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Mon, E. Lesprit dis temps. Une mythologie moderne. Paris, 1975. Poutar, E. “Modernisme”, Encyclopaedia Universalis, vol. XI. Paris: Encyclopaedia Universalis France, 1971, pp. 135-37. Rosennenc, H. The tradition of the new. Nova lorque: Horizon Press, 1959. ‘Van per Leeuw, G. De primitieve mensch en de religie. Groningen, 1937. 206 PAassaDO/PRESENTE* ‘A distingao entre passado e presente é um elemento essencial da concepgio do tempo. E, pois, uma operacao fundamental da consciéncia ‘eda ciéncia histéricas. Como o presente ngo se pode limitar a um tante, a um ponto, a defini¢ao da estrutura do presente, seja ou consciente, é um problema primordial da operagao hist6rica/A defini- 40 do periodo contemporineo nos programas escolares de histéria é © A distingio entre oF dois termos ¢ essencial, quer como cognicéo do tempo (ef. tempo! emporalidade), quer como operasio (cf. aperagéer) da ciéncia eda conscitncia histética (cf. comcibncaleutoconsiénca, bisbria). Momentos distintivosprivilegiados entre os dois termos sf0 a revolupdo, a guerra, a mudanga de segime politico (ct politica), fomes, epi demas ere. Em pricologia (cf. soma/peyche), principalmente a infantil (cf. ifncia), ow da tvolugi etéria (evolu), passado, presente c Futuro sf0 adquitidos como conceitos (cf Cconceto) 3 mesmo tempo em que a percepgio do tempo em conexio com os mexlos de dererminacio da meméria, Em lingiitia, as stings passado/presentefururo no 56 ‘nfo se determinam naturalmente (¢f. nasurezalculeura) como também se determinam de modo diferente conforme a lingua, na linguagerm (cf: linguagem) eas condiges sociis de ‘quem fila (ef, lngualfle) etc. No pensamento selvagem (cf. civilicasto, anrepo, ho- ‘mem, cagacoleta), a8 prpras dstingSes so menos marcadas ea profundidade ou espes- sura do passado (cf. epape-tempo), mais simplificadas, Na consciéneia histéric, a cone -x5ex parsado/presentelfuturo apresentam-se de virios modos: por exemplo, 0 passado pode apresentar-se como modelo (ef. cldsice) do presente ou como idade mitia (ct. #a- der mivicasy, 0 presente em rclagéo 20 passado (04 0 patsado menos remoto em selagio a lum mais remote), como decadéncia ou progresso; 0 futuro aparece em rela ao presen- teu a0 passado também como decadéncia, progresso ou palingenese (cf. ecarologia); sinda, o presente em relacio 20 passado, eal como o passado menos remoro em relagt0 ‘um passado mais remoro, como a Antighidade em relagio 4 Modernidade (cf. anigo/ 207 sum bom teste para esta definigao do presente historico. Ela ¢ reveladora, para os franceses, do lugar desempenhado pela Revolugao Francesa na consciéncia nacional, pois na Franga a histéria contemporiinea comega oficialmente em 1789. Pressentem-se todas as operacbes, conscientes ou inconscientes, que esta definigao do corte passado/presente supse, a0 nivel coletivo. Encontramos cortes ideolégicos deste tipo na maior parte dos povas e das nagées. A Ieilia, por exemplo, conheceu dois pon- tos de partida do presente que constituem um elemento importante da consciéncia histérica dos italianos de hoje: 0 Renascimento ea queda do fascismo (Romano, 1977). Mas esta definigéo do presente, que é de fato, um programa, um projeto ideoldgico, defronta-se muitas vezes com o peso de um passado muito mais complexo, Gramsci escreveu sobre as origens do Renascimento: “Na Itilia, a tradigao da univer- salidade romana c medieval poe entraves ao desenvolvimento das forgas nacionais (burguesas), para além do dominio puramente econdmico- ‘municipal, isto é, as forcas’ nacionais s6 se tornam uma ‘forsa’ nacional depois da Revolugao Francesa ¢ da nova posigio que papado ocupa na Europa” (1930-1932, pp. 589-905 cf. Galasso, 1967). A Revolugio Francesa (tal como a conversio de Constantino, a Hégira ou a Revolu- éo Russa de 1917) torna-se, primeiro, uma fronteira entre passado presente e, em seguida, entre um antes e um depois. A observacéo de Gramsci permite avaliar em que medida a relagio com 0 pasado, a que Hegel chamava 0 “fardo da histéria”, ¢ mais pesada para alguns povos ‘que para outros (Le Goff, 1974). Mas a auséncia de um passado conhe- cido e reconhecido, a mingua de um passado, pode também ser fonte de grandes problemas de mentalidade ou identidade coletivas: é 0 caso das jovens nagées, principalmente das afticanas (Assorodobraj, 1967). (Os Estados Unidos constituem um caso complexo, no qual se combi- nam a frustragio de um passado remoto, as diferentes contribuigées, por vezes opostas, dos virios tipos de populagio pré-americana (princi- ‘modemne}; o passado menos remoto, o presente ¢o futuro, em relacio ao passado como retorno, renascimento, recorréneia (ef. recursvidade, ciel). Finalmente, relagbes entre ppatsado/presence ou presente/fucuro aparentemente progressistas etm uma substincia sa (CF. progresoleap0). reaciondtiae vices 208 palmente européia), os diversos componentes étnicos da populagio nor- te-americana, em que a exaltacio dos acontecimentos relativamente re- centes da hist6ria americana (Guerra da Independéncia, Guerra da Seces- io etc.) sio hipostasiados num passado mitificado e, conseqtientemente, estio sempre ativamente presentes enquanto mitos (Nora, 1966). Os habitos de periodizagio histérica levam, assim, a privilegiar (5 as revolugGes, as guerras, as mudangas de regime politico, isto é, a histéria dos acontecimentos. Encontramos este problema a propésito das novas relagées entre passado e presente, que a chamada “nova” histéria procura hoje estabelecer. Por outro lado, a definigao oficial, universitéria e esco- listica da histéria contemporanea, em alguns paises, como a Franca, obriga-nos atualmente a falar de uma “histéria do presente” para falar do passado mais recente, presente hist6rico (Nora, 1978). ‘A distingao passado/presente que aqui nos ocupa éa que existe na consciéncia coletiva, em especial na consciéncia social histérica. Mas torna-se necessério, antes de mais nada, chamar a atengao para a perti- néncia desta posi¢ao e evocar o par passado/presente sob outras pers~ pectivas, que ultrapassam as da meméria coletiva e da histéria. De fato, a realidade da percepao ¢ divisto do tempo em fun- do de um antes € um depois nao se limita, em nivel individual ou coletivo, & oposigao presente/passado: devemos acrescentar-lhe uma terceira dimensio, o futuro. Santo Agostinho exprimiu, com profundi- dade, o sistema das trés visGes temporais ao dizer que s6 vivemos no Presente, mas que este presente tem vari coisas passadas, o presente das coisas presentes, 0 presente das coisas Faturas” (Confessions, XI, 2 a a ~~ Importa também, antes de considerar a oposicao passado/pre- sente no quadro da meméria coletiva, ter em mente 0 que ela significa em outros dominios: 0 da psicologia e, principalmente, 0 da psicolo- gia infantil e da lingutstica, A oposigao passadolpresente em psicologia Seria errado transpor os dados da psicologia individual para o ‘campo da psicologia coletiva e, mais ainda, comparar a aquisi¢io do 209 dimensbes, o presence das? ¢ O © es 2 < dominio do tempo pela crianga com a evolucéo dos conceitos de tempo através da histéria. A evocagio destes dominios pode, no entanto, forne- ‘cer algumas indicagdes gerais, que esclarecem, metaforicamente, alguns aspectos da oposigao passado/presente em nivel histérico ¢ coletivo. Para a crianga, “compreender 0 tempo ¢ libertar-se do presente [.u] nao 56 antecipar o futuro, em fungio de regularidades inconscien- remente estabelecidas no passado, mas desenvolver uma sucesso de es- tddios, nenhum dos quais é semelhante aos outros, cuja conexdo s6 se poderia estabelecer por movimentos cada vex mais préximos, sem fi- xagao nem repouso” (Piaget, 1946). ‘Compreender 0 tempo “é essencialmente dar provas de reversi- bilidade”. Nas sociedades, a distingao do presente e do passado (¢ do fururo) implica essa escalada na meméria e essa libertagao do presente que pressupdem a educacio e, para, além disso, a instituigio de uma meméria coletiva, a par da meméria individual. Com efeito, a grande diferenga é que a crianga — nio obstante as presses do ambiente exte- rior — forma em grande parte a sua meméria pessoal, enquanto a me~ méria social histérica recebe os seus dados da tradigo ¢ do ensino, aproximando-se, porém, do passado coletivo (cf. 0 artigo “Meméria”, neste volume) enquanto construgio organizada: “Através do jogo desta organizacéo, 0 nosso horizonte temporal con- segue desenvolver-se muito além das dimensdes da nossa propria vida ‘Tratamos 0s acontecimentos que a histéria do nosso grupo social nos fornece tal como tinhamos tratado a nossa propria histéri. ‘Ambas se confundem: a histéria da nossa infincia ¢ a das nossas, primeiras recordagdes, mas também a das recordagbes dos nossos pais, 6a partir de umas e outras que se desenvolve esta parte das nossas perspectivas vemporais (Fraisse, 1967, p. 170) Finalmente — 0 que nao é automaticamente transponivel 20 dominio da meméria coletiva, mas mostra bem que a divisio do tempo pelo homem é um sistema de tres diregoes ¢ no apenas duas—, actianga progride simultaneamente no processo de localizagio no passado ¢ 20 facuro (Malrieu, 1953). ‘A patologia das atitudes individuais em face do tempo mostra que 0 comportamento “normal” ¢ um equilfbrio entre a consciéncia 210 do passado, do presente ¢ do futuro, com algum predominio da pola- riaagdo para o futuro, temido ou desejado. _____Apolaszasfono presente, pica da crianga muito pequens que ‘econstitui o préprio passado em fungio do presente” (Piaget, apud Bringuier, 197, p. 178), do débil mental, do maniaco, do ex-depor tado cuja personalidade foi percurbada, encontra-se em geral nos velhos. nos individuos que sofrem da mania de perseguicao e temem o futuro, ‘O excimplo mais cléssico é 0 de Rousseau, a0 recordar, nas Conféssions, que a sua imaginagio exaltada, que s6 Ihe fazia prever cruéis futuros, 0 levava a refugiar-se no presente; “O meu coragio, inteiramente merg Ihado no presente, nao preenche toda a sua capacidade, todo o seu es- pago” (1765-1776). A oposicio entre orientacio para o presente e orientagio para 0 passado serve de basea uma das grandes clivagens da cascterologia de Heymans ¢ Le Senne, que consideram a primariedade, no primeiro caso, ¢, no segundo caso, a secundariedade, estruturas do cardter humano (Fraisse, 1967, p. 199). Em outros doentes, a at sma de uma fuga para o futuro, 00 de ui Fl de Marcel Proust é exemplar na literatura. Passadolpresente luz da lingitstica O estudo das linguas oferece-nos outro testemunho cujo valor reside, por um lado, no fato de a distingio passado/presente (Futuro), {que tem um caréter natural, nelas desempenhar um papel importante, sobretudo nos verbos ¢, por outro lado, no fato de a lingua ser um fend- meno duplamente originado na histéria coletiva: ela evolui — até ‘mesmo na prépria expressio das relagdes de tempo através das épocas— ¢ até csitamenteligada romada de conscincia da ideneidade maco- nalno pasa, Segundo Mish, shir da rang "womeyacom sons, imei consataoa dingo passo/presente aur) em- ora paresa natural, néo é, de fato, universal em lingiifstica. Ferdinand de Saussure jé 0 notara: aut ‘A distingao dos tempos, que nos & familiar, éestranha a certas linguas; fo hebseu nem sequer conhece 0 que existe entre passado, presente ¢ Faro. © protogermanico no tem forma préprit pars 0 fro [~] As linguas eslavas dissinguem regularmente dois aspectos do verbo: o perfeito, que represents a agfo na sua rotaidade, como um po fora de todo 0 devir, € 0 imperfeito, que a mostra enquanto se faz € nna linha do tempo (1906, I, p- 162). ‘A lingiiistica moderna retoma a constatagio: “Parte-se do principio de que a epic a dos tempos é um trago universal suagem” (Lyons, 1968). : se us nisin const doempo nacre verbal, que vai mito além dos aspects verbais diz respeito 20 vocab~ Litio, & frase € a0 estilo. Fala-se por vezes de cronogenese (Guillaume, 1929). Reencontra-se a idéia fundamental do passado ¢ do presente como construsio, organizacéo Iégica, ¢ ndo como dado bruto. Joseph Vendryés insistiu muito nas insuficiéncias da categoria gramatical do tempo ¢ nas inconseqiiéncias que 0 uso dos tempos m: nifesta em todas as linguas. Faz notar que, por exemplo, ene com a fungi de < endncia gral da linguagsm empregat 0 pres He reali cnieeiP)-0 pasado pode ambem ser expresso pelo se Na nares ase com fends 0 que se designs por ae istérico (e também o futuro histérico: “Em 410 os barba- re apurto a Rom) [-]Inverament, 0 pssado pode servis para Sip preset (cv da nooo egy ani 0880 res [1 Ba ancl, o condicional pasado pode ct wa com sre citar "Sen tee sido cond ee tbo, epee Seen seabado” (Vendiyes 1921, ed. 1968, pp. 118-20. ‘A distingao passado/presente (futuro) & maledvel esté sujeita a miilti- Jas manipulagbes. : aan nae vempo da nazragio constitui um local de observagion particu- larmente interesante. Harald Weintich (1971) sublinhou a imporsin- na narracéo. Utilizando cia de se por em relevo este ou aquele tempo, na narrag = ‘um estudo de De Felice (1957) sobre textos da Idade Médis, chamou "a istinguindo, por exemplo, um ini- a atengio para Uattacco di racconto, distingui tio em Fo (Houve) de um in(eio em Era (Flavia). © passado nfo &s6 pasado, & também, no seu funcionamento textual, anterior a toda a 212 exegese, portador de valores religiosos, morais, civis etc... B 0 pasado fabuloso do conto “Era uma ver...", ou de “Naquele tempo...”, ou 0 pasado sacralizado dos Evangelhos: “In illo tempore. André Miquel, ao estudar, & luz das idéias de Weinrich, a expressio do tempo num conto de As mil e uma noites, verifica que af € posto em destaque um tempo do drabe, o mudi, que exprime 0 passado, o perfeito, © acabado, em relagio a um tempo subordinado, 0 mudari, tempo da 2 concomitincia do habito, que exprime o presente ou o imperfeito, ke Pois que o passado ¢ uma auitoridade, Miquel (1977) pode servir-se ) desta andlise para mostrar que este conto tem como fungao contar aos éra- (, bes desapossados uma histéria de drabes triunfantes e apresentar-Ihes um / passado concebido como fonte, fundamento, garantia de eternidade. A gramitica histérica pode também evidenciar a evolucio do emprego dos tempos do verbo e das express6es lingiifsticas temporais, como elementos reveladores da evolugao das atitudes coletivas perante © pasado, enquanto fator social ou histérico. Brunot (1905) tinha assinalado que, por exemplo, no francés antigo (séculos IX-XII), havia ‘uma grande confusio entre os tempos; de uma certa indistingao entre pas- sado, presente ¢ futuro, dos séculos XI a XIII, assiste-se a0 progredir do imperfeito, e que, em contrapartida, no francés médio (séculos XTV-XV) existia uma determinago mais nftida da fungio exata dos tempos. Tam- bém Paul Imbs (1956) sublinha que a linguagem, ao longo'da Idade ‘Média, pelo menos na Franga, torna-se cada vez mais clara, cada vez mais diferenciada relativamente & expressio da coincidéncia, da simulta- ncidade, da posterioridade, da anterioridade etc. Refere também diferen- tes maneiras de conhecer c exprimir a relagio passado/presente, variével com as classes sociais; 0 tempo dos filésofos, tedlogos e poetas oscila entre o fascinio do passado ¢ 0 impulso para a salvagao Futura — tempo’) de decadéncia e de esperanga; o te i npo de velo- ( cidade, mas que facilmente se torna circular, confundindo os tempos; ) o do camponés € um tempo de regularidade e de paciéncia, deum pas- ] sado em que se procura manéer o presente; 0 tempo dos burgueses, como € natural, é aquele que, além de distinguir passado/presente (fu- turo), orienta-se deliberadamente para o futuro. Emile Benveniste (1965) estabelece uma importante distingZo entre: 213 2) tempo fisico, “continuo, uniforme, infinito, lineas, divisivel avontade”; }) tempo cronolégico ou “tempo de acontecimentos” que, socia- lizado, € 0 tempo do calendétios ©) tempo lingitistico, que “tem o préprio centro no presente da insténcia da palavra’, 0 tempo do locuror: © tinico tempo incrente & lingua eo presente axial do discurso e [...] tal presente € implicito, Isto determina outras duas referéncias tem- porais, que estdo necessariamente explicitadas num significance ¢ fa- fem aparecer 0 presente & sua volta como uma linha de separagio entee © que jd nto é presente e o que irf sé-lo. Estas.duas referéncias néo .si0_pripriss do tempo, mas de pontos de vista sabre-cle.sendo pro- jeeadas para ts ou para frente a parti do. momenta presente {8 J] Ora, 0 tempo histérico, porque nao se exprime a maior parte ‘2 / las vezes em termos narrativos, ao nivel do historiador ou ao da me- // |méria coletiva, comporta uma referencia constante 20 presente, uma <+'| Mocalizacao implicita no presente. Isto é, acima de tudo, vélido para a ise6ria tradicional, que durante muito tempo foi, preferencialmente, |] uma histéria-conto, uma narragio. Dai a ambigttidade dos discursos || histéricos que parecem privilegiar o pasado, como o programa de | Michelet: a histéria como “ressurteigio integral do passado”. Passadolpresente no pensamento selvagem ‘A distingao passado/presente nas sociedades “frias”, para retomar «; wa linguagem de Claude Lévi-Strauss, & mais fraca que nas sociedades 5 AG ““quentes” e, 20 mesmo tempo, de natureza diferente. “Mais fraca porque a referencia essencial ao passado é a de um tempo mitico, criacéo, Idade do Ouro (cf. 0 artigo “Idades miticas”, neste volume), ¢ 0 tempo que se supde ter decorrido entre ral criayao 0 presente é, em geral, muito “simplificado”. j Diferente porque ¢ “préprio do pensamento selvagem ser atem= poral; ele quer aprender o mundo como totalidade simuleaneamente sincrdnica e diacrénica” (Lévi-Strauss, 1962, p. 348). — 214 © pensamento selvagem, no que se refere a mitos ¢ rituais, esta- belece uma relagio peculiar entre passado e presente A histéria mitica tem 0 paradoxo de ser a0 mesmo tempo disjuntiva e conjuntiva, em relacio ao presente [..] Gragas 20 ritual, o passado “disjunto” do mito articula-se, por um lado, com a periodicidade biolégica e sazonal, e, por outro, com 0 passado “conjunto” que, ao longo das gerag6es, une os mortos e os vivos (op. cit., p. 313) A propésito de algumas tribos australianas, distinguem-se os ri- tos histérico-comemorativos, que “recriam a atmosfera sagrada e benéfica dos tempos miticos — ‘época do sono’, dizem os australianos —, que refletem, como num espelho, os protagonistas ¢ os seus altos feitos ¢ que transferem 0 passado para o presente”, ¢ 0s ritos de luto, que cor- respondem “a um procedimento inverso: em lugar de confiarem a ho- mens vivos o encargo de personificar longinquos antepassados, estes ri- tos asseguram a reconversio em antepassados de homens que acabaram de morrer” e, por conseqiiéncia, transferem o “presente para 0 passado” (op. cit., p. 314). Nos samos do Alto Volta, os ritos da morte. que se procuram atrasar mediante sacrificios, revelam “uma certa concepgao de um tempo imanente, nao sujeito as regras da subdivisio cronolé- gica” (Héritier, 1977, p. 59), ou melhor, “de temporalidades relativas” (op. cit., p. 78). Nos nueres, como em muitos “primitivos”, 0 tempo é medido por classes de idade; um primeiro tipo de passado refere-se aos peque- nos grupos ¢ dilui-se rapidamente “em remotos tempos misteriosos, num outrora longinquo” (Evans-Pritchard, 1940); um segundo tipo de pasado constitui 0 “tempo hist6rico”, “seqiiéncia de acontecimen- tos significantes para uma tribo” (inundagées, epidemias, fomes, guerras) Gbidem), muito anterior ao tempo histérico dos pequenos grupos, mas que se limita, sem diivida, a uma cingiientena de anos; vem depois um “plano das tradig6es, em que alguns elementos da realidade histérica se incorporam num complexo mitolégico”, ¢ além “estende-se 0 horizonte do mito puro”, em que se confundem © mundo, os povos, as civilizagses que existiram todas a0 mesmo tempo no mesmo pasado imemoriavel. Para os nueres, a dimensio ais do tempo é pouco profunda. A histéria vélida termina um século atris, ¢ as tadigdes conduzem-nos, na melhor das hipdteses, até dea, ou 12 geragées na estrutura da linhagem {...] Poderemos avaliar a falta de profundidade do tempo nuer se soubermos que a drvore, de quem a humanidade recebeu o set, estava ainda viva, ha alguns anos, a oeste do pais Nuet! (op. cit., pp. 159-60). Nos azandes, “presente ¢ futuro sobrepdem-se de tal modo que o presente participa, por assim dizer, do futuro” (Evans-Prit- chard, 1937). Os seus oréculos, muito praticados, contém ja o fu- turo. Mas, no seio do pensamento selvagem, profundamente sin- crénico, estd oculto 0 sentido de um passado histérico. Lévi-Strauss julga poder identificé-lo nos arandas da Austrélia Central, através dos churinga, “objetos em pedra ou madeira, de forma aproxima- damente oval, com extremidades pontiagudas ou arredondadas, fre- qiientemente semeadas de signos simbélicos [...]” (Lévi-Strauss, 1962), nos quais vé notaveis analogias com os nossos documentos de arquivo. (Os churinga sio 0s testemunhos palpiveis do periodo mitio {..] Se petdéssemos os arquivos, o nosso passado nio seria, por isso, abo- lido: seria privado daquilo a que podemos chamar 0 seu sabor dia- crOnico. Continuaria ainda a existir como passado, mas preservado apenas nas reprodugGes, em livros, instituig6es, mesmo numa ou doutra situaglo, todos contemporineos ou recentes, Por conseguinte, também cle seria reduzido & sincronia (ibidem) Em certos povos da Costa do Marfim, a consciéncia de um pas- sado histérico ja se encontra desenvolvida lado a lado com uma multi- plicidade de tempos diversos. Os guérés tém, assim, cinco categorias temporais: 1) 0 tempo mitico, tempo do antepassado mitico; entre ele € 0 pri- ‘meito av6 real existe um abismo; 2) o tempo histérico, espécie de caneao de gesta do clas 3) 0 tempo genealdgico, que pode abranger mais de der geragoess 4) 0 tempo vivido, que se subdivide em tempo antigo, um tempo muito duro, de guerras tribais, fome, insinia; tempo da colo- 216 jnagio, libertador e ao mesmo tempo escravizante; tempo da in- dependéncia, paradoxalmente sentido como tempo de opressio, em conseqiiéncia da modernizagio; 5) 0 tempo projerado, tempo da imaginagio do futuro, Reflexbes de cardter geral sobre passadolpresente na consciéncia histbrica Eric Hobsbawm (1972) levantou o problema da “Fungio social | do passado”, entendendo por passado o periodo anterior aos aconteci- / \" mentos de que um individuo se lembra diretamente. ‘A maior parte das sociedades considera 0 passado modelo do presente. Nesta devocao pelo passado hd, no entanto, fendas através das quais se insinuam a inovagio e a mudanga. ‘Que parte da inovacdo as sociedades admitem na sua ligagso com ‘o passado? $6 algumas seitas conseguem isolar-se ¢ resistir totalmente ‘amudanca. As sociedades ditas tradicionais, especialmente as campo- esas, no sio to estaticas como se julga. Se a ligacso com o pasado pode admitir novidades e transformagées, n sentido da evolugao € percebido como decadé «fo aparece em uma sociedade sob 3 Form: é aidéia-forca das “renascengas”. ‘Muitos movimentos revolucionérios tiveram como palavra de or- dem e objetivo o regresso 20 passados por exemplo, a tentativa de Zapata de restaurar, no México, a sociedade camponesa de Morelos, no estado em que se encontrava quarenta anos antes, riscando a época de Porfirio Diaz.e regressando ao status quo anterior. Nao podemos deixar de refe- tiras restauragées simbélicas, como a reconstrucio da velha cidade de Varsévia, tal como se encontrava antes das destruig6es da Segunda Guerra Mundial. A reivindicagéo de um regresso ao passado deriva novas iniciativas: o nome “Gana” transfere a histéria de uma parte da Africa para outa, gouges ior parte dos casos 0 ou a dé um regresso ao passado: Ainova-“ ce afastada e historicamente diferente. ‘© movimento sionista nao deu origem a restauracio da antiga Palestina judaica, mas a um Estado completamente novo: Israel. Os movimentos hacionalistas, até 0 nazismo eo fascismo, que tendem a instaurar uma 217 ordem completamente nova, apresentam-se como arcaizantes ¢ tradiciona- liseas. O passado sé é rejeitado quando a inovagao é considerada inevité- vel e socialmente descjével. Quando ¢ como as palavtas “novo” e “revo- lucionério” se tornaram sindnimas de “melhor” e “mais desejével”? Dois problemas espectficos so os que se referem ao passado, como genealogia ce cronologia. Os individwos que compdem uma sociedade sentem quase sempre a necessidade de ter antepassados; é esta uma das fungGes dos grandes homens. Os costumes ¢ 0 gosto artistico do passado so muitas vvezes adotados pelos revoluciondrios. A cronologia mantém-se essencial para o sentido moderno, histérico, do passado, pois quea hist6ria é uma mudanca orientada. Cocxistem cronologias historicas ¢ nio-hist6ricas, € temos de admitir a persisténcia de formas diferentes de sentido do passa- |do, Nadamos no passado como peixxes na dgua e nfo podemos escapar- [the (Hobsbawm, 1972). Frangois Chatelet, por seu lado, ao estudar 0 “ascimento da hist6ria na Grécia antiga, definiu previamente os tragos caracter(sticos do “espirito histérico”. Comega por apresentar 0 passado €0 presente como categorias idénticas e simultaneamente diferenciadas: 2) O capttohistricoacedita na raidade do pss € considera sie pasado, comm &¢ até dre pontm 80 aru contntdo- {no é, por natureza, diferente do presente. Ao reconhecer 0 pas- Mt camo jf nde vind, considera que gue AcOMeceu OU storm cunasteve um ga € um dt, examen da mesma Seana que 0 que ete. que ete conecimento que hoje eno | nee dos othos [-) lt initia que nto ¢ permit, deforma Sigua estar oscontedde como filo ou ie, que nfo | Soma un fo realidad! (1962, 1, p11) b) O pasado € 0 presente sio no s6 diferenciados, como por veres se opéem: Se o passado € o presence pertencem 3 esfera do mesmo, estio tam- bbém na esfera da alteridade. Se € um fato que 0 acontecimento pas- sado estd acabado ¢ que esta dimensfo o constitui fundamentalmen- te, também é verdade que “a sua qualidade de passado” o diferencia de qualquer outro acontecimento que se Ihe pudesse assemelhar. A idéia de que ha repetighes (res gestae) na hist6ria... que “no ha nada 218 de novo sob 0 sol”, ou mesmo de que hi ligbes do passado, s6 tem sentido para uma mentalidadenfo-hissis (op. cit I, p. 12). ©) Finalmente, a histéria, cién todos cientificos de estudo do pasado. do passado, deve recorrer a mé- E indispensivel que o passado, considerado real e decisivo, seja estu- dado seriamente: na medida em que os tempos passados si0 consi- derados dignos de atengio e Ihes é atribuida uma estrucura, em que Ihes si0 dados tragos atuais, todo o discusto significativa do passado deve poder estabelecer claramente por que razio — em fungio de quais documentos e testemunhos — ele dé, de uma dada sucessio de aconte que a datacio e localizagéo do acontecimento sefa muito cuidada, tanto Imais que 0 passado s6 adquire cariter histérico na medida em que recehe semelhantes determinagées (0p. cit., pp. 21-22). mentos, uma versio € nao outra. Convém principalmente “A preocupagio de preciso, no estudo do que outrora aconte- eu, 6 no principio do século passado aparece claramente”, com “o im- pulso decisivo dado por L. von Ranke”, professor da Universidade de Berlim entre 1825 ¢ 1871 (op. cit., p. 22). Evolugao da relagto passadolpresente no pensamento europen da Antigiidade grega ao século XIX Podemos esquematizar as atitudes coletivas perante 0 passado, 0 presente (¢ futuro) ao dizermos que, na Antigitidade paga, predominava avalorizagio do passado, paralelamente a idéia de um presente decadente; que, na Idade Média, o presente est encerrado entre 0 peso do passado ea csperanga de um futuro escatolégico; que, no Renascimeiit6, otnvestimen- to é feito no presente e qu; do século XVII ao século XIX, a ideologia do progresso volta para o futuro a valorizagio do tempo. (Apenas se encon- ward qui win evorayio esque uddes perante 0 pasado ¢ 0 presente. Ver 0s artigos “Antigo/Moderno’”, “Escatologia’, “Idades miticas’, “Memséria’, “Progresso/Reacio”, “Decadéncia”, “Hist6ria’, neste volume). O sentimento do tempo, na cultura grega, volta-se para o mito da dade do Ouro e para as recordagies da época heréica. O préprio Tucidides ica das at 219 y vy i no vé, no presente, mais que um futuro passado (Romilly, 1947; 1956) cc abstrai-se totalmente do futuro, mesmo quando 0 conhece, para mergu- Ihar no passado (Finley, 1967). A historiografia romana esté dominada pela idéia de moralidade dos antigos, eo historiador romano é sempre, de certo modo, um laudator temporis acti, para usat a expresso de Horicio. Tito Livio, por exemplo, que escreveu no contexto da obra de restauragio de ‘Augusto, exalta 0 passado mais remoto e indica, no proémio da sua obra, 0s motivos da decadéncia do passado, no presente: “Quereria que cada um, de vés me seguisse com 0 espirito, para verdes como, diminuindo pouco ‘a pouco a disciplina moral, os costumes de outros tempos comegam por se relaxar, vio descendo cada vez mais baixo, e, finalmente, desde que se cchegou a estes tempos, esto prestes a cair no precipfcio” (1, 9). Pierre Gibert, a0 estudar na Biblia as origens da hist6ria, pos ‘em evidéncia uma das condigées necessérias para que a meméria coletiva se torne hist6ria, o sentido da continuidade, e julga poder identificé-lo com a instituigao da monarquia (Saul, Davi, Salomao): “E & instieuigao mondrquica que Israel deve 0 sentido da continuidade, em relagio a0 conhecimento do seu pasado; mesmo tendo ela possuido, de certo modo, através do conjunto das suas lendas, o sentido desse pasado, mesmo tendo tido uma certa preocupagio de exatido, s6 com a mo- narquia aparece o sentido de uma continuidade sem rupturas” (1979, p. 391). Mas, com a Biblia, a histéria hebraica est4, por um lado, fasci- nada pelas suas origens (criagao, a alianga de Javé com 0 seu povo) ¢, por outro, voltada para um futuro igualmente sagrado: a vinda do Mes- sias e da Jerusalém celeste que, com Isafas, se abre a todas as nagbes. cristianismo, por entre as origens obscuras do pecado ori- ginal e da queda, e 0 “fim do mundo”, a parousia, cuja espera nao deve perturbar os cristaos, vai esforcar-se por centrar a atencio no presen- te, De sio Paulo a santo Agostinho, até os grandes tedlogos da Idade Média, a Igreja procuraré orientar 0 espirito dos cristéos para um presente que, com a encarnagio de Cristo, ponto central da histéria, inicia o fim dos tempos. Mircea Eliade mostrou, através de diversos textos de so Paulo (Epistola aos Tessalénicos, 4, 16-17; Romanos, 13, 11-125 II Tessal6nicos, 3, 8-10; Romanos, 13, 1-7], a ambigii- dade desta valorizagao do presence: “As conseqiiéncias desta valorit 40 ambivalente do presente (na espera da parousia, a hist6ria conti- nua e deve ser respeitada) nao deixam de se fazer sentir. Apesar das 20 imimeras solugées propostas a partir do fim do primeiro século, 0 problema do presente histérico mantém-se, ainda hoje, no pensamen- to contemporineo” (Eliade, 1978, p. 336). De fato, o tempo medieval vai bloquear 0 presente entre uma re- troorientacio parao presente e um futuro-tropismo, especialmente acen- tuado no milenarismo (cf. o artigo “Escatologia”, neste volume). A Igreja, ao reprimir ou condenar os movimentos milenaristas, favorecia atendéncia para privilegiar 0 passado, reforgada pela teoria das seis ida- des do mundo, segundo a qual o mundo teria entrado na sexta e titima idade, a da decrepitude, da velhice. No século XII, Guillaume de Con- ches declarava que nao passamos de comentadores dos antigos, nao inventamos nada de novo. O termo “antigitidade” (antiquitas) era sind- nimo de “autoridade” (auctoritas), “valor” (gravitas), “grandeza”, “ma- jestade” (maiestas). Stelling-Michaud sublinhou que, oscilando entre 0 passado € 0 fururo, procuraram viver o presente de modo atemporal num instante ‘que corresponde a um dtomo de eternidade (1959, p. 13). Santo Agos- tinho a isso exorta os cristos nas Confissdes e na Cidade de Deus: “Quem © parard, a este pensamento (flutuante, ao sabor das ondulagées do pas- sado e do futuro), quem o imobilizaré, para dar-lhe um pouco de esta- bilidade, para abri-o intuigZo do esplendor da eternidade sempre im vel?” (Confissées, XI, 13). E ainda: “Os anos sao como um sé dia... €0 teu hoje nao dé lugar a um amanha, tal como nfo sucede a um ontem. O teu hoje €a eternidade...” (op. cit., 13-16). Ou ainda: “Comparada com um momento da eternidade, a mais longa duragao nao € nada” (De Civitate Dei, XM, XU). Dante exprimiré magnificamente esta idéia (Paraiso, XXXII, vv. 94-96) com a ajuda da imagem do ponto, como esclarecimento da ceternidade: “Un punto solo m’? maggior letargo/ che venticinque secoli a la ‘mpresa/ che fé Nettuno ammirar 'ombra d’Argo”. “Também os artistas da Idade Média revelam atragio pelo passa- do, o tempo mitico do Paraiso, a procura do momento privilegiado, que arrasta para o futuro a salvagao ou a danagao, Estes artistas procu- raram fundamentalmente exprimir 0 atemporal. Movidos por um “de- sejo de eternidade”, recorreram com freqiiéncia ao simbolo, que faz 22 comunicar as diferentes esferas: 0 passado, 0 presente ¢ 0 fucuro. O ctistianismo é uma religido da intercepgao (cf. Morgan, 1966). (© presente € também saboreado pelo homem da Idade Mé- dia, que atualiza constantemente o passado, nomeadamente o passa- do biblico. © homem da Idade Média vive num constante anacro- nismo, ignora a cor, reveste as personagens da Antigitidade de hébi- tos, sentimentos e comportamentos medievais. Os cruzados acredi- tavam que iam a Jerusalém vingar os verdadeiros carrascos de Cristo. Mas talvez possamos dizer: “O pasado nao é estudado enquanto passado; cle ¢ revivido e incorporado no presente” (Rousset, 1951, p. 631)? O presente ja ndo absorvido pelo passado, pois sé este Ihe da sentido ¢ significado? ‘Mas, no final da Idade Média, o passado é apreendido cada vez ‘mais através do tempo das crénicas dos processos de datagio e medigio do tempo, marcado pelos relégios mecanicos. “Passado ¢ presente dis- tinguem-se na consciéncia da Baixa Idade Média, ndo s6 através do seu aspecto histérico, mas através de uma sensibilidade dolorosa e trégica” (Glasser, 1936, p. 95). O poeta Villon encara tragicamente essa fuga do tempo, esse afastamento irremedidvel do passado. (© Renascimento parece ser percorrido por duas tendéncias con- traditérias. Por um lado, os progressos feitos na mediga0, datacio e cro- nologia permitem uma perspectiva hist6rica do passado (Burke, 1969). Por outro lado, o sentido trigico da vida e da morte (Tenenti, 1957) pode conduzir ao epicurismo, a fruigao do presente que os poctas ex- primem, desde Lorenzo, o Magnifico, a Ronsard: “Perd, donne gentil, giovani adorni,/ che vi state a cantare in questo loco,/ spendete lieta~ mente i vostri giorni,/ ché giovinezza passa a poco a poco” (Lorenzo, 0 Magnifico, Canzoni a ballo, IX, wy. 21-24). progresso cientifico, a partir de Copérnico e sobretudo com Kepler, Galileu e Descartes, serviu de fundamento ao otimismo ilumi- nista que afirma a superioridade dos modernos sobre os antigos (cf. 0 artigo “Antigo/moderno”, neste volume), ¢ a idéia de progresso torna-se © fio condutor do historiador que se orienta para o futuro. O século XIX esté dividido entre 0 otimismo econdmico dos partidérios do progresso material e as desilusoes dos espititos abatidos 222 pelos efeitos da Revolugio e do Império. © Romantismo volta-se deli- beradamente para o passado. O pré-Romantismo do século XVIII ti- inha-se interessado pelas rufnas e pela Antigiiidade. Seu grande mestre, Winckelmann, historiador e arquedlogo, propés como modelo de per- feigio a arte greco-romana, Histéria de arte da Antigiiidade (Geschichte der Kiunst des Altertums, 1764), e langou uma célebre colegao da arqueo- logia, os Monumenti antichi inediti spiegati ed illustrati, publicados em Roma no ano de 1767. Foi a época das primeiras escavagées em Her- culano ¢ Pompéia. A Revolucio Francesa consagrou 0 gosto pela Anti- gilidade. Chateaubriand com Le génte du christianisme (1802), Walter Scott com o romance histérico (Ivanhaé, 1819; Quentin Durward, 1823), Novalis com o ensaio A cristandade e a Europa (Die Christenbeit oder Europa, 1826) contributram para orientar para a Idade Média 0 gosto pelo passado. E 0 grande momento da moda troubadour no tea- tro, na pintura, na égua-forte, na gravura em madeira, na litografia. Durante este perfodo, a Franca revela, nas suas manifestagdes artisticas, ‘uma verdadeira “manufatura do passado” (Haskell, 1971). Podemos dis- tinguir entio trés perfodos distintos: em 1792, a abertura (no ex-con- vento dos grandes-agostinhos) de um museu que, em 1796, se trans- formou no Museu dos Monumentos Franceses ¢ impressionou viva- mente muitos dos seus contemporiineos (por exemplo, Michelet, que 1d descobriu 0 passado da Franca). Em seguida, Napoledo deu grande impulso & pintura hist6rica, dedicada a hist6ria da Franga. Os quadros que tratavam da histéria da Franga passaram de dois, nos saldes de 1801 € 1802, para oitenta ¢ seis, em 1814. Finalmente, Luts Filipe decidiu, em 1833, restaurar Versailles e transformé-la num museu dedicado “a todas as glérias da Brana”. O gosto romantico pelo passado, que alimenta 0s movimentos nacionalistas europeus do século XIX e foi incrementado pelos nacio- nalismos, incidiu também sobre a antigitidade juridica e filoséfica e acultura popular. O melhor exemplo desta tendéncia é, sem duivida, a obra dos irmaos Jakob e Wilhelm Grimm, autores dos célebres Contor ‘para criangas e familias (Kinder-und Hausmitrchen, 1812 e segs.), da His- séria da lingua alema (Geschichte der deutschen Sprache, 1848) e de um Vocabulario alemio (Deuasches Warterbuch, 1852 © segs.). 223 O séeulo XX entre a vivéncia do passado, a histbria do presente e 0 fasctnio do futuro © milenarismo, longe de ter desaparecido na Europa do século XIX, oculta-se no seio do préprio pensamento marxista, que se con- sidera cientifico, assim como do pensamento positivista: quando Au- guste Comte, na Sommaire appréciation de Vensemble du passé moderne (1820), defende a ultrapassagem de um sistema teolégico ¢ militar ea aurora de um novo sistema cientifico e industrial, surge-nos como um. novo Joaquim da Fiore. (O século XIX continuou a fazer reviver o passado medieval para além do Romantismo (Graus, 1975). Contudo, no inicio do século XX, a crise do progresso que se esboca determina novas atitudes em face do passado, do presente ¢ do facuro. ‘A ligagio com o pasado comega por adquirir formas inicial- mente exasperadas, reaciondrias; depois, a segunda metade do século XX, entre a anguistia atémica e a euforia do progresso cientifico e téc- nico, volta-se para o pasado com nostalgia e, para o futuro, com te- ‘mor ou esperanca. Entretanto, na esteira de Marx, os historiadores esfor- am-se por estabelecer novas relagdes entre presente e passado, ‘Marx tinha jé denunciado o peso paralisante do pasado — de um passado reduzido a exaltagao das “memérias gloriosas” — sobre os povos, por exemplo, o francés: “O drama dos franceses, tal como o dos operitios, sdo as grandes membrias, E. necessirio que 0s acontecimen- tos ponham fim, de uma vez por todas, a este culto reacionério do pas- j sado” (1870, p. 147), culto que, no fim do século XIX ¢ inicio do sé- | culo XX, foi um dos elementos essenciais das ideologias de dircita e uma \ das componentes das ideologias fascistas e nazis. Ainda hoje, 0 culto pelo pasado alia-se ao conservantismo so- , cial, identificando-o Pierre Bourdieu com categorias sociais em declinio: | “Uma classe ou uma fragao de classe est em declinio e, portanto, vol- tada para o passado, quando jé nao esté 3 altura de reproduzit, com rodas | as suas propriedades, condigses e posigses [..]” (1979, p. 530). Aaceleragio da histéria, por outro lado, levou as massas dos pat- ses industrializados a ligarem-se nostalgicamente as suas ratzes: daf a 224 moda retr5, 0 gosto pela histéria e pela arqueologia, o interesse pelo folclote, 0 entusiasmo pela fotografia, criadora de memérias e recor- dagbes, 0 prestigio da nogao de patriménio. ‘Também em outros dominios a atengao pelo passado desem- penhou um papel importante: na literatura, com Proust ¢ Joyce, na filosofia, com Bergson, ¢, finalmente, numa nova ciéncia, a psicand- lise. Nela, 0 psiquismo ¢ representado como sendo dominado pelas re- cordages inconscientes, pela hist6ria oculta dos individuos e, princi- palmente, pelo passado mais longinquo, o da mais tenra infincia. A importancia atribufda ao passado pela psicandlise foi, no entanto, ne- gada, por exemplo, pot Maric Bonaparte, citando Freud: “Os processos do sistema inconsciente sao atemporais; sto 6, nao so ordenados tem- poralmente, nem so modificados pelo tempo que passa, nao tém re- Iago nenhuma com 0 tempo. A relacio com 0 tempo esti ligada ao trabalho do sistema consciente” (1939, p. 73). Jean Piaget faz outta critica ao “freudismo”: 0 passado que a ex- periéncia psicanalitica apreende nao é um verdadeiro passado, mas um. pasado reconstruido: © que esta operagio nos dé é a nogio atual do sujeito sobre o passado © nio o seu conhecimento direto. E, como Erikson afir- ‘mou (um psicanalista no ortodoxo com o qual estou inteiramente de acordo), © passado aparece reconstrufde em funsio do presen- te, da mesma forma que o presente & explicado em fungio do pas- sado. Hi uma inceragio entre cles, enquanto, pata o freudismo orto- doxo, ¢ o passado que determina 0 comportamento atual do adulto. Como se conhece, entio, esse passado? Através de recordagies que do reconstrufas num contexto, que é 0 do presente e em fungao des- se mesmo presente (apud Bringuier, 1977, p. 181). Concluindo, a psicandlise freudiana inscreve-se num vasto movi- ‘mento anti-histérico que tende a negar a importancia da relacio passado/ presente € que tem, paradoxalmente, as suas raizes no positivismo. A histéria positivista que, através de métodos cada vez mais cientificos de datasao e critica de textos, parecia permitir um bom estudo do pas- sado, estava imobilizando a hist6ria no acontecimento ¢ eliminando a temporalidade. Na Inglaterra, a historiografia oxoniense chegava, por 25 outras vias, ao mesmo resultado. O aforismo de Freeman, “A histéria éa politica do passado e a politica é a histéria do presente”, pervertia a relagdo passado/presence; quando Gardiner declarava que “o que estuda a sociedade do passado prestaré grandes servigos & sociedade do presente na medida em que no a toma em consideragio”, estava seguindo a mesma orientagio (Marwick, 1970, pp. 47-48). Estas afirmagdes ou consticuem apenas uma defesa contra 0 anacronismo e, nesse caso, séo banalidades; ou, entdo, séo uma ruptura com todas as ligagdes racionais entre presente e passado. O positivism: teve também outra atitude que, nomeadamente na Franga, levou 3 nega 40 do passado que afirmava venerar. E 0 “desejo de eternidade” reapa~ recido sob forma laica. Tal como pensava Ordo de Freising, no século XIV, coma tealizacao do sistema feudal, controlado pela Igreja, a his- t6ria atingiria os seus fins e acabaria; também na Franga se pensava que, depois da Revolugao e da Republica, para além de 1789 ¢ 1880, apenas existiria a etemnidade (como disse com pertinéncia Alphonse Duprono), “de tal modo a forma republicana consagrava o génio revolucionério da Franga”. Os manuais escolares pareciam defender que a hist6ria ti- nha atingido entio o seu fim ¢ adquirido estabilidade perpétua: “Re- ptiblica ¢ Franga: tais sio, meus meninos, os dois nomes que devem ‘manter-se gravados no mais fundo dos vossos corages. Que eles sejam objero do vosso amor constante e do vosso eterno reconhecimento”, Alphonse Dupront acrescenta: “A marca da eternidade esté agora sobre a Franga’ (1972, p. 1.466) De modo diferente, os nossos dominios cientificos — a psicans- lise, a sociologia e o estruturalismo — partem & procura do intemporal e procuram esvaziar o pasado. Philip Abrams mostrou que, se os socié- logos (e os antropélogos) se outorgassem o passado, a sua atividade seria, na realidade, a-hist6rica: “O essencial nao era conhecer o pasado, mas fazer uma idéia dele, da qual nos pudéssemos servit como termo de com- paragio para compreender o presente” (1972, p. 28). Alguns especia- fistas de cigncias humanas reagem hoje contra esta eliminagao do pas- sado. O historiador Jean Chesneaux pés a seguinte questo: fazemos tabula rasa do passado? Esta é a tentagio de muitos revolucionatios, ou de jovens preocupados em se libertar de todos os constrangimen- 10s, incluindo o do passado. Jean Chesneaux nao ignora a manipulacéo 26 do passado feita pelas classes dominantes. E, por isso, pensa que os po- vos, em especial os do Terceiro Mundo, deviam “libertar 0 passado”, ‘Mas nao podemos rejeité-lo, temos ¢ de colocé-lo a servico das lutas sociais € nacionais: “Se o passado tem importincia para as massas so- ciais, é num outro aspecto da vida social, quando se insere diretamente nas suas lutas” (1976). Esta integracéo do passado na luta revoliicio- ntia ou politica estabelece uma confusio entre as duas atitudes que 0 historiador deve ter perante o passado, mas que deve manter distintas uma da outra: a sua atitude cientifica de homem do oficio ¢ 0 seu com- promisso politico enquanto homem ¢ cidadao. O antropélogo Mare Augé parte da constatagao do aspecto re- pressivo da meméria, da hist6ria, da chamada 4 ordem do passado, ou ‘melhor, do futuro: é “o passado como constrigio”. Quanto ao futuro, “os messianismos e os profetismos também confirmam o constrangi- mento ao futuro passado, diferindo a aparicéo de sinais que exprimem, uma vez chegado o momento, uma necessidade radicada no passado” (1977, p. 149). Mas “que a hist6ria tenha um sentido, € a exigéncia de toda sociedade atual [...] a exigéncia do sentido passa sempre por um pensamento do passado” (op. cit., pp. 151-52). O que acontece é faze- rem-se, em fungio do presente, releituras constantes do passado, que deve sempre poder ser posto em causa, Este por em questio passado, a partir do presente, é aquilo a {que Jean Chesneaux chama “inverter relagSo passado/resente”; ele aribui sua origem a Marx. Partindo de uma afirmagio de Marx nos Grundrise (A sociedade burguesa é a organizagao histérica de produgao mais di- versificada e desenvolvida. As categorias que as relagbes desta sociedade cxprimem ¢ asseguram, a compreensio da sua estrutura, permitem-nos também compreender a estrutura e as relagées de produsio das socieda- des passadas” [1857-1858]), Henri Lefebvre observou: “Ma claramente o processo do pensamento histérico. O historiador parte do presente [...] a sua atuagio é, de inicio, recorrente, Vai do presente a0 passado. Daf volta ao presente, que é entio Cido e jd nfo oferece 2 andlise uma totalidade confisa” (1970). 3 Marc Bloch propés também ao historiador, como método, um \ duplo movimento: compreender o presente pelo pasado, compreen- \ der o passado pelo presente: “A incompreensio do presente nasce fatal- indicou hem analisadaeconhe- | 227 mente da ignorincia do passado. Mas é talvez igualmence iniiil esgo- tar-se a compreender o passado, se nada se souber do presente” (1941- 1942, p. 47). Dafa importincia da recorréncia em histéria: “Seria um erro grave acreditar que a ordem adotada pelos hiscoriadores nas suas investigagGes se deve modelar necessariamente pela dos acontecimen- tos. Para restituir & histéria o seu verdadeiro movimento, seria muitas vyezes proveitoso comesar por lé-la ‘ao contrério', como dizia Maitland” (op. cit., p. 48) Esta concep¢io das relagSes passado/presente desempenhou um grande papel na revista Annales — fundada em 1929 por Lucien Febvre Marc Bloch —, que inspirou e deu nome a revista britanica de histé- ria Past and Present, a qual, no primeiro ntimero, em 1952, declarou: “A histéria nao pode, logicamente, separat 0 estudo do passado do es- tudo do presente e do futuro”. O futuro, tal como o passado, atrai os homens de hoje, que pro- curam suas rafzes ¢ sua identidade e, mais que nunca, fascina-os. Mas os velhos apocalipses, os velhos milenarismos renascem, alimentados por um novo fortificante, a ciéncia-fic¢io: desenvolve-se a futurologia. Filésofos ¢ bidlogos trazem contribuicdes notaveis para a insergio da historia no futuro. Por exemplo, o fildsofo Gaston Berger perscrutou a idéia de futuro ea atitude prospéctica. Partindo da constaragao de que “os homens s6 muito tardiamente tém consciéncia da significagao do futuro” (1964, p. 227) e da frase de Paul Valéry, “Entramos no fururo as arrecuas”, recomendou uma conversdo do passado em futuro e uma atitude perante o passado que nao desvie nem do presente, nem do futuro e que, ao contratio, ajude a prevé-lo e a preparé-lo. © bidlogo Jacques Ruflié, no fim de De la biologie a la culture, examina a perspectiva e 0 “apelo do futuro”. Para ele, a humanidade estd A beira de um “novo salto evolutivo” (1976, p. 579). Estamos, talvez, assistindo ao inicio de uma transformagao profunda das rela- Bes do passado com o presente. ‘Aaceleragio da histéria rornou insustentével a definicao oficial dahistéria contemporanea. E necessério fazer nascer uma verdadeira his- ria contemporénea, uma hist6ria do presente que pressupée que nao hhaja apenas hist6ria do passado, que acabe “uma histéria que assenta num corte nftido do presente ¢ do passado” € que se recuse & “demissio 28 perante o conhecimento do presente, no preciso momento em que este muda de natureza e se enriquece com os elementos de que a ciéncia se mune para conhecer o pasado” (Nora, 1978, p. 468). Referencias bibliogrdficas ‘Annams, P. “The sense of past and the origins of sociology”, Past and Present, n® 55, 1972, pp. 18-32. Assononosnal, N. “Le réle de Phistoire dans la prise de conscience nationale en Afrique occidentale”, Africana Bulletin, n° 7, 1967, pp. 9-47. Aut, M. Pouvoirs de vie, pouvoirs de mort. Introduction a une anthro- pologie de la répression. Paris: Flammarion, 1977. Benveniste, E. “Le langage et l'expérience humaine”, Diog?ne, n° 51, 1965, pp. 3-13 BERGER, G. Phénoménologie du temps et prospective. 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