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ALEXANDRE O’NEILL | RUY BELO

Poetas contemporâneos

EDUCAÇÃOLITERÁRIA

1. Lê os poemas a seguir transcritos.

Retrato próprio
Magro, de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio, e não pequeno:

Incapaz de assistir num só terreno,


Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos por taça escura
De zelos infernais letal veneno:
5

Devoto incensador de mil deidades


(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades:

Eis Bocage, em quem luz algum talento;


Saíram dele mesmo estas verdades
Num dia em que se achou mais pachorrento.

10 BOCAGE (1985). Antologia Poética (organização e introdução


por M. A. C. Mourão e M. F. P. Nunes). Lisboa: Ulisseia, p. 125.

Autorretrato
O’Neill (Alexandre), moreno português,
cabelo asa de corvo; da angústia da cara,
nariguete que sobrepuja1 de través2
a ferida desdenhosa e não cicatrizada.
Se a visagem3 de tal sujeito é o que vês
(omita-se o olho triste e a testa iluminada)
o retrato moral também tem os seus quês
5 (aqui, uma pequena frase censurada…)
No amor? No amor crê (ou não fosse ele O’Neill!)
e tem a veleidade4 de o saber fazer
(pois amor não há feito) das maneiras mil
que são a semovente5 estátua do prazer.
Mas sofre de ternura, bebe de mais e ri-se
do que neste soneto sobre si mesmo disse…

10 O’NEILL, Alexandre (2012). Poesias Completas. Lisboa: Assírio & Alvim, p. 171.

ENC12DP © Porto Editora


Poetas contemporâneos

1. sobrepuja: ultrapassa. 2. de través: de lado. 3. visagem: trejeitos de cara; careta.


4. veleidade: desejo irrealista, fantasia. 5. semovente: que se move por si mesma.

Autorretrato
Estado civil casado
nacionalidade portuguesa
triste se alegre e sorridente quando triste
muito mais egoísta se se veste de altruísta
chefe só de família e olhar cansado
calva prometedora e tendência obesa
à beira dos quarenta anos de idade
5 e ajoujado ao peso de vários passados
tímido e trágico e capaz de crueldade
tanta quão tamanho o arrependimento
temendo hoje não tanto já fazer o mal
como fazer algumas ou pior uma só vítima
incoerente e instável ora dado a bons bocados
como logo açoitado pelos ventos dos cuidados
poeta para mais por condição
10
homem que só pensar sabe afinal fazer
que vive a arte o amor a vida até como destruição
digam vossas mercês como devia ele ser
pois sempre assim seria inútil mesmo renascer

BELO, Ruy (2014). Todos os Poemas. Porto: Assírio & Alvim, p. 866.

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2. Evidencia as semelhanças que se estabelecem entre os três poemas, completando o esquema.

ENC12DP © Porto Editora


Poetas contemporâneos

Autorretrato

“Retrato próprio” “Autorretrato” “Autorretrato”


Bocage Alexandre O’Neill Ruy Belo

Perfil físico: __ a. __ Perfil físico: __ e. __ Perfil físico: __ i. __


Perfil psicológico: __ b. __ Perfil psicológico: __ f. __ Perfil psicológico: __ j. __
Perfil social/ Perfil social/ Perfil social/
comportamental: __ c. __ comportamental: __ g. __ comportamental: __ k. __
Estrutura formal: __ d. __ Estrutura formal: __ h. __ Estrutura formal: __ l. __

Tema: representação do “eu”


Género da tradição literária:
autorretrato

G R A M ÁT I C A RETOMA

1. Identifica os processos fonológicos ocorridos na evolução de vossa mercê para você:


vossa mercê > vossemecê > voss'mecê > vomecê > vom'cê > vômcê > você

SOLUÇÕES|SUGESTÕESMETODOLÓGICAS

ALEXANDRE O’NEILL
“Autorretrato” (p. 48)

Educação Literária

2. a. “Magro”, moreno (“carão moreno”), “olhos azuis”, mediano em termos de altura (v. 2), pés e nariz salientes (vv. 2, 4),
ar/aspeto triste (v. 3). b. Instável e impetuoso (vv. 5-6); crente no amor; pouco terno (v. 6); autocrítico (vv. 12-13); com
eventual tendência para a melancolia (v. 14). c. Impetuoso e excessivo na vivência do amor (vv. 7-10); anticlerical (v. 11);
talentoso. d. Soneto. e. “moreno” (v. 1), com cabelo preto (“asa de corvo”, v. 2) e nariz saliente (v. 3), ar/aspeto triste
(“angústia da cara”, “olho triste”), testa saliente (“testa iluminada”). f. Autocrítico, irónico, com humor (vv. 7-8, 13-14). g.
Crente no amor (vv. 9-13); tendência para a bebida (v. 13). h. Soneto (não dividido em estrofes). i. “olhar cansado” (v. 5),
calvo (v. 6), obeso (v. 6), com quase “quarenta anos de idade” (v. 7). j. Incoerente, instável (vv. 3-4, 13), reflexivo (v. 16),
vive a vida com intensidade (v. 17), autocrítico (vv. 18-19). k. “casado” (v. 1), “nacionalidade portuguesa” (v. 2), “chefe só de
família” (v. 5), “poeta” (v. 15). l. Versilibrismo (sem forma poética definida, sem rima, metro irregular).

Gramática

1. Assimilação (vossa mercê > vossemecê) e síncopes (vossa mercê > vossemecê > voss’mecê > vomecê > vom’cê >
vômcê > você).

ENC12DP © Porto Editora

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