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TRACE OS@cirn ci A FUNDAMENTOS DA CEOMETRIA DAVID HILBERT Edigao revista e coordenada por E OLIVEIRA ee «Nao € este um livro de texto de geometria elementar, mas esta tradugdo é dedicada aos nossos professores da matéria € EoSmecs Ce Ua cero cM UNre LeU Ufa OCS-CMU LAT) CEIe (eo Or tradutores tém a esperanga de que um cuidadoso estudo dos varios problemas deste livro contribuira indirectamente para implantar neles a ideia de que, em geral, os males do ensino da Fen atm Ome CaO aier- me ALT deficiéncias de ordem pedagogica, mas antes se encontram na Bille Mol Meola ca coco lu Rol 1109) uC CM Komment UGS que se ensina e do indispensdvel treino para a investigacaéo Rel cole) ura MARIA DO PILAR RIBEIRO, JOSE DA SILVA PAULO (1951) «Assim como a teoria dos conjuntos de G. Cantor (posterior- mente axiomatizada por E. Zermelo em 1908) moldou deci- EINE Uintlal mee MK eoLNI KCL (o oOME-1e0 (OD 2 CL Fundamentos da Geometria (1.* edicéo publicada em 1899), feo Maa ilesnemunred occ UUe ial NZ Mle MOM UU icele OM gl ol aticoy BeloelO eMC eR reli EUT CMI i e-CMuele ar Coe PAULINO LIMA ForTes, A. J. FRANCO DE OLIVEIRA (2001) «O trabalho de Hilbert teve importancia capital na mudanca da concep¢ao da geometria e, em certo sentido, na da concepgdo idealistica da verdade [...] Hilbert foi um gigante, e somos afortunados por podermos viver na sua sombra.» aL aelOl Za) eevee) © Paulino Lima Fontes, A. J. Franco de Oliveira/Gradiva — Publicacées, L.** Tradugdo baseada na 7.* ed, de Grundlagen der Geometrie, de David Hilbert, Estugarda, B. G. Teubner Verlag, 1930, trad. do alemao por Leo Unger e rev. por P. Bernays (avid Hilbert, Foundations of Geometry, Open Court Publishing Company, 1971): Maria do Pilar Ribeiro (col. de J. da Silva Paulo). Paulino Lima Fortes @ A. J Franco de Oliveira (col. de A. Vaz Ferreira) Revisio cientifiea e coordenagao: A. J. Franco de Oliveira Capa: Armando Lopes Fot6litos, impressao e acabamento: Multitipo — Artes Grdficas, L# Reservados os direitos para Portugal por: Gradiva — Publicagées, L.** Rua Almeida e Sousa, 21, r/c, esq. — 1399-041 Lisboa Telefs. 21 397 40 67/8 — 21 397 13 57 — 21 395 3470 Fax 21 395 3471 — Email: gradiva@ip.pt URL: http://www. gradiva.pt 1. edig&o: Setembro de 2003 Depésito legal n.° 199 892/203 gradiva Editor: Guilherme Valente Visite-nos na Internet hitp:/ / www.gradiva.pt xiv PREAMBULO Todas as disciplinas matematicas sao historicamente determinadas. A geometria, em especial, teve um longo ¢ turbulento desenvolvimento desde 0 tempo de Euclides e dos primeiros comentadores, passando pela Idade Média até aos tempos modernos. O trabalho de Hilbert teve importancia capital na mudanga da concepgao da geometria e, em certo sentido, na da concepgio idealistica da verdade. A partir da primeira edigéo [1899] dos Fundamentos da Geometria, 0 livro de Hilbert sofreu alteragdes profundas, de tal modo que a tiltima edigdo é praticamente irreconhecivel da primeira. E por esta razio que se impunha tornar acessivel aos estudantes universitarios e aos professores liceais aquela ultima edi¢do em lingua inglesa. Muitos matematicos exprimiram a opiniao de que este trabalho de Hilbert € de menor importancia, esti cheio de erros e despido de significdncia modema. Sem desrespeito por todos aqueles que assim se exprimiram, devo todavia enfatizar a grande importancia da tentativa de desenvolver um tratamento completo e consistente dos axiomas da geometria e de sintetizar estes axiomas no contexto da andlise dos nimeros reais. Tendo partilhado com muitos de vos algumas dividas quando confrontados, pela primeira vez, com a geometria analitica, apés a geometria sintética dos cursos secundarios, também eu indaguei durante anos qual seria a relagao entre as duas. Hilbert ultrapassou essa perplexidade muito antes de mim, ao demonstrar que na andlise dos nimeros reais e, em particular, na Algebra tridimensional real esta um modelo possivel dos axiomas da geometria por si revistos. Mais do que isso, ele mostrou como estabelecer que este modelo é essencialmente tinico, isto é, que qualquer modelo The é isomorfo. Ha alguma confus%o na linguagem que Hilbert utiliza na primeira edig&o, ¢ parte desta confusio estende-se até esta ultima edigao. Devem tomar-se como primitivos nao somente os termos ponto, recta, plano e a relagdo de estar entre, mas também a relag3o de incidéncia de rectas com pares de pontos diferentes, bem como a distinta relagao de incidéncia de planos com triplos de pontos nao colineares, a relagdo de congruéncia de segmentos ¢ a distinta relagao de congruéncia de angulos. Coisas deste tipo sio importantes; todavia clas ndo retiram demasiada utilidade a este texto, sobretudo para o leitor avisado a partida de que o rigor no passado era o bastante. Hilbert foi um gigante, e somos afortunados por poder viver na sua sombra. Harry Goheen Professor de Matemitica Universidade Estadual de Oregon David Hilbert (1862-1942) «Assim comegou, portanto, todo o conheci- mento humano, com intuigdes, passando daqui a nogdes e acabando com ideias.» Kant, Critica da Razdo Pura, “Elementos de Transcendentalismo”, Segunda Parte, I. INTRODUCAO A geometria, do mesmo modo que a aritmética, s6 precisa para a sua edificagao légica subsequente de poucas e simples proposigdes fundamen- ‘ais. Estas proposigdes fundamentais chamam-se axiomas da geometria. O caunciado dos axiomas da geometria e 0 exame das suas relagées mituas um problema que, desde o tempo de Euclides, tem sido discutido em Bumerosos ¢ excelentes tratados da literatura matematica. O problema acabado de indicar tem o seu ponto de partida na andlise légica da nossa intuigdo espacial. O presente trabalho é uma nova tentativa para dar o enunciado dum sistema de axiomas completo ¢ tao simples quanto possivel para a geometria, ¢ deduzir dele os teoremas geométricos mais importantes de tal modo que fique também claramente em evidéncia o significado dos ‘Giferentes grupos de axiomas e a projeccdo de cada um dos axiomas nas consequéncias que deles depois se tiram. Capitulo I OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS §1. Os elementos da geometria e os cinco grupos de axiomas DEFINIGAO, Imaginemos trés sistemas diferentes de objectos: aos objectos do primeiro sistema chamemos pontos ¢ representemo-los por A, B, C, ...; aos objectos do segundo sistema chamemos rectas e representemo-los por a, b, c, ...; aos objectos do terceiro sistema chamemos planos e representemo-los por «, 3, 7, ... . Os pontos chamam- se também os elementos da geometria linear, os pontos e rectas os elementos da geometria plana e os pontos, rectas ¢ planos os elementos da geometria do espaco ou do espaco. Imaginemos os pontos, rectas e planos como tendo certas relagdes miituas e indiquemos estas relagdes por palavras tais como «estar situado», «entre», «congruente»; a descrigéo precisa e, para fins matemé- ticos, completa destas relagdes, é dada por meio dos axiomas da geometria. Podemos dividir os axiomas da geometria em cinco grupos; exprimindo, cada um destes grupos, por si $6, certos factos fundamentais da nossa intuig&o que esto naturalmente associados. Designamos do seguinte modo estes grupos de axiomas: I 1-8 Axiomas da Incidéncia Il 14 Axiomas da Ordem Il 1-5 Axiomas da Congruéncia IV Axioma das Paralelas V_ 1-2 Axiomas da Continuidade. §2. O I grupo de axiomas: axiomas da incidéncia Os axiomas deste grupo estabelecem entre os objectos atrds referidos, pontos, rectas ¢ planos, uma incidéncia e enunciam-se como segue: 2 _I. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS I 1. Para cada dois pontos A, B hd sempre uma recta a que estd associada com cada um dos dois pontos A, B. 1 2. Para dois pontos A, B niéio hé mais do que uma recta que esta associada com cada um dos dois pontos A, B. Aqui, como no que segue, por dois, trés, ... pontos, rectas, planos, entende-se sempre, respectivamente, pontos, rectas, planos, diferentes. Em lugar de «estar associados» empregaremos também outras expressées como por exemplo: a passa por A e por B; a liga A e, ou com B; A esta sobre a; A é um ponto de a; 0 ponto A existe sobre a, etc. Quando A esta sobre a recta a e, além disso, sobre uma recta 6, utilizaremos também as expressdes: as rectas a e b cortam-se em A, tém em comum o ponto A, etc. 13. Sobre uma recta hé sempre, pelo menos, dois pontos. Ha pelo menos trés pontos que ndo estdo sobre uma mesma recta. 1 4. Para quaisquer trés pontos A, B, C que ndo esto sobre uma mesma recta, hd sempre um plano a, que esta associado com qualquer dos trés pontos A, B, C. Para cada plano hd sempre um ponto que esté associado com ele. Empregamos também as expresses: A esta em a; A é ponto de a; ete. 15. Para cada trés pontos que nao estéo sobre uma mesma recta, nado ha mais do que um plano que esta associado com qualquer dos trés pontos A, B, C. 16. Se dois pontos A, B duma recta a estéo num plano a, entéo cada ponto de a esta no plano a. Neste caso dizemos: a recta a esté no plano a; etc. 1 7. Se dois planos a, 3 tém um ponto comum A, entéo tém, pelo menos, mais um outro ponto comum. 18. Ha, pelo menos, quatro pontos que ndo estéio no mesmo plano. O axioma 17, exprime que o espaco n’o tem mais do que trés dimensées, 0 axioma I 8, pelo contrario, que 0 espaco nao tem menos do que trés dimensdes. Os axiomas I 1-3 poderio chamar-se axiomas planos do 1.° grupo, para distinguir dos axiomas 1 4-8, que designamos como axiomas do espaco do 1.° grupo. Dos teoremas que resultam dos axiomas I 1-8 mencionemos, s6 os dois seguintes: FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA 3 TEOREMA 1. Duas rectas dum plano tém um ou nenhum ponto comum; dois planos ou n&o tém nenhum ponto comum, ou tém uma recta e mais nenhum ponto comum; um plano e uma recta que nao existe nele, tém um ou nenhum, ponto comum. TEOREMA 2. Por uma recta e um ponto que nao existe nela, bem como por duas rectas distintas com um ponto comum, passa sempre um plano e um sé. §3. O II grupo de axiomas: axiomas da ordem* Os axiomas deste grupo definem a nogdo «entre» e tomam possivel, com base nesta nogdo, a ordenagfo dos pontos sobre uma recta, num plano no espago. DEFINICAO. Os pontos duma recta dispdem-se com certas relagdes entre si, para cuja descricdo nos serve, em particular, a palavra «entre». II 1. Se wm ponto B estd entre um ponto A e um ponto C, entao A, B, C sdo trés pontos distintos duma recta, e B esta também entre C e A. Il 2. Para cada dois pontos A e C ha sempre, pelo menos, um ponto B sobre a recta AC tal que C estd entre Ae B. A Cc B 113. Dados trés pontos quaisquer duma recta, ndo hd mais do que um que esta entre os outros dois. Além destes axiomas lineares de ordem servimo-nos ainda dum axioma de ordem para o plano. DEFINICAO. Consideremos sobre uma recta a dois pontos A e B; chamemos ao sistema dos dois pontos A e B, um segmento e 2 Estes axiomas foram completamente investigados, pela primeira vez, por M Pasch nas suas Vorlesungen iiber neuere Geometric, Leipzig, 1882. Em particular, 0 contetido do axioma II 4 ¢ devido a M. Pasch. 4 x I. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS representamo-lo por AB ou BA. Os pontos entre A e B chamam-se pontos do segmento AB, ou também interiores ao segmento AB; os pontos A e B chamam-se pontos extremos do segmento AB. Todos os restantes pontos da recta a dizem-se exferiores ao segmento AB. IL 4. Sejam A, B, C trés pontos que nao estéo em linha recta e a uma recta no plano ABC, que ndo encontra nenhum dos pontos A, B, C; sea recta @ passa por um ponto do segmento AB, entdo, seguramente, passa também ou por um ponto do segmento AC ou por um ponto do segmento BC. Exprimindo-nos _intuitivamente: Cc quando uma recta entra no interior dum trifngulo ela também sai. E entdo demonstravel que os dois segmentos AC e¢ BC nao podem ser ambos cortados pela recta a. y §4. Consequéncias dos axiomas de incidéncia e da ordem Dos axiomas I ¢ II resultam os seguintes teoremas: TEOREMA 3. Para cada dois pontos A e C ha sempre pelo menos um ponto D, sobre a recta AC, que esta entre Ae C. Dem. Segundo o axioma I3, hé um ponto £ exterior 4 recta AC e, segundo 0 axioma II 2, ha sobre AE um ponto F tal que Zé um ponto do segmento AF’ Ainda segundo 0 mesmo axioma e pelo axioma II 3, ha sobre FC um ponto G que nao esta sobre 0 segmento FC’. Em vista do axio- ma II 4, a recta HG deve portan- to cortar 0 segmento AC num ponto D. Aplicando agora o axioma II 4, ao triangulo AEG e a recta C’'F, mostra-se que D esté entre A e EF, ¢ pela aplica- ¢&o do mesmo axioma ao trian- gulo AEC e arecta BG reconhe- ce-se que B esta entre Ae C. FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA _ an 5 TEOREMA 4. Dados trés pontos A, B, C’, quaisquer, duma recta, ha sempre um que est entre os outros dois. Dem.} Suponhamos que A nfo esta entre B e C, e que C’ também nao esta entre A e B. Unamos um ponto D, que nio esteja sobre a recta AC, com B e escolhamos segundo 0 axioma II 2, um ponto G sobre a recta BD, tal que D esteja entre B e G [fig. (a) na pag. seguinte]. A aplicagdo do axioma II 4, ao tridngulo BCG e a recta AD mostra que as rectas AD e CG se cortam num ponto £ que esta entre Ce G'; do mesmo modo se vé que as rectas C.D e AG se encontram num ponto F' que esta entre A e G. TEOREMA 5. Dados quatro pontos quaisquer sobre uma recta eles podem designar-se sempre por A, B, C, D, de modo que o ponto designado por B esteja entre A ¢ Ce também entre A e D, ¢ além disso 0 ponto designado por C’ esteja entre A e De também entre Be D.* Dem. Sejam A, B, C, D quatro pontos de uma recta g. Demonstremos em primeiro lugar: G (a) (b) 3 Demonstracao devida a A. Wald. 4 Este teorema, apresentado na I* edig&o como axioma, foi reconhecido por E. H. Moore, Trans. Am. Math, Soc., 1902, como uma consequéncia dos axiomas planos de incidéncia e ordem j4 expostos. Comparem-se também os trabalhos, sobre este assunto, de Veblen, Trans. Am. Math, Soc., 5, 1904, Schweitzer American Journal, 1909. Uma anélise introdutoria sobre sistemas independentes de axiomas lineares de ordem que fixa a ordem sobre a recta, encontra-se em E. v. Huntington, “A new set of postulates for betweeness with proof of complete independence”, Trans. Am. Math. Soc., 1924, compare-se também Trans. Am. Math, Soc., 1917. 6 I. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS 1. Se B esta sobre 0 segmento AC e C sobre 0 segmento BD, entio os pontos B e C est&o também sobre 0 segmento AD. Escolhamos, de acordo com os axiomas I 3 e II 2, um ponto F que nao esteja sobre g e um ponto F tal que F esteja entre C e F' [fig. (b) acima]. Por repetida aplicagao dos axiomas II3 e 4, resulta que os segmentos AE e BF se encontram num ponto G, e mais, que a recta CF’ encontra num ponto H o segmento GD. Visto que, assim, H est4 sobre o segmento GD e, pelo contrario, pelo axioma I13, E nao esta sobre o segmento AG, pelo axioma II 4, a recta HH encontra o segmento AD, o que quer dizer que C est4 no segmento AD, Do mesmo modo se demonstra, simetricamente, que B também esta neste segmento, 2. Se B est no segmento AC’ C no segmento AD entio também C esté no segmento BD e B no segmento AD. Escolhamos um ponto G fora de g e um outro ponto F tal que G est4 no segmento BF’. Segundo os axiomas [2 e II3 a recta CF nao encontra nem o segmento AB nem o segmento BG, portanto, segundo o axioma II 4, também nfo encontra 0 segmento AG. Mas como C estd no segmento AD, a recta CF encontra o segmento GD num ponto H. De novo, pelo axiomas II 3 e 4, a recta FH encontra 0 segmento BD. Portanto, C esta no segmento BD. O resto da tese 2, resulta como consequéncia de 1. Sejam dados agora quatro pontos quaisquer duma recta. Escolhamos trés destes pontos e designemos aquele dentre eles que, segundo o teorema 4 0 axioma II 3, esta entre os outros dois, por Q; os outros dois por P e R, ¢ finalmente o ultimo dos quatro pontos dados por S$. Entio baseando- nos outra vez no axioma II3 e no teorema 4, podemos distinguir as seguintes cinco possibilidades para a posigao de 5: » Resta entre Pe S, ou P estd entre Re S, *ou S esté entre P e R e, ao mesmo tempo, @ entre Pe S, *ou S estd entre Pe Q, °ou P esta entre Qe S. As primeiras quatro possibilidades do a hipdtese de 2, a tiltima a de 1. Com isto fica demonstrado o teorema 5. TEOREMA 6. (Generalizagao do teorema 5) Dado um ntimero finito qualquer de pontos duma recta, entio eles podem ser sempre designados por A, B, C, D, E, ..., K, de tal modo que o ponto designado por B esteja entre A e C, D, E, ..., K, 0 ponto C esteja entre A, Be D, E, ..., K, assim como D esteja entre A, B, C e E, ..., K, etc. Além deste modo de designag4o sé ha mais um, 0 modo de designacao inversa K, E, D, C, B, Anas mesmas condigdes. FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA Z A_ BCD E TEOREMA 7. Entre dois pontos quaisquer duma recta ha sempre infinitos pontos. TEOREMA 8. Cada recta a que est num plano a separa os pontos deste plano a que nao existem nela, em dois dominios nas seguintes condigdes: cada ponto A dum dominio determina com cada ponto B do outro dominio um segmento AB no interior do qual esta um ponto da recta a; pelo contrario, dois pontos quaisquer A e A’ dum mesmo dominio determinam um segmento AA’, o qual no contém nenhum ponto de a. DEFINICAO. Dizemos que os pontos A, A’ estéo no plano « dum mesmo lado da recta a e os pontos A, B estdo no plano a em lados opostos da recta a. DEFINICAO. Sejam A, 4’, O, B quatro pontos duma recta a, de tal modo que O esteja entre A e B, mas nao entre A e A’; entio diremos: os pontos A, A’ estéio na recta a do A mesmo lado do ponto O, e os pontos A, B estéo na recta a em lados opostos do ponto O. O conjunto de todos os pontos da recta a que esto no mesmo lado de O, chama-se B também uma semi-recta com origem em O; assim, cada ponto divide uma recta em duas semi-rectas. A_A' DEFINICAO. Um sistema de segmentos AB, BC, CD, .... KL chama-se uma poligonal que une os pontos A e L; esta poligonal também se designara abreviadamente por ABC'D...KL. Os pontos do interior dos segmentos AB, BC, CD, ..., KL, assim como os pontos A, B, C, D, ..., K, L chamam-se, todos eles, os pontos da poligonal. Em particular, se os pontos A, B, C, D, ..., K, L estéo todos num plano e se, além disso, 0 ponto L coincide com o ponto A, entao a poligonal chamar-se-4 um poligono e designar-se- por poligono ABC'D...K. Os segmentos AB, BC, CD, ..., KL chamam-se também os lados do poligono. Os pontos A, B, C, D, ..., K chamam-se os vértices do poligono. Poligonos com 3, 8 7 7 |. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS 4, ...,n vértices chamam-se tridngulos, quadrilateros, ..., poligonos com n vertices [ou n-dgonos]. DEFINICAO. Se os vértices dum poligono sio todos distintos ¢ nenhum deles fica sobre um lado, e, alémn disso, dois quaisquer lados do poligono nao tém ponto algum comum, entio o poligono chama-se simples. Com 0 auxilio do teorema 8 obtemos, sem dificuldades consideraveis, os seguintes teoremas:> TEOREMA 9. Cada poligono simples, que esta num plano « separa os pontos do plano a que nao pertencem 4 poligonal do poligono em dois dominios, um inferior e um exterior, nas seguintes condigdes: Se A é um ponto do interior (ponto interior) e B um ponto do exterior (ponto exterior), entio cada poligonal existente em a que ligue A com B tem, pelo menos, um ponto comum com o poligono; se, pelo contrario, A, A’ sio dois pontos do interior e B e B’ dois pontos do exterior, entdo ha sempre, pelo menos, duas linhas poligonais em a, & uma ligando A com A’, e outra ligando B com B’, que nao tém ponto algum comum com o poligono. Designando apropriadamente os dois dominios, ha sempre rectas em a que existem completamente no exterior do poligono e, pelo contrario, ndo ha nenhuma tal recta que exista completamente no interior do poligono. TEOREMA 10. Cada plano separa og restantes pontos do espago em dois dominios nas seguintes condigdes: cada ponto A dum dominio determina com cada ponto B do outro dominio um segmento AB no 5 [V. bibliografia no final do Suplemento I 1. Em edigGes anteriores 4 9" edigdo, a frase era «Com 0 auxilio do teorema 8 obtemos, sem grande dificuldade, 0 seguinte teorema.» (Leo Unger).] FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA 9 interior do qual esté um ponto de a; pelo contratio, dois pontos quaisquer Ae A’ dum mesmo dominio determinam sempre um segmento AA’ que niio contém nenhum ponto de a. DEFINICAO. Utilizando as mesmas notagdes deste teorema 10, diremos: os pontos A, A’ esto no espago dum mesmo lado do plano a; e os pontos A, B esto no espago em lados opostos do plano a. Com o teorema 10 da-se expresso 4s mais importantes verdades relativas 4 ordenago dos elementos no espago. Estas verdades sio por isso consequéncias, unicamente, dos axiomas considerados até agora, e no 2.° grupo nao ha necessidade de algum novo axioma no espaco. §5. O III grupo de axiomas: axiomas da congruéncia Os axiomas deste grupo definem o conceito de congruéneia e, com este, também o movimento. DEFINIGAO. Os segmentos tém certas relagdes entre si, que descreveremos servindo-nos das palavras «congruente» ou «igual». Il 1. Se A, B sao dois pontos sobre uma recta a e se, além disso, A! é um ponto sobre a mesma ou outra recta a’, entio pode encontrar-se sempre um ponto B’ sobre um dado lado da recta a’, e a partir de A’, tal que o segmento AB é congruente com, ou igual, ao segmento A'B', simbolicamente: AB=A’B'. Com este axioma exige-se a possibilidade da construcdo [ou deslocamento] de segmentos. A unicidade demonstrar-se-4 mais tarde. Um segmento foi definido simplesmente, como sistema de dois pontos A, B, e designado por AB ou BA, A ordem dos dois pontos nao foi, portanto, tomada em conta na definig&o; consequentemente, as formulas: AB=A'B', AB= BA, BA=A'B', BA=BA tém o mesmo significado. II 2. Se um segmento A'B! e um segmento A’ B" sao congruentes com 0 mesmo segmento AB, entéo, também o segmento A'B' é congruente com o segmento A"B"; ou,abreviadamente: se dois segmentos sGo congruentes com um terceiro, entao sdo congruentes entre Si. 10 _1. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS Visto que a congruéncia, ou igualdade, se introduz na geometria por meio destes axiomas, nao é, de modo algum, evidente que cada segmento seja congruente consigo mesmo; mas esta proposigio resulta dos dois primeiros axiomas da congruéncia, se deslocarmos o segmento AB para uma semi-recta qualquer, obtendo a congruéncia do segmento com A’B", e se em seguida aplicarmos 0 axioma III 2 as congruéncias AB = A'B’, AB=A'B'. Com tais fundamentos, tem-se ainda, por aplicagao do axioma III 2, a simetria ¢ a transitividade da congruéncia de segmentos, isto é a validade dos teoremas: Se AB = A'B’, entio também é A'B! = AB; se AB = A’B’ ¢-A'B’ = AB", entio também é AB = A"B". Como consequéncia da simetria da congruéncia de segmentos, podemos utilizar a seguinte maneira de dizer: dois segmentos sio «congruentes entre si». Il 3. Sejam AB e BC dois segmentos, sem pontos comuns, sobre a recta a e sejam, além disso, A'B' e B'C' dois segmentos sobre a mesma ou sobre una outra recta a’, e do mesmo modo sem pontos comuns; entao se for: AB=A'B'e BC=BC, sera também AC = A'C'. A B C a A! B' Cc al Com este axioma exprime-se o requisito da aditividade de segmentos. Trataremos a construgio [ou deslocamento] de 4ngulos precisamente como a construgaio de segmentos. Além da possibilidade da construgao de Angulos, deveremos exigir também, sem divida axiomaticamente, 2 unicidade; mas, pelo contrario, a transitividade e a aditividade serdo demonstraveis. DEFINICAO. Seja a um plano qualquer, e sejam h, k duas semi- rectas quaisquer, diferentes, no plano a, que partem do ponto O e que FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA A pertencem a rectas distintas. Ao sistema destas semi-rectas h, k chamamos Gngulo ¢ representamo-lo por Z(h, k) ou por Z(k, h). As semi-rectas h, k chamam-se lados do angulo e o ponto O chama-se © vértice do Angulo. Por esta definigao sao excluidos os angulos raso e nulo. Sejam h a recta a que pertence a semi-recta h e F a recta a que pertence a semi-recta k. As semi-rectas h e k tomadas juntamente com o ponto O repartem os restantes pontos do plano em dois dominios: de todos 08 pontos que esto com h do mesmo lado de & e com k do mesmo lado de h, diz-se que esto no interior do angulo /(h, k); de todos os outros pontos diz-se que esto fora ou no exterior deste angulo. Reconhece-se facilmente, com base nos axiomas I e II, que os dois dominios contém pontos, e que um segmento que una dois pontos do interior do angulo esté inteiramente no interior desse angulo. Com a mesma facilidade se demonstram as seguintes proposigdes: se um ponto Hf esta sobre h e um ponto K sobre k, entio o segmento HK esta inteiramente no interior. Qualquer outra semi-recta que parta de O ou esta inteiramente no interior ou estd inteiramente no exterior do Angulo; se esta no interior encontra o segmento HK$ Se A é um ponto dum dominio e B um ponto do outro dominio, ent&o cada poligonal que liga Ae B ou passa pelo ponto O ou tem um ponto pelo menos, comum com h ou k; se, pelo contrario, A, A’ sio pontos do mesmo dominio, entéo ha sempre uma poligonal que liga A com A’ ¢ que nem passa pelo ponto O nem por ponto algum das semi-rectas h, k. DEFINICAO. Os angulos tém certas relagdes entre si, que descreveremos servindo-nos também das _palavras «congruente» ou «igual». Il 4. Sejam dados um dngulo Z(h,k) num plano c e uma recta a! num plano al assim como um determinado lado de a! em a’. Seja h! uma semi-recta da recta a', que parta do ponto O!. Entéo hé no plano a! uma, e uma 86, semi-recta k', tal que 0 dngulo Z(h,k) & congruente com, ou igual ao dngulo Z(h’,k’) e, ao mesmo tempo, tal que todos os pontos interiores do Gngulo Z(h!, k!) estao no lado dado de a'; simbolicamente: L(h, k) = Z(h', k’). Cada Gngulo é congruente a si proprio, isto é, tem-se sempre Z(h, k) = Z(h,k). 6 [Esta tiltima proposigdo é conhecida por feorema da barra transversal. i |. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS Dizemos também abreviadamente: cada angulo pode ser construido num dado lado duma recta num plano dado, ¢ a partir duma semi-recta dessa recta, de uma unica maneira. Assim como para os segmentos, nao consideramos nenhum sentido, também nao consideramos, na definig¢do de angulo, nenhum sentido de rotagdo (orientagdo). Consequentemente, as designagdes Z(h,k), Z(k, h) tém o mesmo significado. DEFINICAO. Um Angulo com o vértice B tendo, sobre um qualquer dos lados, 0 ponto Ae sobre 0 outro 0 ponto C' designar-se-a também por ZABC ou abreviadamente por 2B. Os angulos também se designardo com letras gregas mintsculas. IM 5. Se para dois tridngulos! ABC e A'B'C' sdo vdlidas as congruéncias AB =A'B', AC =A'C', ZBAC = ZBAC', entdo é sempre verificada também a congruéncia LABC = ZA'B'C'. O conceito de triangulo esté formulado na pag. 8. Por troca de simbolos, resulta, sob as hipoteses do axioma, que sio sempre verificadas as duas congruéncias ZABC = ZA'B'C! ¢ ZACB = ZA'BC'. Os axiomas III 1-3 s6 contém afirmagées sobre a congruéncia de segmentos; pode por isso dizer-se que eles so os axiomas lineares do 3.° grupo. O axioma III 4 contém afirmagdes sob a congruéncia de Angulos. O axioma III 5 estabelece a ligacdo entre os conceitos de congruéncia do segmentos ¢ de dngulos. Os axiomas III 4 e III 5 contém afirmagdes sobre os elementos da geometria plana e pode por isso dizer-se que sdo os axiomas planos do 3.° grupo. A unicidade da construgdo de segmentos resulta, com 0 auxilio do axioma III 5, da unicidade da construgao de angulos. Suponhamos que o segmento AB é deslocado a partir de A’ para uma semi-recta que parte de A’, de duas maneiras, até B e até BB". Entio, escolhendo um ponto C” fora da recta A’ B’ obtemos as congruéncias: A'B! = A'B",A'C! = AC’, ZB'A'C' = ZB" AC’, 7 Aqui, e no que segue, os vértices de um triéngulo sao sempre supostos n&o colineares. FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA - 4 13 A At BB" e portanto, segundo 0 axioma III 5, ZA'C'B' = ZA'C'B", contradizendo a unicidade da construcao de angulos, exigida no axioma III 4. §6. Consequéncias dos axiomas da congruéncia DEFINICAO. Dois Angulos que tém o vértice e um lado comuns e cujos lados n&o comuns constituem uma recta, chamam-se &ngulos adjacentes suplementares. Dois 4ngulos com o vértice comum em que cada lado dum deles constitui com um dos lados do outro uma recta, chamam-se Angulos verticalmente opostos. Um angulo que é congruente com um seu Angulo adjacente suplementar, chama-se um dngulo recto. Demonstremos agora os seguintes teoremas: TEOREMA 11.8 Num triangulo com dois lados congruentes, os Angulos opostos a esses lados sfio congruentes, ou abreviadamente: num triangulo isésceles os Angulos da base sao iguais. Este teorema resulta do axioma III 5 e da ultima parte do axioma III 4. DEFINICAO. Um triangulo ABC diz-se congruente com um tridngulo A’ B’C’, se sao verificadas todas as congruéncias AB = A'B', AC = A'C', BC= BC’, ZA= 2A), ZB = ZB',ZC = LC’. TEOREMA 12. (1.° teorema da congruéncia para triangulos) Um tringulo ABC € congruente com um triangulo A'BYC’ desde que se 8 [Este teorema é usualmente designado por pons asinorum.] verifiquem as congruéncias AB=A'B',AC = AC, LAS ZA. Cc Cc A BA’ B Dem. Pelo axioma III 5 sao verificadas as congruéncias B= ZB,20= LC, e s6 precisamos verificar a validade da congruéncia BC = Be. Suponhamos, pelo contrario, que no seja BC congruente com BC ¢ determinemos sobre B’C' 0 ponto D’ tal que BC = B’D’; entio afirma o axioma III 5, aplicado aos dois triangulos ABC e A’B'D', que € ZBAC = ZB'A'D'. Seria portanto ZBAC congruente com ZB’ A'D’ ¢ também com ZB'A'C!; isto n&o & possivel visto que cada Angulo sé pode ser, duma dinica maneira, deslocado num plano, a partir duma semi-recta dada, para um dado lado. Com isto demonstrou-se que o triangulo ABC ¢€ congru- ente com 0 triangulo A’B'C". Do mesmo modo se demonstra facilmente o: TEOREMA 13. (2.° teorema da congruéncia para triangulos) Um triangulo ABC é congruente com um outro triéngulo A’B’C' desde que se verifiquem as congruéncias AB=A'B', ZA= ZA, ZB = ZB’. TEOREMA 14. Se um Angulo ZABC € congruente com um outro Angulo ZA’B'C’, ento também o Angulo adjacente suplementar ZC_BD é congruente com 0 angulo adjacente suplementar ZC'B'D! do outro. FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA 15 ¢ e A B D At B D Dem. Escolhamos os pontos A’, C’, D’ sobre os lados que partem de B' de tal modo que seja AB=A'B',CB=C'B,DB=D'B'. Do teorema 12 resulta ent&o que o triangulo ABC € congruente com 0 triangulo A’ B'C’, isto é, sdo validas as congruéncias AC =A'C'e ZBAC = ZB'A'C'. Porque, além disso, pelo axioma III 3 0 segmento AD € congruente com o segmento .A’D’, resulta outra vez pelo teorema 12, que o triangulo CAD 6 congruente com o triéngulo C’A'D’, isto 6, sto vilidas as congruéncias CD=C'D' ce ZADC = ZA'D'C', ¢ daqui resulta segundo 0 axioma III 5, considerando os triéngulos BC'D e BIC'D', que ZCBD = ZC'B'D’. Uma consequéncia imediata do teorema 14 € o teorema da congruéncia de 4ngulos verticalmente opostos. Dele resulta ainda a existéncia de Angulos rectos (v. a definigo da pag. 13). De facto, se se desloca um Angulo qualquer para os dois lados duma semi-recta OA, a partir de O ¢ se toma nos lados livres: OB = OC, entao 0 segmento BC corta a recta OA num ponto D. Se D cai em O, entao ZBOAe ZCOA sao angulos adjacentes suplementares iguais e, portanto, rectos. Se D esta sobre a semi-recta OA entio é, por construgio: ZDOB = ZDOC; e se D esti sobre a outra semi-recta, entao esta congruéneia resulta do teorema 13. Pelo axioma III 2 cada segmento é congruente consigo proprio: OD = OD. Daqui resulta, em virtude do axioma III 5, que é ZODB = ZODC. 16 1. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS B B TEOREMA 15. Sejam h, k, 1, por um lado e h’, k’, l', por outro, trés semi-rectas que partem, respectivamente, dos pontos O e O! e esto, respectivamente, nos planos a e a’. Suponha-se ainda que as semi-rectas h,k eh’, k’ esto simultaneamente, ou do mesmo lado, ou entdo de lados diferentes de | e U’, respectivamente. Ent&o, se sao verificadas as congruéncias L(hyl) = Z(h WU!) & Zk) = ZK), tem-se sempre também Z(h, k) = Z(h',k’). A demonstragio sera indicada para 0 caso em que h e k esto do mesmo lado de | e, portanto, segundo a hipétese, também h’ e k’ estio do mesmo lado de I’. © outro caso reduzir-se-4 a este primeiro pela aplicacdo do teorema 14. Da definig&o da pag. 11, resulta que, ou h esta inteiramente no angulo Z(k,1) ow k esta inteiramente no angulo 4(h,1). Escolhamos agora as notacées de modo que h esteja no angulo Z(k, 1). Escolhamos sobre os lados k, k’, 1, ’ 08 pontos K, K’, L, L’, tais que OK =O'K’ c OL = OL’. Segundo uma proposiga0 enunciada na pag. 11, h corta 0 segmento AL, num ponto H. K ike oO 7 L oO # r' Determinemos H' sobre h’ de modo que seja OH = O'H’. Nos triéngulos OLH e O'L' ¢ nos tridngulos OLK e O'L'K' verificam-se, pelo teorema 12, respectivamente as congruéncias FUNDAMENTOS DA GEOMETRIA lz ZOLH = ZO'L'H', ZOLK = ZO'L’', LH=I'H', LK=I'R’, ¢ finalmente ZOKL= ZOR'’. Visto que, pelo axioma III 4, cada Angulo sé pode ser deslocado num plano duma tnica maneira, a partir duma dada semi-recta ¢ para um dado lado, e visto que H’ e K esto, por hipétese, do mesmo lado de 1’, entao as duas primeiras citadas congruéncias de angulos mostram que H’ esté sobre L’K'. Com isto, as duas citadas congruéncias de segmentos, dio facilmente, com base no axioma III 3, que HK = H’K". A partir das congmuéncias OK = O'K', HK =H'K' e ZOKL = ZO'R'L', 0 axioma III 5 permite concluir a tese. De um modo semelhante obtemos as seguintes proposiges: TEOREMA 16. Seja o angulo Z(h, &) do plano a congruente com 0 Angulo Z(h’, k’) do plano a’, e seja / uma semi-recta do plano @ que parte do vértice do Angulo Z(h, k) e est no interior deste angulo. Entiio existe uma e uma s6 semi-recta I’ no plano a’, que parte do vértice do Z(h',l’) © esta no interior deste Angulo, de tal modo que L(hyl) = Z(nW) e L(k,l) = L(Y). Para conseguir obter o terceiro teorema da congruéncia e a propriedade da simetria da congruéncia de angulos demonstremos primeiramente, a partir do teorema 15, mais o seguinte teorema: TEOREMA 17. Sejam 2 ¢ Z: dois pontos que esto em lados diferentes duma recta XY e suponhamos validas as congruéncias XZ,=X%, e ¥YZ,=YZ. Ento, também o Angulo ZXYZ, é congruente com o angulo ZXY Zp. Dem. Pelo teorema ll € LXDZy XZ_2,e LY 224 = ZYZZ,. Por consequéncia, Zz Zz resulta do teorema 15 a congru- d 2, éncia: Z4XZ)¥Y = ZX ZY. Nos casos particulares em que X ou Y estio sobre ZZ, conclui-se ainda com maior simplicidade esta congruéncia. y 18 __1. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS Dela, e das congruéncias supostas XZ, = XZeVYA=VYR resulta, pelo axioma III 5, a tese, LXYZ, = ZXYZ2. TEOREMA 18. (3.° teorema da congruéncia para triangulos) Se em dois tiangulos ABC ¢ ‘A'B'C! os lados correspondentes so respectivamente, congruentes, entio 0s tridngulos sao congruentes. Dem. Em virtude da simetria da congruéncia de segmentos, demonstrada na pig. 10, é suficiente demonstrar que 0 tridngulo ABC é congruente com 0 triéngulo ‘A'BIC!. Desloquemos 0 angulo ZBAC para ‘A’ e para um e outro lado da semi-recta A'C’. Escolhamos, no lado do angulo que esta com B’ do mesmo lado de AIC! 9 ponto Bo tal que A’By = AB; € no outro lado livre escolhamos B" de modo que A'B" = AB. Pelo teorema 12 6 BC = BoC" e também BC = B'C’. Estas congruéncias, juntamente com as da hipotese, dio segundo 0 axioma IIT 2, as congruéncias A'B" = A'By, B'C! = BoC" e, correspondentemente, AB" 2 AB, BC SBC. As hipéteses do teorema 17 servem, portanto, tanto aos dois triangulos ABC’ A'BoC’, como aos dois triangulos A’B"C' € A'BIC!, isto é, 0 angulo ZB" A'C! & congruente nao s6 com 0 Angulo ZByA'C' mas também com 0 Angulo ZB'A’C'. Porém, visto que, pelo axioma III 4, cada angulo pode ser deslocado num plano, de uma unica maneira, a partir duma semi-recta dada, ¢ para um dado lado desta, ento a semi-recta A’ Bp coincide com a semi-recta A’B', isto é, aquele angulo congruente com ZBAC que parte de A’C" para o referido lado, € 0 Angulo ‘ZB'A'C!. Da congruéncia ZBAC = ZBIA'C' e da congruéncia de segmentos pressuposta, resulta entdo, pelo teorema 14, a tese. FUNDAMENTOS DAGEOMETRIA 19 TEOREMA 19. Se dois angulos Z(h’, i’) e Z(h!”,k”) so congru- entes com um terceiro Angulo Z(h, k), entéo também o angulo /(h’, k’) & congruente com o Angulo Z(h”, k”). Este teorema, que corresponde, ao axioma III 2, pode formular-se do seguinte modo: Se dois 4ngulos sio congruentes com um terceiro, sio congruentes entre si. Dem. Sejam O', O" ¢ O os vértices dos trés Angulos dados. Escolhamos sobre um lado de cada angulo os pontos A’, A” e A de tal modo que O'A’= OA e O” A" =OA. Do mesmo modo escolhamos sobre os outros lados os pontos B’, BB” e B, de modo que seja O'B!' = OB ec O"B" = OB. Estas congruéncias dao, juntamente com as duas hipdteses /(h’,k’) = Z(h,k) e Z(h",k") = Z(h, k), pelo teorema 12, as congruéncias A'B! = ABe A"B" = AB. B Br" B ak | ae | 4 4 o' a” Oo Pelo axioma III 2, os triéngulos A’B’O’ e A’ BO" tém, portanto, os trés lados iguais, respectivamente, ¢ por isso tem-se, pelo teorema 18, Z(h',k) = Z(h"k"). Do teorema 19 resulta, precisamente como de III 2 para os segmentos, fa propriedade da simetria da congruéncia de Angulos, isto é: se é se Za = ZG, entio Za e 23 sio congruentes enire si. Em particular, podem-se enunciar agora numa forma simétrica os teoremas 12-14. Podemos estabelecer desde jé a comparacdo de grandezas de dngulos. 5 A demonstragéio aqui seguida para o teorema 19, apresentado na 1* edigo como axioma, é devida a A. Rosenthal, compare-se Math. Ann., Vol. 71. ‘A A. Rosenthal deve-se também a simplificagdo do axioma I 4, compare-se Math, Ann., Vol. 69. 20 |. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS. TEOREMA 20. Sejam dados dois Angulos quaisquer Z(h,k) e Z(h',U). Se o deslocamento de Z(h,k) a partir de h’ para o lado de I’ determina uma semi-recta k’ interior, entio 0 deslocamento de Z(h’,I") a partir de h para o lado de & determina uma semi-recta | exterior € reciprocamente. h i’ Dem. Suponhamos que | estd no interior de 4(h,k). Visto que Z(h,k) = Z(h', k’), entdo segundo o teorema 16, correspondendo a semi- recta interior / ha uma semi-recta !" no interior de Z(h’,k’) para a qual é valida a congruéncia Z(h, 1) = Z(h',”). Por hipdtese, Z(h, 1) = Z(h',l’) onde I’ e Ll” sfo necessariamente diferentes em contradigfo com a unicidade da construgio de ngulos, III 4. O reciproco demonstra-se de maneira andloga. h Se o deslocamento de (h, k) referido no teorema 20 determina uma semi-recta k’ interior a Z(h’,1’) entdo dizemos: Z(h,k) é menor do que Z(hi!), simbolicamente: Z(h, k) < Z(h’,1’); se ele determina uma semi- recta exterior, entio dizemos: Z(h,k) & maior do que Z(h',l'), simbolicamente: Z(h, k) > Z(h, 1). Reconhecemos que para dois angulos ae 3 se tem sempre wm e um sd dos trés casos a<6eB >a, a=f, a>BefBP>% 2. a>6,8=% 3. O=8,B>% resulta a> A comparagdo de grandezas de segmentos com as propriedades correspondentes, resulta imediatamente dos axiomas II e I 1-3 e da unicidade do deslocamento de segmentos, demonstrada na pag. 12. Com base na comparacio de grandezas de angulos obtém-se a demonstragdo do seguinte teorema simples, que Euclides — injustifica- damente, na minha opiniaio —- apresentou como axioma: TEOREMA 21. Todos os angulos rectos sio congruentes entre si. Dem.!0 Um Angulo recto ¢, por definigao, tal que é congruente, com um seu adjacente suplementar. Sejam os angulos a ou Z(h,/) e @ ou Z(k,1) adjacentes suplementares. Analogamente quanto aos angulos a’ e B', e seja a = Be a’ = B'. Suponhamos, contrariamente a tese do teorema 21, que a’ nilo seja congruente com a. 10 4 ideia para esta demonstragao ja remonta a Proclo, comentador de Euclides, © qual utiliza, em vez do teorema 14, a hipdtese de que a construgdo de um Angulo recto produz sempre um outro angulo recto, isto é, produz um angulo que € igual ao seu adjacente suplementar. Uma tradug%o do comentario de Proclo, com introdugio e notas por P. Ver Eecke, “Proclus de Lycie — Les Commentaires sur le premier livre des Eléments d'Buclide”, foi publicada na Collection de travaux de I’Acad. Intern. d'Histoire des Sciences, N. 1, Briigge, 1948. [Na 7* edigdo alema, que foi traduzida em portugués, a nota que aqui figura é: «Th, Vahlen faz notar no seu livro Abstrakte Geometrie, Leipzig, 1905, pag. 242, que ja Legendre tinha demonstrado este teorema. Contudo supde ali, que os Angulos constituem um sistema continuo de grandezas.»] 2 - 7 ___|. OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS Entio o deslocamento do Angulo a’ a partir de A o para o lado onde esta 1, da-nos uma semi-recta l" diferente de 1. Portanto 1” esté ou no interior de a ou no interior de 3. No caso em que Jest no interior de a tem-se: LZ(h,l") ZACB. Demonstra-se exactamente da mesma maneira que o dngulo ‘i * i> verticalmente oposto ao angulo ZCAD € maior do que o angulo ZABC. Pela congruéncia dos a Angulos verticalmente opostos e 2 4p B B pela transitividade da comparagao de grandezas de angulos resulta que ZCAD > ZABC. Com isto fica completamente demonstrado 0 teorema. S80 consequéncias importantes do teorema do Angulo externo os seguintes teoremas: TEOREMA 23. Em cada triéngulo o maior lado est oposto ao maior angulo. Dem. Deslocamos o menor dos dois lados considerados do triangulo sobre o maior a partir do vértice comum. A tese resulta entdio, em virtude da transitividade da comparagaio de grandezas de angulos, dos teoremas 11 e22. TEOREMA 24. Um triangulo com dois angulos iguais tem dois lados iguais (isdsceles), 24 - oe |, OS CINCO GRUPOS DE AXIOMAS Este teorema, reciproco do teorema 11, ¢ uma consequéncia imediata do teorema 23. Também do teorema 22 resulta, duma maneira simples, A uma extensao do 2.° teorema da A D B congruéncia para tridngulos: Ba TEOREMA 25. Dois triangulos ABC e A’B'C’, séo congruentes entre si, quando sao verificadas as congruéncias AB=A'BY,ZA= ZA eLO= ZC. TEOREMA 26. Todo 0 segmento é divisivel ao meio. Dem. Deslocamos a partir dos pontos extremos do segmento dado AB e para lados diferentes dele, um mesmo Angulo a e deslocamos para os lados livres os mesmos segmentos AC’ = BD. Visto que C' ¢ D estao para lados diferentes de AB, o segmento C'D encontra a recta AB num ponto B. A hipotese de que E coincida com A ou B esta imediatamente em contradigao com o teorema 22. Suponhamos que B esta entre Ae F. Entio, pelo teorema 22, seria ZABD > ZBED > ZBAC, em contradic&o com a construcdo suposta. Uma contradi¢ao andloga resulta da hipdtese de A estar entre B e EB. c c ay yz D D Pelo teorema 4, E esté, pois, sobre o segmento AB. Consequentemente, os angulos ZAEC ¢ ZBED, sendo verticalmente

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