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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS

ESCOLA DE MÚSICA E ARTES CÊNICAS

JADER ARAÚJO MENDES LEMOS


MARDÔNIO FIGUEIRDO MIRANDA
MOYSÉS DA SILVA BRANDÃO JÚNIOR
WESLEY RIBEIRO PEREIRA

CAMARGO GUARNIERE

Goiânia
2018
JADER ARAÚJO MENDES LEMOS
MARDÔNIO FIGUEIRDO MIRANDA
MOYSÉS DA SILVA BRANDÃO JÚNIOR
WESLEY RIBEIRO PEREIRA

CAMARGO GUARNIERE

História da Música no Brasil


Prof. Mestre: Luiz Eduardo Gonçalves

Goiânia
2018
A Vida de CAMARGO GUARNIERE

Mozart Camargo Guarnieri (Tietê SP 1907 - São Paulo SP 1993). Compositor,


regente, pianista. Filho de Miguel Guarnieri, barbeiro e flautista, e de Géssia Arruda
Camargo Penteado, pianista. Dos pais recebe as primeiras lições de música. Aos 10
anos, teve aulas com o clarinetista Benedito Flora e mais tarde com Virgínio Dias, a
quem dedica sua primeira composição, Sonho de Artista (ca.1920). Em 1922, muda-se
com a família para São Paulo e, dois anos mais tarde, começa a ter aulas de piano com
Ernani Braga. Paralelamente, trabalha tocando piano na loja de instrumentos Casa Di
Franco e no Cine Bijou. Após três anos de estudos com Ernani Braga, passa a ter aulas
com Antônio Sá Pereira e, de 1926 a 1930, com o regente italiano Lamberto Baldi
(1895 - 1979). Com Baldi estuda harmonia, contraponto, fuga e orquestração
simultaneamente e logo é convocado a fazer parte da orquestra, em que toca
instrumentos de teclado: piano, xilofone e celesta.
Por intermédio do pianista Antônio Munhoz, conhece o escritor Mário de
Andrade, em 1928. Suas composições Dança Brasileira e a 1ª Sonatina para Piano
impressionam o escritor, que identifica a música de Guarnieri com seu modo de pensar,
ou seja, traz critérios nacionalistas na construção de uma brasilidade na arte musical
erudita, e passa a apoiá-lo com críticas construtivas encorajando e estimulando-o em seu
trabalho. O ano de 1928 marca também o início de sua carreira como professor de piano
e acompanhamento no Conservatório Dramático e Musical de São Paulo, no qual
permanece até 1933. Em 1930, Camargo Guarnieri escreve a canção O Impossível
Carinho sobre poesia de Manuel Bandeira, um marco no canto de câmara no Brasil, do
qual é um dos mais populares. Um ano depois, mostra o Choro nº 3, para flauta, oboé,
fagote, clarinete e trompa, no Instituto Nacional de Música (INM), que enfatiza seu
interesse pelas formas nacionais de música popular.
Assume, em 1935, a direção e regência do Coral Paulistano, cujo enfoque é
apresentar obras de compositores brasileiros que utilizam textos em português, muito
raros nessa época. Recebe um prêmio de viagem à Europa do Conselho de Orientação
Artística do Estado de São Paulo, em 1938. Em Paris estuda contraponto, fuga e
composição com Charles Koechlin (1867-1950), regência de orquestra e de coro com
François Rühlmann (1868-1948), regente da Orquestra da Ópera de Paris. Camargo
Guarnieri apresenta suas canções em recitais e dirige alguns concertos em Paris.
Retorna ao Brasil em novembro de 1939, em decorrência da Segunda Guerra Mundial.
Em outubro de 1942, após aceitar convite da Pan-American Union, como hóspede do
Departamento de Estado Norte-Americano,viaja pela primeira vez para os Estados
Unidos. Permanece nesse país por um período de seis meses, e recebe o prêmio pelo 1º
Concerto, para violino e orquestra, que se classifica em primeiro lugar no Concurso
Internacional Fleischer Music Collection. Faz duas apresentações como regente da
Orquestra Sinfônica de Boston na abertura concertante. Assume, em 1945, o cargo de
regente supervisor da Orquestra Municipal de São Paulo.
No período de 1956 a 1960 atua como assessor musical de Clovis Salgado
(1906-1978), ministro de Educação e Cultura do governo Juscelino Kubitschek (1902-
1976), e elabora um plano para o ensino de música no Brasil. Em 1960, escreve a ópera
de um ato Um Homem Só, com libreto do teatrólogo e ator ítalo-brasileiro
Gianfrancesco Guarnieri. Em 1975 ocupa o cargo de regente e diretor artístico da
Orquestra Sinfônica da Universidade de São Paulo e permanece nessa função até 1992.
Recebe no mesmo ano o Prêmio Gabriela Mistral, da Organização dos Estados
Americanos (OEA), que lhe confere o título de Maior Músico das Três Américas.
A vida musical de Camargo Guarnieri é diversificada, ele desempenha tripla
função em sua carreira profissional: de compositor, professor e regente. Como
compositor representa a concretização musical do nacionalismo modernista. Suas
relações com as ideias modernistas, e particularmente com Mário de Andrade, têm
características muito especiais. Mário de Andrade e Lamberto Baldi tornam-se os
responsáveis pela sua formação: Baldi desenvolve os aspectos técnicos enquanto Mário
de Andrade o orienta em estética e cultura geral. Inicia-se outro período na vida de
Camargo Guarnieri, que tem, na época, somente os dois primeiros anos da escola
primária concluídos, na cidade de Tietê. Nesse sentido é possível compreender seu
eterno reconhecimento por esses dois homens, aos quais atribui toda a sua educação.
Uma das primeiras coisas que Baldi faz é colocá-lo na orquestra. Estuda o dia
todo, toca na orquestra e à noite após o jantar tem aula com o professor e outros sete
alunos. A experiência como músico na orquestra é fundamental para o seu
desenvolvimento, pois, além de regente, Baldi é um inovador que apresenta pela
primeira vez vários trabalhos contemporâneos nos teatros brasileiros. Muitas peças do
compositor russo Igor Stravinsky (1882 - 1971), por exemplo, têm as primeiras
audições latino-americanas sob sua regência, em São Paulo. Essa experiência possibilita
que escreva as primeiras composições para orquestra, começando pela Suíte Infantil, em
1929.
O nacionalismo de Camargo Guarnieri não consiste em citar melodias
folclóricas nem empregar elementos folclóricos não modificados. Em toda a sua obra
existem poucos exemplos de utilização direta desses temas, entre eles estão
as Variações sobre um Tema Nordestino (1953), para piano e orquestra, e a melodia que
faz parte do quinto movimento da Suíte Vila Rica para Orquestra (1958). Quer ser
reconhecido como compositor nacional e não como compositor folclórico, mas acredita
que a música brasileira nacionalista pressupõe a inspiração no material folclórico.
Passa os primeiros 15 anos de sua vida na cidade de Tietê, no interior paulista e
tem como referência as canções e danças dos grupos musicais da região. As terças
paulistas encontradas em sua obra nascem da lembrança das escutas musicais da
infância. Dança Brasileira, composição de 1928, escrita inicialmente para piano e mais
tarde para orquestra, surge da memória que o compositor tem das comemorações da
abolição da escravatura em sua cidade, no dia 13 de maio, quando o ritmo das danças
dos negros é contínuo durante os festejos.
Em sua música aparecem com frequência os ritmos fortes dos cocos e
embolados, as suaves sincopadas das toadas e modinhas e as rodas. Todos esses
aspectos são encontrados principalmente nos Cinquenta Ponteios para Piano e também
nas composições sinfônicas. Utiliza com regularidade a forma de composição ABA
(primeira parte, segunda parte e repetição da primeira), em que a parte B nem sempre
recebe material novo, mas é um desenvolvimento de A e frequentemente ao retornar ao
A, harmoniza de forma diferente, dando uma nova cor ao tema. O modo mixolídio
(sétimo grau da escala meio tom abaixo) e o modo do nordeste (além do sétimo grau
meio tom abaixo, apresenta o quarto grau meio tom acima) estão bastante presentes em
suas composições.
Em 1932 passa grande parte de seu tempo analisando partituras dos
compositores Arnold Schoenberg (1874 - 1951), Alois Haba (1893 - 1973), Alban Berg
(1885 - 1935) e Paul Hindemith (1895-1963). Por esse motivo suas composições dessa
época começam a apresentar referências do atonalismo. No entanto, a partir de 1934,
escreve obras que define como livres de um sentido tonal, não tonais em vez de atonais.
Nos anos 1950, Camargo Guarnieri se manifesta contra o método serial de
composição da forma como é utilizado pelo compositor Hans-Joachim Koellreutter em
Salvador, Bahia. Em carta aberta aos músicos e críticos do Brasil, chama a atenção dos
jovens de talento que procuram a composição dirigida por fórmulas antes de
desenvolver uma verdadeira técnica e ter orientação estética segura. Essa carta o coloca
na liderança dos compositores que utilizam as formas tradicionais em suas
composições.
Suas declarações tornam difíceis as explicações do próprio estilo de compor que
naturalmente se desenvolve. Muitas pessoas se perguntam se ele muda o modo de
pensar quando utiliza a técnica serial em seu Concerto nº 5, para piano e orquestra, de
1970. Ele declara
"Não estou mudando de ideia. Vivo no presente e
minha música é atual. Você pode reconhecer que
a música é minha, mas a personalidade de minha
música está sempre ligada ao presente".
(VERHAALEN, 2001, p. 451)

Como professor de composição desenvolve a formação de centenas de alunos e é


um dos poucos músicos a formar uma escola. Entre os jovens compositores que passam
pelo seu estúdio estão Osvaldo Lacerda, Sérgio de Vasconcellos Correa, Aylton
Escobar, Almeida Prado e Marlos Nobre.
Apresenta um grande interesse pelo ensino de música no país e elabora um plano
para o ensino de música, no período em que é assessor musical de Clovis Salgado,
ministro de Educação e Cultura do governo do presidente Juscelino Kubitschek. Propõe
que os alunos frequentem o conservatório das 7 horas da manhã às 6 da tarde, estudando
música e todas as outras matérias do currículo escolar, como ocorre na época em países
como os Estados Unidos. Nomeia uma comissão de músicos para, junto com ele,
estudar e melhorar o projeto e envia cópias para todas as escolas de música do Brasil
pedindo opiniões e sugestões. Recebe apenas duas respostas negativas e o projeto não é
concretizado.
A Suíte Vila Rica foi composta a partir da trilha sonora produzida por Guarnieri
em 1957 para o filme Rebelião em Vila Rica. A peça, inicialmente escrita para ilustrar
as cenas do filme, foi reelaborada, no ano seguinte, sob formato orquestral e estreada
em 1958 pela Orquestra Sinfônica Brasileira, no Rio de Janeiro, sob a regência do autor.
A obra desse período de Guarnieri constituiu-se em uma expressão emblemática de
aspectos peculiares do “nacional-modernismo” através de configurações rítmicas e
melódicas diretamente ligadas à identidade brasileira. É possível reconhecer, na Suíte,
elementos inspirados nas modinhas, toadas, cantigas infantis, rodas das violas caipiras e
danças de origem africana.
Em ambiente sonoro singular, os temas apresentados na Suíte ilustram o
contexto dramático do filme inspirado nos ideais da Inconfidência Mineira, transpostos
para os anos de 1940 em Ouro Preto, onde estudantes universitários se rebelam em
tempos opressivos de ditadura reivindicando a demissão de um tirânico reitor. Os
personagens da trama são batizados com nomes de personalidades históricas da
Inconfidência, como o poeta Gonzaga, a musa Marília, o herói Xavier e o traidor
Silvério.
SUITE VILA RICA
A Suíte é composta de dez curtos movimentos. O movimento de abertura,
empregado nas cenas finais do filme, abre a Suíte com um tema executado por toda a
orquestra em caráter magnificente. Já no segundo movimento, Andantino, sombrio e
introspectivo, destaca-se um delicado solo de flauta na seção intermediária. O
Andantino ilustra o momento de abertura do filme durante a exibição de belas imagens
da cidade ao fundo. O terceiro movimento, Misterioso, enfatiza o momento de conflito
da trama, no qual se revela a ação do traidor do enredo. Em contraste, surge
o Scherzando, com um breve solo dos instrumentos de sopro em caráter leve e jocoso,
ilustrando o reencontro do herói com sua amada. É no Agitato que Guarnieri emprega o
tema da canção folclórica mineira Tim, tim oi lá lá. No sexto movimento, Alegre,
destaca-se o diálogo entre cordas e sopros em espírito festivo. Esse movimento foi
empregado durante a cena em que o poeta socorre sua musa após sofrer uma queda. A
musa, em momento posterior, executa ao piano a Valsa, também apresentada no filme
em versão orquestral. O Saudoso nos remete às modinhas brasileiras e ilustra o
momento em que os alunos são informados do afastamento de um querido professor.
Em seguida surge o Humorístico, movimento com caráter vivo e ritmado, ouvido
quando os rebeldes se retiram da república onde residiam e passam a morar nas ruas da
cidade. A conclusão da Suíte efetiva-se com o Gingado, em ritmo de baião, empregado
quando o professor detestado pelos alunos é levado a abdicar da disputa.
Vila Rica desempenhou um papel importante na
história do Brasil. Atualmente denominada Ouro
Preto, a cidade é um tesouro da arte colonial,
sobretudo no que diz respeito às obras do
Aleijadinho. No passado, capital do Estado de
Minas Gerais, 1789 foi palco de uma rebelião em
prol da indepedência do Brasil, assunto tratado
no filme. (VERHAALEN, 2001, p. 449).

Este ciclo foi a única obra produzida por Guarnieri com finalidade
cinematográfica. A composição foi dedicada ao então Ministro da Educação e Cultura
Clóvis Salgado, no período em que Guarnieri atuou como assessor musical junto ao
Ministério. Rebelião em Vila Rica foi um dos primeiros filmes coloridos produzidos no
Brasil, com roteiro dos mineiros Geraldo e Renato Santos Pereira.
REFERÊNCIAS

ANDRADE, Mario. Aspectos da música brasileira. Livraria Martins Editora, São Paulo,
1965.
KATZ, Leonel; ALBIN, Ricardo Cravo; MAXIMO, João; SOUZA, Tárik de; HORTA,
Luis Paulo. Brasil, rito e ritmo. Aprazível Edições, Rio de Janeiro, 2003/2004.

DUPRAT, Regis - seleção de verbetes. Enciclopédia da música brasileira erudita.


Publifolha, São Paulo, 2000.

MARIZ, Vasco. História da Música Brasileira. 2°ed. Revista e ampliada. Rio de


Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.

NEVES, José Maria. Música contemporânea brasileira. São Paulo: Ricordi, 1981.

OSUSP - Orquestra Sinfònica da USP disponível


em: http://www.usp.br/osusp/maestro_camargo.html

RODRIGUES, Lutero. As características da linguagem musical de Camargo Guarnieri


em suas Sinfonias. Dissertação de mestrado – Instituto de Artes – UNESP, 2001.

SILVA, Flávio (org.). Camargo Guarnieri – O Tempo e a Música. Rio de Janeiro:


Funarte; São Paulo: Imprensa Oficial de São Paulo, 2001.

VERHAALEN, Marion. Camargo Guarnieri - expressões de uma vida. EDUSP, São


Paulo, 2001.

WERNET, Klaus. Camargo Guarnieri: memórias e reflexões sobre a música no Brasil.


Dissertação de mestrado – Departamento de Música – USP, 2009.

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