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CURSO DE TEOLOGIA
MARÇO DE 2022
BRASÍLIA -DF
INTRODUÇÃO
Por fim, esta síntese está divida em três partes: a primeira trata do
mistério da Trindade no contexto no Antigo e Novo Testamento; a segunda,
coloca este tema sob o prisma da Tradição e do Magistério da Igreja e a última
uma apresentação objetiva das principais questões deste tratado.
I. O mistério de Deus nas sagradas Escrituras
1
Cf. Dei Verbum n. 12
pode ter um filho quem é Pai. E essa também é uma novidade do Novo
Testamento. No Antigo Testamento, encontramos raríssimas passagens, nas
quais Deus se apresenta como Pai, e quando isso acontece é em referência a
paternidade exercida em Israel2. Ladaria defende que:
2
Cf. Ladaria, 2015, p.59.
deserto (Ex 3, 13-14). Deus se apresenta como “Aquele que é”, “Eu sou”. Deus
está acima de toda realidade existente. Porém, se faz próximo do homem.
Moisés pede a Yahweh para informar o seu nome afim de identificar a
sua pessoa divina na realidade daquele povo. Esse Deus tem nome, é
particular e se distingue de todos os outros deuses ou crenças.
Nesse sentido, Deus entra na realidade de Israel, se dá a conhecer
como alguém próximo, do qual é possível invocar e ser atendido. É importante
destacar que esse conhecimento do nome “Eu sou” não abarca a plenitude
própria de Deus, aliás seria impossível a realidade humana algo semelhante.
Todavia, Yahweh não é mais desconhecido ou mesmo inalcançável.
Além disso, encontraremos no Antigo Testamento outros nomes
atribuídos a Deus como Adonai (“Meu Senhor) e Elohim (Deus em geral),
sendo este o mais encontrado nos relatos do Antigo Testamento.
Embora nos períodos históricos de redação dos livros do Antigo
Testamento não encontraremos a definição do conceito de pessoa, tão
importante para a compreensão da dinâmica trinitária. Existem referências ao
significado ao qual se destina. Tanto que existe uma certa característica de
pessoalidade em relação a Iahweh nos escritos veterotestamentários que se
manifesta mediante diversos aspectos e figuras. Em virtude da maneira
humana pela qual a Revelação se desenvolveu.
Se por um lado Deus se comunica a razão humana e se utiliza de
elementos do mundo físico para transmitir a si mesmo. Por outro lado,
precisamos entender que a essência divina e seus atributos são infinitamente
superiores as possibilidades do intelecto humano. Por isso, qualquer linguagem
ou abordagem será imperfeita. Porém, é possível conhecer algo a respeito de
Deus, não se trata de esgotar o assunto, pois seria impossível, mas reconhecer
que no Antigo Testamento Deus se utiliza das imagens e do contexto histórico
daquela época.
A identidade do filho
1. A época pré-Niceia
3
cf. FERNANDEZ, pp. 364-365
Os padres apostólicos, no século II, tentavam defender a fé trinitária, em
base às sagradas escrituras, atendendo as demandas teológicas da época.
Não obstante, “encontramos nos padres apostólicos algumas fórmulas
triádicas, mas não podemos falar de uma teologia trinitária elaborada. Um
pouco mais desenvolvida encontra-se a teologia da relação Pai-Filho”
(LADARIA, 2005, p.140).
Assim sendo, o período dos padres apologetas, é o período histórico de
início da reflexão trinitária propriamente dita. Esses santos teólogos tinham por
objetivos defender a fé dos ataques pagãos e de outros, bem como esclarecer
entre os cristãos esse mistério grandioso. Nesse sentido, grande foi o esforço
especulativo para entender e distinguir as relações entre Pai-Filho, e
posteriormente, do Espírito Santo.
Era preciso evidenciar para os pagãos que o único Deus verdadeiro era
o Deus cristão; aos judeus explicar que o Deus de Israel é o Pai de Jesus
Cristo e aos hereges gnósticos convencer de que o mundo não está dividido
por uma dualidade e não é fruto de uma emanação, mas da criação divina.
Para tanto, foi preciso buscar referências nos conceitos filosóficos afins de
tornar claro a distinção das pessoas na unidade essencial própria de Deus. De
modo especial, podemos evidenciar São Justino com seu Diálogo com Trifão e
Teófilo Antioqueno, que estabeleceu o termo grego Θρίας que seria mais tarde
latinizado como trinitas.
2. De Niceia I a Constantinopla I
4
Em virtude do que foi mencionado a respeito do mal entendido sobre a
doutrina de Orígenes. É possível nos situarmos sobre a figura de Ário, um
presbítero da Igreja de Alexandria, que negou a ideia de geração em Deus. Ele
teve uma história bem conturbada, na qual recebeu uma formação teológica
herética. Porém, era um grande pedagogo que utilizava de diversos recursos
como canções, poesias e escritos para propagar suas ideias.
Em 325, o Concílio de Niceia, foi convocado pelo Imperador
Constantino, tendo como pauta principal validar ou invalidar a doutrina de Ário.
Graças a contribuição de Santo Atanásio, ainda diácono da Igreja, que
acompanhou o bispo Alexandre foi o principal expoente na defesa obstinada da
ortodoxia diante da heresia. Sua insatisfação principal era com o tema da
salvação, se Ário nega a divindade de Jesus, a salvação é inválida para os
homens. Como apresenta Ladaria: “No fundo, a doutrina ariana significava
reinterpretar o cristianismo a luz dos esquemas helênicos imperante no tempo,
em concreto no platonismo médio com isso se desconhecia, ou se reduzia em
grande medida, a originalidade cristã” (LADARIA, 2005, p.186).
4
cf. SECO, p. 211-221
Se Ário nega divindade do Verbo (Filho), também nega divindade do
Espírito Santo realizando uma grande ruptura com a Tradição.
O Concílio condenou o Arianismo, o seu documento principal é o
Símbolo Niceno dividido em três partes, cada uma dedicada a uma pessoa
divina.
O Pai é apresentado como único Deus, não como uma única pessoa,
mas uma única substância divina, que se apresenta desde o Antigo
Testamento. O Filho é apresentado como uma “comunicação do Pai” mediante
a geração, não como criatura do Pai. Além disso, o Concílio inseriu o conceito
de homoousios, de origem filosófica, para descrever a igualdade essencial
entre o Pai e o Filho. Sobre a utilização de termos filosóficos gregos é
importante esclarecer que, ao contrário do que alguns protestantes acusam, o
Concílio de Niceia não helenizou o cristianismo, gerando uma religião
fragmentada. Mas, como defende Ladaria 5, É verdade que Niceia pegou um
termo helênico para tentar expressar o dogma católico. Niceia usou a palavra
homousious, isto é, consubstancial ao Pai. Mas, foi essa palavra que trouxe a
deshelenização. Isso porque o helenismo ou os helenistas só podiam conceber
um Deus uno, sem nuances, sem Trindade, ou seja, uma unidade monolítica e
não uma unidade dinâmica como nós cremos. Além disso, Niceia tenta resolver
o problema do Arianismo com a expressão da fé bíblica mediante a linguagem
do adversário que era helênico.
Por fim, coloca-se em evidência o termo homoousios, diz respeito não
só a afirmação de consubstancialidade, mas também torna clara a unidade
numérica da essência divina. Além disso, o Espírito Santo é citado durante o
Concílio, mas não houve uma explanação sistemática a respeito desse tema.
Em vista disso, as bases para a formulação teológica trinitária foram
lançadas. Porém, essas referências ainda não foram suficientes para resolver o
dilema da heresia ariana. As considerações foram mal interpretadas
novamente e haviam dúvidas sobre a consubstancialidade do Filho. Essa
controvérsia ainda teve três fases:
a) A primeira fase: envolve o Concílio de Niceia a morte de
Constantino, em 337. Nesse período, surge a oposição à fórmula empregada
5
Cf. (LADARIA, 2005, p.187)
pelo Concílio, tendo no bispo Eusébio de Nicomedia seu principal opositor. Ário
morre em 336.
b) A segunda fase: compreende o império de Constâncio e Constante
(337-361). A contestação ariana é predominante, principalmente no Oriente
realizada por Constâncio, que leva Eusébio de Nicomedia bispo de
Constantinopla. O termo “substância” é rejeitado, sob a justificativa de trata-se
de um escândalo para expressar o mistério de Deus, uma vez que não existe
diretamente nas Sagradas Escrituras. Os defensores da ortodoxia, Papa
Libério, Santo Atanásio e Santo Hilário de Poitiers são exilados.
c) A terceira fase: De 361 até 380. Nesse período, ocorre uma cisão
dos arianos em anomeanos, homeusianos (semi arianos) e homeanos. Surgem
os macedonianos, que negavam a divindade do Espírito Santo. Nela, acontece
também o ressurgimento da confissão da fé Nicena pela volta dos defensores
da ortodoxia do exílio. A partir de 362, com a celebração do Concílio de
Alexandria, um intenso movimento liderado pelos Padres Capadócios, que
resultara na celebração do Concílio de Constantinopla I, em 381, no qual se
aprofundará a fé exposta em Niceia.
Ladaria ainda afirma que:
6
Cf. SECO, p. 222-231.234-237,
Os papéis da Trindade são unidos pela sua natureza divina, como
esclarece São Basílio, embora cada pessoa divina tenha hypostasis diferentes
se unem em uma comunhão de ousía e natureza. Além disso, Basílio defende
que o Pai é agénnetos, não gerado. O Filho génnetos, ser gerado. E é próprio
do Espírito Santo no Filho ser conhecido e dividir com Ele a mesma substância
do Pai. Portanto, na Trindade existem três hipóstasis diferentes: paternidade,
filiação e força santificadora.
Essas diferenças são explicadas por São Gregório de Nissa que
defende que todas essas diferenças estão unidas na essências divina. Ele
utiliza um jogo de palavras: Deus não é um ser alógico, logo tem um logos. Ele
defende que as pessoas divinas têm relações entre si, agem juntas, mas com
papeis específicos.
Por outro lado, São Gregório de Nazianzo explicita a divindade do
Espírito Santo e a sua consubstancialidade com o Pai. E coloca em evidência
que as diferenças entre as pessoas divinas residem nas suas relações. O Pai é
o ponto de unidade, fonte da qual, surge a divindade do Filho e do Espírito .
Além disso, ele esclarece a processão do Espírito Santo, que se distingue da
geração.
O Concílio de Constantinopla I
Santo Agostinho7
7
A exemplo de outros trabalhos de síntese passados. Essa parte foi disposta com a disposição
do autor Seco e também de recortes do seu livro contrastando com comentário do autor deste
trabalho.
se diz segundo a substância: há algo em Deus que não se diz segundo a
substância e tampouco segundo os acidentes, pois não há acidentes em Deus.
Há no seio misterioso da essência divina algo que se diz relação:
paternidade, filiação e espiração. Desta maneira, Agostinho vai além da mera
linguagem filosófica, descobrindo uma realidade ontológica que ela não podia
alcançar: a existência de um relativo não-acidental, o relativo que se dá na
substância e, por isso mesmo, é substancial.
Santo Agostinho contribuiu de forma decisiva, ainda, para a teologia
das processões, mostrando a diferença existente entre a forma com que
procedem o Filho e o Espírito Santo: fez isso baseado na analogia psicológica.
Segundo ele, a processão do Filho é igual à da inteligência a partir da mente ou
da memória, ao passo que a processão do Espírito é igual à da vontade, que
procede necessariamente da inteligência.
Segundo ele, os nomes próprios das Pessoas são relativos
(relacionais), e não essenciais: dizem das Pessoas aquilo que as caracteriza
enquanto relações, e não enquanto essência, que é comum às Três Pessoas:
a) Os nomes da Primeira Pessoa são: Pai, Princípio e Ingênito; b) Os nomes da
Segunda Pessoa são: Filho, Verbo, Imagem; c) Os nomes da Terceira Pessoa
são: Espírito Santo, Dom, Amor.
Por fim, é clássica na doutrina agostiniana a semelhança da alma
humana com a Trindade, pois é o seu reflexo. Por isso, Santo Agostinho
encontra na mente humana três imagens da Trindade, ou melhor, uma mesma
semelhança a três níveis: as duas primeiras estão tomadas da consideração
das
operações gerais da alma, a terceira está tomada da consideração das
operações da alma na contemplação de Deus.
8
cf. SECO, pp. 333-335
9
Idem.
III. APRESENTAÇÃO SISTEMÁTICA DO MISTÉRIO DE DEUS
10
cf. Suma Teológica I, q. 13, a. 11
11
4. MOLINARO, Aniceto, Metafísica. Curso Sistemático. São Paulo: Paulus, 2000.
p. 162.
12
Idem. P. 165
13
cf. Suma Teológica I, q. 4, a. 2 ad 3
Deus é perfeito, defende São Tomás 14, no sentido de que é aquele que
possui tudo que lhe é devido. Ele é a Perfeição, pois possui em si todas as
perfeições, ao passo que, é a causa de todas elas. Além disso, encontramos
referências da perfeição de Deus nas Sagradas Escrituras: Mt 5, 48, Jesus
convoca os discípulos a serem perfeitos como o Pai Celeste é perfeito. Em
base ao testemunho bíblico e a tradição, o Magistério mediante o Concílio
Vaticano I explicitou que Deus é infinito em sua perfeição 15 (DH 3001).
14
cf. Suma Teológica I, q. 4, a. 1
15
Além disso, não existem perdas de perfeição ou qualidade em Deus. Santo
Tomás fundamenta a imutabilidade de Deus com base no fato Ele é ato puro 16.
A vontade divina é infinita, isto reside no fato de que Deus quer todos
as coisas por um único ato perfeito, esta vontade corresponde ao próprio ser
divino. O objeto primário da vontade divina é sua própria essência e o
16
cf. Suma Teológica I, q. 9, a. 1
17
cf. Suma Teológica I, q. 10, aa. 1-2
secundário são as coisas que não são a sua própria essência, mas que são
objeto do seu amor (DH 3001).
Deus ama (DH 3025) a si mesmo de forma necessária em razão da
perfeição do seu ser e do conhecimento da própria bondade. Todas as coisas
são amadas entre si de forma livre.
3. As processões divinas
18
cf. Suma Teológica I, q. 27, a. 1; Suma contra os gentios IV, c. 11
3.2 A espiração do Espírito Santo
19
cf. Suma Teológica I, q. 27, a. 3; q. 37, aa. 1-2
20
cf. Suma Teológica I, q. 28, a. 2
Esta doutrina pode ser encontrada indiretamente nas Letras Sagradas,
em passagens do Novo Testamento que utilizam: Pai, filho e Espírito Santo.
5 A pericorese ou circumincessão 24
21
cf. Suma Teológica I, q. 29, a. 1
22
cf. Suma Teológica I, q. 28, a. 2
23
cf. Suma Teológica I, q. 29, a. 4
24
A circumicessão ou percicorese é a doutrina que defende a essência
divina absoluta como ponto de unidade entre as pessoas divinas, embora
tenham relações de oposição que não causam nenhuma divisão na substância
divina. Inicialmente foi utilizada na cristologia, para identificar a comunicação
idiomática em Cristo. Posteriormente, São João Damasceno utilizou esse termo
na perspectiva trinitária, em referência a imanência presente no movimento da
Trindade ou interpenetração das Três Pessoas Divinas, tendo como ponto de
convergência a essência divina e na dignidade compartilhada na Trindade.
8 As missões divinas
25
LADARIA, 2005, p. 55.
A inabitação divina na alma tem três finalidades: tornar partícipe da
vida divina, ser o princípio motos para os atos e oferecer a dádiva da presença
trinitária na alma.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SECO, Luis Francisco Mateo. Dios Uno y Trino. 2. ed. Pamplona: EUNSA,
2005.
SESBOUË, Bernard; WOLINSKI, J.