRESARIAL. INDENIZAÇÃO. Contrato celebrado entre produtores de cogumelos orgânicos e


a IBD Certificações Ltda. Ministério da Agricultura que impossibilitou a produção após
regulamentação própria. Empresa que não pode ser responsabilizada pelos prejuízos
decorrentes dessas normas que não existiam na época da realização do contrato. Recurso
desprovido.  (TJSP; Apelação Cível 0001575-13.2013.8.26.0091; Relator (a): Teixeira Leite; Órgão
Julgador: 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial; Foro de Botucatu - 2ª Vara Cível; Data do
Julgamento: 18/5/16; Data de Registro: 25/5/16)

2 RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS  MORAIS E MATERIAIS.


FORNECIMENTO DE PRODUTO  ORGÂNICO. AUSÊNCIA DE PAGAMENTO. DANO MORAL 
CONFIGURADO. OFENSA A HONRA DA RECLAMANTE.  QUANTUM FIXADO DE ACORDO COM O
CASO CONCRETO.  SENTENÇA MANTIDA. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 1ª Turma
Recursal - 0000534-71.2014.8.16.0182 - Curitiba -  rel.: FERNANDA DE QUADROS JORGENSEN
GERONASSO -  J. 22/5/15)

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*Pedro Henrique Gallotti Kenicke é advogado civil-empresarial em  Clèmerson


Merlin Clève - Advogados Associados. Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná.

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