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Muniv Sadré As estiatégias sensiveis Aleta, midiae politica Dados Internacionais de Catalogago na Publ (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasi gins sensiveis : afeto, midia a | Muniz Sodré. ~ Petr6polis, RI : Vozes, 2006. ISBN 85.326.3304-8 icologia) 2. Comunicagao igao de massa 4, Estratégia (Filosofia) CDD-302.2 % EDITORA VOZES 1 SENTIR, COMUNICAR E COMPREENDER Midia ¢ comunidade afetiva. As variades dimensées da sensibilidade contropostas és da raz6o no cultura ‘ocidental. Afeccéo, afeto, emocéo e sentimento, Estéti- ca ou estesio como campo das monifestacées sensi- * Vs eoner cases pons de paaldacenapshuaetionne seven: “Parece que é justamente no plano do sentir que a nossa época exerceu 0 seu poder. Talvez por isso ela possa ser definida como uma época estética: no por ter uma relagdo privilegiada e direta com as artes, mas essencial- mente porque o seu campo estratégico nao é o cognitivo, nem o pratico, mas o do sentir, o da aisthesis”®. E nossa questo inicial dispde-se entio na pergunta sobre a possibilidade de existéncia de uma poténcia emancipato- riana dimensa , do afetivo ou da desmedida, para além, portan- ‘ado de “agio emancipa- iva ¢ nao dominada pela transcen- vel pela ordem socioeconémica vigente, ou entio uma a dos direitos civis), para nos perguntarmos em seguida so- idade de uma aco dessa ordem no interior de uma realidade es- Jo e da informagao, sobre a qual estrutura voltada para interesses econémico-corporatives imediatos, idealidade de formas originais ou sem a perspectiva de fins ético-politicos Essas suspeitas so embasadas por toda uma tradigdo humanista (e in- telectualista) de pensamento, segundo a qual um dispositive que gravite na 6rbita dita “cultural” deveria reger-se necessariamente por uma teleologia da transcendéncia da verdade, do sentido e do poder, coincidente com a mais, absoluta racionalidade da historia. A este respeito, comegam a manifestat-se, entretanto, vozes discordantes. Vattimo, por exemplo, aventa a hipétese de ue, num processo ideal de emancipagaio, a comunicagtio nao deveria cami- har no sentido de uma maior verdade de seus contetidos, ¢ sim no senti- do de uma “intensificagao de si mesma como fim De fato, nada nos assegura que a comunieaco disponha de uma razio ‘teenico-social capaz de apontar para uma “maior verdade” ou uma finalida- de cultural qualquer de seus contettdos. J no comego da voga das tecnolo- sgias comunicativas, Wittgenstein itonizava: “Homens julgaram que um rei pudesse fazer chover; nds dizemos que isto é contradizer toda experiéncia Hoje se julga que 0 aeroplano, a radio, etc. sto meios de aproximagao dos povose de difusao da cultura’. E que, desde meados dos anos trinta, cireu- lavam em meios académicos juizos de aproximagao entre 0 automovel, 0 avito ¢ a televisio, sendo esta iltima considerada mesmo a exemplo do psicOlogo da arte alemdo R, Amheim—um “veiculo do espirito”, isto é, um instrumento do mundo das formas da cultura. Maso que Wittgenstein discute aqui, a propésito do problema da certe- za, €a questio da experiéncia, sustentando nao ser ela, ¢ sim uma totalidade de proposigdes, o fundamento do nosso modo de julgar, que nos leva a crer em alguma coisa. Em sua observagio sobre as tecnologias de deslocamento © comunicagéo, ele desqualifica implicitamente a experiéncia de sucesso desses meios ¢ sugere um outro fundamento para a crenca em sua positivi- dade cultural, E a um outro fundamento que também alude Vattimo, mas, diferente- ‘mente de Wittgenstein, buscando transformar a comunicagéo em agdo eman- cipatoria, Seria talvez possivel divisar nesta proposigdo o eco de uma refle- xio nietzscheana: “As nossas vivéncias auténticas no sio de modo algum clogtientes. Nao podemos comunicé-las mesmo se 0 quiséssemos. E que 4. Conforéncia de aberiura do Xll Congrosso da Associagao Nacional des Programos de Pos Gradvagae {Compos). Biblioteca Nacional, 04/06/2002 5.Witlgenstein,L. De fo conti. Gallimard, 1976, 9, $5. Ihes falta palavra", Mas como autenticidade nao sera certamente 0 atributo mais adequado para a experiéncia industrial (logo, economicamente interes~ sada) da comunicagaio, que hoje se faz publica com poderosos recursos tec~ nolégicos e mercadol6gicos, levanta-se a hiptese de um fenémeno que vale- ria pela pura intensidade performativa de sua mimese, isto é, por uma expe~ rigneia intensa de apreensao de aspectos da vida, diante da qual o “contet- do” ou a matéria do acontecimento acaba tornando-se indiferente”. ‘A célebre formula de Marshall McLuhan ~“o meio €a mensagem - nha-se neste mesmo quadro conceitual. Dizer “meio” & dizer “forma”. O- meio-forma é, em principio, a tecnologia que, no caso da televisao, consiste 10 aparato de transmissao ¢ recepedo de imagens por meio de recursos ana- lSgicos ou digitais. Antes de McLuhan se diria, 00 modo do dualismo aris- totélico, que essa forma é 0 envoltério ou o revestimento téenico da maté- ria constituida pelo vivido sociocultural de um grupo humano. O meio seria veiculo de um conteiido externo a ele, de onde proviria 0 sentido. Mas quando se admite queo meio é a mensagem”, esti-se dizendo que ha sentido no proprio meio, logo, que a forma tecnolégica equivale ao con- ‘etido e, portanto, nao mais veicula ou transporta conteados-mensagens de uma mattiz de significagdes (uma “ideologia”) externa ao sistema, jé que a propria forma é essa matriz. Tal é o sentido ou 0 “contetido” da tecnologia: ‘uma forma de codificagao hegeménica, que intervém culturalmente na vida social, dentro de um novo mundo sensivel criado pela reprodugao imaterial das coisas, pelo divércio entre forma ¢ matéria. Liberadas as pessoas ¢ as coisas de seu peso ou de sua gravidade substancial, tomadas imagens que ensejam uma aproximagio fantasmatica, a cultura passa a definir-se mais por signos de envolvimento sensorial do que pelo apelo ao racionalismo da representagao tradicional, que privilegia a linearidade da escrita. Este novo ordenamento cultural nfo poderia deixar de atingir o funcio- namento do Jogos classico. Conseqiientemente, esta hipdtese suscita eriti- cas intelectualistas no sentido de que as indiistrias da comunicagao pode- 6. Niche, FO cepieuo dos idles. Ginortes, 1965p. 102. ex plpvl ear expand, posers dou ‘ors eporsa pl wd cngoe ons Stine ee ao eo oval, ede os oSequn mento. morn empo em gue rnlias eae dee aa arate imentos, 0 publico- 7.Esso indiferanca ¢ uma realidade hi audiéncas do tlojrnas dclinam om po : ypulsionou no possade a ‘al nas rodos eibornetieas ipal da Neotevé € que el fala (conforme a Paleotevé fazia ou fingia fazer) sempre menos do mundo exterior. Bla fala de si mesma e do contato que estabelece com o proprio pii- ico”. Nao é ico, gragas ao controle remoto, decide quando deixé-la falar e quando ‘mudar de canal). Ela, para sobreviver a esse poder de comutagao, procura en- lteter 0 espectador, dizendo-Ihe “eu estou aqui, eu sou eu ¢ eu sou voce” Autores como Francesco Cassetti ¢ Roger Odin detectam ai um empo- brecimento: “Assistir & paleotelevisio implicava atividades cognitivas ou afetivas com plena dimenséo humana; compreender, aprender, vibrar ao rit- ‘mo dos acontecimentos relatados, rir, chorar, ter medo, amar ou simples- mente se distrair. Assistir & neotelevisio nao. mais nada disso, A sin- tonizagdo energét izagdo no vazio, sem objeto”, Verén re- fore-se a esta argumentago, mas para criticé-la, sugerindo que 0 “vazio pertenceria mais “aos nossos instrumentos conceituais” do que propria te- levisdo: o que se poria efetivamente em jogo é uma nova fase da tevé en- quanto dispositivo semidtico de contato, E preciso, entretanto, a nosso modo de ver, deixar bem claro que “con- tato” nao se reduz.a idéia de mera conexo, devendo ser entendido como uma configuragio perceptiva e afetiva que recobre uma nova forma de co- nhecimento, em que as capacidades de codificar e descodificar predomi- ‘nam sobre os puros ¢ simples contetidos. Partilhava esta linha de pensa- mento o pedagogo Paulo Freire que, mesmo nao sendo especificamente tim ta de midi va a centralidade dos processos comunicativos na produgo do saber. Comunicagdio era, para ele, a “co-patticipagio dos sujeitos no ato de pensar”, logo ou uma reciprocidade a seu modo de ver, cate- Borias centrais para a compreensio do agir comunicativo, ensejando a dis 8. Eco, Umberto. Tevé: teira, 1984, 9, 182-18 9.CI.Voren, Elsen, Antonio Foust. Lula ransparéncio perdida In: Viagem na inealidede coldiana, Nove Fron: io da televsao e camponhas pratdanciavss. tn: Vorén, lsa0 & Neto, dente Televisa e poliica na compenha elitorol, Mackar 2008» 21 ngiio meios expressivos, como o jornal ¢ & complexo midiatico, aadi era um mei exatamente por solicitar 0 envol Sérgio Guimaraes, colaborador do pedagogo. mesmo coloca a diferenga entre um meio que seria mais quente, sli, que teria uma abordagem mais emotiva, que mexe mais com o vivo da pessoa, com as emogdes, € um meio mais frio, como o jomnal, onde o que aparece mio é 0 instrumento ao vivo""” Seja qual for o juizo de valor que se faga sobre estes aspectos, configu: ra-se entre os analistas uma espécie de consenso quanto ao crescente au- ica, que tenderia a del por excesso de tautologia, a poténcia intrinseca da linguagem, Para os muitos eriticos deste fendmeno, descartado o horizonte da autenticidade, o que importaria mesmo é falar do que se configura como primordial na vivéncia facticia da comunicagfo (facticidade no sentido de contingéncia e ndo na acepeao hei- deggeriana de “queda” do homem’* em face do Ser), ou seja, falar do enfra- sresenca forte de uma ordem si io.a maioria das restrigdes que c tempordinea dirigem ao fenémeno comunicacional. nite cognitivo, tal como se haviam esforeado por demonstrar 0 neo-hege- smo e a fenomenologia, por exemplo. Fle diz partir da interpretacio dada por Gadamer aos famosos paragrafos 39 ¢ 40 da Kant, para comparar 0 agir comunicativo ao juizo estético, entendido como 1s parigrafos, Kant primeiro sustenta que uma sensago s6 se vel quando ha acordo (Einstimmgkeit, eufonia) de afetos, 0 ue pressupSe uma comunidad afetiva ou comunidade do gosto. Gosto, para ele, & a faculdade de julgar a priori a comunicabilidade (Mittelbarkeit) dos ignifconde snore, sentimentos, “a faculdade que tor vel sem a comm Cabe, portanto, ao senso comum (sensus )assegurar o carter universal, logo transcendental, do gosto, O que Vattimo esté afirmando é ser compteendido como uma expect assim como 0 goz0 estético pode de compartilhamento (o senso co- na contemplagdo de uma obra de arte, por exemplo, o apelo da comunicagao estaria na possibilidade de inte- grar 0 sujeito contemporaneo numa sociedade de i um juizo de gosto. Este é 0 “senso comunt modo diverso da inten¢ao kantiana de dar autonomia 4 estética, uma vez que sob 0 ponto de vista gadameriano a exper posta d parte da realidade vivida, Desta man comunidad so comunicacional. A comunicagiio enc como fim” seria, assi sem a representagiio Esta linha de pensamento guarda alguma semelhanga com o modo pelo qual Jauss aborda 0 problema da recepeo na experiéncia es alheia, Jauss enxerga 0 nicleo propriamente comunicativo da recepgao, onde a experigncia sensivel pode ganhar os foros emaneipatérios de que fala v da raziio, para contornar a recuperagdo das formas sen: mas do poder e alargar, por meio da comunicagao, 0 O que mesmo 0 preocupa, de modo aniilogo a0 0 na contemplaco da obra de arte quer contetido esp rizonte da experién- tidado de Kant como comunicabilidade pura co, cio estétea y hermensutic iterara Eneayasen el compa de la p76 ide uma preocupaco com o que esta aquém oualém do con- a experiéneia de uma dimensio primordial, que tem mais a ver com 0 sensivel do que com a Fazio, Por exemplo, a dimensio da cor- poreidade, uma vez que sentir implica 0 corpo, mi conexiio entre espirito e corpo. Por isto, um outro modo de expor esta mes- ‘ma preocupagiio aparece quando se contrapde a imediatez da expresso cor- i cultura audiovisual, as mediagdes conceituais dos sistemas representativos, Ou ento, quando se reflete sobre a diferenga en- lao (“massa”) e a apregoada racionalidade do ntropdlogo”, a debrugar-se sobre a funedo das imag sages, imagens, devaneios, etc.) na orientaedo pri Por isso, retoma-se no pensamento contemporaneo « pergunta espinosia- na (de inspiraco renascentista e barroca) na Etica “Que pode o corpo?” Da resposta de Espinosa se infere que ninguém tem condigdes de sabé vez que niio se conhecem os limites das afecgdes, co poder hum: afetado'?, No pensamento espinasiano, o corpo humano é uma multiplicida- de ou uma complexidade, composta de corpos diversos, cada um dos quais, por sua vez, implica outras composigdes'*. Tal complexidade toma-o capaz de afetare ser afetado por corpos externos, com os quais interage no meio cir- cundante, Alma e corpo so a mesma coisa, apenas manifestada de formas diferentes, tendo a corporeidade relevancia e precedéncia, uma vez que aalma 6 a sua idéia ou a sua representagio. E a capacidade de associagao entre idéia e ‘corpo quesuscita a imagina¢ao. Esta se eleva no plano do conhecimento e faz da corporeidade uma poténcia afirmativa do ser. ‘Na mesma esteira de pensamento, a psicandlise atesta que no exis- te uma identidade inerente entre corpo e psiquismo, esclarecendo que, do ponto de vista do individuo em desenvolvimento, “o self e 0 corpo nio sio inerentemente superpostos, embora para haver saiide seja necessirio que esta superposicdo se tome um ato, para que o individuo venha a poder iden- 2 lo que, estritamente falando, nfo é 0 self", $6 aos pou- ismo chega a um acordo com 0 corpo — em termos espi apenas na medida em que o conhecimento diferenciado da alma acompanhe 0 do corpo. A infinita ¢ imediata expressividade do corpo leva a suposigao de que 0 alegado poder tinico, Um exemplo talvez pequeno, mas certamente significa tivo, mostra-se no teatro, quando a qualidade de expressiio no corpo do ator transcende a qualidade do texto, fazendo as vezes com que um roteiro medi re ganhe dimensdes notaveis no palco. Fatores como ritmo, tempo, entrosa- mento, energia, gesto e corpo sobrepdem-se a literalidade da pega. Por outro lado, uma parte ponderivel do pensamento contemporanco & atravessada pela intuigo de que a dimensfio dos afetos pode eseapar da apregoada onipoténcia da razdo metafisica. O regime afetivo da alegria & écfini sempre Ihe faltaré uma razio de ser que seja convincente ou mesmo sim= plesmente que possa ser confessada e dizivel. A lingua corrente diz muito mais a respeito do que geralmente se pensa quando fala de ‘alegria louca’ ou declara que alguém esta ‘louco de alegria” E também o caso do liberal-pragmatista Rorty, quando opde ~ como, © fizera no passado Kierkegaard, a0 apontar a ironia como entre sujeito e mundo, entre 0 estético e 0 ético —a figura do w pensador metafisico a do ironista, que privilegia a dimensfo afeti quanto o metafisico considera que a caracter dos outros seres humanos é a sua relagio com um poder comum mais vasto ~a racionalidade, Deus, a verdade ou a historia, por exemplo — 0 ironista considera que a definigdo moralmente relevante de uma pessoa, de um sujei- to moral é ‘algo que pode ser humilhado’. O seu sentido de solidariedade humana bascia-se no sentido de um perigo comum e ndo numa posse co- ‘mum ou num poder partilhado""*. Em suma, sentimento em vez de razio. Assim como Rosset descarta por detris da alegria ~ seja un 1alquer hipétese de uma grande causa “eu” sensivel e poderoso, seja uma objetiva D.W. Netureza humena, Imago, 1990, p. 144 rent. Alegria: « forga maior. Relumo-Dumard, 2000, p.25. 4. Rorty Richard Chatinninrin innin tliderineaee Prasancy 100? 124 presenga permanente —e aponta para uma espécie de “forga mai ria a aprovagio incondicional da vida, Rorty no ac quer outra ordem necessiria, como fundamento do humano. Ele troca feréncias explicativas, feitas a partir de uma essenci pelo sentimento, entendido como suscetibilidade comum a um grupo so- |. E 0 sentimento, desde a explicagao de Hobbes sobre a origem da co- ‘munidade e da politica, derivaria de uma emo¢ao primeira, dominadora, que pode ser chamada de “medo”. Razio e afeto Estamos aqui, nos dois exemplos citados, longe da necessidade e do ‘gos, em plena zona obscura, contingente ia dos afetos, isto é, da das diferengas, é desde a Antiguidade grega 0 caminho dominante para 0 conhecimento ea verdade. H a via que, dotada de metron ou justa medida, induz ao pensamento e & capacidade de fazer inferéncias logicas, ensejando assim 0 controle das possiveis desmedidas da emogio ou paixio. Trata-se, portanto, da razdo, concebida como lucidez ¢ sabedoria ca implicadas na conduta prudente ou sabedoria prética da phronesis, mas também como valor de medida e de normativizagao. Na realidade, a genea- logia da razio aponta para uma cidade, cujos nomes sto, de um lado, ‘Traduzindo-se toda a amplitude do fogas como ratio, privilegiam-se a ‘medida e a norma e se abre caminho para um dogmatismo que, a pretexto de adesao a gravidade do pensamento, desconhece, irrefletidamente, a po- ‘éncia emancipatéria contida na iluso, na emogiio do riso e no sentimento da ironia, Esse dogmatismo decorre da idéia do logas como redugao da di- versidade do real (a infinitude dos opostos, o mistério da diferenga) a0 pério da unidade. Nao se trata, portanto, do mesmo “um” heracliteano, que Mantém a porta aberta ao diverso. para os pensadores ancorados no platonismo, trata-se de uma faculdade teligivel ora como uma operagao articulada da inteligéncia (Filosofia esco- Léstica), ora como uma faculdade de absoluto, voltada para a explie tima dos fendmenos nas trés idéias transcendentais do eu, do mundo ¢ de Deus (Kant). No aspecto objetivo, a razo € tanto o conjunto das nogées pri- meiras (ser, substincia, identidade, causa e fim) e dos prineipios implic 1nos raciocinios (contradigo, razdo suficiente e substincia) quanto das das causas que tornam inte iss0 tudo ressoa fortemente a doutrina platénica. Em sua famosa ale- goria da caverna, narrada como mito no didlogo entre Socrates e Gléucon (A reptiblica), Platio mostra que, para os homens aprisionados e distantes, da luz do sol, a verdade da caverna sfo as sombras ou as silluetas das coisas, que se projetam na parede, a luz do fogo. Sombras no so propriamente coisas, ¢ sim os seus indicios. Sem as referéneias bisicas, os homens dei- xam de perceber as sombras enquanto tais e vivem de sensagdes, isto é, da mera aparéncia, que é a0 mesmo tempo a sua realidade a impossibilidade de fazer a distingZo entre as coisas e suas projegdes. Nesta pura sensibilida- de em que consiste o ser das sombras, sem se dar conta de sua radical escra- vidio, o homem nao pensa livremente, no se realiza como pleno sujeito da raziio e da linguagem. Para a realizagdo dessa plenitude, ndo se pode obliterar a dimensao ob- Jetiva do racionalismo ~a inteligibilidade, tanto em seu sentido nominativo quanto genitivo, dos principios, das leis e das causas ~ que faz da razio nao um atributo essencial colado a uma etnia ou a uma civilizagao particulares, mas uma “tecnologia” de conhecimento inerente a experiéncias historicas diferenciadas. Greco-romano que seja 0 ideal da razo, esta nio se reduz, em sua efetividade operacional, 4 geografia civilizatéria do Ocidente. Dentro de certas praticas culturais perpetuadas pelas academias, a ra- zo pode, entretanto, privilegiar as derivas metafisicas de seu aspecto sub- Jetivo e, entio, exercer-se como objeto de um culto quea considera uma fa- culdade, inerente & “natureza’” humana ¢ capaz-de romper o véu das aparén- cias no rumo de uma realidade “verdadeira”. Alids, no apenas nas acade- mis de feig2o ocidental: na tradigao religiose do hinduismo, a palavra gurt compde-se de dois étimos que significam “romper as trevas”, isto é, pene- rar nas aparéncias que obscurecem a verdade. S6 que no Ocidente, desde o reequilibrio racional entre ordem divina e ‘ordem humana perseguido pelo teatro grego ~ pasando pelas doutrinas de Platdo e de Aristoteles, que pregavam 0 conhecimento como acesso a uma realidade superior, verdade transcendente, como medida de todas as ¢oi- sas, tomou-se a garantia do primado da racionalidade cognitiva do logos unificador. Esta racionalidade deveria referir-se, em principio, dominio técnico da razdo, mas na pritica social implica a ditadura l6gi razio enquanto dominio universal. Na doutrina cristd (neoplaténica), Deus se faz Verdade; no conhecimento, a ciéneia se faz deus. ‘Assim, desde os pré-socraticos ¢ estéicos ~ estes iltimos indiferentes & sensibilidade e aos instintos, submetidos & medida da “Lei"*- o Ocidente ha- bituou-se a fazer a distingdo entre 0 racionalismo cognitivo ¢ as tensdes ou perturbages da alma conhecidas como emogdes ou sentimentos, que Aristé- {eles designava como to pathos. Esta palavta cli conta da impressio moral ou fisiea causada por idéias, pessoas e coisas. Em grego, ela tem um amplo al- cance semantico, mas 0s latinos a traduziram como passio (de patior, softer) para sublinhar o que o homem “softe”: a passividade vitimizada de sua expe- riéncia, Atistdteles, que fez da paixilo uma de suas dez categorias, observana Retérica que “as paixSes sio todos aqueles sentimentos que alteram 08 ho- mens, a ponto de afetar seus juizos e vém acompanhiados de dor e prazer, como a ira, a compaixéio, o medo e seus opostos” (Livro Il, 1377 b). ‘A dicotomia radical entre paixao e juizo, mas igualmente a ambivaléncia darazio, exprime-se pocticamente na tragédia 4s bacamtes, de Euripides, em que a racionalidade tiranica e colérica do Rei Penteu se contrapée ao univer- so insensato ¢ apaixonado do culto ao deus Dioniso. Na peca, como se sabe, 0 ‘guardido da racionalidade (Penteu, auxiliado pelo vidente Tirésias) termina sendo despedagado pelas tebanas enfurecidas, dentre as quais a sua propria, mie, Agave, No embate das diferentes forcas, fica patente que ha uma parte de paixao, logo de loucura ou de delirio, em toda raz. Na Idade Média, og escolasticos entendiam paixdo como qualquer mo- Vimento do apetite sensivel. Alberto Magno (professor de Santo Tomds de Aquino) designaria essa experiéncia como affectio, geralmente traduzida por ‘afecgdio ou afeto, Para Santo Agostinho, termos como affectio, affectus, pas- siones so simplesmente sindnimos. Vale assinalar que, nessa ordem dos fenémenos humanos, onde tem primado o sensivel ou a sensibilidade (entendida como propriedade de aco- Iher impressdes ¢ excitagdes, a elas reagindo com operagdes distintas dos processos intelectuais), os conceitos revelam-se patticularmente impreci- 80s, a despeito do empenho tradicional da disciplina filosofica e, depois, da psicologia, da psicossociologia ¢ da psicanilise. Os termos podem tocar-se € confundir-se, enquanto os teéricos propéem demareagSes para uma sino- nimia genericamente relativa aos estados contrastados de dor ou de prazer, que constituem os prototipos ou matrizes psiquicas dos afetos. at ites se designava como afecgao, a exemplo da doutrina de Espinosa: “Entendo por paixdes (affectus) as afec- s) do corpo que aumentam e diminuem a poténcia do agi diferenga entre Afeto & nome recente para 0 '”, Deste modo, sendo a af: fectio um estado do corpo afetado por outro presente, ¢ 0 afféctus, uma pas- sagem de um estado a outro, sio diferentes as afeccdes-imagens ou idéias dos afetos-senrimentos. O afeto supde uma imagem ou uma idéia, mas a ela nao se reduz, por ser puramente tran: No pensamento espinosiano, o entendimento do que seja a afeesio pas- sa pelo de “modo”. Existe, para ele, em tudo que é, ra coisa. O modo, ser em outra ci que &, define-se como 0 conj segundo termo da alter ito das afecedes de uma subs- Como expliea Deleuze, “um dos pontos essenciais do espinosismo reside na identificagdo da relagao ontolégica substancia-modos com a relagao diferentes da substancia em esséncia ¢ em existéncia, os modos sto produ- Zidos “nesses mesmos atributos que constituem a esséncia da substincia”. Pois bem, as afecgdes equivalem aos modos, que se acham presentes tanto no corpo como no espirito. Corpo é um modo da extensao, ¢ coisa; espirito é um modo do pensamento, portanto idéia do corpo que Ihe corresponde. Emosiio, paixio e sentimento Hoje, termos como a/eicdo ou afeccdo, provenientes de affectus e af: Jectio, entendem-se como um conjunto de estados e tendéncias dentro da fungdo psiquica denominada afetividade, mais especificamente, uma mu- danga de estado e tendéncia para um objetivo, provocadas por causa exter- na, Afeto, por sua vez, com a mesma etimologia, refere-se ao exercicio de uma a¢do no sentido B, em particular sobre a ser necessariamente vivo, A ago de afetar (no latim cl Espinoso: ilosofia prética. Eecuto, 2002, p. 92. meno afetivo que, ndo sendo tendéncia para um objetivo, nem uma dentro para fora (a estado de choque ou de perturbagao na cons. is, afeto pode muito bem equivaler a idéia de energia psiquica, em busca de prazer, 6 provocado pela descarga da tensio" Fixemo-nos no estado designado pela palavra “emogo” por sua alta fre- giiéncia no vocabulirio mademo da afetividade e por um certo consenso ted- rico no sentido de que ela di unidade aos fendmenos sensiveis, fazendo com iio deriva do latim emovere, emotus— donde, commuovere. Inti sado verbais referem-se a um “movimento” energético ou e ‘um ponto zero ou um ponto origindrio na direcao de um outro, como conse- qiiéncia de uma certa tensio, capaz de afetar organicamente o corpo huma- ” significa abalado, sacudido, posto em movimento. plo de Hobbes que, para explicar a origem da paixilo, recorre a id percurso, cuja primeira etapa, a da apreensio sensivel do objet mogaio cerebral provocada pela “concepeo” ou aparéncia do o| gunda ctapa, a mogio € suscetivel de transformar-se no coragdo em dor ou prazer”'. Ai entéo, denomina-se propriamente paixdo, no sentido hoje cor- rente de emogio, A emogio ¢ um tipo de afeto que se costuma atribuir exclusivamente 449s seres humanos, embora comporte a possibilidade de ser também pensa- da como trago do animal. A tradigio metafisica registra varios si /os da natureza do animal, desde os que Ihe atribuem uma zoivel” (Plutarco, Montaigne, Spencer) ou uma “alma sensitiva” (Aristé- teles, Santo Tomas de Aquino, Leibniz) até os que o concebem como uma méquina ou “autémato” aperfeigoado (Descartes)””. HA, assim, reconheci- 19.Ct Lolande, André. Vecabulério éenico @ertco de filasofia. Martins Fontes, 1999, percepgées/ofecsdes(dimenséo subjetva da jos como uma dimensao impessoal, caper: como objeto, @ exemple do formas euto-sficientes ff, Qu ” nele existentes, como o jtibilo, a tristeza, o temor, o amor, 0 ddio, esto 1 das sensagdes, portanto das operagdes consideradas “inferiores” festagdes sensiveis do homem ¢ as des de se inscrever a dimenstio iva na razio e no pensamento, dominios da inteligéncia e do sentido, por- que ela no se} a. como uma estrutura: & forma organizada. dem de idade e compreensio, portanto um modo existencial ¢ dia- légico em que ressoa sempre, necessariamente, mais de uma voz. Damiésio, um especialista contempordneo em processos neuroqui cos, resume essa diferenga, afirmando que “as e de ra ram em toro de objetivos, opgdes de ago, previsbes de resultados futuros eplanos para a implementagao de objetivos em diversas escalas de tempo”, enquanto que “ grante da maq por controles homeo: cos, impulsos e insti como ja havia assinalado Espi esséncia da emogao como a col Gio de mudangas no estado do corpo que so induzidas numa infinidade de 6rgaos por meio das terminagdes nas células nervosas sob o controle d sistema cerebral dedicado, 0 qual responde ao conteiido dos pensam relativos a uma determinada entidade ou acontecimento™, Parece ser-lhe cara uma citagao do pragmatista William James: “Cada objeto que excita 10 excita também uma emogao” Damasio preocupa-se especialmente com a vinculagdo dos sistemas ce- rebrais a comportamentos de planejamento ¢ decisio “pessoais e so por uma partilha entre o que se chama de racionalidade e 0 processé mento de emogdes. Partindo da nogao de corpo como organismo vivo com- plexo, pleno de processos em const icacio, ele sustenta que a capa- do para “exist, inte, logo panso". Nahi do pensamenta, esa néo & ume proposigae nova: no pessado, foram varios os pensodores & em grande parte a forma de imagens reciso que essas imagens estejam ativas e baseada nao ape- ue se da a conhecer como afetos ¢ que constituiria um elo essencial entre o corpo e a conscién- cia, Tra nto da emogo enquanto percepedio direta dos esta- is quanto do emocionalismo, ou campo proprio do amor, da rai- va, da alegria, da tristeza, das diversas paixdes. Evidentement igéncia nfo depende da consciéncia clara de um “eu” puramente racional, j4 que so muitas as formas de compreensio que caminham na obscuridade. Mas a int éncia emocional dos best-sellers correntes é geralmente entendida como eficacia do estado afetivo, portanto, ‘como pretexto para o controle gerencial das emogdes apaixonadas em fungio de uma racionalidade ins nental, que se pode pér a servigo da cri dade na produgo, mas principalmente em fungo do consumo, Seu apelo di- rige-se ao “corpo do consumo’ a representagGes corporais afinadas com as formas mutéveis necessérias i ripida evolugao das mereadorias, a po- icas farmacolégicas de satt- e mental e a cultura midiatica das sensagdes, emogdes e paixdes. Emogio nao é exatamente 0 mesmo que paixdo, embora dela se aproxi- me 0 sentido primal de paixio (ambos os afetos cabem no grego pathos ow paskhein), designando tudo o que acontece de novo a um sujeito, Assim, fa- lar da vida como uma paixao falar, filosoficamente, da vida como uma di- namica em que se morre continuamente para deixar surgir 0 inesperado, ou o novo da existéncia. A ica um estado emocional continuado ou duriivel, portanto mais persistente do que o instantineo abalo animico da emogao. Ela predomina sobre outros recursos sensiveis, como no exem- plo clissico da paixdo por dinheiro por parte do personagem Harpagio (em Moliére. Mas na Europa do século XVII chamava-se a emo- ‘do de paixdo (na verdade, este termo recobria o conjunto dos fenémenos da ate passivamente submetido, segundo Espinosa, ico”, por exemplo: “Frente A paixao, a razo é im- potente, dade da alma), mas que refloresceu no século XVII, quando amadurece um processo de quase quatro séculos de formagao de uma mentalidade quant ficadora, logo uma racionalidade instrumental, por exigéncia das transfor- ‘mages no modo de produgo econdmica ¢ das novas estratégias de domi nio, em que assume lugar primordial o poder de cileulo da ciéneia, A cons- cigncia universalista da modernidade européia — sempre regida pela dimen- sio da medida implicita no logos unificador grego — preside elaboragao de uma vida social mecanica e previsivel. Por isto, Crosby pode referir-se a uma vocagdo “pantométti Ocidente, isto ¢, a uma inclinagao histérica para a medio universal das coi- sas, dentre as quais 0 proprio planeta. As evidéncias aparecem no comércio, com o controle minucioso de receita e despesa pela contabilidade, em subs- tituicdio a meméria do comerciante; na misica, com a representagio grafica dos sons, que altera os caminhos da composigdo e do canto; na pintura, com a preciso geométrica da perspectiva; no tempo, com a cronometria, dos relogios; no espago, com o ordenamento técnico dos mapas ¢ dos trumentos de navegagdo. Mas igualmente no corpo humano que, a partir do século X VIL, se dissocia do conceito de pessoa, convertendo-se num ob- jeto entre outros. Como a came se revela um embaraco para a racionalida- de, banaliza-se o recurso a metifora mecanica para designare tecnologizar a corporeidade. No transe de sua quantificago cientifica e tecnolégica, 0 mundo mo- derno comega a suspeitar mais fortemente dos afetos ou paixOes, enquanto insténcias de confuséo ou de uma desmedida socialmente indesejivel. A ci- vilizagio ocidental avanga no sentido do controle (ora a medida técnica, ora a repressio) das pulsdes, sejam sexuais ou agressivas, Até na guerra a so- ciedade civilizada impde a seus membros um dominio rigoroso da afet dade, para que a capacidade de destruigao se adapte & mecanizagdo. A ex- citagdo guerreira passa a ser despertada por catistrofes, doutrinas e propa- ganda, como observa Elias: “E preciso perturbagées sociais e uma grande miséria, é preciso, sobretudo, uma propaganda poderosamente orquestrada para despertar no individuo e legitimar de qualquer forma os instintos re- calcados, as manifestagdes pulsionais proscritas na sociedade civilizada, tais como o prazer de matar ¢ de destruir™”*, Na paz, a descarga das pulses converge para a pritica do esporte ou para o desfrute do espeticulo. 25.Cl. Crosby, AW. The meosur of cealty - Qua ‘Combriige Universily Proc, 1997. tion des moeurs. Colman-Léw. 1973, 0. 294. fication and Western Society, 1250-1600. Diante de pressdes ci veis nas transformacdes da forga de trabalho e das relagdes de produgao, in- tensificam-se a visio racional-materialista do mundo ¢ o deslocamento do pensamento do ser como substancia para o ser como sujeilo, lastreados pela doutrina cartesiana (O discurso do método é de 1637), a partir dos notaveis progressos da Astronomia e da Fisica. Com Descartes, o primeiro grande fildsofo da modemidade, a racionalidade confirma-se oficialmente como ratio, isto 6, medida e norma. “Método” é precisamente esta modalidade de raziio, que agora leva o dominio do sera passar pelo controle do sujcito, Em ‘As paixes da alma, Descartes preconiza 0 controle das “inclinagoes ani mais”, inclusive 0 medo, por meio do pensamento, da razio e da vontade. Na reflexio cartesiana, o espirito pensa e sente (por estar ligado ao cor- po) na medida em que é um “eu” racionalmente consciente de si mesmo. Sentir 6, no limite, pensar, Entronizada, a razio deve sempre transparecer na representacaio e no sujeito, Este iltimo termo deve ser entendido como um “suporte” ou um “sustentéculo”, isto é, uma identidade capaz de susten- tar ou servir de fundamento para a mudanga: ainda que mudem as qualida- des acidentais, o sujeito permanece idéntico a si mesmo. Com Descartes, 0 de “eu penso”, garante a subjetividade do sujeito, logo, a subjetivida- de da consciéncia, afirmando a identidade pessoal. Constituidas em objeto, as representagdes dispdem-se racionalmente & consciéncia pensante (e “sen- sitiva”), sempre idéntica a si mesma. No século XVIII, ainda fortemente cartesiano, entendem-se filosofica- mente as paixées (logo, a “desmedida”) como 0 conjunto dos fenémenos passivos da alma, O universo-méquina de Descartes se ajustaria perf ‘mente, para seus diseipulos ou sucessores, & metifora fisicalista e industri lista do mundo dos homens como um sistema maquinico a vapor, onde a alma podia existir, mas apenas como o principio (racional) de um momento termodindmico, uma quantidade de movimento, desencadeado no corpo, Pelo curso dos espiritos animais. Descle enti, passam a ter realidade aceitvel apenas os fendmenos que se reduzam & observagao objetiva por parte de um sujeito e racionalidade das leis de causa ¢ efeito. No pensamento kantiano, cujo programa basico & © estudo da razo, o ideal moral é atingir a insensibilidade (apatheia), em- bora sem 0 radicalismo da ataraxia estdica, uma vez que admite a manuten- so dos sentimentos espirituais, como o sentimento do belo, a amizade, 0 amor da verdade, ete. A essa teflexflo, separada da esfera dos afet dos circulos filoséfic 3B pensamento hindu, nao sistematizada, mas com presenga em varios grandes mestres da yoga, segundo a qual o mundo do maya (a ilusdo enganadora) é ‘atividade mental desligada da realidacle e em que as nossas projegdes ¢ in- terpretagdes predominam sobre os afetos. O hindu no crit intelecto em seus aspectos de atengaio beracdo, sim o intelectualismo especulativo que transforma o homem em cabega sem coragdio nem corpo”. Algo desse e reflui para o pensa- co, ¢a partir dai tende a desaparecer a nuance pejorativa atri- buida passividade das paixdes, que passam a ser louvadas como afetos in- dispensiveis d grandiosidade das ages. E certo que, antes disso, a estética kantiana havia pre} sa aatividade do mitimos nossos pensamentos, dois modos (mod!) de comp0-los, um dos quais se chama maneira (modus aesthe, rdo (modus logicus), que se distinguem modo nao possui ne- thum outro padrio que nao o s o de que hé unidade na apresenta- $80 (dos pensamentos), ao passo que o segundo segue em tudo principios indeterminados” (Critica do juizo, parigrafo 49) Masai ainda é visivel a hegemonia do sujeito ¢ da razio. O problema da diferenga entre o int itima sempre foi perturbadora do primado racionalista — basta lembrar Descartes que enxergava um malin gén espécie de espirito travesso, atuando sempre na espontancidade da expe- rigneia contra as leis da necessidade e da causalidade. Iconoclastii do pensamento No campo filoséfico, Schopenhauer foi o primeiro a sistematizar aqui que na época pode ser elogiosamente classificado como uma “iconoclasti contra o primado da causalidade logica e da necessidade absoluta em ter- mos da existéncia human como voniade e repres diante da idéia da Je jd manifesta o seu espanto 1, mostrando que, apenas no do- tas que ide Iuto (Hegel) ou véem o mundo como “substancia absoluta” (Espinosa) ~ Schopenhauer coneebe a existéneia humana como mergulhada na pura con- tingéncia, sem que qualquer interpretagao racions inclusive as da tri- unfante cigncia, seja capaz.de preencher a breche da explicagio causal. Sua indignago pessimista diante do mal ou da dor procede da consciéneia da auséncia de just as ou de causas absolutas, 0 que leva o homem & ex- I da contingéncia, isto é, de algo que aparece de uma forma, mas que bem poderia aparecer de outra completamente diferente. Desiludido com a possibilidade de uma metafisica explicagao altima, Schopenhauer concebe, entretanto, um substrato para os fendmenos, as cau sas fisicas e as representagdes do mundo, que é a fore \cipio dina sterioso ou inexplicado em face da conseiéncia que, em sua forma “Vontade” ou “Querer” (IFille, em alemio). O termo, proveniente de um vocabulério tradicional, pode prestar-se a confusdes. Nao se trata de mera funedo premeditada da consciéncia, ¢ sim de uma forga subjacente & pulsora) grega. Ea luz desta genealogia semantica que se deve entender a adocéio desse termo por Schopenhauer (e inclusive a sua retomada por Nietzsche). A Vontade (com maiiscula, para distinguir Querer global da vontade individualizada) significa o primado do afetivo sobre 0 0u seja, o condicionamento do espfrito pelo dominio do que, no século XIX, se concebiam como “paixdes” ‘Uma manifestago conereta desse estado afetivo radicalmente oposto a tepresentagdo, a mais pura expressao da Vontade, ¢ a miisica, para Schope- nnhauer. Esta ofereceria a tradugdo mais profunda da interioridade das 588, porque, revelando-se como temporalidade pura do vir-a-ser, no se dei 28, Schopenhauer. Le monde como volonté e! comme représentotion. PUF, 1966. Exste uma ‘radueda tensile desta ro as sico do pensamento ni loséficas do sé le (em alemao, Seligh ta opinidio de Rosset, o tema central de Nietzsche: “Provavelmen- do mesmo modo, outros termos conviriam: alegria de viver, géudio, jt- lo, prazer de adesfio & realidade, e ainda muitos outros, Pouco im- porta a palavra”, 0 que a he que, assim, se torna sujeito consciente da experiéncia transbordante da felicidade, da afirmagio beatifica do mundo. Essa experi rios dos afe mento. Em vé- 10s da Gaia ciéncia, Creptisculo dos idolos ¢ O viajante e sua sonibra, principalmente, Nietzsche empenha-se em mostrar como o pensa- mento da felicidade engloba o da infelicidade e do softimento. A afirmagio alegre do mundo ¢ a experiéneia da dor, para a qual deve o homem discipli- har-se, caminham juntas, E nenhuma razio fundamental, isto é, nenhuma es- séncia nem qualquer realidade escondida no fumdo das aparé; a0, testemunho afirmativo da existéncia perpassada pela alterndncia necesséria do prazer ¢ da dor. A paixdo de viver prima sobre qualquer explicagao inte- lectual da vida ou sobre a raziio enquanto forca suprema que gera a conscién- cia individual. Dai, a conhecida critica nietzscheana ao “homem meridiano”, e que s6 vé a claridade, a transparéncia racionalista da consciéncia ~ sob a pecha do ir racionalismo, é verdade ~ coincide em pontos fortes com aspectos cruciais do pensamento hindu que, mesmo reconhecendo o ilus6rio nas aparéncias, afirma-as como a realidade do mundo fenoménico, Esta ¢ real para o obser. vador, ja que lhe aparece como real. E essa realidade que © hindu busca in- tegrar, para abolir a separagao entre sujeito e objeto e atingir a plenitude ou um modo de consciéneia nio-dual, Nada aqui, entretanto, de fustio mistica 36 e do sujeito com o objete m de accitaglio da diversidade do real tal e qual aparece, com o fito de integré-lae chegar depois a uma experiéneia da uni- dade, que ¢ apenas um outro nome para a paixiio da vida, 0 amor , uma certa India e um certo Oci- Na dimensio dos afetos, como se dente abragam-se. Suto Apa ia ocidental como um: eam ° spirit, em geral de forma exagerada, subordinando e arrastando consigo outras inclinagdes espirituais. Isto & claramente cor- roborado no interior da tradi¢ao psicolé neesa, onde o sent também conotado como durivel, embora mais atenuado, enqua gio é aguda e efmera fa sobre o pensamento de Schopenhauer, candlise ~ uma teoria da experiéncia sensivel com impacto transformai na a conscigncia e a identidade do sujeito ~ particulariza 0 aventando oentendimento e a tradugio, Poroutro lado, dentro da teoria geral dos processos inconscientes, afeto ou “paixdo” pode referir-se tanto & nogio de quantidade de energia pulsio- nal (uma soma varidvel e descarregavel de e1 ‘um quantum de quanto a de uma qualidade subjetiva presente nos estados conseientes de prazer ou desprazer. Distinta do que se entende como “razao, entretanto in- terage com ela, como sustenta Freud: “O Ego representa 0 que chamamos azo ea reflexio, enquanto 0 Id, pelo contrétio, é dominado pelas paixdes (cf. Oego eo “acima de tudo, corporal ; centrada nas estruturas cerebrais mantém~: olhos, com o filho. Esta é a memoria afetiva ou pulsional Pulsdo, termo dificil e indeterminado, é uma espécie de mito conceitual criado por Freud para representar no psiquismo, por meio da idéia e do afe- to, um estimulo ocorrido numa parte do corpo. Embora seja ins corporal a sua fonte, pulsio nao se confunde com dade bioldgica, sendo de fato um ar entre o corpo biolbgico o simblico. Afeto &0 que assinala 0 desvio ou a transformagao do. em simbélico. E por isto pode mesmo a pulsao ser rte) nat ingue de qual- sobre esse termo, neuro- n propde agrupa todos os aspectos subje- ida emocional no si ivos da todas as nuangas que duos ¢ dos grupos, E no interior do campo metapsicologico, portanto, que se pode criticar PosieGes excessivamente representacionais ou unitaristas da forma tica, a exemplo do que faz Green com a teoria do seu famoso colega Jace ques Lacan. Para Green, a distingdo essencial feita por Freud entre os dois {ipos de excitagao pulsional correspondentes a representagiio de coisa e re- resentagdo da palavra (¢, conseqiientemente, a modos distintos de descar- ga dos processos psi que parece pas- sar ao largo da pluralidade dos materiais de trabalho inconsci terogeneidade psiquica, centrando-se na linearidade da | tras palavras, Green consura em Lacan 0 esquecimen recoloca no campo psicanalitico a tradicional di toc intelecto. A tealidade é que Lacan ou até mesmo seus opositores contomnam sem- Pre o problema da determinagio conccitual do afeto (preferem geralmente ater-sea seus efeitos), hesitantes diante de sua relaciio com velhas catego- metafisicas, como forca vital e vontade. Mas sem passat da metapsi- cologia a descrigio ativa da vida comum, a modernidade psicanalitica dos afetos ainda nao oferece saida para o vezo das antigas cosmovisdes meca. ti nde reina despoticamente a razo instrument: mandada por ficedes hist6ricas como os conceitos de relhado por uma mente ou uma consei __ Aneuropsicologia contemporsinea, por sua vez, trabalha com a suposi- ‘sao de que a imagem — nao enquanto forma fixa, mas como reinterp 51. Green, André. O icurs vive Uma teoria picanolica do afta. Francisco Ales, 1982, p. 20. 4 analégica de uma real cipal contetido do pei segunda direedo, pesquisas neurocog! cias no sentido de que a produgdo de mento, em forma consciente ou inconsciente, Nes- as vém apontando para evi jagens nos sonhos baseia-se em efei- ivo-motivacionai 0 psiquico e o corporal revelam-se em estreita conexao. Essa conexio ocupou sempre o centro de varias sistematizagdes meta- icas n&o-ocidentais, para as quais o mundo da natureza nfo se cons como totalmente exterior & individualidade designada como “eu”. Em ou- ras, 0 impessoal oa objetividade nao se revelam como exteriores o bastante para conseguirem reduzir o ser do homem a um “eu” cultural- ‘mente identificado no campo da experiéncia a um processo de objetivagio {que separa radicalmente sujeito de objeto e exclui a dimensdo do sensivel Na verdade, o impessoal, o natural, o sensivel— figuras de um cosmos rejei- tado pelo logos da modernidade ocidental — sto intimos da individualidade humana, exprimindo-se em tudo que a razio hegem@nica costuma designar tro-do-eu”, como 0 Efetivamente, mente, também com os inventores da racionalidade e Aris para os quaiis 0 pensament presente nos sentimentos de medo, curiosidade, preocupagio ou espanto (th diante do mundo e das coisas. A este pathos, tanto Max Scheler quanto Mar- tin Heidegger chamam de disposigdo ou situagto afetiva (Befindlichkeit), atribuindo-lhe um carater fundamental no exercicio do pensamento, por ser_ o clo entre ele ea vida. Jd Henri Bergson opta pela intwi¢do como uma es- pécie de trago vital entre a racionalidade ¢ o instinto que possi! géncia da reflexio filos6fica ‘Tanto a intui¢ao quanto o afeto constituem mesmo a base de doutri- "a exemplo de Scheler, para quem os valores como um tipo de ato que mostra a graduagio de um valor ‘preferéne la de valores, dos mais altos para os mais (dentro de uma escala diferent 82. Scholer, Max. Etica - Nuevo entoyo de fundomentacién del pensamiento etico, Revista ‘de Occidente, 1948. baixos) a partir de uma sensibilidade axiolégica primeira. Ou seja, a partir de uma percepgiio origi —que se entende como uma pereepgao ou uma “escuta” (Vernehmen em alemio), ¢ a qual Scheler atribui o mesmo nome que Pascal, “ordre du coeur® — pode-se acompanhar o conhecimento da al- tura relativa de um valor. Essa experiéncia é, para ele, "0 que obriga a distingio entre a objetividade de uma norma moral c a objetividade de um fato. E uma distingao trabalhada primordialmente pelo cireulo dis- cursivo da filosofia stricto-sensu. Heidegger, por exemplo: na sua visio, 0 que as ciéneias nomeiam como “irracional” é apenas um ponto cege da teo- tia, Na realidade, o dito irracional caminha junto com a racionalidade~ Pla- ‘80 chega mesmo a admitir, no didlogo Fedro, o carater benéfico de quatro espécies de loucura, tidas como dons divinos. Mas a questio ¢ igualmente pontuada pelos “pais fundadores” do moder= ho pensamento social. O proprio Augusto Comte niio deixa de observar em seu Cours de philosophie positive que a verdadeira qualidade do positivismo nio era a de tomar os homens mais sistematicos, e sim mais “simpaticos” ou sinergéticos. Quanto ao positivista Emile Durkheim, que faz. da racionalida- de o modelo teérico ¢ pritico do entendimento social ¢ da virtude humana (jé que 0 “social”, scu suposto objeto cientifico, integraria e regularia racional- mente os individuos), também nao deixa de acentuar — particularmente em sua obra posterior ao inicio do século XX — que todo e qualquer tipo de razao assenta-se em bases emocionais. Dai a importncia por ele atribuida as cren- as, seja na religito, seja nas praticas de magia, em que as relagies de causa- lidade, mesmo quando predominantes, contém algo de mistério ow de inde- terminagio, capaz de resistir as medidas da razao suficiente. E convém nao cesquecer que Comte acabou convertendo o seu grande sistema de racional zagio do mundo, o positivismo, numa religido. Sem divvida, 0 pensamento alemdo (Dilthey, Simmel, Weber) é 0 mais icito na oposigao as concepgdes causalistas que possam desembocar no determinismo social. Weber, a quem se tenta entronizar como pai da ra- cionalidade instrumental moderna por conceber a racionalizagio como um destino, pde em diivida a imanéncia da racionalidade ocidental expressa no. capitalismo, apontando para o quanto de irracional existe no homem posto em fungdio de sua empresa e nao 0 inverso. Diz ele: “A racionalidade é um conceito histérico que encerra todo um mundo de oposigdes. Cabe-nos pes- quisar de qual espirito nasceu esta forma conereta de pensamento e de vida racionais: a partir do que se desenvolveu essa idéia de profissio (Berufs- Gedanke) e de devotamento ao trabalho profissional (Berufsarbeit) ~ tio ir- racional, j vimos, do ponto de vista eudeménico do interesse pessoal —que foi, contudo, ¢ que permanece um dos clementos caracteristicos de nossa cultut mo neoplaténico, a f crista, responsavel pela cristianizagio do Ocidente, sempre teve mais a ver com os sentimentos de compaixao, misericordia e com os valores afetivos da caridade (quando niio com as paixdes genocidas que levaram ao exterminio de pagios) do que com a razdo teolégica. Kier- Kegaurd, alids, em sua recusa da totalizacdo racionalista empreendida por Hegel, nao se cansa de mostrar como as mediagSes racionais da ética eae sujeito ¢ objeto so subvertidas pela fé religiosa. Diz ele: “O eristianismo espirito, 0 espirito é interioridade, a interioridade & subjetividade, a subjeti- vidade é essencialmente paixio, e no seu grau mximo, um interesse infi- nito, pessoal ¢ apaixonado por sua propria felicidade eterna”. Para este anti-hegeliano radical, a fé religiosa, fendmeno particular e especifico, sus- pende “teleologicamente” a dimensio universal-ética, a exemplo de Abrafio (cf. Temor e tremor) que, dispondo-se a sacrificar Isaac como prova de fi- delidade a Deus, transpde a cmoda simetria individual e social da ética e arrisca-se ao abismo da razio ¢ da linguagem. ‘Nao raro, porém, a propria razao emerge do afeto. Por exemplo, um jo- vem convocado para o servigo militar obrigatério pode vira ser um soldado apaixonado pelo Exéreito, mas nada elide o fato de o recrutamento ter sido uma operagio de forga, independente de qualquer racionalidade por parte do recruta, Se trocarmos de operacio, substituindo a forga pelo convenci- mento, desponta a racionalidade do ato. Eo convencimento, a persuasio, a sedugiio, ou qualquer outro nome dado a isso, que preside & racionalidade, 0 afeto vem primeiro e induz a arquitetura racionalista Isto nfo quer dizer que se tomar soldado seja um acerto existencial, e sim que ha racionalidade na coeréneia entre essa condigiio e os fatos afetivos (emogao, credulidade, desejos) ao redor da decisio favoravel a vida militar. Ede conhecimento corriqueiro o fato de que, a despeito de sua sofisti- cago racionalista, muitas das doutrinas ou das ideologias que marcaram a cultura ocidental atraiam inicialmente os seus cultores por pressées mais emocionais do que propriamente inteleetuais. Quantos nao trilharam o ca- minho do marxismo revolucionario em virtude da compaixo para com os ‘oprimidos ou os desfavorecidos? E quando se concebe a filosofia como ati- fame, Plon, 1964, p. 7. 33. CL ogleton, 3, Weber, Max. UFthique protestant et esprit du cop 34. Kierkegoord, Soren. Concluding unscientific postseript.Princoton, 1941 Teny. A ideologia do ostéica. Zaher, 1990, p. 136. 4 1r1a NO plano da reflexdo, nao esta implicita a paixo pela liberdade? © mesmo ocorre com as paixées religiosas que, freqiientemente, atin. gem 0 paroxismo fundamentalista. Um bom exemplo & 0 fundamentalismo islamico em regides de escassa tradigao escrita, O islamismo é sabidamente uma religido de vinculagao visceral ao Livro, 0 Cordo, revelado ao profeta, ‘4 na primeira surata, o arcanjo Gabriel, diante da resposta do profeta de que & analfabeto, ordena-the, todavia, ler “em nome do Senhor”. A fé mn gulmana e a leitura sio, em prinepio, inextriciveis, Entretanto, em regides do mundo sem nenhuma tradigio escrita, pode ocorrer mais a “emogi da letra” do que a sua eseuta racional, privilegiando-se assim apenas win dos modos possiveis de conhecimento, E que aparecem na historia do pensamento mugulmano trés grandes modos de conhesimento assim definidos: a) comentério, que se vale prin, cipalmente do recurso da analogia e implica erudigao lingiistica, assim o conhecimento dos exegetas tradicionais; b) 0 racionalismo, que se basels, na demonstragio ¢ ¢)a mistica aliada ao racionalismo, que langa mao da in. luigdo sensivel, ou seja, parte do assentimento entendido como submissao 0 saber do Livro, mas se complementa por meios intelectuais diversos"™, © fundamentalismo caracteriza-se por um assentimento imefletido ao Livro, sobrepondo o sensorialismo (a “emogao da let ’) as praticas da con- trovérsia, que foram intelectwalmente estimulantes para o pensamenio mu. gulmano elissico, o mesmo que desenvolveu a matematica, a medicina, a 6tica e transmitiu a cultura cristata filosofia grega. O contetido do Livro igi. Se-se, assim, & consciéncia do crente como algo sensori |, como puro emo- Cionalismo dogmatico. Com os evangélicos, nas empobrecidas zonas peri- fricas da América Latina, registra-se algo semelhante. Todo este processo tem, na verdade, escopo mais amplo do que o reli sioso. Especulando sobre como chegamos a dizer que sabemos ou temo certeza de alguma coisa, Wittgenstein mostra que “toda verificagaio do que se admite como verdade, toda confirmagio ou invalidagdo acontecem no interior de um sistema, [...] 0 sistema no é tanto 0 ponto de partida dos ar. Gumenios quanto o seu meio vital, Ele toma como exemplo o adulto que

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