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Manuel da Fonseca

EDUC AÇ ÃO LITERÁRIA | ESCRITA

1. A ação do conto “Sempre é uma companhia” decorre em terras do Alentejo.


1.1. Observa o mapa, em que se localizam os espaços referidos no conto.

ENC12COP © Porto Editora


BEJA

MESSAJANA

CASTRO VERDE

OURIQUE

ALCARIA

2. Lê integralmente o conto “Sempre é uma companhia”, incluído na obra O Fogo e


as Cinzas (publicada em 1951).

Sempre é uma companhia


António Barrasquinho, o Batola, é um tipo bem achado. Não faz nada, levanta-se
quando calha, e ainda vem dormindo lá dos fundos da casa.
É a mulher quem abre a venda e avia aquela meia dúzia de fregueses de todas as
manhãzinhas. Feito isto, volta à lida da casa. Muito alta, grave, um rosto ossudo e um
5 sossego de maneiras que se vê logo que é ela quem ali põe e dispõe.
Pois quando entra para os fundos da casa, vem saindo o Batola com a cara re-
donda amarfanhada num bocejo. Que pessoas tão diferentes! Ele quase lhe não chega
ao ombro, atarracado, as pernas arqueadas. De chapeirão caído para a nuca, lenço
vermelho amarrado ao pescoço, vem tropeçando nos caixotes até que lá consegue
10 encostar-se ao umbral da porta. Fica assim um pedaço, a oscilar o corpo, enquanto
vai passando as mãos pela cara, como que para afastar os restos do sono. Os olhos,
semicerrados, abrem-se-lhe um pouco mais para os campos. Mas fecha-os logo,
diante daquela monotonia desolada.
Dá meia volta, enche a medida com o melhor vinho que há na venda, coloca-a
15 sobre o balcão. Ao lado, um copo. Puxa o caixote, senta-se e começa a beber a peque-
nos goles. De quando em quando, cospe por cima do balcão para a terra negra que faz
de pavimento. Enterra o queixo nas mãos grossas e, de cotovelo vincado na tábua,
para ali fica com um olhar mortiço.
Às vezes, um rapazito entra na venda:
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20 – Tio Batola, cinco tostões de café.

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Contos

O chapeirão redondo volta-se, vagaroso:


– Há?…
– Cinco tostões de café!
Batola demora os olhos na portinha que dá para os fundos da casa. Mas é inútil esperar mais. “Ah, se a
25 mulher não vem aviar o rapazito é porque não quer, pois está a ouvir muito bem o que se passa ali na loja!”
Quando se assegura que é esta e não outra a verdade dos factos, Batola tem de levantar-se. Espreguiça-se,
boceja, e arrasta-se até à caixa de lata enferrujada. Mede o café a olho, um olho cheio de tédio, caído sobre
o canudinho de papel.
Volta a encher o copo, atira-se para cima do caixote. E, no jeito que lhe fica depois de vazar vinho goela
30 abaixo, num movimento brusco, e de ter cuspido com uns longes de raiva, parece que acaba de se vingar de
alguém.
Tais momentos de ira são pedaços de revolta passiva contra a mulher. É uma longa luta, esta. A raiva do
Batola demora muito, cresce com o tempo, dura anos. Ela, silenciosa e distante, como se em nada repa-
rasse, vai-lhe trocando as voltas. Desfaz compras, encomendas, negócios. Tudo vem a fazer-se como ela
35 entende que deve ser feito. E assim tem governado a casa.
Batola vai ruminando a revolta sentado pelos caixotes. Chegam ocasiões em que nem pode encará-la.
De olhos baixos, põe-se a beber de manhã à noite, solitário como um desgraçado. O fim daquelas crises
tem dado que falar: já muitas vezes, de há trinta anos para cá, aconteceu a gente da aldeia ouvir gritos afli-
tivos para os lados da venda. Era o Batola, bêbado, a espancar a mulher.
40 Tirando isto, a vida do Batola é uma sonolência pegada. Agora, para ali está, diante do copo, matando o
tempo com longos bocejos. No estio, então, o sol faz os dias do tamanho de meses. Sequer à noite virá al-
guém à venda palestrar um bocado. É sempre o mesmo. Os homens chegam com a noitinha, cansados da
faina. Vão direito a casa e daí a pouco toda a aldeia dorme.
Está nestes pensamentos o Batola quando, de súbito, lhe vem à ideia o velho Rata. Que belo compa-
45 nheiro! Pedia de monte a monte, chegava a ir a Ourique, a Castro, à Messejana. Até fora a Beja. Voltava
cheio de novidades. Durante tardes inteiras, só de ouvi-lo parecia ao Batola que andava a viajar por todo
aquele mundo.
Mas o velho Rata matara-se. Na aldeia, ninguém ainda atina ao certo com a razão que levou o mendigo
a suicidar-se. Nos últimos tempos, o reumatismo tolhera-lhe as pernas, amarrando-o à porta do casebre.
50 De quando em quando, o Batola matava-lhe a fome; mas nem trocavam uma palavra. Que sabia agora o
Rata? Nada. Encostado à parede de pernas estendidas, errava o olhar enevoado pelos longes. Veio o verão
com os dias enormes, a miséria cresceu. Uma tarde, lá se arrastou como pôde e atirou-se para dentro do
pego1 da ribeira da Alcaria.
Aos poucos o tempo apagou a lembrança do Rata, o mendigo. Só o Batola o recorda lá de vez em
55 quando. Mas, agora, abandonou a recordação e o vinho, e vai até ao almoço. Nunca bebe durante as refei-
ções.
Depois, o sol desanda para trás da casa. Começa a acercar-se a tardinha. Batola, que acaba de dormir a
sesta, já pode vir sentar-se, cá fora, no banco que corre ao longo da parede. A seus pés, passa o velho cami-
nho que vem de Ourique e continua para o sul. Por cima, cruzam os fios da eletricidade que vão para Val-
60 murado, uma tomada de corrente cai dos fios e entra, junto das telhas, para dentro da venda.
E o Batola, por mais que não queira, tem de olhar todos os dias o mesmo: aí umas quinze casinhas des-
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garradas e nuas; algumas só mostram o telhado escuro, de sumidas que estão no fundo dos córregos2. De-
pois disso, para qualquer parte que volte os olhos, estende-se a solidão dos campos. E o silêncio. Um silên-
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cio que caiu, estiraçado por vales e cabeços, e que dorme profundamente. Oh, que despropósito de plainos
65 sem fim, todos de roda da aldeia, e desertos!
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Carregado de tristeza, o entardecer demora anos. A noite vem de longe, cansada, tomba tão vagarosa-

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mente que o mundo parece que vai ficar para sempre naquela magoada penumbra.
Lá vêm figurinhas dobradas pelos atalhos, direito às casas tresmalhadas da aldeia. Nenhuma virá até à
venda falar um bocado, desviar a atenção daquele poente dolorido. São ceifeiros, exaustos da faina, que
70 recolhem. Breve, a aldeia ficará adormecida, afundada nas trevas. E António Barrasquinho, o Batola, não
tem ninguém para conversar, não tem nada que fazer. Esta preso e apagado no silêncio que o cerca.
Ergue-se pesadamente do banco. Olha uma última vez para a noite derramada. Leva as mãos cara, es-
frega-a, amachucando o nariz, os olhos. Fecha os punhos, começa a esticar os braços. E abre a boca num
bocejo tão fundo, o corpo torcido numa tal ansiedade, que parece que todo ele se vai despegar aos boca-
75 dos. Um suspiro estrangulado sai-lhe das entranhas e engrossa até se alongar, como um uivo de animal
solitário.
Quando consegue dominar-se, entra na venda, arrastando os pés. E, sem pressentir que aquela noite é
a véspera de um extraordinário acontecimento, lá se vai deitar o Batola, derrotado por mais um dia.
De facto, na tarde seguinte apareceu uma nuvenzinha de poeira para as bandas do sul: ouvia-se ronro-
80 nar um motor. Pouco depois, o carro parou à porta da venda. Fazia anos que tal se não dava na aldeia. Pelas
portas, apareceram mulheres e crianças.
Dois homens saíram do carro. Um deles trazia fato de ganga, o outro, bem vestido, adiantou-se até à
porta:
– Não nos pode dispensar uma bilha de água?
85 Batola, daí a pouco, sai com a infusa3 a escorrer. O do fato de ganga, que havia tirado a tampazinha da
frente do carro, pôs-se a deitar a água para dentro. Enquanto isto acontece, o sujeito bem vestido dá uma
mirada pela aldeia, pelos campos. Sopra, afogueado:
– Que sítio!…
Mas ao ver os fios da eletricidade e a ligação que entra junto das telhas da casa, olha para o Batola com
90 atenção, medindo-o de alto a baixo. Entra na venda, põe-se a observar as prateleiras. O exame parece agra-
dar-lhe. Volta-se, sorridente, para o Batola, que lhe segue, desconfiado, todos os movimentos:
– Tem cerveja?
– Ná. Só vinho…
– Traga o vinho.
95 Muito instado, Batola bebe também. E aqui começa uma conversa que ele não entende. Só percebe, e
isso agrada-lhe, que o homem é simpático e franco. Mas agora há uma pergunta a que tem de responder.
– Não, senhor…
O sujeito vai à porta, e diz para o motorista:
– Calcinhas, traz aí uma caixa do modelo pequeno.
100 A caixa é colocada sobre o balcão. De dentro sai uma outra caixa, mas de madeira polida. Ao meio tem
um retângulo azul, cheio de letras e, em baixo, ao comprido, quatro grandes botões negros.
– Não tem uma tomada?
Em face da resposta, o homem vai ao automóvel. Volta e sobe ao balcão. Tira a lâmpada, enrosca aí a
tomada, puxa o fio que sai da caixa, liga-o, e salta para o chão. Só nesse momento o Batola compreende. A
105 princípio, apenas saem ruídos ásperos da caixinha, mas, aos poucos, desaparecem. Vem então uma música
modulada, grave.
– Hem? Que tal?
Esfregando as mãos, começa a enumerar rapidamente as qualidades de um tal aparelho:
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– É o último modelo chegado ao país. Quando se quer, é música toda a noite e todo o dia. Ou então can-
110 ções. E fados e guitarradas! Notícias de todo o mundo, desde manhã até à noite, notícias da guerra!…
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Contos

Aponta para o retângulo azul:


– Olhe, aqui, é Londres; aqui, a Alemanha; aqui, a América. É simples: vai-se rodando este botãozi-
nho…
Poisa a mão sobre o ombro do Batola, e exclama:
115 – Dou-lhe a minha palavra de honra que não encontram nenhum aparelho pelo preço deste!
Sem dar tempo a qualquer resposta, ordena:
– Traz a pasta, Calcinhas!
Vem a pasta. Batola, aturdido, olha para os papéis de várias cores que vão aparecendo sobre o balcão. A
música, vibrante, enche a venda, ressoa pelos campos.
120 – Aqui é Londres, hem! – grita o homem. – O senhor sabe ler? Então leia aqui!
Mostra os papéis, gesticula e sorri, sorri sempre. Batola coça o queixo com os dedos grossos. Olha as
contas que o outro lhe mostra, olha de soslaio para a mulher. Volta a coçar-se. E tudo isto se repete durante
uma longa hora.
Batola, por fim, cabisbaixo, emudece, como que vencido. Rapidamente, o vendedor preenche, sobre o
125 balcão, um largo impresso e, depois, doze letras4. São as prestações. Dá a caneta ao Batola que se põe a as-
sinar penosamente papelinho a papelinho. Está quase a acabar a difícil tarefa quando a mulher o inter-
rompe, numa voz lenta e carregada:
– António, tu não compras isso.
Então, inicia-se uma luta entre o vendedor e a mulher. Mas as frases e o sorriso do homem bem vestido
130 não surtem agora o mesmo efeito: vão-se sumindo, sem remédio, diante daquele rosto ossudo e decidido.
Ali, só há uma palavra:
– Não.
A cara redonda do Batola começa a encher-se de fundas rugas. Num repente, pega na caneta e assina o
resto das letras:
135 – Pronto! Quem manda sou eu!
Os olhos da mulher trespassam-no. Volta o rosto pálido para o vendedor de telefonias, torna a voltar-se
para o marido. Por momentos, parece alheada de tudo quanto a cerca. Vagarosa, no tom de quem acaba de
tomar uma resolução inabalável, apruma-se, muito alta, dominadora, e diz:
– António, se isso aqui ficar eu saio hoje mesmo de casa. Escolhe.
140 Toda a gente da aldeia que enche a venda sabe que ela fará o que acaba de dizer. Até o vendedor pres-
sente que assim será. Pensativo, olha para o Batola. De súbito, tira um papel qualquer de dentro da pasta e
adianta-se:
– Bem, a senhora não se exalte. Faz-se uma coisa: a telefonia fica à experiência, durante um mês. Se não
quiserem, devolvem-na; nós devolvemos as letras. Assine aqui, Sr. Barrasquinho. Pronto. Agora já a se-
145 nhora pode ficar descansada.
– Mas – pergunta ainda a mulher – quanto se paga de aluguer por esse mês?
– Nada! – responde o homem, de novo risonho.
– Por isso não se paga nada!
E, ao meter os papéis dentro da pasta, repara que já é muito tarde.
150 Apressado, conta que veio por ali devido a um engano no caminho. Sai da
venda, entra no carro, e diz ao Batola, aproveitando o ruído do motor:
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– Você, agora, arrume a questão: tem um mês para a convencer.


Mal o carro parte, deixando uma nuvem de poeira à retaguarda, atira a
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pasta para o assento de trás, e grita alegremente:


155 – Hem, Calcinhas! Levou-me uma tarde inteira, mas foi. Foi de esticão!
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De facto, era sol-posto, pelos atalhos, os ceifeiros re-

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colhiam à aldeia.
Mas, nessa tarde, vieram todos à venda, onde entra-
ram com um olhar admirado. Uma voz forte, rápida,
160 dava notícias da guerra.

Só de lá saíram depois de a voz se calar. Cearam à


pressa, e voltaram. Era já alta noite quando recolheram
a casa, discutindo ainda, pelas portas, numa grande
animação.
165 Um sopro de vida paira agora sobre a aldeia. Todos
sabem o que acontece fora dali. E sentem que não estão
já tão distantes as suas pobres casas. Até as mulheres
vêm para a venda depois da ceia. Há assuntos de sobra
para conversar. E grandes silêncios quando aquela voz
170 poderosa fala divisões vencidas, bombardeamentos,

ofensivas. Também silêncio para ouvir as melodias que


vêm de longe até à aldeia, e que são tão bonitas!…
Acontece até que, certa noite, se arma uma festa na
venda do Batola. Até as velhas dançaram ao som da te-
175 lefonia. Nos intervalos, os homens bebiam um copo,

junto ao balcão, os pares namoravam-se, pelos cantos.


Por fim, mudou-se de posto para ouvir as notícias do
mundo. Todos se quedaram, atentos.
– Ah! – grita de repente o Batola. – Se o Rata ouvisse
180 estas coisas não se matava!

Mas ninguém o compreende, de absorvidos que estão.


E os dias passam agora rápidos para António Barrasquinho, o Batola. Até começou a levantar-se cedo e
a aviar os fregueses de todas as manhãzinhas. Assim, pode continuar as conversas da véspera. Que o Batola
é, de todos, o que mais vaticínios5 faz sobre as coisas da guerra. Muito antes do meio-dia já ele começa a
185 consultar o velho relógio, preso por um fio de ouro ao colete.
Só a mulher quase deixou de aparecer na venda. E ninguém sabe que pensa ela do que contam as vozes
desconhecidas aos homens da aldeia, pois, através do tabique6 de ripas separadas por grandes fendas,
ouve-se tudo que se passa na venda. Ouve-se e vê-se, querendo, a alegria que certas notícias trazem aos
ceifeiros, o gosto e o propósito que eles têm ao ouvir determinada voz que é de todas a mais desejada e
190 acreditada.
E os dias custaram tão pouco a passar que o fim do mês caiu de surpresa em cima da aldeia da Alcaria.
Era já no dia seguinte que a telefonia deixaria de ouvir-se. Iam todos, de novo, recuar para muito longe, lá
para o fim do mundo, onde sempre tinham vivido.
Foi a primeira noite em que os homens saíram da venda mudos e taciturnos. Fora esperava-os o ne-
195 grume fechado. E eles voltavam para a escuridão, iam ser, outra vez, o rebanho que se levanta com o dia,
lavra, cava a terra, ceifa e recolhe vergado pelo cansaço e pela noite. Mais nada que o abandono e a solidão.
A esperança de melhor vida para todos, que a voz poderosa do homem desconhecido levava até à aldeia,
apagava-se nessa noite para não mais se ouvir.
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Dentro da venda, o Batola está tão desalentado como os ceifeiros. O mês passou de tal modo veloz
200 que se esqueceu de preparar a mulher. Sobe ao balcão, desliga o fio e arruma o aparelho. Um pouco
32
Contos

dobrado sobre as pernas arqueadas, com o chapeirão a encher-lhe a cara de sombra,


observa magoadamente a preciosa caixa.
Assim está, quando um pressentimento o obriga a voltar a cabeça: junto da porta
que dá para os fundos da casa, a mulher olha-o com um ar submisso. “Que terá acon-
205 tecido?”, pensa o Batola, de a ver ainda levantada àquela hora.
– António – murmura ela, adiantando-se até ao meio da venda. – Eu queria pedir-
-te uma coisa…
Suspenso, o homem aguarda. Então, ela desabafa, inclinando o rosto ossudo,
onde os olhos negros brilham com uma quase expressão de ternura:
210 – Olha… Se tu quisesses, a gente ficava com o aparelho. Sempre é uma companhia
neste deserto.
FONSECA, Manuel (1985). “Sempre é uma companhia”, in O Fogo e as Cinzas (16.ª edição).
Lisboa: Caminho, pp. 147-158.

1. pego: sítio mais fundo. 2. córregos: caminhos apertados. 3. infusa: bilha de boca larga, com bico, e uma só asa. 4. letras:
títulos de crédito pelos quais um credor ordena ao seu devedor que pague uma dada importância numa certa data. 5. vati-
cínios: profecias. 6. tabique: divisória.

3. Explicita a estrutura do conto, preenchendo o esquema.

1.ª PARTE
Enquadramento da ação (ll. a. )
Localização da ação no espaço físico: b.
Rotina de Batola: c.

2.ª PARTE
Desenvolvimento da ação
Peripécia inicial: d. (ll. e. )

Ações intermédias: f. (ll. g. )

Peripécia final (desfecho): h. (ll. i. )

4. Foca a tua atenção no enquadramento da ação.


4.1. Traça o perfil de Batola e da sua mulher, explicitando a relação que se estabelece
entre as duas personagens.
4.2. Mostra de que modo a representação do espaço psicológico contribui para a ca-
racterização da personagem Batola.
4.3. Transcreve um segmento textual que concretize a representação do espaço socio-
político, justificando.
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5. Considera o desenvolvimento da ação.


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5.1. Salienta a função que a peripécia inicial assume na construção do sentido global
do conto e na caracterização do espaço sociopolítico.
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Manuel da Fonseca

5.2. Analisa estilisticamente o excerto que corresponde às linhas 194-196.


5.3. Refere a importância da peripécia final, relacionando-a com o título do conto e

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com a dicotomia solidão/convivialidade.

6. Indica se as afirmações seguintes são verdadeiras ou falsas, fundamentado as


verdadeiras e corrigindo as falsas.
a. Ao recorrer ao discurso indireto, o narrador imprime vivacidade e verosimilhança à
narrativa.
b. Na expressão “Um sopro de vida paira agora sobre a aldeia.” (l. 165) está presente a siné-
doque, que acentua a mudança de condições atmosféricas.
c. Na linha 202, o advérbio “magoadamente” sugere a dor física de Batola.
d. Na frase “– António – murmura ela, adiantando-se até ao meio da venda. – Eu queria
pedir-te uma coisa…” (ll. 206-207) o verbo introdutor do relato do discurso acentua o
carácter decidido e autoritário da mulher de Batola.

7. Embora o conto seja configurado por sequencialidade de tipo narrativo, nele


estão presentes outros tipos e sequências textuais.
7.1. Completa o quadro, transcrevendo do conto “Sempre é uma companhia” sequên-
cias textuais indicadas e explicitando as suas marcas.

Segmento Marcas
Fases/etapas
textual linguísticas
Sequência descritiva a. b. c.
Sequência dialogal d. e. f.

Ver Manual, pp. 158-159

ORALIDADE DEBATE

1. O conto aborda uma questão grave rela-


cionada com os relacionamentos amoro-
sos – a violência doméstica.
1.1. Debate com os teus colegas sobre a
forma como este problema se manifesta
atualmente, no casamento e no namoro.
A imagem seguinte poderá constituir o
ponto de partida para a reflexão.
Cartaz contra a violência no namoro

EDUC AÇ ÃO LITERÁRIA | ESCRITA EXPOSIÇ ÃO SOBRE UM TEMA

1. O tema do casamento é recorrente na literatura portuguesa.


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1.1. Redige uma exposição (130-170 palavras) em que sintetizes a forma como este
tema é retratado em duas obras que tenhas estudado no 10.º e/ou 11.º ano.
34
Contos

L E I T U R A | G R A M ÁT I C A

1. Lê o texto.

OPINIÃO
Com o Alentejo na alma
Estamos em 1960 (ou talvez 1962), no verão tórrido de um Alentejo desprezado pelo poder
salazarista. Abril estava ainda fora daquele horizonte, aberto e amplo mas a vários títulos asfi-
xiante. Uma calma que apenas estremecia à passagem esporádica de um ou outro automóvel
com os pneus a guinchar na curva apertada após uma longa reta. Os sons das cigarras rompiam
5 o silêncio e a monotonia daquele território árido, onde o amarelado da paisagem, o restolho
seco, era apenas rasgado pelo tapete negro de alcatrão cintilante quase a derreter-se ao sol abra-
sador. Mas na berma da estrada começava a vislumbrar-se, ao longe, uma poeira anormal em
redor de duas silhuetas que se erguiam lado a lado com alguma coisa por trás. No início pode-
riam confundir-se com miragens em pleno “deserto” alentejano. Mas não. Eram bem reais. No
10 seu movimento compassado percebi pouco depois que eram cavalos, trazendo atrás de si um
homem acorrentado. Cavalos montados por aquela guarda, de farda cinzenta e botas altas, que
aterrorizava crianças e ainda mais os adultos, pelo menos os mais conscientes das razões da sua
miséria e do sufoco da sua liberdade. Do alto dos seus cavalos brancos estas figuras altivas eram a
personificação do poder, em absoluto contraste com o ser miserável, com as mãos acorrentadas,
15 curvado e maltrapilho, a desfalecer de sede. Deram-lhe água, mas só depois de saciar os cavalos
no fontanário à beira da estrada.
Estes mesmos guardas, ou outros seus comparsas, eram aqueles que regularmente frequen-
tavam o café-restaurante da família […].
Vinham por vezes em grupos de quatro, recordo-os, grandes e gordos, com ar carrancudo.
20 Creio agora que percebiam a raiva silenciosa que causavam à sua passagem. Sentavam-se num
espaço interior, mais resguardado da casa, e a mesa, devidamente preparada, com toalhas de te-
cido branco, em breve ficava recheada de iguarias, com vinho, presunto, queijo e às vezes outros
petiscos. Ficavam horas a comer, mas falavam pouco; e depois de empanturrados saíam como se
fosse da casa deles. Já se sabia que não pagavam a despesa, mas pelo menos era de esperar que ti-
25 vessem um gesto, ainda que fingido, de pedir a conta. Assim pensavam as vítimas daquele saque
(os meus pais). Porém, na maioria das vezes nem isso acontecia. Entravam e saíam atravessando
o espaço público da taberna, espalhando um temor respeitoso entre os clientes domingueiros
da “Casa de Pasto – o 15” (era esse o nome), um espaço nos fins de semana sempre animado por
grupos de homens, na sua maioria mineiros que, entre cada rodada, exprimiam em coro a sua
30 amargura, mas também a força coletiva através do agora celebrado “cante alentejano”. […]
Estas memórias não se apagam. Nesse período ocorreram algumas greves nas minas. Re-
cordo que numa delas a aldeia inteira andou em alvoroço quando se soube que a guarda tinha
carregado sobre os mineiros. Umas dezenas foram presos. Alguns eram de Rio de Moinhos (a
aldeia de que falo) e até um tio meu, soube depois, tinha sido levado para Lisboa, pela PIDE.
35 Não ficou muito tempo na prisão, mas para um homem honrado e por todos respeitado – um
assalariado para quem a única “subversão” cometida era trabalhar no duro para alimentar os
filhos, ingerindo aquele pó durante décadas, que lhe provocaria o cancro que o matou anos de-
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pois –, as “duas chapadas na cara” que lhe foram dadas por um qualquer esbirro do regime, para
que confessasse os nomes dos cabecilhas da greve, já foram um preço inconcebível. A dureza da
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Manuel da Fonseca

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40 vida no Alentejo nesses anos de penúria e repressão, para quem nasceu e vive como alentejano,
não é uma mera “recordação”, é sim um elemento que se inscreve na própria identidade alente-
jana, pois a sua força é indissociável da resistência (em geral silenciada pela ameaça, nos anos de
chumbo do salazarismo). O ressentimento cultivado por comunidades inteiras, por terem sido
pisadas décadas a fio pelos protegidos do regime, não apagou o afeto, mas, para um alentejano,
45 este não se mede pelo palavreado fácil. Pessoalmente sinto-o no acolhimento, no sorriso largo,
na oferta de guarida ou do almoço, de braços abertos, em cada viagem às origens. Cada regresso
é como um aconchego no seio de uma grande família cujos gestos protetores se perpetuam atra-
vés das gerações. As caras de hoje, umas mais jovens, talvez de terceira geração, outras mais en-
rugadas – as que ainda reconheço –, foram transmutadas pelo tempo, mas é a mesma família.
50 Felizmente, as conquistas democráticas devolveram alguma dignidade ao Alentejo, mas apesar
do envelhecimento demográfico, não apagaram essa força cultural que hoje é reconhecida em
diversos domínios patrimoniais, com destaque para os grupos corais ou a viola campaniça.
ESTANQUE, Elísio. “Com o Alentejo na alma” [Em linha]. Público [Consult. em 11-03-2016, com supressões].

2. Assinala a opção correta.


2.1. Embora tenha sido publicado na secção “Opinião” do jornal Público, este texto
apresenta as marcas específicas do género
(A) exposição sobre um tema. (C) diário.
(B) relato de viagem. (D) memórias.
2.2. O parágrafo que apresenta mais características do género artigo de opinião é
(A) o primeiro. (C) o terceiro.
(B) o segundo. (D) o quarto.
2.3. O texto é marcado por um tom predominantemente
(A) retrospetivo. (C) objetivo.
(B) persuasivo. (D) ficcional.
2.4. Na primeira frase do texto, utiliza-se o presente do indicativo para
(A) conferir à narração um efeito de presentificação.
(B) narrar um acontecimento presente.
(C) criar um efeito de distanciamento entre o presente e o passado.
(D) localizar um acontecimento num tempo futuro.
2.5. A expressão “Abril estava ainda fora daquele horizonte” (l. 2) remete
(A) para a renovação cíclica da natureza.
(B) para o tempo primaveril.
(C) para a revolução política de 1974.
(D) para o momento da juventude.
2.6. No primeiro parágrafo do texto, o Alentejo é descrito pelo autor
(A) de forma poética, como um paraíso perdido.
(B) como uma zona fustigada por condições de vida adversas.
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(C) de forma nostálgica e entusiástica.


(D) como uma terra próspera, conotada com o “celeiro de Portugal”.

36
Contos

2.7. Ao referir-se aos comportamentos dos guardas, o autor manifesta


(A) sentimentos de admiração e estima.
(B) ressentimento e desejo de vingança.
(C) uma atitude de superioridade e de indiferença.
(D) juízos de valor depreciativos.
2.8. O segmento “(ou talvez 1962)” (l. 1) veicula um valor
(A) modal epistémico.
(B) deôntico de obrigação.
(C) deôntico de proibição.
(D) apreciativo.
2.9. Na expressão “Os sons das cigarras rompiam o silêncio” (ll. 4-5) está presente
(A) a personificação. (C) a hipérbole.
(B) a sinédoque. (D) a metáfora.
2.10. Entre os enunciados “Ficavam horas a comer” e “mas falavam pouco” (l. 23)
(A) expressa-se uma relação cronológica de anterioridade.
(B) expressa-se uma relação cronológica de posterioridade.
(C) expressa-se uma relação cronológica de simultaneidade.
(D) não se expressa nenhum tipo de relação cronológica.
2.11. O enunciado “Não ficou muito tempo na prisão […]” (l. 35)
(A) transmite um valor perfetivo.
(B) veicula um valor imperfetivo.
(C) corresponde a uma situação iterativa.
(D) corresponde a uma situação genérica.
2.12. Quanto ao processo de formação de palavras, “PIDE” (l. 34) classifica-se como
(A) sigla. (C) amálgama.
(B) acrónimo. (D) truncação.
2.13. A oração “pois a sua força é indissociável da resistência” (l. 42) é
(A) coordenada conclusiva.
(B) coordenada explicativa.
(C) subordinada adverbial consecutiva.
(D) subordinada substantiva completiva.
2.14. Na última frase (ll. 50-52), a palavra que veicula valor apreciativo é
(A) “Felizmente”.
(B) “democráticas”.
(C) “dignidade”.
(D) “campaniça”.

ORALIDADE TEX TO DE OPINIÃO

1. Produz um texto oral, de quatro a seis minutos, onde exprimas a tua opinião sobre
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a importância da liberdade na vida política, económica e social de um país.


fotocopiável

1.1. Planifica o teu texto, elaborando um plano de suporte com tópicos, argumentos e
respetivos exemplos.
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SOLUÇÕES | SUGESTÕES METODOLÓGICAS

Educação Literária | Escrita 6. a. F – Não há no conto casos de discurso indireto / Ao recorrer

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3. a. ll. 1-78. b. Aldeia alentejana chamada Alcaria (que tem ao discurso direto, o narrador imprime vivacidade e verosimi-
como terras próximas Beja, Castro, Ourique, Messajana) lhança à narrativa (mostra a mundividência dos camponeses).
(ll. 44-45). c. Rotina marcada pela inércia (desde que se levanta b. F – Na expressão “Um sopro de vida paira agora sobre a aldeia.”
até que se deita) e pelo desinteresse face à vida. d. Conversa está presente a metáfora, que sugere a mudança gerada pela
com o vendedor de telefonias, conflito com a esposa e decisão presença da telefonia na aldeia e, consequentemente, pela pas-
de a telefonia ficar na loja durante um mês. e. ll. 79-155. f. Situa- sagem de uma situação de solidão a uma situação de convivia-
ções de convivialidade entre os habitantes da terra, na loja, du- lidade. c. F – O advérbio “magoadamente” sugere o desalento
rante o tempo em que a telefonia está na loja de Batola; tristeza de Batola face à perda iminente da felicidade acabada de expe-
de todos, no último dia em que podem usufruir da telefonia e rienciar. d. F – Na frase “– António – murmura ela, adiantando-se
da convivialidade que ela proporciona. g. ll. 156-198. h. Mu- até ao meio da venda. – Eu queria pedir-te uma coisa…” o verbo
dança de atitude da mulher de Batola – pedido de comprarem a introdutor do relato do discurso acentua a mudança de atitude
telefonia. i. ll. 199-211.
da mulher de Batola (de autoritária e intransigente a submissa e
4.1. Batola: homem apático/inativo, desalentado e desampa- reconhecedora do seu erro).
rado, que se evade na bebida e no passado (lembrança de
7.1. Exemplos: a. “Muito alta, grave, um rosto ossudo e um sos-
Rata); nutre uma raiva profunda em relação ao domínio que a
sego de maneiras que se vê logo que é ela quem ali põe e dispõe.”
esposa exerce sobre ele, tornando-se violento para ela, sob o
efeito da bebida. Mulher de Batola: enérgica, ativa, decidida e (ll. 4-5). b. Apresentação da entidade a descrever (mulher de Ba-
autoritária/dominadora. Relação entre as personagens: rela- tola), identificação e descrição das partes que constituem o
ção de contraste (físico e psicológico) e de conflito (dominador/ todo (“Muito alta, grave”, “um sossego de maneiras”). c. Nomes,
dominado). adjetivos; recursos expressivos (metáfora). d. “– Tem cerveja?
[…] – Aqui é Londres, hem! – grita o homem. – O senhor sabe ler?
4.2. Espaço psicológico presente nas ll. 44-53, que evidencia a
Então leia aqui!” (ll. 92-120). e. Sequência de abertura (“– Tem
tendência de Batola para a evasão no tempo e revela o seu
cerveja?”), núcleo da interação (restantes falas). f. Fórmula de
apreço pela liberdade e pelo contacto com o mundo exterior
abertura (“– Tem cerveja?”), formas de 1.ª e 3.ª pessoa (“Dou-lhe”
(admirava Rata porque este era um mendigo que conhecia ou-
– nota: tratamento pela 3.ª pessoa).
tros locais).
4.3. ll. 68-70 – Exemplo: excerto em que se descreve o regresso Educação Literária | Escrita
dos ceifeiros oprimidos a casa, denunciando-se a situação de 1.1. Exemplos:
miséria que oprimia as massas humanas no Alentejo e a vida • Farsa de Inês Pereira (Gil Vicente): casamento como forma de
precária e sufocada dos pequenos camponeses da altura. ascensão social e de independência relativamente ao jugo
5.1. Funções da peripécia inicial: materno; desvalorização da instituição casamento (casamento
• desencadear a ação (elemento que conduz à sucessão de peri- sem amor, violência doméstica, adultério);
pécias que culminarão na peripécia final); • Auto da Feira (Gil Vicente); desvalorização da instituição casa-
• contribuir para a representação do espaço sociopolítico: a mento (vontade de trocar de cônjuge);
abordagem do vendedor evidencia o confronto de interesses • Os Maias (Eça de Queirós): casamento como fase natural da
e de posições sociais (entre os que têm e os que não têm) e vida, associada à maturidade e à descendência (Afonso da
realça o estatuto das classes populares (em que se inclui Ba- Maia) ou à independência em relação à autoridade materna
tola) como vítimas da violência social. (Pedro da Maia). desvalorização da instituição casamento
5.2. Trecho que realça o estado de espírito dos habitantes de (adultério);
Alcaria face à iminência da perda da convivialidade e do retorno • A Ilustre Casa de Ramires (Eça de Queirós): casamento como
à solidão e à vida pautada pela miséria e pela exploração. forma de ascensão social (Gonçalo/ Ana Lucena); desvaloriza-
Recursos que realçam estes aspetos: dupla adjetivação ção da instituição casamento (adultério de Gracinha).
(“mudos e taciturnos”), metáfora (“Fora esperava-os o negrume
fechado.”; “E eles voltavam para a escuridão”, “iam ser, outra vez, o Leitura | Gramática
rebanho”, “vergado pelo cansaço e pela noite”) e enumeração 2.1. (D). 2.2. (D). 2.3. (A).
(“que se levanta com o dia, lavra, cava a terra, ceifa e recolhe”).
2.4. (A). 2.5. (C). 2.6. (B).
5.3. Peripécia final: acontecimento imprevisível que altera o 2.7. (D). 2.8. (A). 2.9. (D).
rumo dos acontecimentos (decisão de manter a telefonia, pois é
2.10. (C). 2.11. (A). 2.12. (B).
uma “companhia” num espaço de solidão no microcosmos da
aldeia). A decisão de manter a telefonia sugere a necessidade 2.13. (B). 2.14. (A)
de convivialidade, de contacto como o exterior (contrariando o
isolamento e a solidão), e de conhecimento da realidade socio- Oralidade
política; em última análise, sugere a pulsão libertadora e a pos- 1.1. Dossiê do Professor – Materiais de Apoio |
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sibilidade de emancipação face à opressão vivida (trata-se do Recursos do Projeto


germe de uma transformação). Guião de produção de texto de opinião oral
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