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O SOLDADO CRISTÃO

Exposição sobre Efésios 6:10-20

D. M. LLOYD-JONES

rcs

PUBLICAÇÕES EVANGÉLICAS SELECIONADAS

Caixa Postal 1287 01059-970-São Paulo-SP

Título original:

The Christian Soldier

Editora:

The Banner of Truth Trust

Primeira edição em inglês:

1977

Copyright:

Lady E. Catherwood

Tradução do inglês:

OdayrOlivetti

Revisão:

Antonio Poccinelli

Capa:

Ailton Oliveira Lopes

Primeira edição em português:

1996
Impressão:

Imprensa da Fé

INDICE

1.

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3.

4.

5.

6.

7.

8. 9.

10.

11.

12.

13.

14.

15.

16.

17.

18.

19.

20. 21. 22. 23.

.25 . 38 . 50 .63 . 76 .
86 100 114 127 140 154 165 176 188 201 213 225 235 245 257 270 283 296 308 320

A Convocação para o Combate.....................

Combate de Deus, Não Nosso......................

Quem Combate?...........................................

O Moral........................................................

Água e Comida.............................................

Exercício.......................................................

Disciplina......................................................

As Promessas...............................................

“Confie em Deus e...”.................................

O Que Evitar................................................

“Estai pois firmes”.......................................

Toda a Armadura de Deus............................

“Cingidos os vossos lombos com a verdade”

A Única Autoridade......................................

A Escritura da Verdade................................

A couraça da Justsiça...................................

“A justiça que vem de Deus pela fé”..........

Vestindo a Couraça.......................................

Ordens de Marcha........................................

Permaneçam Firmes.....................................

Mobilidade....................................................

O Escudo da Fé............................................
24.

25.

26.

O Capacete da Salvação...............................

A Espada do Espírito.....................................

Orando no Espírito........................................

Orando Por Todos os Santos.........................

PREFACIO

Este volume completa a exposição da Epístola aos Efésios, capítulo 6, versículos


10-20, ini jiadano volume intitulado The Christian Warfare (publicado em 1976), e
consiste de sermões pregados na Capela de Westminster aos domingos de manhã.

Ele não requer introdução, mas eu gostaria de chamar particularmente a atenção para
certos princípios que emergem claramente no texto.

O apóstolo Paulo nunca pára no mero diagnóstico dos nossos males e problemas,
porém ele sempre parte deles, e revela a sua verdadeira natureza e caráter, como o
volume anterior mostra com clareza. Todavia, diversamente de muitos escritos
filosóficos e sociológicos modernos, o apóstolo, como na verdade a Bíblia toda,
nunca se contenta com uma simples exposição e análise do caso. Diagnósticos não
faltam hoje; no entanto, como assinalou Thomas Masaryk, o primeiro Presidente
da Checoslováquia, “Os filósofos só interpretam o mundo, de várias maneiras; a
questão, porém, é mudá-lo”. Onde a filosofia fracassa, o evangelho tem bom êxito; e
na porção das Escrituras de que trata este volume, o apóstolo Paulo nos diz como
combater o bom combate da fé.

Notamos também o contraste entre o método do apóstolo e aquilo que está se


tornando cada vez mais popular- de fato a moda - nos dias atuais com o nome de
“aconselhamento”. Aqui não há mistura do psicológico e do medicinal com o
espiritual. Não nego que ocasionalmente entram esses elementos, mas hoje em dia
eles tendem a obscurecer e a substituir o que se costumava descrever como
“orientação espiritual”. Muito do que passa atualmente entre os cristãos como
problemas psicológicos, é essencialmente espiritual e se deve à falta de
entendimento espiritual. O apóstolo ressalta que o combate espiritual tem que ser
efetuado de maneira espiritual; e eu procurei mostrar o modo pelo qual os
grandes princípios estabelecidos por ele devem ser postos em prática.
">ÍE ~~

A tradução brasileira, O Combate Cristão, foi publicada em 1991 (PES).

A pregação destes sermões, e também o seu preparo para publicação, causaram-me


grande regozijo. Só posso orar no sentido deque todos quantos os leiam tenham igual
experiência e, em conseqüência, possam “resistir no dia mau” e sempre.

D. M.Lloyd-Jones

Mais uma vez sou profundamente grato à sra E. Burney, ao sr. S. M. Houghton e à
minha esposa por sua inestimável ajuda.

Londres, julho de 1977

O SOLDADO CRISTÃO

Efésios6:10-20

10. No demais, irmãos, meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.

11. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra
as astutas ciladas do diabo.

12. Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os
principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra
as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais.

13. Portanto, tomai toda a armadura de Deus; para que possais resistir no dia mau,
e, havendo feito tudo, ficar firmes.

14. Estai pois firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade, e vestida a
couraça da justiça;

15. E calçados os pés na preparação do evangelho da paz;

16. Tomando sobretudo o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os
dardos inflamados do maligno.

17. Tornai também o capacete da sal vação, e a espada do Espírito, que é a palavra
de Deus;

18. Orando em todo o tempo com toda a oração e súplica no Espírito, e vigiando
nisto com toda a perseverança e súplica por todos os santos,
19. E por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra com
confiança, para fazer notório o mistério do evangelho,

20. Pelo qual sou embaixador em cadeias; para que possa falar dele livremente,
como me convém falar.

A CONVOCAÇÃO PARA O COMBATE

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.


Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as
astutas ciladas do diabo. ” - Efésios 6:10-11

Não há nada mais urgente, para todos os que se arrogam o nome de cristão, do que
captar e entender o ensino desta seção particular das Escrituras. Digo “os que se
arrogam o nome de cristão” porque, obv iamente, as palavras do apóstolo são
endereçadas aos cristãos, e aos cristãos somente. Elas não contêm mensagem
nenhuma para os que não são cristãos; na verdade, ninguém mais pode entendê-las. O
mundo atual ridiculariza esse tipo de declaração. Não crê de modo nenhum num
reino espiritual. Duvida até da existência de Deus; não tem fé no Senhor
Jesus Cristo; e, portanto, crê menos ainda na existência de “principados e potestades,
príncipes das trevas deste século, hostes espirituais da maldade nas alturas (ou nos
lugares) celestiais”. Essas palavras nada significam para o inundo; ele não aprecia o
seu valor e a sua importância.

Mas para o cristão a declaração não somente é cheia de significado; também está
cheia de elementos que dão real ajuda e encorajamento; e, permitam-me repeti-lo,
certamente não há tema que seja mais urgentemente importante para todos os cristãos
no presente do quejustamente esse. Refiro-me, naturalmente, ao estado geral da vida,
ao estado geral do mundo, e a toda a dificuldade que há em viver, especialmente em
vivera vida cristã nestes tempos confusos em que nos encontramos. Não que
eu sugira que alguma vez a vida neste mundo foi fáci 1 para o cristão. Não o foi para
os cristãos primitivos. E hoje, nalguns aspectos, o problema é talvez mais agudo e
mais urgente do que nunca antes. Houve tempo, relativamente recente, em que pelo
menos o lar estava mais ou menos isolado do mundo; mas agora o mundo entra no lar
de muitas maneiras diferentes, não somente pelos jornais, e sim também pela
televisão, pelo rádio e por outros meios. Assim o combate da fé torna-se
particularmente difícil e estrênuo para o cristão numa época como esta; e, em
acréscimo

a tudo isso, há a tensão geral dos tempos e a angústia da hora.

Tais considerações é que nos levaram a tomar tanto tempo num volume anterior com
a análise e consideração da grande declaração de Paulo. Nele nos ocupamos em
tratar das “astutas ciladas do diabo”, procurando entender o que significa lutar, não
“contra a carne e o sangue” (em nós mesmos, ou noutras pessoas), mas contra estes
poderes e potentados espirituais, contra estes principados, estas hordas invisíveis da
maldade que estão por trás de todo o mal, dominando as mentes dos homens maus e
todas as suas atividades, e que se lançam contra nós tentando derrotar-nos, estragar
as nossas vidas cristãs e difamar completamente o evangelho. Ocupar-nos disso era
essencial.

O homem que não entende a natureza do problema com que se defronta está
condenado ao fracasso. Os cristãos são como certos alunos do primeiro ano da
escola - a princípio pensam que toda e qualquer matéria é muito simples, que não há
dificuldade nenhuma. Bem, vocês sabem o que provavelmente acontece quando eles
enfrentam um exame! A primeira coisa que se tem a fazer é entender a natureza e o
caráter do problema que se enfrenta. Portanto, nós temos de compreender que,
na vida cristã, somos chamados para um combate, não para uma vida cômoda; somos
chamados para um combate, para uma guerra, para pelejar, para uma luta. Já
examinamos em detalhe os meios diversos e quase intermináveis pelos quais o
diabo, com as suas artimanhas e sutilezas, tenta apanhar, enredar e confundir o
cristão. Para o cristão, estar prevenido quanto ao caráter eà estratégia do inimigoé
absolutamente essencial, pois estar previnido é estar premunido, e isso jáé em si
meia batalha ganha.

Mas é preciso que nos lembremos de que é apenas meia batalha. Se parássemos aí,
sem dúvida todos nós ficaríamos deprimidos. Diríamos: “Já basta a vida como é,
sem você pôr para fora todas estas coisas. Você nos mostra que o problema é de tal
monta que ninguém é competente para lidar com ele. Você dá ênfase a que lutamos
contra poderes e principados terríveis. Quem é suficiente para estas coisas? Quem
pode levantar-se contra essas grandes hordas do mal, com toda a sua astúcia e com
todo o seu poder maligno?” Estudar o problema isoladamente, embora
sendo absolutamenteessencia!,poderiadaremnada, só nos levando a sentir-
nos deprimidos e completae inteiramente sem esperança. Contudo, graças a Deus, o
evangelho é sempre realista. Da verdade nada esconde jamais, e nunca dá uma
impressão falsa. Não é evangelho verdadeiro aquele que dá a impressão de que a
vida cristã é fácil, e de que não há problemas que ela deva enfrentar. Não é esse o
ensino do Novo Testamento. O Novo

Testamento é sumamente alarmante, a princípio, é de fato terrificante, mostrando-nos


os problemas com os quais nos defrontamos. Mas, acompanhem-no - vão adiante!
Ele não pára a meio caminho, ele prossegue com este acréscimo, com esta segunda
metade; e aí ele nos mostra a maneira pela qual, embora seja essa a verdade
concernente ao combate, podemos ser capacitados a empreendê-lo, e não somente
a empreendê-lo, porém a triunfar nele. Mostra-nos que fomos destinados a ser “mais
do que vencedores”.
Por isso o apóstolo prossegue e nos mostra esta segunda metade; e ele o faz a seu
modo característico. Ele até declara isso antes de expor o problema. Diz ele:
“Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura
de Deus, para que” - e então apresenta o problema. Aqui, e somente aqui, nos é dito
que, a despeito de tudo quanto é contra nós, sejam domínios nas alturas ou no mundo
em que vivemos, com todas as suas tensões e pressões, como povo cristão, nós
podemos ser capacitados a triunfar, a regozijar-nos no meio d isso tudo, e a saber q
ue a vitória é garantida. Essa é a questão à qual passamos a dar atenção.

Que é que nos é oferecido quando nos vemos, como cristãos, enfrentando tudo isso-
esta peleja, esta luta, este combate? Vocês notam que há apenas duas coisas juntas. A
primeira é: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”; a segunda é:
“Revesti-vos de toda a armadura de Deus”.

Ao passarmos a examinar estas duas coisas, há alguns comentários preliminares que


devo fazer. O primeiro é que ambas são necessárias. Não devemos tomar uma sem a
outra. O apóstolo d iz as duas, e temos q ue tratar dasduas. Teremos ocasião de
repetir isso constantemente à medida que avançarmos. Notem, porém, a ordem em
que ele as coloca. Ele não diz a você que vista a armadura primeiro, e depois se
fortaleça no Senhor. Não, é o inverso: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu
poder”; e então: “Revesti-vos de toda a armadura de Deus”. A ordem tem um real
significado. Não vou deter-me nisso no momento, mas posteriormente terei ocasião
de mostrar a sua significação e a importância de segui-la como algo prático.

Há, evidentemente, uma relação entre os dois fatores. Deixem-me dar apenas uma
ligeira idéia do que desenvolveremos na seqüência. É o seguinte: com muita
freqüência as pessoas tomam apenas um destes fatores e, porconseguinte, naufragam
na fé. Háalgunsquedizem: “Tudo o que você necessita fazer é levar tudo ao Senhor e
descansar confiante em Seu poder”. Jamais fazem alusão a “toda a armadura de
Deus” -isso é deixado completamente de lado. Há outros que colocam toda a sua

ênfase no revestimento da armadura de Deus, como se eles pudessem vesti-la por si


mesmos. Esquecem a sua absoluta dependência do poder do Senhor, e da Sua força
imensa e vigorosa. Vemos, então, que há diversas questões interessantes na simples
apresentação das duas coisas que são indispensáveis para que se tenha uma vida
cristã vitoriosa.

Comecemos, pois, com a primeira delas - “Fortalecei-vos no Senhor e na força do


seu poder”. Eis aí uma grande ordem dada por este valoroso capitão, o apóstolo
Paulo - ordem do dia. Eis aí uma palavra enviada ao exército reunido, tendo o
inimigo em posição de ataque. Eis aí a palavra proveniente deste grande líder que,
ele próprio, tivera pessoalmente longa experiência de guerra, e que, como tantas
vezes ele nos faz lembrar, tinhaa seu cuidado todas as igrejas, e tinha visto em
primeira mão as maquinações do maligno contra o povo de Deus. Eis aí a grande
ordem do dia-“Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”. Agarrem-se a
isso, não o esqueçam. No calor e no grosso da batalha mais tarde no dia, aconteça o
que acontecer, jamais esqueçam, jamais percam de vista este grande princípio
norteadore determinante.

Pergunto: que é que significa, e como podemos praticá-lo? É uma frase retumbante;
lê-la, repeti-la, não basta. Gostamos de cantar as palavras do hino, “Vistamos a
armadura do evangelho”. Mas, que significa na prática? Investiguemos a matéria. O
cristianismo não é uma forma de psicologia. Você não vai simplesmente pelo
caminho dizendo:“Fortalecei-vos no Senhor e na força de seu poder”, usando a frase
como uma espécie de encantamento, ou de auto-sugestão, repetindo-a para si mesmo.
Isso não é cristianismo, absolutamente! Caracteriza as seitas, é claro; é o método
psicológico. Você repete frases como, “Cada dia, e por todos os modos, vou ficando
cada vez melhor”. Você se persuade a si próprio, e pensa cada vez menos em sua
saúde e, por conseguinte, começa a sentir-se melhor. Até certo ponto
funciona, entretanto só até certo ponto. Mas, de qualquer forma, não é a
mensagem cristã. Assim, muitas vezes corremos o perigo de abusar das
Escrituras desta maneira. Usamo-las meramente como frases dessa maneira,
ou cantamos os nossos hinos despreocupadamente, e nos sentimos melhor por algum
tempo. Todavia, a questão é: como resistimos às tentações quando estamos na rua, e
como somos em casa? Quando você faz das Escrituras uma pílula, algo que lhe
dáalívio temporário sem saber por que ou como, o efeito não dura. Dá-lhe uma
temporária sensação de euforia, mas falha quando você está na luta e no calor da
batalha.

Qual será, então, a verdadeira aplicação do preceito do apóstolo?

A primeira coisa que devemos compreender é a necessidade de sermos fortes por


causa do poder do inimigo. Jamais subestimemos esse poder, A Bíblia sempre nos
conclama a enfrentar o inim igo e adar-nos conta de que ele é, no dizer de Pedro,
“como leão que ruge procurando alguém para devorar” (1 Pedro 5:18, ARA). É-nos
dito que o arcanjo Miguel não se atreveu a falar com ele levianamente ou com
liberdade, e quando discutia com ele a questão do corpo de Moisés, “não ousou
pronunciar juízo de maldição” contra ele. Tudo o que o arcanjo se aventurou a dizer
foi, “O Senhor te repreenda” (Judas 9). O inimigo é terrivelmente poderoso e cheio
de astúcias, sutilezas e manhas; ele até pode transformar-se “em anjo de luz” (2
Coríntios 11:14).

Outra razão, razão muito prática do lado humano, é que, se você há de ser capaz de
resistir e de agüentar-se no dia mau, você precisa deste poder. “O dia mau”! Embora
a vida cristã seja, em certo sentido, sempre o mesmo tipo de vida, há variações; há
dias maus, uns dias são piores do que outros, são excepcionalmente maus. Em geral
no presente estamos vivendo um dia muito “mau”. É mau em todos os aspectos. Não
estou pensando somente nas tensões internacionais; é um dia mau porque o mal e o
pecado estão poderosamente organizados, ou estão muito bem entrincheirados; é um
dia mau porcausada confusão existente na própria Igreja, que às vezes parece não só
negar o evangelho em geral, mas até a crença na existência de Deus. Não é fácil ser
cristão num tempo como este, quando temos homens em posições de alta autoridade
na Igreja falando em “encontrar ateus no céu”! Os cristãos estão sendo
levados àconfusão por essas coisas, particularmente, talvez, os cristãos novatos. O d
iabo está extraordinariamente ocupado e ativo, criando esta incerteza acerca dos
elementos essenciais da fé e produzindo esta confusão total -“O que é o evangelho?
O que não é?” Indubitavelmente vivemos num dia muito mau; e se havemos de
resistir num tempo como este, só há um meio; é o meio que o apóstolo nos ensina
aqui. Precisamos deste poder, e de toda a armadura de Deus; e então seremos
capazes de resistir. Graças a Deus que é assim. Embora a confusão seja terrível, os
que crêem na verdade ainda podem resistir. Não desacorçoe, não se desanime,
não se deixe extraviar, não se ponha fora. Talvez você seja o único a resistir, mas
ainda pode ser habilitado a resistir, apesar de os dias serem tão cruelmente maus, vis
e torpes.

Há, porém, outras razões que nos animam a procurar esta força e este poder. Por que
devo “fortalecer-me no Senhor e na força de seu poder”? Respondo: quero
fortalecer-me para evitar fracasso pessoal; sim, pois eu sei que, quando eu falho e
caio em pecado, fico acabrunhado

e me sinto infeliz. Isso verdadeiramente acontece com todos os cristãos. Portanto,


para se livrarem do infortúnio, que é a inevitável conseqüência de toda e qualquer
falha na vida cristã, tratem de “fortalecer-se no Senhor e na força do seu poder”.

Mas vou dar-lhes uma razão mais elevada do que o medo de fracasso pessoal.
“Fortaleçam-se” porque vocês são quem são, porque vocês são o que são. No que se
refere à salvação, somos indivíduos, porém não somos unidades isoladas. Somos
diferente mente membros do corpo de Cristo; pertencemos a Ele, à família de Deus.
Lembrem-se sempre de que o Senhor Jesus Cristo “não se envergonha de nos chamar
irmãos” (Hebreus 2:11). Lembrem-se também de que “Deus não se envergonha de se
chamar seu Deus” (Hebreus 11:16). O nome de Deus está sobre nós, o nome de
Cristo está sobre nós. Porque devo fortalecer-me? Bem, devo fazê-lo mais por amor
dEle do que por amor de mim. Num sentido, este pensamento é alarmante e, todavia,
é uma das verdades mais gloriosas que podemos compreender a nosso respeito -
que, por assim dizer, a reputação de Deus Todo-poderoso, o Pai, o Filho e o
Espírito Santo, estáem nossas mãos, e qualquer fracasso que nos aconteça dá
má famaao grande e santo nome. Não somos indivíduos isolados, somos um só, neste
grande e poderoso exército.

O mundo sabe como responder a estes apelos, não sabe? Nelson sabia exatamente o
que fazia naquela manhã em Trafalgar: “A Inglaterra espera que cada homem cumpra
hoje o seu dever”. Certamente! O nome da pátria! Multipl iquem isso pelo infinito e
vejam que eu e vocês não temos direito de mostrar-nos fracos, porque o nosso
fracasso não envolve somente a nós mesmos. Toda a família, no céu e na terra, está
envolvida conosco. Somos representantes.

Não é só para que vivamos uma vida feliz que eu estou chamando a atenção para este
texto. Abandonemos esta abordagem puramente subjetiva, aprendamos a ver as
coisas do ponto de v ista da Igreja do Deus vivo, deste grande exército e seu
estandarte; pensemos nAquele que é o Capitão e Líder da nossa salvação. E
lembremo-nos deque pertencemos a Ele, e de que o que quer que nos aconteça O
envolve também.

Assim, finalmente eu coloco a questão da seguinte maneira: não há melhor meio de


provar a veracidade do evangelho do que “fortalecer-nos no Senhor e na força do
seu poder”, do que triunfarmos e prevalecermos. Viver direito é difícil, e quando
vemos alguém que está sendo vitorioso, alguém que é capaz de resistir às seduções e
insinuações do mal, alguém que não se deixa levar pelo popular, que luta
perseverantemente pela verdade e portudo quanto é digno, ficamos muito animados.

Sem dúvida, isso tem grande efeito sobre os que estão observando. Todos nós
estamos sendo observados no presente. O mundo é muito infeliz, os homens e as
mulheres não sabem o que fazer, não sabem aonde ir. Quando vêem alguém que
parece calmo e firme, alguém que não se deixa transtornar num tempo como este,
alguém que parece ter discernimento na situação toda, e que vê além disso tudo, eles
olham e dizem: “Que será isso? Qual será o segredo dessa pessoa?” E assim você se
torna um evangelista simplesmente mostrando resistência e se “fortalecendo no
Senhor e na força do seu poder”. Você não é arrastado pela onda, não faz coisas só
porque os outros as estão fazendo, você tem os seus próprios princípios, e está
pronto a lutar por eles e a morrer por eles. Muitas vezes tem sido esse o meio, sob a
bênção de Deus, para despertar outros e convencê-los do pecado, e levá-los a
começar a buscar a Deus.

Em nossa vida diária, seja qual for a nossa vocação terrena, todos nós vivemos numa
espécie de círculo; estamos cercados de pessoas que o diabo cegou e que ele, a seu
talante, leva por maus caminhos (2 Timóteo 2:26). Você nunca sabe quando o simples
fato de que você está “resistindo” - não estou pedindo que você seja pretensioso, não
estou pedindo que você fale, necessariamente, mas estou apenas pedindo que você
mostre que pode resistir quando todos os outros estão falhando -você nunca sabe,
repito, quando isso pode prender a atenção e abrir uma portade oportunidade para o
evangelho de salvação, o evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo.

Aí estão, pois, algumas razões e considerações preliminares pelas quais devemos


fortalecer-nos no Senhor e na força do Seu poder.
Em segundo lugar, temos que dar-nos contadas nossas fraquezas e da nossa
necessidade de ajuda. Essa é a pressuposição que está por
trás daquiloqueoapóstoloestádizendoaqui. Ele não está preocupado com isto somente
por causa do inimigo, mas está igualmente preocupado por causa da nossa fraqueza,
por causa da nossa falta de forças; e, de novo, o melhor modo de perceber esta
incapacidade é entender algo do poder do inim igo. Há amplo ensino na Bíblia para
dar a você esse conhecimento. Vá ao princípio da Bíblia. Você vê ali um homem
chamado Adão, que era sem pecado e perfeito. Entretanto, é confrontado pelo diabo
e pela manifestação “das astúcias do diabo”. Embora fosse perfeito e tivesse tido
uma vida de amizade e comunhão com Deus, ele caiu; e caiu tão facilmente! A
astúcia do inimigo, com a sua insinuação de que Deus estava contra o homem, de que
Deus era injusto com o homem, foi demais para Adão, e

ele caiu. Quando o diabo lança o seu ataque, que é o homem, embora perfeito e
criado à imagem de Deus? Adão caiu. E se Adão, naquele estado de perfeição, caiu,
quem somos nós para resistir?

Mas, prossigamos. Vejamos os santos do Velho Testamento, todos eles, os patriarcas,


os reis piedosos e os profetas. Todos eles caíram, nenhum deles pôde resistir ao d
iabo. Ele é “o valente que guarda, armado, a sua casa, e mantém em segurança tudo
quanto tem”. Todos os homens falharam, todos eles “pecaram e destituídos estão da
glória de Deus”; eles sucumbiram às “astúcias do diabo”.

Esse tem sido o testemunho universal de todos os santos cristãos, dos maiores santos
através dos séculos. Um dos sinais característicos do verdadeiro santo é que ele
nunca dá a impressão de que a vida cristã é fácil - nunca! O homem que dá a
impressão de que é fácil confundiu o cristianismo com alguma outra coisa; usa um
atalho que ele imagina que o leva a um lugar onde tudo é muito simples. Mas o
caminho do cristão não é esse, jamais. Os maiores santos sempre deram testemunho
da ferocidade da batalha, da sua fraqueza pessoal, da sua incapacidade. Lamentavam
isso. Portanto, estejamos atentos ao que nos está dizendo hoje essa grande “nuvem de
testemunhas”.

No entanto, permitam-me recomendar-lhes que examinem também a sua experiência


pessoal. Se você achaque é um cristão muito forte, permitaquelhe pergunte porque
você falhou tanto, e porque ainda falha? Que acontece com as suas resoluções e com
os seus propósitos? Por que você se vê tantas vezes na situação de arrepend imento?
Por que às vezes o assaltam sentimentos de completa desesperança e de quase
desespero? A que se deve isso? Deve-se tudo ao simples fato da nossa fraqueza;
é porque somos incapazes e infalíveis.

Mas devemos encarar isso com sinceridade. Não é suficiente dizer de modo geral,
“Sim, eu sei que o inimigo é muito forte, como você diz, e que eu sou fraco”. Temos
que persuadir-nos da nossa fraqueza. Isso é meio combate. Precisamos saber que
estamos mal; noutras palavras, precisamos entregar-nos a muito auto-exame. É por
isso que as pessoas dão tão pouca atenção ao nosso texto bíblico; é por isso que
sabemos tão pouco sobre o que é resistir, e fortalecer-nos no Senhor e na força do
Seu poder; nunca nos demos conta da nossa necessidade. “Os sãos não necessitam de
médico” (Marcos 2:17). Esse era o principal problema com os fariseus. Achavam
que estavam em boas relações com Deus; não iam ao médico; não havia nadade
errado com eles. Não vamos ao médico enquanto achamos que está tudo bem
conosco; temos que aperceber-nos de que estamos “doentes”. Todavia isso significa
exame, auto-exame.

Somente dessa maneira é que descobriremos os elementos de fraqueza que


inerentemente há em nós, e que nos tornam tão incapazes de combater o combate
contra o pecado e satanás.

Outra coisa que temos de compreender é que meros princípios morais não nos são
suficientes. O mundo sempre se interessou pelo que ele chama de “viver moralmente
bem”. Os filósofos sempre se interessaram pelo assunto; eles escreveram sobre isso,
argumentavam sobre isso. Mas o problema é que eles nunca foram capazes de
praticá-lo. Os princípios morais são bons, dentro dos seus limites, porém não
são suficientes; você pode ler livros sobre ética e pode chegar a ser
eloqüente nessas questões, mas pô-las em prática é coisa muito diferente. “O querer
está em mim, mas não consigo realizar o bem”, dizia o apóstolo (Romanos 7:18).
Vejo que certo item é correto, contudo o problema é: “Como vou praticá-lo?” Eé
quando você enfrenta realmente o problema que você começa a perceber a extensão
da sua fraqueza.

Além disso, só o poder da vontade não basta. O poder da vontade é excelente, e


devemos usá-lo sempre; mas não basta. O desejo de ter uma vida moral mente boa
não é suficiente. É óbvio que todos nós devemos ter esse desejo, porém ele não
garante sucesso. Permitam-me, pois, colocar aquestão assim: apeguem-se aos seus
princípios morais e éticos, usem o poder da sua vontade até o limite extremo, dêem
toda a atenção a cada desejo nobre e elevado que haja em vocês; mas procurem dar-
se conta de que estas coisas por si só, não são suficientes, que elas nunca os levarão
ao lugar desejado. Temos que compreender que tudo o que há de melhorem nós é
totalmente inadequado, que um combate espiritual tem que ser travado de maneira
espiritual. Esta verdade foi bem expressa num hino de Isaac Watts:

De Ti, a fonte trambordante

Noss 'alma bebe, e se renova.

Quem em sua força natural


E em si confia, cai e morre.

E a pura verdade! Recordemos também as palavras doutro hino:

O braço da carne te falhará,

Portanto, não ouses fiar-te no teu.

Temos aqui o início do entendimento de todo este assunto. O problema não é apenas
um problema de vida moral. Esse é o limite da

preocupação do Estado com as nossas pessoas. O Estado ignora o fundo espiritual,


pois ele ignora o diabo e “os principados e as potestades”. E é por isso que ele
continua a acreditar que a educação pode realmente resolver o problema e reformar
pessoas. É por isso que ele pede o auxílio da psicoterapia e de vários outros
expedientes nas prisões. Mas, quanto mais ele faz isso, mais o problema parece
aumentar. Tudo porque os homens não se apercebem do caráter espiritual do
problema.

Eu e vocês temos que compreender que o viver a vida cristã não acompanha
automaticamente a conversão. Há muitos que, tendo entrado na vida cristã por meio
da regeneração, por meio de uma experiência genuína, tentam viver a vida cristã nos
velhos moldes. Acham que precisam deste ato de Deus em Cristo para salvá-lo,
porém parecem ficar só nisso. Acham que daí em diante vão v iver a v ida cristã por
suas próprias forças; eles têm um novo entendimento e, portanto, agora vão ter
esta vida. Mas não é possível fazê-lo! Esse é o caminho no qual muita gente “cai e
morre”, porque a sua confiança está somente “em sua força natural”. Ao contrário,
este é um combate que tem que ser travado de maneira espiritual ecom entendimento
espiritual.

Isso nos levaao terceiro princípio geral. Tendo compreendido que devo fortalecer-
me e que em mim e por mim eu sou essencialmente fraco, porque ainda estou na
carne, e que continua sendo verdade que “a carne cobiça contra o Espírito, e o
Espírito contra a carne, e estes opõem-se um ao outro” (Gálatas 5:17) -
compreendendo que tudo isso aplica-se verdadeiramente a mim,e que aqui estou,
nesta guerra, e enfrentando este poder terrível, que é que vem em seguida? É
compreender que o Senhor é forte, poderoso e, como no-lo faz lembrar o Velho
Testamento, compreender que “Torre forte é o nome do Senhor” (Provérbios
18:10). Seu nome mesmo é forte. O nome O representa, quem Ele é o que Ele é. E,
portanto, a primeiracoisadaqualdevemosaperceber-noséagrandeza do Seu poder. É
isso que o apóstolo está dizendo aos efésios e a nós.

Ouçam as palavras; examinem-nas em detalhe. Dizele: “Fortalecei-vos no Senhor e


na força do seu poder”. Vocês percebem a plenitude da sua significação? Que é que
ele quer dizer com a frase “na força do seu poder”? O fator básico, obviamente, é o
“poder”. Somos encaminhados à “força” do Seu “poder”. A diferença entre força e
poder é que “poder” significa força revestida de energia; “poder” é força
inerente, algo que é dado ao homem. Pensem num homem forte, musculoso.
O “poder” é essa força e energia muscular do homem. A força é a manifestação
desse poder; o poder subsiste como potencial, como algo

inerente, já se manifestando, mostrando a sua eficácia, mostrando que pode ser


eficiente. Significa esta grande reserva de energia e força em operação de fato,
realizando algo; não o dom propriamente dito, mas a prova de que você tem esse
dom.

Assim é que o apóstolo usa os dois termos, e é importante exam inar os dois. Diz
ele: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”; portanto, você deve
começar lembrando-se da Sua energia. Olhe para Ele, diz o apóstolo, veja a Sua
força; você examinou-se e está tremendo em sua fraqueza e ineficácia; pois bem, diz
ele, agora olhe para Ele, fortaleça-se no Senhor - “Fortalecei-vos no Senhor”.

Para “fortalecer-se no Senhor” você tem que se lembrar “da força do seu poder”. Dê
a expressão que quiser a isso, porém olhe para Ele, para dar-se conta das reservas
de energia e força nEle existentes. É isso que estas Epístolas doNovoTestamento
dizem em quase toda parte. “Nele”, diz Paulo aos colossenses, “habita
corporalmente toda a plenitude da divindade.” “Em que”, diz ele ainda, “todos os
tesouros da sabedoria e do conhecimento estão ocultos” (ARA). Estão todos ali.
Eles constituem este “poder”, esta tremenda força e energia inerente. “Fortalecer-se
no Senhor” é meditar nEle e em Sua força. Não é tão-somente uma frase, um
encantamento, uma fórmula. Significaque você se assenta e recorda estas coisas,
você olha para Ele e traz à memória algumas destas coisas que verdadeiramente se
referem a Ele.

Diga-se de passagem que o fato de podermos fazer precisamente isso é um dos


principais motivos para lermos regu larmente as Escrituras, em particular os quatro
Evangelhos. Não devemos ler as Escrituras apenas para podermos dizer que lemos a
nossa porção diária e assim cumprimos o nosso dever. Isso não é motivo para ler as
Escrituras. Não estou condenandoaleiturasistemática; sou um grande defensor da
leitura sistemática. Tudo o que eu estou dizendo é que devemos ser cautelosos, para
que não suceda que, com a sua astúcia, o diabo se intrometa e nos leve a contentar-
nos com uma simples leitura mecânica das Escrituras sem realmente vê-las, e
meditar nelas sem perceber o que elas estão dizendo, sem tirar lições para nós e sem
orar sobre o seu uso prático. Ler as Escrituras apropriadamente toma tempo. É muito
fácil ler certo número de versículos e sair correndo para pegar o ônibus ou o trem.
Isso não é ler as Escrituras; isso pode ser totalmente inútil. Você tem que parar,
olhar e pensar. Portanto, vá aos Evangelhos e olhe para o Senhor e para a “força do
seu poder”.

Onde vejo a Sua força? Vejo-a em Sua vida. Eu O vejo neste mundo na “semelhança
de carne pecaminosa” (Romanos 8:3, VA e

ARA). Vejo-0 no mesmo mundo em que eu estou. Vejo que, obviamente, Ele
experimentou fome, sede e fraqueza e cansaço físicos, e que Ele sabia o que é ficar
decepcionado com outras pessoas. Ele passou por isso tudo. E, todavia, o que vejo
quando olho para Ele é que Ele resiste, Ele sempre permanece firme. Nunca se vê
nEle qualquer vacilação, e muito menos alguma falta ou hesitação ou queda. Ele
resistia, tendo o mundo, a carne eo diabo-tudo -contra Ele. Ele resistia. Portanto,
quando olho para a Sua vida, vejo imediatamente Aquele que andou por este mundo
sem Se desviarem nenhum aspecto. Ele simplesmente ia adiante resolutamente.

Vejo mais, vejo a Sua força em todos os Seus milagres. Vejo-a principalmente nos
milagres em que Ele expulsou demônios. Eis aqui Aquele para quem eles não eram
problema. Eis aqui Aquele que pode impor-Se aos demônios. Ele pode exorcizá-los.
Ele fala com poder e autoridade, e os demônios têm que vir de rastos a Ele, rogando-
Lhe que os poupe, que não os lance no abismo para destruí-los. Eis aqui um Mestre e
Senhor. Vêm a Ele e Lhe dizem: “Sabemos que tu és o Santo de Deus”. Eis aqui
Aquele que, quando os demônios estavam agindo poderosamente, com uma só
palavra podia expulsá-los. Os discípulos não conseguiam fazer isso. Vejam o rapaz
no sopé do Monte da Transfiguração. O pai o tinha trazido aos discípulos, e eles
fizeram o máximo que puderam. Mas não puderam ajudá-lo, e o pobre rapaz
continuou sendo uma vítima do poder de satanás. Todavia, a uma palavra do nosso
Senhor, o demônio é expulso e o rapaz é curado e devolvido são ao pai. Ali vemos a
Sua força em ação, ali vemos algo da“força do seu poder”. Ele tem o domínio
sobre “os principados, as potestades, sobre os príncipes das trevas deste
século, sobre as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais”.

Mas devemos ir mais longe e observar esta “força do seu poder” revelada na
tentação a que Ele Se sujeitou. Ele foi tentado diretamente pelo próprio diabo, não
por algum dos seus emissários, não por este ou aquele principado ou potestade,
porém pelo próprio diabo, com todas as suas astúcias. Aqui o diabo se encarrega
pessoalmente da situação porque vê que é o maior problema que já enfrentou. Por
isso ele veio ao nosso Senhor e O tentou durante quarenta dias e quarenta noites
no deserto, e noutras ocasiões; mas foi total e completamente derrotado. Com as
palavras das Escrituras o nosso Senhor o repele, e o diabo cai derrotado, esperando
outra ocasião. Contudo fracassou completamente, apesar dos seus numerosos
esforços.

É nisso que devemos demorar-nos, e ponderar. Não será este ou aquele pormenor ou
incidente da vida do nosso Senhor que levará você a entender a Sua Pessoa. Isso
ajuda, é claro, e atesta a Sua Pessoa; mas
agora, diz o apóstolo: façam uso prático dessa força. Tomem-na, apode-rem-se
pessoalmente dela. Vocês vêem que Ele enfrentou em combate singular o diabo com
toda a força dele em ação, e o derrotou facilmente; fortaleçam-se, pois, “no Senhor e
na força do seu poder”. A força estava sempre nEle, e pronta; e quando o diabo
vinha, Ele apenas a mostrava, apenas tirava um pouco dela para fora, por assim
dizer, e o diabo era imediatamente repelido. Segurem-na, diz o apóstolo.

Tiago, exatamente da mesma maneira, e compreendendo este ponto, diz: “Resisti ao


diabo, e ele fugirá de vós” (4:7). É como funciona. Mas não funcionará enquanto eu e
vocês não estivermos bem seguros acerca da força de Cristo, e não conhecermos
realmente algo da “força do seu poder”, da força que Lhe é inerente. “Nele habita
corporalmente a plenitude da divindade”. Ele é Deus e homem. Não pode falhar.
Nunca falhou.

Finalmente, é óbvio, o Senhor prova e demonstra a força do Seu poder na cruz e na


ressurreição. A cruz parece o dia do poder do mal. Assim pensavam os poderes do
mal, bem como o diabo e todas as suas hostes. O mundo também tinha semelhantes
pensamentos. Eles O provocaram, riram dEle, zombaram dEle: “Salvaste os outros,
desce da cruz, salva-te”. Achavam que Ele não era capaz de fazê-lo, e que o diabo O
tinha derrotado! Entretanto o que estava acontecendo ali era que Ele estava
“despojando os principados e potestades” (diz Paulo em Colossenses 2:15)
“expondo-os publicamente e deles triunfando nela” (por meio dela). Quer dizer,
quando pensavam que O tinham derrotado, Ele estava triunfando sobre eles. “Agora
é o juízo deste mundo”, diz Ele com antecipação, contemplando a cruz -“Agora é
ojuízo deste mundo; agora será expulso o príncipe deste mundo” (João 12:31).
Olhem, pois, para a cruze meditem nela. Este é o supremo paradoxo: Ele parece
estar morrendo na maior fraqueza, mas vocês vêem a energia inerente ali, vocês
vêem este Seu poder, vocês vêem ali a força da Deidade, transformando isso na
derrota do diabo e na libertação do Seu povo -numa vitória gloriosa e triunfal?
Olhem para isso, e para isso somente!

Depois vá ver a ressurreição. Ele rompe “as ânsias da morte”, triunfa sobre o último
inimigo e sobre os efeitos finais do pecado e do mal. Ele tem domínio completo
sobre todos estes poderes que se levantam contra nós, e os derrota a todos. Ele
ressuscita, sobe ao céu, “levando cativo o cativeiro”. Ele é o vencedor sobre tudo
quanto se põe contra nós.

Não se trata apenas de uma fórmula psicológica que eu e vocês podemos aplicar.
Mas tudo se reduz a isto - conhecê-10! Vocês nunca

experimentarão poder em suas vidas enquanto não O conhecerem. Portanto,


precisamos conhecê-10. Quando estudarmos as diversas partes da “armadura”,
veremos que quase todas elas estão direcionadas para aquele fim, conhecê-10, ter
conhecimento sobre Ele e sobre a verdade concernente a Ele. Começamos com esse
pensamento aqui - “no Senhor” “e na força do seu poder”.

Já captamos algo disso? Sabemos algo sobre isso? Esqueça-se de você por algum
tempo. Olhe para Ele e procure compreender a verdade a Seu respeito. Depois
procure compreender a força do Seu poder que está disponível para você. Essa é a
chave de tudo. Assim, devemos vê--10 objetivamente como Ele nos é retratado,
como Ele Se nos revela. Depois temos que compreender que pertencemos Àquele
que é “o Senhor” e que nEleestá “a plenitude da deidade” (VA), que nEle há
um poder e uma força que não permanecem apenas como potencial, porém também se
tornam fatuais. Esse poder se manifesta em nosso favor, e também em nós. Por isso
começamos aqui a examinar esta palavra libertadora, que nos capacita, mesmo neste
d ia mau, a manter-nos firmes, a resistir, a fortalecer-nos para combatermos o
combate do Senhor, e para darmos honra e glória ao Seu grande e santo nome.

COMBATE DE DEUS, NÃO NOSSO


4
EXERCÍCIO
AS PROMESSAS
O QUE EVITAR
TODA A ARMADURA DE DEUS
A ÚNICA AUTORIDADE
A COURAÇA DA JUSTIÇA
VESTINDO A COURAÇA
PERMANEÇAM FIRMES
22
A ESPADA DO ESPÍRITO
ORANDO POR TODOS OS SANTOS
COMBATE DE DEUS, NÃO NOSSO

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” —


Efésios 6:10

Em nosso estudo anterior, consideramos algo do conteúdo da expressão, “a forçado


seu poder”. A próxima questão que surge é: como exatamente nos relacionamos com
esta força e poder? Uma coisa é lembrar-nos da onipotência do nosso Senhor, do
glorioso poder que nEle reside, e de que Ele triunfou sobre todos os outros poderes;
mas, como se relaciona isso comigo, como isso me ajuda, que proveito tem isso para
mim em meus problemas, conflitos e lutas pessoais com estes poderes e forças que
se põem contra mim? É o que vamos passar a considerar agora.

A primeira coisa que temos de lembrar sempre é que o Senhor J esus Cristo é o que
o autor da Epístola aos Hebreus chama “Capitão da nossa salvação”. No capítulo
dois, versículo dez, lemos: “Pois convinha que ele, para quem são todas as coisas, e
por meio de quem todas as coisas existem, ao trazer muitos fi lhos à glória,
aperfeiçoasse mediante sofrimentos o Capitão da salvação deles” (VA). Encontramos
a mesma idéia no versículo dois do capítulo doze, onde vemos: “Olhando para Jesus,
autor e consumador da fé”. Ele é uma espécie de Líder Vanguardeiro, o Originador,
Aqueleque lidera continuamente-“autore consumador da fé”. ,

Éo que temos de compreender primeiro. Noutras palavras, é preciso que tenhamos


uma verdadeira concepção desta salvação que estamos usufruindo. O perigo, sempre,
é ver isso de maneira puramente pessoal e subjetiva. Naturalmente, isso é essencial.
Há pessoas que nunca se apercebem do lado pessoal, e elas estão igualmente
erradas. Mas é errado ir para este ou aquele extremo. Muitas vezes o perigo está em
pensarmos na vida cristã como algo que nós temos de fazer. Estou prestes a
acentuar que temos de fazer muita coisa; no entanto, antes de passar a esse ponto, é
preciso que nunca percamos de vista o fato de que a salvação é primariamente uma
obra realizada por Deus. É o grande plano de Deus, o grande esquema de Deus. É
algo que Deus está realizando. É algo que Deus planejou e originou. Ele iniciou o
movimento e o está levando adiante. Este é um princípio fundamental da nossa fé.
Deus está envolvido

na questão da nossa salvação mais do que nós mesmos. Com muita freqüência, temos
a tendência de pensar nela primordialmente como algo que nós temos de realizar, e
que só buscamos a Deus ocasionalmente, para obter ajuda. Todavia isso é colocar as
coisas de maneira totalmente errada. A salvação é um plano de Deus, e nós somos
simplesmente introduzidos nesse plano.

Nunca nos esqueçamos de que somos unidades individuais de um grande exército.


Não estamos travando uma guerra pessoal, particular. A situaçãonão é essa, de modo
algum. Somos apenas soldados individuais de um grande exército que está
empreendendo uma grande campanha de guerra. Noutras palavras, o verdadeiro
ponto em questão não é tanto a minha luta contra o diabo, como é a luta de Deus
contra o diabo. É desse modo que se deve ver o assunto. Ver a questão dessa
maneira, imediatamente nos dá grande força.

Vejam aanalogia óbvia. O soldado em particular, nas fileiras ou nas trincheiras


durante uma grande batalha de uma grande guerra, não está travando um combate
particular, não está ali porque tem uma briga pessoal. Ele é apenas uma unidade
numa grande campanha. Não é ele que decide sobre a estratégia, nem mesmo sobre a
tática. Tudo isso está noutras mãos. Ele está na guerra, foi convocado, foi colocado
nessa situação; entretanto a guerra não é dele. É uma guerra do rei ou da rainha ou da
pátria, e há um general comandando e dirigindo as atividades do exército e
conduzindo a luta.

Pois bem, essa idéia é ensinada em toda parte noNovo Testamento; e não conheço
nada que seja mais consolador e tranqüilizador, mais animador e enobrecedor, do
que a percepção disso no íntimo. Se posso tomar emprestada uma frase util izada no
Velho Testamento com relação ao rei Josafá, ei-la: “A peleja não é vossa, senão de
Deus”. Não significa que Josafá não tinha de fazer nada; significa que ele estava
sendo levado a lembrar-se de que aquilo em que estava envolvido não era uma
questão puramente pessoal, mas, antes, era de Deus. Todas as batalhas de Israel, se
vocês já as estudaram, não eram de Israel, eram sim, do Senhor. Os filhos de Israel
estavam envolvidos porque eles eram o Seu povo. Seu principal problema era que
eles sempre tendiam a esquecer o Senhor e a considerar os combates e os problemas
como questões pessoais deles. Assim, eles faziam em sua política e em suas alianças
com o Egito, e assim por diante, e se viam em dificuldades. Se tão-somente
compreendessem que estavam lutando no combate do Senhor, a situação se
transformaria completamente. Esse é o primeiro princípio que sempre temos de
manter fixamente - “O Capitão da vossa salvação”; “a peleja é do Senhor”.

Ou vejam essa outra frase espantosa empregada no versículo dez do capítulo dois da
Epístola aos Hebreus - “Convinha que ele” - isto é, Deus - “ao trazer muitos filhos à
glória”. É Ele que está na liderança. Eu e vocês não estamos travando um combate
individual na tentativa de obter a salvação. É Deus que nos está trazendo à glória. É
dEle o esquema, o plano é dEle. É algo quQ ELE está realizando. Primariamente não
é realização nossa. “Convinha que ele, ao trazer muitos filhos à glória, aperfeiçoasse
o Capitão da salvação deles” - Ele foi designado como Líder, como Capitão, sendo
aperfeiçoado “mediante sofrimentos”. Notem bem a expressão, “Convinha que
Deus”. Noutras palavras, este é o método de Deus, o plano de Deus.

No momento em que compreendemos essa verdade, a situação toda se transforma


imediatamente. Pensem nos soldados de um exército lutando em seu pequeno setor.
Sofrem forte pressão, e as coisas vão contra eles. Se eles acham que o que estão
fazendo é apenas o seu combate particular, logo serão derrotados. Mas quando se
lembram de que constituem apenas parte de um grande e poderoso exército, e que
na retaguarda, dirigindo tudo, está o Capitão, o seu Líder, a situação se modifica
inteiramente. Noutras palavras, quando combatemos este combate e lutamos contra
estes principados e potestades e enfrentamos as investidas do mundo, da carne e do
diabo, temos de compreender que Deus está envolvido nisso conosco. Nunca
estaríamos nesse combate, não fora isso. O combate fundamental é o combate entre
Deus e o diabo, entre o céu e o inferno, entre a luz e as trevas.

Isso, por sua vez, leva-nos a compreender mais uma verdade, que é impossível que
esta campanha falhe, porqiie a honra de Deus está envolvida nela. Levantem a mente
e o coração no ardor da peleja, e tragam isso à memória. Vocês vêem a força e o
poder do inimigo, e estão cientes da fraqueza pessoal de vocês. Mas digam a si
mesmos: “Este combate é de Deus, recebemos o privilégio de estar nele e de lutar
como soldados individuais, todavia, a honra de Deus estáenvolvidanisso tudo. Ele
não pode permitir que isso falhe porque o Seu caráter, a Sua glória e a Sua honra
estão envolvidos em todos os pontos”. “Fortalecei-vos no Senhor”; lembrem-se de
que Ele está presente, e que o combate é dEle.

.... Não,há como exagerar a ênfase a isso. É o tema da Bíblia, desde o início de
Gênesis. Deus fez um mundo perfeito. Entra o diabo; a mulher e o homem lhe dão
ouvidos, caem, e o diabo se torna “o deus deste mundo”. Mas não é deixado assim.
Deus não disse ao homem eà mulher: “Muito bem, por causa da sua rebelião, da sua
loucura e do seu pecado, vocês trouxeram tudo isso sobre vocês. Agora, agüentem.
Vocês trouxe-

ram isso sobre vocês, pelo que terão de lutar pelo resto das suas vidas contra este
poder maligno que os dominou”. Não foi isso que Ele disse. O que Ele disse foi que
haveria inimizade entre a semente da mulher e a semente da serpente. Essa é a luta,
esse é o conflito. Contudo, Ele não parou aí, Ele fez uma promessa - “a semente da
mulher esmagará a cabeça da serpente”. Ele está envolv ido porque Seu é o mundo, e
eles são Seu povo. Ele não vai deixar que o diabo O derrote. Deus não pode permitir
que satanás estrague definitivamente a Sua grande obra. Naturalmente que não!
Assim Deus faz a Sua promessa de que a semente da mulher vai esmagar a cabeça da
serpente. Deus Se envolve no conflito. Todo o movimento da salvação visa à glória
de Deus; não visa un icamente à nossa libertação, mas primordialmente à glória de
Deus. A nossa libertação é somente uma expressão desta glória e honra em prol
do grandioso nome de Deus. Essa é uma das razões pelas quais Paulo
diz: “Fortalecei-vos no Senhor”. Tratemos de compreender isso! E você, livre-se da
idéia deque isto não passa de um pequeno combate particular que você vai travando
porsua conta: “Fortalecei-vos no Senhore na força do seu poder”.
Mas devemos avançar mais. Aquele é o ponto de partida, e é relutantemente que o
deixo, porque sei como estamos prontos aesquecê--lo. Somos tão subjetivos, e
vivemos nesta geração doentiamente “psicológica”, que começa com o homem e
termina com o homem. A isso se deve a maioria das nossas dificuldades. Estamos
sempre olhando para dentro de nós mesmos, compadecidos de nós mesmos,
lamentando por nós mesmos, e procurando algo que nos ajude.

Livre-se dessa maneira de ver, esqueça-se de si mesmo por um momento; o combate


é do Senhor! Ele é o Autor da salvação. É pela honra do Seu grande e santo nome.
No entanto, prossiga e veja que, uma vez que o combate é de Deus, esta força todo-
poderosa está sendo exercida em nosso favor, mesmo quando não o percebemos.
Nesta grande campanha estão sendo realizados feitos dos quais não temos ciência.
Talvez estejamos meio dorm indo em nosso ponto, e não percebemos que o
grande Capitão está planejando algo com relação a nós. Não temos
consciência disso. Mas não importa. Graças a Deus que Ele o faz, apesar de
não estarmos conscientes disso. Não fosse assim, estaríamos todos perdidos. Ele,
reitero, está pondo em exercício esta força para o nosso bem.

As Escrituras estão repletas deste ensino; e o que realmente necessitamos é conhecer


as Escrituras. Mais adiante se nos fará lembrar que “A espada do Espírito é a
Palavra de Deus”. Exatamente! Vejam

o Salmo 34, versículo 7: “O anjo do Senhor acampa-se em redor dos que o temem, e
os livra”. Você pensa que está fazendo tudo sozinho; porém “o anjo do Senhor” está
acampado ao seu redor. Ele é um anjo muito poderoso. Ele tem grande poder e força,
e está acampado ao redor daqueles que O temem. Mesmo quando estamos dormindo,
Ele está ali, sempre de guarda. Está vigilante porque somos povo de Deus, e a
honra de Deus está envolvida naquilo que acontece conosco.

Ouçam o Salmo 91: “Aquele que habita no esconderijo do Altíssimo, à sombra do


Onipotente descansará” (versículo 1). Que lugar para nele estar! Vocês já viram
filhotes correrem para a mãe à aproximação do perigo? A ave abre as asas e eles se
acolhem sob elas. “À sombra do Onipotente”! Essa é a verdade a respeito de todos
os cristãos. “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.” Não se esqueça
daquelas asas! Você “à sombra do Onipotente descansará”.

Estou simplesmente selecionando algumas expressões grandiosas. Notem como o


nosso Senhor expõe a matéria em João, capítulo 10: “Ninguém pode arrebatá-las da
mão de meu Pai” (versículo 29). Que conforto! Que consolo! Ninguém pode
arrebatar da mão de Deus o povo de Deus, o povo de Cristo. É mão forte, todo-
poderosa. Que o homem, o diaboeo inferno façam o que quiserem para arrebatá-lo, é
impossível. Diz ainda o apóstolo Paulo, escrevendo aos romanos, que ele está
“certo” -persuadido, não tem a menor dúvida-“de que, nem a morte, nem a vida, nem
os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem
a altura, nem a profund idade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor
de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor”. Os nossos inimigos tentarão fazê-
lo, farão o máximo, e haverá ocasiões em que nós, em nossa estultície, começaremos
a pensar que fomos separados, que fomos cortados, e que não há como livrar-nos
e como escapar. Contudo isso não acontecerá jamais. “Nada nos poderá separar do
amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor.” Por quê? A razão é que, se
alguma coisa pudesse separar-nos, Deus seria derrotado, e o diabo seria vitorioso.
Uma calamidade como essa não pode acontecer!

Acreditar na possibilidade de “cair da graça” é acreditar na possibilidade da derrota


de Deus imposta pelo diabo. Isso é inimaginável e completamente impossível. A
perseverança final dos santos é necessariamente verdadeira, em face da glória, do
caráter e da honra de Deus. “Ah, mas”, você dirá, “isso leva a perigo; pois alguém
dirá: “Posso fazer o que eu quiser”. Não! Quanto mais você compreeder esta
grande verdade, mais cauteloso você será. É esta verdade que faz as pessoas se

manterem no caminho estreito- a percepção de que a honra de Deus está envolvida, e


de que não estou combatendo o meu próprio combate, e de que, se eu falhar, o nome
de Deus estará envolvido. Portanto, quando se compreende verdadeiramente a
doutrina, não há perigo de antinom ismo. A doutrinaé bíblica.

Naturalmente, na prática, tudo isso signifícaque Deus cuidade nós, e que o cuidado
que Deus tem por nós supera a nossa compreensão neste mundo. Este ensino está em
toda parte das Escrituras. O nosso Senhor mesmo estava ensinando isso
constantemente. Disse Ele que Deus cuida dos pardais: “Não se vendem dois
passarinhos por um ceitil? E nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso
Pai”. Ah, quanto maior é o Seu interesse por você! Se Deus veste assim os lírios, se
Deus se preocupa tanto com as aves dos céus, “quanto mais”... Não há necessidade
de prosseguir. “Quanto mais”-claro! Ele nos introduziu no Seu plano, Ele Se
preocupa conosco, Ele Se interessa por nós - “até mesmo os cabelos da vossa
cabeça estão todos contados”. Isso demonstra o Seu cuidado. É Ele que realmente
está realizando a obra; e jamais devemos perder isso de vista.

Similarmente, o mesmo apóstolo pode d izer na Epístola aos Filipenses, capítulo


primeiro, versículo 6: “Tendo por certo isto mesmo”. Não se esqueçam do contexto
dessa declaração. O apóstolo estava na prisão, e ele não sabia quanto tempo mais ia
viver. Ele estava nas mãos do caprichoso imperadorNero, que de repente poderia
decidir, por capricho, levá-lo à morte. Paulo não sabia; poderia ser morto a qualquer
momento. Além disso, ele sabia que havia problemas nas igrejas, até na igreja de Fil
ipos. Contudo, ele diz: “Tendo por certo isto mesmo, que aquele que em vós
começou a boa obra a aperfeiçoará até ao dia de Jesus Cristo”. Velho, na prisão,
próximo da morte, deixando tudo, está perturbado? Absolutamente não! Ele está
confiante. Porque “Aquele (Deus) que em vós começou a boa obra a aperfeiçoará
(continuará a realizá-la) até (o fim, a consumação) o dia de Cristo”.

Ocorre que esta verdade não está restrita ao ensino do apóstolo Paulo. O apóstolo
Pedro diz exatamente a mesma coisa em sua Primeira Epístola, capítulo primeiro,
versículo 5. Referindo-se aos cristãos, ele d iz: “Que mediante a fé estais guardados
na virtude de Deus para a salvação já prestes para se revelar no último tempo”. O
que seria mais forte? Somos guardados na virtude (ou “pelo poder”, VA, ARA) de
Deus! “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.” Esse é o poder que nos
guarda.

Depois, outra palavra bíblica que como cristãos lamentavelmente

negligenciamos-o ministério dos anjos. VoltemosàEpístola aos Hebreus. Que são


estes anjos? Cristo é maior do que os anjos, mas o que são os anjos? A resposta é:
“Não são porventura todos eles espíritos mini stradores, enviados para servira favor
daqueles que hão de herdar a salvação?” Isto é, a favor do povo cristão. Nós somos
os “herdeiros da salvação” (VA). E o ensino é que Deus Se serve destes poderosos
anjos que Ele criou para servirem ou ministrarem a nosso favor. Nós ignoramos este
ministério, esquecemo-nos dele; porém, graças a Deus, isso não faz diferença.
Deus designou tarefas para eles, e eles as fazem. Eles fazem a vontade de Deus, são
espíritos ministradores; e o seu trabalho é ministrar para nós, porque somos os
herdeiros da salvação.

Eis a nossa posição: somos comparáveis aos filhos de um grande proprietário, de um


nobre que é dono de uma grande propriedade. Ele tem um filho e herdeiro que um dia
herdará tudo. Mas o filho ainda é uma criança pequena ou um menino. Que é que esse
grande homem faz? Ele nomeia empregados para olharem pela criança; paga-lhes
pelo serviço e lhes diz o que devem fazer para protegê-la de todo mal, impedir que
ela faça coisas que a machuquem, instruí-la e guiá-la. É o que os anjos fazem. Eles
estão ao redor de nós, embora não os vejamos. Que tolice, negligenciar este ensino
que as Escrituras nos dão! “Os seus anjos nos céus sempre vêem a face de meu Pai
que está nos céus”, diz o nosso Senhor acerca dos pequeninos (Mateus 18:10). É
exatamente o mesmo ensino. A razão pela qual muitas vezes ficamosem dificuldade,
pela qual ficamos desanimados e pela qual o diabo nos derrota, é que esquecemos
estas coisas. Esquecemos que a nosso favor servem ou ministram estes poderes
angélicos, estes anjos bons criados por Deus em grande parte com esse propósito.

Aí estão, pois, algumas das maneiras pelas quais devemos compreender que esta
força onipotente está operando a nosso favor. Tudo isso, até aqui, é fora de nós, ao
redor de nós, perto de nós - o anjo do Senhor “acampando-se”, os anjos ministrando,
Deus pondo em ação esse cuidado e esse poder com vistas ao nosso bem estar. Isso
faz parte do “fortalecer-se no Senhor”. Devemos compreender que é desta forma que
nos tornamos fortes, saber sempre o que está acontecendo. Devemos ter confiança no
Autor da nossa salvação, nAquele que deu início à campanha toda e cujo Filho está
envolvido em toda parte dela.

No entanto, podemos ir ainda mais longe. Este poder também está operando, não
somente ao redor de nós e perto de nós, mas em nós. E isso torna o fato mais
maravilhoso ainda. Este aspecto da questão já recebera muita atenção do apóstolo,
porém não é possível exagerar na sua

repetição. Algumas das coisas mais gloriosas das Escrituras são ditas com respeito a
esta matéria. Para começar, nunca estaríamos na vida cristã, se este poder de Deus
não tivesse começado a agir em nós. Isso é declarado explicitamente no princípio do
capítulo dois da Epístola aos Efésios: “E vos vivificou, estando vós mortos” -
mortos! -“em ofensas e pecados”. E para imprimir mais fundo a verdade neles, o
apóstolo a repete no versículo 5: “Estando nós ainda mortos em nossas
ofensas, (Ele) nos vivificou juntamente com Cristo (pela graça sois salvos)”.

Esta é a origem de tudo isso. Ninguém jamais se torna cristão, a não ser como
resultado da operação do absoluto poder de Deus em seu ser. Homem nenhum, como
é, pode decidir aceitar a Cristo, pois ele está “morto”-espiritualmente morto! E, em
acréscimo, e como conseqüência disso, como o apóstolo nos fizera lembrar no
capítulo 4, versículos 17 e 18: “Digo isto, e testifico no Senhor, para que não andeis
mais como andam também os outros gentios, na vaidade do seu sentido,
entenebrecidos no entendimento, separados da vida de Deus pela ignorância que há
neles, peladurezado seu coração”. Essas palavras descrevem o homem como é por
natureza. “A inclinação da carne é inimizade contra Deus, pois não é sujeita à lei de
Deus, nem, em verdade, o pode ser” (Romanos 8:7). O homem natural nada pode
fazer, é completamente desvalido, está espiritualmente morto. Que é que faz de nós
cristãos? Ele “nos vivificou”. Ele o fez por Seu poder, pelo poder do Espírito. O que
nos traz à salvação é que o Espírito de Deus começa a operar em nós e agir sobre
nós, para convencer-nos do pecado, para abrir os nossos olhos. Ele realiza toda
essa obra - “pela graça sois salvos”. É “o poder para a salvação”. E não haveria
esperança para ninguém, fora disso. É assim que começa em nós, pelo poder de Deus
agindo em nós e nos levando ao conhecimento da salvação.

Mas Ele não apenas começa a obra, dá-lhe continuidade. Esse é o conforto e consolo
definitivo e final. Vejam o modo como o apóstolo o expressa no capítulo primeiro.
Ele começa com esta grande verdade no capítulo primeiro de Efésios. Depois, como
em geral é seu hábito, ele interrompe a sua linhade pensamento para
exporalgumpontosubsidiário, e retoma o assunto original. É exatamente o que ele faz
nos capítulos 1 e 2 desta Epístola. De muitas maneiras, o capítulo 2 é uma espécie
de digressão com o fim de desenvolver mais elaboradamente o ponto sobre o qual
ele dera uma idéia no capítulo primeiro. O apóstolo está escrevendo a estes efésios,
e dá graças a Deus por eles. Informa-os de que está orando por eles, “para que o
Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê em seu conhecimento o
espírito de sabedoria e de

revelação; tendo iluminados osolhosdo vosso entendimento”. Para quê? “Para que
saibais qual seja a esperança da sua vocação” - qual o Seu propósito supremo
quanto a vocês -“e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos”. Olhem
para a frente, diz ele, olhem para diante, vejam o que é a Sua herança nos santos, que
também é a herança de vocês. Ademais, porém: “Equal a sobreexcelente grandezado
seu poder sobre nós, os que cremos”. Ele diz, efetivamente: estou orando para
que vocês tenham entendimento, para que vocês conheçam a sobreexcelente grandeza
deste poder de Deus que está atuando para conosco, nós que cremos - “segundo a
operação da força do seu poder”. Observem como ele põe em uso os seus adjetivos,
como ele empilha superlativo sobre superlativo, porque não há limite para a força e
o poder de Deus. Todavia ele acrescenta: o que peço em oração para vocês é que
saibam que todo este grande poder está agindo com vistas a vocês, está agindo em
vocês, está atuando para o bem de vocês, se tão-somente vocês pudessem se
dar conta disso. Pois bem, é isso que devemos pedir em oração para
nós. Necessitamos desta iluminação, deste entendimento. Se vocês simplesmente
conhecessem o propósito de Deus com respeito a vocês, e que Ele está operando em
vocês para fazer com que isso aconteça, e qual é o Seu objetivo final para vocês,
toda a sua perspectiva passaria por uma revolução.

No entanto, o apóstolo volta ao ponto no capítulo 3. Ele está orando mais uma vez
por eles. Vejam o versículo 13, que é uma introdução: “Portanto vos peço que não
desfaleçais nas minhas tribulações por vós, que são a vossa glória”. Estes efésios,
como tantos outros cristãos primitivos, corriam o grave perigo de depender demais
do apóstolo Paulo. Ele lhes havia pregado o evangelho, e eles foram convertidos sob
o seu ministério. Agora ele está na prisão, está doente, está envelhecendo,
e perguntam: que faremos, se Paulo partir? A quem poderemos escrever? De quem
receberemos ajuda e conselho? Se Paulo partir, estaremos arruinados. Eram esses os
seus sentimentos. Mas ele diz: eu “vos peço que não desfaleçais nas m inhas
tribulações por vós, que são a vossa glória. Por causa disto me ponho dejoelhos
perante o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, do qual toda a família nos céus e na terra
toma o nome, para que, segundo as riquezas da sua glória, vos conceda que sejais
corroborados com poder pelo seu Espírito no homem interior”. O poder do Espírito
no íntimo do homem! “A sobreexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que
cremos”! Este poder age no homem interior e o fortalece. Vocês não têm necessidade
de desfalecer, diz Paulo; não importa o que me aconteça, a salvação segue o seu
rumo, porque o poder é do Espírito, não

meu. Sou mero instrumento, sou apenas um pequeno servo indo aqui e ali levando a
mensagem adiante das trincheiras. Todavia quando eu partir deste mundo, Ele
continuará a Sua obra, Ele tem outros servos, Ele fará surgir outros homens. Avante!
É do poder do Senhor que vocês precisam, e vocês o têm no homem interior, e estou
orando para que vocês o tenham cada vez mais.

Depois ele volta ao seu tema no versículo 20: “Ora, àquele que é poderoso para
fazertudo mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o
poder que em nós opera”. Este poder está agindo em nós, e é medido nos seguintes
termos: “Muito mais abundantemente” (NVI e ARA: “infinitamente mais”) .
Desenvolvam vocês mesmos essas palavras! Elas implicam que Paulo chegou aos
limites extremos da linguagem. Ele gostava dos superlativos. Vocês têm que gostar,
quando falam sobre Deus; só servem os superlativos. Mas até eles são inadequados.
É inteiramente “além daquilo que pedimos ou pensamos”. Mesmo a imaginação
falha, tudo falha. O tema está acima de tudo quanto há. “Segundo o poder que em nós
opera.” Não está operando somente em torno de vocês e por perto, está operando em
vocês. No crente! “Segundo o poder que em nós opera.”

No entanto, consideremos também outras declarações que se acham noutras partes


das Escrituras, para que não retornemos a uma condição de desfalecimento e
desesperança. Já citei o capítulo 2 de Filipenses, mas voltemos aos versículos 12 e
13: “De sorte que, meus amados, assim como sempre obedecestes, não só na minha
presença, mas muito mais agora na minha ausência”. Não importava se Paulo
estava presente ou não. Eles achavam que importava; porém não era assim -“muito
mais agora na minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e
tremor. Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a
sua boa vontade”. Seu poder está operando em nós. Esse é o poder que, de repente,
quando você está fazendo algo muito diferente, faz a sua mente voltar-se para o
Senhor; esse é o poder que age em nós e nos leva a querer orar. Que é que o
faz sentir isso repentinamente? Você não sabe. Mas a resposta é-o Espírito! E dEle o
poder que está em ação em você; e está agindo em você o tempo todo. Graças a Deus
que está! Não fora isso, que desespero! Ele nos traz de volta, lembra-nos, chama-nos
para a Palavra - “Deus é o que opera
*

ARA e NVI expressam melhor a ênfase da VA e do original grego. Nota do tradutor.

em vós”. Esta energia, esta força - “a sobreexcelente grandeza do seu poder sobre
nós, os que cremos”!

Outra declaração maravilhosa dessa verdade acha-seem Colossenses 1:29. Nessa


passagem o apóstolo se descreve como pregador. “Para isto”, diz ele, “também
trabalho, combatendo segundo a sua eficácia” (ou “segundo a sua operação”, VA). O
apóstolo está combatendo, contudo o faz “segundo a sua operação”. Vocês vêem que
ele combate. Tratarei desta questão de equilíbrio mais tarde, mas agora estou
dando ênfase ao poder de Deus. “Para isto também trabalho, combatendo segundo a
sua operação, que age em mim poderosamente”, diz o apóstolo. Que é que Paulo
estava fazendo? “A quem pregamos, admoestando a todo homem, e ensinando a todo
homem em toda a sabedoria; para que apresentemos todo homem perfeito em Jesus
Cristo; e para isto (com este fim em vista) também trabalho, combatendo segundo a
sua operação, que age em mim poderosamente.” Ele estave ciente do poder que
operava nele. Não existe experiência mais elevada ou mais gloriosa do que essa.
Você se sente um mero espectador. Não é você que está agindo; você está sendo
usado. E Ele que está realizando a obra, e você é quase mero espectador.

Esta é a li nguagem que o apóstolo emprega sem pre. Escrevendo aos tessalonicenses
em sua Primeira Epístola, capítulo primeiro, versículo 5, ele diz: “O nosso
evangelho não foi a vós somente em palavras, mas também em poder, e no Espírito
Santo, e em muita certeza”. Ele sabia disso; ele estava consciente de que o Espírito
estava operando poderosa e irresistivelmente nele. E é o mesmo poder que está em
nós, que está operando em nós, e operando poderosamente.

O apóstolo João tem o mesmo ensino em sua Primeira Epístola, capítulo 4,


versículos 4-6: “Filhinhos, sois de Deus, e já os tendes vencido” (os anticristos).
Por quê? “Porque maior é o que está em vós do que o que está no mundo. Do mundo
são, por isso falam do mundo, e o mundo os ouve. Nós somos de Deus; aquele que
conhece a Deus ouve-nos; aquele que não é de Deus não nos ouve. Nisto conhecemos
nós o espírito da verdade e o espírito do erro”.

Depois, no último capítulo da Epístola de João, nosversículosl8el9, lemos:


“Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não peca” -isto é, não continua
pecando, não peca habitualmente - “mas o que de Deus é gerado conserva-se a si
mesmo” - o que as autoridades tendem a concordar que significa que é guardado por
Deus - “e o maligno não lhe toca”. O diabo pode gritar com você, pode fazer você
tremer, porém não pode tocar em você. “Sabemos que somos de Deus, e que todo
mundo

está no maligno” - em seu abraço e em suas garras. Nós não; fomos arrebatados dele.
Somos “de Deus”, e é por isso que o diabo não pode tocar em nós. Pode molestar-
nos e tentar atemorizar-nos, mas nunca poderá reconquistar-nos para o seu abraço,
pois isso é impossível. “Somos de Deus”, estamos “seguros nos braços de Jesus”,
estamos nos braços de Deus, os braços eternos estão por baixo de nós e ao redor de
nós. “Somos de Deus, e o maligno não nos toca.” Ele nunca tocará em nós; não pode
fazê-lo. Fomos retirados do seu domínio, Deus “nos tirou da potestade das trevas, e
nos transportou para o reino do Filho do seu amor” (Colossenses 1:13).

Finalmente, vejamos a questão da seguinte maneira: este poder opera em nós.


Entretanto depois o ponto é colocado doutro modo, pois toda a doutrina da Igreja
está envolvida nesta questão. Que é a Igreja? Permitam-me lembrar-lhes o ensino
desta Epístola. O apóstolo nos dá uma idéia disso no capítulo primeiro. Ele fala
deste “poder que opera em nós”; é o poder que Ele “manifestou em Cristo,
ressuscitando-o dentre os mortos, e pondo-o à sua direita nos céus, acima de todo o
principado, e poder, e potestade e domínio, e de todo o nome que se nomeia, não
só neste século mas também no vindouro; e sujeitou todas as coisas a seus pés, e
sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da igreja - isto é, onde nós entramos
- que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos”. A Igreja é o
corpo de Cristo, e a Cabeça do corpo é o próprio Cristo.

Mas vamos ver o desenvolvimento dessa verdade no capítulo 4, especialmente nos


versículos 15 e 16: “Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele
que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de
todas as juntas, segundo a justaoperaçãodecadaparte, fazoaumentodo corpo, para sua
edificação em amor”. Significa que Cristo é a Cabeça e nós somos as partes,
as partes e parcelas individuais do corpo. Todavia cada parte e parcela individual
do corpo deriva a sua energia e a sua nutrição da Cabeça. Não sou uma unidade
isolada, não estou ligado apenas mecanicamente. O sangue que dá suprimento à
cabeça vai pelo corpo até o dedo mínimo, e toda a energia e capacidade nervosa
vem da cabeça. Em última análise, estamos ligados à Cabeça e a cada um dos outros
por meio destas juntas e destes ligamentos e destes meios de comunicação. Paulo
está dizendo que o poder que está na Cabeça também está operando em todos
os membros do corpo. A energia que há em nós é a energia de Cristo, a Cabeça. Este
é o poder que opera em nós poderosamente.

Trabalhemos o tema igualmente em termos da habitação do Espírito

Santo. É por isso que no capítulo 5, versículo 18, Paulo nos diz isto: “E não vos
embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito”, de todo o
poder do bendito Espírito Santo. Em acréscimo, temos o Seu companherismo - “A
graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo”. O
Espírito está em nós: Ele “estará em vós”, diz Cristo em João, capítulo 14, aos
discípulos que estavam desconsolados por causa da Sua partida. “Enviarei
outro Consolador. Ele não somente estará convosco; estará em vós”. E assim é. Ele
está conosco e está em nós - o companherismo, a comunhão do Espírito Santo agindo
como um poder dentro de nós. Além disso, como Paulo diz em Romanos, capítulo 8,
versículos 25, 26 e 27, “o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos
inexprimíveis”. Quando nos sentimos tão duramente oprimidos que não sabemos
pelo que orar como devíamos, “o mesmo Espírito intercede por nós com
gemidos inexprimíveis”. Ele estimulaaoração, fazendo-nos pôr para fora
alguma petição, nem sempre entendendo bem o que estamos dizendo. Mas é Ele que
o está fazendo, é Ele que está agindo em nós.

Este poder do Senhor não está somente em volta de nós e por perto, e não está
apenas cuidando de nós e fazendo planos a nosso favor, porém também está em nós.
“A sobreexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos.” Estamos
lutando, não “contra a carne e o sangue, mas sim, contra os principados, contra as
potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais
da maldade, nos lugares celestiais”; estamos lutando e tendo que resistir ao
diabo. Portanto, fortaleçamo-nos “no Senhor e na força do seu poder”. Lembremo-
nos da força e energia que estão agindo em nós, e lembremo-nos de que esse poder é
invencível porque é do Senhor. Que venham o diabo e os seus poderes, nós podemos
“Resistir pelo Seu grande poder, de Sua força grandiosa revestidos”.

QUEM COMBATE?

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” -


Efésios 6:10

Chegamos agora ao que de muitas maneiras é o ponto crucial desta discussão toda, a
saber, à pergunta prática: como é que isso tudo se relaciona conosco na prática, nas
nossas necessidades diárias, em nossa constante guerra contra o mundo, a carne e o
diabo? Esta é a questão que perturba a muitos - como é que esta exortação do
apóstolo deve ser interpretada com precisão e em detalhe?

Aqui, desafortunadamente, tenho que começar com uma negativa, porque é mais que
evidente, por certo, que numa questão de vital importância como esta, com toda a
probabilidade o inimigo está particularmente desejoso de causar confusão. E ele tem
causado confusão, grande confusão; e no presente há muitos que estão em grande
confusão e perplexidade.

Há um ensino popular- faz cerca de noventa anos que ele é popular -que diz que a
grande dificuldade com a maioria de nós na vida cristã é que lutamos e lutamos
tanto, e aí estão o nosso erro e a grande causa do nosso fracasso. Perguntam os que
assim ensinam: “Por que é que as pessoas não dão ouvidos à exortação do apóstolo?
Ele diz: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”. Significa”, dizem eles,
“que tudo o que nós temos de fazer é “Deixar correr e deixar que Deus o faça por
nós”. Essa é a frase que de muitos modos resume o ensino que tem sido tão popular.

Outra maneira que eles têm de expressar isso é a frase que tem sido repetida
constantemente: “Transfira isso para o Senhor”. “O combate não é seu, é do Senhor;
transfira-o para Ele.” Outra coisa que se diz é: “Deixe que Ele o faça por você; é
isso que Ele está Se oferecendo para fazer”. Dizem tais mestres que não há
necessidade de luta nenhuma; que o nosso erro é que ficamos lutando e pelejando;
mas isso é completamente desnecessário. Não há necessidade de lutar, não há
necessidade de sentir dificuldade alguma.

Eis ainda outra frase: “É muito simples”. Tudo o que você tem que fazer é parar de
combater e deixar tudo isso de lado. E esses mestres usam muitas ilustrações com o
fim de mostrar o que eles querem dizer. Aqui vai

uma, por exemplo, que é muito popular. Dizem eles que o cristão é como um homem
numa sala. Fora, na rua, o sol brilha, mas a sala está obscura. Isso porque as janelas
estão cerradas, e aí está o homem andando às apalpadelas, procurando por onde
andar na sala, tentando achar coisas. Não consegue vê-las. Que tragédia! Há todo
aquele sol brilhando lá fora, porém aqui está um homem na semi-escuridão, com
dificuldade e confusão. Que é que ele deve fazer? Bem, dizem eles, é tão simples,
tudo o que ele tem que fazer é abrir as janelas e deixar entrar a luz do sol, e os seus
problemas desaparecerão. Muito simples! Por que continuar pelejando?

Evidentemente nós temos que dar atenção a esse ensino, porque ele se nos apresenta
como uma exposição do texto deque estamos tratando. É-nos dito que primeiro
precisamos de uma espécie de crise em nossas vidas. O cristão derrotado tem que
chegar a um ponto crítico no qual ele esteja pronto a admitir e confessar sua derrota.
Não há esperança para ele enquanto não faz isso - e aqui estamos inteiramente de
acordo! Depois, dizem eles, tendo se dado conta da sua derrota e a tendo confessado,
ele tem que chegar a esta questão crucial: está ele disposto a render-se, entregando-
se e entregando o combate inteiramente ao Senhor? Está ele disposto a render-se,
está ele disposto a submeter-se, a desistir completa e absolutamente? Se ele estiver,
dizem eles, ele passará por uma crise na qual perderá todo senso de luta e tensão, e
daí em d iante ele entrará num processo. O processo dá no seguinte: tendo passado
por essa experiência crítica, tudo que este homem tem que fazer agora é continuar
“permanecendo no Senhor”. Isso, para eles, significa que ele tem que continuar
recusando-se a lutar e a combater, deixando isso inteiramente com o Senhor; então o
Senhor vencerá o combate para ele. O cristão não tem que fazer nada, senão
“permanecer em Cristo”; ele mesmo não precisa lutar; isto será feito inteiramente
por Deus em lugar dele.

Pois bem, este é o ensino conhecido e popular. Além disso, é apresentado como algo
que pode ser feito imediatamente numa reunião. Assim, muitas vezes as pessoas são
convidadas a ir para a frente, a tomar uma decisão, a decidir-se a aceitar esta oferta
de vitória. Ou são chamadas para ir para a frente ou a erguer as mãos numa reunião,
e lhes é dito que tudo isso pode acontecer nessa experiência crítica. Depois
elas devem prosseguir com o processo de permanecer no Senhor, e verão que toda a
sua vida será inteiramente diferente. A pressão e a tensão terão desaparecido, não
haverá mais “luta”; será uma vida de vitória, mas com a condição de que continuem
permanecendo no Senhor.

Mu iíos cristãos estão tentando fazer isso, estão tentando render-se, estão tentando
dispor-se a render-se, tentando estar “dispostos a ficar dispostos”, como diz a frase
na seqüência, e assim eles podem passar meses e anos na tentativade fazer aquilo
que lhes é recomendado. Outros alegam que já fizeram isso e que, em conseqüência,
vêem que a vida se lhes tornou muito simples, pois tudo o que eles precisam fazer é
continuar olhando para o Senhor e permanecendo nEle; e acham que o
Senhor enfrenta as lutas por eles.

É óbvio que este ensino exige séria e zelosa atenção. Há certas considerações,
sugiro, que mostram que este ensino é contrário ao claro ensino das Escrituras, e
esse é o primeiro teste que devemos aplicar. Quero dizer, por exemplo, que, se este
ensino fosse correto, a segunda coisa que o apóstolo diz que o cristão deve fazer
seria desnecessário, a saber, “Revesti-vos de toda a armadura de Deus”. Ele repete
a exortação no versículo 13: “Portanto, tomai toda a armadura de Deus”, e depois
passa a falar das peças e partes da armadura, uma por uma, para que saibamos usá-
las. O meu argumento é que, se o Senhor faz tudo por nós e não temos que fazer nada,
a não ser permanecer nEle e olhar para Ele, é desnecessário dizer-nos que vistamos
esta armadura. Não obstante, é óbvio quetemos que usar e empregara armadura.
Assim, aquele ensino errôneo elimina de imediato aquilo que o apóstolo junta à
exortação a “fortalecer-nos no Senhor e na força do seu poder”.

Ora, essa é apenas uma das muitas objeções. Vejam a questão da segu inte maneira:
se o ensino que diz que não temos que fazer nada fosse certo, e que o nosso erro é
ficar fazendo coisas demais; que apenas temos que transferir tudo para o Senhor,
“deixar correr e deixar com Deus”, que Ele combata os nossos combates por nós e
assim nós mesmos não os combatemos - se isso fosse verdade, digo eu, julgo que
todas as exortações das Escrituras, particularmente das Epístolas, não
somente seriam desnecessárias, mas também seriam de fato errôneas.

Quais são essas exortações? Eis uma delas, por exemplo, na Epístola de Tiago,
capítulo 4, versículo 7: “Resisti ao diabo, e ele fugirá de vós”. Vocês têm que
resistir a ele. É uma exortação a que resistamos ao diabo. Tiago não nos diz que não
devemos resistir ao diabo, que tudo o que temos de fazer é olhar para o Senhor e Ele
resistirá ao diabo por nós. Pelo contrário, Tiago nos diz que resistamos ao diabo, e
ele fugirá de nós. É uma exortação a que façamos algo. Vejam depois um paralelo na
Primeira Epístola de Pedro, capítulo cinco, onde é feita uma declaração
específica. “Sede sóbrios; vigiai” - tendes que ser vigilantes - “porque o
diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a

quem possa tragar; ao qual resisti firmes na fé, sabendo que as mesmas aflições se
cumprem entre os vossos irmãos no mundo” (1 Pedro 5:8-9). Essa é uma exortação
no sentido de que resistamos “firmes na fé”. Temos aí duas exortações, sem ir mais
longe, que nos vêm dizer que temos de ser vigi lantes e estar atentos, e que temos de
resistir ao d iabo. Elas nos concitam a fazer isso com todo o empenho e energia para
podermos dominarasituação.

Mas há muitas outras. Vejam o que o apóstolo Paulo escreve em Romanos 8:13 sobre
tentações da carne e que vêm do íntimo, usadas e fomentadas pelo diabo. Diz Paulo:
“Porque, se vi verdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo Espírito
mortificardes as obras do corpo, vivereis”. Notem que vocês têm de fazer isso;
vocês o fazem “pelo Espírito”, “por meio do Espírito”. Não é feito por outrem em
seu lugar. O ensino não é, “Deixem isso com o Senhor, olhem para Ele, dêem de
mão”, porém, “Se pelo Espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis”. Em
Filipenses 2:12 temos exatamente o mesmo ensino: “Operai a vossa salvação
com temor e tremor”. Não, “Transferi isso para o Senhor”, “Operai (-o)!” Eu e vocês
devemos operar a nossa salvação com temor e tremor, Esta é uma exortação dirigida
ao povo cristão.

Não causa surpresa, portanto, que as pessoas estejam num estado de confusão. Vejam
também as exortações feitas a Timóteo na Segunda Epístola de Paulo escrita a ele.
Há uma série delas. Tendo começado dizendo aTimóteo: “Fortifica-te na graça que
há em Cristo Jesus”, Paulo prossegue e lhe dá instruções pormenorizadas como,
“Evita falatórios profanos”, “Se alguém se purificar destas coisas” - ele tem que
fazê-lo, não o farão por ele-“será vaso para honra, santificado e idôneo para uso do
Senhor”. “Foge também das paixões da mocidade.” Ele não diz: “Passe por esta
crise de rendição, entregue-se a Cristo e olhe para Ele, Ele fará o combate em seu
lugar”. O que o apóstolo diz é: “Saia de perto depressa, fuja das paixões da
mocidade, não faça provisão para a carne! ” Tudo o que ele diz com relação a este
assunto é também uma exortação dirigida a nós. Ele disse ao jovem Timóteo
precisamente a mesma coisa em suaPrimeira Epístola, nocapítulo 6, com instruções
minuciosas: “Mas tu, ó homem de Deus, foge destas coisas (malignas), e segue a
justiça, a piedade, a fé, o amor, a paciência, a mansidão”.

Temos aí apenas uma seleção feita ao acaso. As Epístolas estão repletas desta
espécie de ensino. Elas se dirigem a homens que haviam sido mentirosos habituais.
Acaso dizem elas: “Agoraolhem aqui, amigos, não combatam mais essa tendênciade
mentir; deixem isso com o Senhor, Ele arrancará isso de vocês, Ele o fará para
vocês, tudo o que vocês têm

de fazer é olhar para Ele e permanecer nEle”? Não, o que o apóstolo diz atais
homens é que não mintam mais, que é preciso que não façam mais isso. Aqui está um
homem perturbado pela tentação para roubar, pela tendência para o roubo. Isso
parece estar nele e fazer parte dele. Que precisa fazer? Dar de mão? Não, “Aquele
que furtava, não furte mais; antes trabalhe, fazendo com as mãos o que é bom, para
que tenha (o) que repartir com o que tiver necessidade” (Efésios 4:28). Depois,
“Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, mas só a que for boa para
promover a edificação” (versículo 29). Não deixe de lado, você tem que dominar-se,
tem que fazer isso. “Não entristeçais o Espírito Santo de Deus... andai em amor,
como também Cristo vos amou e se entregou a si mesmo por nós... Mas a
prostituição, e toda a impureza ou avareza, nem ainda se nomeie entre vós, como
convém a santos; nem torpezas, nem parvoíces, nem chocarrices, que não convêm;
mas antes ações de graças” (Efésios 4:30a5:5).

Aí estão algumas das instruções pormenorizadas. Entretanto, acima de tudo, o ensino


a que me refiro não somente torna estas exortações desnecessárias, e na verdade
errôneas, mas isto se aplica particularmente ao q ue podemos denom inar metáforas e
sím i les m i 1 itares uti 1 izados pelos apóstolos para nos levarem a fazer as coisas
que eles insistem conosco que façamos. Vocês notaram a freqüência com que eles
fazem uso dessas imagens militares? Vê-se isto no texto que estamos estudando.
O apóstolo fala em “estar firmes” e “resistir”. Diz ele: “Revesti-vos de toda a
armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo”.
Depois ele emprega o termo “lutar”. Termo de aplicação militar. “Não temos que
lutar contra a carne e o sangue.” Eu e vocês temos que lutar, temos que estar
ativamente envolvidos neste conflito. Nenhuma palavra sobre “dar de mão”, porém
um austero lembretede que estamos envolvidos nisto! Outra vez ele usa a
expressão “estar firmes”. Em 1 Coríntios 16:13 ele diz: “Vigiai”-ficai em guarda -
“estai firmes na fé; portai-vos varonilmente, e fortalecei-vos”. Essa é a típica
exortação do Novo Testamento. A seguir vejam 2 Coríntios 10:3, onde lemos:
“Andando nacarne, não militamos segundo a carne. Porque as armas da nossa milícia
não são carnais, mas sim poderosas em Deus para destruição das fortalezas”. A
guerra é nossa, e temos que travá-la desta maneira particular. Não é só na carne que
temos de fazê-lo; todavia o oposto disso não é dizer a você que não faça nada, que
simplesmente dê de mão.

Examinemos atentamente estas expressões militares. Já me referi a uma delas, em 1


Timóteo 6:12: “Milita a boa mi lícia da fé”. O apóstolo

está exortando Timóteo. Timóteo tem que “militar”, combater. O problema de


Timóteo eraque ele perdia aesperança com muita facil idade; ficava desanimado,
achava-se fraco e achava que não poderia prosseguir. Inclinava-se a pedir a Paulo
que viesse ajudá-lo, e aencostar-se em Paulo. Mas Paulo lhe escreve de volta:
“Militaa boa milícia da fé”. Junte as suas forças e vá para frente, diz o apóstolo.
“Fortifica-te... Sofre, pois, comigo, as aflições como bom soldado de Jesus Cristo.”
Essa é a figura. “Ninguém que milita se embaraça com negócios desta vida, a fim
de agradar aquele que o alistou para a guerra” (2 Timóteo 2:1,3,4). Todo o quadro é
apresentado em termos militares. Somos combatentes, somos soldados do exército
do Deus vivo; e não nos cabe “dar de mão a tudo”. Temos que desempenhar nossa
parte, combater nossos combates, como participantes numa grande batalha. Assim é
que as exortações nos vêm nesta forma militar.

No entanto, não somente isso. Este ensino errôneo, ao que me parece, é


completamente incoerente com o que o grande apóstolo diz sobre si mesmo e sobre
sua vida. Ouçam-no em 1 Coríntios 9:26 e 27: “Pois eu assim corro”. Ele nos está
falando do modo como ele toma parte nesta peleja. Ele usa a ilustração de certo
número de homens participando de uma corrida, de uma maratona, se vocês
quiserem, nos Jogos Olímpicos, em que correm diversos competidores. O ponto é
que eles estão correndo, não são espectadores sentados e observando algo que está
sendo feito diante deles; não são como as grandes multidões que se assentam e ficam
assistindo à corrida de outros. Não é essa a figura descritiva do cristianismo. O
próprio Paulo está correndo, e assim é desta maneira que ele coloca a questão: “Pois
eu assim corro, não como a coisa incerta; assim combato, não como batendo no ar”.
Agora ele passa a usar a figura de um homem lutando boxe. Esta interpretação não é
minha; há comentadores que concordam nisso. Ele toma uma ilustração de ringue de
boxe; ele próprio está no ringue e está enfrentando um boxeador antagonista. Ele está
fazendo isso; isso não está sendo feito no lugar dele por outra pessoa. Ele não está
vendo alguém que no ringue está lutando por ele; ele mesmo está no ringue. “Assim
combato, não como batendo no ar.” Ele quer esmurrar o seu antagonista, quer golpear
o homem, não o ar. E ele afirma que não faz isso com incerteza. “Antes subjugo o
meu corpo”, o que, traduzindo-se corretamente, significa: “Eu esmurro a
mim mesmo, ao meu próprio corpo, até eu ficar com manchas pretas e azuis. Golpeio
o meu corpo, subjugo o meu corpo”. Ele está fazendo isso consigo mesmo, e não é
fácil. Uma luta está envolvida aí. Ele não está dizendo a si próprio: “Bem, agora,
tenho todos estes problemas dentro de mim, na

carne, e eles se levantam e me tentam e me derrubam... Ah, vejo que só há uma coisa
a fazer, não preciso continuar lutando contra estas coisas, tudo o que eu tenho de
fazer é render-me, passá-las às mãos do Senhor e deixar que Ele o faça por mim”.
Não, não! “Subjugo o meu corpo, e o reduzo à servidão.” Não somente o mantém
subjugado, mas exerce domínio sobre ele-“e o reduzo à servidão, para que, pregando
aos outros, eu mesmo não venha d’alguma maneira a ficar reprovado”. Essa é
a linguagem que o apóstolo Paulo emprega a respeito de si próprio.

Contudo, há algo mais. Em Filipenses, capítulo 3, nós temos as conhecidas palavras:


“Não que já a tenha alcançado”-ele não chegou ao fun da jornada. Há certas coisas
que ele está vendo adiante - “Para conhece-lo, e à virtude da sua ressurreição, e à
comunicação de suas aflições... para ver se de alguma maneira posso chegar à
ressurreição dos mortos. Não que já a tenha alcançado, ou que seja perfeito”. Que é
que ele faz então? “Prossigo para...”. E então ele continua dizendo: “Mas uma coisa
faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que
estão diante de mim, prossigo para o alvo”. Essa é a figura; ele está se esforçando o
máximo que pode para chegar ao alvo - “pelo prêmio da soberana vocação de Deus
em Cristo Jesus” (Filipenses 3:10-14). Depois ele introduz uma palavra de
exortação no versículo 16: “Mas”, diz ele, “naquilo a que já chegamos,
andemos segundo a mesma regra, e sintamos o mesmo”. Olhem para mim, diz
ele, sou o seu líder, sigam-me nesta questão. “Tenhamos o mesmo pensamento”, diz
ele, “andemos segundo a mesma regra, e sintamos o mesmo.”
Vejam então o apóstolo no fim da sua vida. Ele está encarando a morte, está
escrevendo a sua última carta, a Segunda Epístola a Timóteo. Ele olha para tudo
aquilo porque passou, e eis o que diz: “Combati o bom combate”. Mas, de acordo
com o ensino do qual estamos fazendo uma apreciação, ele não devia ter combatido.
Devia ter dito: “O Senhor sempre me deu a vitória, e eu nada fiz. O Senhor sempre
me sustentou, combateu os meus combates, manteve-me em paz; eu
simplesmente descansei nEle, fiquei olhando para Ele, e tudo correu bem”. Não é o
que ele diz. Ele diz: “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a
fé”. Notem como o apóstolo fala de si abrangendo todos os estágios da sua
vida cristã. Ele teve a espécie de vida à qual exortou todos aqueles
cristãos primitivos, e em cada caso ele os chama para lutarem, para combaterem e
para prosseguirem rumo ao alvo, e para se esforçarem.

Além disso, a lógica final do ensino errôneo é, certamente, que, embora ele pareça
maravilhoso, como se tudo estivesse sendo feito por

outrem a nosso favor, no fim deixa tudo conosco, porque o ponto crucial é a nossa
atitude de “dar de mão” e de “permanecer” naquela posição. Os que defendem
aquele ensino são compelidos a falar desse modo por esta razão: aí está um ensino
que nos diz que devemos “deixar correr e deixar com Deus”, e que nos diz, “transfira
tudo para o Senhor”, e depois... ah, sim, porém de repente você se vê caindo em
pecado e diz: “Como pode estar acontecendo isto comigo? O Senhor me deixou
cair? Eu passei tudo para Ele; vocês me disseram que Ele combateria os combates.
Mas eu caí em pecado. O Senhor falhou? O Senhor deixou que eu caísse?”
Naturalmente eles terão que dizer logo: “Não, você não deve dizer isso; o Senhor
não pode falhar jamais”. Pois bem, você pergunta: “Então, como foi que eu falhei?”
“Ah”, dizem eles, “Você não permaneceu no Senhor.” Portanto, o que importa, em
última instância, é o que você faz. É a sua permanência nEle que realmente importa,
pois, no momento em que você falha nisso ou deixa de fazê-lo, você cai. Você não
está sendo guardado; você tem que guardar-se no Senhor, tem que guardar-se
permanecendo nessa posição. Tudo acaba retornando a você; você é deixado onde
estava no princípio, o que é certamente algo muito grave.

Aí está, pois, um ensino contraditório e que aparentemente tira das suas mãos a
responsabi lidade, entretanto no fim deixa tudo em suas mãos. Tudo depende de você
manter esta posição de rendição. Ademais, sempre me parece que aí há uma
incipiente negação da doutrina do novo nascimento. Sei que os amigos que sustentam
o falso ensino de que estamos tratando crêem no novo nascimento, mas eles são
incoerentes nesse ponto. Não vêem que, em seu ensino, virtualmente negam a
doutrina do novo nascimento, e da segu inte maneira: a doutrina ensina que, no
novo nascimento, o homem recebe uma nova disposição, que um novo princípio de
vida é posto nele, um princípio que não havia nele antes. “Se alguém está em Cristo,
novo criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2 Coríntios
5:17). Antes da conversão o homem está “morto em ofensas e pecados”,
completamente “sem forças”. O apóstolo estivera lembrando aos efésios esta
verdade. “E digo isto, e testifico no Senhor, para que não andeis mais como andam
também os gentios, na vaidade do seu sentido.” Diz o apóstolo que eles eram
como os outros, mas que agora não estão mais naquelas condições. Ele
continua: “Mas vós não aprendestes assim a Cristo, se é que o tendes ou vido, e
nele fostes ensinados, como está a verdade em Jesus; que, quanto ao trato passado,
vos despojeis do velho homem, que se corrompe pelas concupis-cências do engano;
e vos renoveis no espírito do vosso sentido; e vos

revistais do novo homem” (4:17-24).

Antes de ser convertido, o homem é somente “o velho homem”, não tem nada senão
uma natureza carnal, pecaminosa, má. Mas o novo nascimento significa que um novo
homem veio à existência, e o novo homem é alguém “que segundo Deus é criado em
verdadeira justiça e santidade”. O cristão não é como antes; há nele o princípio de
uma nova vida, o qual é justo, santo e opera nessa direção. Há um novo poder
nele. O apóstolo diz exatamente a mesma coisa no capítulo próximo
seguinte: “Noutro tempo éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor; andai
como filhos da luz” (5:8). Este é um ensino vital e fundamental. No entanto,
de acordo com aquele outro ensino, permanecemos sempre a mesma coisa; não há
força, não há bem algum em nós, e tudo o que temos de fazer é confiar no Senhor.

Talvez vocês se lembrem da ilustração acerca de um atiçador de chamas, ilustração


usada por um dos famosos mestres desta doutrina da passividade. Olhem o atiçador,
ele costumava dizer. Que é que vocês vêem? Bem, ele está escuro, rijo e frio. Agora
ponham-no no fogo. Que acontece? Estava frio, fica quente; estava escuro, fica
vermelho; estava rijo, fica maleável, e a gente pode arqueá-lo. Sim, mas só enquanto
for mantido nas chamas! Tirem-no dali, diz a ilustração, e ele retoma a condição
anterior, voltando a estar frio, escuro e rijo.

Ora, esse ensino é certamente uma negação da doutrina do novo nascimento. Não há
verdade nele, no que se refere ao cristão. O cristão tem o princípio de uma nova
vida, e nessa nova vida há poder, porque é um princípio dejustiça e de verdadeira
santidade. Não somente isso, é algo que pode crescer, pode desenvolver-se. Todavia
o outro ensino não dá lugar a isso. Tirem o atiçador do fogo, e ele volta a ser
exatamente o que era antes.

Sem faltar com a verdade, a mesma coisa se pode dizer doutra ilustração, sobre os
flutuadores ou o salva-vidas que você pode usar para manter-se na superfície da
água. Enquanto estiver usando os flutuadores, você flutuará; desfaça-se deles, porém,
e você afundará. Aqui não resta espaço, não há lugar para crescimento ou desenvolv
imento ou progresso; ao passo que nas Escrituras, de acordo com adoutrina do novo
nascimento, devemos crescer. Nascemos como bebês em Cristo, e depois
nos tornamos crianças, depois jovens e depois pais. “Crescei na graça e
no conhecimento do Senhor.” Obviamente! Há uma nova vida aqui, e a vida é algo
que cresce. Não devo falar, quanto a mim, que estou em tão completa desesperança
que não há nada que eu possa fazer, exceto confiar no Senhor e em Sua força. E,
como espero mostrar, o que a força

do Senhor faz é alimentar esta nova vida que há em mim, e torná-la cada vez mais
forte. Assim, parece-me que, nesse ponto, embora os nossos amigos certamente
creiam na doutrina da regeneração, neste aspecto particular do seu ensino pesa sobre
eles a culpa de virtualmente a negarem.

Sobretudo, este ensinoéinteiramentediversodetodooensino bíblico concernente à


santificação, visto ser ele passivo. O ensino bíblico não é passivo. Dei alguns
exemplos que provam que ele é sempre muito ativo. A Bíblia não conteria e não
poderia conter exortações, se ensinasse passividade. Mas ela está repleta de
exortações, apelos, argumentos, demonstrações e arrazoados. Como já assinalei, as
Epístolas do Novo Testamento jamais teriam sido necessárias, se o outro ensino
fosse certo. Tudo o que os apóstolos teriam que dizer seria isto: “Pois bem, você
foi convertido, foi salvo, foi justificado. Esse é o passo número um. Agora só há uma
coisa para você fazer: passe tudo às mãos do Senhor, Ele o guardará, Ele fará tudo o
que você necessitar. Não faça nada, não lute nem peleje, transfira tudo para o Senhor,
deixe correr e deixe com Deus”. As Epístolas do Novo Testamento, com todos os
seus argumentos, arrazoados e refutações do erro, com todas as suas exortações e
apelos, seriam inteiramente desnecessárias. Só uma coisa elas teriam para dizer; e,
naturalmente, é aquilo que os nossos amigos dizem: “Você se converteu, muito bem,
dê o próximo passo, e você receberá esta outra bênção. Isso é tudo o que lhe cabe
fazer - e é “muito simples”.

Ora, segundo a Bíblia, não é “muito simples”. Estas Epístolas não são muito simples.
E não são muito simples porque a vida não é simples, porque o diabo não é simples
e porque a vida cristã não é simples. Esse outro ensino é demasiado passivo. Não
somente isso, é demasiado mecânico. Não há nada que seja mecânico no ensino
bíblico; este trata com a vida, com crescimento, alimentação e energia. Os outros
dão de mão, deixam correr, isso é tudo, e ficam nisso. Não, isso é mecânica, não é
vida - o homem não é um atiçador de chamas!

Mas, outra objeção importante àquele ensino é que ele é um atalho. Não há atalho na
vida espiritual - jamais! Essa é sempre uma característica das seitas. Todas as seitas
que estão atraindo muita gente hoje oferecem atalhos. Esse é o segredo delas. Elas
dizem: “É muito simples; esses pregadores fazem você passar por todas essas
Epístolas, por toda essa teologia, doutrina, argumentação e dificuldade. Não dê
ouvidos a eles. Simplesmente creiam neste ensino que lhe oferecemos, etudo
estará bem com você; não importa como você era quando entrou em contato conosco;
você pode sair sem problemas e sem d ificuldades. Você andará

nas nuvens. É tudo muito simples”. É esse o ensino característico das seitas; porém,
não é o ensino das Escrituras - nunca!

Aquele ensino errôneo também compartilha outra coisa que caracteriza as seitas,
muitas das quais tiveram o seu início no século dezenove, como aconteceu com este
ensino errôneo em particular. Dizem elas: “Que tragédia, que durante todos esses
séculos as pessoas não tiveram este ensino! Vejam os santos, leiam sobre suas vidas.
Vejam-nos jejuando, suando e agonizando em oração. Que tragédia, que pena,
que não tenham captado a verdade deste ensino essencialmente simples”! Leiam a
sra. Pearsall Smith sobre O Segredo de Uma Vidci Feliz Para o Cristão (The
Christian's Secret of a Happy Life), e verão que ela diz justamente isso. Leiam um
livro parecidocom aquele, o livro intitulado Tão Grande Salvação (So Great
Salvation), e verão a mesma coisa ali. Diz ele: “Não seria extraordinário que
através de todos esses séculos as pessoas ficaram sem isto? Afinal o descobriram no
século passado; nunca o conheceram antes. Repentinamente a solução simples foi
encontrada”. Todas as seitas dizem exatamente isso, e o meu argumento é que isso
é, em si, uma prova deque este ensino é errado. T odos os chamados “pais”, da
Patrística, todos os reformadores protestantes, todos os poderosos homens de Deus,
que conheciam a Deus de maneira tão íntima, que realizaram façanhas por Ele e que
Ele usou tão poderosamente-a nós é solicitado que acreditemos que todos eles
omitiram o ensino crucial, que eles tinham seguido um caminho errado, que eles
entenderam mal as Escrituras. Certamente isso, já por si, basta para fazer-nos
rejeitar o ensino em foco. Está 1 igada a ele uma arrogância que em si proclama
que ele não é uma fiel exposição das Escrituras. Falo forte assim porque
estou falando da própria reivindicação que o referido ensino faz a seu favor.

O argumento final que os protagonistas deste ensino geralmente apresentam neste


ponto é: “Diga você o que quiser deste ensino, ele funciona. Estive lutando em vão
todos esses anos, e então encontrei este ensino. Acreditei nele, e tive alívio
imediato. Ele funciona, funciona mesmo! Que é que você diz disso?” Respondo que é
isso que todos os seguidores das seitas dizem. “Mas, como você explica isso?”,
alguém pergunta. Não há dificuldade nenhuma. Todas estas seitas e estes
ensinos psicológicos apresentam resultados. E óbvio que não teriam sucesso nem por
um dia, se não os apresentassem. As pessoas não correriam atrás deles, não
comprariam os seus livros e não freqüentariam as suas reuniões, se eles não fizessem
nada. E claro que eles produzem certos resultados. Somos criaturas estranhas,
podemos persuadir-nos de muitas coisas. Há muitas maneiras de conseguir
libertação e al ívio temporários.

A Ciência Cristã, por exemplo, torna muita gente feliz, porém isso está longe de
provar que a Ciência Cristã é verdadeira. Não se prova um ensino unicamente por
seus resultados; é preciso prová-lo pelas Escrituras. Se você vai atrás de uma
argumentação que funciona, que fez algo por você, bem, então lhe pergunto: que
argumento você apresentará ao seguidor das seitas? Você não terá resposta alguma.
Elas podem repetir tudo o que você diz. Podem autorizar-me a dizer: “Eu costumava
ser um guerreiro terrível, tudo era uma carga para mim, não conseguia 1 i vrar-me
disso, não podia dormir de noite. Afortunadamente, um diz um amigo me
disse: “Venha comigo à reunião da Ciência Cristã”. Atendi e fui, cheio
de inquietações, ansiedade e preocupações; mas quando saí de lá, todas elas tinham
desaparecido. Depois disso, nunca mais tive aborrecimento”. As seitas dizem coisas
como essas, e falam a verdade.

Mas a pergunta vital é: como se fez issc? A prova nunca é somente a prova dos
resultados. A prova primordial que se deve aplicar a todo e qualquer ensino é a que
estivemos aplicando; é a prova das Escrituras. “Que é que diz a Palavra de Deus?”
O meu desejo não deve ser primariamente o desejo de ser feliz, e sim o de ser santo;
deve ser o de conformar-me às Escrituras, deve ser o de fazer o que Deus me
chamou para fazer e manda que eu faça. Não há atalho nenhum na vida cristã. Você
pode rejeitar à primeira vista qualquer ensino que lhe diga que é muito simples. Não
é. “Não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas sim, contra os principados,
contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes
espirituais da maldade, nos lugares celestiais.” Que devemos fazer, então? Bem,
vocês precisam “fortalacer-se no Senhor e na força do seu poder”; vocês
precisam “revestir-se de toda a armadura de Deus” e cuidar de cada
parte componente; vocês precisam lutar e continuar lutando, de modo que no fim da
sua vida possam dizer com o grande apóstolo Paulo: “Combati o bom combate,
acabei a carreira, guardei a fé. Desde agora, a coroa da justiça me está guardada”. A
coroa de um vencedor! O Novo Testamento usa essa linguagem. Eu e vocês é que
temos de combater.

Até aqui fomos quase inteiramente negativos. Muitos há que não darão ouvidos a
nenhum outro ensino porque acreditam no ensino que estivemos analisandoe
rejeitando. Temosque livrar-nos disso primeiro, e depois poderemos dar atenção ao
ensino das Escrituras, ao ensino positivo, que nos mostra como lutar e combater, e
como capacitar-nos a fazê-lo. Não somos nós que o fazemos, mas somos habilitados
a fazê-lo. “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.”
4

O MORAL

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. " -
Efésios 6:10

Tendo visto o erro de qualquer sugestão de passividade em nossa interpretação


destas exortações e que a nossa atividade está envolvida, fica-nos este problema:
como conciliar a nossa atividade com esta declaração de que devemos “fortalecer-
nos no Senhor e na forçado seu poder”? Como se pode harmonizar estas declarações
que à superfície parecem incompatíveis?

Certamente a resposta é que, embora a atividade seja nossa, o Senhor é que nos
provê do poder para exercê-la. Paulo não nos diz que não façamos nada. Na verdade
ele nos diz que nos esforcemos quanto pudermos, mas diz também que o poder que
nos é dado para fazê-lo é do Senhor e do Senhor provém, e que devemos aprender
mais e mais a confiar nesse poder.

Começo, pois, com uma preposição-que estas duas coisas sempre devem ser
tomadas juntas. Não é que eu não faço nada e Ele faz tudo. Não é, como outros se
inclinam a dizer, que eu faço tudo. Não é, como outros se inclinam a dizer, que eu
faço tudo e só peço um pouco de ajuda e encorajamento. Não é nenhuma dessas
alternativas. Há uma perfeita combinação do poder do Senhor e da minha atividade.
A atividade é minha, no poder e pelo poder que Ele me dá.

Permitam-me aduzir algumas passagens das Escrituras que provam isso, e que
mostram claramente as relações existentes entre as duas coisas - a minha atividade e
o Seu poder. Há certas expressões empregadas nas Escrituras que mostram a perfeita
combinação das duas, e como as duas se juntam. Vejam, por exemplo, as palavras de
Hebreus 2:18. Neste capítulo dois o autor explica como o Senhor Jesus Cristo,
visto ser Ele o Capitão da nossa salvação, assumiu a natureza humana. Visto que os
filhos são de carne e sangue, “também ele participou das mesmas coisas”. E em
acréscimo a isso, tendo vindo como homem, na semelhança de carne pecaminosa,
Eleestavasujeitoatentações. Eé dada a razão para isso: “Porque naquilo que ele
mesmo, sendo tentado, padeceu, pode socorrer aos que são tentados”. Ele não tira
deles o combate. Não lhes

d iz que transfiram tudo para Ele, que, uma vez que passou por tudo aqui lo, Ele
combaterá os combates deles por eles. Antes, o que se diz é que Ele pode socorrê-
los. Ele os ajuda. Não os toma completamente das suas mãos de modo que eles não
precisem fazer nada, exceto “permanecer" e colher os frutos da Sua vitória. Pelo
contrário, Ele, tendo passado por toda aquela experiência, e tendo sido aperfeiçoado
por meio daqui lo que sofreu, agora está em condição de socorrer-nos, ajudar-nos e
auxiliar-nos. Ele pode dar-nos suporte, pode segurar-nos, nós que ainda estamos
sendo tentados. A palavra “socorrer” é em si suficiente para mostrar a verdadeira
expl icação do texto que estamos considerando. Ambos vêm juntos. Estamos
envolvidos neste combate contrao diabo, e o Senhor vem socorrer-nos em razão do
que Ele mesmo experimentou. Os Seus sofrimentos fizeram parte da Sua preparação
para esta obra. Ele foi designado para ser um fiel sumo sacerdote, não somente para
nos representar perante Deus, como também para nos ajudar aqui na terra. E dessa
maneira nos é dito que Ele nos “socorre”; não, porém, que Ele faz tudo em nosso
lugar. Não damos de mão; combatemos, e Ele nos socorre, Ele vem em nosso auxílio.

Há umadeclaração semelhante e paralela em Romanos 8:26 e 27: “Da mesma


maneira também o Espírito ajuda as nossas fraquezas”. Ele não tira de nós o
problema por sermos fracos, mas “o Espírito ajuda as nossas fraquezas”. “Porque
não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede
por nós com gemidos inexprimíveis.” É exatamente a mesma idéia. Ele não tira todo
o problema de nós, não o deixamos de lado, não ficamos sentados em
silêncio enquanto o Espírito ora por nós. Não, “Ele ajuda”, Ele vem em nosso auxíl
io. O termo empregado retrata-nos como se estivéssemos tentando carregar uma
pesada tora ou tábua, e estamos cambaleando sob o seu peso; todavia vem o
Espírito, segura na outra ponta, e juntos a levamos. “Ajuda!” Não deixamos de
carregar, Ele carrega o fardo conosco, vem em nosso auxílio, dá-nos ajuda.

Essa é a terminologia das Escrituras. Não há nada nelas que nos diga que “o
transfiramos para Deus”, ou que diga “Deixe correr e deixe com Deus”. É
exatamente o oposto desse outro ensino. É por isso que estou dando tão demorada
atenção a ele.

Vejam depois outro exemplo, tomado de 2 Coríntios, capítulo 12, onde o apóstolo
descreve a sua rica e maravi lhosa experiência quando foi arrebatado, “se no corpo,
não sei, se fora do corpo, não sei”, e “ouviu palavras inefáveis”. Depois, diz ele,
foi-lhe dado “um espinho na carne” que o afligia. Ele orou três vezes ao Senhor para
que aquilo se afastasse

dele. Mas a resposta que recebeu foi: “E disse-me: a minha graça te basta”. Noutras
palavras, a Minha graça, a graça que Eu lhe darei, ser--lhe-á suficiente para que
você vá realizar esta obra que lhe compete realizar, ainda que permaneçao espinho
na carne. O espinho não foi tirado dele, ele teve que continuar lutando com aquilo;
mas lhe foi dada graça, e a graça foi suficiente - “pois o meu poder se aperfeiçoa na
fraqueza”. O Seu poder e a minha fraqueza vêm juntos. Tenho que continuar
indo avante, com a minha fraqueza, porém a Sua graça e a Sua força são suficientes.
E o apóstolo diz: “De boa vontade pois me gloriarei nas minhas fraquezas, para que
em mim habite o poder de Cristo”. O poder de Cristo habita em mim, e assim eu sou
capacitado a prosseguir; é assim que a Sua graça é suficiente. “Pelo que sinto prazer
nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias por
amor de Cristo. Porque quando estou fraco então sou forte”. Soa paradoxal, contudo
é a verdade - “quando estou fraco então sou forte”. Tenho que prosseguir, em minha
fraqueza, fazendo tudo aquilo que Ele me chama para fazer; mas Ele me capacita, me
transmite energia, por assim dizer, mesmo na fraqueza. Não sou meramente um
espectador passivo; estou usando todas as minhas forças e tenho consciência do
obstáculo que é esse espinho na carne. Entretanto, “quando estou fraco então sou
forte”. E a força que Ele me dá que me capacita a continuar realizando a minha obra.

Mas vejamos o texto que de muitas maneiras é a passagem crucial com relação a este
contexto - Filipenses, capítulo 2, versículos 12 e 13. Aí também temos uma
combinação dos dois aspectos: “De sorte que, meus amados, assim como sempre
obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na minha ausência,
assim também operai a vossa salvação com temor e tremor”. Essa exortação é a
exata contradição do “Deixe correr e deixe com Deus”, e “Transfira isso para o
Senhor, e Ele o fará por você”. Nessa passagem as duas coisas são colocadas juntas.
Devo desenvolver a minha salvação com temor e tremor, e essatarefa é extremamente
difícil. Tenho que ser cauteloso; ela envolve “temor e tremor”, o que é muito
diferente daquela teoria que diz: “Deixe de ser infeliz, não há absolutamente nada a
temer, entregue tudo ao Senhor, Ele o fará por você; descanse na fé, olhe para Ele,
permaneça assim, você não terá dificuldades, você se regozijará o dia todo”.
“Operai a vossa salvação com temor e tremor”, diz o apóstolo. Quem é
suficiente para estas coisas? Quem pode real izar isto? A resposta é: “Porque Deus é
o que opera em vós tanto o querer como o efetuar”. As duas coisas vêm juntas, e não
separadas como aquele outro ensino sugere.

Vejamos, porém, outras declarações mais que o apóstolo nos faz a seu respeito e a
respeito do modo como ele vivia a vida cristã. Vejam, por exemplo, Gálatas 2:20:
“Já estou (fui) crucificado com Cristo; e vivo”. Observem como Paulo parece
contradizer cada afirmação que faz. Ele o faz para 1 ivrar-nos precisamente do erro
que estamos estudando. Ele diz: “Fui crucificado com Cristo”. Para os que sustentam
o ensino errôneo, essa declaração significaque o apóstolo parou de
fazerqualquer coisa, que ele deu de mão a tudo, que ele pôs fim a esta vida de lutas
e esforços. Ele está morto. Mas imediatamente ele acrescenta: “E vivo”. A seguir,
como para aumentar o nosso espanto, “não mais eu, mas Cristo vive em mim”. “Ah”,
dizem aqueles mestres, “aí você o tem, afinal de contas; você vê que o apóstolo está
ensinando: “e vivo, não mais eu”. Já terminei, deixei tudo com o Senhor, agora
Cristo está vivendo em mim. Acabei, não vivo mais, não devo fazer mais nada.
Cristo é que está vivendo em mim e está obtendo a vitória para mim, e eu apenas
estou permanecendo neste “descanso da fé”. No entanto, desafortunadamen-te para
aquele ensino, o apóstolo continua - “e a vida que agora vivo na carne”. Vocês vêem
que ele ainda está aí, e diz com efeito, estou vivo, e na carne, neste corpo, com tudo
o que ele envolve. “A vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Fi Iho de Deus,
o qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim.” Estou vivendo esta vidaem
termos da minha fé em Cristo e no que Ele fez por mim e no que ainda fará.

Você não pode descartar-se da atividade humana, aí está ela o tempo todo nessas
passagens bíblicas cruciais. É assim que eu vivo, diz o apóstolo. Ele não deixará
você sair para este ou aquele lado. Sair para um ou outro lado é errado. Se você
disser que tem de fazer tudo, estará errado; se disser que você não tem de fazer nada
e que Ele faz tudo, estará igualmente errado. A verdade é, eu vivendo a minha vida
na carne, e é Cristo vivendo em mim e com isso me capacitando a viver esta vida
na carne. Eu a estou vivendo - “a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho
de Deus”. “Eu vivo.” Mas Cristo também vive em mim.

Há uma declaração igualmente clara em Filipenses, capítulo 4, versículos 11 a


13.Oapóstoloestá na prisão,eosfilipenseslheenviaram uma dádiva. Escrevendo para
agradecer-lhes, ele diz: “Não digo isto como por necessidade, porque já aprendi a
contentar-me com o que tenho. Sei estar abatido, e sei também ter abundância; em
toda a maneira, e em todas as coisas estou instruído, tanto a ter fartura, como a ter
fome; tanto aterabundância,comoapadecer necessidade”. E então ele resume
tudo: “Posso todas as coisas em Cristo que me fortalece”.

Para expor este ponto, permitam-me contar-lhes a história de um

velho e curioso pregador que estava pregando precisamente sobre este texto. Com o
fim de fazer calar nos ouvintes o seu argumento, ele fez esta colocação: leu as
palavras, “Posso todas as coisas” — e parou abruptamente e fez uma pergunta ao
apóstolo com as seguintes palavras: “Você não acha que está exagerando, Paulo?
Você estaria realmente dizendo que pode todas as coisas? Não há nada que você não
possa fazer? Você pode realmente combater esses principados e potestades? Você
tem poder igual ao do diabo? Veja o que ele fez com todos os patriarcas, até com
homens como Abraão, amigo de Deus. O diabo derrotou Abraão, e você não estaria
se dizendo superior quando diz: “Posso todas as coisas”?” O velho pregador
continuou por algum tempo dessa maneira, pondo em relevo as dificuldades, fazendo
perguntas ao apóstolo e insinuando que Paulo estava indo além das suas próprias
possibilidades. Mas depois ele passou a ler o texto completo: “Posso todas as coisas
em Cristo que me fortalece”. “Ah, desculpe-me Paulo”, disse o velho pregador, “não
percebi que você era dois!” Dava a impressão de que havia somente um, a saber, o
apóstolo Paulo. Certamente isso deve ser salientado: “Eu”, diz Paulo, “posso todas
as coisas.” Todavia só é capaz de fazer todas as coisas “em Cristo (ou “por meio de
Cristo”, VA) que me fortalece”. Cristo o fortalece, infunde poder nele; mas quem faz
todas as coisas é Paulo. É ele que sabe estar abatido e ter abundância. Paulo não
largou tudo, tornando-se um espectador que fica sentado assistindo a tudo e assim
“permanecendo” passivamente. Ele está engajado, é ele que faz essas coisas todas.
Contudo, a glória disto, diz ele, é que eu sou habilitado a fazer todas essas coisas
por meio de Cristo que - não “faz isso tudo por mim”, mas por meio de Cristo que-
me “fortalece”. É uma espécie de transfusão de sangue, o poder é colocado nele, ele
é fortalecido. As tarefas não são tiradas das suas mãos, porém ele é capacitado a
fazê-las porque está sendo fortalecido da maneira acima descrita.

Vejamos de relance, e por um momento, algumas das experiências que ilustram a


verdade de uma maneira um pouco mais objetiva. Paulo passou poralgumas
experiências penosas. Algumasdelas estão registradas no livro de Atos dos
Apóstolos. Tomem, por exemplo, Atos, capítulo 18, versículos 9 e 10. Paulo está
sendo ameaçado, mas eis o que lemos: “E disse o Senhor em visão a Paulo. Não
temas, mas fala, e não te cales; porque eu sou contigo, e ninguém lançará mão de ti
para te fazer mal, pois tenho muito povo nesta cidade”. É assim que opera a força
que Deus dá. O apóstolo é fortalecido pela visão e segurança a ele dadas. Ele ainda
tem que continuar com a sua pregação, no entanto dessa maneira lhe é dada

a certeza de que não foi deixado só consigo mesmo, e de que o Senhor estará com ele
para fortalecê-lo.

Há um exemplo parecido em Atos 23:11: “E na noite seguinte, apresentando-se-lhe o


Senhor, disse: Paulo, tem ânimo; porque, como de mim testificaste em Jerusalém,
assim importa que testifiques também em Roma”. Dessa maneira o Senhor lhe fala e
se manifesta a ele; e assim ele é revestido de pleno poder e continua o seu
testemunho. Com essa segurança, ele pode agir assim. Ele tem que fazê-lo, e o fará
mais confiantemente, na força deste grande poder.

Mas há também aquela dramática e estimulante h istória no capítulo vinte e sete do I


ivro de Atos dos Apóstolos que fala do naufrágio de Paulo e seus companheiros em
sua viagem a Roma. Destaco particularmente os versículos 23 a 25. A situação
estava se tornando em extremo desesperada, tinham lançado ao mar toda a armação
do navio. “Com as nossas próprias mãos, lançamos ao mar a armação do navio. E,
não aparecendo, haviajá muitos dias, nem sol nem estrelas, e caindo sobre nós uma
não pequena tempestade, fugiu-nos toda esperança de nos salvarmos. E,
havendojámuito que se não comia, então Paulo, pondo-se em pé no meio deles,
disse: fora, na verdade, razoável, ó varões, ter-me ouvido a mim e não partir de
Creta, e assim evitariam este incômodo e esta perda. Mas agora vos admoesto a que
tenhais bom ânimo, porque não se perderá a vida de nenhum de vós, mas somente o
navio”. Como pôde falar com tal confiança? Lá estavam eles, perplexos, o capitão,
os marinheiros e todos os demais, nervosos e completamente desesperados, o
naufrágio sendo esperado a qualquer momento-o desastre, o fim. Eo apóstolo
diz: “Tende bom ânimo!” Que é que o capacita a superar tais circunstâncias dessa
maneira? Diz ele aos homens: “Porque esta mesma noite o anjo de Deus, de quem eu
sou, e a quem sirvo, esteve comigo, dizendo: Paulo, não temas; importa que sejas
apresentado a César, e eis que Deus te deu todos quantos navegam contigo”. Então
eles se puseram a fazer várias coisas. Não se limitaram a deixar o navio à deriva,
cuidaram de muitas coisas necessárias. Assim Paulo foi fortalecido pela palavra que
lhe fora dada, e ele, por sua vez, pôde fortalecer os seus companheiros de viagem
dando--Ihes esta certeza. Eles tinham perdido as esperanças, estavam desesperados,
entretanto, como a palavra de Paulo lhes deu segurança, eles foram capazes de
enfrentar a situação.

Vejam, porém, ainda outro exemplo que nos vem da experiência de Paulo registrada
na sua derradeira Epístola. Na Segunda Epístola a Timóteo o apóstolo menciona a
sua “primeira defesa”. Ele se refere à primeira ocasião em que compareceu
ajulgamento perante as autorida-

des. Os procedimentos eram semelhantes aos atuais; o processo era iniciado, depois
havia um adiamento, a seguiroutra audiência, e assim por diante. “Ninguém me
assistiu na minha primeira defesa, antes todos me desampararam, Que isto lhes não
seja imputado. Mas o Senhor assistiu-me e fortaleceu-me.” Observem a seqüência
dos eventos, sempre na mesma ordem. O que o Senhor faz é fortalecer-nos. Ele não
tira o problema das nossas mãos para que não façamos nada. “O Senhor assistiu-me
e fortaleceu-me, para que por mim fosse cumprida a pregação, e todos os gentios a
ouvissem; e fiquei livre da boca do leão” (2 Timóteo 4:16-17). “O Senhor
fortaleceu-me!” Ele nos torna vigorosos, poderosos e fortes, e capazes de pelejar e
combater; Ele não tira a ação das nossas mãos.

Tomemos agora esta palavra final, já não acerca do grande apóstolo. É uma palavra
muito significativa do livro de Apocalipse, capítulo 12, versículo 11, que descreve
como os santos são atacados pelo inimigo, o antigo dragão, a serpente, o diabo: “E
eles o venceram”. Eles o venceram; não “Ele foi vencido em favor deles” - “Eles o
venceram pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho; e não
amaram as suas vidas até a morte”. Poderia haver algo mais claro?

Como foi que os santos venceram o diabo “pelo sangue do Cordeiro e pela palavra
do seu testemunho”? Sem dúvida isso inclui a idéia de que eles dirigiram a palavra
ao diabo. Puseram em prática a exortação: “Resisti ao diabo, e ele fugirá de vós”.
Como se faz isso? Dizendo: “Você não me pode tocar mais. Podia, mas agora não
pode, o sangue de Cristo está sobre mim”. E a menção da expressão “o sangue de
Cristo” sempre derrota o diabo. “Eles o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela
palavra do seu testemunho.” Eles se voltaram para ele e lhe disseram: “Você é um
inimigo derrotado, e nós pertencemos Àquele que o derrotou; não temos mais medo
de você”. É assim que se faz! “Eles o venceram.”Não ficaram simplesmente sentados
e deixaram que Cristo o vencesse por eles. Não é isso que as Escrituras ensinam. Eu
e você estamos capacitados para a obtenção da vitória pelo sangue do Cordeiro e
pela palavra do nosso testemunho. Nada de “deixar correr e deixar com Deus” - não
há nada disso aqui. Vamos avante e lutamos. A espantosa verdade é que somos
capacitados a vencer o diabo, a derrotá-lo, a ser mais que vencedores sobre ele.
Devemos resistir a ele, e ele fugirá de nós tão logo o façamos desta maneira correta.

E, pois, evidente que estamos envolvidos; a minha atividade e a sua têm que
continuar e continuar; na verdade, deve aumentar. Mas Ele nos

habilitará cada vez mais. Pois bem, aqui vem a questão prática: “Como é que tudo
isso funciona”, dirá alguém; “tudo o que você esteve dizendo, funcionade fato na
prática? Que é que eu devo fazer exatamente? Aceitei a sua argumentação, posso ver
que preciso ir adiante, posso ver que serei capacitado a prosseguir, porém o que
devo fazer, em detalhe e na prática dos fatos?”

A primeira resposta éque temos de perceber e entender ativamente tudo o que


dissemos até aqui sobre o assunto. Isso é absolutamente essencial. Permitam-me
colocar a matéria de maneira diferente dizendo que, se eu e vocês temos que
combater vitoriosamente o diabo e todas as suas forças, o primeiro fator essencial é
a certeza da salvação. Não há esperança para nós neste conflito, se não conhecemos
a força de Deus e o poder de Deus. Se há incerteza em nossa relação com Ele,
não podemos estar firmes e resistir. Noutras palavras, a chave da vitória sobre o
diabo é a segurança da salvação, certamente concernente à nossa relação com Deus
em Jesus Cristo. Essaé apenas outra maneira de dizer: “Eles o venceram pelo sangue
do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho”. Você não poderá dar testemunho, se
não conhecer a sua situação. Só aquele que tem certeza é que pode dar testemunho e
agir como testemunha. O testemunho dos santos, no livro do Apocalipse, é que o
sangue estava sobre eles, que eles pertenciam a Cristo; eles tinham certeza da
salvação.

Pela segurança vocês são fortalecidos “no Senhor e na força do seu poder”. Como
funciona? Vejam esta interessante e profunda observação psicológica de Esdras,
homem que teve de enfrentar dificuldades muito grandes. Esdras teve que enfrentar o
problema da reconstrução, após a destruição de Jerusalém, depois que a cidade foi
saqueada e o povo foi levado embora. Ele foi enviado de volta a Jerusalém .Tudo
não passava de um montão de ruínas, um caos total. Lá estava um homem
encarando uma tarefa tremenda, com inimigos atacando portodos os lados. Pois,
do ponto de vista prático, Esdras fez uma das mais profundas observações de todas
as Escrituras. Diz ele: “A alegria do Senhor é a vossa força” (Neemias 8:10).
Enquanto vocês se sentirem miseráveis, infelizes e inseguros, diz Esdras, nunca terão
êxito, serão completamente derrotados.

Isso pode ser ilustrado interminavelmente. Todos nós temos experiência disso. Você
se sente infeliz, em condições miseráveis, perturbado. Você acorda de manhã, talvez,
e se vê naquela condição. E você sabe que tipo de dia pode esperar. Tudo irá mal. O
trabalho que você faz diariamente será difícil, cheio de problemas. Você começa a
indagar se

é competente, se não devia renunciar, ou se não devia deixá-lo por algum tempo. Por
sentir-se miseravelmente mal, enche-se de pressentimentos. “Para quem sofre de
icterícia, tudo parece amarelo.” Mas, ao contrário, quando você se sente feliz, o seu
trabalho não lhe dá nenhum problema. Você passa voando por ele, por assim dizer.
Toda gentejá passou por isso.

A sua condição pessoal determinará o modo como você fará o seu trabalho, bem
como a sua atitude para com o seu trabalho. O homem que tem problemas domésticos
sai de casa depois de uma discussão ou briga sobre certas dificuldades. Como pode
encarar com alegria o seu trabalho no escritório ou na fábrica ou em qualquer outro
lugar onde exerça a sua profissão? Não pode. Já está derrotado. Mas se tudo vai bem
e ele se sente feliz em casa, tudo irá bem em seu trabalho. Não conhecemos,
todos nós, esse tipo de coisa? “A alegria do Senhor é a vossa força.”

Tivemos diversas ilustrações claras desse tipo de acontecimento durante a última


guerra. Quando as coisas iam pessimamente mal, o então Primeiro Ministro Winston
Churchill falava à nação pelo rádio. Era tudo o que ele fazia. Ele não mudava os
fatos-nenhum deles, porém todos se sentiam diferentes quando ele terminava.
Sentíamo-nos fortes outra vez, prontos para o combate. Ele não tinha feito nada,
senão falar, mas nos dera segurança, nos fizera sentir-nos felizes. Não há o que se
compare com a felicidade. Se você estiver se sentindo feliz, tudo estará bem, você
fará todo o seu trabalho com facilidade; suas tarefas serão superadas. Num sentido
muito mais elevado, “a alegria do Senhor” infunde força em você, infunde poder em
você.

“Mas”, você poderá perguntar, “como é possível isso? O problema continua lá, e eu
continuo sendo a mesma pessoa!” Sim, entretanto você não é uma máquina. O homem
é um estranho amálgama. Sempre tem os mesmos nervos, os mesmos músculos e o
mesmo cérebro, é sempre o mesmo, o tempo todo! Todavia você não disse tudo
sobre um homem quando diz isso. Há também uma espécie de eletricidade
no homem. Não é possível medi-la, e não sabemos muita coisa a seu respeito, mas
existe; e subitamente, quando essa eletricidade é gerada, ela impregna tudo de
energia, e você passa a ser o dobro do homem que era. Do ponto de vista
estritamente materialista, você é a mesma pessoa, porém na prática não é a mesma,
absolutamente. Você é muito mais forte, ligam-se todas as chaves, você está
carregado de energia, você está disposto a qualquer coisa, e pode fazer coisas que
não tinha a mínima possibilidade de fazer quando se sentia miserável, cheio de
dúvidas e infeliz.

É exatamente isso que o apóstolo está dizendo aqui: “Fortalecei-

-vos no Senhor e na força do seu poder”. “A alegria do Senhor é a vossa força.” O


que cabe a você fazer não é “deixar correr e deixar com Deus”. O que lhe cabe fazer
é “fazer cada vez mais firme a vossa vocação e eleição”, como estou a ponto de
explicar. Quando você fizer isso mais e mais, verá que está revestido da força de que
tem necessidade.

Ou vejam o que diz Daniel no capítulo 11, versículo 32. Ele faz a seguinte
colocação: “Mas o povo que conhece ao seu Deus se esforçará e fará proezas”. Os
que conhecem ao seu Deus não são chamados para cruzar os braços e para ficar
olhando enquanto outros fazem proezas por eles. O fator essencial na situação é as
pessoas conhecerem ao seu Deus. É o conhecimento de Deus que as fortalece.
Infunde energia nelas, liga todas as chaves, torna-as capazes. É esse o segredo.
Passividade não -muito ao contrário! A idéia de que o cristão simplesmente não faz
nada, senta-se passivamente e tudo já está feito, é a própria antítese
dadoutrina bíblica que ensina que o cristão de repente se vê carregado dessa
energia e se acha um colosso, e vê que não há nada que ele não possa fazer -“forte no
Senhor”. Isso decorre do fato de que ele conhece ao seu Deus, e porque ele O
conhece, ele é forte, ele é capaz de permanecer firme, não tem medo de nada e pode
fazer proezas.

Temos que captar esta verdade; porque, se não a captarmos, já estamos derrotados.
Permitam-me oferecer-lhes outra declaração a respeito deste mesmo assunto,
declaração feita por este mesmo apóstolo Paulo. Vê-se no capítulo vinte do livro de
Atos dos Apóstolos, onde Paulo diz: “E agora, eis que, ligado eu pelo espírito, vou
para Jerusalém não sabendo o que lá me há de acontecer”. Tudo o que ele sabe é “o
que o Espírito de cidade em cidade me revela, dizendo que me esperam
prisões etribulações”. Essa é a sua situação. Não podia sermuito pior. Odiabo e
todas as suas forças estão preparados contra ele, e estão utilizando comunidades e
indivíduos, judeus e romanos igualmente, para promoverem “prisões e tribulações”
para o apóstolo. O Espírito Santo está testemunhando disso a ele em cada cidade por
onde ele passa; aonde ele vai este ou aquele profetiza nesse sentido. Contudo, ouçam
o que ele diz: “Mas em nada tenho a minha vida por preciosa, contanto que cumpra
com alegria a minha carreira, e o ministério que recebi do Senhor Jesus, para dar
testemunho do evangelho da graça de Deus”. “Mas nenhuma destas coisas me abala”,
diz Paulo (VA). Ele não está apavorado, não está alarmado, não está intimidado, a
despeito das dificuldades profetizadas. Sua única queixa é contra os seus amigos que
choravam, meneando a cabeça e rogando a ele que não prosseguisse. Não façam
isso, diz Paulo, eu vou prosseguir. “Nenhuma destas coisas me abala.” Por quê?
Tudo

o que ele deseja é “cumprir com alegria a sua carreira”. Ele se regozijava em seu
ministério, “o ministério que recebi do Senhor Jesus, para dar testemunho do
evangelho da graça de Deus”. Sua alegria no trabalho! Sua alegria no Senhor! Ele se
regozijava no fato deque ele, que tinha sido “blasfemo, perseguidor e opressor” (1
Timóteo 1:13), agora era um evangelista, um apóstolo de Cristo. Alegrava-se tanto
nisso que, apesar de saber o que estava para vir, ainda podia d izer: “Nenhuma desta
coisas me abala”. Ele é “mais que vencedor”, ele derrotou essas coisas. É a sua
alegria no ministério que o eleva acima de todas as circunstâncias adversas, e assim
o capacita a vencer e a prevalecer.

Isso tudo nos leva à conclusão de que, se temos algum tipo de dúvida ou inceretza
acerca da nossa salvação, o diabo já nos derrotou. Devemos estar seguros da nossa
salvação. As Escrituras sal ientam essa verdade constantemente; grande parte delas é
dedicada ao ensino que nos dá certeza e segurança. Se neste momento você não tem
certeza da salvação, há somente uma razão para isso, e é que, de um modo ou
de outro, o diabo o derrotou. Pode ser que você não tenha recebido o ensino certo,
mas isso é porque o diabo cegou os que ensinaram você. Pode ser que o diabo o
cegue quando você lê as Escrituras, ou que ele o faça olhar para si mesmo, de
maneira demasiadamente introspecti va, e assim o prive da segurança da sua
salvação. Portanto, chega-se a isto: se o diabo o derrubou e o derrotou neste ponto
crucial, ele está barrando a fonte de suprimento, a fonte de energia, poder e vida. Se
elejá fez isso, obviamente pretende derrotá-lo em todos os outros pontos. Você se
acha num estado m iserável, sente-se infeliz, e quando o diabo vem tentá-lo na carne,
ou no espírito, ou de qualquer outra maneira, tem pouca dificuldade em derrotá-lo.
Você está de espírito abatido, e ele dá-lhe com os pés, lança-o ao solo e cospe em
você, e assim você se sente desamparado e sem esperança. Se é esse o seu caso, só
ha um meio de recuperar-se- você tem que reagir, ter segurança e absoluta certeza da
sua salvação pessoal. É isso que lhe dará espinha dorsal, poder e força. Então você
estará preparado para enfrentar o diabo, venha ele como vier e com o disfarce que
usar.

Concluo com esta nota: como cristãos, a primeira e a maior coisa que devemos
compreender é quem somos e o que somos. Essa é a maneirade derrotar o inimigo.
Noutras palavras, temos de compreender que somos filhos de Deus. A simples
percepção de que somos filhos de Deus é uma das grandes fontes de poder e força
que se pode ter. Permitam-me oferecer-lhes duas ilustrações disso.

Volto ao Velho Testamento, e ao livro de Esdras. E se isso é certo quanto aos santos
do Velho Testamento, tanto mais deveria ser quanto aos

santos do "Novo Testamento! Há uma grande história no capítulo 8. Esdras tinha


solicitado ao rei autorização para que certo número de pessoas e provisões fossem
para Jerusalém para iniciar a obra de reconstrução. A hora era crítica, e Esdras
hesitou por um momento. Ele via as dificuldades, como havia inimigos à espera e
prontos para atacar; e o seu primeiro impulso foi mandar um mensageiro ao rei, à
Babilônia, pedindo-lhe tropas, um batalhão de soldados, que os acompanhassem,
os defendessem e os protegessem do ataque do inimigo. Mas de repente disse a si
mesmo: não posso fazer isso. Assim, em vez de enviar mensageiro ao rei pedindo
soldados, ele diz: “Então apregoei ali um jejum...porque me envergonhei de pedir ao
rei exército e cavaleiros para nos defenderem do inimigo no caminho” (versículos
21 e 22). Por que se envergonhou? “Portanto tínhamos falado ao rei, dizendo: a mão
do nosso Deus é sobre todos os que o buscam para o bem, mas a sua força e a sua ira
sobre todos os que o deixam.” Ele esteve prestes a enviar mensagem pedindo um
exército e outras forças, porém, de súbito, ele diz: “Não posso fazer isso, por causa
do que eu já disse ao rei”. Ele tinha dito ao rei que eles iam enfrentar uma jornada
arriscada. “Vocês se acham capazes?” perguntarão rei. “Está tudo bem”, Esdra
respondera. “Eseos inimigos os atacarem?”, indagara o rei. “Correrá tudo bem”,
replicara Esdras. “A mão do nosso Deus é sobre todos os que o buscam para o bem.”
Mas então, mais tarde, tinha surgido um temporário sentimento de temor, e Esdras
quase afundou. No entanto, ele diz: “Não posso pedir soldados; eu faço parte do
povo de Deus; e eu disse aquilo ao rei, e aleguei grandes coisas em nome de Deus.
Muito bem, não solicitemos tropas; em vez disso, proclamemos um jejum, voltemos a
entrar em contato com Deus, e então partamos”. Esse conhecimento o fortaleceu.
Deixou de ser um derrotista; foi vitoriosamente avante em seu caminho.

Consideremos agora Neemias, que estava engajado na mesma obra, como vemos no
livro que leva o seu nome, capítulo 6. Tinha chegado um momento crítico na obrade
reconstrução em Jerusalém. Eles tinham começado a construir o muro, mas havia
inimigos que os observavam, zombavam delese ameaçavam destruirtudo. Tinham que
trabalharcom uma ferramenta numa das mãos e com uma espada naoutra, e a
vigilância era constante, dia e noite. A situação era realmente aflitiva. Então,
um suposto amigo de Neemias o procurou e lhe disse: “Olhe aqui, você não acha que
como líder deste empreendimento você devia tomar medidas para proteger-se?
Venha, vamos juntos à casa de Deus, ao santuário; lá estaremos a salvo do ataque do
inimigo. Você não precisa ficar perto do muro. Você será morto, e tudo estará
perdido. Vamos entrar na casa de

Deus, e lá estaremos em segurança”. Foi quando Neemias deu esta resposta imortal:
“Um homem como eu fugiria?” O que o livra do erro é que ele sabe quem é! “Um
homem como eu fugiria?” Seria ele egocêntrico, mereceria a acusação de fazer
exagerada avaliação de si mesmo? Nada disso! “Um homem como eu fugiria? E
quem há, como eu,queentrenotemploeviva? De maneira nunhuma entrarei.
Econheci que não era Deus quem o enviara” - este mensageiro do inimigo que
lhe recomendava que salvasse a própria pele. O homem alegava estar falando em
nome de Deus. Neemias apercebeu-se de que isso era impossível. Esse tipo de
conselho não é característico de Deus, não é coerente com o método de Deus.
Neemias compreende quem ele próprio é-o homem de Deus! “Um homem como eu
fugiria?” Eu, que fiz as declarações que fiz ao rei a quem eu servia como copeiro?
Será possível o que me é proposto? É impossível! Não posso! Sou homem de
Deus! “Um homem como eu fugiria? Impossível! Não posso! Sou homem de Deus!”
No momento em que ele firmou o grande fato deque era um homem de Deus, foi-lhe
dado ver que Deus nunca tinha enviado aquele mensageiro, mas que foram Tobias e
Sambalate, seus inimigos, que, mediante um estratagema e um subterfúgio, tinham
contratado um homem para agir como traidor com o fim de derrotar Neemias. Assim,
Neemias vence, perde o medo, eé “mais que vendedor”. Sobrequebase?
Simplesmente baseado no conhecimento do fato de que ele é um homem de Deus.
Esse é o começo do fortalecer-se “no Senhor e na força do seu poder”. Quando
compreender quem você é e o que você é, já terá avançado bastante no caminho
rumo à vitória certa sobre o diabo e todas as suas forças.

ÁGUA E COMIDA

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” -


Efésios 6:10

Tendo visto a importância vital da segurança da salvação e da percepção de quem


somos e do que somos, o próximo passo da argumentação é que não há nada que seja
tão fortalecedor como a compreensão do que nos espera e do que nos virá, como
povo de Deus. Este tema é constantemente colocado diante de nós na Bíblia. É a
“bendita esperança” oferecida ao povo de Deus. O conceito bíblico da vida neste
mundo, tanto do Velho Testamento como do Novo, é que esta vida constitui
uma jornada e que a melhor coisa que se pode dizer é que este mundo é passageiro.
Os dias concedidos ao homem “chegam a setenta anos” (Salmo 90:10), e se for um
homem forte, um pouco mais; porém sempre é uma vida passageira. A vida é uma
peregrinação, uma jornada. Esse é um fato de que todos têm ciência, é claro. Mas o
homem de Deus, o cristão, está nesta posição peculiar, e tem esta grande vantagem,
que ele não se perturba com a percepção dessa verdade. Ele sabe que a vida real é a
que está para vir, e tem os olhos postos nela. Esse era o segredo de todos os grandes
patriarcas do Velho Testamento - Abraão, e todos os demais. Eles saíam “sem saber
para onde iam”; todavia sabiam com quem iam. Sabiam qual era a meta final.
Estavam esperando “a cidade que tem fundamentos, da qual o artífice e construtor é
Deus”. Moisés se dispôs a sacrificar todas as perspectivas que se lhe apresentavam
no Egito. Recusou ser chamado filho da filha de Faraó. Pôs de lado todas as glórias
do Egito. Por quê? Por que “tinha em vista a recompensa”; ele sabia o que viria. Este
é um grande princípio ensinado na Bíblia toda, e, particularmente, é claro, no Novo
Testamento. O cristão é alguém que tem os olhos postos na glória rumo à qual ele
está indo. “Amados”, diz João em sua Primeira Epístola, capítulo 3, versículo 2,
“agora somos filhos de Deus, e ainda não é manifestado o que havemos de ser. Mas
sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque
assim como é o veremos.” E então, imediatamente ele faz a dedução no versículo 3:
“E qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como também ele é
puro”.
Noutras palavras, o argumento é que assim que compreendemos esta

verdade, assim que compreendemos que estamos indo para a glória, assim que temos
um correto conceito da vida neste mundo, e compreendemos que o que mais importa
é a nossa chegada lá, devemos pensar que a coisa mais urgente da vidaé purificar-
nos, como o SENHOR é puro. O homem que sabe disso está sempre se preparando.
Ele sabe que está viajando para uma glória indescritível, para uma santidade, para
uma pureza, para uma terra onde não há trevas nem pecado; ele sabe que
está destinado a ver a Deus, a ver o Senhor Jesus Cristo, e a ser semelhante a Ele. O
homem que tem isso no mais profundo da sua mente e do seu coração, tem um
correspondente conceito de tudo quanto o mundo tem para oferecer-lhe - todas as
suas atrações e interesses, todas as coisas que ele sacode na frente dele, todos os
seus artigos valiosos e brilhantes. Ele tem uma nova visão de tudo. A percepção
disso tudo leva o homem a purificar-se, como também Cristo é puro. Ele compreende
que não dispõe de muito tempo para preparar-se para a glória eterna.

As analogias que se nos apresentam neste ponto deviam ser óbvias. Se alguma
grande honra está para vir ao seu encontro, se você está aguardando alguma grande
personagem - um rei ou uma rai nha ou alguém que se acha em posição proeminente -
você se preparará para isso dias, semanas e até meses antes. Você se preparará,
preparará as suas roupas, preparará o seu procedimento, procurando ver o que
deverá fazer, o que dizer e especialmente o que não fazer. Todos os aspectos da sua
vida serão governados pelo esperado evento; tudo mais recua em importância e em
significação. O projeto em perspectiva dominará a sua vida e você viverá e se
preparará para ele. Esse é precisamente o argumento do Novo Testamento:
“Qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si mesmo, como também ele é
puro”. Como cristãos, realmente não pertencemos a este mundo; nele somos
“estrangeiros e peregrinos”. Esse é o argumento bíblico.

Tenho utilizado muitas vezes umaanalogiasimples, quase pueril, para expor este
ponto. É o que os pais sempre dizem às suas crianças quando as enviam a uma festa
natalina ou outra: “Agora, lembrem-se de portar-se como devem”. E por esta razão:
os filhos devem lembrar-se de quem eles são, de que são representantes da família.
Pois bem, esse é o tipo de argumento que deve funcionar com o cristão. Quando ele é
confrontado pelo diabo, com os principados e potestades, que não se deixe iludir
ou enganar. Ele se dá conta do que está acontecendo, e diz: “Não pertenço a você,
não sou mais cidadão do seu reino. Sou membro do reino de Cristo. A minha
cidadania está no céu, e eu estou me preparando para o céu”. Essa confissão lhe
infunde vida, força e vigor.

Essa é, pois, outra maneira pela qual nos fortalecemos “no Senhor e na força do seu
poder”, a saber, a lembrança da nossa relação com Ele, e a percepção do fato deque
vamos estar diante dEle e vamos vê-10 face a face.
Acrescentemos esta consideração, que se segue por inevitável necessidade lógica,
qual seja, que nos lembremos de que a honra de Deus, a honrado Senhor Jesus Cristo
e a honra do Espírito Santo estão, por assim dizer, em nossas mãos. Não podemos
viver para nós mesmos. Somos povo de Deus e não podemos repudiar a nossa
relação. Todaa família está envolvida no que somos e no que fazemos. Que diferença
faria, se nos lembrássemos sempre disso! Que força e vigor nos seriam dados!
Você não pode desligar-se, não pode dizerque é um indivíduo isolado.

É evidente que não podemos isolar-nos na esfera natural. Um filho pródigo pode
achar que pode, que tudo está acabado entre ele e seu pai, sua mãe e seus irmãos e
irmãs, e o seu lar. Ele vai embora, e está determinado a não ficar mais preso pelos
laços familiares. Não obstante, o que ele faz reflete-se na família toda. Toda a
família tem que sofrer, toda a família é levada a uma espécie de desgraça, todos
ficarão falando da família. Ele manchou o nome da família, ele é na verdade a
ovelha negra do rebanho, e não pode isolar-se. Há certas coisas que ele não
consegue fazer, e essa é uma delas. Dá-se exatamente a mesma coisa com o cristão. E
por isso que às vezes eu digo que não existem férias na esfera espiritual. A nossa
relação com Deus e uns com os outros é sempre conosco, e nós sempre somos
cristãos. E preciso que não haja em nós nenhum tipo de falso dualismo, nenhuma
falsa dicotomia. Somos um, e sempre somos povo de Deus, filhos de Deus; e o que
fazemos se reflete no nome de Deus, e no nome do Senhor Jesus Cristo. A percepção
disto é, obviamente, uma tremenda fonte de poder. Dessa maneira
tomamos consciência do fato de que somos representantes, deque somos agentes, e
de que a honra da nossa família, do nosso país e de tudo o que lhe diz respeito está,
por assim dizer, em nossas mãos. Não há nada que mais se preste para fortalecer-nos
e dar-nos vigor, coragem e poder do que precisamente esta percepção.

Passemos agora a outro aspecto do assunto, um aspecto mai s prático ainda.

Vimo-nos como filhos de Deus, e temos em nós esta nova vida. Agora, a pergunta
que desejamos fazer é: como posso manter esta vida e o poder e vigor que nela há?
Sim, e como posso aumentá-la? Como posso tornar-me cada vez mais forte no
Senhor e na força do Seu poder?

Vejamos a questão da seguinte maneira. O que torna cristão um homem é que é


colocada nele uma semente da nova vida. Esta é a terminologia bíblica, como se vê,
por exemplo, na Primeira Epístola de João, capítulo 3, versículo 9: “Qualquer que é
nascido de Deus não comete pecado”, querdizer, não pratica o pecado, não continua
habitualmente em pecado. E por esta razão: “porque a sua semente permanece nele; e
não pode pecar” - não pode continuar v ivendo em pecado - “porque é nascido
de Deus”.

O argumento é que ser “nascido de Deus” significa que uma semente, ou um


princípio da vida eterna, foi colocada em nós. Essa é a doutrina que, como indiquei
num estudo anterior, torna completamente impossível aceitar o ensino acerca do
“Deixe correr e deixe com Deus”. É-nos dito que, porque esta semente da nova vida
está em nós, não podemos continuar em pecado. A verdade é afirmada
categoricamente. É-nos dito que nada podemos fazer, senão entregar-nos ao Senhor;
temos de compreender que Ele colocou um princípio de vida, uma semente, em nós,
e que não podemos continuar praticando o pecado porque a semente está em nós;
quer dizer, somos nascidos de Deus. Este princípio de vida que Ele colocou em nós
tem poder, tem força, muda tudo. “Assim que, se alguém está em Cristo, nova
criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2 Coríntios 5:17).

Aquela outra idéia segundo a qual o cristão permanece sendo o que sempre foi, mas
agora repousa no poder de Deus - idéia colocada nos termos da ilustração do
atiçador de chama- é também uma negação deste ensino acerca da semente. O cristão
não é simplesmente alguém que tomou uma decisão, que decidiu seguir a Cristo e
fazer isso ou aquilo. Ele o faz, porém o que o leva a fazê-lo é que esta semente da
vida eterna foi colocada nele, que ele é nascido de Deus. Há nesse homem algo que
é maior do que o homem todo, e este é o novo princípio que vai governar
a totalidade da sua vida. Posto que éassim, ele não pode continuar vivendo como
vivia. Diz a B íbl ia que a princípio ele é apenas um bebê, uma criança, em Cristo.
Portanto, surge a questão: como esse bebê pode crescer, como essa criança pode
desenvolver-se? Ou, coloquemos a interrogação noutra forma - como é que este
princípio de vida, poder e vigor pode ser alimentado, nutrido e desenvolvido e
assim fortalecer-se cada vez mais?

A melhor maneira de responder essa pergunta é seguir a linha da analogia sugerida


pelaterminologia utilizada nas Escrituras. A necessidade óbvia é de comida e
bebida. De que é que o bebê recém-nascido necessita acima de tudo? Alimento e
água. Necessita de nutrição. Se o bebê há de desenvolver-se, vindo a ser criança,
adolescente, homem,

precisa de sustento. O bebê recém-nascido é dependente e fraco, e nada pode


fazerem seu próprio benefício. Mas viráo diaem que ele terá força, vigor e poder, e
será capaz de fazer coisas para si e para outros. O alimento e a água produzem esta
mudança. Na vida cristã é exatamente a mesma coisa; e este é um modo como nos
tornamos fortes “no Senhor e na força do seu poder”.

Como cristãos, recebemos força e poder da semente da vida que é colocada em nós.
Todavia a semente terá que medrar e desenvolver-se, e nós temos que tomar
medidas, providenciando para que a vida de Deus a nós dada medre, se desenvolva
e constantemente seja cada vez mais forte.

Para mostrar como isso acontece, devemos resumir o ensino que trata deste
problema em quase toda parte da Bíblia. Começo falando de comida e bebida
porque estas vêm em primeiro lugar. Como as obtemos? O nosso Senhor responde
pessoalmente no versículo trinta e cinco do capítulo seis do Evangelho Segundo
João; “Aquele que vem a mim não terá fome, e quem crê em mim nunca terá sede”.
Comida e bebida satisfazem a fome e a sede. Em Cristo as encontramos, indo a Ele,
e perseverando em ir a Ele. “Aquele que vem” - que persevera em vir a Mim - “não
terá fome, e quem crê” - quem persevera em crer - “nunca terá sede.” No mesmo
capítulo, no versículo 53, lemos: “Jesus pois lhes disse: na verdade, na verdade vos
digo que, se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue,
não tereis vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem
a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia, Porque a minha
carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem
come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele”. E mais:
“Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo (ou por causa do) Pai,
assim, quem de mim se alimenta, também viverá por mim”. Aí temos ensino profundo
e místico. Certos ouvintes reagiram e disseram: “Duro é este discurso; quem o pode
ouvir?” Do que é que Ele está falando? “Como nos pode dar este a sua carne a
comer?” (versículo 52), perguntaram eles. Tropeçaram nisso. Na verdade nos diz a
passagem que “muitos dos seus discípulos tornaram para trás, e já não andavam com
ele” (versículo 66). Não puderam entender as palavras do Senhor e, na verdade,
ofenderam-se com elas.

Portanto, estas palavras chegam a nós como uma prova. A nossa reação a estas
palavras proclama exatamente o que somos e onde estamos. Nada mais glorioso e
maravi lhoso jamais foi oferecido aos seres humanos, e, todavia, é possível às
pessoas rejeitar a mensagem e ter

profunda aversão por ela. Parecia que todos O estavam abandonando, pelo que o
nosso Senhor voltou-Se para os discípulos e disse: “Quereis vós também retirar-
vos?” Pedro, sem entender plenamente o que estava falando, disse: “Senhor, para
quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna. E nós temos crido e conhecido
que tu és o Cristo, o Filho de Deus”.

Então, que quer dizer isso? Diz o nosso Senhor que as Suas palavras são espírito,
não carne. Ele não está falando de coisas materiais. Está falando de maneira
espiritual. Eleestá utilizando umaanalogiaaqui.Oque Ele quer dizer, e diz, é: o Pai
Me enviou, e Eu vivo por causa do Pai. Vivo pelo Pai, e recebo Minha força, Minha
nutrição e Meu poder do Pai. Isto faz parte do que a encarnação envolve. Jesus não
tinha deixado de ser o Filho de Deus, mas tinha assumido a natureza humana. Agora
estava vivendo a Sua vida como homem, com a natureza humana. Não estava vivendo
em termos da Sua d ivindade; esta continuava nEle, porém Ele não vivia por ela.
Estava vivendo uma vidade completa dependência do Seu Pai. Por isso orava com
tanta regularidade como orava. Diz Ele: Eu vivo pelo Pai; isto é, do Pai Eu retiro
aMinhaforça, aMinha nutrição, tudo que é Meu. E Ele diz que, de igual maneira, o
homem que verdadeiramente crê em Mim, vive por causa de Mim. Ele Se expressa
em termos de comer Sua carne e beber Seu sangue; o que realmente significa assumi-
lO, crer nEle como Ele é em toda a Sua plenitude, e daí por diante viver uma
vida determ inada, dirigida e governada por esta fé nEle, por esta rendição a
Ele, por esta confiança nEle e na força do Seu poder.

O Senhor fala d isso dramaticamente, naqueles termos, a fim de que possamos ver
que se trata de algo que eu e você temos de fazer de maneira total e completa. Não
basta que digamos: “Sim, eu creio no Senhor Jesus Cristo, cri nEle num dado
momento e, desde aquele momento, tenho sido sempre cristão”. A verdadeira fé em
Cristo leva a “comer a carne e beber o sangue”, q uer d izer, realmente comer e
beber, mastigar, engol ir, assimilar, fazer disso uma parte do seu ser, compreendendo
que Ele é o seu Pão da vida. “Eu sou o pão da vida”, diz Ele. Ele Se contrasta com o
maná do deserto, que era apenas um tipo e uma figura - algo dado para manter o bem
estar físico - e, contudo, um grandioso tipo do que Ele ia fazer quando viesse. “Eu
sou o pão da vida... se alguém comer deste pão, viverá para sempre”, diz Ele. Todo
aquele que comer de Mim jamais morrerá, neste sentido espiritual, porque está
recebendo vida, torna-se “participante da naturezadivina”, alimenta-se de um
manácelestial.
Ele estásealimentandodeMim,estávivendoemMim,estávivendoporMim, está vivendo
porque Eu Sou o que Sou e realizei a obra que o Pai Me deu

para realizar. Jesus o expressa em termos de carne e sangue para que possamos
compreender como esta obra é completa, para que possamos compreender que
realmente nós temos de “apropriar-nos” de Cristo. Uma crença meramente intelectual
é insuficiente. É preciso que Cristo Se torne a nossa vida-o nosso alimento, a nossa
bebida, tudo para nós. Esse é o significado, de qualquer forma uma parte do
significado, que se pode expandir infinitamente, daquela espantosa declaração feita
pelo nosso Senhor no Evangelho Segundo João, capítulo 6.

Permitam-me colocá-lo doutro modo, usando aanalogia que o próprio apóstolo usou
nesta Epístola, capítulo 4, especialmenteversículol6,onde ele de novo nos lembra
que a Igreja é o corpo de Cristo, e que Cristo é a sua Cabeça -“Do qual todo o
corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo ajusta
operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor”.
Significa que, evidentemente, tudo provém da cabeça, e que tudo o que temos de
fazer é dar-nos conta da nossa dependência da cabeça. Toda a energia vital vem de
Cristo, vem da cabeça, do cérebro. Ele é a fonte de todo o poder, desta energia,
desta energia que percorre os nervos, pela qual vivemos e nos movemos, a
nossa energia muscular e de todo o nosso ser. Para fortalecer-me “no Senhor e na
força do seu poder”, tenho de compreender que Cristo é a Cabeça, que sou uma parte
dEle e que dependo completamente dEle para a obtenção desta força e poder. Eu
funciono como parte do corpo com todo o meu poder; mas a energia, eu sei, vem
dEle, e dela eu vivo. Ponho a minha confiança nEle, comendo e bebendo a carne e o
sangue do Fi Iho do homem. O primeiro princípio, e o mais importante, é que sempre
devemos compreender que retiramos de Cristo a nossa vida. Ele colocou em nós a
semente, entretanto tudo o que é necessário para que ela medre e se desenvolva
provém dEle. Ele no-lo dá, e nós temos de participar do que Ele nos dá cada vez
mais.

Passemos a seguir para algo ainda mais prático. Cristo é a nossa comidaeanossa
bebida, mas, devido ànossadébil condição, precisamos de algo que nos ajude a
participar dessa comida, de algo que nos dê maior apetite para nos alimentarmos
dela. E isso se acha nesta Palavra, nesta Palavra escrita; por isso ela nos foi dada.
Cristo nos vem como alimento por meio da Bíblia. E, ao mesmo tempo, ela é um
tônico. Deixem-me lembrá-los da afirmação que o apóstolo Paulo faz aTimóteo, que
era um jovem temperamental, inseguro e instável, sempre pronto a afligir-se e
a alarmar-se. Com facilidade o diabo fazia Timóteo ficar deprimido; ele pôde
aterrorizá-lo e afligi-lo lembrando-lhe que Paulo estava velho e em breve teria de
morrer. Que poderiam fazer os crentes depois da partida

de Paulo? A quem poderiam escrever? Onde obteriam conselho? Paulo teria que
devolver a segurança a Timóteo. Diz ele: “Tu, pois, meu filho, fortifica-te na graça
que há em Cristo Jesus”. Noentanto, ele não se limita apenas à exortação; dá-lhe um
conselho prático quanto ao que ele tem de fazer. “E também todos os que piamente
querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Timóteo 2:1 e 3:12).
PaulodizaTimóteoque não fique deprimido por causa do desenrolar desses
acontecimentos mas que fique na expectativa. Assim como eles metêm perseguido,
diz Paulo, assim também perseguiriam aTimóteo e atodos os cristãos
verdadeiros. Então ele prossegue e acrescenta: “Mas os homens maus e
enganadores irão de mal para pior, enganando e sendo enganados. Tu,
porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem
o tens aprendido”. Essa é a maneira pela qual Timóteo pode fortalecer-se. E preciso
que ele se lembre das coisas que Paulo e outros lhe tinham ensinado. “E que desde a
tua meninice sabes as sagradas letras, que podem fazer-te sábio para a salvação,
pela fé que há em Cristo Jesus. Toda a Escritura é divinamente inspirada, e
proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para instruir em justiça; para
que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra”
(2 Timóteo 3:16-17).

Muitas outras declarações das Escrituras apontam na mesma direção. Há uma


particularmente bela no capítulo 20 do livro de Atos dos Apóstolos. Paulo está
dando as suas últimas palavras de conselho aos presbíteros da igreja de Éfeso,
exatamente a localidade para a qual esta Epístola que estamos estudando foi escrita.
“Olhai por vós mesmos”, diz ele, “e por todo o rebanho sobre que o Espírito Santo
vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu
próprio sangue” (versículo 28). E ainda: “Agora, pois, irmãos, encomendo-vos a
Deus e à palavra da sua graça; a ele que é poderoso para vos edificar e dar herança
entre todos os santificados” (versículo 32). É assim que o cristão se fortalece “no
Senhor e na força do seu poder”; não simplesmente sentando-se e dizendo: “Deixo
tudo com o Senhor, deixo tudo de lado e apenas fico olhando para Ele”. Você tem
que ser edificado, e o pode ser; a Palavra foi dada para que sejamos edificados e
fortalecidos.

Os textos que citei já bastam para provar de modo mais que suficiente que todas as
Escrituras foram providenciadas por essa razão. Alguma vez vocês já fizeram a si
mesmos a pergunta: por que Deus nos deu a B íblia? Esta é a resposta. Foi-nos dada
para fortalecer-nos, para edificar-nos em nossa fé santíssima. Obviamente, pois,
quanto mais partilharmos dela, mais fortes seremos. Se quisermos fortalecer-nos “no
Senhor e na força

do seu poder”, uma das primeiras coisas que temos de fazer é ler, mastigar e
assimilar completamente este Livro.

Ora, isso não significaapenas lerapressadamente a sua porção diária e sair correndo
para apanhar o seu trem. Isso não é realmente tomar a Bíbliacomoalimento. Creio
firmemente na leitura sistemática daBíblia. Há os que desperdiçam muito tempo
abrindo a Bíblia ao acaso ou lendo passagens favoritas. Não há nada melhor do que
ser um leitor sistemático da Bíblia e assegurar-se de passar pela B íblia toda ao
menos uma vez por ano. Contudo o diabo pode fazer disso uma armadilha. Você pode
ter a sua porção diária impressa num cartão, e o perigo está em você preocupar-se
mais com a leitura da sua porção diária do que com o que você está lendo. E isso
não lhe servirá de ajuda. Você pode ler por alto os versículos e deslizar sobre eles
de tal maneira que bem poderia estar lendo um romance. Você pode ter lido a sua
porção diária, mas captou a verdade? Realmente a assimilou? Todavia você não
pode engolir sem mastigar este alimento. Você tem que mascá-lo e mastigá-lo, de
modo que seja digerido completamente e venha a fazer parte da sua constituição
e edificá-lo. A Bíblia nos dá conhecimento, e o conhecimento nos edifica. O
verdadeiro entendimento, o verdadeiro conhecimento, é algo que nos fortalece, nos
edifica e nos firma na fé.

As Escrituras se nos recomendam da seguinte maneira: vejam o Velho Testamento,


por exemplo. Há muitos que insensatamente dizem que não vale a pena ler o Velho
Testamento. “Ah”, dizem eles, “isso está terminado para nós, estamos no Novo
Testamento. A históriajudaica do Velho Testamento é muito interessante a seu modo,
mas não tem nada para oferecer-nos a nós, cristãos.” Não é o que o Novo Testamento
diz a respeito do Velho Testamento. O apóstolo Paulo, por exemplo, em I Coríntios
10:6, refere-se a uma parte da história do Velho Testamento. Ele nos lembra que os
filhos de Israel foram tirados do Egito sob a liderança de Moisés, e que eles
passaram pelo Mar Vermelho. “E”, diz ele, “estas coisas foram-nos feitas em figura,
para que não cobicemos as coisas más, como eles cobiçaram.” Noutras palavras,
vocês podem aprender muito dos filhos de Israel no Velho Testamento. O versículo
11 acrescenta: “Ora tudo isto lhes sobreveio como figuras, e estão escritas para
aviso nosso, para quem já são chegados os fins dos séculos”.
Colocado diferentemente, aí está um homem do tempo do Novo
testamento confrontado pelo diabo e suas artimanhas, e pelos principados e
potestades. Como se deve fortalecer? Um modo muito bom, diz o Novo
Testamento, é ler o Velho Testamento. Não exclusivamente, é claro. Leiam o
Novo Testamento também, porém, certamente, leiam o Velho Testamento,

porque ali vocês verão algumas admoestações maravilhosas. Os filhos de Israel


eram o povo de Deus; mas vejam a história deles. Vejam o seu comportamento
vergonhoso e as derrotas a que foram submetidos. A vergonha lhes sobreveio porque
eles não se lembravam de que eram filhos de Deus. Começaram a por a sua
confiança em si mesmos, em seus exércitos, em seu poder. Fizeram aliança com o
Egito e com a Assíria, e foram derrotados; simplesmente porque foram tolos; não se
aperceberam de quem eles eram e não confiaram na força do poder do Senhor.
Leiam a história deles, diz o Novo Testamento; foi escrita para nossa aprendizagem.
Não cometam os mesmos erros que eles cometeram; olhem para eles, e estejam
advertidos.

Portanto, quando você lê o Velho Testamento, é advertido desta maneira justamente


contra este perigo. Quando você vê outros que se extraviaram, você é fortalecido. E
um argumento óbvio, não é? O homem sábio sempre aprende com os erros dos outros
que estão no mesmo ramo, seja este qual for. Ele vê um homem marchando para a
desgraça, e pergunta: “Bem, que foi que esse homem fez que não devia ter
feito? Onde errou? Que engano cometeu? Ah”, diz ele, “foi neste ou naquele ponto.
Muito bem, vou estar vigilante naquele ponto”. Pois bem, isso é sabedoria. Esse é
precisamente o argumento uti lizado aqui: “Estas coisas são exemplos para nós”.

Ou, vejam ainda Romanos 15:4: “porque tudo o que dantes foi escrito para nosso
ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos
esperança”. Foi por isso que a Igreja Primitiva decidiu incorporar o Velho
Testamento em seus novos documentos. O mesmo Deus, falando em ambos os
Testamentos; o mesmo povo de Deus é o assunto do registro de ambos. Podemos
aprender do Velho Testamento, e aprender tremendamente. Portanto, façamos uso
dele, tratemos de lê-lo, de assimilá-lo; ele nos fará fortes. À medida que vemos
as admoestações e os perigos, nós nos fortalecemos, pômo-nos em guarda, ficamos
prontos a bancar homens. Trabalhemos as suas lições aplicando-as a nós mesmos.

Chegando aoNovo Testamento, as lições são ainda mais óbvias. Por que foram
escritas estas Epístolas do Novo Testamento? Foram escritas para alimentar os
crentes que estavam sujeitos a errar apesar de crerem em Cristo. Muitos estavam
errando na doutrina, e porque erravam na doutrina, erravam em suas vidas. “As más
conversações corrompem os bons costumes” (1 Coríntios 15:33). No momento em
que um homem começa a brincar com a doutrina e andar no erro, é certo que toda a
sua vida irá na mesma direção. E isso que estamos testemunhando na Igreja e no

mundo hoje. Primeiro a Igreja erra na doutrina; depois erra no seu viver. Sempre
acontece dessa maneira.

Na Igreja Primitiva havia muitos crentes que se afligiam e se alarmavam, pelo que
homens de Deus foram movidos pelo Espírito de Deus para escreverem cartas a eles
a fim de fortalecê-los, alimentá-los, dar-lhes entendimento. E só quando temos
entendimento que podemos combater. Se você entra na vida cristã pensando que tudo
o que tem que fazer é tomar uma decisão e dizer que vai ser cristão; se você supõe
que nunca mais vai ter problemas e dificuldades, que estará sempre reel inado no
leito da serenidade, e que será levado para o céu sem fazer nada-se você adere à fé
com essas idéias e pensa que isso é cristianismo, não demorará a tornar-se desditoso
e infeliz. Ver-se-á fracassando, verá todas as coisas irem mal com você; terá todo
tipo de dificuldade e começará a perguntar se há mesmo algo no cristianismo. Muitos
entraram nessa experiência.

A resposta é conhecer o Novo Testamento, conhecer a verdade acerca da vida cristã,


compreender que “todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão
perseguições”. Paulo teve que dizer essa verdade a Timóteo repetidas vezes.
Timóteo queixava-se porque era persegu ido, que, embora fosse pregador e seguidor
de Paulo, estava sendo perseguido e havia gente que não estava sendo bondosa com
ele e que lhe estava fazendo coisas desagradáveis. Ele temiae tremia, indagando o
que o futuro teria reservado para ele. E Paulo teve que dizer-lhe: “Todos os que
piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições”. É inevitável. Foi o
que coube ao Mestre, e Ele exortava os Seus seguidores a esperarem o mesmo
tratamento. “Se chamaram Belzebu ao pai da família, quanto mais aos seus
domésticos?” (Mateus 10:25).

Também nós precisamos ouvir essas coisas. Sendo preparado dessa maneira pelo
ensino, quando me chegar a provação eu não tremerei nem me porei a correr; ficarei
firme e direi: “Resisto como homem de Deus. Esta é uma prova da minha vocação.
Estou sofrendo perseguição porque sou filho de Deus. Muito bem, estou pronto a
resistir”. Igualmente com todos os outros astutos ataques que nos sobrevenham em
conseqüência das artimanhas do d iabo.

Cada uma das Epístolas do Novo Testamento foi escrita para que sejamos
fortalecidos para o combate. Quanto mais conhecermos, mais capazes e mais fortes
seremos. Por outro lado, o ensino que lhe diz que você não tem de fazer nada, senão
deixar tudo com o Senhor, está realmente dizendo que todas estas Epístolas são
totalmente desnecessárias. Mas o Novo Testamento afirma que elas são essenciais.
Afirma

também que são necessários diferentes tipos de ensino em diferentes estágios da


experiência. “Com leite vos criei”, diz Paulo aos coríntios, “e não com manjar,
porque ainda não podíeis, nem tão pouco ainda agora podeis” (1 Coríntios 3:2).
Sejam quais forem as suas condições e o seu estado neste momento, há o alimento e a
bebida apropriada para você na Palavra. Se você é um bebê recém-nascido em
Cristo, há o “leite racional, não falsificado, para que por ele vades crescendo” (1
Pedro 2:2). Esse é o propósito de todas as Escrituras. Há leite para bebê; porém há
alimento mais forte, e o propósito a nosso respeito é que passemos ao alimento
mais forte, ao “sólido mantimento” (Hebreus 5:12). Sejam quais forem as
suas condições físicas, sejam quais forem as suas condições espirituais,
você precisa do alimento adequado. Você vive de leite enquanto é bebê, mas não vai
passar o resto da vida vivendo de leite. Você passa a ter “sólido mantimento”. Na
esfera física há diferentes tipos e graus de alimento. E é exatamente a mesma coisa
na vida cristã. Temos que ir adiante e ficar cada vez mais fortes, até chegarmos à
vida adulta. Por isso João divide a Igreja em “filhinhos”, “jovens” e “pais” (1 João
2:13-14) - diferentes graus, de acordo com a maneira pela qual eles cresceram e se
desenvolveram.

Também devemos considerara oração. A oração não é senão outro modo de receber
sustento, força, vigor e poder. A oração não é só feita de petições; a oração é,
primariamente, amizade e comunhão com Deus. Cristo diz: “Eis que estou à porta, e
bato; se alguém ouvir a minha voz, e abrir a porta, entrarei em sua casa, e com ele
cearei, e ele comigo” (Apocalipse 3:20). Não é uma declaração evangel ística, é
dirigida à Igreja, aos cristãos autênticos. Ele Se dispõe a entrar e cear conosco. É
esse o significado da oração. Não é apenas elevar as nossas petições e fazer
os nossos pedidos a Deus. S ignifica abrir a porta, Cristo entra, toma assento no
outro lado da mesa e fala com você durante a refeição. Amizade e comunhão! E
quando você conversa com Ele e com Ele ceia, você recebe dEle força e poder. Você
Lhe faz pedidos, e Ele fala com você sobre Ele e sobre o Seu interesse por você e
sobre como Ele cuida de você. Oração é comunhão, é ter comunhão, é manter uma
conversação com Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo. É assim que a
gente se fortalece.

Os maiores santos sempre foram homens de oração, e passavam muito tempo em


oração. Os crentes do Novo Testamento, quando em dificuldade, sempre buscavam a
Deus em oração. E quando oravam não começavam falando dasuadificuldade;
começavam adorando, prestando culto e louvando a Deus. Sempre começavam
apercebendo-se da Sua presença e tomando consciência da Sua presença. Um dos
maiores

homens de oração do século passado foi o piedoso George Muller, de Bristol. Era
experimentado na oração; e ele ensinava que a primeira coisa que se deve fazer na
oração é dar-se conta da presença de Deus. Você não deve começar falando
imediatamente. Você pode proferir muitas frases, mas será melhor não fazê-lo se não
tiver se apercebido da presença de Deus. É preciso haver esta amizade, esta
comunhão, esta conversação. E a percepção de que você está em Sua presença
é infinitamente mais importante do que qualquer coisa que você possa dizer. Quando
a temos, enchemo-nos de energia e poder.

Outra vez é óbvia uma analogia humana. Quando você está na presença de uma
pessoa piedosa, sempre você se sente melhor, você se sente mais forte. Multiplique
isso pelo infinito e verá que a percepção da presença do Deus Triúno é a maior fonte
possível de poder, vigor e energia.

Por último, lembremo-nos das ordenanças - o batismo e a Ceia do Senhor - em


particular a segunda. O objetivo da Ceia do Senhor é fortalecer-nos, dar-nos vigor,
energia e vida. “Tomamos de Cristo.” De novo precisamos lembrar-nos de evitar o
erro no qual caíram osjudeus que se ofenderam com as palavras do nosso Senhor e
que as intepretaram carnalmente, e não espiritualmente. Não cremos
natransubstanciação, não acreditamos em nenhuma mágica desse tipo. Não, na Ceia
há um “tomar” espiritual do Senhor. Ele escolheu esta analogia simples, e ela nos
ajuda muito. Os homens comem pão e bebem vinho, e isso é uma figura da maneira
pela qual “tomamos dEle”. Não somente recordamos Sua morte. Começamos com
isso; mas também nos lembramos de que Ele ressuscitou e de que Ele é a Cabeça da
Igreja, que nos dá vida e poder. “Tomamos dEle,” “Tomamos de Ti, Pão vivo!”
Alimentamo-nos de Cristo, participamos dEle, e nos lembramos de que Ele é a nossa
vida, o nosso vigor, a nossa energia, tudo para nós. Ele nos fortalecerá,
nos habilitará a voltarmos à pelejae a lutarmos como homens. Aqui vemos a razão
para participarmos da Ceia do Senhor. Não há nada nela que, num sentido, você não
receba da Palavra pregada, entretanto é um outro meio para recebê-la. Ele designou
a pregação da Palavra, Ele designou também esta ordenança - o partir do pão e o
beber do vinho. E deste modo participamos dEle. Alimentamo-nos com o Pão da
vida. Ele é o maná celestial, é o alimento de Deus para a alma, e tomamos dEle. E
saímos da participação na Ceia com novo poder, novo vigor, fortalecidos “no
Senhor e na força do seu poder”; Deus faz abundante provisão para nós, e é
nosso dever participar abundantemente daquilo que Ele providenciou. É desse modo
que nos fortalecemos “no Senhor e na força do seu poder”.
EXERCÍCIO

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do sen poder. ” -


Efésios 6:10

O nosso último estudo foi relacionado com comida e bebida. A próxima coisa
necessária é que devemos exercitar-nos. E como nos fortalecemos no sentido físico.
Comida e bebida, certamente; mas depois exercício. Também é de vital importância
na vida espiritual. A mesma idéia pode-se ver no capítulo 12 da Epístola aos
Hebreus: “Corramos com paciência a carreira que nos está proposta” (versículo 1).
Nada é mais importante nessa corrida do que manter-nos em forma, do que exercitar-
nos. Muitos estão falhando em sua vida espiritual porque não fazem exercício, e
muitos estão confusos.

Primeiro, não há nada mais importante do que exercitar-nos regularmente. Corramos


“com paciência”; quer dizer, vamos com “resistência paciente”. Este é um dos
grandes segredos da vida cristã, o segredo de conhecer em sua plenitude o conforto e
a consolação do ensino cristão. Temos que fazer este exercício com regularidade.

Ao examinarmos isto em detalhe, estudemos primeiro o aspecto espiritual. Vejam,


por exemplo, este ponto como se vê em muitos outros lugares do Novo Testamento.
Aqui se me diz que eu me “fortaleça no Senhor” e que “resista”. Na Epístola aos
Hebreus é-me dito que eu “corra com paciência a carreira que me é proposta”. Judas
o expressa na sua Epístola da seguinte maneira: “Mas vós, amados, edificando-vos a
vós mesmos sobre a vossa santíssima fé, orando no Espírito Santo, conservai-vos a
vós mesmos no amor de Deus, esperando a misericórdia de nosso Senhor Jesus
Cristo para a vida eterna” (versículos 20 e 21). De novo, longe de não fazermos
nada e de “transferir tudo ao Senhor”, temos que “conservar-nos a nós mesmos no
amor de Deus”, temos que “edificar-nos a nós mesmos sobre a nossa santíssima fé”,
temos que “orar no Espírito Santo”, e temos que “esperar a misericórdia de
nosso Senhor Jesus Cristo”.

Não há nada mais óbvio acerca do ensino do Novo Testamento do que isto, que a
vida cristã é uma vida de atividade, uma vida de vigor, uma vida de esforços. A
força nos é dada pelo Senhor, mas nós temos que agir.

Temos que edificar-nos a nós mesmos, temos que “conservar-nos a nós mesmos no
amor de Deus”. E o dever de pregar não consiste apenas em dizer uma palavra
temporária de conforto, que logo será esquecida; é edificar-nos na fé que, venha o
que vier, estaremos seguros. Sempre temos a tendência de estar à procura de alguma
droga mágica; você toma a droga, e tudo está bem. Estamos sempre à espera de que
algo seja feito por nós de repente, rapidamente, enquanto nos descontraímos
passivamente. Entretanto, esse nunca é o método de Deus. Temos que “correr uma
carreira”, temos que “edificar-nos a nós mesmos sobre a nossa santíssima fé”, temos
que ser capazes de “estar firmes contra as astutas ciladas do diabo” no pior dia que
se possa imaginar. E, se é que havemos de fazer estas coisas, temos que preparar-
nos.

A Epístola aos Hebreus nos diz com vigor exatamente o que temos de fazer. Temos lá
um homem escrevendo a vários cristãos que estavam em condições de desânimo e
infelicidade. Estavam enfrentando grandes problemas, estavam num “dia mau”.
Estavam sendo perseguidos, mal compreendidos e provados, suas casas tinham sido
saqueadas, seus bens tinham sido roubados, simplesmente porque haviam se tornado
cristãos. Alguns se sentiam na maior desgraça, quase desistindo, quase se rendendo,
como acontece com muitos no presente século, que se acham sem nenhuma
esperança. O autor lhes escreve com o fim de tratar desse estado de coisas, e, longe
de dizer-lhes apenas uma palavra de conforto, longe de lhes dar tapinhas nas costas e
dizer-lhes palavras agradáveis, diz uma das coisas mais sérias e severas que se pode
achar em todas as Escrituras. Pensem nos capítulos seis, dez e doze, por exemplo.
Essa é a característica da Epístola em geral; e é dessa maneira que a Palavra
de Deus nos vem hoje. A nossa mensagem não é sentimental, não é apenas um pouco
de conforto que leva os ouvintes a derramarem uma ou duas lágrimas, e depois a
esquecerem tudo a respeito. É uma mensagem dura, é “ração de ferro para a alma”, é
um chamado para “sermos homens”, para “corrermos uma carreira”, para “edificar-
nos a nós mesmos”. Estudemos o seu programa e o seu método.

A primeira coisa que nos cabe fazer, nesta questão de exercitar-nos no sentido
espiritual, é agarrar-nos ao que temos. Os cristãos hebreus estavam correndo o risco
de, como a Epístola diza eles no começo do seu capítulo dois, deixar “escapar estas
coisas” ou “desviar-se destas coisas”. “Portanto”, diz o autor, “convém-nos atentar
com mais diligência para as coisas que já temos ouvido, para que em tempo
algum nos desviemos delas”, ou “para que em tempo algum as deixemos escapar”
(VA), como um navio escapando das suas amarras, ou um anel

saindo do dedo. Esse é o tipo de analogia que está sendo utilizado, Assim, a
primeira coisa que temos de fazer é agarrar-nos a estas coisas, estar absolutamente
seguros delas. Nunca houve época em que necessitássemos desta exortação mais do
que a época atual.

Temos que segurar-nos especialmente nas promessas. Estas promessas as


encontramos, não somente nas Escrituras, mas também em nossos grandes hinos. O
conforto e a consolação das Escrituras para o cristão num mundo como este não é
nada que este mundo tem para oferecer, mas, antes:

Há um país de prazer puro,

Onde imortais os santos reinam.


“No mundo”, diz o Senhor Jesus Cristo aos Seus discípulos, “tereis aflições” (João
16:33). “Ah”, dizem as pessoas, “mas isso é muito entristecedor; eu pensava que o
cristianismo tinha alguma esperança para oferecer.” Todavia você tem que receber o
cristianismo como ele é. Você só pode esperar cair em depressão, se continuar
buscando algo neste mundo!

A primeira coisa que temos de aprender é que este mundo não tem esperança
nenhuma para nos dar. A nossa tarefa neste mundo não consiste em cair e ficar sobre
os nossos pés até o fim, resistir no dia mau, e, “havendo feito tudo, ficar firmes”, Se
você tiver êxito em fazer isso, a vitória pertence a Deus e a Cristo. Todos os demais
fracassam. A nossa única consolação e esperança, aquilo a que devemos agarrar-nos,
é a “esperança proposta” (Hebreus 6:18). Eis como isso é exposto no versículo
cinco do capítulo dois da Epístola aos Hebreus: “Porque não foi aos anjos que
sujeitou o mundo futuro, de que falamos”. Corremos “a carreira que nos está
proposta” através deste mundo, a caminho daquela glória que no mundo por vir
aguarda o povo de Deus. O povo cristão deve estar sempre olhando para a frente. O
autor da Epístola aos Hebreus continua dizendo isso. Vejam o tema de novo no
capítulo seis: “Desejamos que cada um de vós mostre o mesmo cuidado até ao fim,
para completa certeza da esperança” (versículo 11). E de novo, no mesmo capítulo
vemos: “para que por duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta,
tenhamos a firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio em reter a
esperança proposta”.

A mensagem cristã não celebra e não louva o passado; seu interesse está em fazer-
nos olhar para o futuro. O passado só nos ensina a pôr a nossa esperança nas coisas
de cima e a correr a carreira que nos é

proposta. São estas as coisas às quais devemos apegar-nos. Se não temos certeza
sobre estas coisas, não há esperança para nós. Se você de algum modo tem os olhos
postos neste mundo, só pode ser infeliz, ou logo o será. Mas o que o cristianismo diz
é que não devemos ter os olhos postos neste mundo, pois é um mundo condenado e
pecaminoso. No entanto, existe outro mundo - “a esperança proposta”; “o mundo
futuro, de que falamos”. Esse é o mundo a que devemos apegar-nos e, portanto,
apegarmos a todas as promessas de Deus a ele concernentes. Faz parte do exercício
do cristão segurar-se firme no mundo vindouro. “Toma posse da vida eterna”, diz
igualmente Paulo a Timóteo (1 Timóteo 6:12). Não apenas tocá-la com as mãos, mas
agarrá-la e segurá-la firme e apertado.

Permitam-me, porém, acrescentar o que o próprio autor da Epístola aos Hebreus


acrescenta. No fim do capítulo cinco ele tem mais uma coisa para dizer-lhes. Ele
estava lhes apresentando a doutrina do nosso Senhor como Sumo Sacerdote,
masdiz:“Doqualmuitotemosquedizer,dediíícil interpretação; porquanto vos fizestes
negligentes para ouvir. Porque, devendo já ser mestres pelo tempo, ainda necessitais
de que se vos torne a ensinar quais sejam os primeiros rudimentos das palavras de
Deus; e vos haveis feito tais que necessitais de leite, e não de sólido
mantimento. Porque qualquer que ainda se alimenta de leite não está experimentado
na palavra dajustiça, porque é menino. Contudo, o mantimento sólido é para os
perfeitos, os quais, em razão do costume, têm os sentidos exercitados para discernir
tanto o bem como o mal”.

Essadeclaraçãoé vital. Eladizefetivamente: vocês, cristãos hebreus, estão em petição


de miséria, infelizes e desanimados, porque não fazem exercício. Vocês estão fracos
e não cresceram. Tenho carne suculenta para dar-lhes; tenho doutrinas que lhes darão
força e vigor. O adulto não pode viver de leite, precisa de alimento forte que forme
os seus músculos e lhe dê energia e vigor. Ele não pode viver de leite, não pode
funcionar só com leite, precisa deste alimento mais forte. Mas, continua ele,
não posso dá-lo a vocês, porque vocês não conseguem assimilá-lo. Ainda
são crianças; não são homens. Já deviam ser capazes de ensinar outros, porém, ao
invés de poderem ensinaroutros, vocês estão choramingando e chorando como
crianças, porque vocês são ignorantes.

Acaso isto não nos vem como uma censura a nós? O mundo à nossa volta está
completamente sem esperança; devíamos ser capazes de oferer-lhe esperança.
Somos? Este é o dever do cristianismo. Não estamos aqui para falar de política. O
meu dever e o seu é ajudar o nosso vizinho da porta ao lado que, por causa das
condições do mundo, está alarmado e aterrorizado, e não sabe o que fazer ou para
onde voltar-se.

Devíamos ser capazes de ensiná-lo. Somos? “Vocês já deviam ser mestres”, diz o
escritor de Hebreus, “mas vocês próprios se acham em tal miséria e infelicidade, e
com tanta incerteza e dúvida, que não podem ensinar ninguém, pois vocês mesmos
continuam ignorantes. Faço-lhes uma pergunta simples: vocês são capazes
dedizeraos seus vizinhos como resistir, como olhar para aquele glorioso mundo
futuro? Vocês conhecem o plano de salvação? Estão claros para vocês os princípios
elementares do evangelho de Cristo? Vocês podem falar aos outros sobre Ele?
Podem dar “a razão da esperança que há em vós”? - para usar as palavras e a
linguagem do apóstolo Pedro (1 Pedro 3:15). Se não somos capazes disso, só há uma
explicação: não exercitamos os nossos sentidos com relação a estas coisas. É
exatamente isso que o autor da Epístola aos Hebreus diz: “Mas o mantimento sólido
é para os perfeitos, os quais, em razão do costume, têm os sentidos (as suas
faculdades, o seu entendimento) exercitados para discernir tanto o bem como o mal”.
Significa que temos de gastar tempo para entender e estudar estas verdades,
estas grandes doutrinas da fé cristã. Somente quando fizermos isso é que
nos tornaremos fortes, nos tornaremos homens, e poderemos receber al imen-to mais
forte, e assim poderemos crescer, ser vigorosos e ser capazes de ensinaroutros.
Não há dúvida deque os cristãos mais infelizes e desanimados hoje são os que não
exercitam os seus sentidos com relação a esta Palavra de Deus. Não podemos viver
de retalhos na esfera espiritual. Temos que descer a estas verdades profundas das
Escrituras; temos que arranjar tempo para as ler e para ler livros a respeito delas. A
dificuldade hoje, como já vem acontecendo há muitos anos, é que os cristãos não
lêem as Escrituras, não se esforçam para entendê-las. Dizem eles: “Ah, sou
muito ocupado, tenho coisas demais para fazer, e a vida é muito cansativa na época
atual”. Mas os nossos antepassados, que trabalhavam mais duro, e muito mais horas,
e por salários muito menores, achavam tempo. Aqueles homens costumavam ler as
Escrituras e estudá-las. Geralmente compravam uma Bíbl ia que tinha um comentário
no fim de cada página, e a estudavam, e tomavam tempo com isso. Também liam
outros livros que os ajudavam a entender as Escrituras. “Exercitavam os
seus sentidos”; e era isso que os tornava fortes. Esse era o segredo dos mártires
protestantes. Era igualmente o segredo dos Pactuários da Escócia, no século
dezessete. Aqueles homens eram fortes porque conheciam as Escrituras, e conheciam
a verdade das Escrituras. Tinham exercitado os seus sentidos. Dedicavam tempo ao
exercício; viviam pela Palavra. E assim deixaram de ser crianças e se tornaram
homens fortes e vigorosos.

Eu e vocês temos que comportar-nos de maneira semelhante. Não há substituto para


isso. Não nos sentamos e “simplesmente vemos Jesus” fazer tudo isso por nós. Essa
doutrina é falsa; não hesito em usar esse termo. Temos que exercitar os nossos
sentidos, temos que edificar--nos em nossa santíssima fé. Não nos acontece
automaticamente; não há atalhos na vida cristã.

Se você quiser edificar-se, exercite-se nas Escrituras. Todas as ilustrações que usei
apontam realmente para a mesma grande e gloriosa verdade. E à medida que
pusermos isso em ação e perseverarmos, não será necessário estar sempre voltando
aos princípios elementares. A Igreja Cristã hoje tende a viver unicamente na esfera
dos princípios elementares. As pessoas parecem pensar que nada importa, exceto
a evangelização, e assim a própria Igreja fica mais fraca, em vez de mais forte.
Omeiodeevangelizar é, em última anáPse, edificaralgreja. Secada membro da Igreja
Cristã fosse adulto, fosse forte, e pudesse receber alimento forteeensinaroutros,
vocês veriamqueomundoseriaevangelizado de um modo nunca dantes conhecido. Eu
e vocês é que devemos fazer isso. Não é para ficarmos sentados em multidões e
deixarmos que um ou dois façam tudo. O propósito é que todos nós sejamos mestres;
cada um de nós; e esta é a maneira pela qual nos tornamos mestres. Jamais houve tal
oportunidade para o cristão individual comoaque há neste momento.

Depois disso o autor da Epístola aos Hebreus prossegue e diz aos seus leitores
alguma coisa mais. No capítulo dez, versículos 24 e 25, lemos: “E consideremo-nos
uns aos outros, para nos estimularmos ao amore às boas obras, não deixando a nossa
congregação, como é costume de alguns, antes admoestando-nos uns aos outros; e
tanto mais, quanto vedes que se vai aproximando aquele dia”. Captamos o
significado destas palavras? Os que só vêm à casa de Deus em ocasiões especiais,
ou quando têm alguma necessidade particular, e nunca noutras ocasiões, nada sabem
da vida cristã, e tampouco sabem se são cristãos afinal. Os cristãos hebreus estavam
falhando, sentiam-se desventurados e infelizes, em parte porque não se reuniam para
exercitar juntos os seus sentidos espirituais.

Vocês não somente precisam fazer exercícios privadamente, mas também precisam
fazer exercício juntos. A Igreja é a criação especial de Deus para o Seu povo. Ele
deu apóstolos, evangelistas, profetas, mestres e pastores para a edificação do Seu
povo, para habilitá-lo atornar-se forte. Esse é o significado e o propósito do
ministério. Essa é a minha função como pregador e mestre; para isso fui chamado.
Passo o meu tempo estudando este Livro e tentando expô-lo. “Mas”, você diz, “eu
mesmo posso lê-lo.” Sei que pode; porém é uma boa coisa ouvir também

exposições dele. Há coisas nele que você não viu, e é função da pregação chamar a
atenção para elas. E é por isso que você deve vir ouvi-la. Nós nos ajudamos uns aos
outros quando falamos uns com os outros e discutimos juntos estas coisas. “A
comunhão dos santos.” “Não deixando a nossa congregação, como é costume de
alguns, antes admoestando-nos uns aos outros; e tanto mais, quanto vedes que se
vai aproximando aquele dia.”

O cristão frouxo é sempre um cristão acabrunhado - sempre resmungando e


reclamando, perguntando porque isto, porque aquilo. A resposta a isso é fazer mais
exercício, exercitar os seus sentidos na Palavra, vir para ouvir a exposição da
Palavra, aproveitar todas as oportunidades para fazê-lo.

Contudo, vejamos o ponto deste modo também: você é capaz de ajudar outros e de
ensinar outros? Se não é, a razão pode bem ser que você só freqüenta um local de
culto uma vez no domingo, ou talvez menos freqüentemente. Você imaginaque é
suficiente. Mas, se é suficiente, por que você falha, por que você não consegue
prestar boa ajuda aos outros? Você precisa de toda a ajuda que puder receber,
especialmente quando vê “que se vai aproximando aquele dia”. E “aquele dia” está
se aproximando, e convém que tiremos proveito de tudo o que Deus providenciou
para nós. A comunhão dos santos é uma das coisas que Deus providenciou; portanto,
façamos pleno uso dela.

Pois bem, o autorde Hebreus aindatem mais umaexortação. Tendo dito o que já
consideramos, ele escreve o capítulo onze, o qual ele resume no princípio do
capítulo doze, dizendo: “Portanto nós também, pois que estamos rodeados de uma
tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo o embaraço, e o pecado que tão de
perto nos rodeia”. Ele tinha falado sobre o pecado maneira completa, mas agora fala
desta grande “nuvem de testemunhas”. Ele tinha dito algo sobre elas no capítulo
onze: tinha revisto a história e destacara certos homens. Tinha-os escolhido
em função de suas vidas gloriosas e da maneira pela qual eles triunfaram
e sobressaíram. Ele vê aqueles gigantes da fé um após outro, como freqüentemente a
B íblia faz. Faz isso com o fim de nos dar ânimo e ajuda. Exorta-nos a fazer certas
coisas, a apegar-nos à verdade, a agarrar-nos firmes a ela, a exercitar os nossos
sentidos, a viver segundo a Palavra, a estudá-la, a entendê-la, a congregar-nos e a
ajudar-nos uns aos outros. E então, graças a Deus, por fim ela nos anima, concitando-
nos a considerar os grandes homens do passado, a estudá-los e ver por que eles se
alteiam como gigantes espirituais. Devemos repassara lista completa e pensar
em homens como Abel, Noé, Abraão, Moisés, Davi, Jefté e todos os outros

grandes homens de fé. Todos eles viveram no mesmo mundo em que eu e vocês
vivemos; o mundo foi sempre o mesmo. E no registro a respeito deles lê-se como se
segue: “Os quais pela fé venceram reinos, praticaram a justiça, alcançaram
promessas, fecharam as bocas dos leões, apagaram a força do fogo, escaparam do
fio da espada, da fraqueza tiraram forças, na batalha se esforçaram, puseram em
fugida os exércitos dos estranhos. As mulheres receberam pela ressurreição os seus
mortos; uns foram torturados, não aceitando o seu livramento para alcançarem
melhor ressurreição; e outros experimentaram escárnios e açoites, e até cadeias e
prisões. Foram apedrejados, serrados, tentados, mortos ao fio da espada; andaram
vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados (dos
quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos e montes, e pelas covas e
cavernas da terra”.

Esse era o tipo de mundo no qual eles viveram. O nosso mundo não é pior; todavia é
igualmente mau. Eles viveram num dia mau, e nós vivemos num dia mau. Mas
aqueles homens triunfaram. Foram figuras heróicas, foram capazes de permanecer
firmes, de resistir. Tendo feito tudo, permaneceram inabaláveis, ficaram fu mes como
homens, e até hoje se destacam na história como gigantes.

O segredo deles é que eles fizeram precisamente as coisas que os cristãos hebreus
não estavam fazendo. Aqueles homens eram fortes “no Senhor e na força do seu
poder”; eles “exercitavam os seus sentidos” para poderem entender a verdade de
Deus; eram homens que sabiam diferenciar entre o bem e o mal. Vejam um homem
como Moisés. Criado como filhodafilhade Faraó, podiater sido oherdeirodo trono.
Entretanto ele pôs isso de lado, e o fez porque tinha os olhos postos “na
recompensa”. Esse é o segredo de todos aqueles homens; e eu e vocês
devemos observá-los e pensar bem no seu exemplo.

É desta maneira que aqueles homens do passado realmente nos ajudam. Vemo-los
fazerem extamente o que somos chamados a fazer. Eles correram a carreira, e
triunfaram. Eles se edificaram a si mesmos na sua santíssima fé. Eles ficaram firmes
contra as astúcias do diabo, apesar de todo o sofrimento por que passaram. Que
homens magníficos! A história deles foi escrita para ajudar-nos e fortalecer-nos.
Você não se sente melhor sempre que lê sobre eles? É um tônico excelente.
Quando você achar que a luta está sendo demais para você, que tudo está
contra você, e quando você se queixar de tudo o que lhe está acontecendo, leia o
capítulo onze da Epístola aos Hebreus. Se no fim você não se envergonhar de si
mesmo, você é um pobre cristão. E pobre cristão você será, se não se levantar e não
disser: “Sim, eles fizeram aquilo no poder

de Deus, e eu vou fazer o mesmo. Se Deus os capacitou, Ele me capacitará”. Esse é


o constante argumento das Escrituras. Tiago cita o caso de Elias. Diz ele: “Elias era
homem sujeito às mesmas paixões que nós” (5:17). Não havia nadade peculiar em
Elias que explicasse as coisas que ele fez; foi Deus que o capacitou. Muito bem,
façam como ele, diz Tiago. E assim foi com todos eles. O livro de Jó é, todo ele, um
grande tratado sobre este assunto. Considerem a paciência de Jó, e como Deus o
tratou no fim, e o abençoou.

Ler a respeito desses homens ajuda-nos a fortalecer-nos e nos anima a prosseguir


com os nossos exercícios. Se procedermos assim, viremos a ser como eles. Sigam-
nos, sigam essa caravana de heróis; são homens como esses que devemos imitar e
que devemos tomar por modelo.

E assim passamos ao nosso derradeiro princípio: “Portanto nós também, pois que
estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo
embaraço, e o pecado que tão de perto nos rodeia, e corramos com paciência a
carreira que nos está proposta, olhando para Jesus, autor e consumador da fé, o qual
pelo gozo que lhe estava proposto suportou a cruz, desprezando a afronta, e
assentou-se à destra do trono de Deus. Considerai pois aquele que suportou
tais contrad ições dos pecadores contra si mesmo, para que não
enfraqueçais, desfalecendo em vossos ânimos. Ainda não resististes até ao
sangue, combatendo contra o pecado”. O Filho de Deus é a mensagem fundamental.
“Olhando para Jesus”, que veio deliberadamente a este mundo mal, a este mundo de
guerras, pecado, vergonha e indignidade. Ele não pertenciaaestemundo. Veio aele
deliberadamente; Ele sofreu e suportou a contradição dos pecadores contra Si. Ele
“resistiu até ao sangue”. E isso tudo “pelo gozo que lhe estava proposto”. Ele tinha
conhecimento do lugar para onde ia e da glória vindoura. Por isso “suportou a
cruz, desprezando a afronta”.

É desse modo que se faz exercício, é desse modo que se “corre a carreira” que nos é
proposta. É desse modo que você se edifica em sua santíssima fé! Esta é a única
mensagem para os homens e para as mulheres num mundo como o de hoje. Não
podemos mudar as circunstâncias, mas podemos triunfar nelas. Podemos ser: “mais
do que vencedores”; e nos tornamos tais quando nos achamos “olhando
para JESUS”. Olhem para Ele! Olhem as noites que Ele passou em oração, olhem o
Seu conhecimento da Palavra de Deus, olhem o modo como Ele “exercitava os Seus
sentidos”. E todos os que O seguem têm feito o mesmo; todos eles são Seus
imitadores.

Devemos tornar-nos Seus imitadores. Devemos olhar para além dos

homens, devemos olhar para o Filho de Deus e para o que Ele fez para “livrar-nos
do presente século mau” (Gálatas 1:4), e introduzir-nos na glória que nos espera com
Deus.

Cristãos, o mundo está olhando para vocês, esperando de vocês ensino, instrução,
um exemplo de como viver vitoriosamente. Exercitem, pois, os seus sentidos,
agarrem-se a estas coisas, olhem para os grandes heróis da fé, buscando deles
inspiração. Acimade tudo, olhem para Jesus, “o autor e consumador da fé”, e assim
vocês se fortalecerão “no Senhor e na força do seu poder”, e serão capazes de
resistir no dia mau quando este chegar. Há somente um meio pelo qual podemos
“ficar firmes” num tempo como esse, e é conhecer esta verdade, fortalecer-nos nela
e, havendo feito tudo, “ficar firmes”.

DISCIPLINA

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” -


Efésios 6:10

Tendo examinado a importância da nutrição e do exercício na vida cristã, o próximo


passo é, evidentemente, pôr em prática as nossas forças, sendo que o nosso
propósito é viver a vida cristã em sua plenitude. Portanto, agora passamos a
considerar o que temos de fazer na prática dos fatos; e, ao aplicarmos os nossos
princípios praticamente, veremos que, por fazermos isso, crescemos. “A prática faz
o mestre.” Certíssimo! E quanto mais usarmos as nossas faculdades, mais se
desenvolverão. Noutras palavras, a melhor forma de exercitar-nos e, em última
análise, a melhor maneira de manter as nossas forças, é realizar a nossa obra. Notem
a diferença que há entre o homem que tem de trabalhar para ganhar a vida, e o ricaço
que apenas faz exercício para conservar a sua saúde. O que trabalha não precisa
fazer exercício porque quando está trabalhando está exerc itando o corpo todo. O
homem rico não trabalha da mesma maneira, e assim tem que passar algum tempo
fazendo exercício para manter as suas energias. Ambos têm valor. É bom fazer
exercício, mas, afinal de contas, a melhor forma de exercitar-se é fazer
algum trabalho, estar em atividade. Nunca estamos em posição ou condição
mais perigosa do que quando estamos ociosos. Há muitas ilustrações disso
nas Escrituras. O maior pecado de Davi, a sua queda mais terrível, num sentido
resultou do fato de que ele estava sem fazer nada. Os seus exércitos estavam
travando grandes batalhas, porém ele estava em casa, em Jerusalém, com pouca
coisa para fazer. E foi por causa da sua ociosidade que veio a tentação e o apanhou.
Isaac Watts, num de seus poemas para os jovens, lembra-nos isto:

Em obras de engenho ou arte Quero estar ocupado;

Pois satanás acha algum mal

Para incumbir mãos ociosas.

E verdade. Quando as suas mãos estão ociosas, quando você não está fazendo nada,
satanás está sempre pronto a tirar vantagem da

situação e vem seduzi-lo. É perigoso ficar nessa condição. Por isso o cristão é
exortado em muitas partes das Escrituras a manter-se ativo na obra do Senhor.
Naturalmente, da maneira certa! Não estou defendendo um mero e tolo ativismo, uma
agitação em atividade sem sabermos o que estamos fazendo. Estou falando da vida
cristã normal. Esta é uma distinção que está sendo esquecida hoje. Pessoas há que
pensam que ser ativo significa fazer algo fora de nós, por assim dizer, ao passo que
a principal atividade a que sempre somos exortados nas Escrituras é viver a vida
cristã propriamente dita. Essaé a mais elevada forma de atividade para os que não
são chamados de maneira especial para alguma tarefa peculiar com relação à vida da
Igreja Cristã.

Não conheço maneira mais sucinta e mais conveniente de considerar esta espécie de
atividade, este viver a vida cristã em sua plenitude, a que somos exortados, do que
examinar o que vemos no início da Segunda Epístola de Pedro, capítulo primeiro, a
partir do versículo cinco. Aqui o apóstolo Pedro exorta as pessoas a quem estava
escrevendo a fazerem exatamente aquilo que o apóstolo Paulo tem em mente no fim
desta Epístola aos Efésios. “E vós também, pondo nisto mesmo toda a diligência,
acrescentai à vossa fé a virtude.” Mas, antes de examinarmos isto em detalhe, quero
acentuar mais uma vez o elemento da nossa atividade. Devemos apegar-nos com
firmeza a este princípio. Não podemos ter esperança de progredir, enquanto não
virmos isto claramente. Pedro não diz: “Passem tudo às mãos do Senhor; vocês não
têm que fazer nada. Confiem tudo a Ele, deixem tudo com Ele, Ele o fará por vocês”.
O que ele diz é: “Pondo nisto mesmo toda a diligência”. É uma exortação a nós.
Temos que dar ao assunto “toda a atenção”, temos que estar constantemente nisto,
temos que aplicar-nos a isto, acrescentar virtude a virtude (versículos 5,6,7). O
acréscimo não será feito em nosso lugar por outrem; nós temos que fazê-lo. Assim
como um homem não pode fortalecer-se apenas se assentando e lendo livros sobre
exercícios, assim também o cristão não se fortalecerá enquanto não fizer o que
Pedro recomenda. Ele tem que fazer isso, é sua atividade, e esta é feita à medida que
ele se fortalece e se torna vigoroso e poderoso no Senhor.

Mas por que nos é dito isso tudo? A resposta de Pedro é: “Porque, se em vós houver
e abundarem estas coisas” - se vocês fizerem todas estas coisas, noutras palavras, se
vocês acrescentarem ou fornecerem à sua fé todas as coisas adicionais mencionadas
- “não vos deixarão ociosos nem estéreis no conhecimento de nosso Senhor Jesus
Cristo”. A nossa maior necessidade é ter este “conhecimento do Senhor”;
porque, quanto mais O conhecermos, e quanto mais soubermos a Seu respeito,

mais conheceremos a Sua força e a força do Seu poder. Depois Pedro coloca o ponto
negativamente: “Aquele em quem não há estas coisas é cego, nada vendo ao longe”.
Não somente isso -“havendo-se esquecido da purificação dos seus antigos pecados”.
Ele não compreende o que lhe aconteceu, e não vive realmente como cristão.
“Portanto”, diz ele ainda, positivamente, “irmãos, procurai fazer cada vez mais firme
a vossa vocação e eleição.” Você não se elege a si próprio, mas o que você faz afeta
a sua segurança da sua eleição; você pode, por assim dizer, fazê-la mais firme ou
mais segura desta maneira. Então, para esclarecer bem o dever, Pedro acrescenta:
“porque, fazendo isto, nunca jamais tropeçareis”. Todavia, se você não o fizer, você
cairá; o diabo o enredará, os principados e potestades, os príncipes das trevas deste
século, as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais, enredarão você, e
antes de saber o que está acontecendo, você cairá. Como é que alguém pode ensinar
uma doutrina de passividade à luz de palavras como essas?

Este é o modo de “ficar firmes”, diz Pedro; “fazendo isto, nunca jamais tropeçareis”.
Mas tudo isso é questão de atividade nossa; é como esta força e este poder
aumentarão. Depois ele faz um resumo, dizendo: “Porque assim vos será amplamente
concedida a entrada” - vocês não entrarão pura e simplesmente - “no reino eterno de
nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo”. Vocês terão uma “entrada amplamente
concedida”, será uma entrada gloriosa, as trombetas soarão, haverá
grande aclamação.

Estas preliminares são importantes, Elas nos lembram que temos de agir, temos de
pôr “toda a diligência”. É-nos dado poder, poder que pertence à vidaque estáem nós;
e, portanto, a exortação pode serdirigida a nós. E, à medida que praticarmos estas
coisas, seremos cheios de força, cada vez mais, e ficaremos cada vez mais fortes no
Senhor e na força do Seu poder.

Então, que é que temos de fazer? O apóstolo Pedro diz: “Acrescentai à vossa fé”
(versículo 5) - e esta expressão é muito interessante. Significa “suplementá-la”, ou
ainda melhor, “supri-la”, “abastecê-la”. Parece que a palavra tem sua origem em
algo que se fazia com relação ao teatro grego. Eles não se limitavam à representação
concreta da peça propriamente dita, mas a supriam ou suplementavam ou elaboravam
ou, por assim dizer, preenchiam com um coro e várias outras coisas. Essa é a
expressão aqui utilizada pelo apóstolo Pedro - “supri-la”. Você tem o seu enredo ou
a suahistóriaessencial, o conteúdo propriamente dito; mas não o leva ao palco
apenas, você o supre de algo, você cria motivações,

você o torna mais completo, desenvolve-o. Esse é o significado da expressão.


Podemos dividir o que de fato nós temos de fazer na prática como segue:
naturalmente, estas coisas se fundem uma na outra - o exercício e a aplicação prática
da atividade. Uma leva à outra inevitavelmente, de modo que ocorre alguma
sobreposição. A primeira exortação trata de questõesde disciplina pessoal. Pedro
nos diz várias coisas. “Acrescentai à vossa fé a virtude.” O sentido da palavra
virtude mudou. Ligamos ao presente um sentido particular ao termo “virtude”; mas
não é esse o sentido aqui. O significado essencial da palavra é “vigor” ou
“energia moral”. É uma palavra que descreve “a força da alma”.

Talvez seja bom estudar esta palavra negativamente, a fim de verificar o seu sentido
exato. Quando ele diz: “Acrescentai à vossa fé a virtude”, está empregando um modo
de dizer: “Não sejam moles”; “Não sejam letárgicos”. Se você abordar umatarefa,
seja qual for, numa condição ou com um estado de espírito frouxo, um tanto
desanimado e meio dormindo, você não somente fará mal a tarefa, mas também
ficará tremendamente cansado. A primeira coisa que o homem tem que fazer é
reanimar e controlar a si mesmo, isso é, a essência da sabedoria em toda e qualquer
forma de atividade. Noutras palavras, é preciso que não nos arrastemos ao nosso
trabalho, e que não o abordemos com preguiça ou com desânimo. Esse tema poderia
ser desenvolvido facilmente na atualidade. Às vezes me pergunto se todo o futuro
deste nosso país não vai ser determinadojustamente por este princípio. Parece que os
homens não gostam mais de trabalhar. Arrastam-se para o trabalho; mostram-
se preguiçosos; há falta de vigor, desta “virtude”, desta energia, desta vivacidade.

A primeira coisa que lhe compete fazer, diz Pedro, agora que você tem fé, é levantar-
se, livrasse dessa moleza, dessa letargia, dessa estagnação. “Junte forças!” E algo
que todos nós temos de fazer. Por isso, mexa-se, levante-se, diga a si mesmo: “Tenho
este trabalho para fazer, e tenho que me dedicar de vez aeste trabalho”. Esse é o
significado da expressão. Longe de relaxar e se deitar no leito do sossego, e
de somente colher os frutos da vitória, você tem que reanimar-se e agir. Talvez você
acorde de manhã sentindo-se frouxo e letárgico. Pois bem, se você tentar fazer o seu
trabalho com esse quadro mental, não só o trabalho será mal feito, mas também você
estará muito cansado no fim. Este é um fato extraordinário. Por outro lado, porém, se
você se levantar e juntar forças procurando animar-se, não só trabalhará melhor,
mas também estará muito menos cansado no fim.

Este princípio parece ter que ver com a própria constituição física da pessoa. Os
seus músculos precisam estar retesados. Vocês já viram um cachorro relaxado
completamente, talvez deitado ao pé do fogão? Então algo acontece, e imediatamente
o cão estica os músculos e fica pronto e tenso na correia. Esse é o princípio, e é
igualmente válido na vida cristã. São numerosos demais os cristãos moles. Há
muitos de nós que padecem daquilo que Charles Lamb chamou “caxumba e sarampo
da alma”. Vivemos cansados e letárgicos demais; temos ociosidade demais.
Temos que encher-nos de coragem.

Isto você pode fazer. Você pode dizer: “Não me sinto bem”. Mas, com muita
freqüência, você não se acha tão mal como pensa. Não é esse muitas vezes o
problema? Este é um conhecido fato psicológico. Grande parte da chamada “cura
pela fé” atual pode-se explicar adequadamente do seguinte modo: o que ela faz é
causar bem-estar psicológico às pessoas. Sempre “acrescentamos” algo àquilo de
que estamos sofrendo; assim, sempre você pode “sacudir-se”. Certamente não se
deve forçar isso, levando-o a um extremo ridículo. Quando você está de fato
doente, precisa de cama e tratamento. Mas estou falando daquelas
condições hipocondríacas, daquele valetudinarismo de que todos nós tendemos
a sofrer tanto. Há somente uma coisa que fazer neste caso, e é sacudir-se, juntar
forças e agir. Não seja mole, mas diga a si próprio: “Tenho este trabalho para fazer”,
e logo você se verá sentindo-se notavelmente bem e poderá realizar bem o seu
trabalho. “Acrescentai à vossa fé a virtude.”

Vocês não sentem que enquanto consideram estas coisas vocês já tomam consciênc ia
de derivar forças do Senhor? É como a ordem de um grande comandante. Quando se
dirige a você ele lhe infunde força. Concreta e fisicamente, ele não lhe fez nada; mas
colocou em você um novo espírito, e você junta as forças e se sente mais forte.
“Acrescentai à vossa fé a virtude.”

Pedro continua, e fala do conhecimento, com o que não precisamos demorar-nos,


porque já estivemos tratando disso elaboradamente. “Acrescentai à virtude o
conhecimento” (VA); “discernimento”, “entendimento”. Quanto mais conhecimento
tivermos da verdade cristã, e quanto mais a entendermos, mais fortes seremos.

Passemos, pois, ao próximo acréscimo - “temperança”. “Acrescentai ao


conhecimento temperança.” Aqui está de novo um termo cujo significado e cuja
conotação se estreitaram nos tempos atuais. As pessoas tendem a pensar em
temperança unicamente na questão das bebidas alcoólicas. Isso está incluído, é
claro, mas a palavra tem significação mais ampla. O Movimento Pela Temperança,
assim chamado,

realmente não é pela temperança, porque em geral os seus membros falam em


abstinência total. Temperança, em sua essência, significa “domínio próprio”. Como
devo fortalecer-me no Senhor? Devo apenas esperar que algo aconteça? Não, você
se tornará mais forte se se dominar.

Este é, em certo sentido, o princípio da conservação da energia. Muitos de nós


somos fracos porque desperdiçamos as nossas forças. Se conservássemos a nossa
energia, seriamos muitos mais fortes. Todos nós gastamos muita energia
desnecessariamente. Uma das maneiras mais comuns disso é quando falhamos em
nosso domínio próprio. Se não conseguimos dominar-nos, que esperança haverá para
nós quando nos defrontarmos com o inimigo, o diabo? Olhem os atletas profissionais
-futebolistas e outros - e observem a disciplina que eles têm de exercitar. Não lhes é
permitido fumar, não lhes é permitido beber quando uma grande partida está
próxima. Eles têm que viver por essa partida, e têm que dominar-se. Têm que
refrear-se em muitas coisas que gostam de fazer e que normalmente fazem. Exige-se
deles que se disciplinem a si mesmos para que estejam em forma na grande
competição.

Isto é ainda mais verdadeiro na esfera espiritual. Falhar em nosso domínio próprio é
uma perda de energia. Estas coisas podem ser avaliadas concretamente. Quando digo
“domínio próprio”, incluo o domínio do temperamento, o domínio do espírito. Vocês
já viram alguém tremer de raiva? Quanta energia ele está disperdiçando! Ele está
emitindo energia numa proporção tremenda porque não consegue dominar o seu
temperamento e o seu espírito. E, naturalmente, ele fica sendo como massa mole nas
mãos do diabo. Quando um homem não consegue dominar-se, que possibilidade terá
de lidar como inimigo? A disciplina é absolutamente essencial num exército; é uma
das coisas mais importantes. Um exército sem disciplinajá está derrotado, torna-se
uma multidão desordenada.

A Bíblia contém muito dessa espécie de ensino. É tema da maior importância no


livro de Provérbios. O sábio, ao tratar desta matéria, diz: “Melhor é o longânimo do
que o valente” (Provérbios 16:32). O que ele está dizendo é que o homem
longânimo, lento para irar-se, o homem que dom inao seu temperamento, é afinal
muito mais forte do que o valente que perde as estribeiras. O segundo homem é mais
poderoso por natureza, mas, se ele dissipar e desperdiçar a sua energia por não
dominar o seu temperamento, perderá a batalha. O primeiro homem não tem nada
que se assemelhe à energia vital e à capacidade, nem à força do segundo, mas ele se
domina; e quem se domina, muitas vezes vence alguém que é muito melhor na tarefa e
que tem muito mais força, simplesmente porque é firme

e confiável. Vê-se isso com freqüência nos jogos. Um homem pode ser um tenista
brilhante, porém se é instável e tem mau temperamento, provavelmente perderá a
partida, e alguém que não está na mesma categoria o vencerá simplesmente porque se
mantém equilibrado e é capaz de dominar-se. O brilhantismo, por si só, não o levará
ao sucesso; é igualmente necessário que você tenha disciplina. Este é um
princípio sumamente importante com relação à força física. O sábio do livro
de Provérbios era um grande observador da vida, e ele chegou à conclusão de que o
homem que governa o seu ânimo, o seu espírito, é mais poderoso do que aquele que
toma uma cidade. Que energia espiritual desperdiçamos muitas vezes por pura falta
de domínio próprio!

Dá-se precisamente o mesmo com todas as outras coisas que tendem a dominar-nos.
Não somente o temperamento, mas também os nossos desejos íntimos, os instintos e
todos os impulsos. Todos eles são legítimos em si mesmos, entretanto, se você não
os dominar, logo você perderá a sua força. Se você comer demais, logo ficará
letárgico; terá muito menos força, embora tenha assimilado muita fonte de energia.
Visto que você não a utiliza, ela vira gordura, e você se debilita e perde a
vitalidade. Finalmente você se torna mais ou menos inútil, se não conseguir
dominar o seu apetite. É a mesma coisa com os outros apetites. Não importa
quão grande é o cérebro de um homem, se ele beber demais, logo o seu cérebro lhe
falhará. Quantas tragédias têm havido nessa área! E o mesmo acontece com todos os
outros instintos que Deus nos deu.

A fé, a virtude, o conhecimento visam contribuir para o nosso fortalecimento; mas se


o homem não se dominar, haverá dissipação e desperdício de energia. Eu poderia
dar-lhes alguns exemplos biográficos notáveis para i lustrar o que estou dizendo. O
domínio próprio é absolutamente essencial. Isto é óbvio em todas as áreas da vida.
Se você tem uma ocupação e está a frente de vários homens, se realmente quer obter
o máximo deles, você tem que dominar o seu temperamento. Se não o dominar não
terá domínio sobre os homens que estão a seu cargo. Poderão temê-lo até um certo
ponto, porém farão o mínimo, e só o farão enquanto você os estiver vigiando. Se
você quiser conquistar a confiança deles e conseguir o máximo deles, comece
dominando-se a si próprio: para dominar os outros, domine-se a si mesmo.
“Temperança!” Tratemos de exercitá-la em todos os aspectos e sempre, pois tudo
isso é verdade, tanto na esfera espiritual como em todas as demais.

O próximo passo é que devemos acrescentar “paciência”. A vida cristã é uma vida
muito ativa. Leva tempo e causa aborrecimento dominar-se e exercitar disciplina.
Ninguém pode fazer isso em seu lugar,

você tem que fazê-lo pacientemente. “Ah”, dirá alguém, “mas certamente se pode ter
uma experiência que nos livra de todo esse esforço!” Segundo o apóstolo Pedro, não
há! Se houvesse tal coisa, ele o diria. Em vez disso ele nos concita a “acrescentar”, a
“pôr toda a diligência”, a “suprir”. Quando você tiver acrescentado isto, vá adiante e
acrescente aquilo. Acrescente “paciência”.

“Paciência” significa o que normalmente entendemos que significa, mas há algo que
podemos acrescentar ao uso comum. Realmente significa “resistência paciente” ou
“constância paciente”. Significa “ir adiante”, “continuar de maneira paciente”. Este é
o sentido normal, o sentido bíblico da palavra. Significa que você prossegue
perseverantemente. Você não faz as coisas começando e parando, começando
e parando. Dessa maneira você nunca ficará forte. De novo as analogias são óbvias.
Conheço homens que vez após vez resolvem fazer exercício para se fortalecerem.
Eles continuam por algum tempo, e os resultados parecem maravilhosos; todavia
depois param, e retrocedem, voltando a ser como eram antes. Depois eles
recomeçam.Nunca se fortalecem, porque agem por impulsos passageiros. Isso é
profundamente verdadeiro na vida cristã. Você não poderá ter esta classe de vida,
não poderá ser forte ou tornar-se forte e vitorioso nesta vida fazendo as coisas
espasmodicamente.

Ou coloquemos a questão desta maneira: não espere até estar com disposição para
fazer as coisas; levante-se e faça. O homem que fica esperando pela disposição,
provavelmente nunca a terá. É um dever; é uma exortação. Não faça as coisas só
quando está disposto; faça também quando não estiver disposto. Depois sentirá
disposição para fazê-las. Este é o meio de resolver o problema. Não fique tremendo
na beira; arroje-se, vá avante, e logo você estará gostando. “Quem observa o vento
nunca segará”, porque nunca semeia; está sempre hesitante, sempre indagando. ,

Dá-se o mesmo na vida cristã. Não há nada que seja mais importante do que essa
continuidade constante, persistente, venha o que vier. Haverá impeciihos, haverá
obstáculos, haverá decepções, haverá oposição e perseguições; não deixe que estas
coisas façam alguma diferença. Prossiga pacientemente. Isso tem que ser feito em
todos os departamentos da vida. Talvez você seja um estudante, ou exerça uma
profissão, ou faça o que fizer, continue; nunca espere vir a disposição, comece
fazendo o trabalho. Derrame um pouco d’água na bomba e então será capaz de tirar
água da bomba!1 Temos que nos por em ação, e continuar indo. “Constância
paciente!”

Depois Pedro acrescenta “piedade” à paciência. Aqui chegamos a uma categoria


diferente. Afastamo-nos, por assim dizer, da esfera da disciplina puramente pessoal
e agora nos examinamos a nós mesmos em nossa relação com Deus. Este é o centro e
a chave de tudo. Piedade não é uma palavra popular hoje, no sentido de verdadeira
religiosidade, mas é umapalavramuito boa. Significa consciênciade estar andando à
vista de Deus, e com Deus. “Enoque andou com Deus” - isso é piedade. É-
nos ditaamesmacoisadeNoé.Noutraspalavras,estesdoishomensestavam cônscios de
que viviam na presença de Deus. Andavam sob as vistas de Deus, e andavam “com
Deus”. Isso também é algo que temos de fazer e do que devemos lembrar-nos
sempre. As Escrituras nos falam repetidamente a respeito, no entanto nós temos que
lembrar-nos do que elas nos dizem. É por isso que nós temos que acrescentar
“piedade”. Mais uma vez, isso ninguém faz para você, você tem que acrescentar este
elemento, a piedade. Você tem que obedecer a ordem que certa ocasião foi dada
a Abraão: “Anda em minha presença e sê perfeito” (Gênesis 17:1). Essa ordem vem
a cada um de nós. Deus nos ordena: “Anda em minha presença e sê perfeito”. É
como se Ele estivesse dizendo: trate de dar-se conta que você está sempre na Minha
presença e de que está sempre fazendo estas coisas, não somente para Mim, mas
também com a percepção de que Eu o estou observando, e observando-o com prazer.

O apóstolo nunca secansavadedizer-nosamesmacoisa.Dizele no fim do capítulo dois


da Segunda Epístola aos Coríntios: “Porque nós não somos, como muitos,
falsificadores da palavra de Deus, antes falamos de Cristo com sinceridade, como de
Deus na presença de Deus”. Ele diz algo similar no capítulo 4. Ele lhes conta como
realiza o seu trabalho: “rejeitamos as coisas que por vergonha se ocultam, não
andando com astúcia nem falsificando a palavra de Deus; e assim nos
recomendamos à consciência de todo homem, na presença de Deus, pela
manifestação da verdade”. Que palavra para os pregadores! Esse é o único modo
de pregar. Você prega à igreja, naturalmente, mas não deve estar vendo só a igreja
reunida, deve estar vendo a Deus também - “na presença de Deus”. O que mais
importa é que Deus está olhando do alto para você. Pregue apercebido de que você
está na presença de Deus. Isso é piedade. Você não prec isa tornar-se monge ou erem
ita ou anacoreta, e entrar num mosteiro, para ser piedoso. Ser piedoso significa
realmente que você está sempre cônscio de que está fazendo tudo “na presença de
Deus”. E, fazendo assim, você se encherá do poder e da força que vem do
Senhor. Portanto, “acrescentai à paciência piedade”.

A seguir Pedro passa a falar da nossa relação com os outros:

“acrescentai à piedade amor fraternal”. Isto explica-se a si mesmo. Seja bondoso


com o seu irmão. Há muitos cristãos fracos, e a principal causa da sua fraqueza é que
eles não amam seus irmãos. Desperdiçam muito tempo e energia pensando mal dos
outros. Isso é sumamente esgotante; sempre tira muito da sua energia. Pensar mal dos
outros sempre enfraquece você; seja o que for que cause ou deixe de causar aos
outros, sempre faz grande dano a você. Como você poderá orar no Espírito,
se estiver pensando mal dos outros? Como poderá sair e tentar ajudar outros, se você
estiver condenando algum irmão? É impossível. “Nós sabemos”, diz João, “que
passamos da morte para a vida, porque amamos os irmãos” (1 João 3:14). O amor é
uma prova de vida. Todo este fracasso por não amarmos o irmão simplesmente extrai
energia de nós. Se você toma o seu tempo com pensamentos duros, maldosos, cruéis,
vingativos, você se enfraquecerá; e acabará sendo completamente
imprestável. Portanto, se quisermos fortalecer-nos no Senhor e na força do Seu
poder, amemos os irmãos.

Há diferença entre amar e gostar. Não se nos diz que gostemos de todos; não se
espera isso de nós, porque somos diferentes. Há pessoas das quais você, por
natureza, gosta mais do que de outras. Mas recebemos ordem para que “amemos” a
todos, para que sejamos bondosos para com todos, para que os tratemos como
irmãos, seja como for que reajamos a eles no sentido físico ou psicológico. Todos
nós sabemos disso por experiência. Se você exercitar a bondade fraternal, você se
sentirá melhor, você se sentirá mais forte, e estará preparado para enfrentar
o inimigo. Ao passo que, se você se sentir miserável e infeliz, e estiver cheio de
pensamentos maldosos, o inimigo já terá mais ou menos derrotado você antes de
começar a peleja. Quanto mais exercitarmos a bondade fraterna, quanto mais
fizermos o bem e ajudarmos uns aos outros, mais fortes nos tornaremos. Este é um
grande princípio da vida cristã. “Mais bem-aventurada coisa é dardo que receber”
(Atos 20:35). Quanto mais você der, mais terá. O homem que semeia pouco, também
colhe pouco, mas o que espalha e semeia em todas as águas, por assim dizer,
lançando o seu pão sobre as águas, depois de muitos dias colherá abundantemente.
Esse é o homem que vai tornar-se forte.

“E ao amor fraternal caridade.” Significa “amor”, e amor universal a todos. De novo


lhes lembro que não significa “gostar”. Há muitas coisas odiosas acerca dos
pecadores e acerca dos outros, porém devemos amá-los como Cristo nos amou. Por
isso, acrescente à sua bondade fraternal este elemento final, que é o princípio do
amor.

Aí estão, pois, esses elementos vitais efetuados na prática; e à medida

que praticarmos todos eles, e todas as outras exortações do Novo Testamento,


ficaremos cada vez mais fortes. “A prática faz o mestre.” Quanto mais
acrescentarmos à nossa fé estas várias outras qualidades, mais fortes seremos no
Senhor e na força do Seu poder. São essas as coisas que devemos fazer sempre. Não
podemos relaxar nunca. Jamais temos férias na esfera espiritual; sempre devemos
estar fazendo estas coisas - comer, beber, exercitar-nos, praticar, pôr todas essas
coisas em prática destas várias maneiras. Essa deve ser a nossa constante, a
nossa perpétua ação.

Há mais uma questão. Como hei de fortalecer-me “no Senhor e na força do seu
poder” na batalha real? Terei que fazer todas estas coisas, mesmo quando por algum
tempo, o d iabo me deixa em paz; mas que tenho de fazer em plena refrega? Como
vou me fortalecer no Senhor e na força do Seu podernajuta renhida, no calor da
batalha? Só menciono umacoisa por enquanto. É o uso do Seu nome. O uso do nome
do Senhor é uma tremenda fonte de poder. Vemos isso também no livro de
Provérbios, capítulo 18, versículo 10: “Torre forte é o nome do Senhor” - somente o
Seu nome, lembrem-se! “Torre forte é o nome do Senhor; a ela correrá o justo, e
estará em alto refúgio.”

Mas há outros exemplos notáveis de como usar o Seu nome e o poder do Seu nome.
Vocês se lembram da história de Gideão? Gideão era um simples JoãoNinguém.
Vinhade uma tribo nada importante, e pertencia a uma das menores famílias daquela
tribo. Entretanto Deus o chamou para levantar-se e lutar contra os midianitas; e eles
tinham exércitos numerosos. Deus, porém, vocês se lembram, não permitiu que
Gideão tivesse um grande exército. Deixou-o apenas com um punhado de homens -
300 -e os restantes foram mandados embora. Como foi que ele combateu? Confiou
somente em sua própria força? Não, o seu grito de guerra foi -“Espada do Senhor e
de G ideão”. Aí está a nossa doutrina, perfeitamente ilustrada. Gideão não disse:
“Homens, sigam-me; em nome de Gideão, vamos atacá-los. Eis aqui a espada de
Gideão, sigam-me”. Tampouco disse: “Espada do Senhor”. Aí está o perfeito ensino
escriturístico -“Espada do Senhor e de Gideão”. “Confie em Deus e mantenha seca a
sua pólvora!” Tanto a confiança como a pólvora entram. É a espada do Senhor -
certamente; sem ela estamos perdidos. Sim, mas é a espada do Senhor, e a “de
Gideão”. E assim eles partiram para a batalha, combateram com todo o seu poder e
força, e obtiveram uma grande vitória.

Mas o maior de todos os exemplos é, de muitas maneiras, o de Davi e Golias. Estes


incidentes do Velho Testamento, além de constituírem

história, são ao mesmo tempo parábolas perfeitas da grande verdade escriturística


que nos está sendo ensinada aqui, em Efésios, capítulo 6, sobre estarmos “firmes
contra as astutas ciladas do diabo” e sobre a nossa luta “contra os principados e
potestades”. Tudo isso nos é ensinado naquele quadro de Golias e Davi: a luta é
desigual. Olhem para esse gigante. Ele vence todos os outros, ninguém pode resistir-
lhe. Por outro lado, eis aí Davi, um simples rapaz. Não consegue mover-se com
a armadura de Saul, não consegue manejar a espada de Saul. Ele tem uma funda e
algumas pedras. Isso é tudo! Mas Davi triunfou, e isso porque enfrentou Golias
segundo a piedade (I Samuel 17:45). “Davi porém disse ao filisteu” - que estivera
ridicularizando Davi e tentando amedrontá-lo, aborrecê-lo e derrotá-lo antes de
começar o confronto - “Tu vens a m im com espada, e com lança, e com escudo;
porém eu venho a ti em nome do Senhor dos exércitos, o Deus dos exércitos de
Israel, a quem tens afrontado. Hoje mesmo o Senhor te entregará na minha mão, e
ferir-te--ei, e te tirarei a cabeça”. Notem que Davi luta “em nome do Senhor, o Deus
dos exércitos de Israel”; e no momento em que profere “o nome” ele se enche de
confiança, força, poder e energia; e lhe é dada uma retumbante vitória.

El iseu, no início da sua carreira, serviu-se do mesmo princípio. Elias tinha acabado
de ir parao céu, e ali ficou Eliseu, diante do Jordão. Pouco antes ele tinha visto Elias
agitar a capa e com ela dividir o rio; e ali ficou ele, enfrentando o momento da sua
grande prova. Estará ele apto e forte o bastante para suceder Elias como profeta de
Deus? Notem como ele encara a sua tarefa. Diz ele: “Onde está o Senhor, o Deus de
Elias?” Esse deveria ser o grito de guerra da Igreja hoje, parece-me,
combatendo como estamos os principados e as potestades. Tanto em geral como
em particular, é isso que deveríamos dizer. Não temos por que ser fracos, hesitantes,
frágeis e desanimados. Devemos dizer: “Onde está o Senhor, o Deus de Elias? Onde
está o Deus de nossos pais, onde está o Deus dos reformadores, onde está o Deus
dos puritanos, onde está o Deus dos primeiros metodistas? Onde está Ele, o Deus
dos avivamentos? Em Seu nome podemos ser fortes e poderosos”.

PassemosaoNovoTestamento. Vejam Pedroe João, nos primeiros dias da Igreja


Cristã. Eles deparam com um coxo à Porta Formosa do templo. Que é que eles
devem fazer? Eis o que disse Pedro: “Não tenho prata nem ouro; mas o que tenho
isso te dou. Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levanta-te e anda” (Atos 3:6). O
nome! O poder do nome! Foram Pedro e João que de fato falaram e agiram, mas
puderam fazê-lo porque usaram o poder do nome do Senhor. “Torre forte é o nome
do Senhor” - sempre!

Observem o apóstolo Paulo escrevendo ao nervoso e amedrontado jovem Timóteo.


Elejálhehaviadito: “Sofre as aflições como bom soldado de Jesus Cristo”. Ele
dissera a Timóteo que juntasse as suas forças e seguisse adiante. Agora ele quer dar-
lhe algo que realmente o encha de poder, pelo que diz: “Lembra-te de que Jesus
Cristo, que é da descendên-ciade Davi, ressuscitou dentre os mortos, segundo o meu
evangelho” (2 Timóteo 2:8). Cristo não venceu somente os homens, não venceu
somente o diabo, venceu a morte e o túmulo, o último inimigo. Ele é todo-
poderoso. Lembrem-se disso! E ao lembrar-se disso, o homem se fortalece
no Senhore na força do Seu poder. O nome, a lembrança do podere do efeito do
nome do Senhor ressurreto faz maravilhas.

E assim eu leio no livro de Apocalipse, “Eles o venceram (o inim igo) pelo sangue
do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho” (12:11). Eles ameaçaram o diabo
com Ele, e com essa ameaça o venceram. Esta é a única maneira. Ah, sim, diz um
homem séculos mais tarde:

Quão suave é o nome de Jesus Aos ouvidos do crente;

Cura as tristezas e as feridas E expulsa o seu temor.

O nome o fortalece. O nome de Jesus o faz. “Quão suave é o nome de Jesus!”


“Expulsa o seu temor.” Você sabe usar este nome? Sabe invocá-lo? Sabe o que é ser
fortalecido ao simples som dele? Ei-lo aqui de novo:

Forte no Senhor dos exércitos E no Seu grandioso poder,

Quem confia em Cristo e em Sua força,

Sim, é mais do que vencedor.

O cristão luta, mas confia neste nome, invoca-o, e ele o fortalece. E assim ele é
“mais do que vencedor”.

Espero que todos nós saibamos usar o nome do Senhor desta maneira. Isto sempre
me íaz pensarem algo que ouvi muitas vezes quando eu era menino. Tive o privilégio
de ser criado num povoado, numa pequena comunidade onde todos nos conhecíamos.
Às vezes um valentão ameaçava um rapazinho, e este ficava aterrorizado porque não
tinha nenhuma possibilidade contra o valentão. Que é que o rapazinho fazia? Bem,
eis o que com freqüência eu ouvia: o rapazinho sabia que estava perdido, que
não podia fazer nada; mas muitas vezes ele parava o valentão simplesmente dizendo:
“Vou falar com meu pai sobre você”, ou: “Se você me bater, vou contar ao meu
irmão maior”. E o valentão, por mais valentão que fosse, ficava com medo do nome
do pai. E eu e você, em nossa fraqueza e incapacidade, devemos ameaçar o diabo
com o nome do nosso Pai e do nosso bendito Senhore Salvador. Ameace-o! “Resisti
ao diabo, e ele fugirá de vós.” Diga-lhe: “Sei que sozinho não posso fazer
nada contra você; mas, se você relar em mim, Ele me vingará”. Ameace-o com o
nome do Senhor. Ele é uma torre forte, e o justo corre para lá e fica a salvo. O nome
não acrescenta nada à sua força, no sentido puramente físico e material, porém
coloca força dentro de você infundindo-lhe confiança. O simples nome, a própria
palavra, dá-lhe energia; você pode ameaçar o valentão que o está ameaçando, e você
pode pô-lo a correr.

Este é um princípio que se vê em toda parte na vida. Ele explica por que um
embaixadortem sucesso em seu trabalho. Ele mesmo não é nada, mas fala em nome
do seu país, em nome do seu soberano, fala em nome dos poderes que estão por trás
dele. A palavra é dele, todavia o poder é do seu país. E o outro país ouve a palavra
de um homem porque sabe que ele é o representante do poder invisível, oculto e
grandioso que está por trás dele.

Aí está, pois, um dos modos mais excelentes de ficar firme contra as astutas ciladas
do diabo e ser mais do que vencedor. “Forte no Senhor e na força do seu poder.”
Conhecer o poder do Seu nome! “Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno”, diga a seu
inimigo, “deixe-me. Não pertenço a você, pertenço a Cristo, sou protegido por Ele”.
“Eles o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela palavra do seu testemunho.”
Queira Deus capacitar-nos a pôr em prática estas preciosas verdades, para
que “possamos resistir no dia mau, e, havendo feito tudo, ficar firmes”.

Modo antigo de tirar água do poço.


AS PROMESSAS

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” -


Efésios 6:10

A frase “fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder” lembra-nos que um poder


adicional pode ser-nos acessível, um poder que podemos evocar, particu larmente
em ocasiões de pressão e dificuldades incomuns. Devemos ser fortes sempre,
sempre vigorosos, quando vivemos a vida cristã normal; mas há ocasiões e épocas
especiais na vida cristã. O apóstolo faz referência ao “dia mau”. Naturalmente a vida
é sempre má, porém há dias piores do que outros; há “dias maus”; há ocasiões em
que a luta é particularmente dura, em que o inimigo nos ataca extraordinariamente. A
vida é sempre uma guerra, no entanto, há vezes em que o diabo concentra e junta
grandes forças para atacar-nos. Pois bem, em tais ocasiões, há certas coisas que
podemos fazer, além do que fazemos sempre. Consideramos uma delas em nosso
último estudo -que podemos invocar Seu nome!

Vê-se mais uma referência a isso na Epístola de Judas, versículos 8 e 9. Judas se


refere a escarnecedores e outros que se dizem cristãos, mas que não entendem a vida
cristã. Diz ele: “Estes, semelhantemente adormecidos, contaminam a sua carne, e
rejeitam a dominação, e vituperam as dignidades. Mas o arcanjo Miguel, quando
contendia com o diabo, e disputava a respeito do corpo de Moisés, não ousou
pronunciar juízo de maldição contra ele; mas disse: o Senhor te repreenda”. O arcanj
o Miguel compreendeu a natureza do poder que o estava confrontando, e a grandeza
desse poder, e assim não “vituperou as dignidades”. O que fez foi invocar o nome -
“O Senhor te repreenda”. Ameaçou dessa maneira o diabo, e com isso obteve a sua
vitória. Há ocasiões em que essa é a única coisa que eu e vocês podemos fazer.
Confrontados pelo inimigo, e compreendendo a nossa fraqueza, podemos ameaçá-lo
com este nome, que é sempre vitorioso, este nome que está acima de todos os outros
nomes, o nome ao qual se dobrará “todo joelho dos que estão nos céus, e na terra, e
debaixo da terra” (Filipenses 2:10).

Passemos agora a considerar outra fonte de poder, ainda mais gloriosa, a saber, a
ativa percepção da Sua proximidade e da Sua

presença. Aqui está um ensino sumamente exaltado e, contudo, sumamente


consolador para nós, ensino que nos é ministrado muitas vezes na Bíblia, no Velho
Testamento e no Novo. Também se vê, graças a Deus, com muita proeminência, na
história da Igreja e nas biografias de homens que Deus tem usado de maneira notável
na promoção do Seu reino. Engajados nesta guerra, nesta luta, ‘‘não contra a carne e
o sangue, mas sim, contra os principados, contra as potestades”, todos eles dão
testem unho do fato de que, acima e além da força e do poder que em geral recebem
do Senhor, às vezes eles têm sido conscientes, de maneira muito incomum, da Sua
proximidade e da Sua presença, sustentando-os, socorrendo-os e livrando-os.

Devemos examinar isto, porque é um dos aspectos mais estupendos da verdade


cristã. Quero salientar que não se deve pensar que se trata de algo normal e
constante, mas, antes, de algo incomum e excepcional. O normal é ser forte no
Senhor e na força do Seu poder o tempo todo. Alimentando-nos da Palavra,
dedicando-nos à oração e exercitando e vivendo a vida cristã, tornamo-nos fortes
neste combate contra o diabo. Ainda assim, há ocasiões em que a peleja é
extraordinariamente estrênua e dura; há dias particularmente “maus” em que o
inferno inteiro parece estar solto contra nós, e o diabo, com algum propósito, ou
então por sua estratégia maligna, junta todas as suas forças contra nós para derrubar-
nos, a fim de macular o nosso testemunho e lançar-nos num estado de infelicidade e
cativeiro. Há vezes em que a batalha é tão feroz, durae forte que o cristão se vê a
ponto de ser dominado. Ele vem lutando bravamente, vem combatendo com poder e
valor, mas o inimigo, por assim dizer, pôs em ação todas as suas reservas, e o pobre
cristão acha que chegou o fim, acha que tem que desistir.

Isso se vê freqüentemente nas biografias, como por exemplo no livro O Peregrino


{Pilgrim’s Progress), de João Bunyan, na verdade em quase todas as suas obras. Ele
tinha conhecimento disso, e trata do assunto de maneria notável. Isso é algo que se vê
de maneira geral nas vidas dos santos; e o ensino é que em tais ocasiões e em tais
situações o cristão recebe extraordinária força e poder do Senhor. Isto acontece
de duas maneiras principais, e devemos estudar ambas. Estou dando ênfase a que
isto é incomum. Não é o natural, nem o normal. Pode ser colocado na categoria de
milagres; esses não são constantes e comuns. Eles são raros e excepcionais. Este tipo
de experiência se enquadra nessa categoria, e não se pode esperar que aconteça
todos os dias - nem com frequência no mesmo dia.

Esta experiência é algo nos dadojustamente quando mais precisamos

dela, e ela nos vem de duas formas principais. A primeira é que Deus nos concede
graça especial. A promessa fundamental a esse respeito acha-se em Deuteronômio
33:25, onde nos é dito: “A tua força será como os teus dias”. Significa que sempre
nos serão dadas a graça e a força adequadas a toda e qualquer situação em que nos
encontrarmos. Seja qual for o “dia” que acaso nos sobrevenha, a nossa força
corresponderá a ele. Essa promessa de Deus foi dada a Seu povo no passado, à
Igreja do Velho Testamento. O povo estava em suas jornadas de peregrinação, não
tinha chegado à terra prometida; e era confrontado por inimigos, dentro e fora, e por
todos os problemas descritos nas páginas do Velho Testamento. Mas lhe foi dada esta
promessa fundamental de que não precisava temer, pois, fossem quais fossem as
circunstâncias, a graça de Deus seria suficiente. Se os dias fossem particularmente
maus, receberia força suplementar da parte de Deus. Deus conhece tudo a nosso
respeito, e sempre nos proverá de força especial. Nada poderia ter contribu ido
mais para consolar e fortalecer o povo.

Vocês olham para o futuro e perguntam que será que vai acontecer. Muitos ficam
desanimados quando pensam nisso. Eles lêem sobre cristãos perseguidos,
caluniados, presos, talvez sujeitos a todo tipo de tortura - lavagem cerebral e coisas
semelhantes. Então dizem a si mesmos: “Eu nunca poderiaagüentar isso; impossível.
Eu nunca poderia fazertal coisa, nunca poderia resistir a isso, sei que eu falharia”.
Ora, isso está errado; pois a promessa é: “A tua força será como os teus dias”.
É certo que, sozinho, você não conseguiria fazê-lo; você não poderia fazê-lo a
sangue frio, não poderia fazê-lo como você é. Entretanto a promessa é que, se você
se achar nessa situação, verá que lhe estarão sendo dados graça e poder
suplementares. Passe você pelo que passar, será capacitado a superá-lo. A promessa
é universal. “A tua força será como os teus dias.” Talvez você tenha que ficar na
expectativa, talvez seja compelido pelas circunstâncias a esperar por uma grande
provação que está para vir, e seja tentado a dizer: “Não vejo como poderei enfrentar
isso”. Não fale assim: é falta de fé. Dê ouvidos à promessa de Deus. Seja o que
forque lhe sobrevenha, você receberá força. Seja o que for, “A tua força será como
os teus dias”.

Mas devemos acrescentar outro ensino. As palavras não somente compõem uma
promessa do socorro necessitado, somos encorajados a pedi-lo. Há uma consoladora
declaração neste sentido no capítulo 4 da Epístola aos Hebreus, versículos 14-16.
Trata do mesmo ponto, porém expõe o outro lado: “Visto que temos um grande sumo
sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a
nossa

confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das
nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado.
Cheguemos pois com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar
misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno” (ou: “na
hora da necessidade”, VA). Notem de novo a expressão, “na hora da necessidade”,
ou “em tempo oportuno”. A idéia é que os tempos não são todos iguais, e que
a necessidade que temos é da “graça, a fim de sermos ajudados na hora
da necessidade”. A graça que precisamos naquela hora é “graça adequada”.

Sempre estamos sendo aj udados, sempre estamos recebendo graça; não poderíamos
viver um dia sem ela. Contudo, há ocasiões em que precisamos de algo suplementar,
e o nosso consolo é que temos, na presença de Deus, um grande sumo sacerdote
(Cristo) que esteve neste mundo e Se sujeitou a todas as tentações aque estamos
sujeitos, Alguém que enfrentou todas as provações, todos os antagonismos e todas
as decepções da vida. Nada pode acontecer conosco que Ele não
tenha experimentado. Vá, pois, com confiança, com ousadia, ao trono da graça. Você
precisa de misericórdia, mas precisa também da “graça a fim de ser ajudado” nesta
hora de necessidade, neste período de incomum pressão, crise e tensão. Peça-a, e lhe
será dada; vá ao “trono da graça” em nome do seu grande sumo sacerdote, e lhe será
dada ajuda “em tempo oportuno”, ajuda lhe será dada quando você tiver necessidade
dela, e lhe será dada a porção certa, para que seja habilitado a prosseguir e a ser
mais do que vencedor. Isto vem de Cristo, o nosso “grande sumo sacerdote”, que
pode “compadecer-se das nossas fraquezas”. “Fortalecer-se no Senhor e na força do
seu poder” significa que você prevê que haverá dificuldades. Ao fazê-lo, lembre-se
de que você pode ir a Ele, e esteja certo de que receberá o que deseja, que Ele o
conduzirá através da sua crise ou problema particular. Esse é, pois, outro aspecto
desta questão.

Vamos considerar agora um terceiro aspecto que introduz um termo que encontramos
no Novo Testamento com relação à obra do Espírito Santo. E a “unção”. É-nos dito
que recebemos “a unção do Santo” (1 João 2:20); e esta unção do Espírito é uma
questão muito prática, particularmente no contexto de combate da vida cristã. Para
verem o que significa, considerem o que se nos diz acerca do nosso Senhor em
Atos 10:38. Pedro, pregandoaCornélioeàsua família, diz: “Deus ungiu a Jesus de
Nazaré com o Espírito Santo e com virtude; o qual andou fazendo o bem, e curando a
todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele”. Esta unção é sempre um
meio para a obtenção de poder. É um aspecto

particular da obra do Espírito Santo. O Espírito Santo é um selo. É também “o


penhor da nossa herança”; porém, quanto à unção, há um aspecto da obra que o
Espírito Santo realiza no verdadeiro cristão pelo qual ele é capacitado a fazer várias
coisas.

O melhor modo de examinar isto é ver a ilustração do que acontece numa época de
avivamento. Quando o Espírito Santo opera num aviva-mento, há uma grande unção,
e esta se mostra de muitas manerias. Vocês podem ler sobre homens que criam na
verdade e que pregavam fiel e sistematicamente, mas eram ineficazes e faltos de
poder. Subitamente se enchiam de poder. Falavam com ousadia, com poder e com
grande autoridade. É a unção do Espírito. A mesma unção acontece em conexão com
a oração. Num período de avivamento as pessoas têm liberdade na oração. Não é
preciso persuadi-las a orar; não há pausas; há vivacidade, entusiasmo, poder,
liberdade no falar, e entendimento. Isso faz parte da unção. Naturalmente, num
avivamento vocês vêem isso de maneria excepcional, todavia ilustra o ponto. O
poder para testemunhar e falar a outros também é sempre uma característica notável
presente num avivamento.

Esta unção, no entanto, não se restringe aos avivamentos. Uso isso simplesmente
como ilustração. Graças a Deus, é dada noutras ocasiões. Todo homem quejá pregou
deve ser capaz de testificar isso. Há ocasiões em que, inteiramente fora do seu
controle, é-lhe dada autoridade especial, poder especial, uma unção incomum. E há
boas razões para a dádiva desta unção. Há circunstâncias das quais o próprio
pregador não tem consciência e que só depois ele descobre. Pode ter entrado na
congregação alguém que necessitava de uma mensagem ou palavra específica, e o
pregador, sem saber disso, é guiado a dizer algo adequado àquele estado e
condição particular. Há, portanto, este revestimento de poder, chamado “unção”. É
algo que se deve procurar e ambicionar, é algo pelo que se deve
orar constantemente.

Essa mesma unção é dada também aos cristãos no “dia mau”. Em tempos de pressão,
crise, problema e dificuldade incomuns, eles recebem uma incomum unção do
Espírito Santo; e com isso eles são capacitados a perceber e entender o que está
acontecendo. A unção do Espírito lhes propicia um discernimento espiritual que
normalmente não possuem. Naturalmente isto é essencial em nossa luta contra o
diabo. Se não nos apercebermos da mão do diabo, atribuiremos as suas atividades a
algo em nós, ou poderemos achar que Deus não está sendo bondoso conosco. Mas,
quando você tem a unção, logo percebe que é o diabo, e você está apto a descobrir a
sua estratégia. Você vê porque ele está fazendo isto ou

aqu ilo, você vê como ele o está fazendo, você enxerga toda a sua astúcia.

Não somente isso, as Escrituras são “dadas” a você. Você já experimentou isto? É
uma boa maneira de provar o seu estado e cond ição na vida cristã. De repente as
Escrituras vêm à sua mente para você poder responderaodiabo. Vocês recordam
como o nosso Senhor lhe respondeu em Suas tentações. Cada vez, nas três tentações,
quando o diabo veio com a sua astúcia e fez a sua sugestão, ao nosso Senhor foi dada
a passagem apropriada e perfeita das Escrituras. Isso aconteceu com o nosso
Senhor imediatamente após a “unção” de que Pedro falou na casa de Cornélio. O
nosso Senhorestavadando início ao Seu ministério público. Sendo Ele o Filho de
Deus, era cheio do Espírito. Entretanto, para realizar a Sua obra, Ele necessitava de
uma unção especial, e a recebeu em Seu batismo no rio Jordão, ministrado por João
Batista. O Espírito Santo desceu então sobre Ele, e Ele recebeu este poder especial.
Ele era Deus; mas como homem teve necessidade deste “batismo”, desta “unção”
com o Espírito Santo. E agora, cheio do Espírito, Ele é levado ao deserto para
ser tentado pelo diabo. Odiabo vem com asuaastúcia, porém o nosso Senhor tem a
resposta, a passagem bíblica apropriada; e o diabo é posto em confusão e rechaçado.

Pois bem, esta experiência é oferecidaa todos quantos pertencem ao povo de Deus; é
algo que eles têm testificado através dos séculos. Eles ficavam cientes de algo muito
incomum, eram elevados acima de si mesmos, as passagens das Escrituras que eles
tinham esquecido voltavam a eles e eles sabiam aplicá-las. Era-lhes dado este
discernimento e entendimento, e o resultado era que eles podiam ficar firmes, mesmo
no “dia mau”.

São esses, parece-me, os principais meios pelos quais nos é dada esta graça
especial. Não sabemos o que virá sobre nós, não sabemos o que o dia nos trará, e
tampouco sabemos, como cristãos, pelo que teremos que passar. Aqui está algo que
nos conforta. O que quer que aconteça, lembrem-se disto: “Fortalecei-vos no Senhor
e na força do seu poder”. Lembrem-se de que existem promessas, de que elas são
absolutas e de que Deus as cumprirá. Há esta unção especial que nos é dada
para habilitar-nos a ir adiante e ficar firmes no dia mau.

Vejamos agora o segundo aspecto deste assunto. O nosso Senhor nos dá esta ajuda
especial, não somente de maneira indireta, como eu diria, mas também o faz de
maneira direta. Ele nos faz sentir Sua presença real. Quanto sabemos sobre isto?
Lembro-lhes que isto não é comum, não é a norma, não é habitual. E excepcional.
Que é que significa? Comecemos

de novo pelo Velho Testamento. “O Senhor Deus”, diz o salmista no Salmo 84:11, “é
um sol e escudo”. “O Senhor Deus é um sol”, que dá vida, saúde, vigor e energia.
Isso é o normal, é constante, é algo que continua dia após dia. Mas Ele é também um
“escudo”, uma proteção. Ele nos dá cobertura, por assim dizer, nestes tempos
incomuns, e nos escuda e nos guarda, isto significa uma intervenção direta de Deus
a nosso favor; e é interessante observar alguns exemplos disto.

Vou ao livro de Josué em busca da minha primeira ilustração. No fim do capítulo 5


vemos Josué enfrentar a primeira grande crise depois que assumiu a liderança como
sucessor de Moisés. Ele está parado diante de Jerico, cidade extraordinariamente
fortificada. Ele tem todas as promessas, tudo o que Moisés lhe d issera; todavia aqui
ele enfrenta um tremendo problema. Eis o que aconteceu: “E sucedeu que, estando
Josué ao pé de Jerico, levantou os seus olhos e olhou; e eis que se pôs em pé diante
dele um homem que tinha na mão uma espada nua; e chegou-se Josué a ele, e d isse-
lhe: és tu dos nossos, ou dos nossos inimigos?” Observem aí o tom de tensa coragem.
“És tu dos nossos, ou dos nossos inimigos?” “E disse ele: não, mas venho agora
como príncipe do exército do Senhor. Então Josué se prostrou sobre o seu rosto na
terra, e o adorou, e disse-lhe: que diz meu Senhor ao seu servo? Então disse o
príncipe do exército do Senhor a Josué: descalça os sapatos de teus pés, porque o
lugar em que estás é santo. E fez Josué assim”. O que aconteceu ali foi uma
intervenção. O Senhor, na pessoa de um poderoso anjo aparece a Josué; é uma
das teofanias. O Senhor Jesus Cristo, naquelaforma particular, aparece aele para
confortá-lo e fortalecê-lo, e diz: “Eu estou com você, sou o príncipe ou o capitão do
seu exército e da batalha, não tenha medo”.

Outra ilustração pode-se ver no Segundo Livro de Reis, capítulo 6, versículos 11-17,
na vida do profeta Eliseu. Um grande ataque estava sendo levado a efeito pelo rei da
Síria. Mas ouçam a história: “Não me fareis saber quem dos nossos é pelo rei de
Israel?”, perguntou o rei da Síria. “E disse um dos seus servos: não, ó rei meu
senhor; mas o profeta Eliseu, que está em Israel, faz saber ao rei de Israel as
palavras que tu falas na tua câmara de dormir.” Disse então o rei: “Vai, e vê onde ele
está, para que envie, e mande trazê-lo. E fizeram-lhe saber, dizendo: eis que está
em Dotã. Então enviou para lá cavalos e carros e um grande exército, os
quais vieram de noite, e cercaram a cidade. E o moço do homem de Deus” -isto é, o
servo de Eliseu - “se levantou muito cedo, e saiu, e eis que um exército tinha cercado
a cidade com cavalos e carros; então o seu moço lhe disse: ai, meu senhor! Que
faremos?” O pobre servo levanta-se e vê o lugar literalmente cercado de soldados,
carros e cavalos, e fica

completamente alarmado e aterrorizado - “Ai, meu senhor! Que faremos?” “E ele


disse: não temas; porque mais são os que estão conosco do que os que estão com
eles”.

O que Eliseu disse parecia totalmente ridículo, é claro. Lá estavam eles, o profeta e
o seu servo, virtualmente sós, cercados por aquelas tropas do rei da Síria-cavalos,
carros e homens que literalmente os cercavam; porém, ele d iz: “Não temas; porque
mais são os que estão conosco do que os que estão com eles”. “E orou Eliseu, e
disse: Senhor, peço-te que lhe abras os olhos, para que veja. E o Senhor abriu os
olhos do moço, e viu; e eis que o monte estava cheio de cavalos e carros de fogo, em
redor de Eliseu.”

Esse é o tipo de coisa de que estou falando. O servo não podia vê-los; mas Eliseu
podia. Eliseu era homem de fé, o servo era jovem, inexperiente, ignorava estas
coisas e só via os obstáculos, o inimigo, a dificuldade e o apuro. Por isso ficou
alarmado, aterrorizado e cheio de pavor. Está tudo bem, diz El iseu, pois são mais os
que estão do nosso lado do que os que estão do lado deles. Mas, onde estão eles?,
pergunta o homem, não vejo nada. Eliseu orou: “Senhor, peço-te que lhe abras
os olhos, para que veja”. O resultado foi: “E o Senhor abriu os olhos do moço, e viu:
e eis que o monte estava cheio de cavalos e carros de fogo, em redor de Eliseu”. As
hostes invisíveis, o exército do Deus vivo, estavam presentes para proteger o profeta
de Deus e livrá-lo, como nos diz a seqüência da narrativa. Este é o ensino
escriturístico sobre o que acontece com os que pertencem a Deus quando eles
realmente crêem e têm fé, e “se fortalecem no Senhor e na força do seu poder”.

Vamos agora aoNovoTestamento. Eis aí o nosso Senhor, o Filho de Deus; mas Ele
assumiu a natureza humana e viveu como homem neste mundo. Imediatamente após a
Sua tentação no deserto, lemos: “Então o diabo o deixou; e, eis que chegaram os
anjos, e o serviram”. Ele tinha passado por dura provação, por uma experiência
estremecedora, e assim os anjos foram enviados para servi-10 e confortá-IO
imediatamente após a provação. Mas Ele tinha recebido ajuda na provação também,
como já vimos.

Vejam-nO, depois disso, no Jardim do Getsêmani. Ali sofreu, talvez, a Sua suprema
provação. O nosso Senhor estava então encarando a Sua morte. Só havia um meio de
salvar a humanidade, e esse era morrer por ela. Esse era o “cálice” que ele tinha de
beber. Em Sua agonia Ele foi orar sozinho no jardim. Levou consigo, até certa altura,
Pedro, Tiago e João. Deixaram atrás o grupo maior de discípulos, e Ele disse:
“Assentai-vos aqui, enquanto vou além orar” (Mateus 26:36). No entanto, todos

eles dormiram. Não puderam agüentar a tensão; era demais para eles, e eles já
estavam cansados, fatigados e apavorados. Assim, Ele orou sozinho no jard im, e tal
foi a agonia que Ele começou a suar grandes gotas de sangue. Mas, em sua narrativa,
Lucas diz o seguinte - e ele é o único a fazer este registro: “E apareceu-lhe um anjo
do céu, que o confortava” (22:43). Eleprecisou de auxílio, embora sendo oFilho de
Deus. “Aprendeu a obediência”, diz Hebreus 5:8, “por aquilo que padeceu.”

Como Filho de Deus, ele estava lutando aqui contra o diabo e todas as suas forças
mobi 1 izadas contra Ele, as quais O pressionavam a que não prosseguisse, e diziam:
“Deus vai abandonar-Te? Vais perder a vida? Onde está o amor de Deus? Ele não
pode permitir que Te aconteça isto”. O diabo O estava atacando com todo o seu
poder e furor, e o que nos é dito é que foi dada ajuda ao Senhor, o anjo foi enviado
para ajudá-10 e fortalecê-10. E assim Ele foi capacitado a ir para a cruz. Por
isso, dirigindo-Se aos discípulos, como está registrado em João 16:32, Ele dissera:
“Eis que chega a hora, e já se aproxima, em que vós sereis dispersos cada um para a
sua parte, e me deixareis só, mas não estou só, porque o Pai está comigo”. Quando
todos os homens iam abandoná-10, salvando as suas vidas em sua covard ia, disse
Ele sem temor: “Não estou só, porque o Pai está comigo”. Esse foi um “dia mau”
pelo qual o Filho de Deus teve que passar, e que Ele teve de suportar; e, acima de
todo o poderque Ele tinha normalmente, foi-lhe dado poder suplementar. O anjo O
fortaleceu no jardim. Ele sabia que o Pai estaria com Ele.

À luz da Sua própria experiência, o nosso Senhor fez uma promessa aos Seus.
Devemos seguir os Seus passos, devemos seguir o Seu exemplo; entretanto, em
acréscimo, temos que ouvir o Seu ensino. Ele nos fez uma grande promessa. Foi
proferida após a Sua ressurreição: “Eis que estou convosco todos os dias, até a
consumação dos séculos” (Mateus 28:20). Essa é a promessa, a promessa básica,
neste aspecto.

Ora, se a promessa é essa, que foi que aconteceu com ela? Cumpriu-se? Temos aqui
algo que deveria encher-nos de grande coragem e de grande esperança. 01 ivro de
Atos dos Apóstolos tem muitas i lustrações que mostram como esta promessa foi
cumprida. Vejam Atos, capítulo 18, concernente ao apóstolo Paulo em Corinto. Ele
tinha passado por maus momentos ali. Irrompera a perseguição, e o apóstolo corria o
risco de desanimar-se e de cair em depressão. Todavia nos versículos 9 e 10 lemos:
“E disse o Senhor em visão a Paulo: não temas, mas fala, e não te cales; porque eu
sou contigo, e ninguém lançará mão de ti para te fazer mal, pois tenho muito povo
nesta cidade”. Sem dúvida Paulo tinha ido para o leito aquela noite pensando que
estaria para acontecer; tudo estava

contra ele, e ele poderia sofrer até a perda da própria vida. De qualquer forma, seu
ministério ali seria infrutífero. Mas eis que o Senhor lhe aparece e lhe fala. Não é
para admirar que se leia a seguir: “E ficou ali um ano e seis meses, ensinando entre
eles a Palavra de Deus”. Pois bem, aquilo foi uma visitação especial, uma
manifestação especial do Senhor ao Seu servo provado, confuso, perplexo, cansado
e desanimado. Isso não aconteceu com Paulo todas as noites, porém naquela noite
aconteceu.

Graças a Deus, isso é real, é verdade, é algo que acontece de fato. Não segue
nenhum padrão particular, é claro, mas quando ocorre, é igualmente real e autêntico.

Vejam outra ilustração da mesma coisa. Em Atos, capítulo 22, o apóstolo descreve
algo que lhe acontecera. “E aconteceu”, diz ele, “que, tornando eu para Jerusalém,
quando orava no templo, fui arrebatado para fora de mim. E vi aquele (o Senhor) que
me dizia: dá-te pressa e sai apressadamente de Jerusalém.” Em Corinto lhe fora dito
que ficasse; agora lhe é dito que saia de Jerusalém - “porque não receberão o
seu testemunho acerca de mim. E eu disse: Senhor, eles bem sabem que eu lançava na
prisão e açoitava nas sinagogas os que criam em ti. E quando o sangue de Estêvão,
tua testemunha, se derramava, também eu estava presente, e consentia na sua morte, e
guardava os vestidos dos que o matavam. E disse-me: vai, porque hei de enviar-te
aos gentios de longe” (versículos 17-21). Temos aí também uma intervenção especial
do Senhor num momento de grande crise, quando o apóstolo estava em maior
perigo do que ele podia perceber. O Senhor lhe aparece num transe e Se manifesta a
ele. Diz-lhe que vá, concita-o a ir, e lhe fala da obra maior e mais ampla que Ele tem
para ele realizar.

Mas depois há outra i lustração da ajuda especial na Segunda Epístola a Timóteo,


capítulo 4. “Ninguém me assistiu na minha primeira defesa” -
Pauloestavasendojulgado-“antes todos me desampararam. Que isto não lhes seja
imputado. Mas o Senhor assistiu-me e fortaleceu-me, para que por mim fosse
cumprida a pregação, e todos os gentios a ouvissem” (versículos 16-17).

Esses são aparecimentos especiais do Senhor a fim de fortalecer o Seu servo num
dia mau, quando ele estava sob julgamento e estava passando por uma crise
extraordinária. “O Senhor assistiu-me”, esteve comigo - e Ele aparece de diferentes
maneiras! Às vezes o faz indiretamente, por meiodeanjos. Temos uma esplêndida
ilustração disto em Atos, capítulo 12, concernente a Pedro na prisão. Tiago, irmão de
João, já tinha sido preso e levado à morte. A seguir Pedro foi preso e o rei Herodes
Agripa tinha o propósito de matá-lo. Não podia fazê-lo imedia-

tamente porque sucedia que era a época da Páscoa e estavam nos dias dos pães não
levedados, pelo que determinou que ele fosse morto depois de passados aqueles
dias. Lá estava Pedro dormindo na prisão na última noite, certamente pensando
consigo mesmo que deveria ser morto na manhã seguinte, sentindo que não havia
absolutamente nada que se pudesse fazer para salvá-lo. Subitamente, porém,
“resplandeceu uma luz na prisão” e um anjo tocou em Pedro, no seu lado, e o fez
levantar-se. As correntes caíram, as portas se abriram, os portões giraram em
seus gonzos, e Pedro viu-se seguindo o anjo através do portão principal e pelas ruas
da cidade, quando de repente o anjo desapareceu. Isso é história real. O anjo
apareceu para libertar o servo de Deus.

O apóstolo Paulo teve uma experiência similar relacionada com a sua viagem
aRomae com o naufrágio registrado em Atos, capítulo 27. Tudo parecia terchegado
ao fim, eles não somente haviam lançado ao mar uma parte da carga e aliviado o
navio, mas também tinham lançado ao mar até a armação do navio. Não se podia
fazer mais nada, e eles se encontravam numa situação de desespero total.
Repentinamente Paulo se ad ianta e d iz: “Agora vos admoesto a que tenhais bom
ânimo, porque não se perderá a vida de nenhum de vós, mas somente o navio. Porque
esta mesma noite o anjo de Deus, de quem sou, e a quem sirvo, esteve comigo,
dizendo: Paulo, não temas; importa que sejas apresentado a Cesar, e eis que Deus te
deu todos quantos navegam contigo”. O apóstolo sabia pouco de navegação, em
contraste com aquelas pessoas, e, todavia, foi o homem que pôde confortá-las. E
pôde fazê-lo porque “O anjo do Senhor esteve comigo”, e ao apóstolo foi dada a
mensagem divina.

As vezes a ajuda especial de Deus vem por intermédio de visões. Pedro teve uma
visão antes de admitir os gentios na Igreja. Ele nunca teria feito isso, não fosse a
visão. Essa foi uma das grandes provas e crises da vida de Pedro. Ele não
acreditava que os gentios pudessem tornar-se cristãos; era um judeu estreito, fanático
e preconceituoso. Mas Deus lhe deu uma visão. Ele viu um lençol descendo do céu
com toda espécie de animais; e Pedro aprendeu a lição de que precisava mediante
aquela visão.

A í estão exemplos e i lustrações daqu i lo que eu q uero d izer com aj uda especial
do Senhor. Em extraordinários tempos de dificuldade, Ele nos dá a conhecer a Sua
presença. Você não O vê, mas sabe que Ele está ali. Isto é mais do que a força que
Ele dá, é mais do que a graça que Ele dá; Ele próprio Se dá. Você ficacônscio deque
Ele está bem ao seu lado, que Ele o cerca. A mesma coisa é certa quanto aos anjos.
Diz-nos Hebreus 1:14 que os anjos são “espíritos ministradores” enviados por Deus
para

ajudar os “que hão de herdar a salvação”. Você não os vê, porém sente a sua
presença, você sabe que não está só. São dadas palavras a você, é-lhe dada
segurança, é-lhe dada paz, é-lhe dada certeza. Isto pode ser ilustrado
interminavelmente com fatos extraídos das biografias dos santos de Deus através dos
séculos. E essas promessas ainda são verdadeiras.

O testemunhodos santos é neste sentido: o Senhor Se manifesta, em momentos de


extrema agonia e crise, para ajudar-nos. Muitos deram testemunho disso
imediatamente antes de sua morte - sua maior crise. Subitamente Ele apareceu a eles,
e as pessoas que estavam ao lado do leito viram um sorriso em seus rostos. Lembro-
me de haver estado ao lado do leito de um velho santo, de 78 anos de idade, que
outrora fora um terrível pecador. Nunca o esquecerei. De repente ele deve ter v isto
o Senhor, pois estendeu as mãos e disse: “Estou chegando, Senhor!” Isso é algo
que vocês verão acontecer muitas vezes nos últimos momentos dos filhos de Deus. O
Senhor lhes apareceu, eles O viram numa visão, viram-nO de algum modo que nem
sempre entendemos, e foram capacitados a passar pela morte triunfal, gloriosa
ejubilosamente. Esta é uma das manerias pelas quais somos habilitados a
“fortalecer-nos no Senhor e na força do seu poder”. Portanto, que nos cabe fazer? O
que nos cabe fazer é crer neste ensino, agir com base nele, confiar-nos ao Senhor e
orar a Ele. Muitos hinos tratam deste tema.

Sempre em Ti careço, fica perto.

Porquê? Porque

Fenece a tentação, se perto estás.

Vocês têm algum conhecimento sobre isso? Ouçam outras expressões de fé:

Sol da minh ’alma, ó Salvador, Treva não há, se perto estás; Nenhum vapor da
terra suba Para ocultar-Te dos meus olhos.

Fica comigo o dia inteiro Porque sem Ti viver não posso; Fica comigo no
crepúsculo; Sem Ti não ousaria morrer.

Eis aqui outra:

Quando fracassarem outros ajudadores,

E outras consolações desaparecerem,

O Tu, que és o amparo dos desamparados,

Vem ficar comigo!

Da Tua presença preciso a cada hora;

Somente a Tua graça poderá frustrar o vil tentador.


Ah, quem como Tu pode ser meu guia e meu forte apoio? Quer se formem nuvens,
ou refulja o sol, habita comigo!

O autor continua - sua confiança cresce -

Não temo inimigos conTigo ao meu lado para abençoar-me; Os males se


abrandam e as lágrimas perdem o seu amargor. Onde está, ó morte, o teu
aguilhão?

Onde está, sepulcro, a tua vitória?

Eu continuarei, triunfando, vencendo, se Tu, ó Senhor, comigo habitares.

Ouçam mais outra -

Não temerei a batalha,

Se Tu estiveres ao meu lado,

Nem deixarei Tua vereda,

Se Tu fores o meu guia.

Perto estão meus inimigos,

Ao redor e dentro de mim;

Jesus, chega-Te mais, e livra A minh ’alma de pecar.

Eis outra oração -

Jesus, meu bondoso Amigo, Deixa-me acorrer a Ti,

Se as águas rolarem perto E a tempestade rugir.

Esconde-me, ó Salvador,

Até o fim do temporal;

Salvo no seguro porto,

Recebe enfim a minh ’alma!

A conclusão a que devemos chegar é que estas promessas são tão válidas hoje como
sempre foram. O Senhor não mudou, continua sendo o mesmo, e como Ele apareceu
desta maneira e fez Sua presença conhecida, sentida e real aos seus santos militantes,
nos momentos de crise, nos dias maus, Ele fará o mesmo por nós. Todavia, temos
que procurar conhecer o Senhor, temos que buscar a realidade da Sua presença. E a
maneira de fazer isso, como lhes tenho dito, é tomar estas orações dos santos que nos
antecederam, tendo sentido a presença de Deus, e apropriar-nos das promessas e
rogá-las junto ao Seu trono de misericórdia e graça. Poderemos então ter certeza,
não somente de que receberemos graça que nos ajude na hora da necessidade, mas
também deque teremos a rica experiênc ia de saber que Ele está conosco, ao
nosso lado, e de que Ele “nunca nos deixará, nem nos desamparará”.

“CONFIE EM DEUS E

55

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” -


Efésios 6:10

Chegamos agora à aplicação prática daquiloque estivemos considerando. Tudo isso


vem exposto perfeitamente num conhecido hino de autoria de John Newton, que diz:

Embora muitos inimigos Cerquem você, e fraco se ache,

Sua vida oculta em Deus com Cristo Inatingível, salva está.

Fraco que seja, não cairá,

E se cair, não vai morrer;

Jesus, a força dos Seus santos,

Vem dar-lhe ajuda, do alto céu.

Temos aí uma excelente exposição da doutrina que vimos elaborando. Elecontinua:

Sabe você que é um ser mortal,

A fé, porém, sempre O vê perto.

Que glória Ele é, guia e defesa!

Então, não há porque temer.

É por isso que você prossegue sem temor nem hesitação; e o bom e velho John
Newton continua a dar-nos ânimo, dizendo:
Tão certo como é poderoso,

E por você já triunfou,

Assim você, que ama o Seu nome,

NEle também triunfará.

Essâé, pois, a doutrina, o ensino. Vimo-lo ensinado claramente nas

Escrituras, e o hino que em parte citamos é um excelente sumário dele.

Mas alguém poderá perguntar: “Como conhecer tudo isso na prática? Como viver
desse modo?” Em primeiro lugar, temos que terem mente, e manter em mente, os dois
elementos que eu venho salientando o tempo todo - o poder de Deus e a nossa
atividade. Estas duas coisas são absolutamente essenciais. John Newton não diz em
seu hino que Deus tem a intenção de fazer tudo no nosso lugar, que Ele triunfará por
nós. Notem as suas palavras: “Tão certo como (Ele) é poderoso, e por você já
triunfou”. Foi o que o nosso Senhor fez em Sua morte. Não podemos fazer nada
quanto à nossa justificação, não tomamos parte nos atos de justificação e
regeneração. Estamos “mortos em ofensas e pecados”, estamos “totalmente sem
forças”. Essa obra é inteiramente realizada pelo Senhor; é realizada para nós, e nós
simplesmente a recebemos.

Mas quando você chega a esta outra questão, à santificação e às lutas da vida cristã,
a linguagem muda, porque agorajá recebemos nova vida, força e poder. Por isso
Newton continua: “Tão certo como (Ele) é poderoso, ç por você já triunfou, assim
você, que ama o Seu nome, nEle também triunfará”. Você triunfará, diz ele, porque
você está “nEle”. Você triunfa porque tem esta vida que dEle procede, e porque está
unido a Ele. “Sabe você que é um ser mortal; a fé, porém, sempre O vê
perto.” Temos que apegar-nos a estes dois elementos - o poder e a força que Ele nos
dá, e a nossa atividade no dinâmico e na força daquele poder. Entre a justificação e a
santificação há esta diferença essencial: a justificação é recebida inteiramente pela
fé; a santificação é algo que nós realizamos pela fé, por intermédio da fé, na fé que
agora temos, em nossa relação com Ele e na posse da vida que Ele nos deu. Esta é a
doutrina fundamental. Muitos andam confusos porque não entendem isso. Temos que
ter sempre em mente os dois aspectos, as duas atividades.

Permitam-me resumir o ponto lembramdo-lhes ainda outra declaração desta doutrina,


que se acha no início do livro de Apocalipse. Nos capítulos 2 e 3 há sete cartas
escritas para sete igrejas, e nas sete cartas vemos repetida a mesma declaração: “Ao
que vencer...”. Certas promessas são feitas aos que vencerem. No caso da primeira
igreja é: “Ao que vencer, dar-lhe-ei a comer da árvore da vida, que está no meio do
paraíso de Deus”. Vê-se a mesma coisa em todas as sete. Vejam a última-à igreja de
Laodicéia, capítulo 3, versículo 21: “Ao que vencer lhe concederei que se assente
comigo no meu trono; assim como eu venci, e me assentei com meu Pai no seu
trono”. Notem que o ensino é que nós temos de vencer; não é que tudo é feito por
alguém em nosso lugar. Não repousamos simplesmente na fé, por assim dizer, e
ficamos contemplando

enquanto Ele obtém a vitória para nós. A exortação é que devemos fazer certas
coisas; temos que arrepender-nos, temos que recuperar o nosso primeiro amor, temos
que vigiar, temos que ser praticantes, e assim por diante. São-nos dados? porém, a
unção, o colírio, o ouro, as vestes, tudo o de que necessitamos. JÉ-nos dada a
possibilidade de fazê-las, contudo nós temos que fazê-las. É atividade nossa. Aí
está, pois, no último livro da Bíblia, nas cartas do Senhor ressurreto às Suas igrejas,
um maravilhoso sumário desta doutrina.

Pois bem, temos que voltar à questão prática sobre como apl icar tudo isso e
transferi-lo para a vida e a prática diárias. O ponto em questão vem a ser o seguinte:
temos que crer no ensino que consideramos acerca da necessidade de comida e
bebida, acerca da necessidade que temos da oração e da comunhão com o Senhor;
temos que captar a imensa importância de perceber qual é a nossa condição nEle;
temos que ter certeza da salvação. Se não o fizermos, a situação será sem
esperança. Temos de estar seguros quanto a quem somos, que somos filhos de
Deus; e temos que crer em todas essas “grandíssimas e preciosas promessas”. Não
poderemos combater triunfantemente, se não tivermos claro entendimento destas
questões.

Depois temos que manter a percepção da Sua graça, e a percepção da Sua


proximidade e da Sua presença. Temos que empenhar-nos na “Prática da Presença de
Deus”. Isso leva tempo. Qualquer ensino que dê a impressão de que podemos
conseguir tudo isso de repente numa reunião, é inteiramente oposto ao Novo
Testamento, o qual está sempre nos dizendo que devemos ir adiante com estas coisas,
continuar nelas, dedicar-nos diligentemente a conhecê-las. São esses os seus termos,
os termos militares utilizados nas exortações. Todos eles carregam esta idéia de
continuidade nossa na atividade essencial. Vocês não “recebem” isto como uma
espécie de segunda bênção numa reunião. Não há tal ensino em parte nenhuma da
Bíblia. Todo ensino é, antes, o de “continuar”, lutar e pelejar.

Portanto, continuemos “praticando a presença do Senhor”, buscando Sua face,


procurando perceber a Sua proximidade, buscando as manifestações do Filho de
Deus. Há um hino que nos diz: “Tempo para ser santo tu deves tomar”; e isso toma
tempo. Não gostamos disso, naturalmente. Gostamos dos atalhos; daí, o ensino das
seitas é sempre popular. Gostamos de todo ensino que pareça oferecer-se a nós
como uma fórmula, e que dê a impressão de que todos estavam errados
nesta questão, através de todos os séculos, mas agora, “Aqui está!” “Isto é tudo que
você deve fazer!” “Muito simples!” Não! “Tempo para ser

santo tu deves tomar”; e, pôr estas coisas em prática exige tempo. Ou, vejam também
a exortação das Escrituras: “Crescei na graça e no conhecimento do Senhor!”
“Crescei!” Crescimento requer tempo. Você não salta de repente; em vez disso, você
cresce imperceptivelmente.

Conforme continuarmos a seguir o padrão bíbl ico, a nossa confiança aumentará. Não
há dúvida acerca disto. “Àquele que tem, se dará, e terá em abundância.” Quanto
mais conhecermos, mais seguros nos tornaremos. Toda experiência que tivermos da
Sua graça, da Sua proximidade, da Sua presença, nos tornará mais fortes. Estaremos
em melhor situação do que estávamos; e prosseguiremos, semana após semana, mês
após mês e ano após ano, crescendo em poder e no entend imento destas coisas. E, à
medida que avançarmos, poderemos concordar cada vez mais com John Newton,
quando ele nos diz que “não há por que temer”. Seremos igualmente capazes de
confirmar a afirmação de Tiago: “Resisti ao d iabo, e ele fugirá de vós”.

Mas há sempre a dificuldade do início; e é onde muitos tendem a tropeçar. Tudo o


que tenho a dizer a respeito do início é que há somente um modo de saber estas
coisas, e esse é experimentá-las, praticá-las, dar começo. Temos que agir com base
na nossa fé. Não há valor nem propósito em ler a doutrina e entender o ensino, se não
fazemos nada a respeito. Temos que transferi-lo para a prática. Há sempre um
elemento de aventura na fé. A fé é inteiramente diferente do assentimento e da crença
meramente intelectuais. Fé é pôr o que cremos em prática e ação.

Estou tentado a repetir a história que já contei muitas vezes para ilustrar este ponto.
É a história do homem que estava de um lado das Cataratas do Niágara e estava
observando um homem que não somente podia andar sobre as cataratas numa forte
corda, porém também podia fazer rodar sobre elas um carrinho de mão. Ele virou-se
parao homem que estava ao seu lado e perguntou: “Você acred ita que eu sou capaz
de levar um carrinho de mão para o outro lado, e não só isso, mas também
um homem sentado nele?” “Sim”, respondeu o homem. “Bem”, replicou o outro,
“sente-se no carrinho”. Todavia o outro não quis fazê-lo! A história mostra a
diferença entre o assentimento intelectual e a verdadeira fé. A fé entra no carrinho de
mão! Crê na mensagem a tal ponto que se põe a praticá-la.

A prática é um princípio fundamental, com relação à fé. Vemos uma boa expressão
dela no Salmo 34. Davi tivera uma experiência da bondade e da graça de Deus, e
queria compartilha-la com todos. Qualquer homem que já teve uma experiência
sempre quer que outros comparti lhem dela. Disse ele: “Engrandecei ao Senhor
comigo, e juntos exaltemos o seu

nome”. Mas havia alguns que não podiam fazê-lo e não queriam juntar-se a ele. Por
isso Davi se pôs a convidá-los: “Provai”, disse ele, “e vede que o Senhor é bom”.
Vocês nunca o verão, enquanto não o provarem! Diz ele efetivamente: “O problema é
que vocês só ficam parados aí. Vocês têm as suas dificuldades teóricas. Vocês dizem:
isto soa maravilhosamente bem, porém é bom demais para ser verdade”. Por isso
ele lhes diz: “Vocês vão ficar parados aí, e ficarão sem este conhecimento e sem esta
bênção até começarem de fato a fazer algo a respeito. Provem, e vocês verão. Mas
vocês nunca verão, enquanto não provarem”.

Isto é verdade válida para a totalidade da vida cristã. Pessoas há que insistem em
deter-se, olhar e perguntar: “O que você me diz é verdade? Sei que aconteceu com
outros, mas pode acontecer comigo?” Creio que é precisamente isso que o apóstolo
tinha em mente quando estava escrevendo estas palavras: “Fortalecei-vos no Senhor
e na força do seu poder”. Entre os cristãos primitivos, muitos estavam temerosos e
hesitantes, como Timóteo. Por isso eram sempre exortados a aventurar-se, a confiar,
a experimentar, a “provar”, e sempre estavam recebendo a certeza de que, agindo
assim, eles veriam. Portanto, não devemos ficar parados, esmorecidos de coração,
dizendo: “Como posso? A coisa parece boa demais para ser verdade, não é para
gente como eu”. O único remédio para esse estado de coisas está no princípio
segundo o qual a fé é aventureira. Há sempre este elemento de aventura; se tão-
somente “nos aventurarmos no Senhor”, logo descobriremos coisas maravilhosas. A
resposta à pergunta, “Como posso habilitar-me a viver este tipo de vida?”, é que a
capacitação está na própria ordem dada. Esse é todo o segredo. “Fortalecei-vos!”
Como posso fortalecer-me? Você pode fortalecer-se obedecendo à ordem que lhe é
dada para fortalecer-se! Permitam-me oferecer-lhes algumas ilustrações para
mostrar-lhes que a capacitação, o poder, para fazer estas coisas está realmente
implícita e contida na ordem dada para fazê-las.

Voltemos ao Velho Testamento. Vemos Moisés liderando aqueles filhos de Israel


murmuradores e recalcitrantes. Um diaeles o procuraram e lhe disseram: “Não há
água aqui: você nos tirou do Egito para morrermos de sede aqui, no deserto? Não há
água; tudo está seco como um osso de esqueleto; que podemos fazer?” E Deus disse
a Moisés que ferisse a rocha, informando-o de que, quando o fizesse, dela brotaria
água. Pois bem, aí está a situação difícil. Moisés era homem, e, apesar de ser muito
bom homem, sabia que se ferisse a rocha nada aconteceria. Talvez tivesse ferido
muita rocha, sem que saísse água. Entretanto ali foi dito que, se ferisse certa rocha
com sua vara, dela sairia água aos borbotões. Isso

constitui todo o dilema da fé. Essa é a situação de todos nós, quando nos vemos face
a face com a ordem: “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”; “Sede
fortes no Senhor...” (VA).

“Mas quem sou eu?”, você diz. “Não passo de um fracote. Que adianta dizer-me que
eu seja forte?” Eis a resposta: pela fé Moisés feriu, golpeou a rocha, e dela brotou
água. O poder não era de Moisés, mas o braço era dele, e a vara era dele. Moisés
não ficou apenas parado ali, olhando para ver a água surgir. Moisés teve que erguer
o braço e teve que golpear, ferir aquela rocha. Contudo, ao fazê-lo, foi-lhe dado
poder, e saiu águada rocha. Aí vocês vêem os dois elementos presentes nesta
questão. Vocês vêem a atividade do homem, mas vocês vêem que o poder lhe
foi dado por Deus. Não foi Moisés - a Moisés faltava poder para fazer tais coisas.
No entanto, a Moisés foi dado poder para fazê-las. As duas coisas vçm juntas. Mas o
ponto ao qual estou dando ênfase agora é que, se Mo Isés tivesse hesitado ali, e não
tivesse feito nada, não teria visto aqulele milagre maravilhoso; mas, por ter agido,
descobriu que lhe fora dado poder. Ele “provou” e “viu”! É assim que acontece.

Tomemos outra ilustração, agora do Novo Testamento. Consta em três dos


Evangelhos o caso do homem de mão mirrada. O nosso Senhor o encontrou num
sábado, e obviamente Sua intenção era curá-lo. Os fariseus estavam presentes, e
começaram a argumentar com o nosso Senhor sobre se era certo curar alguém no
sábado (Mateus 12:9-14). O ponto substancial da história é que, tendo o nosso
Senhor respond ido aos fariseus e às suas estultas objeções, disse ao homem:
“Estende a tua mão”. Pois bem, aí está de novo o dilema; lá estava um homem com
uma das mãos mirrada, paralisada; possivelmente a mão nunca tivera
desenvolvimento. Essa mão era inútil, o homem não podia fazer coisa alguma com
ela. Em parte devido à falta de uso e desenvolvimento, os músculos eram flácidos,
encolhidos e fracos, sem energia e sem força. Todavia o Senhor disse àquele homem:
“Estende a tua mão”. Eoque lemoséque “ele a estendeu, e ficou sã como a outra”. A
grande maravilha desta história é que, quando o nosso Senhor disse ao homem,
“Estende a tua mão”, à ordem do Senhor ele o fez.

É evidente que o homem teve que fazer esforço. O que o homem fez não foi dizer:
“Bem, sim, a minha mão está mirrada, mas eu creio que todas as coisas são possíveis
a Ti, e que podes curar e restaurar minha mão. Eu creio que Tu podes fazê-lo” e, de
repente, assim que ele expressou a sua fé, a sua mão se estendeu. Não foi assim. O
homem não viu a sua mão subitamente estender-se de um salto; isso não foi feito por
outrem no lugar dele. O ponto vital é que, ao homem que não podia fazê-lo, o nosso

Senhor disse: “Estende a tua mão”, e quando Ele falou, foi dado poder ao homem.
Assim, quando ele fez o esforço, para seu espanto e admiração, ele viu, pela
primeira vez, que podia estender a mão. Os dois elementos são absolutamente
necessários; e, quando vocês estudarem os milagres, verão que na maioria deles
estes dois elementos estão presentes. O nosso Senhor sempre encarregava a pessoa
de alguma ação. No caso da mulher que tinha espírito de enfermidade e andava
curvada, por exemplo, bastou o Senhor ordenar-lhe que se endireitasse para
que imediatamente ela se endireitasse. E assim com os demais; o coxo, o paralítico:
“Levanta-te, toma a tua cama, e anda”. Parecia algo monstruoso, o homem não tinha
poder. Certo, mas o poder foi dado na ordem; e quando ele fez esforço, subitamente
viu que podia fazê-lo. “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder”; vocês
nunca conhecerão isto, enquanto não o praticarem.

Mas há uma i lustração melhor ainda, que apresenta outros elementos mais. Espero
que esteja claro que não estou usando os milagres com vistas à santificação. Isso é
sempre uma falácia. O que estou fazendo é mostrar como o poder “para fazer” é
dado na ordem .Assim chegamos ao famoso caso de Pedro andando sobre as águas,
conforme descrito no capítulo 14 do Evangelho Segundo Mateus. Os discípulos
estavam em seu barco e o mar estava encapelado por causa de uma tempestade.
Subitamente o Senhor apareceu, andando sobre as águas. A princípio eles pensaram
que era um fantasma, porém por fim Jesus lhes disse que era Ele, e os discípulos O
reconheceram. Então Pedro fez algo típico dele. Estava impressionado com a
capacidade do Senhor, de andar sobre as águas, e disse: “Manda-me ir ter contigo
por cima das águas”. “Seria possível eu fazer isso?” E o nosso Senhor lhe disse:
“Vem”. Lemos então: “E Pedro, descendo do barco, andou sobre as águas para ir ter
com Jesus”. A seguir diz o texto que Pedro, vendo de perto as ondas encapeladas,
teve medo, e a conseqüência foi que ele começou a afundar. Então veio a palavra: “E
logo Jesus, estendendo a mão, segurou-o, e disse-lhe: homem de pequena fé, por que
duvidaste?” De novo, o elemento essencial é que Pedro teve que mover-se: “E
Pedro, descendo do barco”. A ação não foi praticada para Pedro ou no lugar de
Pedro. Pedro, que nunca na vida tinha andado sobre as ondas, crendo na palavra de
Jesus, saiu do barco e se pôs a andar sobre as ondas. Ele teve que fazer o esforço,
porém lhe foi dado poder para fazê-lo. Depois, quando duvidou, perdeu o poder
e começou a afundar; mas o nosso Senhor o segurou.

Esta é a ilustração que mostra perfeitamente o que estivemos tentando dizer, que nos
é dado poder, e que isso faz parte da operação da

graça de Deus. No entanto, nos momentos de dificuldade e pressão excepcionais,


quando o combate é extraordinariamente duro e forte e o diabo põe em ação todas as
suas forças, o Senhor aparece e nos segura firme: não nos deixa afundar. Os dois
elementos estão presentes ali. Se Pedro continuasse a exercer a fé, não seria
necessário que o Senhor o segurasse e o livrasse; ele continuaria andando sobre as
ondas. Mas a ênfase é ainda sobre o nosso esforço, a nossa atividade. Pedro nunca
teria sabido que lhe era possível andar sobre as ondas, se não tivesse saído
do barco, se não tivesse feito o esforço, se não tivesse feito tudo o que
podia, sempre, é claro, confiando no poder do Senhor para habi litá-lo a agir
desse modo.

Passemos a examinar agora diversos milagres realizados por estes mesmos


apóstolos, como estão registrados no livrode Atos dos Apóstolos. Há algumas
observações que devemos fazer acerca desses milagres. Uma é que nunca houve
fracasso nos milagres apostól icos registrados no livro de Atos dos Apóstolos. Outra
é que os apóstolos não realizavam milagres todo dia. E também, eles nunca
anunciavam previamente que iam fazer isso. É desse modo que eles diferem daqueles
que hoje dizem que fazem milagres, e que afirmam que podem anunciar que
pretendem fazê-lo em tal ou tal dia. Os apóstolos nunca falavam dessa maneira; e
a razão disso é óbvia - eles nunca sabiam de antemão quando iam real izar um
milagre. O que está claro é que subitamente lhes eram dados a incumbência e o
poder. Pedro e João, vendo o coxo à Porta Formosa do templo, sabiam que tinham
recebido a incumbência, pelo que diz Pedro: “Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno,
levanta-te e anda”. O homem levantou-se, “e logo os seus pés e artelhos se firmaram.
E, saltando ele, pôs-se de pé, e andou, e entrou com eles no templo, andando, e
saltando, e louvando a Deus”. O princípio é que, com a incumbência é dado o
poder, na ordem está a capacitação.

O mesmo princípio é válido quanto a toda questão da pregação. Pessoas há que


defendem idéias estranhas, esquisitas, com relação à pregação. De fato conheci
pessoalmente homens que não hesitavam em dizer que o pregador nunca deve
preparar o seu sermão. Eles achavam que a preparação é um erro, que indica falta de
fé. Às vezes citavam o Salmo que diz: “Abre bem a tua boca, e ta encherei” (81:10),
e argumentavam que tudo o que o pregador precisava fazer é subir ao pú lpito, abrir
a boca e começar a falar. Outro versículo que muitas vezes eles citavam mal,
isolando-o do seu contexto, é Mateus 10:19, que nos diz: “Não vos dê cuidado como,
ou o que haveis de falar, porque naquela mesma hora vos será ministrado o que
haveis de dizer”. Mas o nosso

Senhor estava falando de pessoas sob julgamento nos tribunais, durante perseguição,
subitamente detidas e presas. “Numa ocasião como essa”, disse Ele, “não se
preocupem, Eu estarei com vocês, e lhes darei as palavras que vocês deverão dizer.”
Ele não estava falando sobre um ministério de pregação. Todavia eles insistiam,
argumentando: “Tudo vem do Senhor, e você não precisa fazer entrar nisso o
elemento humano; você não deve usar a sua mente, não deve usar o seu entendimento
e o seu conhecimento. Deve confiar inteiramente no Espírito”. Argumentavam que
Whitefield estava completamente errado em usar os espantosos poderes de oratória
que lhe tinham sido usados por Deus desde o seu nascimento natural. “A oratória é
coisa errada”, diziam eles, “é manifestação da carne”. Não reconheciam que a
oratória é um dom de Deus. “Você tem que ser inteiramente passivo”, insistiam eles
em sua argumentação. Não se prepare, não faça uso das suas faculdades naturais!

Essa perspectiva é totalmente antibíblica. Nas Escrituras vemos que os homens que
Deus usou preparavam-se e preparavam o seu material. Paulo passou três anos na
Arábia, obviamente desenvolvendo a sua recém-adquirida fé em termos do Velho
Testamento. Ele tinha que preparar a sua mensagem para judeus e gentios, e por isso
passou três anos na Arábia.

Sempre vocês verão que os homens que Deus usou foram marcantemente os que
estudaram mais, conheciam melhor as Escrituras e dedicavam tempo à preparação.
Vocês devem fazer o melhor e o máximo que puderem; entretanto não devem confiar
no que fazem. Devem confiar no Espírito. Quando me dirijo aministros, às vezes
digo que o maior perigo que ameaça o ministro que conclui o preparo dos
seus sermões para domingo - seja sexta-feira à noite, ou sábado ao meio-dia, ou
sábado à tarde -é dizer a si próprio: “Estou preparado para domingo; tenho meus
dois sermões”. O perigo surge desta maneira: ele tem que ter os seus dois sermões;
mas se confiar unicamente nos seus dois sermões, fracassará. O homem deve
preparar os seus dois sermões e colocar neles todas as suas habilidades e todo o seu
conhecimento, porém deve compreender que, se o Espírito não vier sobre eles, de
nada valerão. O Espírito geralmente usa a melhor preparação dohomem. Não é o
Espírito ou a preparação; é a preparação mais a unção, e aquilo que somente
o Espírito Santo pode dar. O perigo sempre está em ir para um dos dois extremos.
Seu esforço energizado pelo Senhor, e a sua confiança nEle! Não há nenhuma
dificuldade aqui, nenhuma contradição!

É precisamente o mesmo na questão da cura. Há muitos que são

apanhados e caem em dificuldades sobre a questão da chamada “cura pela fé”.


Interpretam a “cura pela fé” no sentido de que nunca se deve usar meios, que nunca
se deve fazer uso de remédios ou medicamentos. Alegam que isso seria falta de fé.
“Você tem que deixar o assunto inteiramente com o Senhor, tem que confiar
totalmente nEle.” E argumentam que você não poderá exercitar a fé se fizer uso de
meios. A resposta consiste em fazer as seguintes perguntas: quem nos deu os meios?
De onde vêm esses diversos remédios e medicamentos? Eles se acham na natureza,
nas flores, nos metais e em várias outras coisas. “Deus nos supriu ricamente de todas
as boas coisas, para delas desfrutarmos.” Deus nos supriu de todas essas coisas e,
evidentemente, Ele não as teria dado se não pretendesse que as usássemos. Mais uma
vez, o perigo está em oscilar de um extremo ao outro. Há alguns que
confiam unicamente nos meios, e esse é o grande perigo atual. Por causa do
nosso progresso, do nosso desenvolvimento e das descobertas no campo
da medicina, as pessoas acham que Deus não é necessário; elas põem a
sua confiança nos medicamentos e nos meios. Isso está errado. Mas também estão
igualmente errados os que dizem que não têm nenhuma necessidade dos meios.

Uma das melhores ilustrações quanto a este assunto é um incidente ocorrido na vida
de Hudson Taylor, o fundador da Missão do Interior da China (“China Inland
Mission”). Quando fazia a sua primeira viagem para a China, achou que era falta de
fé usar um salva-vidas que tinha providenciado para si, para atender aos insistentes
rogos de sua mãe. Ele achou que devia confiar inteiramente na proteção do Senhor, e
não quis fazer uso daquilo. De fato se desfez dele. Mais tarde, porém, ele passou a
entender que estivera errado. Não é falta de fé usar salva-vidas. Use-o, mas continue
a pôr em Deus a sua confiança. Use os meios disponíveis, todavia ponha a sua
confiança em Deus. Hudson Taylor veio a compreender isso posteriormente, e
corrigiu o que à primeira vista lhe parecia uma pura questão de fé.

Uma ilustração parecida refere-se ao caso de Andrew Murray, da África do Sul, um


bem conhecido mestre sobre a vida piedosa. Ele passou por um período em que
pensava que era falta de fé, na verdade uma negação da fé, fazer uso de meios de
cura; achava que o sofredor tem que confiar-se inteiramente ao Senhor. Não precisa
de médico, não precisa de medicamentos. Mas Andrew Murray, igualmente, em
conseqüência de experiências penosas, chegou a ver que estava errado e, mais tarde
em sua vida, usou médicos e os medicamentos receitados por eles. Contudo não
havia falta de fé nisso; em última análise, a fé está em Deus.

A palavra que cito por último sobre este assunto foi dita por Oliver Cromwell:
“Confie em Deus, e mantenha secaa sua pólvora”. Não é que você deva confiar em
Deus e não fazer nada. Você tem que lutar, tem que manter o seu poder de fogo, tem
que certificar-se de que poderá usá-lo no fragor e no calor da batalha. Mas observem
a ordem das palavras: “Confie em Deus” precede a “mantenha seca a sua pólvora”.
Quando se lê sobre a vida de Cromwell, vê-se claramente que o seu grande segredo
era a sua confiança em Deus. Esse era o seu referencial principal, porém ele era
suficientemente sábio para ver que você precisa dos meios e que tem de usá-los. Não
se fica parado e esperando que façam tudo por você. Não, “Confie em Deus, e
mantenha seca a sua pólvora”.

Porventura tudo não é muito parecido com o que frequentemente fazemos quando
procuramos animar uma criança ou alguém que está começando a aprender algo? O
principiante, a criança, diz - “Não consigo fazer isso”. Fica nervoso, com medo,
nunca fez aquilo antes, e diz que não consegue fazê-lo. Os que vão andar de bicicleta
pela primeira vez podem ter sentimentos semelhantes. Ficam dizendo que não
são capazes disso. Como lidar com tais pessoas? Naturalmente, o que temos de fazer
é restaurar-lhes a segurança, levá-las a aventurar-se, mostrar-lhes que aquilo pode
ser feito. O que normalmente fazemos é segurá-las, mas, sem que o percebam,
seguramos cada vez menos firme, e por fim a nossa mão apenas repousa nelas, sem
segurá-las. Quando elas saem, a nossa mão não fica mais sobre elas, e de repente
elas vêem que fizeram “o impossível”. Elas têm o poder latente nelas, porém não
acreditam nisso, não sabem disso; e a única maneira pela qual serão capazes
de andar de bicicleta ou de fazer seja o que for, é levá-las a aventurar-se. Elas têm
que fazer esforço, têm que fazer tudo o que podem. “Estende a tua mão”; o homem a
estendeu, e viu que tinha a capacidade. Esta lhe foi dada. Usei estamultiplicidadede
ilustrações afim de ajudar os queainda estão temerosos, assustados, alarmados. O
propósito a nosso respeito não é que sejamos assim. Espera-se que demos ouvidos a
esta grande exortação. Quando você ouvir, “Fortalecei-vos no Senhor e na força
do seu poder”, não diga, “Ah, eu sou fraco, sou débil”. É porque você é fraco que
lhe é feita a exortação. Não se lhe está dizendo que você tem em si mesmo este
“poder” e “força”, ficando por aí o assunto. O que se lhe diz é que você é filho de
Deus, que tem em si a semente da vida divina, que você está relacionado e unido a
Cristo, a Cabeça, que está sempre nesta relação, e que, quando você realizar coisas
em Seu nome, verá queé capaz de realizá-las. Você verá que tem o poder, a
capacidade tão necessária.

Vemos, pois, que todo o segredo nesta questão é crer que Deus nos está falando por
intermédio destas palavras. Não é uma frase feita, não é tão-somente uma declaração
geral, não é simplesmente uma espécie de cabeçalho. É muito prática e se
desenvolve da maneira que indiquei. O Senhor está dizendo a cada um de nós, de um
modo ou de outro, “Estende a tua mão”; pare de dizer que você não é capaz de fazê-
lo, pare de falar da sua paralisia, ouça o que estou dizendo. O poder é dado, faça-
o, continue a fazê-lo, persevere em fazê-lo. E quando o pusermos em prática,
veremos que não somente é algo verdadeiro, mas é infinitamente mais verdadeiro do
que jamais o imaginamos ou pensamos. “Provai, e vede que o Senhor é bom.”
“Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.” Por vezes você ficará admirado
com o seu poder e com a sua força; achará difícil acreditar que realmente é você.
Fraco, sem ânimo, débil, você se espantará consigo mesmo, e se encherá de
assombro face ao poder, à força e à capacidade dados a você pelo Senhor.

Seja o que for que nos defronte, seja o que for que seja posto contra nós em
particular, eu e vocês temos que compreender estas preciosas verdades - que o poder
é dado, que o Senhor está conosco, e que “nada nos poderá separar do amor de
Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor”.

Combate o bom combate

Com todo o teu poder;

Cristo é a tua força, e o teu direito;

Toma posse da vida,

E esta será deveras Tua alegria e coroa, etemamente.

Corre a carreira certa, .

Mediante a graça de Deus,

Eleva os olhos, vê Sua face;

A vida e seu caminho Estão diante de ti;

Cristo é o caminho, Cristo é o prêmio.


Deixa todo o cuidado;

Apoia-te no teu Guia,

E Sua mercê te suprirá;

Apoia-te, e a alma Confiante provará Que Cristo é sua vida e seu amor.

Jamais te desanimes,

Seu braço perto está;

Ele não muda, e tu és amado; Portanto, crê somente,

E tu verás então Que Cristo em tudo é tudo para ti.

-JohnS.B.Monsell
O QUE EVITAR

“No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” —


Efésios 6:10

Vimos que é essencial que nos concentremos positivamente no fato de que nos é dado
poder em nosso novo nascimento, quando recebemos uma semente de vida
possuidora de força e vigor. Cabe-nos fazer com que ela cresça e se desenvolva.
Fazemos isso apropriando-nos de comida e bebida espiritual, orando, exercitando-
nos, servindo ao Senhor, lançando-nos a aventuras da fé, e assim por diante. O tempo
todo nos concentramos naqui lo que eu posso denominar o lado positivo deste
ensino. Essa é, por certo, a sua parte mais essencial; mas, para que a nossa
investigação seja completa, devemos acrescentar certa soma do lado negativo,
porque isso é também absolutamente essencial.

Permitam-me usar a analogia que está em nossas mentes desde o começo, a analogia
do crescimento e desenvolvimento do ser humano, no sentido físico. Começamos
com o bebê, incapaz de cuidar de si mesmo, porém não destituído de força. Ele não
pode andar, mas pode sacudir as pernas e mover suas mãos e seus braços. Há
energia ali. Esses poderes têm que ser desenvolvidos, fomentados e treinados de
maneira positiva. Pois bem, usando esta mesma analogia, vemos também que há
certas verdades negativas que são de vital importância para nós. Noutras palavras, a
fim de permanecermos saudáveis, fortes, vigorosos e cheios de energia, há certas
coisas que temos de evitar. A luta por saúde, se se pode chamar assim, tem estes dois
aspectos -o positivo e o negativo. De nada vale tentar edifícar-se, se, por outro lado,
você faz certas coisas que só podem arruinar a sua energia e a sua vitalidade, e que
até podem tirar-lhe totalmente a saúde. O homem mais forte, se entrar numa sala
infecta, provavelmenteserá vítima de contágio. Assim, devemos evitar, em
geral, tudo quanto tenda a enfraquecer-nos, a minar a nossa energia, a privarmos de
nossa saúde espiritual, da qual nos vem a nossa energia e vigor espiritual. Proponho-
me, pois, nesta altura, a chamar a atenção para certas coisas que precisamos evitar.

A primeira coisa que temos de evitar é o desperdício de energia. Por mais energia
que tenhamos, se a usarmos mal, se a desperdiçarmos, se a

jogarmos fora, o resultado será que teremos menos energia, e nos tornaremos menos
eficazes, menos eficientes. Isso é óbvio na esfera física. Muitos homens, outrora
fortes, tornaram-se fracos simplesmente porque se empenharam demais,
pressionaram-se demais; e o resultado é que passaram a ter fadiga de coração (como
se diz), ou coração fraco, e finalmente perderam a saúde e têm que cuidar muito de si
mesmos.

Isso é igualmente verdadeiro naesfera espiritual. Às vezes penso que esse é um dos
maiores perigos que confrontam o povo evangélico, particularmente na atualidade.
Uma vez me pediram para falar numa conferência de cristãos evangélicos, e o tema
sugerido foi precisamente esta questão. É que vários cristãos, pertencentes a
diversas profissões e a outros modos de vida, estavam preocupados consigo
mesmos, no sentido de que pareciam ter perdido o tom da sua vida espiritual, não
gostavam da Bíblia como antes, não gostavam de orar, e assim por diante, e em
geral se sentiam infelizes com o estado e condição espiritual em que tinham caído.
Há muitos nesta condição, e não tenho dúvida em afirmar que, em minha experiência
como pastor, a sua causa mais comum é o desperd ício de energia.

O apóstolo escreve que os seus patrícios tinham “zelo” sem “entendimento”


(Romanos 10:2). Esse mal não se restringe aos incrédulos, mas é muito comum entre
os crentes. “Zelo sem entendimento.” Isso significa, em parte, atividade sem
reflexão, ou o que pode ser descrito como “ativismo”. Espera-se que sejamos ativos
e, comojáassinalei, não há nada que garanta tanto o aumento da nossa força como
estar em atividade. No entanto, você tem que saber como ser ativo. Há toda
a diferença do mundo entre atividade e ativismo, entre a atividade saudável e a
dissipação de energia. A necessidade é que a nossa atividade seja razoável,
disciplinada, governadaedirigida. Pode-se entenderesse perigo e como ele surge.
Acontece que o ensino popular no presente é que “todos estejam fazendo algo”. “Dê
ao recém-convertido algo para fazer.” Essa é a frase corrente; e, diga-se de
passagem, é completamente antibíblica. As Epístolas pastorais ensinam quase
exatamente o oposto; elas nos advertem de que não ordenemos um neófito porque ele
ainda não está pronto para fazer certas coisas; e lhe é perigoso porque ele
pode encher-se de orgulho, como aconteceu com o diabo. Mas este é o
ensino dominante hoje: temos que estar fazendo alguma coisa aqui, ali, em
toda parte.

Esta é uma condição muito perigosa para a alma, pois o que geralmente acontece é
que essas pessoas acabam ficando exaustas e sob demasiada tensão. A resistência
espiritual das suas vidas sofre então.

Este é um princípio válido para todos os domínios e departamentos da vida. Todo


aquele que exagera no que faz - e não importa o que faça - logo descobrirá que, antes
de mais nada, a qualidade do seu trabalho começa a sofrer as conseqüências. O
homem que prega demais, que dá duro demais no ministério, o homem que é super-
ativo, o homem que canta demais-em todos os casos, a primeira coisa que se perde é
a qualidade. O público em geral nãoo perceberá poralgum tempo. Os críticos,
porém, o reconhecerão; dirão que o homem está sendo conduzido adiante por
sua reputação passada, mas que já não é o mestre que era, dirão que lhe
falta destreza, que algo se perdeu. Simplesmente porque o homem
está sobrecarregado de trabalho, está se cansando, e o resultado é que ele
vai perdendo algo vital, inexoravelmente.
Isso é particularmente verdadeiro na esfera espiritual. Há muitos que, com muitas
boas intenções, e achando que têm que estar fazendo algo para justificar o seu
cristianismo, muitas vezes entram nesse estado porque temem as críticas dos adeptos
do tal ensino atualmente popular. Muitos cristãos, por seu medo dos verbosos clichês
que estão sendo tão usados, acham que devem estar sempre fazendo alguma coisa.

Este é um problema deveras real. Alguns profissionais, cristãos, saem quase todas as
noites da semana para reuniões. Isso é errado até do ponto de vista da vida familiar;
mas não é o que me preocupa neste momento. Estou preocupado com o perigo que
eles próprios estão correndo. Eles se vêem exauridos, enfim, sem mais nada que
possam dar; ficam apenas fazendo algo mecanicamente, algo de bem pouco
valor. Digo que a culpa deles é a “dissipação de energia”, o “desperdício
de energia”-atividadedestituídade inteligência.

Todo homem tem que sentar-se e planejar sua vida; tem que decidir o que ele pode e
o que não pode fazer. Deve ser resoluto, e não se deixar governar pelo “que o povo
diz”. É ele que está na melhor posição para saber o quanto ele pode fazer, quando
fazê-lo e onde fazê-lo. Nunca permitam que outros lhes ditem o que fazer. Não
permitam que “o que há para fazer”, em toda e qualquer esfera, determine o que
vocês irão fazer. Devemos encarregar-nos de nós próprios, ou, doutro
modo, ficaremos cansados, aborrecidos e exaustos simplesmente por dissiparmos,
por jogarmos fora, a nossa energia.

Há outras maneiras pelas quais o mesmo erro vem à superfície. Acaso não constitui
um perigo o fato de que alguns de nós desperdiçam bastante energia simplesmente
falando demais? Falamos tanto que nunca paramos para pensar ou meditar. A maioria
de nós fala demais, e assim desperdiça muita energia. Uma conversa muito longa
pode levar à

exaustão. O falatório pode levar muitos a terem problemas espirituais. Temos que
aprender a seguir a exortação das Escrituras: “Todo homem seja pronto para ouvir,
tardio para falar, tardio para se irar” (Tiago 1:19). Certifiquemo-nos de que não
vamos passar a vida toda falando, sem realmente nunca pensar na verdade e sem
entendê-la, com isso deixando de crescer na graça e no conhecimento. Temos que
disciplinar-nos a nós mesmos nesta questão.

Também se pode dissipar energia meramente argumentando, disputando e brigando.


Muitas advertências nos são feitas nas Escrituras concernentes a isso. Vejam 1
Timóteo 1:4: “Nem se dêem a fábulas ou a genealogias intermináveis, que mais
produzem questões do que edificação de Deus, que consiste na fé”. E no versículo 6:
“... desviando-se alguns, se entregaram a vãs contendas”, isto é, passavam a vida
discutindo e brigando. Vamos ainda à Segunda Epístola aTimóteo, capítulo 2, onde
há bom número de referências a essas questões. Vejam o versículo 14: “Traze estas
coisas à memória, ordenando-lhes diante do Senhor que não tenham contendas de
palavras, que para nada aproveitam e são para perversão dos ouvintes”. Eles davam
a impressão de que eram muito inteligentes; argumentavam, debatiam. Mas não havia
proveito em sua conversa. Por mais que você se incline a argumentar sobre a
verdade, se não estiver crescendo espiritualmente como resultado disso, diminua
isso; talvez, por algum tempo, seria melhor você cortar isso totalmente e começar a
examinar a sua alma. “Nada aproveitam e são para perversão dos ouvintes.” Também
no versículo 16: “Evita os falatórios profanos, porque produzirão maior impiedade”.
Observe bem o resultado desse tipo de coisa. Versículo 23: “Rejeita as questões
loucas, e sem instrução, sabendo que produzem contendas”. Ainda em Tito 3:9: “Mas
não entres em questões loucas, genealogias e contendas, e nos debates acerca da
lei; porque são coisas inúteis e vãs”. A prova de tudo sempre deve ser se
é proveitoso - proveitoso para as nossas almas, proveitoso para as almas doutras
pessoas. Há muita dissipação de energia, puro desperdício de energia, em disputas e
contendas que não têm utilidade. Se você não estiver crescendo em conseqüência da
sua atividade nesse aspecto, será melhor começar a exam inar-se de novo. Se você
tem tanto conhecimento, deveria estar mostrando isso em sua vida. “Todavia, o
fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus.”
Sim, “E qualquer que profere o nome de Cristo aparte-se da iniqüidade” (2 Timóteo
2:19). Conhecimento, batalhar pela fé e crescimento na graça, sempre devem andar
juntos.

Este tema merece muita atenção. É uma questão muito difícil, porque

as Escrituras nos dizem duas coisas. Primeiro, somos exortados a “batalhar pela fé”.
É a exortação de Judas. “Tive por necessidade escrever-vos e exortar-vos a batalhar
pela fé que uma vez (por todas) foi dada aos santos.” E há grande necessidade disso
na presente hora. O apóstolo agradece aos filipenses que permaneceram com ele na
“defesa e confirmação do evangelho” (Filipenses 1:7). Somos chamados para fazer
isso; e nunca com maior necessidade do que no presente. No entanto, devemos
manter-nos numa posição que esteja entre dois extremos. Há alguns que nunca
defendem a fé. Estes se dizem pessoas amáveis, bondosas, que não discutem, que não
entendem, que não são dados à controvérsia. Assumir essa posição é ser antibíblico,
pois, o propósito a nosso respeito é que batalhemos zelosamente pela fé.

Esse é um dever cristão, mas também há outro. Nunca devemos fazer-nos culpados
desses “debates vãos”, dessas “contendas vãs”. Não sejamos como os que vivem
sempre criticando e discutindo. É um péssimo defeito. Existe uma posição
intermediária entre os dois extremos. “Ao servo do Senhor”, diz o apóstolo, “não
convém contender” (2 Timóteo 2:24). Ao mesmo tempo nós temos que batalhar
pelafé e conter-nos, evitando contender. “Contender” significa que o seu espírito
está errado, e uma vez que o seu espírito está errado, o seu motivo se torna errado.
Você tende a orgulhar-se de ser “um defensor da fé”, e perde a sua qualidade
espiritual. Este é um perigo terrível, especialmente para o pregador. No transcurso
do meu ministério, conheci homens que ilustram isso muito bem. Penso
particularmente em dois homens que começaram com pastorados poderosos, sob os
quais muitos foram convertidos e eram edificados. Esses dois homens terminaram
como meros contestadores. Eles atraíam multidões para ouvi-los nas noites
de domingo -gente que gosta de uma espécie de briga espiritual, querendo ver quem
ia “apanhar” em seguida, quem ia ser atacado. Há uma mentalidade que tem prazer
nesse tipo de coisa, e quanto mais você lhe der disso mais prazer terá. Isso é muito
ruim. Devemos batalhar, porém jamais contender. Temos que fazer o primeiro e
evitar o segundo. No momento em que alguém começa a contender, já está dissipando
a sua energia. Aqueles dois homens que conheci eram muito capazes, e
grandes pregadores; mas arruinaram os seus ministérios. Puseram-se a contender, e o
poder se foi; e por fim se tornaram ineficientes em tudo.

Sugiro ademais que devemos evitar passar muito tempo no que chamo “atmosferas
enervantes”. Não importa quão forte você seja, se estiver numa atmosfera ruim, se,
por exemplo, houver ali excesso de

umidade, você não se sentirá muito forte. Isso minará a sua energia e a sua
vitalidade. Você se sentirá fraco, apesar de ser, naturalmente, uma pessoa muito
forte.

Isso, de novo, é tão válido na vida espiritual como o é na vida física. Há atmosferas
muito enervantes.É-nos possível disperdiçarmuito tempo por pura falta de disciplina
pessoal; e não há nada que seja mais enervante do que isso. Um homem pode
simplesmente sentar-se e não fazer nada; quanto mais ele fizer isso, menos poderá
fazer. Ficar só na preguiça e na negligência é por demais enervante. Não é que,
necessariamente, você esteja fazendo coisas más; pode-se desperdiçar tempo não
fazendo nada ou fazendo coisas que não valem a pena. Lembro-me de um homem
que uma vez estava dando conselho a ministros. Era um ancião, e ele
estava advertindoos ministros especialmente do perigo dojornal matinal. Disse ele
que descobrira em seu ministério que, de um modo ou de outro, ele gastava a maior
parte da manhã lendo todo o seu jornal, e então, de repente, percebeu que, lá pelas
onze horas ou onze e meia, a manhã se fora e ele não fizera nada.

E desse tipo de coisa que estou falando. Está certo o ministro ler um jornal para
saber da situação contemporânea; porém, se ele perde toda a manhã com a leitura de
um jornal, está errado. Conheci outro que tinha dom para pregar e que, não obstante,
deu em nada porque costumava sair todas as manhãs e conversar com os que ele
encontrava nas ruas da cidade. Todos o elogiavam como pessoa afável e bondosa;
mas ele não estava realizando o seu trabalho, não estava lendo, não estava
se preparando para o exercício do seu ministério. Apliquemos tudo isso a
nós mesmos. Se você entrar nessa condição de negligência, poderá desperdiçar toda
a sua vida não fazendo nada. Isso é completamente inútil, e acaba com a nossa
energia.

A seguir, para examinar a questão por outro aspecto, podemos passar tempo demais
com companhia imprópria. Não me refiro necessariamente a má companhia. Estou
pensando num tipo de companhia que não é positivamente útil, no sentido espiritual.
Naturalmente não estou querendo dizer que devemos afastar-nos totalmente de tais
pessoas, doutro modo nunca as poderemos ajudar. Esse é um extremo; o outro é você
gastar muito tempo com elas. Não estou sugerindo que você se torne monge
ou eremita e saia da vida. Isso é um erro, não é ensino do Novo Testamento, é um
falso ascetismo. Mas então, o outro perigo está em você passar muito tempo com
elas, apenas conversando, não sobre coisas más, porém sobre coisas que pouco
importam. É isso que as Escrituras descrevem como “o mundo”. O mundo é inimigo
do cristão. Você não se afasta dele, todavia

não deve passar muito tempo nele. Se você passar muito do tempo de que você
dispõe numa atmosfera mundana, verá que o fio da sua vida espiritual ficará
embotado. Não há nada de errado, inerentemente, em ver televisão ou ouvir rádio,
mas se passar muito tempo fazendo isso, é certo que não será capaz de orar muito
bem, e que perderá o gosto pelas Escrituras.

Temos que andar pisando em ovos, nestas questões; você não se deve colocar neste
ou naquele extremo. Entretanto, precisa estar vigilante. E, por certo, examinando-se a
si próprio, sempre poderá dizer se a sua força está aumentando ou declinando. Você
acha que no presente lhe falta algo, espiritualmente, que você perdeu o ânimo, que
não aprecia as coisas cristãs como antes e como sabe que deveria apreciá-las? Bem,
eu lhe faço uma única pergunta: quanto tempo você toma com as outras coisas, e por
quê? Esta é uma regra absoluta; a atmosfera afeta imendiatamente a nossa
constituição. Por isso, certifique-se de que não está passando tempo demais nesse
tipo de atmosfera.

Existe uma coisa ainda pior. O apóstolo já nos tem exortado nesta Epístola aos
Efésios acerca do que ele chama “parvoíces e chocarrices”. Não devemos ser
pomposos, não devemos apresentar-nos com excessiva seriedade, mas isso é muito
diferente do erro das “parvoíces e chocarrices”. Muitas vezes fico surpreso por
ouvir cristãos cedendo a essas “parvoíces e chocarrices”. Verifiquemos que não
estamos produzindo uma atmosfera nociva com esse tipo de coisa. Essa espécie
de conversa pertence ao mundo, não a nós. Isso é a instrução das Escrituras.

O mundanismo, naturalmente, tem muitas formas, e há perigos específicos. O


apóstolo adverte Timóteo, na Primeira Epístola, capítulo 6, versículo 9: “Os que
querem ser ricos caem em tentação, e em laço, e em muitas concupscências loucas e
nocivas, que submergem os homens na perdição e ruína. Porque o amor ao dinheiro é
a raiz de toda a espécie de males; e nessa cobiça alguns se desviaram da fé, e se
traspassaram a si mesmos com muitas dores. Mas tu, ó homem de Deus, foge
destas coisas”. Paulo aí condena o amor ao dinheiro. O dinheiro como tal não é mau,
se o homem o usa apropriadamente, como despenseiro do Senhor Jesus Cristo.
Contudo, no momento em que o homem começa a amar o dinheiro, entraopecado.
Tenho bastante idade parapoderdizerque tenho visto muita gente boa sair-se mal
nesse ponto. Uma vez que acontece isso, a temperatura espiritual sempre abaixa, e
ocorre uma rápida perda de vigor espiritual. Conheci homens que foram convertidos
de uma vida muito pecaminosa, e que, por causa da sua conversão, começaram a
dar atenção ao seu trabalho, progrediram e tiveram sucesso; e tive a
infeliz experiência de ver alguns deles caírem na armadilha de que estamos

falando. Antes, jogavam fora o seu dinheiro; agora, começaram a amá-lo. Ambos os
extremos são maus.

Outra causa da perda de vigor e energia espiritual, e de deixar de ser “forte no


Senhor e na força do seu poder”, é a enervante atmosfera da respeitabilidade. É um
perigo muito comum na Igreja. As vezes me pergunto se não é a maior maldição na
hora presente. Pelo menos, as estatísticas provam claramente que, por uma razão ou
outra, o cristianismo atual não está sensibi lizando as classes trabalhadoras deste
país. Será, às vezes me pergunto, porque estamos dando a impressão de que
o cristianismo é só para as respeitáveis classes médias? Examinemo-nos a nós
mesmos sobre isso. Tememos amanifestação do Espírito? Pesa sobre nós a culpa de
apagar o Espírito? Tememos a vida, o vigor e o poder? Quantas vezes vi homens que
começaram com fogo se tornarem cristãos simplesmente respeitáveis, finos - inúteis,
sem nenhuma energia, sem nenhum vigor, sem nenhum poder!

Permitam-me ilustrar isso outra vez com fatos daesfera do ministério. Conheci
homens que entraram no ministério e que sem dúvida eram homens chamados por
Deus, cheios de paixão pelas almas e revestidos de poder na pregação. Vi-os
terminarem apenas como bons pastores, bons visitadores. Visitar faz parte do
ministério pastoral; mas se o homem se torna apenas um homem agradável, um pastor
bondoso, excelente para receber-se em casa, alguém que toma uma chávena de chá
com você, é trágico. Que tragédia o profeta acabar sendo tão-somente um
homem amável e um pastor bondoso! Mais uma vez estamos vendo que
sempre devemos procurar evitar os extremos. No entanto, não há nada que possa ser
tão enervante como esse tipo de atmosfera fina e respeitável, na qual ficamos
temendo quase tudo, e, acima de tudo, ficamos temendo a manifestação do poder do
Espírito Santo. Por isso, começamos a “extin-guir o Espírito”!

É evidente que há aplicações intermináveis deste tema. Ele constitui o fundo e base
racional do ensino que se vê em 2 Coríntios, capítulo 6, sobre “não nos prendermos
a um jugo desigual com os infiéis”. Isso se aplica primariamente ao casamento. A
razão pela qual o cristão não deve casar-se com alguém incrédulo é que, fazendo
isso, ele se põe numa atmosfera nociva, que tende a minar a sua energia e vitalidade
espiritual. Isso é inevitável, como se vê no fato de que desse modo ele se associou e
se prendeu a alguém que não tem vida e entendimento espiritual .Ele, não o seu
cônjuge, é que sofrerá as conseqüências. Por conseguinte, somos exortados a não nos
sujeitarmos a um jugo desigual com os infiéis.

Em terceiro lugar, evitemos contágios e infecções. Aqui estamos indo para um perigo
mais positivo. Agora não estamos falando meramente de uma atmosfera enervante,
por ruim que isso seja. Há algo ainda pior, a saber, uma atmosfera enfermiça, um
lugar em que existe uma infecção ativa. Se você sabe que há infecção numa casa ou
num quarto, obviamente não irá lá, a menos que tenha que ir por uma boa e válida
razão. Você não deve “aventurar-se” na infecção. De novo, é claro, você tem que
ser cauteloso, pois aqui também há extremos. Pode ficar com tanto medo
de infecções que nunca sai para fora das portas e, por fim, talvez acabe vivendo
numa espécie de estufa onde vai morrer de inanição! Temos que manter este
equilíbrio espiritual e bom senso em todos os aspectos das nossas vidas.

Refiro-me, é claro, à necessidade de evitar más companhias. Já indiquei o perigo de


companhia mais ou menos inocente, e não espiritual. Quanto mais necessárias as
advertências acerca das más companhias! O Salmo 1 trata desse assunto: “Bem-
aventurado o varão que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no
caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores”. Ele é um
homem “bem-aventurado”, um homem reto, um homem feliz; é um homem
que conhecerá a bênção do Senhor, porque evita toda atmosfera poluída. Se você
“andar segundo o conselho dos ímpios”, tiver estreita amizade com pessoas que são
literalmente ímpias, más e perversas, elas só poderão afetar você. Se você “se
detiver no caminho dos pecadores” e se puser onde eles estão, não será surpresa se
você cair; e se você “se assentar na roda dos escarnecedores”, logo perderá o fio da
sua vida espiritual. Isso tem acontecido frequentemente. Há somente uma coisa a
fazer -evitar toda má companhia! “Evite-a como à peste”, como se diz, pois é a
própria peste, a peste do inferno, a peste do diabo e de tudo quanto é imundo.
Afaste-se dela.

Gosto do termo do apóstolo - “Foge”! Corra disso, fique tão longe quanto puder. É a
única coisa a fazer com as más companhias. Você verá ensino muito instrutivo sobre
isso em I Coríntios, capítulo 5. No fim desse capítulo o apóstolo nos mostra o
perfeito equilíbrio que sempre caracteriza os ensinamentos bíblicos. Nos versículos
9-11 ele diz: “Já por carta vos tenho escrito, que não vos associeis com os que se
prostituem”. Segue-se a declaração que dáo equilíbrio -“Isso não quer dizer
absolutamente com os devassos deste mundo, ou com os avarentos, ou com
os roubadores, ou com os idólatras; porque então vos seria necessário sair do
mundo. Mas agora vos escrevi que não vos associeis com aquele que, dizendo-se
irmão, fordevasso, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou
beberrão, ou roubador; com o tal nem ainda comais”. Não faça companhia a um
irmão que seja culpado desses crimes, você não deve ter nada a fazer com ele. Mas,
observem o equilíbrio segundo a maneira pela qual Paulo o coloca.

Temos um ensino semelhante no capítulo cinco desta Epístola aos Efésios, onde ele
diz no início, no versículo 8: “Porque noutro tempo éreis trevas, mas agora sois luz
no Senhor; andai como filhos da luz”. Versículo 10: “Aprovando o que é agradável
ao Senhor. E não comuniqueis com as obras infrutuosas das trevas, mas antes
condenai-as. Porque o que eles fazem em oculto até dizê-lo é torpe”. Não devemos
ter nada a fazer com eles, e nem sequer devemos falar sobre eles. Depois há aquela
terrível advertência na Epístola de Judas, versículo 23. Judas tinha dito aos cristãos
como ajudar as pessoas: “Apiedai-vos de alguns”, diz ele, “...e salvai alguns,
arrebatando-os do fogo; tende misericórdia deles com temor, aborrecendo até a
roupa manchada da carne”. Vocês têm que ajudar essas pessoas, porém com muito
cuidado, para não suceder que, ao ajudá-las, elas os arrastem para baixo e os
corrompam. Muitos dizem levianamente: “Ora, o nosso Senhor foi amigo de
publicanos e pecadores”. Certo, mas nunca nos esqueçamos de que Ele era o Senhor!
Agindo com base nesse ditado há muitos que, tola e impensadamente,
acabaram sendo arrastados para o baixo nível do publicano e do pecador!
Todavia, se vocês o fizerem “aborrecendo até a roupa manchada da carne”,
não haverá perigo.

Ademais, evitem a má leitura-refiro-me à leitura geral, à leitura que corrompe. Fala-


se muito absurdo sobre isso hoje em dia. Estão nos dizendo que o cristão precisa ler
esse tipo de lixo para poder ajudar as pessoas. Vocês não precisam espojar-se na
lama para entender algo sobre ela. Vocês não têm necessidade de ler esse tipo de
“literatura”. É ruim, écorruptora; evitem-na, tanto nos livros como nosjornais.
Acasojá não viram, em sua experiência, que ler certas coisas lhes causa dano?
Não as leiam, pois. Se perceberem que, em conseqüência da leitura de certo tipo de
reportagem de jornal sobre divórcio ou sobre algo semelhante, vocês ficam sujeitos
à tentação de maneira mais aguda, não leiam esse tipo de coisa. Evitem-no, ponham-
no de lado; se necessário, compre um jornal diferente, que não se glorie na
corrupção moral, mas que muito acertadamente dedique apenas umas poucas linhas à
matéria, dizendo que se chegou a tal ou qual veredicto. Vocês não precisam saber
dos pormenores, não ganham nada por sabê-los. Ne verdade, quase sempre sofrerão
algum dano resultante dessa leitura. O apóstolo estabelece a questão assim, em
Romanos 13:14: “... nãó façais provisão para a carne,

para atender suas cobiças” (VA). Se vocês alimentarem a carne, não fiquem
surpresos se caírem em suas tentações e em suas concupiscên-cias; não façam
provisão para ela. Vigiemos nossa leitura geral.

E ainda, sob este título, vigiem os seus pensamentos e imaginações. “Foge também
das paixões da mocidade”! Esse é o ponto em que temos de vigiar. Ao primeiro
pensamento, à primeira imaginação, “Foge”, afaste-se, corte isso, detenha-o. Os
pensamentos e as imaginações podem ser maus, e nós temos que mortificá-los
rapidamente.

Temos, ademais, de evitar as pessoas que não crêem na Bíblia como a Palavra de
Deus, pois farão mal a vocês; elas vão tirando energia espiritual de vocês, e vocês
acabarão sendo contagiados. Quantas vezes acontece isso! Quantas vezes conheci
jovens, verdadeiramente convertidos, cheios de paixão pelas almas, zelo e
entusiasmo, que, depois de irem para uma faculdade teológica, saem completamente
inúteis! O que aconteceu foi que a sua fé na Palavra de Deus foi solapada. Quanto
mal isso faz, que ruína produziu tantas vezes! Estou me referindo a certa atitude para
com as Escrituras, ao ensino segundo o qual o homem, com a sua razão, é capaz de
determinar o certo e o errado. O crítico crê nisto, acerca do Senhor, não crê naqu i
lo; não crê que Ele nasceu de uma v irgem, não crê nos milagres, não crê na morte
expiatória e na ressurreição. A Bíblia não é mais a Palavra de Deus, não há
evangelho real, não há mensagem. Não tenham comunhão com os que não crêem que
a Bíblia é a Palavra de Deus. Estou falando dos que se dizem cristãos. Naturalmente,
temos que relacionar-nos com os outros; mas, se um homem diz e garante que é
cristão, e, contudo, procura destruir a própria base e fundamento da fé, não tenham
comunhão com ele.

Não estou escrevendo isso baseado em m inha autoridade pessoal; há justificativa


escriturística para o que digo. O apóstolo João, em sua Segunda Epístola, diz: “Se
alguém vem ter convosco, e não traz esta doutrina, não o recebais em casa, nem tão
pouco o saudeis”. Temos que agir com base nesse princípio. É meu dever nunca
permitir que ocupe o púlpito da igrejade que sou pastor alguém que tenha um
conceito errôneo da inspiração das Escrituras, ou de qualquer destas doutrinas
cardinais. Não somente não é um verdadeiro pregador, é um inimigo e uma
ameaça. Não somente não tem valor, é um perigo. Se eu puder ajudá-lo, muito bem, e
bom será, porém não devo dar-lhe acolhida em minha casa, não devo considerá-lo
irmão, não devo ser amigável com tal pessoa. Devo mostrar que há uma diferença
essencial entre nós.

Não há nada que seja tão fatal para o vigor e poder espiritual como atitude errada
para com aPalavrade Deus e para com as doutrinas cristãs

cardinais. Foi por isso que o apóstolo escreveu a Primeira Epístola aos Coríntios,
capítulo 15. Certas pessoas estavam negando a ressurreição. Por que Paulo se
preocupou com isso? Porque “as más conversações corrompem os bons costumes”.
A vida será errada, se a doutrina for errada. E não hesito em afirmar de novo que
uma das principais causas das condições atuais da Igreja Cristã é a fuga, durante o
século passado, da crença na inspiração divina e plenária das Escrituras Sagradas, e
em sua autoridade final em todas as questões de fé e conduta. Não hádúvida sobre
isso. A própria Igreja Cristã, lançando dúvida sobre a veracidade da palavra e a
autoridade das Escrituras, literalmente semeou as sementes da incredulidade nas
mentes do povo em geral, resultando em que agora o povo em geral está fora da
Igreja. E continuará fora, enquanto a Igreja não voltar à fé na autoridade da Palavra
de Deus.

Na Primeira Epístola a Timóteo, diz o apóstolo que certos homens “se apartaram” da
verdade, com a conseqüência de que, no que diz respeito à fé, “fizeram naufrágio”.
Ele diz virtualmente a mesma coisa de novo, e mais extensamente, na Segunda
Epístola a Timóteo, capítulo 2. Vejam o versículo 18, por exemplo: “Os quais se
desviaram da verdade, dizendo que a ressurreição era já feita, e perverteram a fé de
alguns”. Eles se desviaram e estavam causando dano a outros; e, por conseguinte, a
vida, a energia e vigor espiritual ficaram perdidos paraa Igreja. Evitem todas as
heresias como essas, evitem-nas como à própria peste; desenvolvam um senso de
discriminação. Não digam, “Fulano de Tal é um homem excelente e louvável; ele fala
sobre Cristo, e sobre a morte de Cristo”. A pergunta vital é: que é que ele diz sobre
essa morte. Qual o seu ensino sobre ela? Desenvolvamos um espírito de
entendimento e de discriminação, para que não sejamos vítimas de infecções
perniciosas e insidiosas que nos privarão da nossa vida evitai idade espiritual. Não
me agrada dizer essas coisas, mas é um dever advertir as pessoas do perigo das
infecções. O pregador é alguém que foi chamado para divulgar com grandes letras
avisos advertindo o povo acerca das moléstias contagiosas e perigosas. A Igreja
deve pôr os falsos mestres em quarentena nos hospitais de isolamento, todavia,
enquanto ela não faz isso, eu digo: evitem esses homens e os seus ensinos, e não
tenham comunhão com eles.

Vê-se mais outra ênfase em nosso texto, na parte final. Diz o apóstolo no versículo
13: “Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau,
e, havendo feito tudo, ficar firmes”. “Havendo feito tudo”! Que é que ele quer dizer?
“Havendo feito tudo” significa “havendo lutado”. O cristão põe toda a armadura de
Deus, enche-se de

força e poder e enfrenta a batalha no dia mau. Havendo feito tudo, ele é tentado a
tirar a armadura. “Consegui a vitória”, diz ele, “está tudo bem”. Tira, então, a
armadura e vai se deitar. “Não”, diz o apóstolo, “havendo feito tudo-ficai firmes”!
Continuem firmes. Não relaxem. “Defendam o acampamento”, como diz Martinho
Lutero neste ponto. “Defendam o acampamento!” Estamos sempre de serviço na
vida cristã, não podemos relaxar nunca. Isso de férias não existe no reino espiritual.
Cuidado com o excesso deconfiança porterem tido umagrande vitória. Em 1
Coríntios 10:12 Paulo diz: “Aquele pois que cuida estar de pé, olhe, nãocaia”.
Nunca relaxem, nunca desistam; havendo feito todas as coisas, continuem firmes, isto
é, continuem defendendo a posição. Relaxar é um perigo muito real. Ouço muitos
evangélicos dizerem tolamente: “estamos vencendo o tempo todo, as coisas vão indo
bem”. Vão mesmo? O estado em que o inundo se encontra prova a afirmação? E o
estado em que se encontra a Igreja? Muitos homens foram derrotados imediatamente
após a sua maior vitória. Estultamente se despiram da armadura e se instalaram para
um período de tranqüilidade e repouso. “Havendo feito tudo, continuem firmes”,
sempre; fiquem sempre em posição de alerta e em prontidão face a este inimigo por
demais astuto.

Queira Deus dar-nos graça para podermos apl icar estas coisas a nós mesmos. Estive
indicando algumas das coisas que temos de evitar; se vocês deixarem de fazer isso,
logo perderão a sua força, ficarão moles e fracos. Foi porque falhou nisso que
Sansão caiu em alguns dos laços e armadi lhas dos quais os estive advertindo. Ele
perdeu a sua força porque não foi suficientemente cauteloso quanto à companhia que
teve. Que Deus nos preserve! Que Deus nos dê graça e sabedoria para
aplicarmos estas coisas!

“ESTAI POIS FIRMES”

"No demais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. ” -


Efésios 6:10

Agora estamos em condições de resumir o nosso estudo da primeira exortação


particular desta declaração. Com este propósito, chamo a atenção para uma
expressão empregada nestes versículos, a saber, a expressão estar firmes, no
versículo onze. Havendo-nos sido dito, “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu
poder”, é-nos dito, “Revesti-vos de toda a armadura de Deus”, para que possamos
“estar firmes contra as astutas ciladas do diabo”. Depois, de novo, no
versículo treze: “Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que
possais resistir”. Esta palavra comunica a mesma idéia, com algo mais.
“Estar firmes contra”, “resistir”, enfrentando todas as coisas que lhes sobrevenham,
particularmente “no dia mau”; “e, havendo feito tudo, ficar firmes”. O apóstolo
prossegue: “Estai pois firmes”. Noutras palavras, temos esta exortação particular
neste contexto imediato quatro vezes; e, no início do versículo catorze ele está
realmente resumindo tudo, como se dissesse: eis agora o sumário de tudo o que eu
estive dizendo: “Estai pois firmes!”

A ênfase é dada particularmente à primeira exortação a “fortalecer-nos no Senhor e


na força do seu poder”. Precisaremos da armadura também, mas o importante é que
temos que permanecer firmes, plenamente equipados dessa maneira, contra o diabo e
suas nefandas forças. Este é o grande chamamento que nos vem, a todos nós que
somos cristãos. Somos chamados para sermos vencedores na luta, na verdade,
para sermos “mais do que vencedores” sobre tudo quanto se ponha contra nós. Essa
expressão resume as exortações do Novo Testamento, embora expostas numa
variedade de formas. Tudo isso tem em vista este fim, que sejamos capacitados a
"ficarfirmes”.

A “ordem do dia” para todos os cristãos é, “Ficai firmes!” “Estai pois firmes!” Já
vimos com que freqüência ocorrem expressões militares nas Epístolas do Novo
Testamento. Nelas não somos considerados gente enferma, sempre somos tratados
como gente sadia, e como gente que resiste, que permanece firme. A imagem que se
deve ter em mente é a de um quartel, de um campo de treinamento. Devemos pensar
em nós

como tropas, como soldados, como pessoas engajadas no exército do Deus vivo.
Que diferença faria para a Igreja Cristã, se ela se visse dessa maneira! O mundo de
fora não se interessa pelo cristianismo porque pensa que ele é algo sentimental,
desarrumado e sem medula espinal. Porventura nossas vidas sugerem que há alguma
verdade nessa crítica? Pesaria sobre nós a culpa de uma espécie de brandura que é
uma completa falsificação da verdade cristã? Não é para ser assim, pois todas as
exortações aqui feitas, como estou mostrando, são de caráter militar. Temos que pôr-
nos de pé, temos que “ficar firmes”.

Examinemos, pois, e vejamos algo do conteúdo e da força dessa expressão. A


primeira idéia que nos dá é que devemos sentir-nos frustrados e infelizes porque há
um conflito, porque há um combate. Muitos cristãos parecem ficar decepcionados
quando vêem que a vida cristã é uma luta. Parecem estar com a idéia de que, desde o
momento em que alguém se torna cristão, jamais encontrará quaisquer problemas
ou dificuldades; não haverá luta; não haverá conflito; não se requererá nenhum
esforço. Por isso, quando vêem que, ao contrário, eles têm grandes dificuldades e um
tremendo combate, ficam completamente desanimados. E, naturalmente, no momento
em que entra o desânimo, eles já se sentem fracos, e correm o perigo de se tornarem
negligentes e letárgicos. Logo tendem a aborrecer-se, a lamentar-se e a perguntar
por que isso tinhaque acontecer com eles. O próprio tom de voz com que
eles levantam as suas questões indica que já estão derrotados.

A palavra do apóstolo vem a tais pessoas e as convoca a “ficarem firmes”, a se


animarem, a se encherem de coragem para o conflito. O apóstolo Pedro trata da
mesma situação em sua Primeira Epístola, onde diz: “Amados, não estranheis a
ardente prova que vem sobre vós para vos tentar, como se coisa estranha vos
acontecesse” (1 Pedro 4:12). De fato, quando se lêem estas Epístolas do Novo
Testamento, fica mais que evidente que tais palavras tinham de ser ditas
constantementeà primeira geração de cristãos. Isso está bem claro no caso da
Epístola aos Hebreus. Aqueles crentes hebreus estavam perguntando: porque está
acontecendo isso conosco? Estamos sendo perseguidos pelos nossos patrícios,
pelos judeus; tudo está contra nós; temos sido despojados. Pensávamos que quando
entrássemos nesta vida cristã não haveria mais dificuldade, nenhum problema,
nadaque nos perturbasse a felicidade. O resultado foi que eles estavam começando a
ver sua fé abalada e a olhar para o passado, para sua antiga religião judaica.
Semelhantemente, não existe nenhuma chave real para o entendimento do 1 i vro de
Apocal ipse, exceto

esta mesmíssima idéia. O livro de Apocalipse é uma profecia do tipo de vida que os
cristãos sempre terão neste mundo lim itado pelo tempo até o fim, devido ao diabo e
às suas potestades, e devido aos estragos feitos pelo pecado na natureza humana. De
várias maneiras e mediante uma diversidade de símbolos, as forças postas contra nós
são retratadas, e nos é mostrado exatamente o que devemos esperar. De igual modo o
apóstolo Pedro escreve: “Amados, não estranheis a ardente prova que vem sobre vós
para vos tentar, como se coisa estranha vos acontecesse” - não fiquem surpresos,
porque, se ficarem, já estarão derrotados.

Nada é mais importante do que o fato de que devemos reconhecer a inevitabilidade


das provações, dos problemas e dos conflitos deste mundo por causa do diabo e por
causa do pecado. Portanto, sempre que nos virmos inclinados ao desânimo, e a
reclamar e murmurar que parece que o Senhor não está cumprindo as Suas promessas
a nós, nesse preciso momento temos que dar ouvidos a esta exortação a “Ficar
firmes”. “Junte forças!” “Encha-se de coragem!” Não devemos dar lugar
aos pensamentos de autopiedade que vêm juntar-se em nossa mente e coração. Como
cristãos, nunca devemos lamentar por nós mesmos. Não importa qual seja a nossa
situação, ou o que nos esteja acontecendo, nunca devemos lamentar por nós mesmos.
No momento em que o fizermos, perderemos a nossa energia, perderemos a vontade
de lutar e a vontade de viver, ficaremos paralisados. Por mais forte que você seja,
assim que você der lugar a esse sentimento, já estará perdendo algo da sua
energia vital.

Portanto, essa expressão nos vem como uma forte exortação a que nos livremos de
toda a lassidão. “Lance fora a néscia indolência; lance fora a vã melancolia.” Todos
nós temos necessidade dessa palavra. Reconhecemos que certas coisas práticas são
pecaminosas, e nem sonharíamos em fazê-las. Lembremo-nos, porém, de que um dos
grandes pecados é o pecado da autopiedade, de lamentar-se a pessoa por si mesma e
de permitir que entrem na sua mente pensamentos que lancem dúvida sobre o amor e
a bondade de Deus, e de que Ele cuida de nós. Nunca achem estranho ou
surpreendente que a vida em que vocês entraram tem essas dificuldades. Este mesmo
apóstolo, escrevendo a Timóteo, explicita bem isso. Diz ele: “E também todos os
que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Timóteo
3:12). Verdadeiramente, na Epístola aos Filipenses a colocação é clara: “A vós vos
foi concedido, em relação a Cristo, não somente crer nele, como também padecer
por ele” (Filipenses 1:29). O mesmo apóstolo, é-nos dito no final do capítulo 14 do
livro de Atos dos Apóstolos, numa visita que fez às
igrejas, lembrou-lhes que “por muitas tribulações nos importa entrar no reino de
Deus”.

Aí está, pois, a nossa primeira dedução desta grande e animadora expressão “Ficai
firmes!” Na verdade eu posso ir além e dizer que, porque somos cristãos, devemos
esperar mais dificuldades, em alguns sentidos, do que os outros. O homem do mundo,
o homem que não tem a nova vida em Cristo, não é tão atacado pelo diabo e suas
hostes como nós. Devido sermos cristãos, o diabo é extraord inariamente ativo com
relação a nós; e, portanto, de todas as pessoas, nós deveríamos ser as
menos surpresas quando essas coisas acontecem conosco.

Uma segunda dedução é que, não somente não devemos ficar surpresos, também não
devemos apavorar-nos. “Ficai firmes”, diz o apóstolo. O homem apavorado não é
visto como sendo firme, em pé; já está meio correndo, a fugir, está aterrorizado,
alarmado. “Ficai firmes”, diz o apóstolo. Não significa que vamos subestimar o
diabo e seu poder. Paulo se empenha para nos dizer que não façamos isso. É por essa
razão que ele entra em detalhes sobre o caráter e a natureza desses poderes. Ele não
está defendendo uma atitude temerária. Devemos compreender plenamente a natureza
do poder que se opõe a nós. Contuto, apesar de sabermos que esse poder é tão
grande, tão terrível e tão poderoso, só ficando abaixo do poder de Deus, somos
exortados a não apavorar-nos -e isso é a maravilha da mensagem cristã!

Acontece isso por causa da realidade do poder que está em nós e nos sustenta.
Somos capacitados a resistir ao diabo. Isso é afirmado claramente na Primeira
Epístola de Pedro: “Sêde sóbrios; vigiai; porque o diabo, vosso adversário,
andaemderredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar” (1 Pedro 5:8-
9). Mas a exortação é: “Ao qual resisti firmes na fé”. Tiago faz uma exortação
similar: “Resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” - embora ele seja de fato um leão a
rugir! Como é importante que compreendamos isso! Psicologicamente importante!
Toda vez que você fica apavorado, já está derrotado. No momento em que
você começa a tremer, a estremecer e a ceder a pensamentos de possível derrota, sua
energia simplesmente escorre para fora de você, vai se gastando e se dissipando.
Portanto, necessitamos desta exortação a “ficar firmes”. “Em nada vos espanteis dos
que resistem” (ou, “dos vossos adversários”, VA)! (Filipenses 1:28). Como cristão,
você não admite isso. Noutras palavras, procure dar-se conta de que você é “forte no
Senhor e na força do seu poder”, que você faz parte deste Corpo que é dominado,
governado e alimentado pela Cabeça, da qual todaaenergia

provém. Você está “em Cristo”, e o Seu poder está em você, mediante o Espírito.
Procure aperceber-se disso, e então será forte. O apóstolo expressa isso desta
maneira notável - “Ficai firmes”! Antes de termos tempo para desenvolver o
argumento, simplesmente devemos “Ficar firmes”. Isso tem uma espécie de efeito
elétrico sobre nós, imediatamente. Aí estamos nós, propensos a agitar-nos, a tremer e
a estremecer; e nessas condições o inimigo pode fazer o que quiser conosco.
Mas, subitamente se nos diz que “Fiquemos firmes”; e imediatamente nos animamos
para o combate outra vez. Como cristãos, não devemos ficar apavorados, jamai s.

Isso é o que podemos chamar o paradoxo da posição cristã. Ao mesmo tempo, o


cristão compreende quão terrivelmente fraco ele é, e, todavia, quão tremendamente
forte. Em si e por si, desvalido; mas, na força do Senhor e no Seu poder, invencível,
“mais do que vencedor”. Portanto, quando nos vierem pensamentos deprimentes, e
quando o diabo tentar aterrorizar-nos como leão, e rugir para nós, lembremo-nos
da exortação a “Ficar firmes”. Não permitamos que ele nos aterrorize. “Todo o
mundo”, diz o apóstolo João em sua Primeira Epístola, “está no maligno” - em seus
braços. “Mas o maligno não nos toca” (1 João 5:1819). Temos que lembrar-nos
disto; o maligno não nos toca. Fomos transferidos do seu reino “para o reino do
Filho do seu amor” (Colossenses 1:13). Ele pode rugir, porém não nos pode tocar.
Portanto, deixemos que ele ruja. Fiquemos firmes! “Ao qual resisti firmes na fé.”
Embora ele seja o diabo, e embora você seja fraco, o Senhor o torna forte. O diabo
nada lhe poderá fazer quando você o fizer lembrar-se do sangue de Cristo que está
sobre você como resultado da sua relação com Ele. Fique firme! Oxalátodos nós
pudéssemos ouviressas palavras quando o diabonos vem tentar ou seduzir! Seja o
que forque o tente, ou que o prove, você não tem por que fracassar, ou vacilar, ou
cair em tentação. Fique firme! Não se apavore!

Mas a expressão “ficar firmes”, dá também a idéia de que não devemos ser
indiferentes e indecisos. Não nos encolhamos, não nos dobremos; fiquemos firmes no
nosso posto. Nunca sejamos indiferentes ou indecisos no combate. Se tivermos
dúvidas sobre a guerra na qual estamos engajados, lutaremos pessimamente. Isso tem
acontecido com freqüência; aconteceu com nações, e também com indivíduos.
Qualquer dúvida ou incerteza ou hesitação quanto à causa em que estamos engajados,
i rá privar-nos da nossa energia e mais ou menos nos paral isará. Assim, o chamado
para que fiquemos firmes é outra maneira de levar-nos

a perceber claramente qual é a situação. Noutras palavras, é outro meio de dizer-nos,


mais uma vez, que devemos lembrar-nos do que significa ser cristão. Devemos ter
um claro entendimento da vida cristã. A Igreja de Deus em grande parte é o que é
hoje porque nela estão muitos que não sabem porque pertencem às suas fileiras.
Muitos estão nela simplesmente por causa da criação que tiveram. Não entendem a
razão disso, e estão a contragosto; passam boa parte do tempo pensando que
prefeririam não ser cristãos e nunca terem ouvido falar da fé. Vêem outros, que são
seus conhecidos, fazerem certas coisas porque não foram criados numa atmosfera
cristã; e quase lamentam serem cristãos, porque é aquilo que de fato eles gostariam
de fazer. Certamente, todos quantos se acham nestas condições já estão derrotados,
porque são indecisos.
Se o cristianismo é uma tarefa, se o culto a Deus em Sua casa é algo que temos que
forçar-nos a fazer, já estamos derrotados. Não estamos “firmes”. Estamos
atordoados e oscilando; temos que receber ajuda doutras pessoas, somos levados
por algum impulso alheio, não por impu lso próprio. Essa é a situação de muitos;
estas coisas não estão claras em suas mentes. Todo aquele que se diz cristão e que
acha que o ensino do Novo Testamento é estreito, está proclamando que ele ou ela
realmente nada sabe a respeito. Se você protesta contra o ensino do Novo
Testamento, e procura fazer o mínimo, com isso confessa que não “está firme”,
que tem mente dividida, que é indiferente, que é indeciso em toda a sua atitude.

A Bíblia condena essa condição, onde quer que se encontre. Diz o salmista: “Vós,
que amais ao Senhor, odiai o mal” (Salmo 97:10, VA). “Odiai o mal”! Não somente
não o pratiquem, mas odeiem-no! E se na realidade sabemos algo sobre o Senhor, só
temos que odiar o mal. A diferença entre Deus e o mal, entre Deus e o diabo, é a
diferença que existe entre a luz e as trevas. “Tu és tão puro de olhos, que não podes
ver o mal” (Habacuque 1:13). “Deus é luz, e não há nele trevas nenhumas” (1 João
1:5). E eu e vocês dizemos que somos filhos de Deus!

Devemos examinar estas coisas e lembrar-nos delas. Levante-se! Veja que você é
filho de Deus, e que o mundo, a carne e o diabo estão contra você. Tenha isso claro
em sua mente, e então você se preparará para a tarefa e para o dever. Lemos na
Epístola de Tiago: “Não sabeis vós que a amizade do mundo é inimizade contra
Deus?” (4:4). E esta é, necessariamente, a verdade. O mundo está contra Deus. “O
inundo” significa a vida, a perspectiva, tudo o que é organizado pelo diabo e
seus poderes. Ele está totalmente contra Deus. E Tiago afirma que, se você é amigo
do mundo, nessa mesma medida você é inim igo de Deus. Você está tentando ter um
pé em dois campos ao mesmo tempo - um pé em cada

canoa. Está na Igreja, e está no mundo, é por Deus, e é pelo diabo. Você é como o
homem de mente dupla, e você é inútil. Ecomo umaondado mar, jogada para cá e
para lá. Mas, “Não podeis servir a Deus e a Mamom” (Mateus 6:24), você não pode
estar na luz e nas trevas ao mesmo tempo.

O apóstolo João fala ainda mais fortemente sobre o assunto. Diz ele: “Aquele que
diz: eu conheço-o (ao Senhor), e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso” (1
João 2:4). Ora, isso é falar franco, todavia é como o Novo Testamento ensina
santidade. As Escrituras não se limitam a dar uma palavra de ânimo a você, e dar
palmadinhas em suas costas, a dizer que você está indo muito bem, e a induzir-lhe a
fazer um pouco melhor. Nada disso; diz, porém: “Você é mentiroso”. Isso
choca você? É preciso que não tenhamos mente dividida, mente dupla. “A amizade
do mundo é inimizade contra Deus.” Por isso João continua: “Não ameis o mundo,
nem o que no mundo há - a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a
soberba da vida” (I João 2:15 ss.). Essas coisas, diz ele, não são do Pai, não têm
nenhuma ligação com Ele, são a exata antítese da vida piedosa. Portanto, não tenha
nenhuma ligação com elas.

Será que estes preceitos nos deixam felizes? Será que somos entusiasticamente
sinceros nestas questões? Sentimo-nos orgulhosos por estarmos na igreja domingo de
manhã? Vangloriamo-nos de nós mesmos, em vez de nos regozijarmos do privilégio
de prestar culto porque somos povo de Deus? Acaso é um peso adorar a Deus em
espírito e em verdade? Você tem que forçar-se para fazer isso? Se não é assim, você
está em harmonia com as Escrituras, você está firme. Mas, se é assim, então
a exortação é pronunciada para você -“Fique firme!” Não seja indiferente, não esteja
meio dentro, meio fora. Seja dedicado totalmente! Seja autêntico! A exigência a nós
imposta é totalitária; portanto, demos uma resposta total a ela. O Senhor nos chama
para que Lhe votemos lealdade completa: “Amarás, pois, ao Senhorteu Deus de todo
o teu coração, e de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento, e de todas as tuas
forças” (Marcos 12:30). Não retenha nada. Ele quertudo; dê-Lhe tudo. Firme-
se, apreste-se, tome sua posição. Tudo isso está aqui, numa só breve expressão.

Permitam-me, aseguir, sugerir-lhes umquartosignificadodaexpressão “ficar firmes”.


Segue-se, é claro, de tudo o que estive dizendo. Havendo-nos livrado das coisas que
impedem que resistamos apropriadamente, jamais sequer pensemos em retirada.
Ogeneral que está planejando umacampanha e olha sobre os ombros para trás,
pensando numa possível retirada,

provavelmente terá que fazer retirada. Ele já está derrotado, antes da batalha
começar. Nunca nos façamos culpados dessa conduta. Não existem portas dos fundos
na vida espiritual, e jamais devemos dar as costas ao inimigo. “Ficai firmes!” O
mundo está cheio de portas dos fundos atualmente. Às vezes parece que, na maioria,
as pessoas que se casam hoje já estão pensando no divórcio, mesmo antes do
casamento. Isso é a razão da atual bancarrota da moralidade. Certas portas
deveriam ser fechadas com ferrolho e tranca, e nunca deveriam ser reabertas. Nunca
olhe para trás, só para frente. Você está encarando o inimigo; não pense em retirada.
Jamais faça a corte a um possível pensamento de fracasso; é completamente oposto a
este ensino.

Não fale nem pense muito em sua fraqueza, ou em suas derrotas, ou nas fraquezas e
falhas dos outros. É deprimente, e é má propaganda. Os agentes do inimigo gostam
de levar-nos a fazê-lo, e ele os tem entre nós por toda parte. Ele tem os seus espiões,
e estes insinuam em nós pensamentos e nos fazem sugestões, e procuram levar-nos à
depressão falando-nos da grandeza do inimigo e da nossa fraqueza, e assim
por diante. Certamente temos que atentar para estas coisas; mas não falemos demais
sobre elas. Não passemos demasiado tempo segurando as mãos uns dos outros. Isso
parece duro? No entanto, é o ensino do Novo Testamento. Se a Igreja dá ao mundo a
impressão de que ela não passa de um bando de pessoas que se dão as mãos uns aos
outros e ficam dizendo coisas bonitas, consoladoras e sentimentais, já está acabada e
é inútil num mundo como o de hoje. O diabo e suas forças estão ativos, e precisamos
lutar! Uma igreja não é um lugar onde as pessoas pouco mais fazem do que
compadecer-se umas das outras; essa é uma concepção totalmente errada da Igreja
Cristã.

Avante cristãos! A hita enfrentai!

Eia, encarai o forte inimigo!

Notem como o hino expõe a matéria, e como a expressa bem! E de novo:

Jamais recueis! Render-vos? - Jamais!

Cristãos, saireis do penoso campo?

Ire is vós fugir na hora do perigo?

Acaso não conheceis o vosso forte Capitão?

Não devemos nem pensar em fugir na hora do perigo. É o que muitos

têm feito. É por isso que a Igreja neste país está tão fraca como está hoje. Os
“passageiros” tendem a abandonar sorrateiramente o barco, as pessoas que não
sabem por que estão na igreja, sempre saem dela num tempo como este. No fim isso
é bom, naturalmente, e a Bíblia mostra que faz parte do método de Deus. Lembrem-
se do que Ele fez com o exército de Gideão, como o reduziu drasticamente até restar
só uns poucos; e então Deus o usou. Esse é o método! Que nunca haja nem suspeita
de um pensamento sobre uma possível retirada. Uma coisa dessas deve
ser inimaginável, tanto no caso da Igreja Cristã como no caso dos
cristãos inidividuais.

À luz disso tudo, o meu quinto ponto é: tome a sua posição e fique sempre alerta.
“Fique firme!” Há muitas idéias aqui. A exposição que o apóstolo Pedro faz dessa
expressão é: “Sede sóbrios...” (1 Pedro 5:8). A referência não é à questão de
embebedar-se com vinho ou com álcool. Isso está incluído, porém não é o que ocupa
principalmente a mente do apóstolo. Ele quer dizer: “Livre-se de todas as formas de
embriaguez mental e espiritual”. Não somente da embriaguez física, mas também
da mental e da espiritual! Sabemos algo sobre isso? Embriaguez mental é você
abrigar tantos pensamentos derrotistas e tantas idéias desalentadoras que se torna
incapaz de fazer coisa alguma. Você fica paralisado, como um “bêbado coxeante”.
Há quem diga: “Não sei onde estou, não sei o que fazer”. Pessoas assim são como os
ébrios. Não tomaram nenhuma bebida alcoólica, todavia sofrem de embriaguez
mental, estão em confusão, com muitos pensamentos, possibilidades e idéias. Andam
tão estonteadas que não conseguem lutar. Embriaguez mental!

A mesma coisa acontece na esfera espiritual. Ser sóbrio significa ser equilibrado,
não ficar desnorteado, mental ou espiritualmente, não ser “levado em roda por todo o
vento de doutrina” (Efésios 4:14), não se transtornar quando ouvir algo que nunca
tinha ouvido. E saber controlar-se, é ter domínio próprio em todas as circunstâncias.
A característica da embriaguez, quer física quer espiritual ou mental, é que a pessoa
não consegue controlar-se. Diz coisas e faz coisas que não devia. Não pensa bem,
não tem equilíbrio, falta-lhe entendimento completo, ageao primeiro impulso. Isso é
estar embriagado; por isso a ordem dada aos soldados cristãos é: “Sede sóbrios”. O
homem que permanece a postos, a sentinela, necessariamente tem que estar sóbrio.
Tem que ter pleno domínio de si. Sua mente, seu pensamento, suas energias têm que
estar concentrados em sua tarefa.

Assim, Pedro acrescenta outra palavra: “Vigiai”. Significa “ficai

bem acordados”. A sentinela que dorme em seu posto é um perigo, não somente para
si, mas também para todo o exército e para tudo o que está sendo protegido. Talvez
tenha ficado muito tempo de serviço, talvez tenha ficado muito cansado, fatigado e,
por isso, talvez tenha se encostado na porta dasuaguarnição. Então o inimigo vem de
súbito, pega-o cochilando, e assim consegue entrar. Estejamos alerta, sejamos
vigilantes! O Novo Testamento dá ênfase a isso constantemente - “Vigiai!”
“Vigiai!” “Sede vigilantes!” Estejam alerta, fiquem bem acordados, fiquem firmes!
Vocês não podem dar-se ao luxo de relaxar, porque, se o fizerem, provavelmente vão
acabar dormindo. A única maneira de manterem-se acordados é resistir. Animem-se
e certifiquem-se de que estão resistindo, de que estão com pleno domínio e que estão
sempre vigiando. Vocês têm um inimigo muito astuto. Ele pode vir contra vocês de
qualquer direção-mantenham-se acordados, vigiem e orem! Não relaxem a tensão
nem por um momento, mas sejam sempre vigilantes.

São essas as expressões doNovo Testamento. Como são diferentes do que muitas
vezes pensamos! Contudo, ouçamos as Escrituras; são estas as exortações divinas
que vêm a nós, como vieram primeiro aos cristãos primitivos. Sejam vigilantes,
sejam sóbrios, por causa do caráter e da natureza do seu inimigo. Noutras palavras,
vigiem a primeira abordagem dele; ataquem-no e resistam aele de imediato, sem
nenhuma hesitação. Se vocês uma vez começarem a dar ouvidos ao diabo,
elejáos capturou. Não lhe dêem ouvidos, não recebam dele nem uma só expressão; à
primeira investida, repliquem imediatamente, como fez o nosso Senhor na Tentação,
e o derribarão. Mas se vocês uma vez começarem a aceitar algumas das suas
sugestões, se uma vez começarem a arrazoar ou argumentar, ele já os derrotou. O que
quer que ele diga, fogo nele imediatamente! Ele diráque vem como amigo, ele quer
fazer propostas, ele tem uma sugestão... Não lhe dêem ouvidos. Fogo! Ele é sempre
o inimigo, ele é sempre um mentiroso, ele é sempre o “pai da mentira”, ele é
“mentiroso desde o princípio”. Não dêem a mínima atenção a ele, em nenhum
aspecto. Sejam vigilantes, sejam sóbrios, estejam sempre prontos, sempre vivos,
sempre alerta, sempre despertos, e sempre vigiando em todas as direções. Não se
entreguem ao cansaço, não fiquem pensando na longa duração da batalha, não se
ponham a dizer: “Isso não vai ter fim?” A resposta é: de pé! Em frente! “Avante,
cristãos! A luta enfrentai!”

Finalmente, tratem de compreender o princípio de estar nesse combate. Não somente


fiquem firmes; fiquem firmes briosamente. A verdade é que vocês não poderão ficar
firmes sem o fazerem soberba-

mente. Isso está na própria expressão “Ficar firmes!”, pois, que tremendo privilégio
é esse! Vale a pena lutar pela causa de Deus. O próprio apóstolo Paulo lhe chama “o
bom combate” da fé (2 Timóteo 4:7). “Combatei o bom combate da fé!” E se isso
não nos fizer “permanecer firmes”, o que o fará? Pensem no reino a que
vocês pertencem, pensem na sua posição completa. Se tão-somente
compreendêssemos isto, jamais ficaríamos indecisos, jamais ficaríamos
trôpegos. Deveríamos encher-nos de ufania, e de um senso de glória, face
ao privilégio que nos é dado, que não precisássemos ser exortados a resistir, a ficar
firmes; já estaríamos resistindo, já estaríamos firmes. Em certo ponto anterior
mencionei a ordem do dia expedida porNelson na manhã de Trafalgar: “A Inglaterra
espera que cada homem cumpra hoje o seu dever”. Lembrem-se daquilo pelo que
vocês estão lutando, lembrem-se da Causa. O fato é que o combate é de Deus. Não
estamos travando uma luta pessoal; não se trata de uma pequena contenda pessoal.
Estamos pelejando na batalha do Senhor. “O combate não é vosso, mas de Deus.” O
cristianismo não é assunto nosso, é de Deus; e a Igreja Cristã, como exército, é
exército do Deus vivo. Israel, em seus grandes dias, sempre lutou dessa maneira -
sempre lutou como exército do Deus vivo.

Recordem a história de Davi e Golias, e do que Davi disse a Golias: “Tu vens a mim
com espada, e com lança, e com escudo, porém eu venho a ti em nome do Senhor dos
exércitos, o Deus dos exércitos de Israel, a quem tens afrontado” (1 Samuel 17:45).
Recordem também a causa de Gideão e do seu grito de guerra - “Espada do Senhor e
de Gideão” (Juizes 7:20). A guerra é de Deus; e estamos lutando pelo nome e
pela glória de Deus. O tipo de “ensino de santidade” que nos vem primeiramente
como algo para nós mesmos, está errado já no princípio. Você não deve preocupar-
se primariamente com a obtenção de auxílio para você, e sim, com a guerra do
Senhor, com a guerra de Deus. É assim que se começa. “Fique firme”, dando-se
conta de que a guerra é de Deus. Não devemos ser demasiado subjetivos, como nos
inclinamos a ser. Em primeiro lugar, comecemos com Deus, e depois, logo
entenderemos e resolveremos o nosso problema pessoal. Estamos combatendo em
nome de Deus e para a glória de Deus. O diabo não é primariamente nosso inimigo;
é inimigo d eDeus. Foi contra Deus queele se levantou, foi contra Deus que ele se
rebelou; e é contra Deus que ele guerreia. Ele faz uso de nós, em nossa ignorância e
loucura, para investir contra Deus. Foi Deus que nos fez e que nos redimiu a um
preço tremendo; e se o diabo puder derrotar-nos, estará derrotando a Deus. A guerra
não é nossa, e eu e vocês temos o privilégio de lutar nesta guerra - na “guerra do
Senhor”.

E assim recebemos ordem para “ficar firmes”. Eu e vocês, assim como somos,
recebemos o privilégiode lutar num dos combates do Senhor Deus todo-poderoso!
Vê-se que o diabo está tentando arrastar o mundo inteiro para a ruína, atualmente.
Porventura vocês não o vêem aparentemente vencendo, e o nome de Deus sendo
blasfemado, ou totalmente ignorado? Porque freqüentamos a igreja? Só para
recebermos benefícios? Não deve ser esse o nosso primeiro motivo; o nosso
objetivo primord ial deve ser lutar contra o inimigo de Deus, contra o diabo, satanás,
contra este inferno que ele deixa solto no universo. É por nosso intermédio que Deus
está travando esta batalha. “Estai, pois, fi rmes.” Mas lembrem-se também de que o
diabo é igualmente o nosso maior adversário e inimigo pessoal. Ele é o nosso
acusador, “o acusador de nossos irmãos” (Apocalipse 12:10).

Tomemos um segundo pensamento. Quem é o seu Capitão? - seu Lider? O Capitão da


nossa salvação não é ninguém senão o Filho de Deus, o Senhor Jesus Cristo. Que
diferença faz o general, o líder! Todos nós ficamos sabendo algo sobre isso durante a
última guerra mund ial; mudar a liderança muitas vezes faz uma diferença vital. Os
homens confiam no novo líder, e os mesmos homens que antes eram derrotistas e
pensavam em fugir, digamos, recebem nova energia e novo poder do recém-chegado.
O Exército Imperial Francês, parece, sempre podia dizer por instinto quando
Napoleão estava presente. A mera presença do
“Pequeno CabodeGuerra”1sempregalvanizavaaenergiadastropas. Multipliquem
isso por m i lhões e por infin idades, e vocês começarão a compreender que
estamos sendo liderados pelo Senhor Jesus Cristo.

Sábio e amoroso, é nosso Deus.

Quando o pecado dominava,

O Adão Segundo, para lutar E resgatar-nos, veio à terra.

Eis “O Capitão da nossa salvação”! Ele veio à terra para conduzirmos neste
combate. E nós ficamos firmes atrás dEle, estamos com Ele, Ele é nosso Líder.

Ou pensemos da seguinte maneira: estamos engajados na mesma luta em que Ele


próprio esteve engajado quando esteve neste mundo, sendo que “em tudo foi tentado,
mas sem pecado” (Hebreus 4:15). Se alguma

vez houve alguém que foi confrontado por decepções e incompreensões dos amigos;
se alguma vez houve alguém que foi caluniado e perseguido, Seus próprios amigos
fugindo dEle porque não compreendiam o Seu ensino, esse foi o Filho de Deus!
Estamos seguindo esse Capitão, estamos na mesma espécie de guerra. Como nos
lembra um hino:

O caminho por onde o Senhor foi,

Não deveria o servo percorrer?

Podemos resumir tudo dizendo que estamos lutando pela honra da fé. Paulo escreve:
“Como tenho porjusto sentir isto de vós todos, porque vos retenho em meu coração,
pois todos vós fostes participantes da minha graça, tanto nas minhas prisões como na
minha defesa e confirmação do evangelho”. Também o versículo 27: “Somente
deveis portar-vos dignamente conforme o evangelho de Cristo” (ou: “Somente seja a
vossa conversação como convém ao evangelho de Cristo”, VA). Que frase! Vivam de
tal maneira, diz o apóstolo, que convenha, que se ajuste, ao evangelho de Cristo,
“para que, quer vá e vos veja, quer esteja ausente, ouça acerca de vós que estais num
mesmo espírito, combatendo juntamente com o mesmo ânimo pela fé do evangelho”-
defendendo juntos a linha, todos se mantendo alerta, ninguém fraquejando, ninguém
desertando. O evangelho de Jesus Cristo, sua honra, sua reputação, sua glória, está,
ele todo, em minhas mãos e nas suas. Vocês lêem freqüentemente nos jornais que há
no presente uma divisão nos conselhos do Ocidente, e os jornalistas dizem: “Dão
risadade nós em Moscou”. Claro! Eles ficam muito alegres quando vêem divisão no
Ocidente. E quando eu e vocês caímos, há regozijo no inferno. “Haverá alegria no
céu por um pecador que se arrepende” (Lucas 15:7). Sim, e há alegria no inferno
quando um filho de Deus cai ou foge ou deixa de resistir. A honra da fé, a glória
da fé, está em nossas mãos. “Estai, pois, firmes.” Não pense muito em si próprio;
lembre-se do que e de quem você representa.

Eis minha derradeira palavra: pensem na coroa de glória que os aguarda. Vocês
acham longa a batalha? Vocês se sentem aborrecidos e cansados, e, às vezes,
combatendo nas horas quentes e pesadas do dia, sentem-se abandonados? Se é assim,
ouçam o que o apóstolo escreve no último capítulo da última carta escrita por ele - a
Segunda Epístola a Timóteo: “Eu já estou sendo oferecido por aspersão de
sacrifício, e o tempo da minha partida está próximo. Combati o bom combate, acabei
a carreira, guardei a fé”. Ele não tinha ficado dormindo; ele estava firme - “Desde
agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor,

justo juiz, me dará naquele dia”. Mas, você dirá isso é somente para os Paulos da
Igreja, não há muitos, na verdade há só um. Ele pode ter a coroa da justiça, porém
quem sou eu? Ouçam: “E não somente a mim, mas também a todos os que amarem a
sua vinda”. Vem o dia em que a mim e a você será dada uma coroa de glória, das
mãos do bendito Senhor, e ouviremos as palavras: “Bem está, servo bom e fiel; entra
no gozo do teu Senhor”. Você se ajoelhará diante dEle, e Ele porá a coroa sobre a
sua cabeça, a grinalda e a coroa dadas a cada vencedor do combate, a todos os
homens e mulheres que, compreendendo que tinham o privilégio de pelejarem Seu
combate, de manter a Sua causa, em Seu glorioso exército, estiverem firmes, e firmes
continuaram. “Estai, pois, firmes”, sabendo que “o dia do coroamento vem, e não
demora”.

“Petit Caporal”, apelido familiar dado a Napoleão I por seus soldados. Nota do
tradutor.
TODA A ARMADURA DE DEUS

“Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para que possais estar firmes contra as
astutas ciladas do diabo. ” - Efésios 6:11

Havendo tratado da primeira exortação - “Fortalecei-vos no Senhor e na força do


seu poder” - chegamos agora à segunda, que salienta a importância de “tomar” para
nós e de “revestir-nos de toda a armadura de Deus”. Notem que o apóstolo coloca
primeiramente esta exortação em termos gerais, e depois, do versículo catorze em
diante, passa a tratar do assunto em detalhe, dando-nos instruções acercadas peças
particulares desta armadura. Isso é muito característico dele; ele coloca o
geral primeiro, e depois toma as partes particulares.

O meu primeiro comentário terá que ser, inevitavelmente, que o próprio fato de que
esta armadura é necessária, e que nos é dito que nos utilizemos dela, é certamente
uma notável confirmação de tudo o que vimos e aprendemos quando tratamos da
primeira exortação. Lá nos afanamos em salientar que estamos numa luta, num
conflito, e que nós temos de fazer o combate. “Temos que lutar.” Se isso fosse algo
feito para nós, não precisaríamos da armadura, apenas assistiríamos, por
assim dizer, e colheríamos os frutos e os benefícios da vitória. O próprio fato de que
nos é dito que nos rev istamos da armadura, que ponhamos cada peça, e de que nos é
dito mais ou menos como usar cada peça, dá-nos a entender de novo a parte do
ensino que acentua que cada um de nós está engajado nesta guerra, e que a primeira
coisa que temos de aprender como cristãos é como “combater o bom combate da fé”.
Estamos nele, nunca poderemos abster-nos e, portanto, convém que nos
certifiquemos de que sabemos exatamente o que fazer.

O meu segundo comentário -já fiz alusão a ele várias vezes - pode ser colocado na
forma de uma pergunta. Por que o apóstolo põe estas duas coisas nesta ordem
particular- “Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder” primeiro, e depois,
em segundo lugar, a armadura? Essa, para mim, não é somente uma questão
interessante, mas é também uma questão muito importante e vital. A resposta háde ser
que a primeira coisa que precisamos fazer é tratar da situação toda. Começamos com
o geral,

antes de chegar às partes individuais. Na primeira exortação Paulo estivera falando


da nossa resistência geral ao inimigo. Havendo tratado disso, então está em
condições de tratar das particularidades.

A analogia da guerra ou de uma grande campanha guerreira nos ajudará a entender


este ponto, pois a relação que há entre a primeira e a segunda exortação é
precisamente a que existe entre a estratégia e a tática, na arte ou ciência da guerra.
Sempre se deve começar com a estratégia, não com a tática. Noutras palavras, deve-
se ter um quadro totalmente abrangente, considerar o inimigo em sua totalidade, e
a estratégia geral deve cobrir a campanha toda. Só depois de se começar com a
estratégia é que se pode passar acertadamente para a esfera da tática, que se
preocupa mais com as frentes particulares, com os setores particulares, com os
movimentos particulares, com os métodos e meios particulares de ataque.

Este é um assunto sumamente fascinante. Vocês verão na história da guerraque houve


muitos generais que eram muito bons natática, todavia poderiam ser positivamente
uma ameaça e um perigo se os nomeassem comandantes em chefe e os encarregassem
da estratégia. Esta requer um diferente tipo de mentalidade, e exige uma perspectiva
diferente. O homem que pode sermuito bom nasdisposições locais, pode falharem
sua percepção e em seu entendimento de toda a projeção da guerra. Parece-me que é
essa a distinção que temos aqui entre estas duas coisas. Primeiramente eacimade
tudo, o apóstolo nos estádizendo: “Muito bem, aí está o seu inimigo, e você tem que
estar em condições, por todos os modos, para lutar na guerra. Antes de começar a
lutar, você precisa estar revestido da energia que só vem do Senhor e “da força do
seu poder”. Esta é a exigência geral. Depois você desce ao nível das
particularidades.

Mas há outra razão para o método do apóstolo: é a diferença entre o positivo e o


negativo. Ao falar sobre “fortalecer-nos no Senhor e na forçado seu poder”, o
apóstolo, como vimos, trata da questão de edificar--nos e de fazer-nos fortes,
capazes e prontos para tudo quanto temos de fazer neste grande combate. Isso é
positivo. No entanto, nesta questão da armadura, a perspectiva é um pouco mais
negativa. Você fica esperando que algo aconteça com você. Ou, para usar outros
termos, é a diferença entre ofensiva e defensiva. A energia e a força do Seu poder
são uma característica “ofensiva”, mas a armadura relaciona-se principal e
quase exclusivamente com a nossa proteção e com o aspecto defensivo da
nossa peleja, do nosso combate, da nossa luta contrao diabo e os principados
e potestades.

Portanto, reitero, não é de admirar que o apóstolo use esta ordem. Nesta questão
particular, o positivo deve vir sempre antes do negativo. Aqui não estamos
interessados na análise da verdade, porém no combate e na convocação para a
guerra, e somos obrigados a começar com o positivo, passando em seguida ao
negativo. Noutras palavras, se você entrar neste conflito espiritual somente na
defensiva, esquecendo-se inteiramente do ofensivo e do positivo, você já está
derrotado. Vimos isso no desenvolvimento do primeiro princípio. A exortação é a
“ficar firme” e a “resistir”, a que não temamos este inimigo, apesar dele assemelhar-
se a um “leão a rugir”. “Ao qual resisti firmes na fé” - é o que devemos fazer. Se não
colocarmos o positivo antes do negativo, o espírito ofensivo antes do defensivo, nós
nos tornaremos derrotistas; e isso, naturalmente, é sempre fatal. Por conseguinte, não
podemos senão admirar a excelência da estratégia que aqui é colocada diante de nós
pelo apóstolo.

Há ainda uma terceira razão pela qual é deveras inevitável que a primeira exortação
venha antes da segunda. É simplesmente que nenhum de nósteria possibilidade de
usar esta armadura, se primeiro não nos fosse dada força. Você precisa ser forte para
poder usar a armadura. Vestir o fracote com este tipo de armadura é torná-lo
completamente desvalido e inútil. Ele terá que usar tanta energia para tentar lidar
com ela e mover-se, que não lhe restará energia suficiente para enfrentar o
inimigo. Noutras palavras, esta armadura é de tal caráter que você terá que ser capaz
de usá-la. Assim, você começa com a exortação a “fortalecer-se no Senhor e na
força do seu poder”.

Este é um princípio sumamente importante com respeito ávida cristã e ao modo de


viver cristão. Se negligenciarmos esta questão da nossa força e tratarmos
imediatamente destas várias exortações acerca da armadura, certo será que nos
veremos completamente derrotados. O princípio opera da seguinte maneira: veremos
que, em parte, esta armadura consiste do entendimento da doutrina e do seu uso
correto. Muito são capazes no trato da doutrina, mas são derrotados na sua vida
cristã, simplesmente porque se olvidaram de uma coisa mais importante, a saber, os
seus espíritos. Você pode colocar-se com acerto neste e naquele aspectos,
intelectualmente, porém se, no geral, você não estiver certo, se não estiver cheio
deste glorioso poder que estivemos considerando, o seu hábil manuseio das peças
particulares daarmadura finalmente de nada lhe valerá. Assim o apóstolo, por estas
três razões, menciona o “fortalacer-se no Senhor e na força do seu poder” antes de
nos mandar “revestir-nos de toda a armadura de Deus”.

Mas afinal, por que é necessária esta armadura? Por que não é suficiente dizer-nos
que “nos fortaleçamos no Senhor e na força do seu poder”? Há muitos que só
ensinam isso. Param na primeira exortação, e nunca passam à segunda. A idéia deles
é que, se você estiver forte no Senhor e na força do Seu poder, nada mais lhe será
necessário. Só pregam a necessidade que temos do poder, e realmente não se
preocupam em expor as Escrituras em detalhe. Isso não lhes parece necessário. Eles
têm uma fórmula mágica, e, uma vez que você a tenha aceitado, tem tudo. Assim, eles
não conhecem as Escrituras, deixam de expô-las, não vêem a importância de cada um
de seus artigos. Dizem eles: “Uma vez que você tenha conseguido este poder, está
tudo bem, não há nada que lhe possa resistir”. Mas o apóstolo, havendo-nos dito que
“nos fortaleçamos no Senhor e na força do seu poder”, vai adiante e, por questão de
ênfase, diz duas vezes: “Revesti-vos de (tomai) toda a armadura de Deus!” E
o motivo para essa exortação é que precisamos de proteção. A força, só, não é
suficiente, pormaravilhosaque seja; ainda precisamos daproteção dada por esta
armadura. Noutras palavras, temos de compreender que, enquanto estivermos neste
mundo, a defesa contra as astutas investidas do inimigo é uma necessidade constante,
que jamais deve ser negligenciada.
A Bíblia está repleta deste particular tipo de ensino. Vejam, por exemplo, o que este
mesmo apóstolo diz na Primeira Epístola aos Coríntios: “Aquele, pois, que cuida
estar em pé, olhe, não caia” (10:12). Ele retrata o homem que pensa que pode
resistir. “Tenho poder”, diz ele, “de que mais necessito? Tive uma grande
experiência espiritual.” Ele se sente cheio de poder. Essa tentação é comum. Após
alguma experiência particularmente alta e exaltada, muitas vezes vem um período de
grande perigo. Vocês poderão ver isso na história de Davi, rei de Israel, depois que
ele venceu todos os seus inimigos e se encheu de alegria e de
orgulho porsuasextraordináriasvitórias.Foijustamentequandoodiabootentou a contar
os filhos de Israel; e isso levou o seu povo a grande dificuldade e a grande
sofrimento. O princípio que esse incidente ilustra, a Bíblia o ensina em toda parte.
Quando você se julga forte, e provavelmente invencível, quando você acaba de ter
uma grande vitória, corre o perigo de achar que nada mais é necessário, que você se
tornou um cristão de tal maneira forte que imagina que pode resistir facilmente, Você
se esquece da exortação que diz: “Aquele que cuida estar de pé, olhe, não caia”.

A queda de Sansão e a queda de alguns dos maiores santos que figuram nas
Escrituras, ocorreram dessa maneira. Aconteceu com o

próprio apóstolo Paulo, após a grande experiência por ele descrita em 2 Coríntios,
capítulo 12, sobre ter sido “arrebatado ao terceiro céu”. Foi então que “um
mensageiro de satanás” foi enviado para esbofeteá-lo, para que ele se mantivesse
humilde e para salvaguardá-lo, a fim de que não viesse a confiar em si próprio e em
suas experiências.

Esse é, pois, o princípio aqui exposto. Embora pareçamos muito fortes, embora
tenhamos crescido maravilhosamente na graça e tenhamos obtido grandes vitórias,
jamais devemos confiarem nossa força e em nosso crescimento, jamais devemos
descansar nisso, jamais devemos supor que estamos fora do alcance do inimigo. O
inimigo que sempre nos defronta nunca admite derrota, e está sempre nos vigiando e
esperando pelos nossos momentos de descuido. Ele nunca relaxa, e tem sob o
seu comando grandes poderes. Não é só o diabo, mas também “os principados, as
potestades, os príncipes das trevas deste século, as hostes espirituais da maldade,
nos lugares celestiais”. O próprio diabo é ubíquo, e os seus emissários estão em toda
parte e estão sempre esperando por um momento de negligência, quando a pessoa
não está vigilante. “Portanto”, diz o apóstolo, “tomai toda a armadura de Deus”.
Vistam-na, e não se desvistam dela.

O nosso inimigo não é somente poderoso, mas também é astuto; e, como vimos, os
seus métodos e a variedade das suas armas são tais que não podemos perm itir-nos
tomar nada como coisa líquida e certa. Jamais devemos relaxar. Onde quer que
estivermos, sejam quais forem as circunstâncias em que estivermos, seja o que for
que tenhamos feito, seja o que for que tenhamos de fazer, nunca haverá feriado no
reino espiritual. Ainda que nos sintamos vibrar de poder, sejamos cautelosos! Ele
sempre sabe do calcanhar de Aquiles, sabe qual é o ponto fraco. Portanto,
embora tenhamos grande força e poder, o apóstolo nos lembra que esta
armadura defensiva é sempre uma necessidade absoluta.

Aos que se interessam por estratégia de guerra, eu diria que muitas vezes penso que
essa questão é de grande ajuda para entendermos algumas destas ilustrações
bíblicas. Não significa que você precisa ser uma pessoa belicosa, não significa que
você deve ser uma pessoa sanguinária. Todavia, em geral, aarte da guerraé um
assunto fascinante, e embora você nada entenda de luta na prática, pode entender
estas questões por sua inteligência. Se vocêjá leu 1 i vros sobre esse assunto,
terá visto que, em sua estratégia amplamente abrangente, um general jamais deve
negligenciar a defesa. A história dá eloqüente testemunho deste assunto. Houve
generais que foram excelentes quando naofensiva; mas, às vezes, o seu próprio gên
io e o seu bri lhantismo os levavam a tornar-se

um tanto negligentes em sua defesa; o resultado era que, enquanto eles estavam
atacando aqui, ignoravam adefesaali,eo inimigo entravaefazia estragos. O inimigo
empregava alguma estratégia e abordagem indireta, e, a despeito do seu
brilhantismo, o general era finalmente derrotado. Jamais devemos negligenciar a
defesa; é por isso que esta armadura, “toda a armadura de Deus”, é tão essencial.

Isso nos leva ao quarto ponto, que consiste em salientar que ela é chamada “a
armadura de Deus”. Notem como Paulo tem o cuidado de repetir as palavras “toda a
armadura de Deus”. Ele o faz porque essa é a chave da situação toda. Nada, senão “a
armadura de Deus”, nos será suficiente neste conflito terrível em que estamos
engajados. Não há proteção, não há nada que possamos fazer, que em última
instância nos proteja contra este inim igo ardiloso, astuto e poderoso, senão a
armadura de Deus. Essencialmente é, por certo, a armadura dada por Deus. É esse o
real significado da frase. Noutras palavras, você não é deixado por conta dos seus
meios e recursos pessoais. Você não tem que pensar em algo novo; tudo o de que
você necessita é fornecido por Deus.

Este é um pensamento sumamente consoladore encorajador. Seja o que for que nos
confronte na vida cristã, Deus, em Sua infinita sabedoria e bondade, já providenciou
algo a respeito. Diz o apóstolo Pedro em sua Segunda Epístola, capítulo primeiro,
que “tudo o que diz respeito ávida e piedade” já nos foi dado. Daí, todos nós
ficamos sem escusa quando falhamos. Não há nenhuma contingência que se possa
conceber, de que o Senhor não tenha tratado de antemão.

Pois bem, ao estudarmos estas questões em detalhe, examinemo-las, em primeira


instância, negativamente. Se tentarmos combater o diabo e estes poderes unicamente
em termos da nossa sabedoria e do nosso entendimento, inevitavelmente seremos
derrotados. Às vezes somos tentados a pensarque, tendo 1 ido as Escrituras, e tendo
vivido a vida cristã durante uma certa extensão de tempo, agora nós mesmos somos
capazes de lidar com o inimigo. Achamos que podemos fazê-lo por meio da
razão, de argumentos e do senso comum, ou em termos da psicologia ou do poder da
vontade. Permitam-me oferecer-lhes uma ilustração. Pensem na tendência de
preocupar-se, de ficar ansioso e de tomar tempo em preocupar-se com algo que você
pode ter feito no passado ou do que possa acontecer com você no futuro. Muitas
vezes o inimigo ataca os cristãos dessa maneira. Se ele consegue apanhar-nos
absortos conosco e com os nossos problemas-coisasque aconteceram, coisas que
podem acontecer -ele fica mais que satisfeito. No momento em que ele consegue
fazer que

nos voltemos para nós mesmos, ele já nos afundou num redemoinho no qual ficamos
girando e girando, e nos tornamos derrotados e completamente inúteis como cristãos.

Há os que ensinam que a maneira de lidar com essa experiência é como segue: eles
nos dizem: “Por que você não pára e pensa? Que adianta chorar sobre o leite
derramado? A coisa está feita, você não pode desfazê-la; de que vale, então, pensar
nisso?” Isso é, evidentemente, bom senso, é simples, é razoável. Mas você játentou
lidar com o seu problema só dessa maneira?Toda a dificuldade que defronta a
pessoa que é atacada pelo diabo nesse ponto é que essa é justamente a coisa que ela
é incapaz de fazer. Ela gostaria de poder fazê-la, porém não consegue. Ela
está dispostaaadmitir-“Sim, concordo inteiramente; quando você me coloca a
questão, posso ver que a minha reação é completamente ridícula, que é um
desperdício de energia e que realmente estou sendo tolo”. E, todavia, continua a agir
daquela forma. Simplesmente não consegue parar de fazê-lo porque o inimigo não
lhe dá sossego. Ele desgasta o sofredor até ele ficar tão cansado que mal consegue
pensar. O fato é que, qualquer de nós que imagine que pode argumentar com o diabo,
está simplesmente mostrando que é o mais simples novato na esfera espiritual. No
momento em que você começa a enfrentar o inimigo argumentando com a sua própria
razão e com o seu próprio entendimento, você já está derrotado. Ele o vencerá todas
as vezes.

É por essa razão que você precisa da “armadura de Deus”. Todos os outros métodos
vão bem até certo ponto, mas a tragédia é que, quando mais você precisa deles, eles
não parecem ajudá-lo. Se você está cuidando do caso de uma outra pessoa, tudo
parece simples; porém quando a dificuldade chega a você, de algum modo você não
consegue ver o remédio, e é derrotado. Há somente um modo de combater
esse combate, e esse é com “a armadura de Deus”. O inimigo pode derrotar a sua
mente, a sua razão, os seus argumentos, o seu senso comum, a sua psicologia, a sua
força de vontade, tudo - e ele o faz. O único modo de obter real vitória é fazer uso de
toda esta “armadura de Deus”, cujo objetivo principal é proteger-nos. Ela nos
protege, e, em termos finais, nenhuma outra coisa nos protegerá. Estamos lidando
com um inimigo que só é inferior em poder à Trindade bendita e santa, um inimigo
que está completamente acima do homem em inteligência, agilidade mental e poder.
Portanto, nada menos que esta proteção dada por Deus serve adequadamente à nossa
necessidade.

A segunda idéia veiculada pela expressão “toda a armadura de Deus” é que este é
um tipo muito especial de armadura, como os próprios

termos indicam - “verdade”, “justiça”, “fé”, “salvação”. Evidentemente só há um


tipo de pessoa que pode pôr e usar esta armadura, e esse é o cristão. É assim, não
somente porque ele é o único tipo de pessoa que “se fortalece no Senhor e na força
do seu poder”, mas também porque a própria natureza da armadura torna isso
completamente inevitável. Você pode conhecer alguém que não é cristão, talvez um
parente, ou um amigo, ou alguém que lhe é apresentado. Você pode ver logo
exatamente como e por que esta pessoa está em dificuldade, porém não pode ajudá-
la. E por esta razão, ela não é cristã. O único método do qual você pode saber para
lidar com esta situação, e enfrentá-la com sucesso, é o uso de “toda a armadura de
Deus”. Entretanto a pessoa referida não pode usar a armadura. Que adianta perguntar
a um incrédulo: “Os seus lombos estão cingidos com a verdade?” De que vale dizer-
lhe: “O de que você necessita, naturalmente, é a couraça da justiça”? Ele não sabe o
que significa isso, não acredita nisso. Portanto, é óbvio que ele não pode usar esta
armadura. Chama-se “toda a armadura de Deus” porque é uma armadura dada por
Deus. Só pode ser usada pelo cristão, por aquele que, porassim dizer, foi iniciado na
verdade, aqueleque, tendo crido, está agora em condições de pegar, vestir e usar a
armadura dada por Deus.

Noutras palavras, somos levados ao seguinte ponto: que esta armadura consiste de
um entendimento e de uma aplicação da verdade do evangelho. Não devemos pensar
nisso, considerando em si e por si, em termos mateirais. O apóstolo está fazendo uso
de uma ilustração tomada daesfera física, a fim de expor o seu ponto. Notem os
termos: os lombos do cristão cingem-se com a verdade; ele coloca a couraça da
justiça; os seus pés estão calçados com a preparação do evangelho da paz; ele leva o
escudo da fé; põe o capacete da salvação; maneja a espada do Espírito, que é a
Palavra de Deus. Ora, como cada parte e peça desta armadura é obviamente
espiritual em sua natureza, significa que ela só pode ser usada por pessoas
espirituais.

Aqui está, de novo, uma coisa que se verifica constantemente na prática. Vocês vêem,
quando falam com outra pessoa e procuram ajudá-la, que a primeira coisa que têm de
fazer é tentar conseguir que essa pessoa se torne cristã. Não poderão ajudá-la
enquanto não acontecer isso. Noutras palavras, tudo o que vocês poderão fazer
enquanto ela não se torna cri stã, é usar argumentos do senso comum, da razão e da
ps icologia. Não há nenhuma outra coisa que possam fazer por ela nesse ponto. Se
o outro não é cristão, vocês não podem dar-lhe ajuda espiritual. A razão é que ele
não tem a base do entendimento, não tem nada que o habilite a tomar a armadura.
Esta é “a armadura de Deus”.

Tudo isso pode ser exposto com inquirições. Quando nos examinamos e exam inamos
a nossa experiência, que é que nos vemos realmente usando neste combate? Como
enfrentamos os nossos problemas e as nossa provações? Nós os enfrentamos como o
faz o homem natural, ou como o faz o homem espiritual, o homem revestido de toda a
armadura de Deus? O mundo tem os seus métodos para lidar com os seus
problemas. É isso que torna possível a sociedade, e é por isso que não entra tudo
em colapso. Mas, como o mundo vai ficando cada vez mais sombrio e diíTci 1, e a
pressão vai ficando cada vez maior, as neuroses também aumentam, e o trabalho do
psiquiatraé cada vez mais solicitado. Isso prova como são inadequados os métodos
do mundo. No entanto, até certo ponto, o mundo pode ajudar. E ele tem os seus
adágios, provérbios e máximas - “Não adianta chorar sobre o leite derramado”;
“Faça cara bonita”; “Posso agüentar isso”, e assim por diante. Todas estas coisas
são válidas, até certo ponto.

Mas a questão é, “Como você combate?” Como cristão, você deve estar revestido da
“armadura de Deus”. Não devemos combater este combate à maneira do mundo, ou
de maneira meramente racional. O nosso combate sempre deve ser travado de
maneira espiritual. Toda a armadura de Deus é providenciada para nós. Assim,
asseguremo-nos de que estamos revestidos de toda esta armadura de Deus, a qual é,
em última análise, o entendimento e a aplicação da verdade do evangelho.

Notem, ademais, a dupla ênfase sobre “toda” a armadura. “Tomai toda a armadura
de Deus.” “Portanto, tomai toda a armadura de Deus.” Isso é também algo de crucial
importância. Significa que não escolhemos e selecionamos o que queremos, nesta
matéria. Se você há de ser um soldado deste exército, se você há de combater
vitoriosamente nesta cruzada, terá que vestir todo o equipamento que lhe é dado.
Essa é uma regra em qualquer exército. Você não pode selecionar as partes do seu
uniforme que vai vestir. Se você disser, “Não acho que isto vai me servir, não gosto
daquilo”, você sabe muito bem o que acontecerá com você. E isso é infinitamente
mais verdadeiro nesta esfera espiritual e nesta guerra espiritual em que estamos
interessados. No momento em que você começar a dizer, “Preciso deste capacete,
mas não preciso da couraça”, você já está derrotado. Você precisa de toda ela-“de
toda a armadura de Deus” - porque o seu entendimento é inadequado. Somente
Deus conhece o seu inimigo, e Ele sabe exatamente qual a provisão indispensável
para você, se é que você vai continuar resistindo. Cada peça desta armadura é
absolutamente essencial; e a primeira coisa que você tem de aprender é que não está
em condições de escolher e selecionar.

Isto significa que tomamos todo o corpo de doutrina cristã; não nos concentramos em
partes particulares dela. Não é de admirar que a Igreja Cristã esteja como está,
formando movimentos para salientar unicamente uma doutrina. Essa é uma parte
crucial de todo o nosso problema atual. Temos que assumir a doutrina completa. O
apóstolo Paulo se refere a isto em suas últimas palavras aos presbíteros desta igreja
de Efeso, palavras registradas em Atos, capítulo 20. Ele estava viajando para
Jerusalém, e os presbíteros de Éfeso desceram a Mileto para encontrar-se com ele.
O apóstolo teve a alegria e a satisfação de poder dizer que lhes tinha anunciado
“todo o conselho de Deus”. Não havia nada que ele deixasse sem dizer.
Semelhantemente, não há parte alguma da doutrina cristã que eu e vocês possamos
dar-nos ao luxo de ignorar. Devemos estudar todas as partes das Escrituras; e é bom
ler a B íblia inteira uma vez por ano. Não deixem nada fora, leiam a história, leiam
tudo. Tomem cada parte e parcela da doutrina. Não parem na evangelização, não
parem na justificação, não se detenham na santificação; estudem a glorificação,
estudem a profecia, tomem toda a doutrina. Nada causa tanta fraqueza e
tanto fracasso na Igreja Cristã como o nosso erro de não nos revestirmos de “toda a
armadura de Deus”.

Também é necessário acentuar que todas as partes do seu serdevem estar envolvidas
nesta vida cristã. A sua mente, por exemplo, precisado “capacete da salvação”.
Nunca negligenciem a sua mente nestas questões. A idéia de que o cristianismo é
apenas uma forma de emocionalismo ou de sentimentalismo-como o mundo está
constantemente sugerindo-é totalmente errada; e se nós estamos dando ao
mundo ocasião de pensar e falar assim de nós, somos muito pobres soldados
do exército cristão.

Mas não se detenham na mente. O coração precisa de proteção de igual maneira.


Certas pessoas são muito cuidadosas na proteção da mente; são versadas em
teologia, erros e heresias; porém se descuidam do coração, e o resultado é que
muitas vezes são feridas e derrotadas. Caem à beira do caminho por negligenciarem
este órgão vital.

Igualmente com relação à vontade. O apóstolo Paulo, escrevendo a Timóteo, fala em


conservar “a fé, a boa consciência, rejeitando a qual alguns fizeram naufrágio na fé”
(1 Timóteo 1:19). Eles estavam dando atenção ao aspecto intelectual da fé, todavia
não estavam “mantendo boa consciência”; estavam negligenciando a vontade e o
aspecto prático. O resultado, d iz Paulo, foi que eles “fizeram naufrágio” em sua fé e
em suas vidas. “Tomai toda a armadura de Deus”, todas as suas partes e cada uma
delas, a fim de que cada parte da personalidade esteja coberta e

protegida. Não há nada que nos cause tanto regozijo na vida cristã como o fato de
que ela afeta o homem completo. Nenhuma outra coisa faz isso. Vocês podem ter
sociedades intelectuais no mundo; entretanto, elas são frias e sem coração. Existem
interesses emocionais, sentimentais no mundo; mas não têm nada para a mente.
Outros se concentram na ética, porém não têm entendimento espiritual, e não têm
conforto e consolação para oferecer-nos. No entanto, o ensino bíblico toma o homem
todo e governa a personalidade inteira. “Toda a armadura de Deus”!

Mas, tendo salientado isso, observem como, ao mesmo tempo, o apóstolo tem todo o
cuidado de tratar minuciosamente das diversas peças. “Toda” inclui cada uma das
peças. Nunca negligenciem os detalhes. Não deixem parte alguma da alma sem
proteção - “Com oração veste cada peça”.

Não deixe de pôr toda a armadura;

Com oração veste cada peça.

Que perfeito equilíbrio há aqui, como sempre há nas Escrituras, no ensino da Palavra
de Deus!

Esse é o equ i 1 íbrio que devemos demonstrar neste combate espiritual, nesta guerra
cristã. Como o inimigo ainda está à espera e nos vigia com toda a sua astúcia, com
todo o seu engenho, com todo o seu poder, há somente um modo de resistir.
“Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder.” Rev ista-se de toda a armadura
que Deus providenciou para você. Vista-a, peça por peça. Não deixe nenhum lugar
desprotegido em sua alma, mas faça uso do equipamento completo que Deus, em Sua
graça infinita, providenciou para você, no Senhor Jesus Cristo e em Sua grande e
gloriosa salvação.

“CINGIDOS OS VOSSOS LOMBOS COM A VERDADE”

“Estai, pois, firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade. ” - Efésios
6:14

Chegamos agora ao princípio do nosso estudo pormenorizado de “toda a armadura


de Deus” que o apóstolo exortou estes cristãos efésios, e todos os demais cristãos, a
vestir. Na resistência às astutas ciladas do diabo e na luta contra os principados e
potestades, contra os príncipes das trevas deste século e contra as hostes espirituais
da maldade nos lugares celestiais, é essencial, diz ele, que primeiro “nos
fortaleçamos no Senhor e na força do seu poder”. E então, depois disso, temos que
“tomar e vestir toda a armadura de Deus”.

Tendo introduzido o assunto em geral, permitam-me lembrar-lhes, mais uma vez, que
o que temos aqui é um quadro descritivo, um quadro externo de algo que é interno e
essencialmente espiritual. O perigo quanto a um quadro como este é materializá-lo
exageradamente. Muitos caíram nesta armadilha. É, talvez, o único real defeito do
grande livro de William Gurnall, O Cristão Com A Armadura Completa (The
Christian in Complete Armour). Sua tendência é desenvolver exageradamente
os detalhes. Era essa, talvez, a tentação com que se defrontavam os puritanos - a
tendência de alegorizar demais, ou de transformar uma parábola numa alegoria.
Devemos ter isso em mente, ao passarmos à interpretação do significado destas
diferentes partes de toda esta armadura de Deus. O apóstolo, como prisioneiro, era
conhecido dos soldados romanos, e sempre tinha que olhar para eles. Algemado, às
vezes, a um soldado, do lado direito e a outro do lado esquerdo, ocorreu-lhe
muito naturalmente usar essa comparação e dizer, efetivamente: “Este é um quadro
do que temos de fazer no sentido espiritual”. Tais quadros, porém, têm que ser
tratados de maneira bem geral.

Ao todo são seis as peças desta armadura. Diz Paulo que temos de ter os nossos
lombos “cingidos com a verdade”, que temos de vestir “a couraça da justiça”, e ter
os pés calçados com “a preparação do evangelho da paz”. Depois temos que tomar
“o escudo da fé”, tomar “o

capacete da salvação” e usar “a espada do Espírito”. São essas as seis peças


mencionadas. Certamente nunca ele quis dizer que se considere isso exaustivo. Há
outros aspectos quanto à guerra e à defesa. O que ele faz é destacar as peças mais
importantes, as que são absolutamente essenciais, quando examinamos esta guerra
espiritual em geral.

Ao passarmos a classificar estas seis peças, inclino-me a concordar com a maioria


dos comentadores que dizem que elas podem ser divididas em dois grupos de três. A
base da divisão é, a grosso modo, que as três primeiras são as que ficam realmente
no corpo. O cinto nos lombos, por exemplo, fica de fato em posição fixa no corpo.
Assim com a couraça. Essas peças não pendem soltamente, ou com uma ligação
frouxa com o corpo; elas têm que ser amarradas, ou enlaçadas. As sandálias,
igualmente, têm que ficar firmemente nos pés. Essas três peças da armadura têm esse
traço em comum. Mas quando chegamos ao escudo, tratamos obviamente de algo que
não fica fixo no corpo. Com o capacete dá-se o mesmo. Não devemos pensar no
capacete em termos do que nos é mais conhecido, o tipo de capacete que se usava na
Idade Média. O que era usado no tempo do apóstolo consistia de um quepe de couro
com peças de metal, o qual o homem colocava na cabeça. Não era fixo; a ligação
não era tão firme como no caso das três primeiras peças. E, obviamente, a espada
não fica presa ao corpo. Veremos a significação dessa distinção conforme
avançarmos em nossa interpretação do sentido das peças individualmente.

O único comentário mais que faço, antes de chegarmos ao estudo detalhado da


primeira peça, é que a ordem em que as peças são mencionadas é de muito grande
importância e significação. O apóstolo não mencionou estes diferentes artigos ao
acaso, de maneira casual, como lhe ocorressem, ou como quando via um soldado.
Ele constrói uma argumentação; e é essencial que adotemos o seu método e
examinemos estas diversas peças da armadura na ordem em que ele no-las apresenta.
Portanto, comecemos com, “...tendo cingidos os vossos lombos com a verdade”. A
Versão Autorizada inglesa (semelhante a ARC) não é tão boa, neste caso, como
poderia ser; pode levar a um entendimento errôneo, no sentido de que faz uma
colocação em termos passivos, e não ativos. Em vez de dizer: “Estai, pois, firmes,
tendo cingidos os vossos lombos com a verdade”, como se uma outra pessoa o
fizesse por você, uma tradução melhoré: “Estai, pois, firmes, tendocingidoosvossos
lombos coma verdade” (assim o faz a ARA). Noutras palavras, nós é que temos de
fazer isso. O cinto não é colocado em nós, nós temos que colocá-lo firmemente, na
posição certa.

Este cinto ou cinturão deve ser colocado naquela parte do corpo conhecida como
lombos. É óbvio que não deve ser colocado somente com fins de decoração; não é
um ornamento. Muitas vezes os cintos são usados apenas como enfeite, por questão
de aparência; mas absolutamente não era isso que estava na mente do apóstolo. Ele
nos garante que este cinto é uma parte absolutamente essencial do equipamento; e é,
pois, a primeira peça que temos de colocar em nós.

O cinto é vital por causa da sua função. Aqui devemos lembrar-nos de que o
apóstolo estava escrevendo para os seus dias e para a sua geração, quando as
pessoas, os homens inclusive, costumavam usar longas vestes, algo parecido com a
toga de Genebra, talvez até mais compridas. Pois bem, o propósito do cinto era
juntar e atar essas roupas soltas. Essa era a sua função essencial. Quando um homem
se assentava e se descontraía, tirava o cinto; todavia no momento em que queria pôr-
se em ação, juntava as vestes e as prendia com um cinto. Fazia isso porque, de outro
modo, ao mover-se, suas vestes seriam um obstáculo para ele. Estaria
constantemente pisando nelas; estaria tropeçando quando tentasse manusear a espada
ou o escudo. Assim, a primeira coisa que o soldado tinha de fazer quando se
aprontava para enfrentar o inim igo era juntar suas vestes e fixá-las com firmeza, na
posição certa, por meio desta faixa forte ou deste cinto que, dessa maneira, mantinha
em posição toda a sua vestimenta. E a simples colocação do cinto já por si
aprestava e preparava o homem para agir.

Ainda mais importante, porém, é o fato de que a colocação do cinto libera o soldado
para a ação. Ele agora se vê desimpedido para todos os seus movimentos e ações, e
pode manejar o escudo com uma das mãos e a espada com a outra. Não precisa
temer desequilibrar-se ou cair ou enroscar-se nalguma parte das suas vestes. É-lhe
essencial isso, para poder ficar com a ação livre e desimpedida.

Em terceiro lugar, o cinto dava ao soldado uma sensação de segurança. Ele estava
pronto, 1 i vre, alerta, tenso e preparado para a ação, e via que tudo estava em ordem
e em posição; não tinha apenas um conjunto de partes soltas militando contra o que
ele se propunha a fazer. Isso lhe dava de imediato confiança e uma sensação de
segurança.
Vocês verão que esse quadro é freqüentemente utilizado nas Escrituras. Vemos o
nosso Senhor fazendo uso dele no capítulo doze do Evangelho Segundo Lucas, onde
Ele exorta os Seus discípulos a serem sempre vigilantes, cautelosos e atentos. É
exatamente o mesmo argumento usado pelo apóstolo aqui. O nosso Senhor o expõe
da seguinte maneira: “Estejam cingidos os vossos lombos, e acesas as vosas
candeias” (Lucas

12:35). Estejam prontos para agir. Esse é sempre o primeiro passo. Tratem de nunca
ser apanhados, d iz Ele, numa cond ição em que vocês não estejam prontos para agir.
Esse é outro modo de d izer: “Estai, poi s, firmes, tendo cingidos os vossos lombos
com a verdade”. A primeira coisa que nos cabe fazer é certificar-nos de que estamos
prontos para a ação e preparados para toda e qualquer eventualidade.

Não há dúvida de que a ordem em que o apóstolo coloca estas coisas diante de nós
foi adotada deliberadamente. Seria ocioso e inúti 1 passar às outras peças da
armadura sem termos claro entendimento desta. Há os que dizem que devemos
interpretar o cinto num sentido ainda mais fundamental, entendendo-o como uma
espécie de vestimenta básica; que você começa Com ele e depois coloca sobre ele
as outras coisas. Estou disposto a aceitar isso. Mas o que está claro em ambos os
casos é que é fundamental, que o soldado não pode esperar fazer coisa alguma sem
ele, que na verdade não haveria nada senão confusão se não começasse com ele e
não se assegurasse dele - do cinto!

Vejamos agora como Paulo usa o quadro do cinto de maneira espiritual. “Tendo
cingido os vossos lombos”, diz ele, “com a verdade”. Como se trata de algo
fundamental, é vital saber exatamente o que ele quer dizer com “verdade” aqui. Tem
havido muita discussão sobre a matéria. De fato, é interessante, para não dizer quase
divertido às vezes, observar a maneria pela qual os expositores tratam dela. O
problema, penso eu, é que mu itos deles tendem a ser demasiado rígidos quanto a
isso. É pena, porém isso se aplica até a Charles Hodge.

Ao desenvolverem a analogia, eles perguntam: “Qual é o sentido de verdade aqui?”


E replicam dizendo que o seu primeiro impulso é, naturalmente, dizer que é a
Palavra de Deus, a verdade das Escrituras. “Ah”, dizem eles, “mas não pode ser”, e
por esta razão, que mais adiante Paulo diz: “Tomai também o capacete da salvação e
a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.” Por isso eles argumentam
afirmando que não háa mínima possibilidade de que o cinto seja a verdade objetiva.

Os expositores, então, vão adiante e dizem que, como o cinto não representaa
verdade objetiva, só deve significar algo subjetivo em nós. Aqui alguns vão tão
longe que chegam a d izer que não significa nada mais do que um espírito de
sinceridade e veracidade em nós. Não tanto a verdade propriamente dita, quanto a
veracidade existente em nós. É como diz Davi no Salmo 51: “Amas a verdade no
íntimo”. Sinceridade! Singeleza! Veracidade! Franqueza! Isso, dizem eles, é a base
de tudo; temos que ser honestos. O cristão coloca em si o cinto da veracidade, da
sinceridade, da singeleza e da franqueza porque, sem isso, ele fica em desamparo e
sem esperança.

Ora, isso me parece uma grave e quase perigosa interpretação errônea. Refuto-o
dizendo que a objeção do expositor à verdade objetiva aqu i não é vál ida por esta
razão - que há dois modos como podemos ver a verdade. Há um modo puramente
objetivo, e um modo puramente subjetivo. No entanto, não devemos limitar a questão
a isso. Naturalmente, temos que aceitar a declaração de que “a espada do Espírito é
a Palavra de Deus”, mas também é meu desejo dizer que o cinto é também a Palavra
de Deus de maneira diferente.

Há uma grande diferença entre a verdade como um todo e a verdade em suas porções
separadas. Permitam-me ilustrar o que estou querendo dizer. Tomemos a frase “A
espada do Espírito, que é a Palavra de Deus”. Há uma perfeita ilustração do que se
quer dizer com essa expressão naquilo que vemos na tentação do nosso Senhor Jesus
Cristo no deserto pelo diabo. O diabo O tentava, e Ele lhe respondia dizendo:
“Está escrito”. Ali está Ele usando “a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus”,
porém o que Ele faz realmente é citar partes específicas das Escrituras. Isso é muito
diferente de falar sobre a verdade completa da Bíblia, a verdade geral concernente à
doutrina da salvação. Minha opinião é, pois, que o cinto representa a verdade toda, a
verdade em si mesma. Paulo está falando da verdade de maneira objetiva; contudo,
ela nos vem também subjetivamente.

Além disso, o cinto não tem a mínima possibilidade de representar a veracidade, a


sinceridade e a singeleza por esta boa e suficiente razão -que, se vamos confiar em
nossa sinceridade e veracidade como a peça fundamental da armadura na luta contra
o diabo, já estamos derrotados e a campanha está perdida. E uma lástima, porém a
verdade a respeito de todos nós é a expressa pelas palavras de um hino, “Não ouso
confiar na mais doce disposição”. E você, está disposto a confiar em si próprio?
Não, todos nós nos encontramos na situação em que temos de d izer: “Sou o que sou
pela graça de Deus”. A peça fundamental da minha armadura não é a minha
sinceridade e veracidade. Não pode ser isso, porque o apóstolo está salientando
aqui que o cinto é uma peça da armadura que Deus providenciou para nós. Portanto,
o cinto não é uma parte de nós mesmos, e sim algo que podemos colocar em nós,
algo que nos é dado.

Para interpretarmos a palavra “verdade”, como empregada pelo apóstolo, adotemos


o método de abordagem que sempre deveríamos adotar quando nos vemos face a
face com uma dificuldade desta natureza. Há uma dificuldade na superfície;
concedamos isso. “A espada do Espírito, que é a Palavra de Deus.” Isso parece
resolver a questão. Mas não a resolve! Vejamos, então, se podemos chegar ao
sentido da
palavra “verdade” examinando as Escrituras e comparando Escritura com Escritura -
passagem com passagem. Esse é certamente o real método de exposição em todas as
ocasiões.

Uma passagem que nos vem logo à mente é a que se acha no capítulo oito do
Evangelho Segundo João. Lemos ali, nos versículos 30 e segu intes, que, “Dizendo
ele estas coisas, muitos creram nele. Jesus dizia, pois, aos judeus que criam nele: se
vós permanecerdes na m inha palavra, verdadeiramente sereis meus discípulos; e
conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. Notem os termos que Ele utiliza.
Ele fala em “conhecer a verdade”; noutras palavras, Ele está falando sobre a
verdade como um todo - toda a doutrina cristã, em sua inteireza, a soma total da
verdade. “E essa verdade vos libertará”, libertará do diabo. Observem
particularmente a ênfase. Diz Ele: “Parece que vocês creram; muito bem, se
vocês permanecerem em Minha palavra, em Minha instrução concernente à verdade,
então vocês serão verdadeiramente Meus discípulos, e então a verdade assim
comunicada a vocês e na qual vocês permanecerão, os libertará. Paraque fiquem
livres do diabo e das suas astutas ciladas, vocês precisam colocar em si o cinto da
verdade-A Minha palavra”.

Mas consideremos também a frase de nosso Senhor na “oração sacerdotal”


registrada no capítulo dezessete do Evangelho Segundo João, versículo dezessete:
“Santifica-os”, diz Ele, “na verdade; a tua palavra é a verdade” (ou: “Santifica-os
pela verdade...”, VA). A santificação é pela verdade, mas ela funciona por meio da
“tua palavra” - desta Palavra de Deus. É sobre a santificação que estamos falando
aqui, em Efésios, capítulo 6; sustento, pois, que o sentido aqui é exatamente o mesmo
de João, capítulo 8 e de João, capítulo 17.

Vejam asegu ir outro exemplo. Oapóstolo Paulo, na Primeira Epístola aos Coríntios,
capítulo 16, versículo 13, d iz: “Vigiai, estai firmes nafé”\ na fé! “A verdade” e “a
fé” são virtualmente sinônimas. “Estai firmes na fé”. Aqui em Efésios a exortação é a
mesma, acontecendo porém que é empregado o termo alternativo-“Estai, pois,
firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade”. O apóstolo está falando da
verdade como um todo, pois a verdade, como a fé, é uma só.

Notem também que o apósolo Pedro diz algo parecido em sua Primeira Epístola a
pessoas queestavam com problemas, com dificuldade e enfrentavam uma grande
batalha contra o mundo, a carne e o diabo. Tendo delineado a situação em geral, ele
empreende a argumentação propriamente d ita no versículo treze do capítulo
primeiro e diz: “Portanto, cingindo os lombos do vosso entendimento” (ou “da vossa
mente”, VA). Pois bem, a mente lida com “a verdade”, com “a fé”. É esclarecedor

observar como Pedro, neste mesmo contexto, emprega a expressão “os lombos”
exatamente como Paulo faz no texto que estamos estudando. É indubitável que Paulo
está pensando na mente, e não no corpo. Não materializem a ilustração. Ele está
pensando espiritualmente, e assim é que são “os lombos” da mente, pois a faculdade
maior no homem é a sua mente, e a sua mente precisa receber iluminação, se é que
ele pretende lutar vitoriosamente.

Pedro repete o seu ensinamento no capítulo cinco dessa Primeira Epístola, no


versículo 8, onde ele escreve que “o diabo, vosso adversário, anda em derredor,
bramando como leão, buscando a quem possa tragar”. Diz ele no versículo 9: “Ao
qual resisti firmes na fé”. Noutras palavras, a primeira coisa que você deve
compreender é que só poderá resistir sendo “firme na fé”. E para se tornar firme na
fé, você terá que “cingir--se”, terá que amarrar-se e amarrar a sua roupa com “a fé”.

Esses exemplos certamente ajudam a lançar grande luz sobre o problema com o qual
nos defrontamos. Portanto, interpreto a palavra “verdade” neste contexto no sentido
de uma crença em “a verdade como está em Cristo Jesus” e um conhecimento dela. É
a verdade objetiva, aqual eu possuo de maneira subjetiva. Significa terdomínio
sobre a verdade, mas também significa ser dominado pela verdade. Sou preso pela
verdade. E a verdade que me amarra, mantém-me coeso, põe-me sobre os meus pés e
me dá força, vigor e poder. Ou, para expressá-lo mais particularmente, significa que
não examino a Bíblia apenas intelectualmente nem a estudo como se ela fosse,
digamos, Av Obras de Shakespeare, mas sim, significa que a sua verdade toma
posse de mim e governa toda a minha atitude para com o inundo, a carne e o diabo, e
para com tudo quanto acontece. Eu me cingi com ela. “Cingindo os lombos do
vossos entendimento, sede sóbrios, e esperai inteiramente na graça que se
vos ofereceu na revelação de Jesus Cristo” (ou, “...e esperai até o fim pela graça que
vos será dada...”, VA), como diz Pedro.

A verdade é a primeira coisa que devemos vestir. Sem ela estamos completamente
perdidos. Significa que temos uma firme convicção quanto à verdade; significaque
não há incertezas, nem dúvidas. Significa também que não deve haver falta de
clareza. Não há nenhuma esperança, diz Paulo, a menos que vistamos primeiro a
verdade. E isso significa nada menos do que sabermos em quem cremos, e sabermos
no que cremos. O cinto é a verdade- examinada, entend ida, assimi lada, e de tal
maneira que ela governa toda a minha perspectiva, em todos os aspectos.
Somente deste modo, diz o apóstolo, você poderá travar com sucesso a
batalha contrao inimigo.

Isso decorre necessariamente do que já consideramos em nossos estudos anteriores.


O diabo procura confundir-nos, desviar-nos, com relação ao que cremos. Ele é
“mentiroso”, ele é “assassino”, ele é “o acusador do irmãos”, ele é “o adversário”;
e, como já vimos, ele exerce esses poderes nefandos com particular astúcia e afinco
em suas tentativas de criar confusão e incerteza. Como repeli-lo? “Cingindo os
vossos lombos com a verdade!” Se você deixar de fazer isso, estará derrotado quase
antes de começar a lutar.
Este princípio é fartamente ilustrado nahistóriada Igreja. Acaso não é evidente que a
necessidade de colocar o cinto da verdade já tinha surgido mesmo nos tempos do
Novo Testamento? Na Igreja Primitiva o diabo tentou logo lançar as sementes da
confusão e da incerteza. Fez isso primeiro, é claro, quanto à questão da admissão
dos gentios na Igreja. Procurou levar os cristãos judeus a se apegarem à circuncisão
como sendo ela absolutamente essencial, e também a outras observâncias da Lei.
Vocês podem ler sobre isso no livro de Atos dos Apóstolos, capítulo 15, e
igualmente na Epístola aos Gálatas. O diabo entrou em ação logo no começo e tentou
lançar esta semente de dúvida. “Ah”, dizia ele, “está certo crer em Cristo, porém se
você não for circuncidado, não será um cristão verdadeiro; todos têm que se tornar
judeus, antes de se tomarem verdadeiros cristãos.” E assim houve essa tendência de
entrar em confusão, e os apóstolos tiveram que tratar do problema.

No capítulo vinte do livro de Atos dos Apóstolos temos um registro da mensagem de


despedida de Paulo aos presbíteros da igreja de Efeso. Ele os adverte do que
acontecerá depois da sua partida. “Olhai, pois, por vós”, diz ele, “e por todo o
rebanho sobre que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apacentardes a igreja
de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue. Porque eu sei isto, que, depois da
minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não pouparão ao rebanho; e
que de entre vós mesmos se levantarão homens que falarão coisas perversas, para
atraírem os discípulos após si. Portanto, vigiai, lembrando-vos deque durante três
anos, não cessei, noite e dia, de admoestar com lágrimas a cada um de vós.” Paulo
tinha passado muito tempo ensinando, pregando, esclarecendo-os, dando-lhes
entendimento, porque sabia que era certo que surgiriam esses males. O cinto da
“verdade” é absolutamente essencial; vocês serão derrotados, se não tiverem esse
conhecimento.

Depois, quando avançamos um pouco mais na história da Igreja Primitiva, vemos de


novo a mesma coisa. Como é fácil, num ofício fúnebre, ouvir irrefletidamente a
leitura do magnífico capítulo quinze da Primeira Epístola de Paulo aos Coríntios! A
linguagem é esplêndida, e o

equilíbrio das frases, as cadências, a glória e a beleza das palavras nos fascinam, e
dizemos: “Maravilhoso!” Mas muitas vezes deixamos de aperceber-nos do que o
apóstolo está dizendo! Ele escreveu esse capítulo porque havia pessoas que estavam
ensinando que não haverá nenhuma ressurreição final do corpo. É um escrito
puramente polêmico. Ele o escreveu para contra-atacar à investida do diabo contra a
doutrina da ressurreição. Era essencial que o fizesse. Diz ele: “Se esperamos
em Cristo só nesta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens”. Ele teve
que escrevê-lo para opor-se à sutil tentativa feita pelo diabo de subtrair a verdade.

Paulo faz a mesma coisa no capítulo dois da Segunda Epístola a Timóteo. Dizele que
certas pessoas estavam “dizendo que a ressurreição já havia acontecido, e
perverteram a fé de alguns”. Qual é o remédio? “O fundamento fica firme.” Que é
esse fundamento? É a verdade do evangelho, que ele também descreve como “o meu
evangelho” (versículo 8). É a única maneira pela qual podemos responder a esse
ataque particular. As Epístolas do Novo Testamento são, em certo sentido,
o verdadeiro cinto que eu e vocês devemos colocar em nós - “o cinto da verdade”.
Temos de estar equipados com isso, se queremos enfrentar este inimigo. Precisamos
ter toda a verdade em nossas mentes. Todo o nosso pensamento tem que ser
governado por ela, de modo que, quando sofrermos uma investida, teremos a
resposta, e estaremos preparados -“cingidos com a verdade”.

Mas este problema não terminou com a Igreja Primitiva; continuou nos séculos
posteriores. Leiam a história da Igreja Cristã, e verão que houve a realização de
alguns grandes concílios. Os líderes cristãos, provenientes de diversos países,
reuniam-se para definir a verdade. Fizeram isso porque tinham surgido hereges,
falsos ensinamentos estavam sendo propagados e a Igreja em geral estava em
confusão. Ninguém sabia exatamente em que acreditar; um dizia isto, outro dizia
aquilo -ensinos diametralmente opostos - e, contudo, todos eles se diziam cristãos. E
os cristãos primitivos, conduzidos pelo Espírito Santo, reuniam--seem solenes
concílios nos quais definiam a verdade. Diziam, isto está certo, aquilo está errado.
Definiam a heresia e a condenavam, e excomungavam os que a ensinavam. Se não
tivessem feito isso, não haveria Igreja Cristã hoje. A filosofia grega entrou, e os
homens procuravam entender e explicar o que não se pode entender e explicar, e
assim surgiram as heresias; e os líderes das igrejas tiveram que reunir-se em
concílios.

O resultado foi que temos os chamados grandes credos da Igreja -por exemplo, O
Credo Apostólico. O Credo Apostól ico jamais teria sido

escrito, não fossejustamente aquilo que estamos discutindo. Odiabo, com a sua
astúcia, tinha tentado causar confusão na Igreja, pelo que esta se reuniu e disse:
“Estes são os elementos essenciais da fé”. Recite-os, ponha-os em sua mente, vista-
os, cinja-se deles. Todavia não somente o Credo Apostólico, também o CredoNiceno
e o Credo de Atanásio. Todos esses credos vieram à existência exatamente da mesma
maneira. Esse é um modo de cingir os lombos com a verdade. A Igreja certificava-se
do ensino, e depois certificava-se de que ele era pregado e ensinado em toda parte.

No entanto, essa ação não se restringe à Igreja Primitiva. A mesma coisa acontece
sempre que há um período de reforma e avivamento. Suponho que a maior
característica da Reforma Protestante é a maneira pela qual as primeiras igrejas
protestantes passaram a redigir as suas confissões - a Confissão de Augsburg, a
Confissão Belga, a Segunda Confissão Helvética, o Catecismo de Heidelberg, etc.
Todas essas confissões são documentos que contêm definições da verdade, a fim
de que as pessoas soubessem o que estava certo e o que estava errado. Na Inglaterra,
naquele mesmo século dezesseis, a Igreja da Inglaterra redigiu os Trinta e Nove
Artigos. No século dezessete a Assembléia de Westminster redigiu a sua famosa
Confissão de Fé. Em todos os períodos de avivamento e despertamento, quando a
Igreja está realmente viva e compreende o caráter do conflito espiritual, sempre faz
exatamente isso. A redação de uma confissão não é nada menos que um modo de
“cingir os lombos da mente”, ou “colocar o cinto da verdade”.

Esse tipo de ação é essencial por uma razão que o apóstolo nos dá: “As más
conversações corrompem os bons costumes” (1 Coríntios 15:33). A verdade
realmente importa! Se você começar a andar mal em suas “conversações”, naquilo
que você diz a outrem e nos seus pensamentos, isso o levará a práticas más, a más
maneiras e a mau comportamento. E, finalmente, você causará naufrágio da fé. O erro
na doutrina é sempre fatal, tanto na vidado indivíduo como da vida da Igreja. Paulo
diz claramente na Epístola aos Efésios que Cristo deu à Igreja apóstolos, profetas,
evangelistas, pastores e mestres, “querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a
obra do ministério, para a edificação do corpo de Cristo, até que todos cheguemos à
unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a varão perfeito, à medida da
estatura completa de Cristo”. Aí o fato é exposto positivamente. Mas imediatamente
o apóstolo acrescenta o elemento negativo: “Para que não sejamos mais meninos
inconstantes, levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens
que com astúcia enganam fraudulosamente”.

Uma característica dos meninos é que eles tendem a acreditar em toda e qualquer
história. Um suposto “bom” homem vem vender livros à porta, e eles dizem: “Parece
muito bom, ele fala sobre a Bíblia, só pode estar certo!” E assim compram os livros
sem maior investigação. “Levados em roda por todo o vento de doutrina”, porque
não conhecem a sua própria doutrina, porque não cingiram os seus lombos com a
verdade, porque não sabem qual a sua posição e no que se firmar.

Essa é, pois, a primeira exortação particular quanto à nossa armadura. Realmente


não haverá esperança para nós neste combate contra o diabo, e todas as suas astutas
ci ladas, se não possu irmos a verdade, e por ela não formos possuídos. Sem termos
conhecimento do que cremos, e dAquele em quem cremos, já estamos desarmados, já
estamos derrotados. “Estai, pois, firmes, tendo cingido os vossos lombos com a
verdade.” “Cingi os lombos da vossa mente.” O cinto ocupa o primeiro lugar na
lista “das armas da sua guerra”. Obedeçamos resolutamente à exortação do apóstolo,
“e, havendo feito tudo, fiquemos firmes”.
A ÚNICA AUTORIDADE

"Estai, pois, firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade” (VA e ARC).

"Estai, pois, firmes, tendo cingido os vossos lombos com a verdade ” (VR). 1

"Estai, pois, firmes, cingindo-vos com a verdade" (ARA).

- Efésios 6:14

Vimos que a razão fundamental para começarmos com o cinto da verdade é o que
Paulo diz em 1 Coríntios 15:33: “As más conversações corrompem os bons
costumes”. Tem-se esquecido isso no presente século. Em geral, a tendência deste
século é dizer que se pode preservar “os bons costumes” sem a verdade. Mas é
impossível! Não há maior falácia do que pensar que você pode ficar com a
moralidade e a ética da Bíblia e jogar fora a verdade que ela ensina. A Bíbliatoda
testifica contra essa idéia. A moral idade e a verdade estão entrelaçadas
indissoluvelmente. Portanto, não há nenhuma esperança fora de uma firme apreensão
da verdade bíblica e de uma vida vivida em conformidade com o ensino
dessa verdade.

Alguém poderá dizer: “Você, como pregador, pode dizer: “Estai, pois, firmes, tendo
cingidos os vossos lombos com a verdade”, mas o que significa isso na prática?”
Outro poderá dizer: “Admito, confesso, que a minha vida é um fracasso; o diabo me
domina constantemente; e você diz que o remédio está em “fortalecer-me no Senhor e
na força do seu poder”, que devo “tomar toda a armadura de Deus” e que devo
começar cingindo os meus lombos com a verdade. Entretanto, o que é
essa verdade?”

É essa questão que vamos ver agora. Infelizmente, é uma questão acerca da qual há a
maior confusão na Igreja Cristã atualmente. Falo isso com espírito de tristeza, quase
de desespero. Prouvera Deus que não fosse necessário dizertal coisa, ou, na
verdade, que não fosse necessário dizer o que terei de dizer. Mas é essencial fazê-lo,
por causa das condições

em que se acha a Igreja Cristã na Inglaterra. As estatísticas falam eloqüentemente.


Comparem a Igreja atual com a Igreja retratada no Novo Testamento, ou com a Igreja
sobre a qual se pode ler, de certos períodos e épocas da sua longa história. A Igreja
está em condições patéticas, verdadeiramente perigosas. Há uma razão principal
para isso, a saber, a Igreja não aceita o ensino do apóstolo neste ponto. A exortação
do apóstolo é totalmente impopular hoje, e está sendo contestada em quase toda
parte.

A atitude moderna na Igreja é quase o exato oposto desta exortação. Diz o apóstolo
que, se a Igreja funcionar como um corpo, e se você funcionar eficientemente como
indivíduo cristão, a primeira coisa que você tem de fazer é colocar esta “verdade”
em torno dos seus lombos de tal modo que ela o prenda e o enfaixe, firme você sobre
os seus pés e o energize. Mas a atitude moderna da Igreja, com os seus
congressos internacionais, suas “semanas de oração pela unidade” ou suas “oitavas”
de oração, está longe do modelo apostólico. Essa atitude coloca toda a sua ênfase
sobre um certo espírito geral, e não sobre princípios particulares- um espírito ou
uma atitude geral de amizade, de amor e de união na adoração. Naturalmente, isso é,
em si, uma coisa excelente. Devemos amar-nos uns aos outros, e é preciso que exista
“a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Efésios 4:3). Contudo, a questão toda
é como chegar a isso. Não se pode “vestir” um espírito vago. Mas, de acordo com o
apóstolo, há uma peça da armadura que você pode pegar, tomar e vestir. Todavia,
nos tempos atuais nos dizem que a esperança para a Igrejae para o indivíduo está
num vago e geral espírito de companheirismo.

Outra maneira pela qual o assunto é exposto é que a vida é mais importante que a
crença. A tendência geral hoje é dizer que não importa o que um homem diga sobre o
que ele crê ou sobre o que não crê, desde que ele viva uma boa vida, então ele é
cristão. Por exemplo, um artigo escrito recentemente sobre um homem que praticou
muita coisa boa, dizia: “Embora ele, naturalmente, não se dissesse cristão, sua vida
prova que ele era cristão”. Isso foi dito em nome cia Igreja Cristã. Assim, não é
de admirar que o cristão comum diga: “É-me dito que eu “cinja os meus lombos com
a verdade”, porém, o que é a verdade? Com que me devo cingir? A crença tem algum
valor, afinal? Se vamos “encontrar ateus no céu”, acaso teria importância alguma o
que eu creio? Que é a verdade? A verdade vale alguma coisa? E possível saber o
que ela é?”

Crendo, como creio, que terei de comparecer diante do trono do juízo de Cristo e
prestar contas dos feitos que pratiquei estando no corpo, não posso ficarem silêncio
no meio de toda essa terrível confusão. As coisas

que estão sendo ditas não somente confundem as pessoas, mas também
indubitavelmente as estão levando para o inferno! Pois, d izer às pessoas que não
importa o que alguém crê, contanto que viva uma vida louvável e faça o bem, não
somente é uma negação do evangelho, é também fadado a desencorajar as pessoas,
levando-as a rejeitar a única verdade que pode salvá-las.

Não só isso; preocupo-me como pastor. Se eu aceitar essa atitude moderna, o que
vou dizer aos que me procuram pedindo conselho e ajuda, como de fato fazem,
porque a vida é difícil e penosa? Devo dizer-lhes: “Procurem ter pensamentos de
amor, simplesmente tratem de fazer todo o bem que puderem, e sejamos amigos uns
dos outros?” É evidente que isso não os ajudará. E quanto mais se oferecer esse tipo
de ensino vago e nebuloso, maior será o número de pessoas que dão as costas à
Igreja. E não as culpo, pois com freqüência as seitas oferecem mais ensino do que a
Igreja Cristã. Não; os nossos lombos têm que estar cingidos com a verdade.

Ora, para captarmos mais de perto este assunto, o que está sendo ensinado ativa e
perigosamente é que não se pode definir a verdade. Essa é a essência desta atitude
moderna, a base da sua força de atração. Há osquedizem:“A Igreja está divida e
separada porque as pessoas insistem em doutrinas particulares. Essa maneira de agir
sempre causa divisão. Tod os nós devíamos concordar que a verdade é tão grande e
tão gloriosa que não pode ser definida”. Noutras palavras, o que nos dizem é que
a verdade é algo que “se capta, não que se ensina”. Você não pode enquadrá-la em
definições, não pode expô-la como uma série de proposições, dizem eles; é
simplesmente algo do que você toma consciência.

Deixem-me oferecer-lhes uma ilustração disso tirada de um livro que,


porsinal,tinhaoseguintetítulo:igweVõe,y Wr/mas (“Ultimate Questions”). O autor
estava interessado em tratar dos pontos fundamentais. Diz ele que, no passado, o
problema era que as pessoas tentaram definir o que é certo e o que é errado; porém,
dizele, não é possível fazer isso. Então, que é cristianismo, que é a verdade? Como
resposta ele faz umadescriçâo de um homem que ficou sabendo que, se ele subisse ao
topo de certa montanha, teriaumavista maravilhosa, um panoramagrandioso.
Assim, um dia ele sobe ao topo da montanha. Depois de muito esforço, lutae suor, e
de ferir os joelhos e as mãos nas pedras e penhascos, ele chega ao pico e dali
contempla o magnífico panorama. “Que é que ele faz?”, pergunta o referido escritor,
“vai para casa e escreve tudo o que viu com proposições e definições - primeiro,
segundo e terceiro pontos?” Claro que não! Não se pode descrever nesses termos tal
vista gloriosa. Não; só

há uma coisa que fazer; simplesmente fica lá, na mais completa adm ira-ção. Fica
sem fala. Diz o escritor: “Posso imaginá-lo dançando, posso imaginá-lo cantando,
mas o que não posso imaginar é vê-lo escrevendo no papel em proposições o que viu
-dissecando-o, anal isando-o, definindo-o e contrastando-o com alguma outra coisa”.
Diz ele que isso arruinaria a realidade. Não se pode analisar uma flor, não se pode
analisar um aroma. Pode-se perceber, pode-se sentir, pode-se ficar emocionado com
o objeto em questão; entretanto não é possível analisá-lo. No momento em que você
puser as suas rudes mãos nele e tentar analisá-lo, já o perdeu. A verdade é isso! ^

Essa ilustração é típica da atitude moderna. À luz disso, naturalmente, fazer crítica é
terrivelmente ruim. Se você se aventurar a criticar ou a dizer que certo ensino é
errado, você é despachado como pessoa contenciosa. Dirão que seu espírito deixou
de ser cristão, que você se tornou estreito; que está tendo a pretensão de que só você
está certo. Você não deve fazer isso. Quem pode definir a verdade? Uma pessoa a vê
de um modo, outra pessoa a vê de outro. Não importa! Todos nós estamos
interessados na mesma coisa! Portanto, você não deve criticar, não deve dizer acerca
de nenhum ensino que ele é errado. Se um homem está realmente fazendo o melhor
que pode, e está procurando elevar-se e elevar a humanidade, que direito você tem
de dizer que ele está errado? A verdade escapa à definição. Por isso a sua faculdade
crítica deve ser abafada; e você deve deixar que toda e qualquer pessoa creia no que
quiser, contanto que tenha o propósito de fazer o bem.

Noutras palavras, a unidade é posta adiante da doutrina. Há somente uma coisa,


parece-me, em que a maioria acredita, a “unidade”. “A unidade” é o único artigo de
fé. Devemos unir-nos a todo custo, crendo no que qui sermos. É a isso que se chega
de fato; e essa está crescentemente se tornando a idéia predominante. Nós e Roma
devemos ser um. Os Reformadores estavam errados. Quem pode dizer que os de
Roma estão errados e que nós estamos certos? Que direito têm eles de dizer que
nós estamos errados e que eles estão certos?Não se pode definira
verdade. Todoaqueleque se diz cristão é meu irmão. Somos todos um!
Eassimos líderes do Movimento pela Unidade - o movimento ecumênico -
estão interessados em “reconciliar” o catolicismo romano com o protestantismo,
unindo-os numa grande “Igreja Mundial”.

Tratemos de falar claramente sobre isso. Uma unidade de âmbito mundial é o fim
lógico do argumento. Você não tem direito de ficar a meio caminho, nesta questão da
unificação dos diferentes segmentos do protestantismo; terá que seguir o argumento
até o fim. Se o argumento é

que você não pode definir a verdade e que, se um homem se diz cristão você terá de
se unir a ele, seja o que for que ele diz ou crê, o fim d isso tudo será unirmos todos
com Roma. Não podemos deter-nos; temos que ser coerentes. Significa, portanto, que
a Reforma foi um desastre. Muitos dizem isso abertamente. Esse é o fim lógico do
argumento que afirma que não se pode definir a verdade, que não se deve criticar
ninguém e que não se deve fazer perguntas. É o fim lógico da posição segundo a
qual devemos recebertodaequalquerpessoaporseuvalornominal,eque, num espírito de
caridade e amizade, devemos estar d ispostos a trabalhar junto com ela.

Por trás disso tudo está a crença em que o padrão e o teste finais de tudo é o
conhecimento moderno. Li recentemente num periódico religioso a declaração
específica de que a Bíblia é de grande valor, mas, naturalmente, seria tolice esperar
que ela realmente nos ajudasse nos tempos atuais. A Bíblia foi escrita numa época
em que a sociedade era primitiva e simples. Ela trata dos problemas daquele tempo,
e os trata muito adequadamente. Não só isso, o artigo diz também que a Bíblia
tem percepções - essa é a palavra, “percepções”2- que são de grande ajuda paranós
hoje, porém, obviamente, na complexidade dacivilizaçãomoder-na e da sociedade
moderna, seria ridículo esperar que a Bíblia fosse adequada. Avançamos muito em
relação a isso. Assim, devemos confiar no conhecimento moderno, no entendimento
moderno e na instrução moderna.
A pergunta que faço, à luz disso tudo, é: como devo colocar o cinto da verdade? O
apóstolo me diz que é absolutamente essencial, que é a primeira coisa que eu devo
fazer, que, se não o fizer, não poderei revestir-me de toda a armadura de Deus, e que,
sem a armadura de Deus, já estou derrotado. Diz o apóstolo que a verdade é algo que
eu posso tomar, que eu posso vestir; todavia hoje nos dizem que não podemos defini-
la.

Há somente uma resposta a essa atitude moderna. Na Bíblia, a verdade édefinidaeo


erro é condenado. Há uma perfeita ilustração disso no capítulo dois da Segunda
Epístola a Timóteo, onde o apóstolo diz virtualmente uma só coisa no capítulo todo,
a saber, que devemos apegarmos à verdade. Havia alguns que a estavam negando,
“dizendo que a ressurreição era já feita”. O apóstolo chama esse tipo de ensino
de “gangrena”! Mas se eu lhe chamar gangrena hoje, serei caluniado como pessoa
arrogante, como pessoa contenciosa, cujo espírito é mau.

O apóstolo Paulo define doutrina. Vejam o versículo 8 daquele

capítulo: “Lembra-te de que Jesus Cristo, que é da descendência de Davi,


ressuscitou dentre os mortos, segundo o meu evangelho”. “O meu evangelho!” Pura
arrogância! Hoje o apóstolo seria posto fora como um sujeito contencioso e
arrogante. E isso que certamente dizem a respeito de todos os que mantêm o ensino
apostólico hoje. Há muitos que não hesitam em falar isso mesmo do próprio
apóstolo. Não gostam do apóstolo Paulo; preferem o que chamam “o simples
evangelho de Jesus”, o “evangelho do amor”. Lamentam, dizendo que Paulo, “com a
sua mente legalista, inseriu suas idéias farisaicas no simples evangelho do
amor”. Não admira, pois, que a Igreja esteja como está.

Paulo fala de: “o meu evangelho”! Mas notem que ele diz também: “Tu, pois, meu
filho, fortifica-te na graça que há em Cristo Jesus. E o que de mim... ouviste, confia-o
a homens fiéis, que sejam idôneos para também ensinarem os outros” (versículos 1 e
2). O apóstolo Paulo, como vemos em Atos e nas Epístolas, não se contentava em
dizer: “Juntemo--nos e sejamos todos amigos; o amor de Deus cobrirá todas as
coisas. Creiamos no que quisermos, contanto que sejamos todos bondosos, amáveis e
amigáveis, e que todos estejamos apresentando uma frente comum”.

“E o que de mim, entre muitas testemunhas, ouviste, confia-o a homens fiéis, que
sejam idôneos para também ensinarem os outros.” Estas coisas não são meras
generalidades, e sim, pontos particulares; e no capítulo do qual estou falando, Paulo
toma um assunto particular - a ressurreição. Hoje nos dizem que é completamente
insignificante se a pessoa crê ou não crê na ressurreição literal, física. Isso não
tem importância, dizem, contanto que a pessoa pertença a uma igreja. Desde que
afirme que é cristã, deixemos que negue a ressurreição ou outra coisa qualquer.
“Não!” diz o apóstolo, “o fundamento de Deus fica firme.” Observem também o que
ele diz no fim: “E ao servo do Senhor não convém contender, mas, sim, ser manso
para com todos, apto para ensinar, sofredor; instruindo com mansidão os que
resistem” (versículos 24 e 25). Você tem que instruí-los, e você não poderá instruí-
los, a menos que acredite que eles estão errados e que você está certo. E lhe
cabe instruí-los, “a ver se porventura Deus lhes dará arrependimento
para conhecerem a verdade”. Aqueles homens tinham errado em pontos particulares
da sua doutrina; e Timóteo precisava ser paciente com eles, para ver o erro deles e
instruí-los. Devemos igualmente expor a verdade aos que estão errados, a fim de que
retornem à verdade, “desprendendo-se dos laços do diabo, em que à vontade dele
estão presos” (versículo 26).

O apóstolo está dizendo que devemos ter dó desses homens e que

devemos lamentar por eles, porque caíram nos “laços do diabo”. O diabo, como um
caçador de animais, arma as suas armadi lhas por toda parte para apanhar os
ignorantes, os que não crêem em doutrina e dizem que não importa no que você creia,
desde que esteja vivendo uma vida louvável, seja um homem bom e amável, e assim
por diante. O diabo monta as armadilhas para pegá-los, e eles caem nelas. Estas se
fecham de repente sobre eles, e eles não conseguem livrar-se. Eu e vocês temos o
dever de libertá-los.

Se isso é verdade, segue-se que você não experimentará a paz verdadeira, não
experimentará a alegria do Senhor, não saberá o que é o verdadeiro viver cristão,
enquanto não crer na doutrina cristã. Você pode persuad ir-se de que tudo está bem,
mas lembre-se de que o diabo é capaz de pôr em nós o que se chama “fortes ilusões”
(2 Tessalonicenses 2:11, VA). Um pobre demente pode achar que tudo está
perfeitamente bem no mundo, ou um homem que está sob a influência do álcool pode
dizer que tudo vai bem. De igual modo o diabo pode levar as pessoas a
pensarem que tudo está bem, por meio das suas “ilusões”. “Amados, não creais a
todo espírito”, diz o Novo Testamento, “mas provai se os espíritos são de Deus” (1
João 4:1).

O Novo Testamento é bem claro sobre todas estas coisas. A verdade pode ser
definida, e pode ser declarada em proposições. É o que vemos nestas Epístolas. O
Novo Testamento ensina claramente que, portanto, você deve dizer que qualquer
outro ensino está errado e você deve condená-lo. O Novo Testamento argumenta; o
Novo Testamento é polêmico. Oapóstolo Paulo emprega linguagem muito forte. Diz
ele que algumas pessoas “crêem na mentira”, que há “falsos mestres”, e adverte as
pessoas no sentido de que fujam deles. Ele declara: “Ainda que nós mesmos ou um
anjo do céu vos anuncie outro evangelho além do que já vos tenho anunciado, seja
anátema” (Gálatas 1:8). Ele não escreveu essas palavras a pessoas do mundo, de
fora da Igreja; ele estava se referindo a falsos mestres na Igreja. Todavia, se você
disser tais coisas hoje, se você repeti-las, você é “contencioso”, é “estreito”, é
“negativo”, pensa que só você está certo; de fato você é obstinado e intolerante.
Porventura é surpreendente que a Igreja Cristã esteja como está no presente? Todo
este ensino moderno não é somente uma negação do Novo Testamento, é também uma
negação do que a própria Igreja tem ensinado através dos séculos. Se não se pode
definir a verdade, se ela não pode ser declarada em proposições, então joguemos
fora o Credo Apostólico, o Credo de Atanásio e o Credo Niceno. Paremos de recitá-
los. Queimemos todas as grandes confissões de fé. Estão errados, todos

eles, em princípio, para não dizer nos detalhes. O ensino moderno é uma negação e
um repúdio do que o povo de Deus, sob a direção, o poder e a orientação do
Espírito Santo, fez em todos os maiores e mais gloriosos períodos da história da
Igreja Cristã.

Contudo, estou preocupado com tudo isso, não tanto nesse aspecto geral, e sim
principalmente em seu aspecto pessoal. Como devo colocar o cinto da verdade? Que
é “a verdade”?

Como devo saber o que é verdade? Qual a minha autoridade em relação a ela? A
grande questão atual é a questão da autoridade. Que devo dizer no meio desta babel
de vozes? A primeira resposta é que a minha autoridade não deve ser a razão
humana. Essa é a autoridade suprema hoje - a razão humana baseada no
conhecimento moderno. O que nos dizem é que, porque estamos vivendo numa
eracientífica, todaasituação é diferente. Mas isso é clara, patente e completamente
inadequado, porque são tantas as coisas que eu não sei, e são tantas as coisas que
eu não entendo! Minha mente é demasiado finita, é pequena demais.

Depois me dizem que a nossa situação hoje depende do conhecimento moderno, e


que eu não devo confiar num conhecimento que vem do passado. Isso, porém, me
deixa na seguinte situação: se, à luz do meu conhecimento, eu digo que o grosso do
“conhecimento” passado estava errado, sei perfeitamente que daqui a cinqüenta ou
cem anos as pessoas estarão dizendo exatamente a mesma coisa sobre o meu
conhecimento atual; portanto, o que eu sei agora provavelmente estará errado.
Não tenho nada; estou em areia movediça, e me defronto com uma oscilante escala
da verdade.

Mas, fora isso, que é a razão humana - a razão de qualquer homem -quando encarada
pela razão, pelo conhecimento, pela inteligência e pela astúcia do diabo? “Não
temos que lutar contra a carne e o sangue.” Não estamos meramente argumentando
com homens, estamos argumentando com a maior mente do universo inteiro, depois
da mente do Deus triúno. Essa é, como vocês devem recordar, a constante ênfase do
apóstolo - as artimanhas e as astúcias do diabo. E a história que nos é dada na
Bíblia é uma ilustração dessa astúcia. Ela mostra como as melhores, as maiores e as
mais santas mentes foram laçadas pelo diabo; os melhores homens tiveram os seus
extravios. Se eu puser a minha confiança na razão humana, também serei derrotado.
Você não pode confiar em sua razão; ela é pequena demais, é deveras inadequada.
Todavia, é o que os homens estão fazendo hoje. Estão confiando em sua razão e
criticando a Bíblia; criticam até o Senhor Jesus Cristo! “Ele era um filho da Sua
era”, dizem eles, “Ele não tinhaa mínima possibilidade de sabero que nós sabemos.”

Essa é a razão humana, o conhecimento humano, a razão colocada na posição


suprema; e deixam você sem nenhuma autoridade superior. A nossa autoridade final
não pode ser a razão.

Que dizer dos meus sentimentos? Os sentimentos são colocados na posição de


autoridade por muitos hoje, porque as mentes mais sinceras têm de admitir que, em
última instância, a razão falha. As duas guerras mundiais destroçaram a fé na razão
humana, que caracterizou a primeira parte do século atual. O humanismo foi
grandemente ridicularizado e desacreditado pelas duas guerras mundiais. Por isso,
muitos se afastaram dele e estão dando um salto para a esfera do “sentimento”. “Ah”,
dizem eles, “não tente entender demais, não tente raciocinar. É o que você sente, é o
que você experimenta que importa-este algo indefinível que o “apanha”!”

Mas os sentimentos não podem ser a nossa autoridade final, porque, como bem
sabemos, eles são instáveis e não são confiáveis. Eles vêm e vão, e você nunca sabe
o que poderão ser. “Não ouso confiar na disposição mais fina”, diz um autor de
hinos, porque amanhã ela poderá ter desaparecido. Se eu estiver sendo governado
por meus sentimentos, ver-me-ei mudando constantemente-às vezes feliz, às vezes
infeliz, às vezes achando que está tudo bem, ora achando que tudo vai mal,
ora emocionado pela leitura da Bíblia, outras vezes tendo que me esforçar para
extrair algo dela, sentindo-me frio, árido, lerdo, tolo! Não seria essa a sua
experiência? Se é assim, como você pode confiar nos sentimentos como sua
autoridade?

Lembrem-se também de que os sentimentos podem ser facilmente simulados. Se o


que é agradável é necessariamente bom, se o que me causa um sentimento prazeroso
e animador tem que ser certo, então não tenho como responder às seitas. Eu teria que
dizer pura e simplesmente: “Pois bem, busque-as. Tudo o que o faça sentir-se
melhor, qualquer coisa que lhe dê algum descanso e alívio é bom; siga isso.
Qualquer coisa que faça de você um melhor homem só pode estar certa; siga-a”.
Se confiamos meramente na prova pragmática do que me faz sentir melhor, não temos
nenhum padrão. Não posso criticar nenhum ensino. É tão inteiramente subjetivo que
eu não tenho padrão de espécie alguma.

Prossigamos, porém. Se a autoriade não é a razão e não é o sentimento, será possível


que é a Igreja? Aí está sempre a igreja católica romana, é claro, alegando que a sua
autoridade é final. “Oh, sim”, diz ela, “a Bíblia é muito boa, contudo não é
suficiente. Nós temos acrescentado algo a ela, tivemos revelação adicional. Você
deve crer na Igreja tanto como na Bíblia.” Aí está essa pequenina “corrente”, que tão
depressa
se transformanum dilúvio, de volta a Roma. Isso é inevitável, à luz do que estivemos
considerando. Se não temos testes válidos para aplicar, há só uma conclusão - vamos
para Roma.

Há muitas razões pelas quais eu d igo que não podemos aceitar Roma como a nossa
autoridade. O modo como ela tão obviamente se afastou da doutrina e da prática da
Igreja Primitiva é suficiente em si e por si. Uma vez fiz a um sacerdote católico-
romano que veio falar comigo no fim de uma reunião esta única pergunta: “Você
pode ver a sua igreja, como ela é hoje, no Novo Testamento?” “Nunca pensei nisso”,
disse ele. “Pois bem”, disse eu, “pense nisso agora.” Ele o fez e disse: “Tenho
que admitir que não consigo vê-la ali”. Naturalmente que não! É criação dos homens.
Eles se apropriaram de idéias das religiões pagãs e do sistema político do Império
Romano. Não é possível ver essa igreja no Novo Testamento. Ela é totalmente
diversa da Igreja Primitiva. E isso, digo eu, é suficiente em si e por si para
desaprovar a sua reivindicação de autoridade.

“Mas”, perguntará alguém, “que é que isso tudo tem a ver comigo?” Tem o seguinte a
ver com você, que, se você tiver problema, talvez um dia se desespere, e por acaso
se defronte, quem sabe num ônibus, ou trabalhando perto de você no seu escritório,
com um católico romano que lhe diga: “você não pode lidar com estas coisas. Você
foi bastante tolo para pensar que podia, todos estes anos. Só lhe resta fazer uma
coisa, volte para a Madre Igreja; ela o livrará do problema, o sacerdote o livrará.
Você não tem por quê ficar carregando esse fardo; venha e entregue-se, livre-se
disso”. É isso que leva gente para Roma, às vezes pessoas muito intelectuais, como o
finado C. K. Chesterton e centenas de outros. Há intelectuais nos Estados Unidos da
América que estão abertamente voltando para Roma, e o motivo é que eles
estão desnorteados!

Ora, reitero que Roma não é autoridade por causa das adições feitas por homens,
acréscimos para os quais não há autoridade nenhuma. Além disso, esses acréscimos
contradizem ensinos cristãos básicos. A igreja de Roma não abandonou a crença na
divindade de Cristo, nos fatos concernentes a Ele, em Sua morte expiatória, em Sua
ressurreição literal, física. Ela defende essas doutrinas, contudo, acrescentou outras
que negam o ensino original concernente a Ele e à obra que Ele realizou para a nossa
salvação. Ela é um amontoado de contradições. Tomemos apenas umailustração-
acrescente mariolatria, a adoração da virgem Maria, na igreja católica romana. “Os
católicos romanos são cristãos”, dizem-nos, por isso “oremos com eles, unamo-nos a
eles.” Mas, antes de fazerem

isso, considerem esta citação de um artigo escrito por um monsenhor, alto oficial da
igreja romana. Diz ele: “Cada vez que repetimos a oração, “Salva-nos, ó Rainha”,
admitimos espontaneamente a Realeza de Maria. Maria é Rainha do céu e da terra
porque ela é a Mãe de Jesus, o Rei do universo, tornando-se desse modo a co-
Redentora da raça humana” -co-Redentora com o nosso Senhor, ele quer dizer. Ele
continua: “Visto que Maria deu vidaa um Filho que é Rei e Senhor de tudo, ela é, um
tanto misteriosamente, a Mãe da Trindade”. A Mãe da Trindade! A Mãe do Pai e do
Espírito Santo, como também do Filho! “Maria é também a nossa Rainha e co-
Redentora da nossa salvação. Foi ela, uma pessoa que estava livre de culpa e do
pecado”. Onde eles acham isso nas Escrituras? “Foi ela, que estava livre de culpae
do pecado, que ofereceu o seu Filho na cruz do Calvário, sacrificando o seu amor e
os seus direitos maternos para a nossa salvação eterna. Maria, Rainha de bondade e
m isericórd ia, cheia de amor e de graça, guia toda a humanidade para o Paraíso.
Sentada ao lado de Cristo, que é o Governador do mundo, está Maria, a quem o
nosso Redentor deu a incumbência de ser a dispenseira oficial da graça.
A autoridade que Maria tem está baseada no poder de intercessão e mediação
porque ela tem acesso ao coração de Cristo, o Rei. Ela tem a chave do Seu coração e
distribui todas as graças e todos os tesouros que nele residem.”3

Baste-nos isso. Não posso considerar a igreja romana como a autoridade final
porque o seu ensino nega o claro ensino das Escrituras, nega o que foi ensinado pela
Igreja Primitiva e pela Igreja durante séculos após, e é uma contradição do seu
próprio ensino noutros pontos.

Outra razão pela qual não posso aceitar Roma é todo o sistema que caracteriza
aquela igreja, sistema que me pede que eu creia em milagres operados pelas
relíquias dos santos, que eu creia em milagres que não são milagres e que não são
autenticados. Meu objetivo, ao dizertudo isso, não é apenas denunciar a igreja
católica romana. Estou dizendo estas coisas porque acredito que fui chamado por
Deus para pregar o evangelho da verdade aos homens e mulheres modernos, para
levá-los ao conhecimento da salvação mediante “a verdade como está em Jesus”.
Falo assim porque sei que terei que prestar contas da minha mordomia. Daí,
faço advertência contra estas coisas. Dizem-nos que não poderemos ser felizes
enquanto não estivermos unidos de novo àquela igreja que ensina o que citei. Isso,
para mim, não passa de uma tentativade seduzir e incitar as pessoas a andarem
deliberadamente no erro, a crerem como verdade

algo que é mentira e que menospreza a glória singular do Filho de Deus, nosso único
Salvador e Redentor. O apóstolo nos assegura que “há um só Deus, e um só
Mediador” (somente um\) - nenhum co-Mediador, nenhuma co-redentora - “entre
Deus e os homens, Jesus Cristo homem”. Acrescentar-Lhe algo é tirar-Lhe algo; e
isso é a blasfêmia final. Digo estas coisas em nome da verdade, por amor e pela
honra do meu bendito Senhor, que morreu por mim. Digo-as porque me sinto
responsável pela minha alma, e não somente pela minha, como também pelas
almas dos outros.

Vocês devem cingir-se e cingir os seus lombos com a verdade. Se não o fizerem,
estão derrotados. E eu estou asseverando e sustentando que se pode conhecer a
verdade, que há uma autoridade. Não é a razão, não são os sentimentos, não é a
Igreja, nenhuma igreja. É o Livro chamado Bíblia.

A ESCRITURA DA VERDADE

“Estai, pois, firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade. ” - Efésios
6:14

Já chegamos ao estágio no qual vemos a absoluta necessidade de uma autoridade


externa, objetiva; não a minha razão, os meus sentimentos, ou as tradições dos
homens, que em última análise não passam de produto da razão e dos sentimentos. A
igreja católica romana, e todas as igrejas que a seguem, falam muito acerca da
tradição, mas, em sua maior parte, ela é de origem humana, não divina. O nosso
Senhor mesmo fala sobre “a tradição dos anciãos” (Marcos 7:5), por meio da qual
se violaram os mandamentos de Deus. É essencial que tenhamos uma autoridade
externa, objetiva, pela qual possamos testar a nossa razão, os nossos sentimentos e
tudo mais. Assevero mais uma vez que esta é uma questão de superlativa
importância. O que vocês vêem quando olham para o futuro? Como vocês explicam
as tendências que são tão óbvias? É indiferente para vocês se toda a Igreja se unir à
Roma? Acaso os Reformadores morreram em vão, ou a Reforma, como tantos
andam dizendo hoje em círculos protestantes, foi o maior desastre da história
da Igreja? Estas questões são absolutamente vitais para nós. Chegou o dia em que
temos de encará-las com toda a seriedade e tomar nossa decisão, fazendo a nossa
escolha com relação a elas.

Em minha tentativa para deixar isso claro, permitam-me relatar uma experiência que
me sobreveio muito recentemente. Ela assinala a importância de toda esta questão de
autoridade. Eu estava sentado num trem, viajando com destino a Southend. Eu estava
lendo um livro, mas subitamente percebi umaagitação no compartimento. Era um
daqueles compartimentos abertos, com divisões. Olhei, e vi pessoas em pé, em tomo
de um homem que evidentemente estava tendo algum problema. Assim, aproximei-me
e vi ali um companheiro de viagem tendo um ataque epilético. Ele se debatia,
vermelho-azulado, espumando na boca, e assim por diante. Logo vi que aquelas
bondosas pessoas que o rodeavam e que lhe deram atenção enquanto eu lia
tranquilamente, tinham chegado a uma decisão. Disseram que só havia uma coisa a
fazer. Tinham que deter o trem na próxima estação. Uma daquelas pessoas sabia que
havia um hospital não longe da estação, e insistia em que era preciso chamar uma
ambulância

e levá-lo para lá. A idéia do grupo era que o homem tinha sofrido um derrame
cerebral, ou que estava tendo um forte ataque cardíaco, e estava à beira da morte.
Visto que essa era a sua opinião, aquelas pessoas, muito acertada e naturalmente,
estavam-se propondo a tomar essas providências. Tendo-as ouvido, tive que tomar a
minha decisão. Que devia fazer? Para mim estava claro que aquele homem não
corria perigo de vida. Estava tendo um ataque epilético, como provavelmente lhe
acontecera muitas vezes. Eu sabiaque o homem, quando voltasse a si, ficaria
muito aborrecido, se se visse num hospital. Por isso, no interesse do homem, resolvi
intervir.

Mas então tive que tomar uma segunda decisão. Deveria dizer-lhes, quando
interferisse, que eu tinha algum conhecimento sobre esses problemas, ou não deveria
dizer-lhes nada? Bem, não querendo envoi ver-me numa demora que poderia atrasar-
me para o meu compromisso de pregação naquela tarde, decidi não lhes dar nenhuma
indicação quanto a quem ou o que eu era,4 de modo que simplesmente lhes disse,
com firmeza: “Não, vocês não devem fazer isso; é inteiramente desnecessário.
Este homem está tendo um ataque epilético, e logo estará bem, e ficará
muito aborrecido se vocês o internarem num hospital”. E acrescentei: “Não
há absolutamente nenhum perigo”. Os circunstantes me olharam com considerável
dúvida e hesitação, porém pude ver que os estava impressionando. Assim, persisti, e
em pouco tempo os persuadi. Obviamente, alguns deles ainda duvidavam, e
realmente não acreditaram no que eu tinha dito, mas eu pude persuadi-los a não
fazerem nada. Assegurei-lhes que o homem ia recuperar logo a consciência; ò que,
naturalmente, aconteceu. Finalmente ele desceu do trem comigo em Southend, como
eu soubera que ele faria, e foi para casa sem precisar da ajuda de ninguém.

Minha única razão para relatar esse incidente é mostrar como a questão de
autoridade entrou lá. Havia aí um bom número de pessoas -éramos estranhos uns
para os outros - decidindo algo. Eu sozinho, uma vez que todos os demais elementos
do grupo estavam de acordo sobre o que iam fazer, fui capaz de persuadi-los a não
agirem. Tive êxito porque eles se aperceberam do toque de autoridade no que eu
estava dizendo. Eles não sabiam qual era a causa do mal de que o homem
estava padecendo. Era derrame cerebral, ataque cardíaco, que era?
Todos concordavam que ele estava morrendo, que o caso era sem
esperança, entretanto não sabiam o que era. Mas de repente alguém fala com

autoridade e diz: “Está tudo bem; vocês não precisam fazer isso; não precisam deter
o trem, chamar uma ambulância e levar o homem a um hospital; ele vai recuperar-se
logo”. E eles me deram ouvidos, aceitaram a minha opinião e agiram de acordo. O
ponto significativo é que eles não sabiam qual era a base da minha autoridade. Eu
não lhes disse com que base eu lhes podia falar dessa maneira dogmática, positiva e
autoritária. Contudo, apesar da sua falta de conhecimento, eles me ouviram,
mudaram de opinião e seguiram o meu conselho.

Isso, ao que me parece, é uma parábola. Ela ilustra o caso de muitos na Igreja e, em
conseqüência, o caso de muitos de fora da Igreja. Muitos ficam desnorteados quando
enfrentam uma situação alarmante. Que será que vai acontecer? Que se deve fazer? E
não sabem. Consideram e discutem muitas idéias e propostas. Então, subitamente,
ouvem alguém falar dogmaticamente e com autoridade, e se dispõem a ouvi-lo.

O ponto significativo que emerge é que, sem saberem qual a base da autoridade,
estão prontos a ou vir uma afirmação autoritária. Não foi isso que aconteceu? Isso
explica por que as seitas estão tendo sucesso hoje, por que certos movimentos
religiosos excêntricos estão tendo sucesso hoje, e porque a igreja romana teve
sucesso. Falam com autoridade, falam com convicção. Por outro lado, as igrejas
protestantes estão titubeantes, hesitantes e cheias de dúvidas. Elas dizem que não
sabem o que é a verdade, algumas chegando a afirmar que não se pode dizer o que
ela é, que é algo que “se apanha, não que se ensina”, e assim por diante. Quando as
pessoas, em sua desorientação, ouvem uma palavra de autoridade, alguma coisa
proferida definidamente, acreditam. Aceitam--na e agem de acordo com ela; no
entanto, não sabem qual a base da autoridade.

Eu pude falar como falei aos meus companheiros de viagem porque eu tinha
autoridade. Não foi meramente umaopinião, não foi somente um sentimento que eu
tive; falei com base no conhecimento e nos fatos. Não fiz o que os médicos às vezes
chamam “diagnóstico aleatório”;’ era perfeitamente simples; era um “caso de
compêndio” de ataque epilético; não havia dúvida. Conhecimento! Informação!
Verdade! Por isso fui capaz de falar como falei. E o que eu disse foi confirmado,
porque estava baseado e firmado em fatos e num conhecimento de medicina.

A necessidade que temos hoje não é apenas de um toque de autoridade, mas da


autoridade que leve à afirmação categórica. Há no mundo muitos que estão prontos a
fazer pronunciamentos dogmáticos e 5

a falar com grande convicção e certeza nascidas de nada mais que a sua
autoconfiança e, às vezes, as suas ilusões! É aí que surge o perigo. Muitos estão
prontos a ouvir, como aqueles que me ouviram no trem, sem saberem a base da
autoridade. Alegrou-me que me ouvissem e, todavia, ao mesmo tempo, para mim
houve algo patético naquilo tudo, porque mostrou este perigo terrível. Contudo, o
que o incidente ilustra é a imprescindibilidade de uma autoridade baseada no
conhecimento.

Voltemos, então, a considerar a única autoridade que pode responder a estes


desideratos. Acha-se na Bíblia. Não pode haver dúvida de que todos os problemas
da Igreja hoje, e a maioria dos problemas do mundo, devem-se ao abandono da
autoridade da Bíblia. E, que pena! Foi a própria Igreja que introduziu a chamada
Alta Crítica que veio da Alemanha há mais de cem anos. A filosofia humana tomou o
lugar da revelação, as opiniões do homem foram exaltadas e os líderes da Igreja
falavam do “progresso do conhecimento e da ciência”, e dos “seguros
resultados” desse conhecimento. A Bíblia passou a ser então simplesmente
como qualqueroutro livro, obsoletoem certos aspectos, errado noutros, e
assim pordiante. Deixou de serum livroem que se podia confiar implicitamente. Não
se pode contestar que a queda na freqüência à igreja neste país é conseqüência direta
da Alta Crítica. O homem da rua diz: “Que é que estes cristãos sabem? É só opinião
deles; eles estão perpetrando algo que os verdadeiros pensadores e cientistas de há
muito verificaram e pararam de considerar”. Essa é a atitude do homem da rua! Ele
não ouve mais, perdeu todo o interesse. A situação em geral é de deriva; e, em
grande parte, repito, é resultado direto e imediato da dúvida que a própria
Igreja lançou sobre a única autoridade verdadeira. As opiniões dos homens tomaram
o lugar da verdade de Deus, e as pessoas, em sua necessidade, estão procurando as
seitas e estão dando ouvidos a qualquer falsa autoridade que se lhes ofereça.

Portanto, todos nós temos que enfrentar esta questão crucial e fundamental; aceitamos
a Bíblia como a Palavra de Deus, como a única autoridade em todas as questões de
fé e prática, ou não? Seria todo o meu pensamento governado pelas Escrituras, ou eu
venho com a m inha razão a fim de selecionar e destacar partes das Escrituras, para
fazer-me seu juiz, pondo-me e pondo o conhecimento moderno como o padrão
supremo e a autoridade final? A questão é clara como cristal. Porventura aceito
as Escrituras como revelação de Deus, ou confio na especulação, no conhecimento
humano, no saber humano, no entendimento humano e na razão humana? Ou, fazendo
uma colocação ainda mais simples: eu ligo a minha fé e submeto todo o meu
pensamento ao que leio na Bíblia? Ou será

que cedo-me ao conhecimento moderno, ao saber moderno, ao que as pessoas


pensam hoje, ao que sabemos nestes tempos presentes e que não se sabia no
passado? É inevitável que ocupemos uma destas duas posições.

A posição protestante, como aconteceu com a Igreja Primitiva nos primeiros séculos,
é que a Bíblia é a Palavra de Deus. Não que a “contém”, mas que ela é a Palavra de
Deus, inspirada e inerrante em sentido único. Os reformadores protestantes criam,
não somente que a Bíblia contém a revelação da verdade de Deus aos homens,
porém também que Deus salvaguardava a verdade exercendo controle sobre
os homens que a escreveram, mediante o Espírito Santo, e que Ele os mantinha livres
de erro, de mácula e de toda forma de engano. Essa é a posição protestante
tradicional, e no momento em que a abandonarmos, já começamos a andar pela
estrada que leva de volta a uma das falsas autoridades e, como é provável,
finalmente a Roma. Em última análise, esta é a única alternativa.

As pessoas querem ter uma autoridade em que se firmar; e estão certas em pensar
assim. Precisam de autoridade porque estão desnorteadas; e se não a acharem
seguindo o caminho certo, vão buscá-la no caminho errado. Poderão ser persuadidas
mesmo que não saibam a origem da autoridade; em sua total desorientação, estão
prontas a deixar-se persuadirporqualquer afirmação autoritária. Dessamaneira,
chega-se ao seguinte: voltamos exatamente ao ponto em que estavam os cristãos
há 400 anos. O mundo fala do seu progresso no conhecimento, da sua ciência etc.,
mas o fato é que estamos girando em ciclos, e estamos de volta exatamente onde os
cristãos estavam há 400 anos. Temos que travar mais uma vez todo o combate da
Reforma Protestante. Ou é este Livro, ou, em última instância, é a autoridade da
igreja de Roma e a sua “tradição”! Esse foi o grande impasse na Reforma
Protestante. Foi por causa do que eles encontraram na Bíblia que aqueles homens se
levantaram contra a igreja de Roma, questionaram-na e a contestaram, e finalmente
a condenaram. Foi somente isso que capacitou Lutero a permanecer firme, um único
homem, desafiando todos aqueles doze séculos de tradição. “Não posso fazer outra
coisa”, disse ele, por causa daquilo que ele tinha encontrado na Bíblia. Ele pôde ver
que Roma estava errada. Não importava que ele estivesse só, e que todos os grandes
batalhões estivessem contra ele. Ele tinha a autoridade da Palavra de Deus, e
ele julgava a igreja católica romana, sua tradição e tudo o mais por meio
dessa autoridade externa.

Estamos de novo naquela mesma situação, e a questão me interessa,

não somente do ponto de vista da Igreja em geral, mas também do ponto de vista das
nossas experiências individuais. Como podemos combater o diabo? Como podemos
saber como devemos viver? Como podemos responder às coisas que ouvimos, às
coisas que lemos e a todas as astutas sugestões do diabo? Onde posso ver esta
verdade da qual devo me cingir, ao me revestir de toda esta armadura de Deus?
Onde poderei vê-la, se não a puder ver na Bíbl ia? Ou meu fundamento é de areia e
cede sob os meus pés, e não sei onde estou, ou então me firmo sobre aquilo que W.
E. Gladstone denominou “A Inexpugnável Rocha das Escrituras Sagradas”.

Por que devemos retornar à Bíblia, por que devemos crer nela? Porque não devemos
ser como meninos “levados em roda por todo o vento de doutrina, pelo engano dos
homens que com astúcia enganam fraudulosamente”. A única maneira de evitar essa
catástrofe é ter uma bússola, é ter um mapa, é ter uma autoridade, é ter algo sólido
em que basear toda a nossa vida e, se necessário, sacrificar por ele as nossas vidas.

Pois bem - para falar mais em detalhe - a primeira resposta é que a própria Bíblia
afirma que ela é essa autoridade. Às vezes o diz explicitamente, e em toda parte o
diz implicitamente. Nenhum homem pode por si mesmo chegar ao conhecimento de
Deus. Essa é toda a base do ensino do Novo Testamento, como era toda a base do
ensino apostólico. Não posso entender como alguém que tenha lido os dois primeiros
capítulos da Primeira Epístola de Paulo aos Coríntios pode defender outra idéia. O
apóstolo estabelece o seguinte, como sua posição fundamental: “Porque a palavra da
cruz é loucura para os que perecem; mas para nós, que somos salvos, é o poder de
Deus”. E então continua: “Porque está escrito” - ele cita o Velho Testamento -
“Destruirei a sabedoria dos sábios, e aniquilarei a inteligência dos inteligentes”.
“Onde está o sábio? Onde está o escriba? Onde está o inquiridor deste século?”

Quer dizer, onde está o homem que confia no conhecimento moderno, na ciência, no
saber, na sua própria capacidade e no que dizem os filósofos? E Paulo prossegue:
“Porventura não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo?” De que forma? Paulo
responde: “Visto como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus pela sua
sabedoria” -pelafilosofia, pelo saber, pelo conhecimento, pelo
entendimentoepelarazão humana. O mundo fracassara em sua busca de Deus; mas
quando o mundo tinha fracassado, “aprouve a Deus... pela loucura da pregação”-por
aquilo que o mundo considerava como a “loucura” do que era pregado, a “loucura”

do evangelho e da mensagem do evangelho - “salvar os que crêem”.

O apóstolo expõe ali aposição completa; e não hácomo contestá-la. É nisso que
vemos a sabedoria de Deus. As pessoas com freqüência perguntam: “Se Deus Se
propusera enviar o Messias, o libertador, o Seu próprio Filho, a este mundo, como
Ele predisse através dos séculos, por que esperou tanto tempo para fazê-lo? Por que
não o fez mais cedo?” A resposta é que Deus enviou Seu Filho ao mundo com a Sua
mensagem depois de ter dado ao mundo plena oportunidade para libertar-se a
si próprio, particularmente por meio da filosofia grega. Todos os grandes filósofos
gregos - Platão, Sócrates, Aristóteles, e todos os demais -viveram e morreram antes
da vinda do Senhor Jesus Cristo. Eles representaram o homem em seu apogeu. Não
há dúvidade que o período florescente do intelecto humano, em tantos sentidos, foi
alcançado na grande era da filosofia que precedeu a vinda do Senhor Jesus Cristo.
Ali vocês têm a capacidade e o pensamento do homem em sua melhor e mais elevada
forma; mas toda essa sabedoria mostrou-se incapaz de elevar-se ao ponto de chegar
ao conhecimento de Deus. “O mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria”, e
nunca O conheceu desde aquele tempo, e nunca O conhecerá.

Todavia, hoje os homens continuam pondo a sua confiança na filosofia humana. A


Igreja está fazendo isso; ela cita os filósofos, encontra “percepções” numa variedade
de religiões e nos ensinos dos filósofos, sejam eles cristãos ou não. Se são homens
capazes, homens de cultura e pensadores profundos, argumenta-se que eles devem ter
algo para dizermos! Mas isso é uma completa negação de toda a base da
pregação apostólica.

“O mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria”; e a razão disso é óbvia. Óbvia
por causa do caráter e da personalidade de Deus. E em I Coríntios, capítulo 2, Paulo
afirma que “nenhum dos príncipes deste mundo conheceu” e não reconheceu o nosso
Senhor. “Falamos sabedoria”, diz Paulo, “entre os perfeitos; não, porém, a sabedoria
deste mundo, nem dos príncipes deste mundo, que se aniquilam” (versículo 6).
A sabedoria humana, mesmo em seus príncipes, em seus maiores homens, é
inadequada; ela nunca nos levará à verdade. Isso porque Deus é o que Ele é! Deus é
infinito, absoluto e eterno em todos os aspectos. Deus é! E no momento em que você
compreende essa verdade, você vê como o homem jamais tem possibilidade de
chegar ao conhecimento de Deus. Como pode a mente finita abarcar o Infinito? Como
pode o homem mortal chegar a um verdadeiro conhecimento do Deus imortal, do
Deus que diz: “Eu sou o que sou”, do Deus que é de eternidade a eternidade,
absoluto

em todos os aspectos, do Deus que é “luz, e não há nele treva nehuma?”

Mesmo que o homem fosse perfeito, não poderia chegar ao conhecimento do Deus
infinito, pois, em comparação com Deus, o homem não é nada. Se você pode abarcar
algum conhecimento com o seu cérebro, significa que o seu cérebro é maior do que o
objeto que você abarca. Assim, quando o homem tenta entender Deus, e ve-10
mediante a sua pesquisa, o seu poder, o seu intelecto e seu entend imento, está
pressupondo que ele é maior do que Deus e que Deus é alguém que está aberto
para ser examinado. A própria idéia disso é monstruosamente ridícula.

No entanto, quando nos damos conta de que o homem não somente é finito, mas
também é pecador, decaído, transviado, pervertido, aquela postura se toma ainda
mais ridiculamente impossível. Vejam o argumento: “Qual dos homens sabe as
coisas do homem, senão o espírito do homem, que nele está?” (1 Coríntios2:l
lj.Temque haver uma correspondência. Se você quer apreciar música, tem que ter
alguma sensibilidade musical. Há pessoas que absolutamente não apreciam música.
Podem ter grandes intelectos, porém não têm ouvido, não podem apreciá-la. É
preciso haver alguma correspondência ou correlação antes de poder haver entend
imento. E o mesmo se aplica ao domínio espiritual. Deus não é só infinito, absoluto e
eterno; “Deus é luz, e não há nele treva nenhuma”. Não há comunhão entre a luz e as
trevas, não há correspondência entre o preto e o branco. Deus é sempiternamente
santo, e cada um de nós é pecador, indigno e vil. E o resultado, como diz o apóstolo,
é que, para cada uma dessas pessoas “naturais”, as coisas do Espírito de Deus são
“loucura” (1 Coríntios 2:14). O homem por natureza não somente não pode chegar ao
conhecimento; quando lhe é dado o conhecimento, ele o rejeita com escárnio. É
absurdo para ele, é loucura. “Os gregos buscam sabedoria”, mas o evangelho é
“loucura” para eles. É tão completamente diferente do que eles crêem, do que eles
são e do que eles têm! E assim será por toda a eternidade. A passagem das eras não
faz diferença. Deus não muda, o homem não muda, o pecado não muda e, portanto, o
que quer que possamos conhecer cientificamente hoje, que os nossos antepassados
não conheceram, não faz a mínima diferença. Assim, estamos de novo na antiga
situação: “O mundo não conheceu a Deus pela sua sabedoria”. Não podia
conhecê-10. “O homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus... e
não pode entendê-las.” O homem não pode entendê-las por causa da sua fraqueza,
incapacidade e pecaminosidade, e por causa da grandeza de Deus.
Todos nós estamos, pois, nesta situação, que, mesmo empregando todos os nossos
esforços, por estes nunca chegaremos a este conheci-

mento de Deus. Pois bem, então, seria possível o conhecimento? Se devo cingir os
meus lombos com a verdade, como posso achá-la? Há somente uma resposta: se
havemos de ter algum conhecimento da verdade, é preciso que nos seja dado por
Deus. Terá que ser revelado a nós. “É sobremodo elevado, não o posso atingir”, diz
o salmista (Salmo 139:6, ARA). Mas Deus, se quiser, pode dar-nos o conhecimento
que desejamos. E a mensagem geral da Bíblia, do princípio ao fim,
éjustamenteesta, que Ele o fez. “Como na sabedoria de Deus o mundo não conheceu
a Deus pela sua sabedoria, aprouve a Deus salvar os crentes pela loucura da
pregação”- pela mensagem que Ele enviou por meio dos Seus servos. Esse é outro
modo de declarar o fato da revelação.

Consideremos por ora a maneira pela qual o apóstolo Paulo expôs o assunto quando
ele estave pregando em Atenas e se dirigia aos estóicos e aos epicureus. E, para
mim, não somente a tragédia das tragédias, mas também quase inexplicável, o fato de
que a Igreja Cristã, no século passado, deliberadamente introduziu de novo a
filosofia na Igreja e a colocou numa posição central. É uma negação fundamental da
totalidade do evangelho. E ela continua fazendo isso. Temos que levantar-nos
diante do mundo e dizer o que Paulo disse em Atenas: “Esse, pois, que vós honrais,
não o conhecendo...” (Atos 17:22 e seguintes). Eles estavam tentando achá-10; não
somente haviam erigido templos dedicados aos seus diversos deuses, porém havia
aquele estranho altar, que trazia a inscrição: “Ao Deus Desconhecido”. Eles tinham a
sensação de que Ele estava nalgum lugar. As raças mais primitivas têm umacrença
num Deus supremo. Não O conhecem, estão tentando achá-lO - e era assim com os
gregos! “O Deus Desconhecido!” E Paulo olha para eles e diz: “Esse, pois, que vós
honrais não o conhecendo” - ou esse que estais tentando honrar - “é o que eu vos
anuncio” (ou “vos declaro”, VA). Ele está fazendo uma declaração.

Lá estavam pessoas andando às tontas, às apalpadelas, na escuridão, e então chega


um homem com autoridade e diz: “Esse é o que eu vos declaro”. Eis aí
conhecimento, informação. Isso é revelação! Essa é toda a posição bíblica. Em nossa
incapacidade, em nossa condição finita, em nossa pecaminosidade, não podemos,
nem nunca poderemos chegar ao conhecimento de Deus. E estamos tão presos a essa
condição que, se a Deus não aprouvesse dar-nos o conhecimento, dar-nos a
revelação, não teríamos nada, estaríamos destruídos, estaríamos sem nenhuma
esperança, “sem Deus no mundo”. Mas, dizaBíblia, Deus fez precisamente isso! Essa
é a glória da mensagem, essas são as boas novas da salvação; a Deus aprouve dar-
nos esta revelação. Essa é a mensagem da Bíblia toda; é o

que ela proclama do começo ao fim. “No princípio... Deus”. É uma declaração
autoritária. Como foi que Moisés fez a declaração autoritária? Foi-lhe dada. Assim
vocês vêem o autor da Epístola aos Hebreus dizendo que “pela fé entendemos que os
mundos pela palavra de Deus foram criados”. Sabemos isso “pela fé”; foi dado; é
uma revelação.

Essa é a reivindicação do Velho Testamento; e, nesta questão, o Velho T estamento é


tão importante como o Novo. Os dois andam juntos, um levando o outro. Moisés
escreveu cinco livros, não por sua sabedoria pessoal, não por sua própria filosofia.
Ele não nos oferece suas idéias pessoais e o seu entendimento. A verdade lhe foi
revelada, e ele foi capacitado pelo Espírito Santo para escrevê-la. Quando chegam
aos profetas, vocês vêem exatamente a mesma coisa. Nem um só profeta se levantou
e disse: “Estou dizendo isso porque pensei muito neste assunto; meditei e li muito a
respeito, e cheguei a esta conclusão”. Não é isso que eles dizem. Em vez disso, eles
falam do “fardo do Senhor”; “veio a mim a mensagem do Senhor”; ou “o Espírito de
Deus veio sobre mim”. Alguns deles não queriam entregar a mensagem. Jeremias
diz: “Eu gostaria de não ter que falar; só entro em dificuldade quando falo”. Mais de
uma vez resolveu que nunca mais falaria, mas disse: “A Palavra de Deus foi como
fogo ardente dentro de mim, e não pude refrear-me”. Essa era a situação deles. O
salmista diz quase a mesma coisa.

A Bíblia é resultado da ação de Deus inquietando homens pelo Espírito, dando-lhes


a mensagem, e depois os capacitando a transmiti-la, falando ou escrevendo. E os
apóstolos, escrevendo no No vo Testamento acerca destas mesmas coisas, confirmam
plenamente o que o Velho Testamento reivindica. Vejam a famosa declaração do
apóstolo Paulo a Timóteo, em 2 Timóteo 3:16: “Toda a Escritura é dada por
inspiração de Deus” (VA), “é divinamente inspirada”. Vem de Deus. Ele a
“inspirou”, “soprou-a” em certos homens. Não é de homens, não é literatura humana,
sua origem é divina. “É proveitosa para ensinar, para redargüir, para instruir em
justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda
a boa obra”. A verdade é o cinto que você tem de colocar ao redor dos seus lombos.
Pedro confirma essa verdade com a sua linguagem numa importante exposição que
consta em sua Segunda Epístola, capítulo primeiro, do versículo dezenove até o
fim: “E temos, mui firme, a palavra dos profetas, à qual bem fazeis em estar atentos,
como a uma luz que alumia em lugar escuro, até que o dia esclareça, e a estrela da
alva apareça em vossos corações. Sabendo primeiramente isto: que nenhuma
profecia da Escritura é de particular interpretação”. Pedro não quer dizer que eu e
vocês não podemos

interpretá-la quando a lemos, mas sim, que “nenhuma profecia da Escritura” é


produto de excogitação humana privada; não é produto da razão humana, do
pensamento humano e do entendimento humano. Os escritos proféticos não nos
apresentam uma interpretação privada dos eventos contemporâneos e sua tentativa de
prever o futuro - não se trata disso! Pedro continua e diz: “Porque a profecia nunca
foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus
falaram inspirados pelo Espírito Santo”; eles foram “movidos”,
“levados”, “conduzidos” pelo poder do Espírito Santo. A reivindicação é
feita primeiro no Velho Testamento; e a vemos exposta claramente noNovo.

No entanto, além e acima do testemunho dos apóstolos Paulo e Pedro atestando os


escritos do Velho Testamento, temos o atestado passado pessoalmente pelo nosso
Senhor, que os credencia. Leiam os quatro Evangelhos e observem como Ele cita as
Escrituras, e sempre como a autoridade final. Notem que Ele diz numa ocasião: “A
Escritura não pode ser anulada” (João 10:35). Ele cita Gênesis, bem como os outros
livros. Ele fala sobre o homem em suas origens, obviamente aceitando o
ensino sobre Adão e Eva, sobre o primeiro casamento etc. Em todo o Seu ensino não
há nenhuma dúvida sobre a autoridade do Velho Testamento. Ele aceita o Livro
inteiro. E observem como, após a Sua ressurreição, quando Ele conversa com os
dois que estavam a caminho de Emaús, desconsolados e desapontados, cuja fé fora
abalada, Ele diz: “Ó néscios, e tardos de coração para crer tudo o que os profetas
disseram!” E se pôs a guiá-los através das Escrituras - Moisés e os profetas.
Mostrou-lhes nas Escrituras “o que dele se achava” nelas (Lucas 24:25-27). Ele já
tinha dito aos judeus: “As Escrituras testificam de mim” (João 5:39). E então, mais
tarde, quando os dois de Emaús chegaram de volta a Jerusalém, onde toda a
comunidade estava reunida, e alguns ainda estavam um tanto desorientados e
infelizes, e se sentiam incapazes de entender bem o que estava acontecendo, lemos
em Lucas 24:44: “E disse-lhes: são estas as palavras que vos disse estando ainda
convosco: que convinha que se cumprisse tudo o que de mim estava escrito na lei de
Moisés, e nos profetas e nos salmos”. Ele ensina claramente a autoridade do
Velho Testamento; refere-Se à profecia como predição - e predição exata!
O conhecimento só podia ter vindo de Deus; e fora registrado pelos servos de Deus.
“Então abriu-lhes o entendimento para compreenderem as Escrituras.

As Escrituras do Velho Testamento são autoritárias porque são Palavras de Deus.


Chegando ao Novo Testamento, a mesma verdade continua de pé. Lá está a altaneira
figura do nosso Senhor, com tudo o que

Ele diz de Si mesmo, e com o que Ele reivindica para o Seu ensino. Ele não hesita
em falar com autoridade; e as pessoas a reconheciam; elas diziam que Ele as
“ensinava como tendo autoridade; e não como os escribas” (Mateus 7:29). “Eu vos
digo”-este carpinteiro, este homem que, dentre todos os lugares, vinha deNazaré,
este homem que nunca fora instruído nas escolas dos fariseus, levanta-Se e fala com
autoridade. Afirma que é o Filho de Deus, não um mestre humano; Ele veio de Deus.
Ele é o Filho do homem que desceu do céu e continua “no céu” (João 3:13).
“Antes que Abraão existisse, eu sou”, diz Ele (João 8:58). Essa é a
Sua reivindicação em toda parte. Ele lhes ordena que O ouçam por causa
da autoridade única que pertence à Sua Pessoa, e, portanto, ao Seu ensino.
Que alguém possa ler as Escrituras sem notar essas reivindicações seria realmente
inexplicável, não fosse que sabemos como o pecado cega, e como o pecado nos
enche de tanto preconceito que não conseguimos enxergar. O crime que se comete
hoje é que as pessoas se assentam para julgar, não somente as Escrituras, mas
também o Senhor das Escrituras! Dizem elas que Ele estava errado em Sua fé no
Velho Testamento e que “Ele era filho da Sua era”. Não hesitam em dizer que Ele
estava errado em certas reivindicações que fazia quanto a Si próprio. Pessoas que
falam assim abandonam toda declaração autoritária, pois não há outra alternativa. A
suprema e única autoridade é Aquele que é o Filho de Deus e que veio do seio
eterno. Ele estava “com” Deus. Ele viu a face de Deus. Ele veio à terra e revelou
Deus. “Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai,
esse o fez conhecer” (João 1:18). E o que é que sabemos, fora dessa revelação?

Este é o princípio do assunto, o fundamento, o estritamente mínimo, o absoluto. Ou


nos baseamos nisso, ou não temos autoridade nenhuma em que basear-nos. Ou você
se submete completamente a essa autoridade, ou então a opinião de um homem é tão
boa como a de qualquer outro -e isso significa que você fica sem nenhuma
autoridade. Antes de você conseguir cingir seus lombos com a verdade, terá que vir
à Palavra de Deus como uma criança pequena, ou, para usar a palavra mais forte
que Paulo usa, terá que vir a ela como um “louco”. “Se alguém dentre vós se tem por
sábio neste mundo”, diz ele, “faça-se louco para ser sábio” (1 Coríntios 3:18); o que
significa: “Que trate de dizer que não sabe nada, que trate de dizer que a sua
filosofia não tem nenhum valor para ele, que trate de concordar que “o mundo não
conheceu a Deus pela sua sabedoria” e não pode conhecê-lO, e que, portanto, ele
não sabe nada e está disposto a dobrar os seus joelhos, a olhar para o alto e a
receber a revelação divina”.

Noutras palavras, se devemos cingir os nossos lombos com a verdade, não somente
temos que admitir que não sabemos nada, mas também que enquanto o Espírito Santo
não agir em nós e não nos der iluminação, não poderemos receber a revelação de
Deus. O homem natural não pode recebê-la; “mas Deus no-las revelou pelo seu
Espírito; porque o Espírito penetra todas as coisas, ainda as profundezas de
Deus” (1 Coríntios 2:10). Se você quiser cingir-se com a verdade, terá que vir como
criança, reconhecendo não somente a sua fraqueza, a sua insuficiência, a sua
incapacidade e a sua total impotência; terá que compreender que será preciso que o
Espírito de Deus opere em você, ilumine-o, purifique o seu entendimento e lhe dê
unção, antes de você poder receber a revelação que a Deus, por Sua graça, aprouve
dar-nos. Eis aí a autoridade - a revelação de Deus, revelação que podemos receber
e entender graças à operação do Santo Espírito de Deus em nós e sobre nós.

Você sabe onde está? Sabe contra o que está lutando? Como você encara o futuro?
Como você lida com a tentação, com o diabo e com toda a incerteza da vida hoje?
Aqui está a única resposta. Dê-nos Deus graça e forças para que tenhamos cingidos
os nossos lombos com a verdade!

V A = Versão Autorizada, inglesa (Authorized Version); ARC = Almeida, Edição


Revista e Corrigida; VR = Versão Revista, inglesa ( Revised Version); ARA
= Almeida, Edição Revista e Atualizada no Brasil. Nota do tradutor.

“Insights”, no original. Nota do tradutor.

Mantive as maiúsculas do original. Nota do tradutor.

David Martyn Lloyd-Jones era médico e exerceu a medicina antes de se dedicar ao


ministério da Palavra. Nota do tradutor.

“Spot diagnosis”, no original. Nota do tradutor.


A COURAÇA DA JUSTIÇA

“...e vestida a couraça da justiça. ” - Efésios 6:14

Até este ponto falamos sobre, “tendo cingidos os vossos lombos com a verdade”.
Esse é o fundamento de tudo, e interpretamos a palavra “verdade” como sendo toda a
verdade concernente à salvação, a grande mensagem da salvação, que, naturalmente,
é a mensagem peculiardeste livro que chamamos Bíblia. Mas, a seguir, temos de
revestir-nos das diversas peças da armadura, e agora vamos ver a peça que o
apóstolo descreve como “couraça da justiça”.

Permitam-me lembrá-los primeiro do que eu quero dizer com “vestir toda a


armadura” e depois “vestir as peças”, e ilustrar isso narrando o que aconteceu
quando a Grã-Bretanha tomou o Canadá dos franceses. A conquista foi realizada, em
certo sentido, na Batalha de Quebec, em 1759, quando o general Wolfe venceu o
general Montcalm; e, todavia, sabemos pela história que demorou décadas para que
se desse a tomada de posse daquela parte da América do Norte. Houve uma
batalha decisiva, a Batalha de Quebec, e daquele momento em diante o
Canadá tornou-se britânico; mas ainda havia bolsões de resistência que tinham de ser
enfrentados, e isso durou até a década de trinta do século dezenove, e só depois é
que se pôde dizer que a Coroa Britânica realmente havia tomado e agora possuía
aquele grande território. É quase o mesmo aqui. Começamos a vestir “toda a
verdade” - a nossa aceitação e o nosso entendimento de todo o plano da salvação.
No entanto, tendo-a vestido, somos ensinados por Paulo que é igualmente importante
que tenhamos claro entendimento quanto aos aspectos e aplicações particulares.
Quando estamos lidando com uma ilustração como a que o apóstolo está usando,
como quando 1 idamos com uma figura, com uma imagem, sempre devemos ter o
cuidado de lembrar-nos de que não passa de uma figura. O apóstolo está tratando de
algo puramente espiritual e, todavia, está falando de partes do corpo humano e do
que vestimos-coisas materiais que colocamos em diferentes partes. É uma figura
muito boa, porém devemos lembrar que ele está interessado no aspecto espiritual.
Estivemos, por exemplo, falando sobre os “lombos”. O apóstolo não está interessado
em nossos lombos físicos propriamente d itos, ele se refere aos

“lombos da mente”, como diz o apóstolo Pedro (1 Pedro 1:13, VA). Essa era a idéia
quando estivemos falando sobre os lombos, e é a mesma coisa, agora que chegamos
à couraça. Não devemos forçar demais as m inúcias. Mu ita confusão tem sido
causada pelos expositores por não entenderem este princípio, resultando em que eles
se tornaram muito mecânicos.

Digo isso por este motivo, que, ao passarmos a tratar da colocação da “couraça da
justiça”, lembramos que em 1 Tessalonicenses 5:8 o apóstolo diz: “Mas nós, que
somos do dia, sejamos sóbrios, vestindo-nos da couraça da fé e do amor”. Aqui se
trata da “couraça da justiça”. Aprendemos, pois, que não devemos ser demasiado
mecânicos nas interpretações, ou começar a pensar que o apóstolo está se contrad
izendo. A preocupação do apóstolo é no sentido de que compreendamos
a importância destes diferentes aspectos da nossa guerra espiritual, e
que compreendamos que Deus fez uma provisão especial para cada parte
em particular, bem como para o todo.

Mantenhamos em mente esse princípio. Ao mesmo tempo, porém, não se pode


duvidar de que há uma significação muito real na ordem em que o apóstolo coloca
estas peças da armadura. Ele começou pelo cinto para os lombos, como lembrei a
vocês, porque os lombos do corpo determinam a força do corpo. Eles formam o eixo
no qual todo o corpo gira, e portanto vocês devem começar por eles. Não somente
isso, o cinto prende, junta, firma e aperta tudo mais.

Passemos agora a considerar a couraça. A couraça que Paulo tem em mente é aquela
que nos tempos antigos era utilizada pelo soldado romano. Pode ser que ele
estivesse acorrentado a soldados à direita e à esquerda quando estava ditando a sua
Epístola; em todo caso, essa era uma figura muito conhecida no mundo romano
daquele tempo. Essa “couraça” geralmente ia da base do pescoço à parte superior
das coxas, cobrindo assim o que agora costumamos denominar tórax e abdome.
Esse é de fato o termo utilizado no grego, nesta passagem - o “tórax”. Mas também
cobria o abdome, a cavidade abdominal. Assim, Paulo está falando aqui sobre a
parte da armadura que é colocada sobre toda aquela parte que em geral pode ser
chamado de “tronco”. Esta é, evidentemente, uma parte importante desta armadura,
em vista das partes do corpo que ela cobre.

Primeiramente e acima de tudo, naturalmente, ali há o coração. Depois os pulmões.


Tanto um como os outros são vitais para a existência, para não mencionar a própria
vida. Depois vêm todos os diversos órgãos da cavidade abdominal. Hoje não lhes
atribuímos a mesma significação

que os antigos atribuíam. Os escritores bíblicos com muita freqüência se referem aos
diversos órgãos da cavidade abdominal. Lemos sobre os “rins” no 1 ivro de Salmos.
Também sobre “Entranhas minhas, entranhas minhas!”, exclamação de Jeremias
(4:19). E vemos um uso similar no Novo Testamento, nos escritos do apóstolo Paulo.
Na Epístola aos Filipenses ele diz: “Se, portanto, há alguma consolação em Cristo,
se algum conforto de amor, se alguma comunhão do Espírito, se algumas entranhas e
misericórdias” (2:1, VA). Os antigos acreditavam que estes diversos órgãos eram a
sede dos “afetos”, e eles atribuíam significação praticamente a todos eles. Num
sentido essa idéia persistiu. Fala-se de alguém que está “bilioso”, e assim por
diante; refere-se a uma disposição resultante das condições do fígado. Também
falamos de homens “descarregando a bílis”. Os antigos tinham consciência, quando
tinham vários sentimentos e sensações, de que havia algum tipo de referência local,
e assim deduziam que a causa de uma perturbação particular estava num órgão local
particular. Não importa se eles estavam certos ou errados, o importante é saber que
era assim que eles viam a questão. Portanto, o apóstolo, aqui, quando nos diz que
coloquemos a couraça dajustiça, está preocupado em que, neste conflito, neste
combate no qual estamos engajados contra o mundo, a carne e o diabo, não deve
haver parte com a qual sejamos mais cautelosos quanto à proteção do que onde
os sentimentos e os afetos são comandados. E não somente os sentimentos e afetos,
mas também a consciência, os desejos e a vontade.

Para os que gostam de termos que tais, isso é o que eu chamaria psicologia bíblica, e
é muito profunda. Aos escritores bíblicos era dada a iluminação do Espírito para
entenderem o homem e a personalidade do homem. O apóstolo Paulo sabiaque os
sentimentos e os afetos desempenham papel proeminente em nossa vida. O diabo
também sabe disso, e está pronto a manipulá-los, a usá-los para atender aos seus
perniciosos fins e propósitos. Assim, é preciso protegê-los com muito cuidado.

Igualmente a consciência, é claro. Que poderoso instrumento é a consciência!


Umadas maiores dificuldades da vida para todos nós é viver com a nossa
consciência. Não podemos 1 i vrar-nos dela; ela está aí, e está sempre falando. E de
novo, naturalmente, o diabo sabe disso, e está muito pronto, como veremos, a vir
atacar-nos na área da consciência. Há muitos que são mantidos cativos pelo diabo
neste ponto. Eles “vivem dias laboriosos”, como o coloca Milton, em grande parte
porque o diabo confunde as suas consciências, e eles não sabem como lidar com ele.
De algum modo deixaram de vestir a couraça dajustiça como deviam.

Depois há os desejos e a vontade. Aqui também está uma questão

muito complexa e complicada. Não há nada de errado com os desejos como tais. E
Deus quem nos dá os nossos desejos. Os desejos, em si, são bons; são uma parte da
vida, uma parte da nossa natureza e da nossa constituição. Todaviao que o diabo fazé
vir criar “desejos desordenados” (Filipenses 3:5, VA); ele inflama os desejos. Por
meio desses desejos a vontade é afetada. Assim é de suma importância que essa
parte da nossa vida, essa parte da nossa personalidade onde estão centralizados
estes fatores e forças vitais, seja protegida adequadamente.

Devo proteger estas partes que estive descrevendo, com a couraça da justiça. Aqui
também tem havido muita confusão. Há alguns que afirmam que o que se quer dizer
aqui com “justiça” é “retidão moral”. Vocês poderão ver que a “New English Bible”,
assim chamada, traduz o termo por “integridade” - devemos estar seguros da nossa
“integridade” pessoal, devemos ser homens de “retidão moral”, devemos
ser pessoas retas e boas. Esses mestres nos dizem que não teremos
nenhuma esperança ou possibilidade na luta contra o diabo e todos os
seus emissários, a menos que sejamos pessoas sinceras, a menos que tenhamos
integridade de personalidade inerente. É essencial, dizem eles, que não sejamos
culpados de hipocrisia, que não sejamos duas pessoas ao mesmo tempo, e que não
haja mentira no centro da nossa vida.

Não nos é possível aceitar “integridade” como a interpretação certa e adequada


aqui. E óbvio que não a rejeitamos por sermos opostos à integridade. A integridade é
essencial em toda parte. Vocês não poderão esperar fazer coisa alguma sem ela; mas
é de bem pouco valor quando estamos face a face com o d iabo. A integridade do
homem, em sua me lhor expressão, não passa de cera, diante do diabo. Se vocês
imaginam que, confiando em sua bondade, virtude e retidão moral inerentes,
podem resistir às astutas ciladas do diabo, vocês não passam de marinheiros
de primeira viagem nestas questões. Leiam as biografias de alguns dos maiores
santos que a Igreja conheceu, e verão que, quanto mais santos eles são, menos
confiantes se mostram em sua própria integridade, em sua bondade, em sua retidão
moral. Alguns dos maiores servos de Deus sentiram mais agudamente no fim das
suas vidas que tinham sido “servos inúteis” eque não tinham feito nada. Leiam a
autobiografia de um homem como André Bonar, e verão quão inúteis são a
integridade pessoal, a bondade e a retidão pessoal quando confrontadas pelas ci
ladas, investidas e insinuações do diabo.

A integridade não é uma “couraça” adequada para enfrentarmos os “dardos


inflamados” e todos os outros instrumentos e implementos que o diabo usa contra
nós. A integridade é boa, mas a integridade e a bondade

natural não é nada quando confrontada pelos ardis, pelas ciladas e pela astúcia do
inimigo que se levanta em oposição a nós. Ele poderá levar-nos a uma completa
condenação, se confiarmos em nossa bondade.

Com muita faci I idade eu poderia tornar-me advogado do d iabo, neste sentido. Se
você tende a orgulhar-se como cristão, leia algumas biografias cristãs, e logo
começará a perceber o que você é e onde está. Leia sobre Whitefield e os Wesley,
leia sobre Hudson Taylor e pessoas como ele, e por vezes começará a duvidar se
alguma vez você foi cristão. A integridade pessoal é insuficiente neste ponto. Ela não
é a armadura providenciada por Deus; e nós estamos interessados em “toda a
armadura de Deus”.

Permitam-me colocar diante de vocês o que me parece ser a única resposta


adequada. É evidente que necessitamos de umajustiça que nos seja dada por Deus. É
isso que nos é descrito, por exemplo, no capítulo três da Epístola aos Filipenses. Ali
o apóstolo expõe o assunto com muita clareza. Começa fazendo referência à sua
própria justiça natural, e diz: “Se algum outro cuida que pode confiar na carne, ainda
mais eu”. Se é que deve haver umacompetição em integridade pessoal ejustiça, diz
ele, estou pronto a entrar na competição. E ele tem uma base boa e firme
-“Circuncidado ao oitavo dia, da linhagem de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu
de hebreus; ...segundo ajustiçaque há na lei, irrepreensível”. Ele era um paradigma
de todas as virtudes! Ele podia levantar-se e desafiar todos os candidatos;
indubitavelmente, estava em primeiro lugar na lista. Ouçam, porém: “Mas o que para
mim era ganho reputei-o perda por Cristo. E, na verdade, tenho também por perda
todas as coisas, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo
qual sofri a perda de todas estas coisas, e as considero como escória, para que
possa ganhar a Cristo, e seja achado nele, não tendo a m inhajustiça que vem da lei,
mas a que vem pela fé em Cristo, a saber, ajustiçaque vem de Deus pela fé”. “A
couraça da justiça” refere-se à “justiça que vem de Deus”. É oriunda de Deus, feita e
preparada por Deus, dada a nós.

É issoqueeu quero, dizo apóstolo. E nisso que estou interessado; tudo mais é
“escória” e perda, é inútil, não é digno de menção. Eu pensava que a minhajustiça
pessoal era maravilhosa, diz ele, mas os meus olhos foram abertos e passei a ver que
ela não vale absolutamente nada. Vocês vêem, pois, como aprincípioo diabo tinha
derrotado completamente Paulo, como fez com todos os fariseus. Essa era a própria
essência da tragédia deles. Os fariseus eram homens muito bons. É um erro pensar
que eram maus. Jejuavam duas vezes por semana, davam o dízimo dos seus bens
aos pobres; eram piedosos e muito rei igiosos. O apóstolo Paulo, quando ainda

se chamava Saulo de Tarso, era fariseu, e se orgulhava disso. Mas passou a ver que
isso não era nada, porém o diabo o cegava. Vestindo a couraça da sua própria
integridade e justiça, estava totalmente derrotado. Conseqüentemente, não está mais
interessado em sua própria justiça e integridade; mas está interessado nesta outra
justiça. Somente esta pode defendê-lo; eis o que pode mantê-lo a salvo-“a justiçaque
vem de Deus pela fé”.

Querendo definir o que isto significa, não podemos fazer melhor do que aceitar a
definição desta “justiça de Deus que é pela fé”, definição que sempre foi ensinada
por aqueles que certamente foram os grandes mestres nesta matéria particular, os
reformadores protestantes e os seus nobres sucessores, os teólogos puritanos. A
medida que a Igreja os esqueceu, e esqueceu o ensino deles, ela se tornou vaga e
indefinida acerca deste assunto glorioso, e sofreu tantas derrotas às mãos do diabo e
dos poderes que ele comanda. Eles traçam uma cuidadosa distinção entre justiça
“imputada” e justiça “infundida”. Estamos vivendo numa época em que as pessoas
dizem que não entendem essas expressões. Algumas até eliminaram a palavra
“justiça” das suas traduções e a substituíram por “integridade” e “bondade”! Mas o
termo correto é “justiça”* e devemos esforçar-nos para aprender o seu
significado. “Mas não sabemos o que significa o termo “imputado”, diz o
cristão moderno. Decerto que não. E dever da pregação e da Igreja esclarecer bem
estas coisas. Não devemos esperar que as pessoas em geral saibam estas coisas
quando lêem a Bíblia, nem mesmo os cristãos instruídos. Por isso devem vir à igreja
e receber instrução, em vez de expressarem as suas tolas opiniões com relação a
estes assuntos. Quem jamais esperou que algum homem natural entenda estas
profundidades e imensidões?Todos nós, mesmo em nossas melhores e mais elevadas
condições, não passamos de principiantes, de aprendizes.

A “justiça imputada” é todo o fundamento da nossa posição como cristãos. Uma


expressão alternativa é “justificação pela fé”! Nem isso o homem moderno sabe o
que significa. Naturalmente que não! Mas é o que ele precisa saber. Ele é o que é
porque nada sabe sobre “Justificação pela fé”. Os homens poderão produzir novas
traduções da Bíblia até se cansarem, mas o homem natural continuará sem entendê-
la. É preciso que lhe seja ensinado o sentido, e ensinado não meramente com
palavras, porém pela “demonstração do Espírito”. É algo que clama pela iluminação
celestial.

“Righteousness”, no original. Nota do tradutor.

J ustificação pela fé significa “justiça imputada”, conforme a descreve Paulo em


Filipenses, capítulo 3. Esta é a justiça da qual temos que revestir-nos, diz Paulo. Por
melhor que seja a sua vida, seja o que for que você é, seja o que for que tenha feito,
quando comparecer à presença de Deus verá que você é um pecador sem esperança,
completamente condenado. “Ah”, dirá você, “mas eu pretendo viver uma vida
melhor, pretendo virar a página, pretendo começar a ler a B íbl ia, orar e fazer o
bem - pretendo fazer de m im um homem justo na presença de Deus.” Melhor seria
você parar imediatamnte, diz a Bíblia, porque você não conseguirá fazer isso. Se
você dedicasse toda a sua v ida a esse trabal ho, no fim estaria tão mal como no
princípio. Se você abandonasse o mundo e se tornasse monge ou eremita, isso não o
ajudaria.

Por que não? Porque “Deus sonda o coração” e porque o padrão de Deus é absoluto.
Deus não exige apenas um pouco de bondade. A exigência de Deus vem exposta
nestas palavras: “Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua
alma, e de todo o teu pensamento. Este é o primeiro e grande mandamento. E o
segundo, semelhante a este, é: amarás o teu próximo como a ti mesmo”
(Mateus 22:37-39). Esse é o padrão de Deus. Você pode ser altamente
moral, entretanto não é isso que Deus quer de você. Que é que o homem pode fazer?
A resposta é: não pode fazer nada. E essa é a primeira coisa que ele tem de aprender.
E essa é a única maneira pela qual poderá ser capaz de combater as insinuações do
diabo. O diabo pode submeter a suaj ustiça a exame; ele tem seus testes e padrões, e
pode ridicularizá-la, pode mostrar como elaéinútil.Quando você estiver se
pavoneando por sua v ida virtuosa, ele pegará um livro e lhe mostrará um homem
que sacrificou tudo. Você verá que não fez nada, que só deu o dinheiro que
pôde contribu ir, por assim d izer, somente deu aqu i lo que poderia facilmente dar-
se ao luxo de dar. Aí está um homem que deu tudo, e assim, aquilo de que você se
tem gabado e de que se tem orgulhado, torna-se escória em suas mãos.
Visto que nós nunca atingimos o padrão de justiça de Deus, Deus enviou Seu Filho
unigênito aeste mundo, paraque Ele pudesse dar-nos a Sua justiça. Ele veio, o
Filhode Deus, sem mácula, sem pecado, e prestou perfeita obediência à lei de Deus,
obedeceu-Lhe em cadajota e til da lei. Viveu uma vida perfeitamente justa. Mas,
mais do que isso; Ele Se fez responsável pelos nossos pecados, levou-os sobre o
Seu próprio corpo e foi crucificado por causa deles. “O Senhor fez cair sobre ele a
iniqüidade de nós todos”. Na cruz Deus feriu o Seu amado Filho porque Ele
levou sobre Si os nossos pecados. E, ao levantá-10 dentre os mortos no dia da

ressurreição, Deus nos proclamou que a morte de Cristo foi mais que suficiente para
satisfazer as Suas justas exigências.

A justiça imputada é definidaem 2 Coríntios 5:21: “Àquele que não conheceu


pecado, (Deus) o fez pecado por nós”. Noutras palavras, Deus tomou os nossos
pecados e os “imputou” a Seu Filho, colocou-os sobre Ele, colocou-os na conta
dEle. Esse é o significado de “imputação” -que você toma algo que pertence a uma
pessoa e o coloca na conta de outra. Um homem tem um débito; você apaga na página
em que está seu livro--razão e o anota na página de outro homem. Você “imputou” o
débito a outrem. Foi o que Deus fez com os nossos pecados. Ele imputou a Seu Filho
os nossos pecados e os puniu nEle.

Isso, no entanto, não esgota o significado do termo. Isso me deixa com os meus
pecados apagados; mas não é suficiente. Antes de eu poder permanecer na presença
de Deus, tenho que ser positivamente santo, tenho que ser positivamente justo. Deus
é reto, e justo e santo. “Deus é luz, e não há nele treva nenhuma.” Para eu permanecer
na Sua presença necessito ser positivamente reto e justo. E eis o que acontece:
quando eu creio no Filho de Deus e em Sua obra a meu favor, Ele “imputa” a
Sua justiça, a Sua perfeita observânciada lei, amim. Eu nãocuinpri a lei; Cristo a
cumpriu perfeitamente, e Ele é justo perante a lei. Deus põe em minha conta, imputa
a mim,ajustiça de Seu próprio Filho. Ele me veste com ela. Assim, quando
compareço à presença de Deus, Deus não me vê, Ele vê a justiça de Cristo me
cobrindo, vestindo-me completamente. É nisso que agora me regozijo, d iz o
apóstolo. “Na verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do
conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor; pelo qual sofri a perda de todas estas
coisas, e as considero como escória, para que possa ganhar a Cristo, e seja achado
nele, não tendo a minha justiça que vem da lei, mas a que vem pela fé em Cristo, a
saber, a justiça que vem de Deus pela fé” (Filipenses 3:8-9).

Salvação mediante “justiça imputada” significaque ajustiça perfeita de C ri sto é


posta em m inha conta, é imputada a mim, é posta sobre mim por Deus. E, olhando
para mim, vendo-me revestido dajustiça de Cristo, Deus me declara homem justo,
declaraque sou justo; e a lei não pode tocar em mim. “Portanto, agora nenhuma
condenação há para os que estão em Cristo Jesus” (Romanos 8:1). A lei não tem
nada que possa dizer contra mim porque estou coberto por esta perfeita e
imaculadajustiça do Filho de Deus, e trago sobre mim “a couraça dajustiça”.

Isso faz parte dajustiça, mas não é toda ela. Há também o que os puritanos chamavam
justiça“infundida”, e é igualmente importante que nós a compreendamos também. A
diferença entre justiça “imputada” e

“infundida” é que se fico só na justiça imputada, eu sou deixado onde estava antes.
Não possuo em mim nenhuma justiça inerente, embora esteja vestido e coberto pela
justiça do Senhor Jesus Cristo. Esse é o começo; é o que me faz cristão; é o
fundamento. No entanto, Deus não pára aí; Ele começa a operar em mim a justiça de
Seu Filho. Ele a “infunde” em m im, Ele a torna uma parte de m im, Ele a introduz em
mim. Isso acontece necessariamente como resultado do novo nascimento,
da regeneração, da nova vida. Há uma nova semente de vida “implantada” em mim.

A semente foi colocada em mim, e essa semente cresce e se desenvolve. E isso que
se quer dizer com a idéia de “infundir” justiça. “Transmitir” e “infundir” são os
termos geralmente usados para expressar esta ação divina. A justiça não somente é
colocada sobre mim como um casaco, uma coberta, mas também é “infundida” em
mim. E comparável a uma transfusão na qual o sangue de uma pessoa é posto
em circulação no sangue de outra. Os verbos podem ser “transfundir” ou “infundir”,
“injetar”, “transferir” - todos eles representam a mesma operação.

Eis como o apóstolo expressa a verdade aos filipenses: “De sorte que, meus amados,
assim como sempre obedecestes, não só na minha presença, mas muito mais agora na
minha ausência, assim também operai a vossa salvação com temor e tremor; porque
Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa
vontade” (2:12-13). Devemos “crescer na graça” e no conhecimento do Senhor.
Estas são diferentes maneiras de expressar “justiça infundida”. É importante que nos
lembremos disso, particularmente no contexto da matéria de que estamos tratando,
pois o diabo nos atacade várias maneiras. Ele não ataca apenas no que se refere à
nossa justificação, ataca-nos também na esfera do desejo e da vontade, na esfera dos
sentimentos. E o único modo de enfrentá-lo nestes pontos é “vestir a couraça da
justiça”. Esta é a justiça que nos protegerá nestes pontos sensíveis - o coração, a
consciência, o desejo, a vontade - onde este conflito prossegue sem cessar e o
diabo procura derrotar-nos.

A couraça da justiça ajuda-nos em primeiro lugar dando-nos um sentimento geral de


confiança, e isso é sempre essencial em nossa guerra. Se vocês entrarem neste
combate contra o diabo inseguros e hesitantes, já estão derrotados. Precisamos ter
confiança. Aqui estou eu, digamos, como soldado, e sei algo sobre o inimigo.
Examinei a distribuição das posições, descobri alguma coisa sobre as forças que ele
comanda, os armamentos que ele pode usar, e sei que as características dessas forças
são astúcia, fortidão e poder. Também estou ciente destes órgãos sensíveis dentro de
mim e que estão expostos ao seu ataque. Enquanto eu não tiver um sentimento de
confiança em que eles estão cobertos, não terei possibilidade de resistir e de estar
preparado para alguma investida que venha. Mas, tão logo que tenha esta couraça,
sei que tudo está bem.

Em certo sentido isto significa, pois, segurança da salvação; uma percepção da nossa
posição e situação. Esdras fez uma observação muito profunda sobre este assunto.
Ele estava dirigindo o povo de Deus num período muito difícil, depois de tudo ter
dado errado, e agora estavam começando a endireitar as coisas. Mas havia inimigos,
e Esdras (com Neemias), falando ao povo certa ocasião, disse: “A alegria do Senhor
é a vossa força” (Neemias 8:10). Sem a alegria do Senhor, somos muito fracos. “A
alegria do Senhor é a vossa força” - e essa é a força de que necessitamos. Vocês
somente poderão obter a alegria do Senhor quando se apropriarem desta verdade
concernente à “justiça de Deus que é pela fé” (quer dizer, ajustiçaque nos vem
mediante a instrumentalidade da fé). Essa justiça é de Deus, e nos é dada desta
maneira extraordinária. Noutras palavras, significaaconfiançaque surge do
conhecimento de que somos filhos de Deus.

Não existe nenhuma outra coisa que nos habi lite a ficar firmes contra o diabo. O
autor de certo hino expressa esta verdade perfeitamente. Ele tivera experiências
maravilhosas, sabia o que era aquecer-se ao sol da face e do sorriso de Deus, sabia
o que era derramar o coração em louvor e ação de graças, mas quando escreve este
hino, eis o que ele diz:

Não ouso confiar na mais doce disposição,

Mas de todo me apóio no nome de Jesus;

Em Cristo, a rocha sólida somente firmo os pés.

Outra base qualquer é areia movediça.

Essa é a verdade a respeito de todos os cristãos. Se nos firmarmos em qualquer


coisa que não seja Cristo, e Suajustiça, veremos que a nossa base é “areia
movediça”. Se vocês estiverem pondo a sua confiança em seus sentimentos ou em
seus caprichos e em suas disposições, acabarão vendo que não têm nada. É-nos dito
no livro do Apocalipse que “eles o venceram pelo sangue do Cordeiro e pela
palavra do seu testemunho” (deles) (12:11). Não há outro meio pelo qual vocês
possam vencer finalmente. João se refere ao assunto em sua Primeira Epístola,
capítulo 5:18-19: “Sabemos que todo aquele que é nascido de Deus não peca” -não
vi ve pecando, não peca habitualmente, não cai e permanece caído em

pecado - “mas o que de Deus é gerado conserva-se a si mesmo”. Isso pode


sertraduzido melhor por, “aquele que é nascido de Deus o guarda” (cf. ARA) - em
última análise, vem a dar no mesmo - “e o maligno não lhe toca”. Posto que você
está nesta posição, “o maligno não lhe toca”. “Sabemos que somos de Deus, e que
todo o mundo está no maligno.” Todo o mundo “está no maligno”, totalmente nas
garras dele. Mas não nós! Sabemos que somos de Deus! Fomos tirados,
“transferidos” do reino do diabo, e estamos revestidos da justiça de Jesus Cristo.
Não estamos nas garras do diabo, ele não pode tocar em nós, porque
somos protegidos pela “justiça de nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo”.

Você está pondo a sua confiança em sua própria justiça? Ou na “justiça de Deus que
é pela fé em Jesus Cristo”? Você sabe em que base está firmado neste momento?
Você tem debaixo de si esta rocha sólida? Você está confiando plenamente no Filho
de Deus e na Sua obra perfeita em seu favor? Se não é assim, você está sem a
couraça dajustiça, o que significa que vocêjá está derrotado pelo diabo.
Estaéaúnicajustiçaque nos vale, não somente quando vamos a Deus em oração, mas
também quando somos confrontados pelas astutas ciladas do diabo, e quando lutamos
contra os principados e potestades, contra os príncipes das trevas deste século,
contra as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais.

Vocês conhecem este anseio do apóstolo por um entendimento ainda mais perfeito e
por receber ajustiça de Deus que vem pela fé? Ele, acima de tudo, entendia
claramente a justificação, porém eisoquediz: “Não que já a tenha alcançado, ou que
seja perfeito”. O seu desejo é: “Conhecê-lo, e à virtude da sua ressurreição, e à
comunicação de suas aflições, sendo feito conforme à sua morte; para ver se de
alguma maneira posso chegar à ressurreição dentre os mortos”. Esta justiça de Cristo
que está sendo “transferida” a nós, finalmente nos levará à perfeição, “sem mácula,
nem ruga, nem coisa semelhante”. Seremos santos e inculpáveis, perfeitos e
completos, na presença de Deus. Acaso você está confiando nesta justiça que é dada
por Deus? Você sabe que ela foi imputada a você? Seria essa a sua tábua de salvação
- a justificação somente pela fé; estar revestido dajustiça de Cristo, e conformar-se
cada vez mais à Sua imagem bendita?

Jesus, Teu sangue e Tua justiça São meu fulgor e sobrepeliz;

Do mundo em chamas, com esse traje,

Minha cabeça alçarei feliz.

Já me absolveste do vil pecado,

E denunciar-me, quem ousaria? Livre do medo, da culpa e da vergonha, De pé


estarei em Teu grande dia.

Que agora os mortos ouçam a Tua voz; Alegra os Teus nesta dura liça;
Eis seu fulgor e sua bela veste: Jesus, Teu sangue e Tua justiça.

“A JUSTIÇA QUE VEM DE DEUS PELA FÉ”

"...e vestida a couraça da justiça. ” - Efésios 6:14

Passemos, agora, a considerar mais algumas maneiras pelas quais esta “couraça da
justiça” nos ajuda em nosso conflito com as astutas ciladas do diabo, e em nossa luta
contra os principados e potestades. Consideremos primeiro o modo como ela nos
protege na esferados nossos sentimentos e sensibilidades. Há muitos cristãos que,
por não terem vestido a couraça dajustiça, são muito infelizes; o diabo os “pegou” e
os derrotou simplesmente porque nunca souberam bem o que significa vestir a
couraça.

Refiro-me primariamente aos temperamentos e às variações em nossos sentimentos e


sensibilidades. Todos nós devemos ter descoberto há muito tempo que os
sentimentos vêm e vão; e, naturalmente, o diabo sabe muito bem disso. Assim, a sua
estratégia especial neste ponto é procurar fazer-nos confiar indevidamente em nossos
sentimentos, sensações e sensibilidades. Ele persuade muitos a basearem neles toda
a sua posição cristã. Tiveram alguns sentimentos maravilhosos em certa ocasião, e
basearam tudo nessa experiência. Ou podem ter tido sentimentos maravilhosos na
presença de Deus em oração, ou num culto, ou nalgum outro lugar; e puseram neles a
sua confiança. Depois, por uma razão ou outra, os seus sentimentos parecem tê-los
abandonado. Experimentam aridez e frieza; não sentem mais o que sentiram; e toda a
sua posição está abalada. O diabo lhes sugere que não são cristãos, que eles nunca
foram cristãos. A única coisa que lhes tinha provado que eram cristãos desapareceu,
e assim eles ficam sem nada.

O perigo surge porque os sentimentos constituem parte, na verdade uma parte vital e
essencial, da verdadeira experiência cristã. Sejamos claros quanto a isso. Se nunca
sentimos nada com relação à nossa fé, então não temos fé verdadeira. Não podemos
crer realmente nesta grandiosa salvação sem sentiralgo. O homem quetem real
conhecimento da verdade que estivemos descrevendo é alguém que se sente
profunda-

mente comovido por ela. Tem que ser assim. Não é possível aperceber-se
verdadeiramente da presença de Deus e não se comover.

Mas, desafortunadamente, o diabo vem e procura causar uma divisão da


personalidade humana; e o faz de várias e diferentes maneiras. Um meio que
particularmente ele usa é o seguinte: tendo o evangelho nos levado a ver que os
afetos, as emoções, devem estar envolvidos e devem ser “movidos”, ele exagera
deliberadamente esse elemento. Ele o pressiona, e quer fazer-nos acreditar que esta,
e somente esta, é a coisa que importa. E assim ele consegue que confiemos
exclusivamente em nossos sentimentos. Depois, naturalmente, quando por umarazão
ou outra eles de repente mudam - e há muitos motivos pelos quais isso
pode acontecer- ficamos sem coisíssima nenhuma.

Pois bem, é justamente aqui que a couraça da justiça é da máxima importância; na


verdade, neste ponto ela é a única proteção adequada. O piedoso homem que
escreveu em seu hino, “Não ouso confiar na mais agradável disposição”, escreveu
essas palavras porque sabia como são falíveis essas “disposições”, como costumam
chamá-las. É um termo muito bom. Falamos de “disposição da mente”. Bem, pode
ter-se uma “disposição” do sentimento e da emoção, dos afetos, exatamente
do mesmo modo. No momento não estou pensando particularmente nas pessoas
emocionalistas. O emocionalismo é sempre um mal, e os emocionalistas são, dentre
todas as pessoas, as mais iludidas pelo diabo. Refiro-me a pessoas que se deixam
levar a uma espécie de êxtase emocional, a um excesso de emoções. Isso pode ser
feito por meio do canto. Se você ficar cantando, elevar o tom, gritar e entrar num
certo ritmo, facilmente poderá entrar num estado altamente emocional. Não estou
pensando nisso agora. Isso não precisa receber atenção; condena-se a si mesmo.
Uma vez que um homem perca o controle dessa maneira, torna-se provável vítima de
qualquer mau espírito que acaso esteja por perto, esperando sua oportunidade. Estou
pensando, antes, em pessoas que não são assim, mas que, não obstante, tendem a ser
do tipo introspectivo. Tais pessoas preocupam-se muito com os seus sentimentos; e o
perigo que correm é o de colocarem os seus sentimentos em primeiro lugar e porem
neles a sua confiança. E por isso se vêem muitas vezes como o pobre William
Cowper clamando em agonia: “Onde está a bênção que outrora conheci, na primeira
vez que o Senhor eu vi?” Fora-se.

Essa é uma condição muito comum. Todo pastor, todo médico de almas, terá visto
isso com maior freqüência, talvez, do que qualquer outra coisa. Há os que lamentam:
“Não sinto mais nada; sentia, mas agora não”. Estão desanimados e abatidos, e
perguntam se são cristãos afinal.

Para tudo isso a resposta é: “Vistam a couraça da justiça”. É a única resposta.


Permitam-me, pois, completar a citação do hino.

Não ouso confiar na mais doce disposição,

Mas de todo me apóio no nome de Jesus;

Em Cristo, a rocha sólida, somente firmo os pés,

Outra base qualquer é areia movediça.

As suas mais elevadas disposições, os seus melhores sentimentos, podem ser


traiçoeiros, e podem abandonar você a qualquer momento; e então, tendo-se
desvanecido aquilo em que você se apoiava inteiramente, você se pergunta se é
cristão afinal. O único remédio é: “a couraça da justiça”. Embora devamos gostar
dos sentimentos, é preciso que eles sejam subservientes à nossa posição firmada
sobre a base da justificação somente pela fé, e disso devem resultar. É “a justiça de
Jesus Cristo pela fé” que me salva, não quaisquer sentimentos que possamos ter a
respeito.

Há uma inevitável ordem nestas questões. O subjetivo sempre deve seguir-se ao


objetivo. A tragédia é que muitas vezes há pessoas que colocam o subjetivo antes do
objetivo. Outras, naturalmente, fazem exatamente o oposto, e o diabo vem e lhes diz:
“Muito certo, é a única coisa que importa”. São tão objetivas que nunca sentiram
coisa alguma! E não são cristãs! O verdadeiro cristão é o homem definido em
Romanos 6:17: “Mas graças a Deus que, tendo sido servos do pecado,
obedecestes (pela vontade) de coração (afetos, emoções) à forma de doutrina a
que fostes entregues (mente).” Aí estão o intelecto, o coração e a vontade; e todos
eles têm que estar envolvidos, e nessa ordem.

Tenhamos consciência, então, da sutil tentação de colocar os sentimentos e as


emoções em primeiro lugar e de confiar no que sentimos quanto à nossa segurança
final da salvação. Os sentimentos nunca devem ser isolados como se pudessem ficar
sós. O modo de evitar isso é vestir “a couraça”, que é “a justiça de Deus em Jesus
Cristo”. Isso, e somente isso, pode livrar-nos dessa sutil tentação.

Depois, de maneira similar e estreitamente relacionada, temos toda questão da


“experiência”. Há diferença entre “sentimentos e emoções” e “experiências”. Às
vezes a nós, como cristãos, são dadas experiências notáveis e incomuns. Deus, em
Sua graça, no-las envia. Isso as Escrituras descrevem com freqüência. Deus, por
Seus motivos inescrutáveis, concede ao Seu povo algumas manifestações de Si
mesmo, algo que é completamente fora do comum, algo extraordinário e excep-

cional. Aqui também temos algo pelo que devemos dar graças a Deus. Mas aqui
também temos que ter o cuidado de vestir a couraça dajustiça, porque o diabo virá e
tentará fazer-nos confiar justamente nessas experiências.

Esse perigo é descrito no 1 ivro de Jó. Um dos amigos de Jó foi bastante eloqüente
sobre as experiências que sobrevêm à pessoa durante a noite. Sempre houve pessoas
assim na Igreja, pessoas que talvez tenham entrado na vida cristã de maneira
dramática. Tais pessoas falam sobre a visão de uma bola de luz, e da de um quarto
ser iluminado. Essas coisas podem fazer parte de uma experiência espiritual genuína;
mas podem não ser, e podem ser pura fraude. O perigo é que, se tais experiências
são concedidas a nós, teremos a tendência de basear nelas toda a nossa fé e toda a
nossa posição. E então, naturalmente, virá o diaem que, de súbito, por uma razão ou
outra, começamos a perguntar e a questionar tudo. Isso tem acontecido
freqüentemente. Há pessoas que tiveram essas experiências e puseram nelas a sua
confiança. Depois, pode ser que tenham lido algum livro no qual viram que pessoas
que obviamente nunca se
tornaram cristãstiveramexperiênciassemelhantes,eporissocomeçaramaduvidar de
tudo. Há os que falam sobre “ter visões do nosso Senhor”. Vocês devem ser um
pouco desconfiados nesse ponto, porque esse não é o método normal. E se não é o
método normal pelo qual Deus leva a alma à salvação, sejam sempre cautelosos,
pois o diabo pode propiciar falsas experiências, que não passam de imitações.

O princípio geral é que devemos ter o cuidado de não pôr a nossa confiança nessas
experiências. Não baseie tudo nelas. A história da Igreja dá eloqüente testemunho da
loucura dessa linha de ação. Há pessoas que parecem entrar na vida cristã mediante
alguma experiência estupenda que faz com que o restante de nós perguntemos se
alguma vez fomos cristãos, afinal. Vocês verão, porém, que depois de breve espaço
de tempo, muitíssimo freqüentemente elas tiveram um retrocesso; não sabem qual a
sua posição; e têm que ser trazidas de novo para a vida cristã pelos meios comuns e
normais. Nunca entenderam a doutrina dajustifi-cação pela fé, mas confiaram
inteiramente na experiência maravilhosa que tiveram. Graças aDeus pelas
experiências, todavia não ponham nelas a sua confiança. Não vistam “a couraça das
experiências”, mas sim, a couraça da “justiça”. Vocês devem compreender a única
base da sua permanência na presença de Deus, para que, na ausência de
algo incomum, dramático e extraordinário, não obstante, possam saber onde estão,
possam saber como estar firmes e como responder a tudo quanto o diabo sugira a
vocês.

Consideremos ainda, sob este título, a questão geral do desânimo. O desânimo é


utilizado com muita freqüência pelo diabo. O diabo sabe muito bem que o problema
final do homem é sempre o seu orgulho. É o orgulho que impede o homem de crer no
Senhor Jesus Cristo. A maioria dos que não são cristãos, particu larmente os
intelectuais, é incrédu la por causa do seu orgulho. Os homens sempre se recusaram
a dizer: “Vil, cheio de pecado eu sou”. Claro que não são! Não querem dizer que são
“desva-lidos” e que nada podem fazer. Estão convictos de que podem fazer muito, e
estão tentando fazê-lo. Confiam em sua própria moralidade, confiam no seu próprio
entendimento, em suas idéias, e em muitas outras coisas. Sua confiança nessas coisas
impede-os de se tornarem cristãos.

O orgulho é fundamental na natureza humana decaída, e o resultado é que, mesmo


quando entramos na vida cristã, e vemos inicialmente quão completamente errados
nós temos sido, e como a nossa “bondade” pessoal de nada vale, e comotemos de
confiarcom completa simplicidade e nulidade pessoal em Cristo e em Sua perfeita
obra em nosso favor -reitero, mesmo quando entramos na vida cristã, o diabo ainda
pode armar ciladas para nós. Ele procura levar-nos de voltaa uma sutil confiança
nas obras, em nós mesmos e em nossas atividades. Estamos vivendo a vida cristã,
somos ativos, estamos trabalhando arduamente e fazendo uma grande contribuição; e,
de maneira sutil, começamos a orgulhar-nos disso, a confiar nisso e a achar que,
afinal de contas, somos como somos por causa de todo o bem que temos feito desde
que nos tornamos cristãos! Sem saber, passamos a confiar em nossas atividades e
ações.

Essa é uma das maiores tentações com que se defronta o pregador, o ministro do
evangelho, o pastor de igreja. Mas, aplica-se a todos os cristãos. E se aplica
especialmente a certos tipos que são ativos por natureza. O diabo nos conhece muito
bem. Ele nos leva a esta situação, na qual pomos a nossa confiança em nossas
atividades e ações. Chega então a hora em que, por uma ou outra razão, as coisas
começam a correr mal, dificuldades e problemas surgem, mesmo em conexão com o
nosso trabalho cristão, talvez. Ou após um período de sucesso e bênção,
parece haver uma espécie de declínio, quando nada está acontecendo; e o diabo vem
e procura fazer-nos cair em depressão. Ele começa a fazer-nos sentir que nunca
fizemos nada, que tudo o que fizemos é apenas algo temporário e de nenhum valor
real; e, assim, todas as obras nas quais estivemos confiando, de repente parece que
não são nada. A conseqüência é que somos lançados nas profundezas da melancolia
e do desespero, e até nos perguntamos se alguma vez fomos cristãos. É uma
condição extraordinária. E muito comum entre os melhores obreiros, entre as

pessoas mais ativas na v ida cristã. Tudo parece chegar a uma estagnação; nada vai
bem; e o pobre homem que inconscientemente estivera confiando em sua atividade e
em suas obras, vê-se perdido, abalado e sem saber o que está acontecendo.

A primeira coisa que temos de aprender é que todo o bem que fizermos, e toda a
atividade em que nos empenharmos, não nos ajudarão no dia do juízo. Onosso
Senhor ensinou essa verdade. Os discípulos não conseguiram entendê-la, pelo que o
Senhor lhes disse, na parábola registrada no capítulo dezessete do Evangelho
Segundo Lucas, que, quando você tiver feito tudo o que puder, ainda terá que dizer:
“Sou um servo inútil” (Lucas 17:7-10). Essa é a única posição saudável para
o cristão. Todo e qualquer homem que compreender exatamente o que ele é, e que se
contrastar com alguns dos grandes santos que viveram antes dele, logo começará a
ver a sua nulidade.

Contudo, não deverá ficar abatido por causa disso. Sua situação eqüivale àquilo que
o apóstolo ensina aos coríntios, na Primeira Epístola, capítulo 3: “Porque ninguém
pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo. E, se
alguém sobre este fundamento formar um edifício de ouro, prata, pedras preciosas,
madeira, feno, palhas, a obra de cada um se manifestará; na verdade o dia a
declarará, porque pelo fogo será descoberta; e o fogo provará qual seja a obra de
cada um. Se a obra que alguém edifícou nessa parte permanecer, esse
receberá galardão. Se a obra de alguém se queimar, sofrerá detrimento; mas o
tal será salvo, todavia como pelo fogo”. Temos aqui o princípio determinante com
relação a isto - “o dia a declarará”. Mas, como estou sugerindo, às vezes o diabo nos
faz uma prévia visão desse dia, e nos faz examinar a nossa obra e ver o que temos
feito, e rapidamente nos convence de que não fizemos absolutamente nada. Assim,
caso você tenha estado confiando em suas obras, toda a sua posição entra em
colapso. A única resposta é esta - naquele grande dia, aconteça o que acontecer, e
ainda que toda a minha obra seja queimada, graças a Deus ainda estarei
salvo, “todavia como pelo fogo”. O que me salva é “o fundamento”, além do qual
nenhum outro pode ser posto, “Jesus Cristo”. É a couraça dajustiça que me sal va!
Portanto, quando eu pensar emmimeemmeu trabalho, na eternidade e no juízo, a única
coisa da qual posso estar seguro é a justiça de Jesus Cristo, que recebi pela fé.
Devemos manter sempre esta couraça da justiça, para que, quando o diabo quiser
desencorajar-nos, não o ouçamos, e possamos repeli-lo.

É evidente que existem muitas formas de desânimo. Háos que dizem: “Faz muito
tempo que estou na vida cristã; que é que eu tenho para

mostrar a respeito? Que é que eu fiz?” E o diabo os derruba, e eles começam a


duvidar que são cristãos. Não estou desculpando a negligência na vida cristã. Não
permita Deus que o diabo use até o que eu estou procurando dizer para desviar
alguém! Sei que ele está bem disposto a fazê-lo. Não estou incentivando a
indolência. Isso seria indesculpável. Mas o que estou salientando é que não devemos
ir ao outro extremo e pôr a nossa confiança em nossa atividade e nos sentirmos
felizes pelo que estamos fazendo. Para mim, um dos quadros mais tristes da vida
cristã hoje, e particularmente, talvez, entre os evangélicos, é o número de pessoas
que estão vivendo baseadas em suas atividades. Algumas até ficam com a saúde
abalada. É o diabo que as leva a viverem em função das suas obras! É um perigo
real. Finalmente, isso sempre acaba em fracasso. Há unicamente uma couraça - a
justiça de Jesus Cristo.

Vamos, agora, examinar este assunto em termos de um tipo geral de depressão


espiritual. Estive me referindo, é claro, a manifestações particulares da depressão
espiritual. Façamos um rápido exame da depressão espiritual geral. Não precisamos
tomar muito tempo para descrevê-la. Ela constitui um estado em que todo o teor da
vida espiritual da pessoa baixou. É como a temperatura que às vezes temos de
suportar - fria, tudo fica paralisado, sem nenhuma evidência da primavera e da vida.
Uma condição similar parece descer às vezes sobre a alma. Às vezes é muito difícil
diagnosticar com precisão como foi que isso aconteceu. Mas a pessoa se vê
simplesmente num período de aridez e sequidão, letargia e dormência. Muitos santos
deram testemunho disso.

Se vocês não têm nenhuma experiência disso, sugiro que fariam bem em examinar os
seus fundamentos. Ocorre essa espécie de variação na experiência espiritual, como
ocorre na vida física natural. Nem sempre uma pessoa se sente a mesma na vida
física; e isso ocorre igualmente na esfera espiritual. Vejo que as pessoas que nunca
sofrem variações são as que seguem as seitas, porque uma parte do seu ensino é que
não devem ocorrer varjações. Todavia, na vida espiritual vêem-se e se
conhecem variações. É “vida”, e onde quer que haja vida, tende-se a ter
variações. E, naturalmente, estamos no corpo, e por vezes a causa dessa
depressão pode ser puramente física. A depressão física pode levar à
depressão espiritual, e isso pode confundir as pessoas. Não nos lembramos
com facilidade de que o corpo, a alma e o espírito são relacionados intimamente.
Devido a você se sentir fraco, mole e letárgico no sentido físico, e por uma boa
razão física, o diabo talvez diga que tudo se deve ao seu estado espiritual. E assim
você começa a duvidar se alguma vez foi cristão, afinal.

Outras causas de depressão são as provações e as tribulações. Temos de enfrentá-las


neste mundo. O nosso Senhor teve que suportar “contradições dos pecadores contra
si mesmo” (Hebreus 12:3), e há pessoas que O odeiam e odeiam todos os cristãos, e
fazem tudo o que podem para nos confundir e desanimar. Basta que você leia o
capítulo quatro da Segunda Epístola aos Coríntios para lembrar-se disso. O apóstolo
estava sendo assediado por todos os lados. Dentro e fora da Igreja havia pessoas
tentando atingi-lo, derrubá-lo e frustrar todo o seu trabalho. E havia também o
aspecto físico. Diz ele: “Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a
excelência do poder seja de Deus, e não de nós. Em tudo somos atribulados” -de
todos os cantos ele estava sendo atacado, não podia ser pior - “mas não angustiados;
perplexos”

- ele não podia entender aquilo, indagando por que estava acontecendo

- “mas não desanimados; perseguidos, mas não desamparados; abatidos” - o


grande apóstolo! - “mas não destruídos; trazendo sempre por toda a parte a
mortificação do Senhor Jesus no nosso corpo, para que a vida de Jesus se manifeste
também em nossos corpos”.

O apóstolo Pedro descreve a mesma coisa. Ele estava escrevendo a certos cristãos
“dispersos” por várias partes do mundo, e eis o que ele lhes diz: “Em que” (falando
da grande salvação) “vós grandemente vos alegrais, ainda que agora importa, sendo
necessário, que estejais por um pouco contristados (“em prostração”, VA) com
várias tentações (provações)” (1 Pedro 1:6). Diz ele: ouvi dizer algo a respeito de
vocês; por isso lhes escrevo. Vocês estão se alegrando na grande salvação e
em Cristo Jesus, embora, por breve momento, “por um pouco”, por alguma estranha
razão, vocês estejam sendo contristados, estejam em prostração, com multiformes
provações, dificuldades e tribulações. São essas as condições a que os cristãos
frequentemente estão sujeitos.

Estas coisas podem vir com tal força, com força tão opressiva às vezes, que o pobre
cristão mal sabe onde está e o que está acontecendo. E o diabo o tenta e lhe diz:
“Você ainda crê? Você ainda diz que é cristão? Você ainda diz que Deus é um Deus
de amor?” Ele pode aparecer “como um anjo de luz” e dizer: “Claro, Deus é amor,
mas é óbvio que Ele não ama você, pois, se o amasse, não deixaria acontecer isso
com você, e você não estaria passando por essa experiência”. E assim você se
desanima, e vai para o fundo do poço. Você não consegue superar isso sozinho,
você se vê nesse estado de “prostração”, de depressão espiritual. Você não vê, não
entende, não sabe, não consegue explicar; e o diabo o está pressionando, forçando-o
a desistir, a abandonar tudo, porque “isso não tem valor nenhum”.

Só há uma defesa contra tais investidas: “a couraça da justiça”. Nenhuma outra coisa
pode ter utilidade para você neste ponto. Se você não tiver vestido esta couraça, o
diabo o fará duvidar, ou murmurar, ou queixar-se e dizer coisas pesadas contra Deus.
Você será como o homem do Salmo 73, que disse: “Pouco faltou para que
escorregassem os meus passos”. Por pouco não disse: “Na verdade é em vão que
tenho purificado o meu coração”. O que o salvou foi que ele entrou na casa de Deus.
Essa é outra maneira de dizer “tendo vestida a couraça da j ustiça”. A única
esperança está em dizer: “Bem, eu não entendo; no entanto, há certas coisas das
quais estou seguro, aconteça o que acontecer”. Isso é vestir a couraça da justiça.

Para expressá-lo com palavras do Velho Testamento: “Descansa no Senhor, e espera


nele” (Salmo 37:7). Quando você não entender; quando estiver realmente perplexo,
como o apóstolo estava; quando tudo estiver contra você, para “levá-lo ao
desespero”, “Descansa no Senhor, e espera pacientemente por ele” (VA). É a única
coisa que você pode fazer, mas é uma coisa maravilhosa para se fazer. Por esse meio
você veste a couraça dajustiça, e no momento em que o fizer, estará protegido e em
completa segurança, muito embora não entenda o que está acontecendo. Ou veja a q
uestão nos termos da declaração do apóstolo em Romanos: “Sabemos que todas as
coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus” (ARA). Ele não diz: “Nós
entendemos isso”. Diz ele que nem sempre entendemos como as coisas operam,
porém “Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a
Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito”. Isso leva
você diretamente à justificação pela fé, à justiça de Jesus Cristo. Descanse nisso; é a
única coisa que lhe cabe fazer. Toplady o expressa da seguinte maneira:

A obra que a Sua bondade começou O braço da Sua força a completará;

Sua promessa é “sim ” e “amém ", e a cumprirá,

Pois continua válida e nunca falhou.

Você não pode entender os acontecimentos particulares, não pode dar nenhuma
explicação. Tudo o que você sabe é que está confiando completamente neste glorioso
propósito de Deus em Cristo. Esse é simplesmente outro modo de obedecer à
injunção: “Vista a couraça da justiça”. Você pode dizer a si próprio: “Já a vesti; e,
portanto, sei que Deus Se interessa por mim; Ele nunca me daria isso, nunca me
vestiria

com isso, se não me amasse e não me salvasse. Devo ter coragem. Não sei o que está
aconteceno comigo agora, não posso compreendê-lo; mas isto eu sei: se Ele começou
a Sua obra em mim, Ele a continuará até completá-la”. Portanto, podemos dizer:

Nem as coisas futuras, nem as do presente,

Nada do que haja embaixo, e do que em cima exista,

Podem fazer que do Seu plano Ele desista,

Nem minha alma cortar do Seu amor ingente.

O diabo pode estar tentando convencê-lo de que você foi cortado de Deus — se é
que alguma vez você estêve ligado a Ele - e de que estas coisas estão provando que
a sua união com Deus é impossível. Mas você possui a couraça da justiça, e nada
pode penetrá-la. Vista-a! Lembre-se das palavras que talvez você cante às vezes:

Em todo tempestuoso e forte vendaval,

Firme está a minha âncora, além do véu.

Vocês têm experiência disso? Graças a Deus por isso. Estas são diferentes metáforas
que dizem a mesma coisa. Sou como um pequeno navio, um pequeno barco em pleno
Atlântico, e irrompe uma terrível tempestade; os vagalhões rolam, o vendaval ruge
sobre mim, o meu frágil barco é jogado para cá e para lá, e eu sinto que a qualquer
momento posso afundar. Não, nunca! “Em todo tempestuoso e forte vendaval, firme
está a minha âncora, além do véu.” É a âncora de Cristo. Ele é “o precursor, que
entrou em nosso lugar”. Sua justiça está sobre nós, e nada jamais poderá tocar em
nós. Vista a couraça da justiça, não importa o que possa acontecer-lhe, mesmo a pior
tempestade que se possa imaginar. E o que o protegerá; é a única coisa que poderá
fazê-lo.

Permitam-me, pois, fazer um sumário de toda esta seção, relacionada com os


sentimentos e as sensibilidades, transcrevendo um hino que infelizmente não consta
em muitos hinários modernos, embora esteja em muitos hinários antigos:

No fulgor da alegria e nas nuvens da dúvida,

Os nossos sentimentos vêm e vão;

O nosso melhor bem é sacudido Pelo fluxo e refluxo que não cessa;
Sei que emoção alguma ou pensamento Nem um dia sequer será constante;

Porém Tu, Senhor, sim, sei que não mudas;

Sempre o mesmo Tu és.

Apreendo o Teu poder, faze-o meu,

Meu coração tem paz;

Se solto a mão, trevas me sobrevêm E frio desassossego.

Não me deixes tirar o meu conforto Da minha frágil mão a segurar-Te;

Só nisto eu me alegro, com temor -Tua mão me segurando.

Deixando o impulso débil e intranqüilo,

Que vem somente para logo ir-se,

A pureza do céu então me elevo,

Onde imutável Tu, Senhor, estás.

Segura-me com Tua forte mão.

Oxalá o Teu braço poderoso Minha fraqueza prenda em seu amplexo;

E mal nenhum temerei.

Teu propósito, que é o bem eterno,

Faze-me conhecer com segurança;

Nisso me apoiarei - meus mutáveis caprichos E sentimentos venham ou vão -Alegre


se o Teu sol enche a minha alma,

E não perdido quando as nuvens tudo cobrem,

Desde que Tu, em Teu firme domínio De amor, bem me segure.

Esse hino é uma gloriosa expressão do que significa vestir a couraça dajustiça. E se
não soubermos vesti-la, inevitavelmente seremos derrotados pelo diabo num ou
noutro destes pontos que mencionei. E há muitos outros. Os meios e métodos pelos
quais o diabo vem são quase intermi-
Prefiro sacrificar a métrica e as rimas, para preservar, quanto possível, o
pensamento. Nota do tradutor.

náveis. E só há uma resposta-Cristo! Cristo em mim! A justiça de Cristo sobre mim!


Toda a minha relação com Ele!

Nem o inferno, nem coisa alguma podem penetrar ajustiça de Jesus Cristo. Vistam-
na! “Tendo vestido a couraça da justiça.” Assim, seja qual for a investida, e seja
qual for a forma que ela acaso tome, sabemos que estamos absolutamente seguros, e
finalmente “nada nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus
nosso Senhor”. Deus colocou sobre nós “ajustiça de Jesus Cristo”. E você, ponha
sobre si “a couraça daj ustiça”, lembrando-se desta verdade e pondo a sua
confiança total e exclusivamente nela.
VESTINDO A COURAÇA

“...vestida a couraça da justiça. " - Efésios 6:14

Em nosso estudo anterior da “couraça da justiça” vimos que o uso da couraça dá-nos
um senso geral de confiança e de certeza confirmada. Essa é uma das grandes
vantagens de vestir esta armadura - você se sente melhor no momento em que a veste.
Você não se sente exposto como antes; você está preparado, pode confiar na proteção
queela lhe dá. Isso é deveras maravilhoso - certeza da salvação em geral!
Depois consideramos como necessitamos ser protegidos no domínio dos
nossos sentimentos e emoções, que são tão variáveis, e vêm e vão! Há somente uma
proteção, a saber, “a justiça de Cristo”. Não a nossa integridade, mas “a justiça de
Deus que é pela fé, mediante Jesus Cristo”. “Imputada!” “Transferida!” A
justificação pela fé! Sim, e o desenvolvimento dela - a santificação! E ela é a única
defesa contra os nossos caprichos, disposições e sentimentos variáveis; contra o
desânimo, a depressão, e tudo o que o diabo procura introduzir em nós com o fim de
desfigurar a nossa experiência e arruinar o nosso trabalho. Estivemos
considerando isso tudo.

Sim ilarmente, a couraça da justiça é absolutamente essencial como proteção contra


as acusações do diabo, que as Escrituras descrevem como “o acusador dos irmãos”.
Ao mesmo tempo, ele é também “o adversário”. Não somente nos acusa a Deus,
porém também nos acusa a nós mesmos, e é essencial que saibamos defender-nos
dós seus ataques.

A Bíblia contém muita instrução a esse respeito. Satanás atacou todos os patriarcas e
os santos do Velho Testamento; especialmente Davi, talvez; e igualmente atacou os
santos doNovo Testamento. Há na história da igreja, nas biografias dos santos, muita
informação sobre como eles sofreram e suportaram asacusaçõesdo diabo. A vida
cristã é “o combate da fé”! Não nos é prometida uma vida de comodidade e repouso.
Não somos levados passivamente, digamos assim, para o céu. Esseé um falso ensino
das seitas. Nós experimentamos “o combate da fé”! Enfrentamos o adversário! O
acusador! Ele está sempre nos ameaçando; e faz as suas terríveis acusações contra
nós.

Observemos algumas das maneiras pelas quais ele o faz. Ele o faz, acima de tudo,
quando procuramos orar a Deus. Buscamos a Deus em

oração, talvez por alguma necessidade, ou talvez por sentir o desejo de fazê-lo; e no
momento em que dobramos osjoelhos, o diabo começa a agir. O que ele faz é
insinuar que não estamos em condições de orar a Deus. Ele nos faz lembraranossa
indignidade, a nossa pecaminosidade, revolve, talvez, de um passado distante e
obscuro, algo que fizemos, e o desfralda diante de nós. Depois, fazendo-se anjo de
luz, ele nos fala da grandeza e da glória, da majestade e da santidade de Deus, e diz:
“Como é que uma pessoa como você pode orar a Deus? Que acesso, que entrada, um
verme assim tão miserável, tão pecador, pode ter àquela glória sempiterna? Deus é
luz, e não há nEle treva nenhuma; Seu semblante é tão puro que Ele não pode sequer
olhar para o pecado, e aí está você querendo entrar à presença de Deus!” O diabo
ridiculariza a coisa toda e mostra como essa pretensão é total e completamente
impossível.

Vocês jamais serão capazes de argumentar com o diabo naquela situação. Ele os
derrotará o tempo todo. Ele nos conhece bem; ele tem um registro do nosso passado;
ele conhece o nosso presente; ele sabe tudo a nosso respeito - e, como digo, ele pode
falar-nos acerca de Deus. Há somente uma maneira de resistir aos seus ataques, e
essa é, “vestir a couraça da justiça”.

O que isso tem em vista neste ponto é a aplicação de algo que já estivemos
considerando; significa total e absoluta confiança no Senhor Jesus Cristo e S ua j
ustiça. O objetivo em vista é a aplicação ao nosso caso e às nossas condições da
gloriosa doutrina dajustificação somente pela fé. Fora daí não há nenhuma esperança.
Quem não tiver claro entendimento desta doutrina, já está derrotado pelo diabo.

Permitam-me oferecer-lhes algumas ilustrações de como isso funciona. O único


modo de responder ao diabo, quando ele vem daquela maneira, é dizer; “Sendo,
pois, justificado pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; pelo
qual também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes” (Romanos
5:1-2). Essa é uma resposta final, conclusiva, completa, porque toma a base debaixo
dos nossos pés. Ele nos fizera lembrar a nossa pecaminosidade e a
nossa indignidade. Mas depois, quando você cita estes dois versículos, em vez de se
sentir amedrontado por essas acusações do diabo, você lhe diz: “Você não me
intimida d izendo isso, eu sei a respeito tanto quanto você”. E, falando dessa
maneira, você já o derrotou. Naturalmente, se você não entende a justificação pela
fé, ele já o derrotou. Contudo, se você a entende, pode dizer-lhe: “Eu nunca pretendi
ir à presença de Deus baseado em minhajustiça; não alego diante dEle minha vida
virtuosa ou

minha excelência pessoal. Você está certo, não há o que discutir nesse ponto. Se você
falar mais ainda contra mim, se tentar condenar-me ao mais horrível inferno,
concordarei. A m inha integridade não foi a base da minha aproximação a Deus. O
meu acesso a Ele está baseado no Senhor Jesus Cristo, “pelo qual também temos
entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes”. Tudo se acha nesta bendita
Pessoa. Esse é um dos sentidosdo uso da “couraça da justiça”! Quando o diabo vier
com as suas acusações, acabemos com ele dessa maneira.

Mas não se contente com uma citação somente, quando estiver 1 idando com o diabo.
Aniquile-o completamente, arremesse muitos textos nele. Leve-o a Hebreus, capítulo
4 e leia, ou recite, para ele os versículos 14 e 16: “Visto que temos um grande sumo
sacerdote, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firmemente a
nossa confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se
das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas
sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da graça, para que possamos
alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno”.
Diga ao diabo que você está confiante em Cristo, o nosso grande sumo sacerdote,
Jesus, o Filho de Deus. Ele é o nosso representante! Ele é o nosso sumo sacerdote,
Ele morreu pelos nossos pecados! Sim, precisamos ser tratados com misericórdia! E
sabemos que o seremos, porque Ele está no trono da graça.

Então o diabo diz: “Ah sim, mas ouça-me um pouco mais. Deus está no trono, Deus é
o Juiz, e aí está a lei de Deus. Vocêjá considerou a Sua justiçae todas as Suas santas
exigências?” Replicamos: “Concordamos que Deus é todo-poderoso e eterno, e que
Ele está no trono. No entanto, sabemos que para nós o trono se tornou trono da
graça”. “Como vocês sabem que é trono da graça?”, pergunta o diabo. A nossa
resposta é: “Lá está Alguém sentado à destra do Juiz, e Ele é o nosso grande
sumo sacerdote. Ele satisfez todas as exigências da lei, e Deus reconheceu
isso, ressuscitando-o dentre os mortos-Jesus, o Filho de Deus! Ele cruzou os céus e
está sentado ali”. Por isso podemos ir a Deus com ousadia e confiança, apesar de
sermos o que somos. O nosso Senhor sabe o que é ser tentado. Ele esteve aqui em
carne, Ele entende tudo; e lá está Ele a nosso favor. Assim é que podemos chegar
“com confiança ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar
graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno”. É a mesma resposta outra
vez. Usamos esta “couraça da justiça”. Jesus Cristo! É a Sua justiça que é colocada
sobre mim, e essa justiça é suficiente para todas as minhas necessidades.

Demos, porém, outra resposta ao diabo. Vamos ao capítulo dez de Hebreus,


começando no versículo 19: “Tendo, pois, irmãos, ousadia para entrar no santuário,
pelo sangue de Jesus, pelo novo e vivo caminho que ele nos consagrou, pelo véu,
isto é, pela sua carne, e tendo um grande sumo sacerdote sobre a casa de Deus,
cheguemo-nos com verdadeiro coração, em inteira certeza de fé, tendo os corações
purificados da má consciência”. O diabo estivera revivendo essa “má consciência” -
levando-a a condenar-nos - da maneira que indiquei; e não podemos contestá-
la. Sabemos que o que ela testifica contra nós é verdade. Mas a consciência pode ser
purificada, e o foi! Ela recebeu a aspersão do sangue de Jesus Cristo, e o “nosso
corpo” foi “lavado com água limpa”. Este é tão-somente um modo gráfico e muito
dramático de reafirmar esta gloriosa doutrina dajustificação somente pela fé.

Para mais uma citação, vejamos 1 João 3:21: “Amados, se o nosso coração não nos
condena, temos confiança para com Deus”. Há somente um modo como isso pode
acontecer. É como devemos sempre buscar o trono de Deus. É vestindo a couraça da
justiça. Deixemos que Toplady o resuma para nós:
A misericórdia devedor,

Eu canto do pacto a mercê;

Sem temor, tendo a Tua justiça,

Oferta eu trago, e o meu ser.

De Deus e a lei o seu terror Já não me atinge, pois me cobrem,

A obediência de Cristo e Seu sangue.

Não sou nada, não sou ninguém; e a minha pequena oferta, que é? Mas está tudo bem:
“Sem temor, tendo a Tua justiça, oferta eu trago, e o meu ser”. Portanto, quando o
diabo vem e procura me desencorajar, e me diz que não estou apto para orar, é dessa
maneira que eu o rechaço.

A pergunta prática que se nos apresenta é: estamos usando esta couraça neste sentido
como devemos? Ainda existem muitos cristãos que nunca tomam parte nas orações
públicas, porque se dizem indignos e ineptos para isso. Essa é uma razão muito boa,
e muito errada. Você entende claramente a justificação pela fé? Porque você fala
tanto em sua inaptidão? É da couraça da justiça que você necessita! Nenhum de nós é
apto. Quem sou eu, para levantar-me num púlpito para expor esta santa Palavra e
para dirigir orações públicas? “Quem é suficiente para estas coisas?” Temos que
vestir esta bendita couraça, a justiça de Jesus Cristo.

Por si próprio você nunca será apto para entrará presença de Deus. Ainda que se
torne monge ou eremita ou anacoreta, e se segregue do mundo, e jejue, sue e ore,
você não terá acesso à presença de Deus, a não ser pelo sangue de Jesus. Não há
outro meio pelo qual entrar. Contudo, em Cristo você tem acesso, você pode “ficar
firme” nesta graça, você pode chegar lá com ousadia, confiança e certeza. E pelo Seu
sangue! “Pelo novo e vivo caminho”!

Nunca foi mais necessário que hoje saber algo sobre essa ousadia! Nunca houve
tanta necessidade de oração. Vejam o mundo! Vejam a Igreja! Vocês intercedem por
eles? Vocês se preocupam com a desesperada condição em que se acham as almas
dos homens e das mulheres? Por que não oramos mais? Às vezes penso que é porque
o d iabo nos impõe derrota neste ponto, e nunca soubemos o que é “vestir”, desta
maneira, esta couraça da justiça que Deus providenciou para nós.

Passemos agora ao segundo método de ataque - as acusações que o diabo nos faz
quando caímos em pecado. Faz parte da nossa
doutrina oensinoqueocristãopodecairem pecado! Não há nenhum perfeccionismo no
Novo Testamento. Somos salvos, porém ainda somos falíveis. A “velha natureza”
continua ali - não o “velho homem”, mas a “velha natureza”. E, enquanto essa velha
natureza estiver em nós, estaremos sempre sujeitos a pecar, e de fato caímos em
pecado. Então vem o diabo e tenta levar-nos a um sentimento de total condenação e
de completo desespero. Diz ele: “Você creu no evangelho. Muito bom! Mas
naquele tempo você era ignorante, não tinha conhecimento! Agora tem, e, portanto,
agora você pecou contra a luz. Antes havia aquela excelente, adequada e suficiente
desculpa da ignorância. Todavia você não pode mais alegar isso - porque, como
filho de Deus, você pecou, e agora não há esperança para você”. E assim ele atira
em nós essa acusação, e nos diz que perdemos o direito ao amor de Deus. Ele não
faz isso somente na questão dos pecados públicos, abertamente cometidos; pode ser
que Deus esteja Se manifestando a nós e nos esteja conduzindo, mas nós
desobedecemos, pomos em primeiro lugar os nossos desejos e a nossa comodidade.
Então vem o diabo e nos atormenta, dizendo-nos que não pode haver perdão para
essa conduta, pois pecamos contra a luz.

Há ainda muita coisa que também se poderia citar com relação a este aspecto do
assunto; porém, a resposta fundamental a isso, como à primeira acusação, continua
sendo a couraça da justiça. Esta é sempre suficiente e nunca nos falhará. A Primeira
Epístola de João parece escrita especialmente para estas condições.No capítulo
primeiro, começando no

versículo 6, lemos: “Se dissermos que temos comunhão com ele” (que é luz, e em
Quem não há treva nenhuma), “e andarmos em trevas, mentimos, e não praticamos a
verdade. Mas, se andarmos na luz, como ele na luz está, temos comunhão uns com os
outros, e o sangue de Jesus Cristo, seu Filho, nos purifica de todo o pecado”.
“Purifica” é o tempo contínuo. Quer dizer que o sangue de Cristo continua a
purificar-nos. E então, “se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a
nós mesmos, e não há verdade em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel
e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça”. E ainda, nos
dois primeiros versículos docapítulo dois: “Meus filhinhos, estas coisas vos
escrevo, para que não pequeis; e, se alguém pecar, temos um Advogado para com o
Pai, Jesus Cristo, o justo. E ele é a propiciação pelos nossos pecados, e não somente
pelos nossos, mas também pelos de todo o mundo”. Isso é tão claro e tão explícito
como nada mais o poderia ser; e, todavia, estou certo de que já tive que citar
estes versícu los em meu gabinete possivelmente mais vezes do que quaisquer outros
versículos da Bíblia toda. Isso mostra que o diabo consegue persuadirmuitos, neste
ponto, de que não há esperança para eles. Ele lhes diz: “Não adianta orar; vocês não
têm o direito de aproximar-se de Deus. Certamente vocês serão uns canalhas, se
voltarem a Deus para pedirem perdão depois de cometerem esse pecado, ou depois
daquele fiasco, ou depois daquela desobediência. Vocês não terão vez, vocês
pecaram contra a luz, e não há esperança nenhuma para vocês”. Assim, são mantidos
na escravidão, no desespero e em completa desesperança, e com complexo de
abandono, sentimentos que são os inevitáveis concomitantes do erro de dar ouvidos
ao diabo neste ponto. É óbvio que eles não compreenderam a significação destes
versículos da Primeira Epístola de João, porque aí eles têm a resposta completa aos
seus temores. “Se alguém pecar... Se confessarmos os nossos pecados, Ele é fiel
ejusto para perdoá-los.”

O apóstolo João expressa o assunto dessa maneira porque quer que entendamos que
a nossa relação com Deus é de natureza legal. Deus sempre age de acordo com a Sua
lei. Por isso os tolos que consideram incompatíveis as idéias da ira de Deus e do
amor de Deus, ou da justiça e da misericórdia de Deus, estão negando as Escrituras.
O amor de Deus não é sentimental. E simplesmente amor, amor santo, amor que
se harmoniza com a lei. “Ele é fiel ejusto”! Deus estabeleceu um meio pelo qual Ele
pode, com justiça, perdoaro pecado em que o crente caiu. Ouso ir além e dizer que
acredito que isso significa que quando eu O busco penitente e contrito, e com o
coração quebrantado pelo que fiz, se Ele não

me perdoar não estará sendo justo, não estará sendo fiel à Sua palavra. Ele ofereceu
o Seu Filho como “propiciação”, e eu O busco alegando esse fato. Deus -digo isto
com reverência- não poderá recusar você, se você O buscar confessando o seu
pecado, sinceramente arrependido e se entregando inteiramente ao seu amado
Senhor, que morreu por você e ressuscitou para a sua justificação. Esse é o
argumento de João.

Vocês verão o mesmo argumento, igualmente claro, em Romanos 8:1, que contém
uma das mais majestosas declarações daBíblia sobre este assunto. O apóstolo
estivera desenvolvendo esta grande doutrina da justificação pela fé, particularmente
nos quatro primeiros capítulos; mostrara, a seguir, no sumário do capítulo 5, algumas
das inevitáveis conseqüências. Depois, nos capítulos 6 e 7, tratara de duas
objeções óbvias ao que ele tinha acabado de dizer; e, tendo concluído isso, ele
diz: “Portanto, agora nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus”.
Agora não há condenação nenhuma, jamais haverá, jamais poderá haver, nenhuma
condenação no futuro. Lembrem-se de que o cristão, como o apóstolo demonstra
fartamente, está fora da esfera da lei. Ele está “morto para a lei”, “morto para o
pecado”. Como pode, então, haver condenação? Nada pode condenar o crente. Ele
está em Cristo Jesus! O cristão precisa compreender que está nesta nova relação
com Deus, que ele foi tirado inteiramente da esfera da lei e da condenação -da “lei
do pecado e da morte”. “A lei do Espírito de v jda, em Cristo Jesus, me livrou da lei
do pecado e da morte” (versículo 2). À lei que leva à morte e à condenação foi dada
plena resposta e satisfação, e, no que se refere ao cristão, ela foi removida.

Devemos aprender a perceber e entender o que a justiça de Jesus Cristo nos faz. Ela
nos cobre. Deus a colocou sobre nós, e sobre nós ficará para sempre. “Mas
certamente”, dirá alguém, “essa é a pregação do puro antinomismo. Virtualmente
você está dizendo: “Vá em frente, e peque quanto quiser, estará tudo bem com você”.
Foi justamente essa a acusação feita contra o apóstolo Paulo. Seus críticos diziam:
“Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja a graça
mais abundante?” (Romanos 6:1, ARA). “De modo nenhum”, responde Paulo. “Se
você diz isso, é porque não entendeu o meu ensino.” “Nós, que estamos mortos para
o pecado, como viveremos ainda nele?”

Noutras palavras, o que temos de compreender, em todos os pontos e sempre, é que a


nossa posição nunca se baseia em nossas ações ou em nossa bondade. Devido nos
incl inarmos a pensar que essa é a nossa base, então quando caímos em pecado
dizemos: “Está tudo perdido!” - e por isso damos ouvidos ao diabo quando
apresenta as suas acusações contra

nós. Obviamente, pusemos a nossa confiança em nossa bondade, em nossa] ustiça.

O liso da couraça da justiça é a nossa única segurança. Mantenha-se vestido com


ela! E quando o diabo vier e disser: “Você não tem como permanecer nessa posição,
você está condenado, você está acabado”, deverá responder: “Não! A minha posição
não depend ia do que eu estava fazendo ou não fazendo; ela depende sempre da
justiça do Senhor Jesus Cristo”. Vire-se para o diabo e diga-lhe: “A minha relação
com Deus não é variável. Não é que eu sou filho de Deus um dia, e não sou filho de
Deus no dia seguinte; depois torno a ser filho de Deus e, a seguir, de novo não sou
filho de Deus. Não é essa a base da m inha posição; não é essa a minha situação.
Quando Deus teve misericórdia de mim, fez-me Seu filho, e continuo sendo Seu
filho. Um filho pecadore muito indigno, talvez, mas ainda Seu filho! E agora que eu
caí em pecado, não pequei contra a lei, pequei contra o amor. Como o filho pródigo,
voltarei ao meu Pai e Lhe direi: “Pai, já não sou digno de ser chamado seu filho”!
Mas Ele me abraçará e me dirá: “Não diga esse absurdo, você é Meu filho”,
e derramará o Seu amor sobre m im”. É isso que significa vestir a couraça da justiça!
Nunca permita que o diabo o faça entrar num estado de condenação. Nunca permita
que um pecado parti eu lar torne a levantar de novo toda a questão da sua posição
perante Deus.

Uma ilustração simples será útil aqui. Quando o seu filho pequeno lhe desobedece,
faz traquinagem, faz alguma coisa muito errada, você fica aborrecido com a criança,
e certamente a repreenderá e a castigará; mas isso afeta a relação entre vocês? Claro
que não! As transgressões não afetam a relação; portanto, não ouça o d iabo quando
ele d iz que afetam. “Sei que estou errado, sei que sou indigno e que mereço sofrer
pelo que fiz, porém, graças a Deus, continuo sendo Seu filho, e sei que Ele
me perdoa”. E porventura vocês não sentem que é este seguro conhecimento de que
continuam sendo filhos de Deus, que Ele os ama, e que Ele os perdoa-não sentem que
é isso que, nesse ponto, quebranta o seu coração mais do que qualquer outra coisa?
Mas isso não os deve levar a sentir-se condenados. A couraça da justiça é mais que
suficiente.
Isso não é desculpar o pecado do crente. Na verdade, se entendermos
verdadeiramente esta doutrina, ela é mais propícia do que qualquer outra coisa a
livrar-nos de pecar. É quando conhecemos o amor que Deus tem para conosco, e
quando O amamos como devemos, que o pecado se toma mais odioso. Não há nada
que nos afasta tanto do pecado como o temor de ferir ou ofender ou magoar Aquele
que nos dedicou tanto amor.

Devo mencionar mais uma manifestação das acusações do diabo, a saber, as


acusações que nos faz quando estamos para morrer. Alguns dos maiores santos
tiveram um terrível conflito com o diabo em seu leito de morte. '‘Aquele, pois, que
cuida estarem pé, olhe, não caia” (1 Coríntios 10:12). Você pode estar bem agora, e
rebrilhando de saúde, e pode inclinar-se a dizer: “Ele nunca me abalaria!” Mas,
deixe-me lembrar-lhe que você está enfrentando as astutas ciladas do diabo. Ele
tentou abalar alguns dos maiores santos quando moribundos, íázendo-os lembrar-se
dos seus pecados passados, fazendo-os lembrar-se de tudo o que não tinham feito, da
pobreza do seu trabalho e do seu serviço-procurando convencê-los de que tudo
aquilo não valia nada! Por ocasião da sua doença física, e com a proximidade da
morte, o diabo tenta abalá-los. A única resposta que se deve dar continua sendo a
mesma: “a couraça da justiça”. Em tal circunstância você pode aplicá-la fazendo uso
das palavras do nosso Senhor em João 5:24: “Na verdade, na verdade vos digo que
quem ouve a minha palavra, e crê naquele que me enviou, /<?;;>”-já possui-“a
vida eterna, e não entrará em condenação, mas passou da morte para a vida”. Você
sabe que não tem nada que o recomende, porém pode dizer: “Descanso confiante em
Sua palavra. Já passei da morte para a vida, não entrarei em condenação, graças a
Ele!” E a isso você pode acrescentar a extraordinária argumentação de Paulo em
Romanos 8:31-37: “Que diremos, pois, a estas coisas? Se Deus é por nós, quem será
contra nós? Aquele que nem mesmo a seu próprio Filho poupou, antes o entregou
por todos nós, como nos não dará também com ele todas as coisas? Quem intentará
acusação contra os escolhidos de Deus? É Deus quem os justifica. Quem os
condenará?” Cristo nos condenará? Não! “Pois é Cristo quem morreu, ou antes,
quem ressuscitou dentre os mortos, o qual está à direita de Deus, e também intercede
por nós. Quem nos separará do amor de Cristo?” Ninguém! Nada! No entanto,
deixemos que Paulo nos dê a sua própria conclusão, nos versículos 38 e 39: “Porque
estou certo de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem
as potestades, nem o presente, nem o porvir, nem altura, nem profundidade, nem
alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus
nosso Senhor”.

Usem sempre a couraça da justiça. Nunca se apartem dela. Mantenham-se vestidos


dela constantemente. Deixem-me expressar para vocês a verdade com as conhecidas
palavras do Conde Zinzendorf, traduzidas para o inglês por João Wesley, parte das
quais citei num estudo anterior:
Jesus, Teu sangue e Tua justiça São meu fulgor e sobrepeliz;

Do mundo em chamas, com esse traje, Minha cabeça alçarei feliz.

Já me absolveste do vil pecado,

E denunciar-me, quem ousaria? Livre do medo, da culpa e da vergonha, De pé


estarei em Teu grande dia.

Jesus, louvor infindável a Ti,

Pois misericórdia teve de mim; Resgate eterno por mim pagaste, Expiação plena
por mim fizeste.

“Vesti a couraça da justiça”!

ORDENS DE MARCHA

“Estai, pois, firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade, e vestida a
couraça da justiça. ’’ - Efésios 6:14

Prosseguindo nesta luta contra o diabo e suas forças, também é preciso compreender
que ter e continuar tendo um conceito correto da nossa vida como cristãos no
presente mundo é uma das maneiras pelas quais vestimos acouraçadajustiça. Este
pensamento percorre igualmente o Velho e o Novo Testamento. Será que nós, cristãos
modernos, lembramo-nos disso como devíamos? Seguramente, um dos
maiores perigos é o mundanismo que se insinuou na Igreja, e o fato de que perdemos
a noção da atitude do cristão para com a vida neste mundo. O ensino bíblico geral é
no sentido de que somos povo de Deus e que, portanto, somos um povo separado. No
Velho Testamento os filhos de Israel eram distintos de todos os demais, graças a
muitos mandamentos, regulamentose regras. Isso tinha por fim simplesmente
diferenciá-los dos outros, e mostrar que eles eram o povo de Deus. Esse é o
significado, não somente dos Dez Mandamentos, mas também das leis cerimoniais,
que ensinavam que eles não deviam comer certos animais. E com que freqüência
Deus os lembra disso! “De todas as famílias (as nações) da terra, a vós somente
conheci”, diz Ele por meio de Amós (Amós 3:2). Eles eram um povo separado
porque eram Seu povo. O mandamento dom inan-te era: “Sede santos”! Por quê?
“Porque eu sou santo.”

Deus separou Israel com o objetivo de revelar-Se e de introduzir a grande salvação.


Como nação, era a igreja do Velho Testamento. Mas o princípio se vê com igual
clarezanoNovo como no Velho Testamento. O cristão, por definição, tem que ter um
conceito deste mundo inteiramente diverso de todos os demais, sendo que uma das
razões d isso é que ele tem um novo conceito de si próprio. Estamos neste mundo,
paticipamos da sua vida, das suas atividades, juntamente com todas as outras
pessoas; e, contudo, apesar de estarmos nele, não somos dele. E o nosso
maior problema é a luta contra o diabo quando ele nos confronta no “mundo” e por
meio dele. Devemos dar-nos conta deque, se havemos de “resistir” ao diabo, temos
que ver “o mundo” como ele é. Como diz o apóstolo João: “...esta é a vitória que
vence o mundo, a nossa fé” (1 João 5:4).

“O inundo” nas Escrituras significa, não o universo físico, natural-

mente; tampouco significa as pessoas que estão no mundo, propriamente ditas.


Significa o mundo dos homens como ele é organizado pelo diabo contra Deus.
Significa o mundo governado pelo diabo. O apóstolo Paulo, na Segunda Epístola aos
Coríntios, capítulo 4, refere-se ao diabo como “o deus deste mundo” (VA)! Na
Epístola aos Efésios, capítulo 2, versículo 2, ele lhe chama “o príncipe das
potestades do ar, do espírito que agora opera nos filhos da desobediência”. Ele
domina a mente e a perspectiva do mundo sem Deus. Temos que compreender isso.

A nossa posição se baseia, em última instância, no que o nosso Senhor ensinou i


medi atam ente antes da Sua morte na cruz, quando Ele elevou a sua última oração
intercessória em favor do Seu povo. Está registrada no capítulo dezessete do
Evangelho segundo João: “Eu rogo por eles; não rogo pelo mundo, mas por aqueles
que me deste, porque são teus”. Ele traça umadistinção fundamental. Não ora pelo
mundo, ora unicamente por aqueles que Deus chamou do mundo para serem dEle,
para serem Seus servos, Seus representantes, aqueles por intermédio dos quais
Ele vai realizar a Sua obra após a Sua partida. Depois Ele continua: “Dei-lhes a tua
palavra, e o mundo os aborreceu, porque não são do mundo, assim como eu não sou
do mundo. Não peço que os tire do mundo, mas que os livres do mal. Não são do
mundo, como eu do mundo não sou. Santifica--os na verdade, a tua palavra ca
verdade”. Ele vai deixar estes discípulos, estes Seus pobres seguidores. Ele sabe da
ignorância deles; sabe que eles não entendem o que vem, não conhecem o diabo,
como Ele o conhecia, e não conhecem o mundo, como Ele o conhecia. Embora tenha
vindo ao mundo, Ele nunca lhe pertenceu, não era do mundo, era um estrangeiro aqui.
Todavia, como Ele passou pelo mundo, Ele experimentou o seu poder: por isso Ele
roga ao Pai que os guarde. Diz Ele: Eu os guardei enquanto estive aqui, e agora volto
a Ti; guarda-os, “santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade”. Os discípulos
iriam estar empenhados neste formidável combate contra “o mundo”.

Vê-se este mesmo ensino em todas as Epístolas. Vemo-lo no capitulo 5 da Epístola


aos Efésios, no versículo 8. Diz ali Paulo: “Noutro tempo ércis trevas, mas agora
sois luz no Senhor”. Vocês não são mais o que eram, diz o apóstolo, vocês não são
mais trevas, são luz, não estão mais no mundo, estão na Igreja. Deu-se esta grande
mudança. Observem o modo como ele expõe o tema escrevendo aos filipenses: “A
nossa cidade (a nossa cidadania) está nos céus” (3:20). Apesar de vivermos
neste mundo e de, em certo sentido, ainda sermos cidadãos deste mundo, a nossa real
cidadania está no céu, É de onde somos. Alguém traduziu a frase assim: “Somos unia
colônia do céu”. Noutras palavras, não

pertencemos a este mundo, o céu é o nosso lar, o céu é a nossa cidade. A nossa
cidadania definitiva é lá; o céu é o lugar ao qual devemos a nossa primeira lealdade.

Eis o que se diz do povo de Deus no capítulo onze da Epístola aos Hebreus:
“...confessaram que eram estrangeiros e peregrinos na terra” (versículo 13). É o que
se diz acerca dos grandes heróis da fé, em várias gerações. Foi a grande
característica de pessoas como Abel, Noé, Abraão, Isaque, Jacó, Moisés e Davi. Era
esse o seu eonceito da vida neste mundo. Eles estavam nele, desempenharam o seu
papel nele; mas nunca pertenceram a ele; eram separados. Sabiam que eram
estrangeiros e peregrinos, meros excursionistas e viajores. Não se fixaram
neste mundo, não viveram por este mundo; suas atividades não eram primariamente
no interesse deste mundo. Desempenharam sua parte, não se segregaram, não saíram
do mundo; porém não viveram para ele, o seu horizonte não era limitado por ele.
Eles olhavam para além dele, esperavam "a cidade que tem fundamentos, da qual o
artífice e construtor é Deus”. Similarmente, vocês vêem o apóstolo Pedro, ao dirigir
seu apelo a cristãos, escrever: “Amados, peço-vos, como a peregrinos e forasteiros,
que vos abstenhais das concupiscências carnais que combatem contra a alma; tendo o
vosso viver honesto entre os gentios; para que, naquilo em que falam mal de vós,
como de malfeitores, glorifiquem a Deus no dia da visitação, pelas boas obras que
em vós observem” (1 Pedro 2:11-12).

O que estou acentuando é que uma parte essencial da colocação da couraça da


justiça é partir dessa percepção. Se você diz: “Acaso a vida não é maravilhosa, o
mundo não é maravilhoso?” Se você se deixou fascinar por este mundo e é dominado
por ele, você está marchando para o fracasso. Diz o apóstolo João: “O mundo passa,
e a sua concupiscência; mas aquele que faz a vontade de Deus permanece para
sempre” (1 João 2:17). Por isso temos que partir desta percepção de que toda a
organização da vida deste mundo é contra nós como cristãos. Os jornais são
uma perfeita representação da mentalidade do mundo. Vejam o que eles dizem, o que
ensinam, o que insinuam. Reparem na representação que fazem da vida e observem o
que eles defendem. A mesma coisa se pode dizer verdadeiramente dos outros
instrumentos-a televisão, orádio,eo resto-todas essas coisas pertencem ao mundo. O
poder dominante delas é o que a Bíblia chama “o mundo”. Elas não nos concitam a
pensar na alma, em nossa relação com Deus e na eternidade. Estão presas à
terra, todas elas dentro do que é temporal, material, físico. E o mundo odeia a

Bíblia; o mundo é anti-Deus. Vocês não precisam irà Rússia1 para obter prova disso;
vocês a vêem nos seus jornais - a gritante e aberta crítica e ridicularização da Bíblia
e do seu ensino. O mundo está fazendo isso constantemente. A maioria dos grandes
homens do mundo atual está fazendo justamente isso. “O mundo” é isso!

Se não compreendemos estas coisas, já estamos derrotados. O cristão tem que


compreender que o mundo está contra ele, que o diabo está usando o visível, o que
se vê, para derrotar o povo de Deus, para levar os filhos de Deus à confusão, para
enredá-los, para armar-lhes laço, e desse modo privá-los das bênçãos que Deus está
pronto adar-lhes. Como somos lerdos para perceber isso! Diz o nosso Senhor: “Se o
mundo vos aborrece, sabei que, primeiro do que a vós, me aborreceu a mim”.
Não fiquem surpresos, diz Ele. O mundo odiou o Senhor, e Ele diz: “O servo não é
maior do que o seu Senhor. Se me odiaram, odiarão a vocês”. E o povo de Deus
sempre foi odiado. Umobjetivo importante do capítulo onze de Hebreus é mostrar
como o mundo tratou os filhos de Deus. O mundo nãoera“dignodeles”; perseguiu-os,
maltratou-os, odiou-os. E, lembremo-nos, “o mundo” pode entrar na Igreja; o que
explica porque muitas vezes os cristãos são perseguidos pelos cristãos meramente
nominais. Eles sempre sofreram isso, e continuam sofrendo. A mente do mundo
diz: “Tudo bem com a religião, mas você não precisa exagerar, não precisa levá-la
demasiado a sério”. Há sempre ódio do mundo pelo cristianismo verdadeiro.

Obviamente, pois, uma parte essencial da colocação da couraça da justiça sobre


você é compreender que você não pode dar-se ao luxo de tomar coisa alguma como
líquida e certa, que você precisa estar sempre vigi lante, que você tem de andar
sempre com sobriedade, pois os tempos são maus. Estamos cercados daquilo que é
completamente oposto a nós e que está tentando derrubar-nos. Não estou pensando só
no pecado abertamente cometido. O mundanismo não se limita ao pecado
flagrante. Há muitas pessoas altamente respeitáveis que são completamente
mundanas. Ser mundano é fechar-se para Deus, fechar-se para Cristo, fechar-se para
a vida santa. Muito respeitável, talvez, porém não cristão; isso constitui a essência
do mundanismo.

Temos que dar-nos conta de que o mundo no qual vivemos não é realmente o nosso
mundo. Como cristãos, vivemos nele, e temos que tomar parte nele. Mas não
devemos ficar muito entusiasmados com ele;

a nossa maior ambição não deve ser uma reforma mundial. O que devemos
considerar mais importante é que “a nossa cidadania está no céu”. Se somos cristãos
verdadeiros, sabemos que este mundo nunca será verdadeiramente reformado. Não
pode ser reformado, porque está sob o poder e sob o domínio do diabo. Está também
debaixo da “ira de Deus”, está sob julgamento, e finalmente será destruído. Portanto,
o homem cuja idéia geral se restringe a fazer do mundo um lugar melhor e pensa que
esse programa faz dele um cristão, está negando o ensino essencial das Escrituras.
“A nossa cidadania está no céu.” O mundo está sob “o deus deste mundo”, o diabo; e
só terá que enfrentar o desastre final e o juízo final. Vistam “a couraça da justiça”.
Procurem compreender o estado do mundo em que vocês estão vivendo; não
busquem nele seu prazer, sua felicidade, sua alegria. Usem-no, entretanto não
abusem disso. Tenham os olhos fixos em seu lar celestial, no lugar ao qual
vocês pertencem - “pensai nas coisas que são de cima” (Colossenses 3:2).

Devemos dar mais um passo nesta questão e dizer que temos de ter uma compreensão
mais prática da natureza do lugar para o qual vamos indo. Somos viajores,
“estrangeiros e peregrinos”. O mundo, como disse o poeta Dryden, é uma estalagem.
Você passa a noite nela, paga a conta de manhã e se vai. Estamos apenas viajando
por este mundo. Contudo, evidentemente, temos que saber para onde estamos indo, e
temos que saber algo sobre a natureza do nosso destino. Deveremos considerar
isso em detalhe quando estudarmos “o capacete da salvação”. Menciono isso neste
ponto porque constitui uma parte essencial da couraça da justiça. Devemos dar-nos
conta da óbvia necessidade de preparo.

Este também é um tema que se encontra em todas as Escrituras. Um viajante, um


estrangeiro, um peregrino, obviamente pensa primeiramente no lugar para onde vai.
Poderá fazer certas coisas en route, mas, se você partir numa viagem, certamente o
seu objetivo é chegar ao seu destino. Não está interessado na viagem propriamente
dita. A viagem é apenas um meio de levá-lo à meta a que você quer chegar. Esta é
uma perfeita figura da vida do cristão neste inundo; ele é um viajante. Significa, pois,
que ele não se estabelece definitivamente neste mundo, nem deseja fazê-lo,
nem lamenta o fato de que terá que deixá-lo. Ele deve estar desejoso de chegar ao
seu destino e, por isso, constantemente pensa no lugar a que deseja chegar. Ele nunca
teria partido, se não fosse esse desejo de chegar lá.

Faz parte da colocação da couraça da justiça que eu me lembre 2

diariamente de onde eu sou, e para onde vou. Paulo expõe isso em sua carta aos
romanos, no capítulo 13, começando no versículo 11: “E isto digo, conhecendo o
tempo, que é já hora de despertarmos do sono; porque a nossa salvação está agora
mais perto de nós do que quando aceitamos a fé”. Significa que você está mais perto
da meta do que quando começou; você viajou uns tantos quilômetros; “...a nossa
salvação está agora mais perto de nós do que quando aceitamos a fé”. Depois
Paulo acrescenta: “A noite é passada, e o dia é chegado...”. Este mundo é um lugar
de trevas, um lugar noturno, e nós estamos pela aurora, pelo dia, pelo dia eterno de
Deus. Vem a seguir a exortação do apóstolo: '‘Rejeitemos, pois, as obras das trevas,
e vistamo-nos das armas da luz. Andemos honestamente, como de dia; não em
glutonarias, nem em bebedeiras, nem em desonestidades, nem em dissoluções, nem
em contendas e inveja. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e não tenhais
cuidado da carne em suas concupiscências” (ou, “e não façais provisão para a carne,
para cumprirdes as suas cobiças”, VA). Noutras palavras, diga a si próprio: “Eu não
pertenço a este lugar, estou de passagem por este país, este é a noite, este são as
trevas. Vou indo para o céu, para a luz, para Deus, para a glória. O tempo está
passando e eu devo estar preparado para o grande momento que está para chegar!”
Quando você disser isso, estará vestindo a couraça da justiça.

Temos, porém, instruções ainda mais específicas no livro de Apocalipse, no capítulo


21, versículo 27: “E não entrará nela (na cidade) coisa alguma que contam ine,e
cometa abom inação c mentira; mas só os que” - e somente esses - “estão inscritos no
livro da vida do Cordeiro”. E no último capítulo da Bíblia, versículos 14 e 15:
“Bem-aventurados aqueles que guardam os seus mandamentos, para que tenham
direito à árvore da vida, e possam entrar na cidade pelas portas”. Aí se tem em vista
“a cidade santa”, e nos é dito que certas pessoas não terão direito de entrar nessa
cidade. A verdade é que somente aqueles que “guardam os seus mandamentos” têm
direito à árvore da vida e podem entrar na cidade pelas portas. Fora ficam os cães
espirituais, os animais carniceiros, que fossam aqui e ali à cata disto e daquilo para
sua delícia e seu prazer - “os feiticeiros, e os que se prostituem, e os homicidas, e os
idólatras, e qualquer que ama e comete a mentira”. Esses não entrarão na
cidade. Podemos enganar o homem; mas não podemos enganar a Deus. Haverá um
exame quando você for passar pelas portas daquela cidade.

O cristão é alguém que compreende que está viajando para uma cidade. A maior
ambição do cristão é entrar por aquelas portas e participar da “árvore da vida” para
todo o sempre. Sc ele realmente crê nas

palavras que há pouco citei, será essa a primeira coisa em sua vida, e ele estará se
preparando para isso. “A nossa salvação está agora mais perto de nós do que quando
aceitamos a fé. A noite é passada, e o dia é chegado.” Estamos chegando perto. Não
há tempo a perder.

É uma contradição os cristãos dediearem demasiada energia a este mundo. As


conferências e assembléias da Igreja passam a maior pane do tempo considerando
“este mundo”, aprovando resoluções sobre este mundo. Todavia o nosso primeiro
dever é preparar-nos para o outro mundo! Este mundo está condenado. Está sob a
condenação de Deus; nunca se tornará um lugar melhor. Recordem quanto os homens
têm tentado nos últimos cem anos reformá-lo, e como há ministros da religião e
líderes das igrejas que se dedicaram à política. Vejam, porém, o estado da Igreja e
do mundo! Os maiores benfeitores do mundo têm sido aqueles que, como os de
Hebreus, capítulo 11, compreenderam que eram “estrangeiros e peregrinos” e tinham
os olhos postos na “recompensa” -homens como Moisés, que recusou a glória de ser
chamado fi Iho da filha de Faraó e se dispôs a sofrer aflições com o povo de Deus,
em vez de “por um pouco de tempo ter o gozo do pecado”. Mu itas vezes o mundan
ismo tem arruinado o testemunho da Igreja; e precisamos retornar a este conceito
bíblico do que seja um cristão. Para isso é necessário “vestira couraça da justiça”.
Certamente devemos dedicar nossa energia a essa questão muito prática. Temos que
aplicar esta verdade que alegamos crer e, quando o fizermos, estaremos vestindo a
couraça.

Em muitos outros aspectos também devemos usara couraça. João, em sua Primeira
Epístola, capítulo primeiro, versículo cinco, afirma claramente: “Deus é luz, e não
há nele treva nenhuma”. Segue-se disso que, “Se dissermos que temos comunhão com
ele, e andarmos em trevas, mentimos, e não praticamos a verdade”. O apóstolo quer
dizer que, se afirmamos que somos cristãos, e não como os homens do mundo,
se afirmamos que somos membros de igreja e temos comunhão com Deus e, contudo,
ao mesmo tempo andamos nas trevas, somos mentirosos e, sendo mentirosos, não há
lugar para a verdade em nós. João volta ao tema no capítulo dois: “Aquele que diz:
eu conheço-o, e não guarda os seus mandamentos, é mentiroso, e nele não está a
verdade”. Vestir a couraça daj ustiça é compreender a força dessas palavras, e
provar isso deixando de andar nas trevas.

Permitam-me tirar algumas deduções práticas destes aspectos da doutrina cristã que
mencionei. Fazemo-lo, como o fazem as próprias Epístolas, introduzindo a palavra
“Portanto”. Paulo já tinha feito isso

nesta Epístola aos Efésios. Tendo exposto a sua doutrina nos três primeiros
capítulos, ele começa o capítulo quatro dizendo: “Rogo-vos, pois, eu, o preso do
Senhor, que andeis como é d igno da vocação com que fostes chamados”. Ele os faz
lembra-se da doutrina; “portanto”, diz ele, ponham isso em prática. Ele faz a mesma
coisa no capítulo doze da Epístolaaos Romanos: “Rogo-vos, pois (portanto), irmãos,
pela compaixão de Deus” - a compaixão da qual estivera falando no capítulo
onze. Se me pedissem para dizer numa palavra o que significa vestir a couraça da
justiça, eu diria que significa entender o sentido da palavra portanto nas Epístolas
do Novo Testamento.

Mas, naturalmente, não podemos ficar nisso; os próprios apóstolos não o fizeram,
pois eles continuaram a desenvolver para nós o “portanto”. Temos que contentar-nos
com alguns cabeçalhos. Grite estes para você mesmo, e quando fizer isso estará
vestindo a couraça da justiça. Cristo diz: “Se sabeis estas coisas, bem-aventurados
sois se as fizerdes” (João 13:17). Você pode ouvir esta gloriosa doutrina do Deus
bendito, porém, se não a aplicar, ela não terá nenhum valor para você.
Muitos cristãos estão nessas miseráveis condições por causa dessa
infeliz negligência. Eles não chegam ao “Portanto”! Param na doutrina. Pensam que a
conhecem, todavia não a aplicam.

Podemos dividir estes cabeçalhos ou estas máximas em negativas e positivas. As


negativas se acham na Epístola aos Efésios, do capítulo 4, versículo 17, em diante
(ARA): “Isto, portanto, digo, e no Senhortestifico, que não mais andeis como também
andam os gentios, na vaidade dos seus próprios pensamentos, obscurecidos de
entend imento, alheios à v ida de Deus por causa da ignorância em que vivem, pela
dureza dos seus corações, os quais, tendo-se tomado insensíveis, se entregaram à
dissolução para, com avidez, cometerem toda sorte de impureza”. O cristão não deve
andar mais dessa maneira. E mais adiante Paulo continua: “Por isso, deixando a
mentira, fale cada um a verdade com o seu próximo... lrai-vos, e não pequeis; não se
ponha o sol sobre a vossa ira, nem deis lugar ao diabo. Aquele que furtava, não furte
mais”. São essas as negativas-são as máximas em termos negativos. Pode-se dizer
que ele resume isso no capítulo 5, versículo 11: “Não tenhais comunhão com as
obras infrutíferas das trevas; antes, porém, reprovai-as” (VA). Essa determinação é
para nós hoje, como foi para estes cristãos efésios do século primeiro.

Não significa, reitero, que vocês devem sair do mundo. Vocês ainda têm que
encontrar-se com pessoas, ter boas relações e real izar negócios; mas não tenham
“comunhão” e “amizade” com elas, não se unam a

elas. Na Epístola aos Romanos, capítulo 6, versículo 12, Paulo tendo dito: “Assim
também vós considerai-vos como mortos para o pecado, mas vivos para Deus”,
continua: “Não reine portanto o pecado em vosso corpo mortal, para lhe
obedecerdes em suas concupiscências; nem tão pouco apresenteis os vossos
membros ao pecado por instrumentos de iniqüidade”. Se você fizer isso, estará se
contradizendo, estará negando o que você diz que crê. Também no capítulo 8,
versículo 12, ele diz: “Portanto, irmãos, somos devedores, não à carne, para viver
segundo a carne. Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis”. E depois,
no início do capítulo 12: “Rogo-vos,pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que
apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é
vosso culto racional. E não vos conformeis com este mundo.,.”. Mas hámuitos que
continuam conformados com este mundo, mesmo depois de entrarem na esfera da
Igreja. Vocês vêem na Igreja distinções mundanas, distinções de classes, a
sofisticação dos homens, a aparência de fidalguia! Essas coisas são “do mundo”, e
não devemos conformar-nos com este mundo porque não pertencemos a ele. O
que deveria ser óbvio acerca do cristão, em primeiro lugar, não é que ele pertence a
certa camada da sociedade, ou que ele foi educado de certa maneira, e sim, que ele
pertence a Cristo, que a sua cidadania está no céu.

Temos então a declaração do capítulo treze, já citada: “A noite é passada, e o dia é


chegado. Rejeitemos, pois, as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz.
Andemos honestamente, como de dia”. E a seguir, aquelas palavras que tiveram tão
profundo efeito sobre Agostinho: “Não em glutonarias, nem em bebedeiras, nem em
desonestidades, nem em dissoluções, nem em contendas e inveja...”. “Não”,
“nem”. São essas as negativas. “Não somos da noite, nem das trevas.” Mais uma vez,
em 1 Tessalonicenses 5:22: “Abstende-vos de toda a aparência do mal”, que
significa, “abstende-vos de todas as formas do mal”. Seja qual for, abstenha-se dele.
Judas diz: “aborrecendo até a roupa manchada da carne” (VA: “odiando até a roupa
manchada pela carne” - versículo 23). A própria roupa manchada pelo pecado. Não
toque nisso, não tenha nenhuma ligaçãocom isso. Issoétípico dasexortações negativas
doNovo Testamento. O apóstolo João escreve: “Não ameis o mundo, nem o que no
mundo há... a concupiscência da carne, a concupiscênciados olhos e a soberba da
vida”. Essas coisas são a própria antítese daquilo que dá prazer ao coração de Deus.

Passando às positivas, vemos que elas são endereçadas ao "novo homem” do qual o
crente “se reveste”, como por exemplo em Romanos 6:13: “Apresentai-vos a Deus,
como vivos dentre os mortos, e os vossos

membros (as vossas facu Idades) a Deus, como instrumentos de justiça”. Em


Romanos 8:13 lemos: “Se pelo Espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis”.
Exortações similares aparecem em Colossenses, capítulo 3: “Mortificai pois os
vossos membros, que estão sobre a terra: a prostituição, a impureza, o apetite
desordenado, a vil concupiscência, e a avareza, que é idolatria; pelas quais coisas
vem a ira de Deus sobre os filhos da desobediência; nas quais também em outro
tempo andastes, quando vivíeis nelas. Mas agora despojai-vos também de tudo: da
ira, da cólera, da malícia, da maledicência, das palavras torpes da vossa boca. Não
m intais uns aos outros, pois que já vos despistes do ve lho homem com os seus
feitos, e vos vestistes do novo, que se renova para o conhecimento, segundo a
imagem daquele que o criou” (versículos 5-10).

Retornando a Romanos, capítulo 12, vemos a exortação negativa seguida por:


“Transformai-vos pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis
qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus” (versículo 2). Andem
prudentemente, remindo o tempo, não percam um só momento. Vocês são filhos da
luz, vocês são filhos do dia. Depois, de novo em Colossenses, capítulo 3: “Pensai
nas coisas que são de cima, e não nas que são da terra” (VA: “Acertem o seu afeto
para as coisas que são de cima...”). Acertem-no para elas! Vocês têm que acertá-lo
como acertariam uma bússola, planejando uma rota. Etêmque fazê-lo
deliberadamente. O mundo não os ajudará, antes os atrapalhará. Se vocês
começarem o dia com os seus jornais ou com o rádio, estarão acertando os seus
afetos para outros lugares. “Crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e
Salvador Jesus Cristo.” “Qualquer que nele tem esta esperança purifica-se a si
mesmo, como também ele é puro.”

“Está para chegar o dia da consumação; logo vem.” “A noite é passada e o dia é
chegado.” Logo vem o dia da investidura. As pessoas que vão ser investidas em
posições ou cargos e que vão receber medalhas e honras no Palácio de Buckingham,
passam muito tempo preparando-se para a ocasião. Preparam seu vestuário, seus
corpos, seus modos - tudo. Cristão! Vem odiada sua investidura, o d ia em que você
estará diante do Rei “imortal, invisível, o único Deus”, e será investido recebendo a
sua coroa de glória, e entrará no gozo daquela glória por toda a etern idade. O dia
vem! “A nossa salvação está agora mais perto de nós do que quando aceitamos a fé”!
Não temos um momento a perder. Procure compreender todas estas coisas, e quando
as compreender, será capaz de “estar firme” contra as astutas ci ladas do diabo,
mesmo no dia mau, e, havendo feito tudo, “ficar firme”. Vista “a couraça da justiça”!

Lembremo-nos de que o autor proferiu essas palavras antes do desmoronamento do


comunismo ateu na Rússia. Nota do tradutor.

A caminho. Em francês no original. Nota do tradutor.


PERMANEÇAM FIRMES

"E calçados os pés na preparação do evangelho da paz. ”

-Efésios6:15

Nessas palavras vamos examinar ainda outra peça desta '‘armadura de Deus”
providenciada para nós como povo de Deus em nosso combate neste mundo contra o
diabo e os principados, as potestades, os príncipes das trevas deste século, contra as
hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais. Gostaria de lembrar-lhes, ao
passarmos a ver esta próxima peça, que o apóstolo está fazendo uso de uma figura; e
que devemos ter o cuidado de não cair no literalismoou de forçá-la muito.

Esta terceira peça, que tem relação com os pés, faz-nos pensar de novo que toda a
personalidade está engajada nesta guerra cristã; c que, portanto, é preciso que nada
seja negligenciado. Nada é mais importante na vida cristãdo que o equilíbrio. Muitos
dos nossos problemas se devem à faltade equilíbrio, fato do qual o inimigo está bem
ciente. A própria figura que o apóstolo utiliza fez-nos lembrar a totalidade, e que
todas as partes de nós, como cristãos, estão engajadas neste con flito. Não somos
cristãos em partes e segmentos. A nossa fé absorve a totalidade da vida e
a totalidade do homem; portanto, temos que proteger-nos em todas as áreas sem
exceção.

Contudo, é interessante notar que as diferentes partes têm sua importância relativa. A
pessoa pode sertentada a pensar, a princípio, que, em termos de comparação, os pés
são destituídos de importância. Comparando-se o coração com os pés do ponto de
vista da mecânica c da engenhosa finura, naturalmente é óbvio que hádiferença. O pé
parece grosseiro e relativamente sem importância. Há, pois, na vida cristã o perigo
de se considerarem certos aspectos como relativamente destituídos de importância.
Mas a passagem em foco nos diz que temos de proteger os nossos pés, e pela
evidente razão que eles desempenham um papel vital na vida. Por mais poderoso que
o seu peito seja, e por mais maravi lhosos que sejam os seus lombos, se você for
ferido nos pés, ou se você escorregar e cair na batalha, será fácil presa para o seu
antagonista. Assim, os pés, embora tendo a sua importância própria, contribuem
para o bem-estar do corpo todo.

A palavra à qual o apóstolo dá ênfase mostra a importância dos pés.

É a palavra traduzida por “estar firme”. Afinal de contas, você está ou fica firme
sobre os seus pés! Você não fica firme sobre o seu peito! Há um sentido, pois, em
que tudo depende da proteção, da segurança e do bom funcionamento dos pés.

Este mesmo apóstolo trata com muita clareza deste assunto no que ele diz sobre o
corpo no capítulo doze da Primeira Epístola aos Coríntios. Ele usa al i a analogia do
corpo de maneria diferente. A igreja de Corinto estava dividida em grupos e seitas, e
eis como ele lida com esse mal: vocês não se lembram, indaga ele, de que são o
corpo de Cristo e de que não podem dividir o corpo? O olho às vezes diz à mão: não
preciso de você; que é a mão, comparada com o olho? Há partes elegantes e partes
menos elegantes, e temos a tendência de tratar com desdém as partes
menos elegantes. Não obstante, Paulo diz que isso é tolice; cada uma das partes do
corpoéindispensávelparaobomfuncionamentodocorpo todo. Dada a natureza do
corpo, quando há algo errado com o nosso dedo m ínimo, o corpo inteiro sofre. Por
isso somos lembrados que os pés são absolutamente essenciais ao bem-estar do
corpo, por causa da unidade do corpo. O cristão é uma personalidade una; cada parte
dele tem o seu valor; assim, não devemos tratar nenhuma das suas partes com
desrespeito ou com algum tipo de negligência.

Passemos, pois, a considerar o que se deve fazer acerca dos pés. Os nossos pés, com
os quais andamos pelas ruas e estradas, no pó, na lama e na sujeira, são muito
importantes. Sejamos cautelosos, procurando saber exatamente o que fazer com eles.
O que se nos diz é: “Tende os vossos pés calçados com a preparação do evangelho
da paz”. A melhor maneira de entender o sentido dessas palavras é começar pela
própria analogia utilizada pelo apóstolo. Indubitavelmente, ele estava pensando no
soldado romano. A provisão feita para os pés do soldado romano era de certo
tipo de sandália. Não uma bota, mas uma sandália, que essencialmente consistia de
sola e tiras que se prendiam firmemente ao pé. Entretanto, o mais importante é que
essa sandália tinha pregos ou tachões por baixo.

A sandália dava ao soldado romano adesão firme, para impedi-lo de deslizar,


escorregar e cair; daí o uso dos tachões. Mas havia outro motivo para supri-lo de
sandálias feitas de material resistente. Um comum estratagema de guerra daquele
tempo era colocar certas armadilhas no terreno. Pegavam um pedaço de madeira ou
uma vara e a afinavam, de modo que se tornava uma vareta pontuda, e a enterravam
no solo deixando a ponta mais fina ligeiramente acima da superfície, quase
invisível. Quando um inimigo vinha correndo sem sandálias, de repente
aqueles espetos penetravam na sola do seu pé. Isso não somente causava grande

dor, também fazia sangrar, e podia infeccionar e pôr o soldado inteiramente fora de
ação. Era sumamente importante, pois, que os pés estivessem protegidos dessas
armadilhas que eram camufladas e ficavam ocultas a fim de causar esse problema.

A terceira razão óbvia para que os soldados recebessem essas sandálias era a
mobilidade. Num exército nada é mais importante do que a mobilidade. Os romanos
tinham muito interesse por este aspecto das ações de guerra. O primeiro homem que
viu a importância da mobil idade no sentido militar foi Alexandre, oGrande, um
dosmaiores comandantes de exército e de guerra que o mundo já conheceu. Ele viveu
no século quarto antes de Cristo, e teve os seus maiores sucessos movendo os
seus exércitos rápida e inesperadamente, enquanto que os seus adversários
se mantinham estacionários ou se moviam lenta e pesadamente. Assim é que ele tinha
fornecido aos seus soldados o tipo certo de calçados, e os romanos e outros,
naépoca do apóstolo, tinham imitado Alexandre. Dessa maneira, o apósto lo recebeu
uma vai iosa e instrutiva 1 ição para passar aos cristãos que estavam lutando e
resistindo contra “as astutas ciladas do diabo”. Diz ele aos cristãos: “Tenham os
seus pés calçados com a preparação do evangelho da paz”.

O nosso interesse está na aplicação espiritual desta analogia. O termo “preparação”


é a chave para isso. “O evangelho da paz” não é difícil de ser entendido, mas qual
será o significado da palavra “preparação”, segundo a tradução da Versão
Autorizada (inglesa) e da Versão de Almeida? Há duas interpretações principais, e
ambas podem alegar, até certo ponto, que se baseiam no sentido básico original da
palavra empregada pelo apóstolo. A primeira é que ela simplesmente comunica a
idéia de “firmeza”, que a “preparação” do evangelho da paz significa a firmeza que
nos é dada pelo evangelho da paz. A chamada Nova Bíblia Inglesa (“New English
Bible”) adota esse significado em sua tradução: “dar-vos um andar firme”. Mas a
idéia comum, adotada muito geralmente, com poucas exceções, é algo que está muito
mais próximo daquilo que temos na Versão Autorizada (e em Almeida) e, na
verdade, é apenas uma variante dela - “Os vossos pés calçados com a prontidão...”.
John Wycliffe foi o primeiro a ver que esse é o sentido real. Ele a traduziu por “em
fazer-vos preparados”, que significa “estar de prontidão” ou “estar preparados”. A
Versão Revista Padrão americana (RSV) dá-nos 1

uma boa tradução, qual seja, '"equipamento”; “tendo os vossos pés calçados com o
equipamento do evangelho da paz”. A tradução feita pela Nova Bíblia Inglesa não é
nem sequer levada em consideração por Arndt e Gingrich em seu léxico. Eles se
concentram inteiramente na “prontidão” e especialmente na idéia de “equipamento”.
Parece-me não haver dúvida de que esta é a idéia correta.

AmesmapalavraéutilizadanaEpístolaaTito, capítulo três, versículo primeiro, onde o


apóstolo diz: “Admoesta-os a que se sujeitem aos principados e potestades, que lhes
obedeçam, e estejam preparados para toda a boa obra” (VA e ARA, na parte final,
dizem: "'prontos para toda boa obra”). Proponho-me, pois, a acatar como a melhor
tradução a palavra “equipamento”, que inclui tanto a idéia de prontidão como
o elemento de estabilidadee firmeza.

Por que nos diz o apóstolo que devemos ter os nossos pés calçados com a prontidão,
com o equ ipamento do evangelho da paz? A Iguns d izem que ele se refere à nossa
prontidão para levar a outros as boas novas do evangelho da paz e da salvação; que
como cristãos devemos estar prontos para evangelizar, sempre prontos para
obedecer à ordem: “Ide, e pregai o evangelho”. No livro do Dr. John Henry Jowett
sobrei Armadura de Dens (The Armour of God), no capítulo dedicado a esta questão
dos pés, há um característico sermão que dá ênfase à necessidade de
estarmos prontos para obedecer ao chamado de Deus e para engajar-nos na atividade
missionária; de estarmos sempre como qui vive, por assim dizer, de modo que,
quando a voz de comando chegar a nós, estaremos prontos para ir. “Por Mim e pelo
evangelho, ide contar a história da redenção.” Imagino que essa interpretação foi
sugerida por aquelas Bíblias que têm referências marginais que indicam duas
porções das Escrituras. A primeiraé Romanos 10:15: "‘Como pregarão, se não
forem enviados? Quão formosos os pés dos que anunciam a paz, dos que anunciam
coisas boas!”-citação de Isaías 52:7. Assim, na referência marginal vocês podem ver
a indicação de Isaías 52:7, com relação a “pés” em Romanos 10:15 (assim também
na ARA). Por isso entra a idéia de se estar pronto para propagar o evangelho, a boa
notícia da paz com Deus mediante o sangue de Cristo.

Parece-me que se deve rejeitar completamente essa interpretação, e por uma razão
plenamente suficiente. Nesta passagem de Efésios o apóstolo está tratando de uma só
coisa, a saber, o nosso combate e confl ito 2

com o diabo. “Não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os
principados, contraas potestades.” Todo o seu objetivo consiste em habilitar-nos a
“estar firmes” contra as ciladas do diabo. Ele não está pensando na evangelização,
ele está retratando o cristão que está sendo atacado dia e noite pelo diabo e todas as
suas forças, e o está advertindo de que, se ele não se deixar encher pelo poder de
Deus, e se não vestir toda esta armadura de Deus, será derrotado. É ação guerreira
defensiva. Como é que a questão da ação evangelística pode entrar neste
assunto sobre guerra defensiva?

Sendo assim, alguém poderá perguntar: “Bem, como foi que alguém chegou a
interpretar esse texto dessa maneira?” Temos aqui um ponto sumamente interessante
relativo à nossa leitura e interpretação das Escrituras. Usar uma concordância é bom,
mas ela pode ser um instrumento muito perigoso! Vocês podem ler este versículo, “E
calçados os pés...”, pegar a sua concordância, e ali vai ser remetido a Romanos
10:15, Isaias 52:7, etc.; e isso determina a sua interpretação. Ora, esse é um mau uso
de uma concordância. Há muitos que sempre interpretam as Escrituras dessa forma.
Vêem uma palavra, procuram as referências, e então baseam o sermão nos usos da
palavra. A partir disso apresentam uma interpretação que tem pouca relação com o
contexto. Há aqui, pois, uma lição damáxima importância. Nunca devemos
interpretar uma palavraou frase sem certificar-nos de que ela se enquadra no
contexto. Não a isolem, pensando nos seus possíveis sentidos e usos; tudo deve
sertomado em seu contexto. No momento em que vocês adotarem esse método aqui,
verão que a interpretação particular de “prontidão” e “ímpeto para a ação”
é totalmente errada. De fato leva a um desvio total neste ponto, pois os
fará esquecertudo acercadodiaboedosprincipadose potestades. No sermão do Dr.
Jowett a que me referi esses poderes não são sequermencionados. Ele não fala de
coisa alguma, senão da pregação do evangelho, de levá-lo a partes remotas da terra,
e de se estar pronto para obedecer ao chamado. É importante, repito, sempre tomar
uma palavra ou frase em seu contexto. Se as pessoas dessem atenção ao contexto, a
maior parte dos nossos problemas de interpretação estaria resolvida. Muitas
heresias surgiram porque houve homens que tiraram totalmente do seu contexto uma
palavra ou uma frase, e com esta elaboraram uma teoria falsa ou um ponto de vista.

Visto, pois, que o apóstolo está falando sobre a nossa luta contra o diabo, a nossa
interpretação das suas palavras deve incluir os seguintes princípios: o primeiro é
firmeza, confiança, sentir segurança. Se você estiver empenhado num conflito mortal
com um adversário poderoso,

astuto, esperto, deve estar alerta para não cair, para não deslizar e escorregar,
certificando-se de que os seus pés estão bem calçados. Isso é importante em todas as
espécies de conflito físico; e é ainda mais importante na esfera espiritual. Você
precisa estar bem seguro de que sabe o que está fazendo e onde está se firmando. É
preciso que se cuide para não ver, de repente, tudo fugir de debaixo dos seus pés
porque esses não têm como se firmar bem.

Isso quer dizer que você deve ser resoluto; que você tem de resolver ser “um bom
soldado de Jesus Cristo”, venha o que vier. Você tem que resolver apegar-se a este
evangelho, não importa que hostes de inimigos estejam armados contra você. Você
tem que ter firmeza. Não deve entrar na vida cristã e continuar nela com coração
dividido, estando meio dentro, meio fora, desejando benefícios mas se opondo a
deveres, querendo privilégios porém rejeitando responsabilidades. Para começar,
você tem que ser firme, sólido, resoluto e confiante. A menção que Paulo faz
das sandálias traz essa noção. Se você quer “estar firme”, assegure-se de que pode e
quer “estar firme”. Não se precipite, por assim dizer, com os pés descalços, mas
calce as sandálias guarnecidas de tachões. Preste atenção nesse requisito.

O apóstolo ensina a mesma verdade em 1 Coríntios, capítulo 16, na ordem: “Estai


firmes na fé”! (versículo 13). Quando olho para a Igreja hoje, vejo muitos cujos pés
não estão calçados com a preparação do evangelho da paz. Eu os vejo escorregando
e deslizando - evangélicos, bem como outros! Os homens não são mais firmes, não
são mais resolutos, não sabem mais no que crêem, e não se apegam ao que crêem
venha o que vier. As concessões são muito comuns. Seja agradável, seja bom,
seja afável, são as máximas atuais. Muitos protestantes parecem estar prontos para
voltar para Roma a qualquer momento! É porque não têm os pés calçados com o
equipamento do evangelho da paz. Eles estão deslizando, escorregando, oscilando e
mudando, sem saber onde estão, e nesse meio tempo o diabo se regozija. Isso é
aplicável tanto a igrejas como a indivíduos.

Vocês sabem em que crer? Existe algo pelo que vocês estão prontos para “estar
firmes”? Não me desculpo por fazer tais perguntas. Parece-me que hoje as pessoas
estão prontas para fazer concessões em todas as coisas. Porventura vocês crêem
realmente que a Bíblia é a Palavra de Deus, divina e singularmente inspirada, e
inerrante? Vocês estão prontos para ficar firmes nessa verdade? É isso que significa
pôr as sandálias. Vocês estão prontos para permanecer firmes em prol da deidade
de Cristo? Do Seu nascimento virginal? Dos mi lagres? Vocês estão prontos

para permanecer firmes em prol da morte expiatória, sacrificial, substitutiva do


nosso Senhor? Vocês estão prontos para permanecer firmes em prol da ressurreição
de Cristo como um fato literal, físico? Vocês estão prontos para permanecer firmes
em prol da Pessoa do Espírito Santo? Sabem onde querem estar firmes, conhecem a
sua posição? Como poderão combater o inimigo, se não conhecem a sua posição? As
vezes penso que a leitura sobre as artes bél icas deveria ser obrigatória, que
deveríamos ler sobre os grandes comandantes de exércitos como Alexandre,
Cromwell, Napoleão e outros. Eles sempre escolhiam o seu lugar e a sua
posição; sabiam onde iam estar firmes. E nós não devemos deixar a decisão com o
inimigo. Tome a sua posição e diga: “Aqui estou firme!”Tome posição com Marti
nho Lutero, que não se perturbou com o fato de que tinha contra si doze séculos de
catolicismo romano e de tradição. “Aqui estou firme; não posso fazer outra coisa”,
disse ele; e nós também temos que aprender a “estar firmes”. Temos de saber o que
cremos, ser resolutos e estar determinados a permanecer firmes por isso, venha o
que vier.

Vocês têm uma posição definida? Estão dispostos a permanecer firmes nela, e a
dizer: “Nunca me renderei, nunca sairei daqui”? No momento em que vocês
começarem a ceder quanto à Palavra e Deus, logo estarão escorregando e
deslizando, tanto na doutrina como na prática. Alguns estão constantemente se
contradizendo; elogiam os protestantes e os pais não conformistas na primeira
metade do seu discurso ou artigo; depois os criticam na segunda metade. Isso não
é “ficar firme”; é escorregar. Eles não sabem onde estão, e ninguém sabe.

Como o apóstolo Paulo dizem 2 Coríntios 1:19, o evangelho de Cristo não é sim e
não, ao mesmo tempo. Essa é a verdade quanto à política, quanto ao eclesiasticismo,
quanto ao “inundo”; contudo não é verdade quanto a Cristo. Oevangelho do Filhode
Deus, Jesus Cristo, nunca é “sim e não”. O ensino de Paulo não concorda com o
credo atual - “dialética”, lhe chamam - que ensina “sim e não” ao mesmo tempo. No
entanto, d iz Paulo, o evangelho não é “sim e não”, mas “nele (em Cristo) houve
sim. Porque todas quantas promessas há em Deus, são nele sim, e por ele o Amém,
para glória de Deus por nós”. E isso significa, segundo alguns intérpretes, que eu e
vocês devemos somar o nosso Amém ao Seu Amém, ao Seu grande “sim”.
Permaneçam firmes nisso, custe o que custar.

A nossa firmeza, porém, não se aplica somente à doutrina; aplica-se à totalidade da


vida. Uma vez que você entrou nesta vida, tem que tomar a sua posição e permanecer
firme, sem vacilar, do lado do Senhor. Quando você se encontrar com os seus velhos
amigos do mundo, e eles propuserem a você que continue fazendo o que costumava
fazer com eles, você

sabe que não pode, e recusará fazê-lo. Permaneça firme resolutamente. Não
escorregue para o lado deles. Não! Você tem os seus pés calçados com a prontidão
do evangelho da paz. Uma vez que você entrou nesta vida e percebeu que ela é
inteiramente diferente da sua vida anterior, você deve dizer: “Aqui estou firme!”
Alguém de quem você gosta muito poderá tentá-lo, todavia você terá que dizer: “Não
posso trair o meu Senhor; comprometi-me em obedecer aos Seu mandamentos. Os
meus pés estão calçados, não estou vaci lando”. Não fomos destinados a portarmos
ridiculamente, é claro; mas a permanecer firmes nos princípios, e a aplicar esses
princípios. Isto se aplica intelectual e doutrinariamente, e à conduta e ao
comportamento. Aplica-se a todos os departamentos da vida.

Os seus pés estão calçados? Essa é a grande necessidade desta hora; é o chamado de
Deus, creio eu, à Igreja e a todo cristão no presente. Deus está à procura dos que
permanecerão firmes! Acredito que Ele está dizendo nos dias atuais o que fez nos
dias de Gideão. As “hostes de Midiã” tinham subido, e um grande exército de 32.000
foi reunido por Israel. Dos 32.000 houve somente 300 em que Deus pôde confiar.
Ele sabia que estes permaneceriam firmes, que nunca desistiriam, que
nunca cederiam. Por isso Ele despachou os restantes, e com os poucos 300,
o remanescente, Ele derrotou e desbaratou as hostes de Midiã. Deus sempre realizou
as Suas maiores obras com um remanescente. Livre-se da idéia de números. O que
Deus quer é um homem ou uma mulher que esteja em prontidão para “ficar firme”,
cujos pés estejam “calçados com o equipamento do evangelho da paz”. Ele sabe que
pode confiar em tais pessoas; sabe que elas permenecerão firmes, não importa o que
aconteça com elas e em torno delas.

Você está firme? Está disposto a permanecer firme? Está pronto para ficar firme?
Você entrou de fato na vida cristã, ou está com um pé no mundo e um pé na Igreja?
Qual será a situação? “Não podeis servir a Deus e a Mamom.” Talvez você pense
que pode; logo verá que não pode. Será derrotado, e se sentirá miseravelmente mal
e, quando enfrentar a Deus no juízo, você terá vergonha de si mesmo. Tenha os seus
pés calçados com a prontidão, com a firmeza, com o equipamento do evangelho da
paz. “Firmes!” “Vós, que sois homens, agora servi ao Senhor.”

O segundo grande princípio, em acréscimo à firmeza, à confiança e à confiabilidade,


é a vigilância, a atitude de alerta. Nas palavras do conhecido hino, “Onde chama o
dever, ou o perigo, nunca estejas ausente, meu amigo!” Devemos compreender,
noutras palavras, o caráter do

inimigocoinquemnosdefrontamos. Já examinamos pormenorizadamente este assunto


em estudos anteriores, mas agora estamos interessados na aplicação prática daquilo
queaprendemos. Vigilância! Atitude dealerta!

“Vigiai, estai firmes na fé, portai-vos varonilmente, efortalecei--vos”, diz Paulo no


último capítulo da Primeira Epístola aos Coríntios. Sua primeira palavra é “vigiai”.
Diz o nosso Senhor: “Vigiai e orai”. Por quê? “Para que não entreis em tentação.”
Vigiai! Orai! Este preceito percorre todo o Novo Testamento. Paulo exorta os
colossenses a andarem “prudentemente”. Suas palavras nos exortam a vigiar quanto a
onde pomos os pés. Isso por causa dos laços, das armadilhas e dos espetos
colocados pelo inim igo que estamos enfrentando. Isso é salientado por muitas
razões; a primeira é que somos confrontados por um inimigo incansável e que não
pára de agir. O apóstolo Pedro o descreve como “um leão a rugir”, andando para lá e
para cá continuamente. Vocês já estiveram num lugar como o Parque Nacional
Kruger, na África do Sul? Já viram filmes sobre essas criaturas nos amplos espaços
abertos onde a natureza ainda se vê “vermelha nos dentes e nas garras”? Já viram
um leão rondando, arrastando-se pelo chão, ocultando-se e pronto para, a qualquer
momento, dar o bote? Essa é uma figura do “diabo, vosso adversário, (que) anda em
derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar”. “Vista a sua
armadura celestial”, diz muito bem o hino, “usemo-la noite e dia”, por causa do
caráter do ser maligno que se opõe a nós. Ele nunca se afadiga, nunca se cansa, e
comanda os principados e potestades, e todas as más influências, forças e fatores.
A conclusão é que devemos estar sempre prontos -“noite e dia”, por assim dizer.

Outro elemento é o imprevisto, o caráter inesperado do ataque. Vocês nunca sabem


quando ele virá. Se tão-somente o soubéssemos, toda a situação seria diferente.
Depois de termos algum tempo de grande elevação espiritual num culto ou em nossos
lares, inclinamo-nos a pensar que vamos ficar imunes. Contudo, esse pode ser o
momento mais perigoso. “Aquele pois, que cuida estarem pé, olhe não caia.”
Você nunca sabe quando vem o inimigo. Você não pode descansar no fato de que
recentemente foi abençoado por Deus de maneira incomum;o inimigo pode
aproveitar-se disso para passar-lhe uma rasteira. Foi depois do batismo do nosso
Senhor, quando o Espírito Santo desceu sobre Ele, que Ele foi levado para o deserto
para ser tentado pelo diabo. Nunca se sabe quando a tentação virá. Cuidado com o
imprevisto!

Outra consideração sumamente importante é a astúcia, são as


“ciiadas”dodiabo.“Emboscadoesláo maligno”, diz o hino. O apóstolo

nos lembra isso no capítulo quatro da sua Epístola aos Efésios, onde ele diz: “Para
que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por todo o vento de
doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam fraudulosamente”
(versículo 14). É o diabo que usa os homens para produzir astúcia enganosa e
fraudulenta! Com “engano dos homens” ele se refere à esperteza pela qual a
agilidade das mãos engana os olhos. É isso que está acontecendo doutrinariamente,
teologicamente, diz o apóstolo. Falsos mestres há muitos. Vocês não devem crer em
tudo por seu valor aparente; não devem supor que, se um homem não diz nada que
seja ultrajantemente errado, ele é um excelente evangélico. Todavia é o que está
acontecendo hoje em dia; não há discriminação. Isso porque os cristãos não estão
“prontos”, não estão “vigilantes”, não estão preparados para as ciladas e para a
astúcia da tática do diabo.

Na Segunda Epístola aos Coríntios Paulo usa a expressão: “Não ignoramos os seus
ardis (de satanás)” (2:11). Ele lhes estava escrevendo sobre o perdão a um homem
que os tinha ofendido, e diz ele que estava fazendo isso, não somente pelo bem
daquele homem, mas também porque sabiaque o diabo está sempre pronto para vir e
tirar proveito da situação. E os seus ardis são muitos. Será que conhecemos a astúcia
de satanás? Sabemos algo sobre as suas ciladas? Reconhecemos a camuflagem
que ele usa com tanta esperteza? Conhecemos os diferentes disfarces e formas com q
ue ele aparece? Se você quer defender-se, tenha os seus pés calçados com esta
prontidão. Você deve estar sempre alerta, sempre vigilante, sempre ciente do que o
inimigo está fazendo.

No entanto não devemos estar somente cientes da sutileza de satanás, mas também da
sua tática variável. A ignorância sobre esse ponto faz com que muitos sejam
derrotados. Às vezes ele muda a sua aparência. Nem sempre ele é comparável a um
leão a rugir. Na Segunda Epístolaaos Coríntios, de novo, no capítulo 11, Paulo
afirmaque o maligno “se transfigura em anjo de luz” (versículo 14). Nem sempre o
diabo aparece feio, hediondo, áspero e cruel. Ele pode ser sumamente agradável,
afável e insinuante. Essas mudanças iludem a muitos. Muitos hoje confundem
afabilidade com santidade. “Tão bom”, dizem, “tão agradável!” “Conversei com o
homem, e ele foi tão amável!” Contudo a questão é: em que ele crê? A questão
importante nesta esfera não é se um homem é bom ou não; a questão é: que é que ele
d iz? Que d iz ele sobre a Bíblia? Que diz ele sobre a verdade? “Ah, mas ele é tão
bom”, dizem as pessoas, “ele nunca diz nada indelicado acerca de alguém!”
“Portanto, ele deve ser um cristão maravilhoso”, diz o crente que não calçou os pés
com a preparação do evangelho da paz.

Mas, o diabo muitas vezes muda também os seus métodos. Às vezes ele vem opondo-
se violentamente a você, e condenando você. No momento seguinte ele o bajula. Às
vezesele inflama as suas paixões para levá-lo a pecar; na próxima vez em que vem,
de maneira muito sutil e sedutora ele atinge o mesmo fim, antes de você saber que
algo aconteceu. Às vezes ele vem e golpeia você na cabeça, porassim dizer,
confundindo-o para levar você a fazer o que ele quer que você faça; doutra vez
ele emprega uma forma razoável e suave de persuasão. O diabo se contradiz; não se
importa com isso. O seu único objetivo é derrubar-nos. Ele se contradiz completa
edesavergonhadamente; que importa? Contanto que acreditemos nele nas duas
ocasiões, ele se dá por satisfeito. Às vezes ele ataca as Escrituras; no momento
seguinte ele as estará citando, como as citou para o nosso Senhor. Num momento ele
vem a nós e nos diz que não somos suficientemente bons para sermos cristãos, noutro
ele nos diz que somos tão bons que não temos necessidade da morte de Cristo
para salvar-nos; as nossas v idas são tão boas que Deus nos aceitará por
nossos próprios méritos. Num momento ele vem e nos diz que temos dejustificar--
nos por nossas boas obras, que nada tem valor para Deus senão as boas obras, e que,
se não vivermos vida virtuosa e não fizermos boas obras, não seremos justificados;
no próximo momento ele virá e nos dirá que as obras não têm a mínima importância;
tão logo digamos que cremos em Cristo e em Seu sangue, podemos sair e fazer o que
quisermos. Antinomismo! Uma hora ele vem ao cristão e diz: “Não se sobrecarregue;
cuidado com a sua saúde, cuide dos seus interesses; leia mais, não faça coisa
alguma”. Na hora seguinte ele vem e nos enche de zelo carnal, e nos faz ficar
tão ocupados que arruinamos a nossa saúde, talvez, ou não temos tempo para ler
nada; e assim perdemos contato com a verdade, e ficamos sem saber onde estamos.
Num momento o freio está solto; no outro, é puro fanatismo. O mesmo diabo nos
tenta nos dois extremos.

Nada importa para o diabo, contanto que ele possa colocar-nos em dificuldade. Num
momento ele vem e nos enche de dúvidas acerca da verdade e da fé; no momento
seguinte ele nos enche de uma credulidade que nos faz prontos para considerar
qualquer coisa como mi lagre, e para esperar “sinais e maravilhas” constantemente.
Ele nos leva a extremos, e fica na maior alegria quando obedecemos ao que ele nos
diz. Num momento ele nos persuade a relaxar, no momento seguinte nos leva a
uma escrupolosidade mórbida, ou faz de nós legalistas atai ponto que ficamos com
medo de mover-nos, porque a lei passou a ser uma idéia fixa para nós.

São estas, pois, algumas das razões pelas quais todos nós temos que estar “calçados
com a preparação do evangelho da paz”. Estamos

combatendo “as astutas ciladas do diabo” eos "principados e potestades”, e a


diabólica engenhosidade disso tudo - a camuflagem, a pintura, o pó, as aparências,
os disfarces, as rápidas mudanças. Há somente uma defesa segura: estar sempre
pronto, sempre alerta. “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação.” Esse é, pelo
menos, o começo do que significa “ter os vossos pés calçados com o equipamento
(com a prontidão) do evangelho da paz”. Queira Deus fazer-nos sábios neste assunto
vital!

MOBILIDADE

“E calçados os pés na preparação do evangelho da paz. "

-Efésios6:15
Em nosso estudo anterior notamos que “ter os pés calçados” significa que devemos
ter firmeza e confiança, e que devemos ser vigilantes. A vida cristã não é uma
sinecura. Os cristãos não se deitam num leito de rosas na expectativa de que o levem
por alguma estrada de ferro celestial para o paraíso. Eles são chamados para
“combater o bom combate da fé”, para “vigiar”, para “fortalecer-se”, para
“ficar firmes”, para portar-se como homens varonilmente. E estamos examinando a
maneira interessante e pictórica pela qual o apóstolo transmite essa instrução.

A nossa próxima aplicação desta “figura” sobre termos os nossos pés calçados com
a preparação do evangelho da paz refere-se a toda a questão da “mobilidade”, que é
outro grande elemento de interpretação da “prontidão”, da “preparação”, do
“equipamento”. Vimos que toda essa idéia de mobilidade na guerra introduziu-se
realmente com Alexandre, o Grande. Depois foi praticada pelos grandes generais
romanos no tempo em que o apóstolo viveu. De fato, muitos dos realmente
grandes comandantes de guerraatribuíam grande significação à mobilidade.
Isso constitui parte do gênio de Oliver Cromwell, precisamente o que fez dele um
general tão notável. Ele repentinamente removia uma parte das suas tropas,
particularmente da cavalaria, no meio de uma batalha; via uma oportunidade, e tirava
proveito dela. Essa era também uma parte importante do gênio de um dos seus
contemporâneos, Montrose, que muitas vezes conseguiu espantosas vitórias com as
extraordinárias marchas que planejava e executava, com as quais desconcertava o
inimigo. O estudo da estratégia militar, usado apropriadamente, pode ensinar muita
coisa ao cristão. O uso que o próprio apóstolo faz desta imagem aqui justifica o
que estamos dizendo. Muita batalha e campanha foi perdida por não ter sido posto
em prática este princípio. Pensem nos Cromwell e nos Montrose, e não nos Douglas
Haig, se quiserem pôr em execução este princípio como deve ser posto, e se
quiserem captar a mensagem espiritual comunicada aqui. Isso é de importância
extraordinária e excepcional hoje, não somente

para o cristão individual, mas, particularmente, talvez, paraa Igreja como um todo,
que, na hora presente, está numa terrível dificuldade. Se não reconhecemos o
pavoroso estado em que a Igreja se encontra hoje, já estamos completamente
derrotados.

A Igreja não tem o mínimo valor na Grã-Bretanha. Não passamos de um d im i nuto


remanescente, apenas uns dez por cento da popu lação. Por que a Igreja está
decaindo? Essa é a questão. E em muitas outras terras é a mesma coisa. Mesmo nas
terras em que parece haver prosperidade religiosa, a verdade é que o que ocorre é
um verdadeiro fracasso. Mesmo nesses países o mal e o pecado aumentam
ostensivamente. Pode haver uma aparência de sucesso, que não é sucesso. É de vital
importância, pois, que encaremos toda essa questão. Não somente precisamos vigiar
o inimigo, temos que estar prontos para impedir cada um dos seus movimentos e
enfrentá-lo onde ele está, não onde achamos que ele deveria estar. Toda esta noção
de prontidão, agilidade, vigilânciae mobilidade é inerente à imagem e figura que o
apóstolo emprega aqui. Noutras palavras, estou salientando a importância da tática.
Não tanto da estratégia, que estou tratando, porém da tática. É justamente nesta esfera
que toda a questão da mobilidade é da maior importância.

Qual será, então, a aplicação espiritual? O primeiro ponto é, evidentemente, que não
devemos ser lentos, não devemos ter os pés pesados, que não haja nada que faça os
pés se arrastarem. Não há nada que seja tão fatal para um progresso vitorioso como
o cristão sem vida, inerte. Perguntem na rua a um transeunte comum por que ele não
vai a um local de culto, por que ele não é cristão, e vocês verão que a resposta que
ele provavelmente lhes dará é que é tudo muito insípido e morto. Ele dirá que não há
coisa alguma na Igreja, não há vida. E é claro que há muita coisa que justifica o que
ele diz. Se vocês simplesmente compararem e contrastarem um espécime típico do
povo do mundo com um espécime típico do povo cristão, verão a base sobre a qual
ele faz aquela afirmação. Vejam o entusiasmo e a agitação dos que assistem ao
futebol sábado3 à tarde no inverno, ou dos que vão às corridas. Ouçam os gritos,
observem a agitação. Vej am as pesoas que vão aos desportos, ou sejam quais
forem os seus interesses! Elas querem estar lá o tempo todo, querem os
melhores assentos, querem que a partida continue sem parar, e ficam decepcionadas
quando acaba o jogo. Contrastem isso com os cristãos que parecem estar fazendo
uma coisa extraordinária quando vão a um local de culto domingo de manhã. Quando
acordam, de manhãzinha, não estão certos

se vão ou não, mas afinal, por questão de dever, resolvem ir-esperando que o culto
não seja muito demorado. Não é essa a situação?

Damos nós a impressão, quando vamos aos nossos locais de culto, de que estamos
fazendoacoisamaismaravilhosaeemocionantedomundo? Estamos vivos? Mostramos
regozijo? Como estamos, em comparação com aquelas outras pessoas? O cristão
parado e sem vida é, em muitos aspectos, uma negação do evangelho em sua
característica mais gloriosa. Ter os pés pesados, mover-se lentamente, mostrar
letargia, ter que ser fustigado e incitado constantemente, e que ser pressionado a
fazer isto e aquilo, em vez de espontaneamente correr para fazê-lo, e alegrar-se
nisso, é uma triste e falsa representação do cristianismo. “Examine-se todo homem.”

Ou vejam a matériadaseguinte maneira. Muitos de nós simplesmente seguem uma


rotina, sem pensar, sem inteligência. Soa estranho dizer isso num período como este
na história da Igreja Cristã, mas na Igreja há muitos que não têm idéia da razão pela
qual estão ali, exceto pelo fato de que foram habituados a freqüentar os cultos. Não
fosse isso, não estariam ali. Nunca pensaram nessas coisas o bastante para romper o
hábito; seguem uma rotina. Há pessoas que não pensam, pessoas sem entendimento,
que não têm amínima idéia do conflito espiritual, não têm a mínima idéia da crucial
importância da Igreja Cristã numa hora como esta. Seguem o mesmo itinerário e
fazem a mesmíssima coisa domingo após domingo, simplesmente como parte da
rotinada vida. Entretanto lhes falta entendimento. É esse o tipo da coisa que o
apóstolo tem em mente. Tais cristãos, é claro, já estão derrotados; são inúteis na
batalha. Não têm valor nenhum no exército. Os cristãos ativos têm que carregá-los
porque eles não conseguem mover-se; não estão prontos para alguma súbita
mudança de tática. Eles são passageiros que temos que levar, e sempre são
um grande empecilho para um exército. Eles têm sido um grande problema em toda a
história das guerras.

Por outro lado, há também muitos que vivem em função das suas próprias atividades
e que não têm ciênciade que há um conflito espiritual. Para eles, o cristianismo é o
que eles fazem. Isso faz parte do perigo de amoldar-se a um tipo. É triste ver pessoas
que recentemente entraram na vida cristã dentro de um curto período de tempo
repetindo frases e chavões. Não têm idéia do que significam; estão apenas imitando
os outros; estão pegando o linguajar, as expressões e as atividades. E isso continua
indefinidamente. Pode-se perceber que elas não estão vivamente conscientes da
verdadeira situação.

Permitam-me admitir com sinceridade que estas exigências estritas

se aplicam a todas as partes da Igreja, tanto aos pregadores como aos membros e
freqüentadores. Não há nada que eu saiba que seja tão completamente oposto ao que
o apóstolo está ensinando aqui como o pregador profissional, o homem que adota
certo maneirismo e certo tom de voz, o chamado tom de voz clerical, e todas as
outras características da “veste” sacral. O profissional no púlpito é uma grande
maldição. Esse homem está realmente combatendo a favor do inimigo. É um traidor
no exército do Deus vivo!

Tenhamos os nossos pés calçados com a preparação do evangelho da paz. Tratemos


de saber o que estamos fazendo. O referido profissionalismo acha-se entre os
liberais, e também entre os evangélicos. Alguns fingem, apresentando um artificial
brilho e entusiasmo, uma espécie de “cristianismo muscular”. Os que procedem
assim estão se amoldando a um modelo. Não estão tendo entendimento, e revelam
uma incapacidade de entender o profundo caráter da vida cristã. E há outros, às
vezes jovens, que tentam parecer puritanos, como se vivessem há trezentos anos, e
que falam na linguagem dos puritanos. Isso é igualmente mau. Vestir um casaco ou
uma máscara ou agir por puro profissionalismo, é exatamente o oposto do que o
apóstolo nos exorta a fazer.

Todas essas coisas são apenas manifestações daquele “estar em paz em Sião”
enquanto uma tremenda batalha está sendo travada. Um cristianismo respeitável ou
formal num tempo como este é inútil. É por isso que a Igreja está decaindo e
exibindo nada mais do que um cristianismo respeitável, “Moralidade com um toque
de emoção”, como Matthew Arnold o descreveu, sem nenhum valor. Não me
surpreende o fato de que o estado em que se acha a Igreja é o que é. Falta
entendimento espiritual, ou, para usar a figura do apóstolo, os pés estão pesadamente
calçados com meras tradições e culto formal. Não há nada daquela mobilidade
e agilidade que são essenciais numa época como esta.

A Igreja atual tem muita semelhança com Davi vestido com a armadura de Saul.
Golias desafia Israel com sua armadura, sua lança e sua espada; e Israel se abala e
treme, e não sabe o que fazer. Todos estão morrendo de medo deste homem que
matou tantos. Então Davi, jovem, simples pastor, chega ao acampamento israelita, e,
movido pelo Espírito de Deus, apresenta-se para responder ao desafio de Gol ias.
Saul e os seus companheiros, sem os pés “calçados com a preparação do evangelho
da paz”, e pensando na velha terminologia em vez de pensarem espiritualmente,
dizem: “Ele parece convencido de que poderá fazê-lo; vamos buscar a armadura de
Saul e colocá-la nele”. Acreditavam que a única maneira pela qual alguém poderia
pelejar com Golias era com a armadura

de Saul. Por isso a colocaram nele. Mas Davi percebeu logo que se fosse vestindo
aquela armadura, seria morto. Mal podia mover-se, a armadura era pesada demais e
grande demais parade, E assim livrou-se dela. “Não vou conseguir lutar usando a
armadura de Saul”, disse ele; “tenho que usar o meu método de combate e, em nome
do Deus vivo, é o que vou fazer.” Pode-se dizer que Davi percebeu a importância de
estar “calçado com a preparação do evangelho da paz”. Ele queria ter mobilidade,
e ser capaz de mover-se rapidamente e responder e reagir a cada movimento de
Golias.

O que quero dizer é que os cristãos muitas vezes entram em dificuldade porque
tentam lutar nesta batalha de um modo do qual não são capazes. Por exemplo, com
freqüência encontro cristãos em dificuldade e dizendo: “Fiz um péssimo papel outro
dia, numa discussão com algumas pessoas acerca de religião; realmente sinto que
causei mais mal do que bem”. “Bem”, eu dizia, “que é que vocês estavam
discutindo?” Eles me contavam que estavam discutindo o evolucionismo ou alguma
outra questão de natureza científica. “Digam-me”, dizia eu, “vocês receberam
instrução e treinamento científicos?” “Ah, não”, respondiam. “Muito bem”, eu
perguntava, “por que vocês entraram nesse tipo de discussão?” Não deviam fazer
isso. Davi recusou-se a lutar usando a armadura de Saul. Se vocês não conhecem o
assunto, não digam nada; ou digam: “Não sei”. Guardem a batalha para aquilo que
vocês conhecem. Insistam sempre em ter o controle sobre o lugar onde a batalha
será travada. Não permitam que os seus amigos vistam vocês com a armadura de
Saul. O dever de vocês é fazer aquilo de que são capazes. Tirem a sua funda e as
suas pedras, e use essas coisas. Não tentem fazer algo que está além das suas forças.

Não somos chamados para defender a totalidade da fé cristã. Homem nenhum pode
fazer isso em todos os pontos. Limite-se ao terreno conhecido. Certifique-se de que
os seus pés estão calçados com “a preparação do evangelho da paz”. Você precisa
ter mobilidade, precisa ter liberdade de ação por todos os meios e sem nenhum
impedimento. Não deve estar calçado com pesadas botas com as quais mal
conseguirá mover-se e que vão obrigá-lo a passar todo o tempo de que
dispõe observando os seus pés e estudando como irá mover-se. Essa é a
verdade fatal relacionada com o profissionalismo. Toda a tragédia hoje é que
a Igreja Cristã está se movendo pesadamente, lentamente, arrastadamente, enquanto o
mundo está nas garras do diabo. Ela se dedica a nomear comitês para investigar os
problemas, comissões para examinar diversas situações, e fica solicitando relatórios
parciais e finais, com o prazo de um

ano, ou talvez vários anos, que depois serão analisados. E ela faz isso enquanto o
mundo arde em chamas, as pessoas estão indo para o inferno e o diabo age
ostensivamente em toda parte!

Causa surpresa que o inundo esteja como está? Os nossos pés não estão calçados
com a preparação do evangelho da paz. Vocês nunca poderão combater o diabo
dessa maneira. Temos que combatê-lo seguindo o método que Deus ensinou, por
mais ridículo que possa parecer ao homem moderno. Lembrem-se de quão ridículo
Davi pareceu a Gol ias e também a muitos de Israel. Um simples rapaz! Golias,
vocês se lembram, trovejou porcimadele,e achavaque virtualmente iacortá-
lodaexistência com o sopro das suas narinas. Não obstante, quem foi morto foi
Golias. Assim é q ue a Igreja Cristã precisa estudar este texto particu lar com mu
ita urgência. Quando será que a Igreja de Deus vai acordar e compreender que a sua
força não está no número dos seus membros mas em sua relação com Deus e em sua
capacidade de responder positivamente a cada sugestão do Senhor, a cada estímulo
que dEIe venha, a cada um dos Seus movimentos? Não devemos ser lerdos, nem
estar com pés pesados.

Mas vejamos isso de maneira mais positiva. Estou insistindo no vital princípio da
adaptabilidade, da elasticidade e da tática. Bem sei que isso pode ser mal
interpretado, e está sendo mal interpretado atualmente, por muitos, pelo que devemos
ser cautelosos. Fundamentalmente o combate é sempre o mesmo. Em todas as épocas
e gerações, tanto no século primeiro como no século vinte, a luta é contra o diabo e
os principados e potestades. Fundamentalmente não há mudança. Portanto,
precisamos da mesma estratégia essencial em todas as ocasiões e em todos
os lugares. Precisamos de duas coisas ao mesmo tempo. Devemos ter firmeza e
mobilidade. O problema é que, ou somos firmes demais -tão firmes e sólidos que
somos inúteis - ou então nos agitamos tanto que rompemos as fileiras, e não
hácoesão nem disciplina. Em ambos os casos, quem vence é o inimigo. Poderíamos
ilustrar isso até em termos de cânticos, do canto congregacional. Alguns estão
sempre adiante da congregação reunida, outros se arrastam e se atrasam em cada
verso. Ambos estão errados. O exército tem que marchar como uma unidade.
Vocês precisam terfirmeza,etodavia rapidez, mobilidadeeadaptabilidade.

Apesar de acentuarmos desse modo a necessidade que vocês têm de adaptabilidade,


é muito importante que a adaptabilidade esteja sempre dentro dos limites da
verdade. Nunca devemos mover-nos indo além da verdade. “Faça-se tudo”, dizem as
Escrituras, “decentemente e com ordem” (1 Coríntios 14:40). Os nossos métodostêm
que corresponderá nossa mensagem, e não precisamos tomar a opinião de algum
jornalista

ateu a respeito; mas sim, ajamos baseados na sabedoria do Novo Testamento e dos
santos através dos séculos. Não estamos interessados na arte pela arte, e na
modernidade e nas novidades, porém na adaptabilidade que, não obstante, está
sempre ligada fielmente ao ensino fundamental. À semelhança da calhandra de
Wordsworth, devemos ser-

Qual calhandra que voa, e não se perde, fiel Aos familiares pontos do lar e do céu!

Vocês podem “voar”, entretanto sem jamais “perder-se”, sem vagar errantes. Noutras
palavras, este cristão tem os pés firmes no chão e, contudo, move-se. Não é tolo, não
“perde a cabeça”, não abandona os seus princípios, em seu entusiasmo para fazer
algo e na tentativa de converter pessoas.

Adaptabilidade significa que temos de nos acautelar contra uma escravizadora


aderência às velhas formas. Isso é sempre uma tentação. Um dos problemas da Grã-
Bretanha na Primeira Guerra Mundial foi que seus generais e líderes eram velhos
homens da cavalaria que não conseguiam desfazer-se da idéia de que uma guerra
tinha que, necessariamente, ser feita pela cavalaria. Alguns deles não aprenderam a
lição até o fim da guerra - daí o terrível massacre que ocorreu. Com as
mentes rigidamente presas à sua velha escola, achavam que estavam travando uma
outra Guerra dos Boers. Não tinham compreendido que se tratava de um tipo
comçletamente novo de guerra. Assim vocês têm os seus Passchendaeles. E essa
tendência ainda continua. Um dos maiores problemas daúltima guerra mundial foi
amentalidade da França. Pensava na Linha Maginot. Não se devia fazer nenhum
movimento. A inexpugnável Linha Maginot ia bloquear o avanço do inimigo, nada
poderia passar por ela, tudo tinha que permanecer estático - foi desse modo o
combate na Segunda Guerra Mundial. Foram essa mentalidade e esse
pensamento que causaram o colapso e a queda da França, e a seguir quase o
colapso e a queda de todo o mundo livre. O governo francês e os generais
não quiseram ouv ir o General de Gaul le, que tinha escrito um 1 ivro
assinalando que a próxima guerra seria uma guerra de movimento, que a
mentalidade presa à Maginot era fatal, que seria uma guerra de tanques e movimento
# r - n T-
Guerra dos Boers, ou dos Bures ou dos Bôer; variantes registradas por Caldas
Aulete. Refere-se à guerra dos colonos de origem holandesa no sul da África £ J
899-1902). Nota do tradutor.

Cidade de Flandres, onde, em 1917, as forças britânicas sofreram reveses. Nota do


tradutor.

-veículos blindados em abundância-e que, a menos que compreendessem isso,


estariam perdidos. Ele escrevera esse livro vários anos antes da guerra; mas foi
ridicularizado.

Poderíamos ir mais longe com as nossas ilustrações. Agora nos defrontamos com a
guerra nuclear; e não devemos pensar mais em termos de mu ltidões de homens e de
coragem pessoal. A próxima guerra será nuclear, e temos que compreender isso e
adaptar os nossos métodos. Não devemos esperar que poderemos combater na
próxima guerra com os métodos da Primeira Guerra Mundial. A estratégia
fundamental não deve ser mudada, os princípios básicos pertencentes à tática não
devem ser abandonados, porém é preciso ser adaptável.

Seria a Igreja Cristã adaptável? Como eu vejo as coisas, a tragédia é que parece que
ainda estamos apegados às formas e aos métodos dos vitorianos. Não existe nada
mais extraordinário do que ver homens que abandonaram o evangelho hámuito
tempo, ainda apegados aos métodos, formas e cerimonial dos vitorianos. Não é de
admirar que o povo não freqüente mais as igrejas. As pessoas que se esqueceram do
evangelho, ainda se agarram aos velhos métodos e formas; e o mundo zomba disso. A
coisatodaé ridicularizada. E, na verdade, não temos direito de queixar-nos disso.

Não quero ser injusto, deixem-me dar equilíbrio àminhaexposição. Não vamos lutar
neste moderno combate com sucesso repetindo os sermões dos puritanos palavra por
palavra, nem adotando as suas classificações e sub-divisões e a sua maneira de
pregar. Isso seria fútil. Devemos aprender e apegar-nos aos velhos princípios, mas
devemos aplicá-los e usá-los de maneira atualizada. Perdoem-me uma
referência pessoal. Vou fazer o que o apóstolo Pau lo fez no capítulo onze da
Segunda Epístola aos Coríntios. Vou ser um tolo, e dizer algo sobre m im
mesmo. Lembro-me de que, no ano em que comecei a pregar, eu estava pregando num
culto e tinha comigo um velho pregador de mais de oitenta anos de idade. Tendo
visto o meu pobre esforço, e tendo me ouvido pela primeira vez, o ancião fez este
comentário que me animou grandemente. Disse ele: “Embora você seja jovem, está
pregando as velhas verdades que tenho tentado pregar a m inha vida inteira”. Ele
continuou: “Você está pregando as velhas verdades, porém as está vestindo com um
terno bem moderno”. É isso que estou tentando dizer. Precisamos das velhas
verdades num terno moderno. Vocês não devem vesti-las com a velha e fixa
terminologia ou maneira ou método que eram apropriados no passado. No momento
em que nos tornamos escravos de qualquer sistema - não importa quão bom ele tenha
sido em sua época e em sua geração - já

estamos derrotados, porque perdemos completamente este princípio de


adaptabilidade. Por isso não precisamos de gravações, nem mesmo dos puritanos!
Necessitamos da verdade que foi pregada pelos puritanos, todavia pregada de
maneira que mostre a sua relevância, sua adaptabilidade às situações modernas mais
urgentes. Não permita Deus que os nossos métodos neguem a mensagem que estamos
tentando pregar, quer imitando os mais recentes métodos de entretenimento mundano,
quer pelos métodos que são tão arcaicos que tornam a nossa mensagem irrelevante.

Para expor a questão em termos diferentes, o perigo está em concentrar-nos em


velhos problemas, em vez de concentrar-nos em problemas atuais. A Igreja Cristã
ainda está combatendo em ações de retaguarda. A impressão que os jornais dão do
cristianismo é que ele não passa de um protesto contra a abertura de casas de
diversão, ou contra a profanação do descanso semanal, ou contra isto ou aquilo -
sempre protestando, sempre negativa. Não se pode esperar que as pessoas venham
ouvir o evangelho, se pensam que o cristianismo não é nada, senão negação, ou
protesto negativo. Mas essa é a impressão dada. Há cem anos, quando a Igreja era
poderosa e podia influenciar governos, os seus protestos realmente produziam efeito.
Mas hoje, quem dá ouvidos às resoluções das assembléias da Igreja? Vocês
imaginam que algum governo dá a menor atenção à Igreja? Naturalmente que não! E
o povo em geral está desinteressado.

Tampouco devemos tratar dos problemas errados. Com muita freqüência o homem do
púlpito prega sobre os seus problemas, não sobre os problemas do povo. Em
decorrência de sua leitura de filosofia, ele fica com certos problemas filosóficos, e
traz esses seus grandes problemas filosóficos ao púlpito. Mas não são problemas das
pessoas que o ouvem; e é dever do pregador pregar para as necessidades das
pessoas que vão ouvi-lo.

Há aqueles que pensam que o problema por excelência da Igreja hoje é o problema
da unidade. Por isso dedicam a ele todo o seu tempo e toda a sua atenção. Parece
que não lhes importa que as pessoas vão para o inferno, estão sempre pregando
sobre a unidade e escrevendo livros sobre esse assunto. “A Unidade da Igreja” é o
seu evangelho. No entanto, isso nunca salvou ninguém. Se todas as igrejas do mundo,
a igreja católica romana inclusive, se unissem, e se pudéssemos dizer que
agoratínhamos uma grande igreja mundial, aventuro-me a profetizar que isso não
faria a menor diferença para o homem da rua. Ele não está fora das igrejas porque as
igrejas estão desunidas, está fora porque gosta do seu pecado,

porque é pecador, porque ignora as realidades espirituais. Ele não está mais
interessado neste problema do que estaria em conhecer a lua! E, contudo, a Igreja
fala sobre o problema da unidade como se fosse o problema central. E enquanto
ficamos falando sobre o problema da unidade, o diabo está obtendo as suas vitórias,
está conquistando pessoas individuais, e toda a posição da Igreja está abalada. A
unidade não é o primeiro problema, nem o maior.

De igual maneira, muitos evangélicos estão combatendo o que podemos chamar “o


velho modernismo”. Hoje combatemos um novo modernismo. O problema atual não
é tanto que as pessoas estejam dizendo coisas que não são verdadeiras. É um fato
que fazem isso, mas o maior problema é que agora elas dizem que o que você diz não
tem a mínima importância. Há cinqüenta anos havia o problema da
chamada novateologia, de R. J. Campbell. O que ele dizia sobre a Pessoa de
Cristo era o problema urgente. E foi corretamente enfrentado e denunciado pelos
valentes daquela época. Contudo, houve grande mudança. Hoje em diaa atitude de
muitos da Igreja é que o que você crê não importa, contanto que você se declare
cristão. O fato de alguém não ver a verdade acerca da deidade de Cristo não
importa, contanto que ele esteja procurando fazer o bem e apresentar a ênfase cristã
sobre a arte, a educação, a política, a indústria etc. Atualmente nos defrontamos com
esta posição, que o que você crê não é importante. Creia no que quiser; desde que
você se declare cristão, está tudo bem. Estaremos nós enfrentando o
problema errado?

Noutras palavras, hoje o inimigo é a complacência. O inimigo no momento é um


idealismo sentimental indescritível que está passando por cristianismo. Princípios
vitais são considerados como desnecessários. A afabilidade passa por piedade. O
homem que se idealiza hoje é um agregado de negativas. A ausência de qual idades
constitu i a grandeza de hoje. Não se crê mais na verdadeira grandeza. Não se crê na
bondade, na varonilidade, na própria verdade. O homem popular é o
homem maneiroso, fino, afável. Há, contudo, algo de rude na verdade. Vejam
o apóstolo Paulo, este homem que permanece firme, que fala com ousadia e que
denuncia os hereges como inimigos da verdade. “Estes homens”, d iz ele, “são
inimigos da cruz de Cristo, cujo Deus é o ventre, e cuja glória é para confusão
deles.” “Como é terrível”, d iz o homem moderno, “falar dessa maneira!” Mas é
assim o apóstolo Paulo. O problema é que o diabo nos persuadiu de que amabilidade
é piedade. Lembrem-se de como a serpente “enganou Eva”, diz o apóstolo.

Pois bem, o apóstolo não nos d iz somente que devemos estar prontos

e preparados; ele acrescentaque a prontidão é produzida pelo "evangelho da paz”,


porque sem essa paz não podemos fazer nada. Qualquer incerteza que haja no cristão
tende ao fracasso e ao desastre. Esdras e Neemias dizem bem: “A alegria do Senhor
é a vossa força”. O salmista também diz: "Correrei pelo caminho dos teus
mandamentos, quando dilatares o meu coração” (119:32). Assim diz Paulo que temos
esta mobilidade eadaptabilidadeecapacidadeparaavigilânciacomo resultado do
evangelho da paz. O evangelho da paz significa, primeiramente, paz com Deus. Esta
sempre nos deixa preparados. Se eu tiver algum dúvida acerca da minha salvação,
não serei capaz de combater o inimigo. Terei que passaraminhavida inteira lutando
comigo mesmo. Osoldadotem que ter claro entendimento de certas coisas; e o cristão
tem que ter claro entendimento da sua relação com Deus. “Sendo, pois, justificados
pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo; pelo qual também temos
entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes” (Romanos 5:1-2). Somente
quando temos claro entend imento do fato fundamental de que os nossos pecados
estão perdoados e de que fomos reconci liados com Deus, é que Deus, por Sua
graça, pode realizar a Sua obra de santificação em nós. Paulo, em 1 Tessalonicenses
5:23, diz: “E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e
alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso
Senhor Jesus Cristo”. Quando Deus nos faz isso, somos habilitados a combater o
inimigo; e é como o “Deus de paz” que Ele realiza a obra.

A Epístola aos Hebreus diz a mesma coisa no capítulo 13, versículos 20-21: “Ora, o
Deus de paz, que pelo sangue do concerto eterno tornou a trazer dos mortos a nosso
Senhor Jesus Cristo, grande pastor das ovelhas, vos aperfeiçoe em toda a boa obra,
para fazerdes a sua vontade, operando em vós o que perante ele é agradável por
Cristo Jesus, ao qual seja glória para todo o sempre. Amém”. Paz com Deus! Se
você não tem isso, é um pobre soldado do exército do Deus vivo. Provavelmente
você foi acidentado. Seria melhor você ser enviado para trás das linhas, para algum
posto de recuperação, ou mesmo para algum hospital.

Mas também é preciso ter paz interior. É preciso que eu saiba que "todas as coisas
contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são
chamados por seu decreto” (Romanos 8:28). Similarmente devo crer no que Paulo
diz aos filipenses, no capítulo 4, versículo 6 dessa Epístola: “Não estejais inquietos
por coisa alguma”; quer dizer, não tenha preocupações. Se, como soldado do
exército de Deus, você está inquieto, preocupado talvez com o que esteja
acontecendo em casa, você é um pobre soldado. Você tem que se concentrar

inteiramente na luta contra o inimigo. “Não estejais inquietos por coisa alguma, antes
as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e súplica,
com ação de graças. E a paz de Deus, que excede todo o entendimento, guardará os
vossos corações, e os vossos sentimentos em Cristo Jesus.” Necessitamos ter paz
interior. Todavia, também é preciso que sejamos pacíficos, é preciso que sejamos
brandos, magnânimos e pacientes. Não devemos ser cristãos preocupados, ansiosos,
perturbados e frenéticos. Por isso grande parte do tempo do exército cristão é
utilizado para manter as tropas saudáveis e sentindo-se bem. “Estou preocupado com
isto”, diz um; “Estou em dificuldade, e tudo é um fardo e um problema”, diz outro.
Como poderão vocês combater o diabo, se ele já os derrotou dessa maneira? Paz
interior, bem como paz com Deus, é essencial.

E finalmente, paz com os outros: “Quanto estiverem vós”, diz Paulo em Romanos,
capítulo 12, versículo 18, “tende paz com todos os homens”. “Quanto puderdes e
quanto for possível”, é o que Paulo insiste que eles façam. “A ninguém torneis mal
por mal; procurai as coisas honestas, perante todos os homens... Não vos vingueis a
vós mesmos, amados, mas dai lugar à ira, porque está escrito: Minha é a vingança,
eu recompensarei, diz o Senhor. Portanto, se o teu inim igo tiver fome, dá-lhe de
comer; se tiver sede, dá-lhe de beber, porque, fazendo isto, amontoarás brasas de
fogo sobre a sua cabeça. Não te deixes vencer do mal, mas vence o mal com o bem.”
Se os membros do exército do Deus vivo estiverem lutando uns contraos outros, que
esperança terão na luta contra oinimigo?Nãolhes será possível vencê-lo. O apóstolo
repete esse ensino na Epístolaaos Filipenses, capítulo 2: “Completai o meu gozo,
paraque sintais o mesmo, tendo o mesmo amor, o mesmo ânimo, sentindo uma mesma
coisa. Nada façais por contenda ou por vangloria, mas por humildade; cada um
considere os outros superiores a si mesmo. Não atente cada um para o que é
propriamente seu, mas cada qual também para o que é dos outros” (versículos 2-4).
É assim que se combate o inimigo. Se formos ciumentos, invejosos e egoístas, só
interessados em nós mesmos, desatentos ao bem-estar dos outros, não haverá
esperança. Não haverá disciplina, não haverá coesão. Devemos ser exatamente
o oposto da igreja de Corinto, que estava dividida em grupos e facções. Devemos
obedecer à exortação que Paulo faz aos colossenses, no capítulo 3, versículo 13
dessa Epístola: “Suportando-vos uns aos outros, e perdoando-vos uns aos outros, se
algum tiver queixa contra outro; assim como Cristo vos perdoou, assim fazei vós
também. E, sobretudo isso, revesti-vos de amor” - vistam-se com o amor - “que é o
vínculo da

perfeição. E a paz de Deus, para a qual também fostes chamados em um corpo,


domine” - ou seja o árbitro - “em vossos corações; e sede agradecidos”.

Essa é a “preparação do evangelho da paz”! Procurem estar calçados dessa maneira!


Certifiquem-se de que têm paz com Deus, paz no coração, paz uns com os outros.
Que a paz de Deus seja o árbrito, atue como juiz, entre vocês como membros deste
grande exército; a fim de que, juntos, e por amor do Seu glorioso nome, vocês
possam enfrentar o inimigo e vencê-lo, e conquistar estrondosas vitórias para o seu
bendito Senhor e Salvador, o Capitão da nossa salvação.

VA: “preparation”, preparação; variantes citadas pelo autor: “preparedness” ou


“readiness”, prontidão. Nota do tradutor.

Como alguém que está bem vivo, que é forte. Em latim no original. Nota do tradutor.

3
: Na Grã-Bretanha a maioria dos jogos de futebol acontece aos sábados à tarde.
22
O ESCUDO DA FÉ

“Tomando sobretudo o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos
inflamados do maligno. ” - Efésios 6:16

Passamos agora a considerar ainda outra peça desta “armadura de Deus”, que o
apóstolo lembra aos efésios que é tão essencial para uma guerra vitoriosa contra o
diabo e contra “os principados, contra as potestades e contra os príncipes das trevas
deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais”.

Observemos primeiro que, quando o apóstolo introduz esta quarta peça da armadura,
há uma espécie de ruptura. Ev identemente, chegamos a um ponto de transição.
“Tomando”, diz ele, “sobretudo o escudo da fé”. As peças desta armadura, como
indicamos ao introduzir o assunto em geral, podem ser divididas em dois grupos
principais; ejá tratamos do primeiro grupo. Agora, ao passarmos ao segundo,
veremos que em certos aspectos as partes deste diferem das do primeiro. O apóstolo
chama a atenção para este fato dizendo: “Sobretudo”.

Quanto à interpretação dessa palavra, a tendência é tomá-la no sentido de “acima de


tudo mais em importância”, como na tradução da Versão Autorizada (inglesa). Mas
realmente significa “em acréscimo a tudo”, quer dizer, em acréscimo às três partes
da armadura que já mencionei. Além do mais, “sobretudo” introduz tudo o que vem a
seguir - não somente “o escudo da fé”, porém também “o capacete da salvação” e “a
espada do Espírito”. É uma introdução geral para a apresentação que Paulo nos faz
dessas partes adicionais.

Também devemos notar outra maneira pela qual ele chama a nossa atenção para a
diferença. Até aqui ele tinha feito uso da palavra “tendo” (oraexplícita, ora
implícita). “Estai, pois, firmes”, dizele, “tendocingidos os vossos lombos com a
verdade, e (tendo) vestida a couraça da justiça; e (tendo) calçados os pés na
preparação do evangelho da paz”. E agora ele muda a palavra. “Tomando”, diz ele,
não “tendo”, “sobretudo o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos
inflamados do maligno.” “Tomai também o capacete da salvação”, “e (tomai)
a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”. A diferença entre as três partes que
vêm e as três já mencionadas é a diferença entre “tendo” e “tomando”.

Com isso sugerem-se duas coisas importantes. As três primeiras partes da armadura
são peças que se prendem de maneira especial ao corpo. Vimos que esse é o caso do
cinto; é algo que se coloca fixamente; você como que o grampeia e o coloca firme na
posição certa. A mesma coisa com a couraça da justiça - você a coloca fixamente
sobre si. E, é óbvio, pode-se dizer o mesmo das sandálias.
As três primeiras partes da armadura são presas firmemente desse modo especial, e
assim ficam imóveis. Mas, no caso das três partes subseqüentes, a diferença é óbvia.
Você não fixa o escudo no corpo; é algo que fica separado de você. Você o toma e o
usa, porém ele não fica ligadoao seu corpo. Aplica-se o mesmo ao capacete, que era
semelhante a um quepe que se punha na cabeça e se tirava facilmente. E é
evidente que a espada não faz parte de nós, mas é algo que empunhamos e
usamos quando necessário. Isso mostra porque o apóstolo dispensa o termo
que estava empregando, “tendo”, e diz “tomando”. Você “tem” aquelas outras peças
colocadas, sempre; entretanto “toma” o escudo, a espada e o capacete e os utiliza.

Mais uma diferença, diferença que na verdade redunda da primeira, é que as três
primeiras partes são mais ou menos passivas e preparatórias; o soldado as veste e as
mantém no corpo. Todavia, quando chegamos ao segundo grupo, imediatamente nos
vem a idéia de atividade. O soldado pode estar sentado em seu alojamento no
quartel, aproveitando um período de repouso, mas continua com o seu cinto da
verdade, a sua couraça da justiça e as suas sandálias. Então, de repente soa o
alarme, avisando que o inimigo já está atacando, e ele imed iatamente toma o
seu escudo e a sua espada, põe o quepe, e sai correndo. A idéiaé de atividade, de
uma lutae uma batalha reais. Você não tem nas mãos o escudo, quando está
descansando; você o põe nalgum lugar, e faz o mesmo com a espada. Contudo, no
momento em que o inimigo torna a entrar em ação e há uma peleja, você tem que
tomar essas coisas para estar pronto para a batalha.

Devemos dizer algo sobre o escudo propriamente dito, porque o apóstolo está
transmitindo uma verdade espiritual por meio destas figuras e analogias, e o seu
desejo é que as examinemos em detalhe. O escudo utilizado pelo soldado romano,
aquém Paulo está tomando como exemplo, era muito grande. Estamos acostumados a
pensar em escudos de menor tamanho; mas os que eram usados naquela época tinham
cerca de um metro e vinte centímetros de comprimento por oitenta centímetros
de largura. A idéia original era de uma porta que você segurava em sua frente, e atrás
da qual podia ficar oculto. Mais tarde ele foi modificado, tomando forma oblonga;
todavia ainda se destinava a cobrir a maior parte

do corpo. Mais importante ainda, porém, é o fato de que este escudo tinha uma
cobertura de metal à prova de fogo, cujo significado logo se vê. O escudo era de
madeira, mas tinha um forro de metal à prova de fogo sobre a sua superfície, para
que, quando você o segurasse para enfrentar o inimigo que estivesse atirando dardos
em chamas em você, os dardos atingissem esse forro de metal à prova de fogo.

Evidentemente, a idéia é que, em acréscimo à couraça já colocada, o cinto nos


lombos e os pés calçados, você tem que se proteger de maneira mais geral. Você
precisa do escudo para proteger-se das coisas que podem ser arremessadas contra
você preliminarmente, antesdco inimigo vir em pessoa, espada na mão, e o atacar
ainda mais diretamente. É evidente que é essa a figura que se quer comunicar.

Diz o apóstolo que o escudo é necessário para “apagar todos os dardos inflamados
do inimigo”. Os “dardos inflamados” explicam-se a si mesmos. Eram de madeira ou
de metal, mas a sua característica principal era que tinham uma ponta aguda. Eram
como flechas ou setas. Eram feitos de um material que fora embebido numa
substância inflamável. Depois esse material, impregnado dessa substância
inflamável, era enrolado na ponta do dardo, bem apertado, até ficar firmemente
na posição. Depois, quando já estavam prontos para atacar o inimigo, tocavam fogo
nesse material inflamável, para que ficasse em chamas, e atiravam os dardos em
direção ao inimigo. Se um desses dardos penetrasse, as chamas aumentariam,
queimariam uma parte do corpo do inimigo e o punham fora de combate. Dessa
maneira preparavam o caminho para o ataque em massa das tropas do inimigo, seu
oponente.

Os soldados costumavam lançar estes dardos sobre o inimigo em grande profusão,


de todas as direções concebíveis, para causar confusão. E, tendo preparado o
caminho desse modo, as tropas avançavam. Essa era a maneira antiga de fazer o que
nas guerras modernas se conhece como barragem preliminar de fogo, a fim de
preparar para o avanço da infantaria. Ou se pode pensar no bombardeio preliminar
que se costumava fazer na Segunda Guerra Mundial.

Segundo a Versão Autorizada (inglesa), esses dardos são lançados sobre nós pelos
“ímpios”; mas essa tradução não é feliz. No original a palavra significa “o iníquo”,
“o maligno” (como se vê na Versão de Almeida). A tradução exata é particularmente
importante aqui, porque o apóstolo nos tem lembrado que não combatemos o “mal”,
considerando-o como algo abstrato ou impessoal. Ele já tinha afirmado que
somos confrontados pelas “astutas ciladas do diabo”, e não somente pelo diabo, mas
também “pelos principados, pelas potestades, pelos príncipes das

trevas deste século, pelas hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais”.
Tudo o que ele se propõe a dizer é que estamos lutando contra pessoas, poderes,
seres espirituais. E se alguma vez foi necessário dar ênfase a isso, é no presente.
Como já assinalamos, o mundo não acredita mais no diabo, menos ainda em seres^e
entes espirituais. O mundo não acredita em anjos nem em demônios. Essa é uma das
principais causas dos seus problemas.

O “maligno” é o diabo, e ele domina e comanda uma diversidade de poderes e


agentes. Nunca foi mais importante compreender que estamos envolvidos numa
tremenda guerra espiritual. Cremos no Deus triúno, o Pai, o Filho e os Espírito
Santo, Três Pessoas numa Deidade. Deus é um Ser pessoal. Não é uma força ou um
poder. Tampouco as forças que militam contra nós são simples força ou poder; pelo
contrário, são instrumentos pessoais em ação, inteligências pessoais. Como
assinalei muitas vezes, não começaremos a entender o problema da vida neste mundo
nos tempos atuais, se não entendermos este ensino. Sem este entendimento, não
entenderemos a nossa própria experiência pessoal, e entenderemos menos ainda o
estado e as condições gerais do mundo. Não estamos lutando apenas contra “carne e
sangue”. O que temos de combater, o nosso problema, não é meramente o homem e o
seu pecado e o mal que nele há. Por trás do homem estão estes poderes
infernais, estes agentes demoníacos, estes entes espirituais. Não existe
nenhuma questão teológica, e também prática, mais importante do que a questão
da “Origem do Mal”. Não se deve pensar no mal e na iniqüidade como algo abstrato.
Todo o ensino da Bíblia é que o mal é manipulado e propagado por estes seres, estes
entes, estas pessoas. O nosso Senhor teve que enfrentar o diabo, umapessoa,
natentação no deserto. Assim, é de grande importância que demos às palavras do
apóstolo esta tradução: “podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno”.

Háumaafirmaçãoparecidanoversículodezenovedocapítulocinco da Primeira Epístola


de João. De novo se vê uma tradução pobre na Versão Autorizada, que se lê:
“Sabemos que somos de Deus, e que todo o mundo está na iniqüidade”. Isso,
naturalmente, é verdade, porém o que 1

o apóstolo escreveu foi: “todo o mundo está no maligno” (outra vez, como o traduz
Almeida), nos braços de satanás, aquele que o Senhor Jesus Cristo descreveu como
“o valente armado” (Lucas 11:21). Temos que descartar-nos da idéia do mal
abstrato: não existe tal coisa. O mal é um ser pessoal. Não haveria mal no mundo se
não houvesse pessoas más; não haveria seres humanos maus se não houvesse seres
espirituais maus que entraram na criação de Deus e tentaram e seduziram o homem,
levando-o à calamidade da Queda. O estado em que o mundo se encontra
hoje, caracterizado pelo mal, provém daquela calamidade.

Mas agora vamos retornar à aplicação espiritual do nosso tema. O apóstolo está nos
dizendo que devemos estar preparados para o que podemos descrever como
investidas e ataques satânicos que por vezes podem ser extraordinariamente cruéis e
ferozes. Somando-se a todas as outras atividades e a todos os recursos e
instrumentos que ele emprega, o diabo utiliza estes dardos inflamados. É o que são;
eles pegam fogo e são muito destrutivos.

Entender isso é de vital importância para nós em nosso combate espiritual. Muitos
mestres da vida espiritual descreveram esses ataques em detalhe. Os exemplos mais
conhecidos são Martinho Lutero e João Bunyan. Não houve outros dois escritores
que tratassem mais especificamente nem mais claramente deste aspecto do combate
cristão do que aqueles dois homens. A maioria dos cristãos já ouviu a famosa
história de Lutero e o seu tinteiro, e como ele o atirou no diabo. Ele estava
sentindo intensamente a presença do diabo em seu quarto, e não conseguia livrar-se
dele. Fizesse o que fizesse, o diabo continuava lançando os seus dardos sobre ele.
João Bunyan, a seu modo, testifica uma experiência semelhante.
Mas, que dizer das nossas experiências? Não sabemos algo do que é, quem sabe,
acordar de manhã cedo e ver que, antes de termos tempo de fazer alguma coisa, nos
vêm pensamentos, pensamentos maus, talvez até pensamentos blasfemos? Você não
estava pensando, não estava fazendo nada, tinha acabado de acordar; no entanto, de
repente os dardos o atingem. É isso que Paulo quer dizer com “os dardos inflamados
do maligno”.

E importante que compreendamos isto, porque faz parte da estratégia do inimigo


impedir que entendamos que ele é a causa disso. Ele quer que acreditemos que todas
estas coisas se originam em nós mesmos, e então nos persuade de que, em
conseqüência, só podemos ser pessoas muito más, sem nenhum direito de chamar-
nos cristãos. É assim que ele nos lança nas profundezas do desespero e do desalento
acerca de nós

mesmos. Portanto, nada é tão vital para nós quanto aperceber-nos de que é o diabo,
com os seus dardos inflamados, que é responsável pelas condições em que nos
encontramos, Mas vamos considerar alguns exemplos disso. Acaso vocês já não
viram que, quando se empenhavam na oração ou tentavam orar, estes dardos vieram
de todas as direções sobre vocês? Quando o seu único desejo era concentrar-se em
Deus, no culto, na oração e na adoração, vocês se viram cheios de todos
estes pensamentos, idéias e noções que os levaram a distrair-se e que talvez sejam
maus. De onde vieram?

Porventura vocês não têm experimentado isso também quando estão lendo a BTblia?
Podem ler um jornal e concentrar-se nele, mas quando começam a ler a Bíblia,
pensamentos e idéias vêm de todas as direções, e vocês vêem que é quase
impossível concentrar-se. De onde vêm? São “os dardos inflamados do maligno”. O
ponto que devemos captar é que, evidentemente, eles vêm de fora de nós mesmos.
Não são gerados por nós; vêm a nós. Eles nos atingem. Damos prova de alguma
percepção disso com expressões como, “de repente me atingiu”, ou “o
pensamento me veio”, e assim por diante.

Podemos acrescentar ainda mais este ponto, que há uma curiosa periodicidade
quanto a estas experiências. Não estão conosco permanentemente, porém podem
acontecer a qualquer momento. Mas há vezes e ocasiões em que o inimigo é
extraordinariamente ativo, neste aspecto. A analogia das ações de guerra é muito útil
aqui. Na Primeira Guerra Mundial, em particular, quando se praticavam combates
com o uso de trincheiras, havia dias em que dominava a calmaria. O inimigo
continuava ali, e você não podia permitir-se correr nenhum risco. Se você
se expusesse, seria baleado, todavia em geral havia uma calmaria, não acontecendo
nada demais. Então, de repente, vinha uma barragem de fogo das linhas do inimigo.
Algo comparável a isso acontece na esfera espiritual. Nunca se sabe o dia em que
aquilo vai se manifestar. O fato de você ter tido um maravilhoso dia de bênção não
garante que estará tudo bem amanhã. Essa pode ser justamente a ocasião em que o
diabo subitamente lançará em você os seus dardos de todos os tipos, espécies e
formas, e de todas as direções concebíveis. Ele pode continuar fazendo isso durante
dias. Tais acontecimentos podem ser definidamente classificados como ataques
satânicos. Há vezes em que o inimigo se concentra em cristãos individuais, em
igrejas cristãs ou em segmentos da Igreja Cristã, q uase em países inteiros às vezes
e, dessa mane ira mal igna, e le faz o máximo que pode para destruir a obra de Deus
arremessando contra nós estes “dardos inflamados”. Estes dardos podem tomar
quase qualquer

forma. A mais comum é relacionada com os pensamentos. O diabo nos atira dúvidas.
Alguns dos maiores santos foram atormentados de tempos em tempos por horríveis
pensamentos. Estes eram lançados sobre eles, os pensamentos entravam em suas
mentes; sugestões, interrogações, questões surgiam. Eles não as desejavam, faziam o
máximo para expulsá-las; mas ainda vinham e se acumulavam nas suas mentes.
Muitos dos maiores santos testificaram tais tentações.

Pois bem, há uma coisa pior ainda! Muitas vezes o diabo atormentou alguns dos mais
nobres santos com pensamentos blasfemos-pensamentos blasfemos acerca de Deus,
pensamentos blasfemos acerca do Senhor Jesus Cristo. Horrível, terrificante! E,
como expliquei pouco antes, o que o diabo supõe e espera que ocorreráé que o santo
que está sendo atacado suponha que esses pensamentos são dele mesmo e comece a
duvidar de que é cristão. Ou o diabo pode atirar no cristão palavras e
frases, imprecações, linguajar horrível. Pode parecer que a sua mente esteja cheia
dessas coisas. Mas nenhuma delas procede do crente. Vem do diabo, que tenta abalá-
lo, tenta confundi-lo, tenta persuadi-lo de que ele não é cristão, e de que nunca foi
cristão.

São essas algumas das maneiras pelas quais os dardos entram, e, principalmente,
como digo, na esfera dos pensamentos. É de fato instrutivo ler sobre isso nas vidas
dos santos. Graças a Deus que esses fatos foram registrados; porque é um grande
auxílio ao cristão que está sendo alvo de ataque e que pode imaginar que tais
tentações nunca aconteceram com ninguém mais, não somente lembrar-se do que
o apóstolo diz aqui, como também ver a sua confirmação na vida e na experiência de
alguns dos maiores e mais maravilhosos santos que já adornaram a vida da Igreja
Cristã.

Mas às vezes os dardos tomam a forma de imaginações. Não há o que o diabo não
possa fazer a esse respeito. Somos confrontados pelas “astutas ciladas do diabo”, e a
sua engenhosidade é quase ilimitada. Ele pode trazer à mente cenas, pode
representar eventos, pode pintar quadros vividos, pode torná-los reais. Dessa
maneira ele lança os seus dardos inflamados contra nós nos domínios da imaginação.
Ele faza mesma coisa nos domínios dos desejos, das paixões e das cobiças -
inflamando-os, incitando-os, instigando-os com tremendo calor. Vocês não se dão
conta de quão verdadeiro é tudo isso? Se não se dão, vocês estão de tal maneira nas
garras e nos braços do diabo que nem percebem o que está acontecendo. Todos os
cristãos estão sujeitos à tentação; ela sobrevêm a todos, numa ocasião ou noutra, de
uma forma ou de outra. Temos que estar preparados para enfrentá-la. Temos que ter
sempre o escudo da fé

numa posição conveniente para que possamos pegá-lo a qualquer momento. É a


nossa única esperança.

Gostaria de acrescentar mais um item a esta lista das maneiras pelas quais o diabo
pode atirar os seus dardos em nós. Diz um hino muito conhecido: “Se tua vereda
passar por ígneas provações”. A história da Igreja tem muito a dizer acerca das
“ígneas provações”! Há hoje de fato muitos cristãos que estão passando por ígneas
provações; estão numa fornalha, como aqueles jovens do tempo de Daniel. O
apóstolo Pedro, no capítulo quatro da sua Primeira Epístola, usa essa mesma
expressão no versículo doze: “Amados, não estranheis a ardente prova (“a
ígnea provação”, VA) que vem sobre vós para vos tentar, como se coisa estranha vos
acontecesse”. Não é nada estranho, é o que cabe ao povo de Deus. Sempre foi,
sempre será. “E também todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus”, diz
Paulo a Timóteo, “padecerão perseguições” (2 Timóteo 3:12). O maligno pode
repentinamente colocar todas essas coisas sobre nós.

São esses os meios pelos quais satanás procura alarmar-nos, procura encher-nos de
temores. Será que os nossos inimigos intentam matar-nos? Pretendem tirar tudo de
nós? Vou perder a minha posição porque sou cristão? Ou talvez você fique
preocupado com a sua mulher e com a sua família, talvez você fique preocupado com
a sua igreja, com a causa de Cristo em geral. Terríveis períodos de perseguição
sobrevêm à Igreja Cristã. Também podem ocorrer longos intervalos em que não há
perseguição, a não ser de maneira pouco significativa, um ocasional tiro aqui, outro
ali. Mas às vezes o diabo esteve, por assim dizer, preparando uma enorme
quantidade de dardos inflamados, e os lança todos ao mesmo tempo; e esse ataque
furioso pode continuar durante um certo período.

Muitos bons cristãos sofreram dolorosas provações durante o regime de Hitler, na


Alemanha; e há cristãos sofrendo esse tipo de prova de fogo nos dias atuais. As
perseguições podem vir até por meio daqueles que nos são caros mas não são
cristãos. Eles podem deixar-nos em paz por um longo período, edepois, subitamente,
comoseodiabo estivesse solto neles, de repente nos atacam, e continuam nos
atacando durante algum tempo. Em seguida desistem, depois tornam a atacar, e assim
sucessivamente.

O ensino do apóstolo é que só há um modo de 1 idar com esses ataques. Temos que
tomar e usar o escudo da fé. É a única coisa capaz de apagar os dardos inflamados
do maligno. Quando estas coisas vierem sobre vocês, não exponham o peito,
deixando que os dardos atinjam a couraça da justiça. O que vocês devem fazer é
tomar, levantar e segurar firme o escudo, de modo que eles atinjam aquela parte do
escudo especificamente

destinada a resistir-lhes quando se inflamarem contra ela, e assim vocês não sofrerão
dano. Vocês têm que estar prontos para enfrentá-los por todos os lados. Lembrem-se
de que os seus pés têm que estar calçados com a preparação do evangelho da paz.
Vocês têm que ter mobilidade e ser ágeis, segurando o escudo em todas as direções.
Apaguem um dardo aqui, outro ali, outro numa terceira direção, e assim evitarão
muito problema. Apanhados assim por seu escudo, vocês não terão necessidade de
desenredá-los das malhas da sua armadura; e assim vocês estarão livres de muito
problema.

O apóstolo Pedro expressa a mesma idéia com as palavras: “Sede sóbrios; vigiai;
porque o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando
a quem possa tragar; ao qual resi sti firmes na fé” (1 Pedro 5:8 e 9). Somente a fé os
capacitará a enfrentar estes ataques particulares. João diz exatamente a mesma coisa:
“Esta é a vitória que vence o mundo, a nossa fé” (1 João 5:4). A fé é sempre
o escudo que vocês têm de empunhar para apagar estes dardos inflamados do
maligno.

Fé aqui é a capacidade de aplicar rapidamente o que cremos, de molde a repelir tudo


o que o diabo faz ou tenta fazer conosco. Fé não é meramente uma crença ou teoria
intelectual. Naturalmente, a fé inclui aquilo em que você crê, mas a fé nunca se detém
no mero assentimento e crença intelectual. A fé é sempre prática. A fé sempre faz
aplicação da verdade. “A fé sem obras é morta.” Há sempre este elemento
de atividade na fé. “A fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova
das coisas que não se vêem” (Hebreus 11:1). Portanto, eu defino a fé que consta no
“escudo da fé” como a rápida aplicação do que cremos como uma resposta a tudo o
que o diabo atira em nós.

Ora, como age a fé como nosso escudo? A resposta é que a fé nunca

aponta para si mesma, mas sempre aponta para o seu objeto. Isso é

absolutamente crucial. As seitas produzem pessoas que têm fé na fé. Mas

se você puser a sua fé na fé, você finalmente se destru irá. Há pessoas que

tentam exaltar a fé, a qualidade da fé, em si mesmas; porém nunca terão

êxito. Isso é coueísmo,* algo puramente psicológico. Não se nosdiz que


exaltemos a fé, ou que ponhamos a nossa fé na fé. Não, a fé nunca aponta

para si mesma. Em si e por si, a fé nunca protege ninguém.


*-;-

De Coué, Emile (1857-1926), que apregoava a auto-sugestão como método de

cura. Francês, natural de Troyes. Após a Primeira Guerra Mundial fez preleções

por toda a França, na Inglaterra e nos Estados Unidos, sempre em torno da sua

declaração: “Dia após dia, e de todas as formas, estou melhorando cada vez

mais”. Nota do tradutor.

A fé sempre aponta para o seu objeto, e desse modo ela nos fortalece. Paulo trata
dessa matéria no capítulo 4 da Epístola aos Romanos, começando no versículo 18.
Ele está escrevendo a respeito de Abraão, “o qual, em esperança, creu contra a
esperança que seria feito pai de muitas nações, conforme o que lhe fora dito: assim
será a tua descendência. E não enfraqueceu na fé, nem atentou para o seu próprio
corpo já amortecido, pois era já de quase cem anos, nem tão pouco para
o amortecimento do ventre de Sara. E não duvidou da promessa de Deus por
incredulidade, mas foi fortificado na fé, dando glória a Deus, e estando certíssimo de
que o que ele tinha prometido também era poderoso para o fazer. Pelo que isso lhe
foi também imputado como justiça”. A fé salvou a Abraão “dando glória a Deus”,
apontando para Deus. É o que a fé sempre faz! Nunca aponta para si mesma; a fé
aponta para Deus. O segredo de Abraão foi que a sua fé o levou a Deus, bem como
ao caráter e às promessas de Deus; e confiou em Deus e em Suas promessas, e
tudo foi bem. Acerca dos grandes heróis da fé diz Hebreus, capítulo 11, que “da
fraqueza tiraram forças”. Sempre pela fé! Não fé na fé, e sim, fé em Deus! Eles eram
homens que criam em Deus, eles O consideravam capaz de fazer o que tinha
prometido. Esse era o segredo deles.

A fé nunca se volta para si mesma. Portanto, você não deve estar olhando para si
mesmo e tentando cultivar a fé em si próprio. A fé sempre aponta para Deus, para o
caráter de Deus. Ele é o Único em quem podemos confiar. A fé aponta para as Suas
promessas - e a Bíblia está repleta delas. Aplique-se a conhecê-las, e então você
será capaz de empunhar o escudo da fé. No momento em que o inim igo vier e os
dardos voarem em torno de você, você poderá empunhar uma declaração
das Escrituras, uma promessa de Deus, sabendo que Ele é sempre verdadeiro e fiel
às Suas promessas. Ele é imutável. Ele é “o Pai das luzes, em quem não há mudança
nem sombra de variação”. Assim, quando o diabo se aproximar de você e lhe disser:
“Admito que Deus abençoou você no passado, e que Ele parecia ser seu Pai; todavia
agora Ele não está mais interessado em você”, levante o escudo da fé e diga: “Mas
isso é impossível; Deus é o “o Pai das luzes, em quem não há mudança nem sombra
de variação”. Ele não pode mudar. O que Deus prometeu, Ele realizará. As Sua
promessas são sempre infalíveis. Ele fez um juramento, e nunca o quebrará”. E assim
que você deve empunhar o escudo da fé.

Depois, também, você deve lembrar-se do poder de Deus. Quando o inimigo enviar
a sua chusma de dardos e você se sentir fraco e frágil, e tentado a crer que eles o
ferirão e que você será inapelavelmente derrotado, tome o escudo da fé, levante-o.
Ele dirigirá você diretamente

a Deus e ao poder de Deus. Lembre-se daquele incidente da vida de Abraão, como


ele ficou cansado e exausto após uma longa resistência, e o inimigo se pôs a atacá-lo
e a dizer-lhe: “De que adianta a bênção de Deus para você desse jeito? Ele não lhe
deu herdeiro nenhum, você não tem ninguém que dê prosseguimento à linhagem; de
que valem todas estas grandes promessas de Deus, se você não tem um filho?” E
Abraão estava a ponto de fraquejar quando Deus lhe lembrou o escudo da fé,
dizendo-lhe: “Não temas, Abraão, eu sou o teu escudo, o teu grandíssimo galardão”
(Gênesis 15:1). “Eu sou o teu escudo”! Deus é o nosso escudo, e o Seu poder é
infinito e eterno. “Deus é o nosso refúgio e fortaleza, socorro bem presente na
angústia”, diz o Salmo 46. E o livro de Provérbios acrescenta: “Torre forte é o nome
do Senhor; a ela correrá o justo, e estará em alto refúgio” (18:10). Esse é o escudo -
o nome do Senhor, o poder de Deus! Davi se delicia em dizer-nos no Salmo 84:
“O Senhor Deus é um sol e escudo”. O escudo da fé encaminha você para o poder de
Deus, e no momento em que você se esconder por trás dele, todos os dardos
inflamados do maligno serão apagados e se reduzirão a nada; não poderão tocar em
você. E lembre-se, o poder de Deus é perene, ilimitável, eterno; Ele é o Deus
onipotente. Que se juntem e venham as forças do inferno; não poderão tocar em você:
“Ao qual resisti firmes na fé”.

Mas não é somente Deus o Pai que está do nosso lado; o nosso bendito Senhore
Salvadoro faz de maneiraaindamaisdefinida. Seu amor por nós no passado prova o
Seu interesse por nós. “Quem os condenará?”, pergunta Paulo. “Pois é Cristo quem
morreu (por nós), ou antes quem ressuscitou dentre os mortos, o qual está à direita de
Deus, e também intercede por nós” (Romanos 8:34). Assim, quando o diabo lançar
estes dardos e dúvidas sobre você, empunhe o escudo da fé dizendo: “Cristo provou
o Seu amor por mim morrendo por mim e ressuscitando”. Depois tome este
pensamento: Ele esteve neste mundo como homem; “O Verbo se fez carne”. Ele veio
“em semelhança da carne do pecado”. Ele foi tentado pelo diabo. Odiabo lançou
todos os seus dardos inflamados e gastou todas as suas reservas contra Ele. No
entanto, Ele o derrotou completamente e o destroçou definitivamente. Lembre-
se também de que agora Ele está sentado à direita de Deus, com todo o poder em
Suas mãos, e de que ali Ele é o nosso representante, está ali para ajudar-nos a travar
todas as nossas batalhas, e está “Esperando até que os seus inimigos sejam postos
por escabelo de seus pés” (Hebreus 10:13).

Quando você estiver no calor da batalha, e quando os dardos inflamados estiverem


vindo de todas as direções, lembre-se de que,

porque Ele veio a este mundo, porque a encarnação é verdadeira, porque Ele sofreu
lutando contra o pecado até o sangue, porque Ele foi tentado como nós somos, Ele é
plenamente capaz de compadecer-Se de nós quando somos tentados. “Porque não
temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém
um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado.” Você não é deixado
entregue a si mesmo; Ele está com você e “pode lhe socorrer”. Você está “nele”,
e Ele está velando por você e cuidando de você! Ele deu prova do Seu amor pelo
que fez; Ele continua a dar essa prova pelo que ainda faz.

O uso do escudo da fé lembra a você que você está olhando para Deus o Pai, Deus o
Filho e Deus o Espírito Santo. Significa que você está na confiante dependência de
Deus e de Sua graça em Cristo. Significa que você se mantém ligado em sua mente e
em seu pensamento Àquele que tem todo o poder, e que poderá tornar-nos “mais do
que vencendores”. Há ocasiões em que estamos debaixo de tal pressão que não
podemos fazer nada senão clamar pelo nome do Senhor. Sentimo-nos quase
incapazes de empunhar o escudo da fé, porém ainda o fazemos dizendo:

Cada momento preciso de Ti;

Ter-Te por perto é paz!

As tentações já não têm seu poder,

Quando aqui perto Tu estás.

É tudo o que você consegue dizer! Você tão-somente clama a Ele: “Fica aqui perto;
fica por perto” - e Ele ficará!

Eu necessito da Tua presença A cada hora que passa.

O que frustrará o poder do tentador,

A não ser a Tua graça?

Mas a graça pode fazê-lo. “A minha graça te basta.” Assim, podemos dizer:

Inimigo nenhum temerei,

ConTigo perto a abençoar;


As lágrimas suaves serão,

E os males não irão pesar.

Onde está, ó morte, o teu aguilhão?

Onde a tua vitória, ó sepulcro?

Se comigo estás, ainda vencerei.

É isso que significa “tomai o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os
dardos inflamados do maligno”. Não é tentar exaltar algum tipo de sentimento
chamado fé. A fé leva direto ao Deus todo--poderoso, que é o nosso Salvador, e que
é “socorro bem presente na angústia”. Cheguemos, pois, com confiança ao trono da
graça, para que possamos alcançar a misericórdia e achar graça, a fim de
sermos ajudados em tempo oportuno” (Hebreus 4:16). Faça isso, e nenhum destes
dardos achará lugar onde alojar-se em você, nem o queimará, nem lhe fará dano
algum. Empunhe o escudo da fé. “Ao qual resisti firmes na fé.”

Queira Deus capacitar-nos a entender este ensino, e a pô-lo em execução, toda vez
que o inimigo vier, com a sua malignidade, atirando em nós os seus dardos
inflamados.

O CAPACETE DA SALVAÇÃO

“Tomai também o capacete da salvação. " - Efésios 6:17

Chegamos agora à segunda parte da armadura que não fica fixa no corpo ou atada a
ele, mas que o soldado tem que tomar e colocar em si - “o capacete da salvação”. O
apóstolo estava usando a figura de um típico soldado romano do seu tempo, e ele
sabia que o soldado sempre tinha necessidade de um capacete. Todas as partes do
seu corpo tinham que ser protegidas e cobertas. E como é essa a realidade quanto à
guerra ordinária, é igualmente a realidade quanto à aplicação espiritual.

O capacete uti 1 izado pelo soldado romano era uma espécie de quepe, feito de
couro; mas esse couro tinha sido fortalecido e, diga-se de passagem, adornado, com
placas ou “estrias” de metal para dar-lhe proteção. Por cima de tudo vinha uma
espécie de penacho ou pluma, cujo principal propósito também era a ornamentação.
Quando o soldado romano sabia que o inimigo se aproximava, pegava o seu escudo,
punha o seu quepe ou capacete, e então empunhava a sua espada e corria para a
batalha.

A aplicação espiritual do capacete é evidente; o apóstolo está chamando a atenção


para a cabeça, para a mente, para o cérebro, o entendimento, o pensamento do
cristão. Já falamos sobre os sentimentos e as sensibilidades, as emoções, e sobre os
desejos, e vimos como o inimigo tende a atacar-nos nesses vários pontos. Mas agora
temos que dirigir a atenção ao aspecto particular que envolve a consideração da
mente e do entendimento, da parte intelectual de toda a nossa posição como cristãos.

Torno a lembrá-los de que não devemos exagerar a importância destas divisões e


distinções; contudo, elas estão aí, e devemos dar-lhes atenção. Naturalmente, quando
falamos do coração, também incluímos a mente, pois o diabo pode tentar-nos com
dúvidas nessa esfera. Aqui, sugiro, o apóstolo está preocupado, não tanto com a
nossa aceitação e o nosso entendimento da fé - de que já tratamos, na couraça da
justiça -entretanto com algo que é ainda mais geral. Aqui, não é tanto com o
nosso entendimento de doutrinas particulares, como ajustificação pela fé,
que estamos preocupados, como com toda a nossa atitude para com a fé.

Já tratamos da matéria concernente às doutrinas particulares; aqui temos algo que é


mais geral. Em estudos anteriores indiquei que as guerras

podem ser consideradas tanto em termos de estratégia como de tática; quer dizer em
termos da campanha como um todo, ou em termos dos incidentes e eventos
particulares ocorridos na campanha. A distinção é vital. Alguns grandes generais e
capitães de guerra foram peritos em estratégia - eram capazes de ter uma excelente
visão geral de tudo - mas nem sempre eram igualmente habilidosos com respeito a
escaramuças locais, e à tática; e o inverso também é verdadeiro.

Tomamos muito tempo examinando a tática; agora nos empenharemos em examinar a


estratégia, em ver toda a campanha. Neste sentido geral, o nosso adversário, o diabo,
muitas vezes nos ataca produzindo em nós uma sensação de aborrecimento e
cansaço; tanto assim que o cristão às vezes se vê como que desistindo de uma vez do
combate. Notem a diferença que existe entre isto e o que denominei tática. Os
cristãos às vezes ficam em dificuldade e com problemas quanto a doutrinas
particulares, quanto a aspectos particulares da fé. Isso não levanta a questão
do abandono completo da vida cristã. Aqui, porém, temos algo maior e, num certo
sentido, mais grave. É que a pessoa tende a ficar farta e cansada, e a perder as
esperanças quanto a toda a campanha propriamente dita e os seus resultados.

Esse é o tipo de problema de que trata um conhecido poema de Arthur Hugh Clough:

Não digas que lutar de nada adianta,

Que vãs são as feridas e o labor,

Que o inimigo não dorme nem se cansa,

E tudo continua como sempre.


O poema fala das condições em que o homem começa a achar que o combate é em
vão, “de nada adianta, que vãs são as feridas e o labor”. Ele diz a si próprio: “Estou
nesta campanha já faz muito tempo, estou ferido, estou combatendo, estou pelejando;
mas, que adianta tudo isso? Estou caindo no desânimo, “e tudo continua como
sempre”. Acaso conquistei uma polegada de terreno, ao menos? Consegui fazer
alguma coisa, afinal?”

O apóstolo trata desse mesmo problema quando escreve aos gálatas com estas
palavras: “Não nos cansemos de fazer o bem” (6:9). O cristão se cansa de fazer o
bem simplesmente ao sentir “o peso do dia”. A campanha vem sendo travada há tanto
tempo, o combate é constante, e ele é tentado a perder todas as esperanças.

Isso pode afligir-nos no sentido pessoal, ou num sentido mais geral.

Muitas vezes sobrevêm a um homem, individualmente, em conexão com os seus


próprios problemas e batalhas pessoais. As vezes ele se volta para si mesmo e diz,
nas palavras de Rustum, no poema de Matthew Arnold, intitulado Sobrab e Rustum.

Em luta e sangue foi a minha mocidade,

Cheia de luta e sangue é esta minha idade;

E nunca terá fim esta vida de sangue.

Ele diz a si mesmo: tenho combatido desde que me tornei cristão; e ainda estou
combatendo. Isso não terá fim? Significa que o diabo o está atacando e tentando fazê-
lo sentir que a coisa toda é vã e inútil.

Podemos sentir a mesma coisa acerca das condições gerais da Igreja, quando a
vemos como está hoje. Aí está uma instituição que existe há quase dois mil anos;
mas, qual a sua situação no mundo atual? Na Grã-Bretanha a Igreja está cheia de
confusão, desconcerto e incerteza. Vale tão pouco! E assim o diabo vem e procura
sugestionar-nos com a idéia de que ela é inútil. Do contrário, diz ele, as coisas não
estariam como estão depois de dois mil anos. O inimigo parece forte e poderoso,
enquanto que os cristãos parecem fracos e desanimados. Haveria algum valor
em continuar pelejando? E, indubitavelmente, há muitos que outrora pertenciam à
Igreja Cristã, mas a abandonaram, achando que tudo é em vão. E este sentimento
pode sobrevir a nós, quanto aos nossos problemas individuais e pessoais, ou quanto
ao estado e às condições gerais da Igreja.

Talvez a melhor maneira de examinar a questão seja vê-la em termos do ensino da


Epístola aos Hebreus. Na verdade, em certo sentido, a Epístola aos Hebreus não
passa de um extenso comentário desta frase que estamos estudando - “Tomai também
o capacete da salvação”. Os cristãos hebreus, destinatários da carta, tinham sido
criados na religião dos judeus; depois ouviram a mensagem cristã e nela creram, e se
tornaram membros da Igreja Cristã. Por algum tempo o seu sol brilhou fulgente,
e eles se sentiam felizes em sua nova fé. Todavia, com o passar dos anos, eles se
viram perseguidos pelos judeus, seus concidadãos, que os consideravam traidores da
sua longa história, e também pelos gentios. Lemos que eles foram espoliados dos
seus bens. Além disso, fora-lhes dito, na pregação e no ensino, que o Senhor ia
voltar, receber os Seus para Si mesmo e estabelecer o Seu reino. Mas não havia nem
sinal da Sua vinda. O resultado foi que estes cristãos hebreus tinham ficado
completamente desanimados, e alguns começaram a olhar de novo para a sua
velha religião, e estavam perguntando a si mesmos se não tinham sido um pouco

precipitados em abandoná-la e assumir a fé cristã. Esse é o pano de fundo da


Epístola aos Hebreus -cristãos desanimados! Eles estavam começando a pensar, e a
perguntar se, afinal de contas, estavam comprometidos com a religião verdadeira;
estavam começando a olhar para o passado, e alguns estavam inclinados a retornar
ao culto e ao ritual do templo.

Noutras palavras, o problema com o qual aqueles cristãos hebreus se defrontavam


não era uma questão de tática, e sim, a de abandono de toda a campanha. Eles
estavam aborrecidos, estavam cansados, eram perseguidos, eram tentados; tudo
parecia estar contra eles, e ficaram em condições tais que foram tentados pelo diabo
a desistir, a largar tudo, a retirar-se da campanha de guerra e a voltar à sua antiga
posição.

Há uma ilustração parecida na capítulo três da Segunda Epístola de Pedro. O


apóstolo trata ali dos escarnecedores que vinham à Igreja Primitiva e indagavam:
“Onde está a promessa da sua vinda?” Diziam efetivamente: vocês, cristãos,
disseram que o Senhor vai voltar, e que Ele vencerá os Seus inimigos e estabelecerá
o Seu reino, mas onde está a promessa da Sua vinda? Tudo permanece como sempre
foi, desde a fundaçãodomundo. Estes inimigos diziam aos cristãos: vocês
cometeram um erro, acreditaram numa mentira, a sua doutrina não é
verdadeira. Vocês podiam muito bem desistir dela, porque está provado que ela
é falsa.

Estamos enfrentando o mesmo problema em nosso século vinte. O diabo vem e


investe contra a nossa mente e contra toda a nossa maneira de ver, e o faz dizendo:
não há nada no cristianismo; ele faz ofertas maravilhosas, porém o que lhe dá? Ele
volta a atacar e diz: aquele evangelista que você ouviu e que insistiu com você que
se tornasse cristão, disse-lhe que todos os seus problemas se acabariam, que você
andaria pelo cam inho a passos leves, que você estaria num novo mundo e que
tudo iria bem com você. Mas, foi assim? Você não estaria cercado de provações,
dificuldades e problemas? Você não se vê numa campanha por demais irritante e
cansativa? Na verdade não parece que as coisas estão até piores do que eram antes
de você tornar-se cristão? O combate não é mais fragoroso, e você não está sendo
atacado como nunca fora? Édemais, para esse seu cristianismo; ele oferecia tanto, e
o que realmente lhe está dando na prática?

Essas são as condições das quais estamos falando. É um problema muito antigo. O
povo de Deus sempre foi provado dessa maneira. O exemplo clássico do Velho
Testamento é o Salmo 73, que mostra o homem temente a Deus cheio de problemas e
provações; tudo parecia estar contra ele. Ele olha para os outros, para os
irreligiosos, os ímpios, e diz:

“Não há apertos na sua morte. Os olhos deles estão inchados de gordura, nada dá
errado para eles”. “Na verdade”, ele está a ponto de dizer, “em vão lavei as minhas
mãos na inocência. Estou tentando ter uma vida piedosa e agradar a Deus, porém
tudo dá errado com igo. Aqueles outros desafiam a Deus, em rebelião; mas o que se
vê é que eles passam maravilhosamente bem.” A tentação que lhe veio foi que
renunciasse à religião e que dissesse que não havia nada de bom nela. “Em vão
lavei as minhas mãos. Estou procurando ter uma vida reta, sem nenhum proveito;
bem que eu podia render-me e desistir.” Foi essa a tentação, e é dessa tentação que o
apóstolo está falando quando nos diz que ponhamos este “capacete da salvação”.

O que ele quer dizer é que às vezes o diabo consegue persuadir-nos a ficar tão
preocupados com os pormenores da vida cristã que esquecemos a grande verdade
que cobre a realidade toda. Ficamos tão preocupados com as árvores que deixamos
de ver a floresta; ficamos tão absortos na tática local que olvidamos a grande
campanha. “O mundo está por demais conosco.” Damos tão aguda atenção ao calor e
ao peso do dia que nos esquecemos de quem somos, esquecemos para o que fomos
destinados. Naturalmente, a conseqüência disso tudo é que começamos a achar que
não podemos prosseguir, que isso tudo é demais para nós. “Lutar de nada adianta.”
As nossas feridas são todas em vão, e vão é todo o nosso labor. Ficamos achando
que o diabo é forte demais, é astuto demais para nós; e que ele nos derrotará,
inexoravelmente.

O nosso Senhor trata dessas cond ições quando fala “sobre o dever de orar sempre, e
nunca desfalecer” (Lucas 18:1). O perigo é desfalecer. O maior problema da vida é
manter-nos firmes e não nos deixarmos dom inar por estas coisas que vêm sobre nós
de todos os lados e nos fazem pensar: ah, não há nada de valor nele; saia, volte para
o mundo, divirta-se, lance fora as suas tristezas. Que adianta ficar lutando desse
jeito, que é que você está obtendo disso? Desista disso tudo! Essa é a tentação.
Este problema está numa categoria inteiramente d iferente dos d iversos problemas
pormenorizados de que tratamos em nosso estudo desta seção das Escrituras até este
ponto. Portanto, é óbvio que isso merece um tratamento meticuloso. A maneira de
resistir ao inimigo neste aspecto é tratada extensamente em muitas partes das
Escrituras. Consideremos outra ilustração do assunto, para que fique bem claro para
nós. Essa foi a dificuldade pecu liar ao jovem Timóteo. Timóteo sempre tinha a
sensação de que tudo era demais para ele. Como prosseguir era sempre a questão e o
problema. O seu velho amigo e mestre, o apóstolo Paulo, estava na prisão, e
provavelmente seria levado à morte a qualquer momento, e os

cuidados, os fardos e os problemas das igrejas caíam sobre ele. Ah, como pode
alguém ir avante com tudo isso? O apóstolo Paulo teve que escrever a Timóteo e
dizer-lhe: “Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza, e de amor, e de
moderação” (2 Timóteo 1:7).

Para tratar disso, diz o apóstolo, só há uma linha a seguir: pegue o capacete da
salvação e ponha-o na sua cabeça! Que é que significa “salvação” neste contexto?
Neste ponto aventuro-me a discordar do grande Charles Hodge, que diz que
“salvação” aqui significa a nossa consciência do fato de que somos salvos, somos
cristãos. Diz ele que o termo se refere ao presente gozo da salvação. Concordo que
isso está incluído, no entanto acredito que esse modo de ver perde o
principal impacto deste ponto e, portanto, é inadequado.

Deixa-me satisfeito o fato de que o próprio apóstolo Paulo nos leva à resposta certa
com o que ele d iz na Prime ira Epístola aos Tessalonicenses, capítulo 5, versículo 8,
onde lemos: “Mas nós, que somos do dia, sejamos sóbrios, vestindo-nos da couraça
da fé e do amor, e tendo por capacete a esperança da salvação”. “A esperança da
salvação”! Assim, eu interpreto isso como significando, não tanto a percepção da
nossa salvação no presente, e sim na “esperança” da salvação.

O sentido de “esperança” neste contexto é dado pelas próprias Escrituras. A melhor


maneira de interpretar qualquer passagem das Escrituras é examinar outra passagem
semelhante. As Escrituras interpretam as Escrituras. Vamos, pois, ao que Paulo diz
na Epístola aos Romanos, capítulo 13: “O amor não faz mal ao próximo. De modo
que o cumprimento da lei é o amor. E isto digo, conhecendo o tempo, que já é hora
de despertarmos do sono; porque a nossa salvação está agora mais perto de nós do
que quando aceitamos a fé”. “Salvação”, neste contexto, não é tanto algo que estou
desfrutando no momento; é algo para o que estou indo, algo que está vindo a m im;
“A nossa salvação está agora mais perto de nós do que quando aceitamos a fé.”

Noutras palavras, opino que o que o apóstolo quer dizer com salvação aqui é a
esperança cristã, ou o que noutro lugar ele chama “a esperança da glória”. Portanto,
a proteção que pomos em nossa cabeça para fazer frente ao particular assalto e
ataque do diabo é “a esperança da glória”. O nosso Senhor, em Seu ensino, tratou
desse assunto no fim da Sua vida terrena. Vejam, por exemplo, passagens como o
capítulo vinte e quatro de Mateus, ou o capítulo treze de Marcos e o capítulo vinte e
um de Lucas. O Senhor faz uma previsão da história, e adverte os Seus seguidores
de que certamente eles tèrão grandes provações, e terão que suportar grandes
tribulações. Haverá “guerras e rumores de guerras”. Livrem-
-se da idéia de que o cristianismo é uma coisa mágica, que vocês entram num círculo
mágico e que nunca mais terão problemas. Não será assim, diz Cristo, mas será antes
uma vida de provações, problemas e tentações. “Aquele que perseverar até o fim
será salvo.” Esse é o quadro! Ele não diz: o Meu ensino vai tornar o mundo cada vez
melhor; o Meu ensino é da natureza de uma reforma política que eliminará a guerra.
Não haverá dificuldades, as nações se abraçarão umas às outras, e vocês,
como judeus, estarão na chefia das nações. É exatamente o oposto disso.

Não obstante, Cristo dá aos Seus discípulos uma real esperança. Diz Ele: “Estas
coisas terão que acontecer antes que venha o fim”. Então Ele fala do fim e de como,
quando eles pensarem que não há nenhuma esperança e estiverem a ponto de
entregar-se ao desespero, subitamente verão o Filho do homem vindo sobre as
nuvens dos céus, o Rei dos reis, o Senhor dos senhores. É isso que se quer dizer aqui
com “o capacete da salvação”. Quando o inimigo lhe disser que entregue os pontos e
desista, que não há esperança para você, que você está perdendo, a sua resposta será
- a esperança! “A esperança da glória”! A esperança da Sua vinda! Tudo quanto está
contido nesse ensino! Vê-se a mesma coisa no ensino do apóstolo Paulo,
porexemplo, na Primeira Epístola aos Coríntios. “Mas vós sois dele”, diz ele, “em
Cristo, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e
redenção” (1:30). Nesse contexto “redenção” tem o mesmo sentido de “salvação”
como em nosso presente contexto. O cristão já está justificado. Alguns acham que
a palavra “redenção”, como vem citada, é tautológica: contudo não é.
Com “redenção” Paulo se refere à libertação culminante, consumada, final e plena -
a salvação completa na glória! Já a temos pela fé.

Mas vejamos outro exemplo, a saber, o tema central de 1 Coríntios, capítulo 15.0
argumento do apóstolo ali é que a certeza de que Cristo ressuscitou, e que nós
também ressuscitaremos em incorrupção etc., é a mola real de toda a atividade do
cristão. Diz ele, por exemplo, no versículo 32: “Se, como homem, combati em Éfeso
contra as bestas, que me aproveita isso, se os mortos não ressuscitam? Comamos e
bebamos, que amanhã morreremos”. Diz ele, efetivamente: eu não levaria adiante
este combate, não fora que eu sei o que está para vir. De que adiantaria lutar contra
as bestas de Efeso? O que me faz prosseguir na luta, diz ele, é que eu sei que esta
redenção, esta salvação, esta vitória final que virá, é certa. Se não fosse assim, diz
ele, “Comamos e bebamos, que amanhã morreremos” - voltemos, desistamos!

Paulo diz algo semelhante na Segunda Epístola aos Coríntios, capítulo 4, versículo
6: “Deus, que disse que das trevas resplandecesse a luz, é

quem resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória


de Deus, na face de Jesus Cristo”. Poder-se-ia supor que o homem que fala dessa
maneira é certamente alguém que nunca tem problemas. Mas ele acrescenta
imediatamente: “Temos, porém, este tesouro em vasos de barro, para que a
excelência do poder seja de Deus, e não de nós”. E continua: “Em tudo somos
atribulados, mas não angustiados, preplexos, mas não desanimados. Perseguidos,
mas não desamparados; abatidos, mas não destruídos; trazendo sempre por toda a
parte a mortificação do Senhor Jesus no nosso corpo, para que a vida de Jesus se
manifeste também em nossos corpos; e assim nós, que vivemos, estamos sempre
entregues à morte por amor de Jesus, para que a vida de Jesus se manifeste também
na nossa carne mortal. De maneira que em nós opera a morte, mas em vós a vida. E
temos portanto o mesmo espírito de fé, como está escrito: cri, por isso falei; nós
cremos também, por isso também falamos. Sabendo que o que ressuscitou o Senhor
Jesus nos resuscitará também por Jesus, e nos apresentará convosco”. Não fora essa
esperança, nos desfaleceríamos, o combate nos poria abaixo, nós desistiríamos,
largaríamos tudo. Assim, Paulo continua: “Por isso não desfalecemos; mas, ainda
que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia em
dia”. E então vem a comovente declaração no final: “Porque a nossa leve e
momentânea tribulação produz para nós um peso eterno de glória mui excelente; não
atentando nós nas coisas que se vêem, mas nas que se não vêem; porque as que
se vêem são temporais, e as que não se vêem são eternas”. Aqui Paulo está pondo “o
capacete da salvação” e se regozijando na “bendita esperança”. Mantenham os olhos
fixos nisso! “Pensai nas coisas que são de cima.” Todas estas declarações são
variantes da ordem que estamos exminando.

Este ensino, entretanto, não está restrito ao apóstolo Paulo. Comojá deixei entrever, é
o grande tema da Epístola aos Hebreus. No capítulo 6, versículos 11 e 12, lemos:
“Mas desejamos que cada um de vós mostre o mesmo cuidado até o fim, para
completa certeza da esperança; para que vos não façais negligentes, mas sejais
imitadores dos que pela fé e paciência herdam as promessas”. O autor já lhes
dissera: “Mas de vós, ó amados, esperamos coisas melhores, e coisas que
acompanham a salvação, ainda que assim falamos”. Ele estivera falando sobre
pessoas que negaram a fé e que antes diziam que criam, e tinha dito coisas
terríveis concernentes a elas. No entanto, diz ele, de vós, ó amados,
esperamos coisas melhores. “Porque Deus não é injusto para se esquecer da
vossa obra, e do trabalho do amor que para com o seu nome mostrastes,

enquanto servistes aos santos; e ainda servis.” Então ele os concita a aplicarem a
mesma diligência que tinham mostrado no serviço prestado aos santos “até o fim,
para completa certeza da esperança”. Noutras palavras, usem a mesma energia que
vocês mostraram em questões práticas nessa luta contrao inimigo quando ele procura
desanimar vocês. Depois o escritor continua e passa a falar do compromisso que
Deus assumiu conSigo mesmo, com juramento, “para que, por duas
coisas imutáveis... tenhamos a firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio
em reter a esperança proposta”. Assim, diz ele, temos uma âncora “que penetra até o
interior do véu”, porquanto Jesus, o nosso precursor, entrou por nós. Apeguem-se
firmes a essa verdade, diz a Epístola, certifiquem-se de que a estão entendendo, e
apoderem-se dela.

Esse é outro modo de colocar o capacete da salvação. Esse é, de fato, o ensino que
se vê em toda a Epístola aos Hebreus. Seu autor já dissera no capítulo 2, versículo
5: “Porque não foi aos anjos que sujeitou o mundo futuro, de que falamos”. Quem são
os anjos “Não são porventura todos eles espíritos ministradores, enviados para
servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação?” (Hebreus 1:14). “O mundo
futuro” não está sendo preparado para os anjos; está sendo preparado para nós - nós
que cremos em Cristo. No capítulo 4 ele expõe a mesma verdade exortando-os a não
serem como os filhos de Israel que ficaram desanimados no desertoederam ouvidos
aodiabo, que lhes diziaqueeles nunca chegariam à terra de Canaã, terra que mana
leite e mel, e insistia com eles que se voltassem contra Deus. Daí se rebelaram no
deserto, e nunca entraram na terra da promessa. Não sejam como eles, diz a Epístola;
apeguem-se firmes à esperança, apeguem-se firmes à salvação vindoura.

O apóstolo Pedro oferece o mesmo ensino: “E o Deus de toda a graça”, diz ele, “que
em Cristo Jesus vos chamou à sua eterna glória, depois de haverdes padecido um
pouco, ele mesmo vos aperfeiçoará, confirmará, fortificará e fortalecerá” (1 Pedro
5:10). O apóstolo João escreve de maneira semelhante: “Amados, agora somos
filhos de Deus, e ainda não é manifestado o que havemos de ser. Mas sabemos
que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele; porque assim como é o
veremos” (1 João 3:2-3). Seguem-se depois as palavras: “E qualquer que nele tem
esta esperança” - aí está! “A esperança da salvação”! “O capacete da salvação”!

Vê-se a mesma mensagem no último livro da Bíblia; é, na verdade, a real mensagem


do livro de Apocalipse. A visão foi dada a João a fim de que ele pudesse preparar
os cristãos daquele tempo, e os cristãos de todos os séculos subseqüentes, para o
tipo de tratamento que devem esperar

neste mundo. As “bestas” se levantarão contra a Igreja- o poder militar, o poder


político, o falso poder. Eles atacarão os santos, e os santos serão quase
exterminados. Mas não precisamos temerou entrarem pânico. Ele virá - o cavaleiro
cavalgando o cavalo branco, com uma espada em Sua boca, vencendo e para vencer.
Isso faz parte da mensagem do livro. É um livro que foi destinado a dar conforto aos
filhos de Deus, a habilitá-los a repelir o inimigo quando este os atacar na esfera da
mente, acerca da campanha toda. Não estamos falando de doutrinas particulares aqui,
é a totalidade do cristianismo que está envolvida. E o livro de Apocalipse mostra-
nos a única maneira pela qual podemos ter bom êxito.

Para concluir, podemos dizer que, para nós, não há nada mais importante do que
aprender o que podemos chamar “os tempos verbais da salvação”. Um oponente
poderá dizer: “Você está tentando dizer-nos, então, que a pessoa nunca pode saber se
está salva? Você está apresentando a salvação como algo inteiramente futuro”. A
resposta é que há tempos na salvação, passado, presente e futuro. O cristão é
alguém quefoi salvo. Ele foi justificado pela fé. Não está mais “sob a lei”.
Vimos isso quando
estávamosestudandoacouraçadajustiça.Nuncaentraráem condenação. Também está
livre do domínio de satanás. Ele já está livre e, nesse sentido, foi salvo. Todavia o
cristão é alguém que está sendo salvo. Ele não é perfeito, há uma obra sendo levada
a efeito nele. O presente da salvação é o “presente contínuo”. Mas também a
salvação tem um tempo futuro. O cristão ainda terá que experimentar a
salvação final. Virá o dia em que ele será absolutamente perfeito. Tendo isso
em mente, esta palavra “salvação” obviamente significa a esperança da salvação.
Portanto, pode-se descrever os tempos atuais assim: o passado é a justificação, o
presente a santificação, o futuro a glorificação. “Redenção!” “Glorificação!” A
salvação completa, final, absoluta!

Assim, pôr “o capacete da salvação” significa que quando você é atacado, sitiado,
provado, tentado, e o diabo diz: “Não há nada nesse cristianismo, bem que você
podia sair dele, o cristianismo faz promessas falsas, não as cumprirá - desista!”,
responda dizendo: “Não, eu não vou deixar que este ensino me leve a extraviar-me.
Sempre soube que há passos e estágios na salvação. Sei que sou salvo, sei que estou
sendo salvo, sei que finalmente serei salvo completamente”.

Noutras palavras, temos que compreender o que esta “esperança” significa


realmente; e não há dificuldade em fazer isso. O apóstolojá nos dissera no capítulo
cinco desta Epístola aos Efésios: “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como
também Cristo amou a igreja, e a si mesmo se entregou por ela, para a santificar,
purificando-a com a lavagem da água,

pela palavra” - com este fim - “para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem
mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível”. Esse é o
clímax da salvação. Os crentes são destinados a serem absolutamente perfeitos,
livres do pecado, livres de todos os vestígios do mal, “sem mácula, nem ruga, nem
coisa semelhante”. Seremos glorificados, seremos semelhantes a Cristo, vê-lO-emos
como Ele é e seremos semelhantes a Ele; os nossos corpos serão transformados,
seremos glorificados completamente-seremos salvos inteiramente, corpo, alma e
espírito; não ficará faltando nada. Essa é a esperança! E pôr o capacete da salvação
é compreender que isso virá.

Em segundo lugar significa que temos toda a certeza de que fomos predestinados à
glória. “E aos que predestinou a estes também chamou; e aos que chamou a estes
também justificou; e aos que justificou a estes também glorifícou” (Romanos 8:30).
Significa saber que todas estas bênçãos são suas, saber que você não é mais do
mundo, saber que você foi redimido pelo precioso sangue de Cristo, e que, tendo
sido justificado, você pode regozijar-se na esperança da glória de Deus.

Em terceiro lugar, significa que o Senhor, tendo uma vez posto o Seu amor e o Seu
afeto em nós, e tendo nos chamado, nunca nos abandonará; que, sejam quais forem a
força e o poder do inimigo, o Seu poder é maior. E o que nos dizo nosso Senhorem
João, capítulo 10, versículos 28-29: “E dou-lhes a vida eterna, e nunca hão de
perecer, e ninguém as arrebatará da minha mão. Meu Pai, que mas deu, é maior do
que todos; e ninguém pode arrebatá-las da mão de meu Pai”. Esse é o “capacete
da salvação”! Nenhum homem será capaz de arrancar-nos da mão do Filho, e da mão
do Pai! Eles nos guardarão! Ouçam Paulo dando o mesmo conforto aos cristãos em
Romanos, capítulo 8: “Que diremos pois a estas coisas? Se Deus é por nós, quem
será contra nós?” Quando você vir que o inimigo vem aos magotes, e com todo o seu
poder e força, ponha este capacete da salvação - “Se Deus é por nós, quem será
contra nós?” -e você já o terá derrotado. Pois, conquanto sejamos levados como
ovelhas para o matadouro, e tudo esteja contra nós, “estou certo de que, nem a morte,
nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente,
nem o porvir, nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos
poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor”. Que o
diabo faça a sua mais terrível tramóia, nunca poderá separar-nos! Esse é o capacete
da salvação! Essa é a segura e certa esperança!

Noutras palavras, chega-se a isto: vejam o nosso bendito Senhor, o Filho de Deus
aqui encarnado, neste mundo pecaminoso e mau, com o

diabo atacando, e com todos os poderes do inferno soltos contra Ele. Ele passou
portudo isso. Ele sabia o que Lhe significaria isso, sabia que a cruz seria a Sua
separação de Seu Pai; contudo perseverou. O que O capacitou a fazê-lo? A resposta
é dada em Hebreus 12:2: “O qual, pelo gozo que lhe estava proposto, suportou a
cruz, desprezando a afronta”. Esse foi o segredo. Ele tinha os olhos fixados naalegria
postadiante dEle e, por isso, pôde venceros Seus inimigos. Portanto, “Olhemos para
Jesus”, sigamos o Seu exemplo. Quando o inimigo vier e atacar a mente e o
entendimento, respondamos-lhe com “a bendita esperança”, com a certeza
dessa esperança, com a sua glória! E tratemos de compreender que estamos sob o
poder de Cristo e que Ele nunca nos deixará nem nos desamparará. Os escritores dos
nossos hinos se apossaram da idéia e a expressaram desta maneira:

No afã, na tribulação,

No tumulto de sua guerra, Espera a consumação Da paz, além desta terra,

Até que a bênção lhe venha E a visão gloriosa tenha E então vitoriosa a
Igreja, Igreja em paz sempre seja.

Outro hino nos exorta:

Levantemo-nos por Cristo!


Longa a luta não será:

Hoje o fragor do conflito; Depois, a canção triunfal Aquele que for


vencedor Coroa da vida será dada;

E reinará eternamente Com o Rei da Glória, o Imaculado.

Concluamos com João Bunyan:

Nem fantasma nem demônio Intimidam seu espírito;

Ele sabe que afinal

Herdará a vida eternal;

Fora, pois, com as fantasias!

O que o homem diz, ele não teme E trabalha noite e dia Para ser um peregrino.

Bunyan vira essa realidade! Ele tinha a esperança. Ele tinha conhecimento desta
redenção suprema, desta glorificação final, desta salvação consumada e completa.
Ele tinha posto o capacete da salvação.

Essa é a única maneira pela qual se pode combater nesta guerra. Terá o diabo
tentado você a desistir? Ele o tenta a desistir da igreja e da sua profissão de fé
cristã, e a unir-se ao mundo e seus pretensos prazeres? Você não consegue enxergar a
astúcia presente nisso tudo?Não percebe a loucura que é dar ouvidos ao diabo?
Nunca nos foi oferecida uma vida fácil neste mundo. O cristianismo é por demais
honesto para fazer tal oferecimento. São os políticos e os filósofos que oferecem tais
coisas. Cristo nos adverte: “Aquele que perseverar até o fim será salvo”. “Haverá
guerras e rumores de guerras”, tudo estará contra você, e você talvez pense que está
definitivamente perdido e derrotado. “Levantai as vossas cabeças! O dia da vinda do
Filho do homem se aproxima. Ponha o capacete da salvação.”

Lembre-se o leitor de que o autor pregou e escreveu essas palavras numa época
diferente da nossa, e principalmente num ambiente diferente do nosso. Entre
nós multiplicam-se os “crentes” em seres sobrenaturais - considerados, procurados e
adorados idolátrica e supersticiosamente, em afrontosa desobediência à Palavra de
Deus. A frase conclusiva do autor, “Essa é uma das principais causas dos
seus problemas”, é tragicamente válida entre nós. Nota do tradutor.
A ESPADA DO ESPÍRITO

"Tomai também., a espada do Espírito, que é a palavra de Deus. ” - Efésios 6:17

Devemos examinar aqui a sexta parte da armadura de Deus que o apóstolo exorta os
cristãos efésios a tomar e vestir. Embora seja a sexta da série toda, é a terceira da
segunda divisão em que vimos que se pode estudar estas peças da armadura.

A espada do Espírito difere de todas as outras peças em três aspectos principais. Isto
é interessante na esfera natural e, portanto, ainda mais interessante quando chegamos
à aplicação espiritual. Todas as outras partes que examinamos dão proteção ao corpo
como um todo ou a partes particulares do corpo. Mas não é o que se dá com a espada
do Espírito.

Outro ponto de diferença é que esta arma é defensiva de modo diferente. Édefensiva
no sentidode que mantém afastado o inimigo como um todo, antes que algum aspecto
particular do seu ataque ou de algum método particular do seu ataque. É evidente que
a couraça da justiça protege, como vimos, a sede dos afetos. Semelhantemente, o
capacete e as sandálias protegem diferentes partes do corpo, ou cobrem o corpo
todo, como o faz o escudo grande. A espada nos protege no sentido de que nos ajuda
a manter afastado o inimigo, em vez de alguma ação particular da parte dele.

Mas o terceiro e principal ponto de diferença e distinção é que é também uma arma
“ofensiva”. Isso constitui a sua singularidade. Não havia nenhum elemento do caráter
ofensivo em nenhuma das outras cinco partes de toda a armadura de Deus, porém
aqui há. A espada serve a um duplo propósito, defensivo e ofensivo. É algo com que
não somente podemos repe 1 ir o inimigo, mas também atacá-lo.

Isso lança luz sobre frases das Escrituras como: “Resisti ao diabo, e ele fugirá de
vós” (Tiago 4:7). Você não o detém, apenas; por assim dizer, ele sairá correndo, ele
“fugirá”. Aprendemos, pois, que não apenas temos que repelir o inimigo, ou resistir
a ele e aos seus nefandos ataques num sentido negativo, mas também tem que haver
um elemento positivo no que fazemos com relação a ele. Ele tem que ser vencido, e
tem que ser obrigado a bater em retirada.

Um dos maiores problemas é que o diabo tende a aterrorizar-nos, a

deixar-nos apavorados, e a produzir em nós um espírito covarde e um sentimento de


desesperança. E se ele consegue fazer isso conosco, já estamos derrotados. Não
obstante, a declaração do apóstolo acerca da espada é o antídoto final para tais
sentimentos. Ela nos lembra que, se virmos estas coisas da maneira como o Novo
Testamento as vê, não teremos por que recuar face ao diabo com temor covarde;
devemos estar confiantes em nossa capacidade, e resistir-lhe. Devemos ter acerteza
de que, embora ele seja tão grande e poderoso, e embora tudo o que temos visto a
respeito dele e suas forças seja real, não é uma batalha perdida. É possível ao
cristão resistir ao diabo a ponto de fazê-lo fugir.

Contudo, devo moderar as minhas palavras dizendo que não se trata aqui de
encorajar uma atitude temeráriaou um espírito dejocosidade com relação ao diabo.
Para o mundo o diabo é motivo de brincadeira; e de fato há na Igreja Cristã muitos
que tendem a pensar a mesma coisa. Lembrem-se, porém, das advertências da
Segunda Epístolade Pedro e da Epístola de Judas. Não devemos “difamar
autoridades superiores” (ARA), não devemos “fazer acusação injuriosa contra o
diabo”. O cristão temerário não passa de tolo. Jamais devemos esquecer a grandeza,
a força e o poder deste grande inimigo que se põe contra nós. Mas, ao mesmo tempo,
não devemos ficar aterrorizados por causa dele. Temos que “ficar firmes”, “resistir”
e usar esta “espada do Espírito” de tal maneira que o façamos fugir de nós.

Há equilíbrio quanto a este assunto no Novo Testamento. Não devemos entregar-nos


a uma tola autoconfiança que nos leve aachar que, v isto que somos cristãos,
podemos ficar despreocupados. Antes, o que se nos diz é: “Aquele, pois, que cuida
estar em pé, olhe, não caia”. Mas, ao mesmo tempo, devemos evitar aterrorizar-nos
face ao d iabo, e ser levados a um sentimento de completa desesperança por causa
do seu grande poder e força.

Pois bem, devemos passar à minuciosa descrição dada pelo apóstolo. Devemos
“tomar a espada do Espírito”, o que significa que é a espada que o Espírito dá ou
fornece. Mas depois, a isso ele acrescenta a frase: “que é a palavra de Deus”. A
chamada Nova Bíblia Inglesa (“New English Bible”) traduz assim essa passagem:
“Como espada, tomai a que o Espírito vos dá - as palavras que vêm de Deus”.
Confesso que não tenho idéia do que querem dizer com isso. Consultei todas as
outras traduções que conheço e, sem exceção, todas elas dizem: “a espada
do Espírito, que é a palavra de Deus”. Entretanto, a “N.E.B.” diz: “as palavras que
vêm de Deus”, abrindo a porta para o misticismo, ou para

certos sentimentos ou palavras que nos podem ocorrer numa hora de tensão. Isso me
parece uma total contradição daquilo que o apóstolo está ensinando nesta altura. O
texto não diz, “palavras que vêm de Deus”, e sim, “A espada do Espírito, que é a
palavra de Deus”.

Às vezes se vê em curso outra interpretação errônea, que declara: “Tomai a espada


do Espírito, o qual é” - quer dizer, o Espírito é - “a palavra de Deus”. Mas,
evidentemente, isso é um erro, porque em parte alguma das Escrituras o Espírito
Santo é descrito como a Palavra de Deus. Essa descrição se restringe unicamente ao
nosso Senhor Jesus. O Espírito não é a espada.

O que o apóstolo está dizendo é: tomem a espada que o Espírito providencia para
vocês, isto é, a Palavra de Deus; noutras palavras, as Escrituras, a Bíblia. É meu
desejo provar isso e mostrar que não é só idéia minha, mas, antes, algo que é
inevitavelmente verdadeiro. Como provada minha alegação, indico a vocês o que
aconteceu com o nosso bendito Senhor quando Ele foi tentado pelo diabo no deserto
durante quarenta dias e quarenta noites. Primeiramente, Ele foi batizado por João
Batista no Jordão, e quando saiu da água o Espírito desceu sobre Ele na forma de
uma pomba. Ele foi cheio do Espírito. Depois, notem a coisa interessante que vem a
seguir: “Então foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo
diabo” (Mateus 4:1). Segue-se depois a narrativa da tentação. Todavia o que nos
interessa agora é a maneira pela qual o nosso Senhor, cheio do Espírito, resistiu às
tentações do diabo. Ele o fez citando as Escrituras. Não disse apenas palavras dadas
por Deus a Ele no momento; não proferiu apenas “palavras que Lhe vieram de
Deus”. Ele citou a Palavra de Deus, citou as Escrituras. E não se pode duvidar de
que Paulo tem tudo isso em sua mente, como substrato do que ele está ensinando
neste ponto particular. A arma util izada pelo nosso Senhor foi a Palavra de Deus, as
Escrituras. E eu e vocês devemos combater o diabo e todos os seus poderes com a
mesma arma, “a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”.

Isso, por sua vez, leva-nos a fazer esta pergunta: “por que as Escrituras são descritas
dessa maneira e definidas como a espada providenciada pelo Espírito? Neste
combate contra o diabo e todos esses poderes, não há nada mais importante do que
termos claro entendimento sobre a Palavra de Deus e sua autoridade e seu
significado. É “a espada do Espírito”, o que significaque é Ele que adá. Ela vem
inteiramente dEle. Foi o Espírito que inspirou os homens que a escreveram; assim,
ela é “a espada do Espírito”, nesse sentido. Permitam-me lembrar-lhes
algumas declarações muito importantes concernentes às Escrituras: “Toda a

Escritura é dada por inspiração de Deus”, ou “Toda a Escritura é divinamente


inspirada” (2 Timóteo 3:16), declaração que nos garante que as Escrituras são-nos
dadas por Deus o Espírito. Depois há a declaração igualmente importante em 2
Pedro 1:19-21: “Eternos, mui firme, a palavra dos profetas, à qual bem fazeis em
estar atentos, como a uma luz que alum ia em lugar escuro, até que o dia esclareça, e
a estrela da alva apareça em vossos corações. Sabendo primeiramente isto: que
nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação”. O que Pedro diz é que
as profecias que encontramos no Velho Testamento não são, em nenhum sentido,
opiniões privadas daqueles profetas; não representam o seu entendimento e a sua
interpretação dos tempos e do futuro. Não são idéias excogitadas pelos profetas, por
assim dizer, por suas próprias mentes, e colocadas diante de nós como seus
pensamentos e teorias. Pedro diz claramente: “A profecia nunca foi produzida por
vontade de homem algum” - o homem nunca tem capacidade para produzir isto -
“mas os homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo”. Portanto, há
todos os motivos para descrevermos a Palavra de Deus como “a espada do
Espírito”. Ele a produziu. Ele deu a revelação a homens escolhidos; Ele os guiou no
registro da revelação. Portanto, a Bíbl ia não é mero documento humano, palavra
humana. É verdadeiramente a Palavra soprada, inspirada por Deus - a Palavra de
Deus. Foi inspirada - soprada dentro destes homens - e eles a escreveram.

Um ponto vital e fundamental para nós é que esta arma particular providenciada para
nós faz de fato parte da armadura de Deus. Não devemos combater o diabo com a
nossa própria força e poder, ou com as nossas próprias idéias; devemos combatê-lo
com esta Palavra que o próprio Espírito de Deus produziu. O Espírito Santo é o
Autor das Escrituras. Não significa que os homens que as escreveram o
fizeram mecanicamente; mas significa, sim, queo Espírito Santo é o Autor que de tal
maneira Se assenhorou destes homens e os guiou e inspirou, que lhes deu a revelação
e a capacidade para escrevê-la sem nenhum erro. Quando vocês considerarem a
força e o poder do inimigo que está contra nós, verão a importância de compreender
a força e o poder desta arma particular.

Assim sendo, devemos avançar um pouco mais. Somente o Espírito Santo nos
capacita a entender esta Palavra. Uma das claras afirmações neste sentido acha-se
em 1 Coríntios 2:12: “Nós não recebemos o espírito do mundo, mas o Espírito que
provém de Deus, para que pudéssemos conhecer o que nos é dado gratuitamente por
Deus”. Não podemos conhecê-lo doutra maneira. O argumento de Paulo é que,
quando o Filho

de Deus estava presente neste mundo na carne, os príncipes deste mundo não O
conheceram, não O reconheceram. Repudiaram-nO e O ridicularizaram, pois, “se o
conhecessem, nunca crucificariam ao Senhor da glória”. Como alguém vem a crer
nEle? O apóstolo dá a resposta: “As coisas que o olho não viu, e o ouvido não
ouviu, e não subiram ao coração do homem, são as que Deus preparou para os que o
amam. Mas Deus no-das revelou pelo seu Espírito; porque o Espírito penetra todas
as coisas, ainda as profundezas de Deus”. E mais: “O homem natural
não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não
pode entendê-las, porque elas se discernem espiritualmente... o que é espiritual
discerne bem tudo, e ele de ninguém é discernido” (ou: “...o que é espiritual julga
todas as coisas, mas ele mesmo não é julgado por ninguém”, VA e ARA). É
unicamente o Espírito que nos habilita a entender e a receber esta Palavra.

De igual modo, é unicamente o Espírito que nos capacita a “interpretar” esta


Palavra. É inteiramente obra do Espírito. Tudo quanto está ligado a esta Palavra é
sempre resultado da operação do Espírito, do princípio ao fim. Por mais capaz que
um homem seja no sentido natural, essa capacidade não o ajuda a interpretar as
Escrituras. Ele pode ser um gênio, ou um grande erudito, mas isso não o ajudará
aqui. A verdade “se discerne espiritualmente”. Deve ser interpretada de maneira
espiritual. E nada pode habilitar-nos a fazê-lo independentemente do Espírito
de Deus-e nem pessoa alguma. Assim, ao longo de toda a linha, vemos que a nossa
arma é “a espada do Espírito”.
Finalmente - e esta é, talvez, a consideração predom inante na mente do apóstolo
quando ele escreveu as palavras - é unicamente o Espírito Santo que nos capacita a
usar apropriadamente esta Palavra. E, como o apóstolo está preocupado com a
maneira prática de combater o inimigo, repeli-lo e fazê-lo fugir, evidentemente é isso
que ocupa lugar predominante em sua mente. Umacoisa é conhecero conteúdo deste
livro; é coisa muito diferente saber usá-lo direito. Somente o Espírito Santo
pode capacitar-nos a fazê-lo.

A relação entre o Espírito e a Palavra é da maior importância. O não reconhecimento


disso explica aocorrência de tantas dificuldades na longa história da Igreja Cristã. A
tendência geral é sempre dar ênfase exclusivamente a um ou ao outro lado. No
momento em que vocês separarem o Espírito e a Palavra, terão problema. Há alguns
que dizem que, tendo a iluminação do Espírito, você não tem nenhuma necessidade
da Palavra. Essa foi a tragédia dos quaeres. George Fox começou com o
equilíbrio certo, porém com o tempo foi se inclinando a dar cada vez menos atenção

à Palavra, e cada vez mais à “luz interior”, à iluminação do Espírito, à mensagem


recebida direta, imediatamente. Por isso a tradução da Nova Bíblia Inglesa, assim
chamada, é tão perigosa. Ela substitui “que é a palavra de Deus” por “palavras que
vêm de Deus”, exatamente aquilo que os fanáticos sempre afirmaram. Os
“entusiastas”, os fanáticos, sempre basearam toda a sua posição nisso.

Mas depois existe a outra tendência, no outro extremo, de desacreditar o Espírito e


dizer que, desde que tenhamos a Bíblia aberta e a Palavra diante de nós, e desde que
a conheçamos num sentido mecânico, não precisaremos de mais nada. Assim o
Espírito é esquecido, e se pode ter uma ortodoxia morta, ou um conhecimento
meramente intelectual e mecânico das Escrituras, que não capacita ninguém a pelejar
no combate contra o diabo, os principados e as potestades. O Espírito e a Palavra
têm que ser mantidos sempre juntos. O Espírito nos muniu da instrução que se acha
na Palavra, porém não podemos usá-la sem Ele. Ela pode ser letra morta para nós:
“a letra mata e o espírito vivifica” (2 Coríntios 3:6). O que é necessário é o Espírito
abrir a Palavra, abrir a minha mente e abrir o meu coração. Desde que vocês
mantenham os dois juntos, como o apóstolo faz aqui, vocês não terão como errar;
entretanto, se os separarem, o diabo já terá “dividido para poder vencer”, por assim
dizer. E, como digo, ele fez isso muitas vezes na longa história da Igreja Cristã.

O erro entra de muitas maneiras, mas agora estamos particu larmente interessados no
ataque geral contra a “verdade”. Já consideramos ataques específicos sob outros
títulos. O inimigo faz este ataque geral de muitas maneiras. Ele o faz por meio da
filosofia, que sempre foi inimiga da verdade, desde o princípio. Uma das primeiras
batalhas que a Igreja Cristã teve que travar foi contra a filosofia grega. Quando o
evangelho veio para a Europa, primeiro veio para a Grécia, onde havia uma
grande tradição filosófica, a perspectiva segundo a qual o homem, buscando a Deus,
poderá encontrá-10, o homem pode chegar à verdade graças à meditação e ao efetivo
desenvolvimento das suas teorias. Houve um grande combate nos primeiros séculos
entre a Igreja Cristã e o sutil ataque oriundo da filosofia. Continuamos tendo esse
combate, é claro, e talvez mais do que nunca.

Fazendo parelha com a filosofia, há o que geralmente chamam “conhecimento” -


qualquer conhecimento que o homem tenha. O conhecimento “científico” em
particular. É em termos do conhecimento moderno, dos últimos avanços do
conhecimento, especialmente do conhecimento científico, que muitos rejeitam o
cristian ismo. O único modo pelo qual podemos repelir este ataque particular é
empunhar e brandir “a

espada do Espírito, que é a Palavra de Deus”. Não há outro meio de defesa. Foi o
que o nosso Senhor fez. Devemos seguir os Seus passos em todas as questões; e nas
páginas dos quatro Evangelhos vocês verão que o nosso Senhor fez isso
repetidamente. Aqueles homens inteligentes, fariseus, escribas, doutores da lei,
vinham com as suas perguntas capci-osas, dizendo a si mesmos: “Quem é este
sujeito? Ele nunca foi instruído como fariseu, é um simples carpinteiro, nunca foi às
escolas, que é que Ele sabe?” E assim traziam as suas perguntas espertas. Eles eram
peritos nos pormenores e minúcias da lei. Eram grandes eruditos, e assim vinham
com toda a sua erudição, e pensavam que podiam apanhá-lO e pôr um fim no Seu
ministério. Ele sempre os enfrentou da maneira que já O vimos fazer na tentação no
deserto.

Vejam um exemplo, tomado do Evangelho Segundo Lucas: “E eis que se levantou um


certo doutor da lei”-um homem inteligente, instruído, um perito na lei
judaica-“tentando-o (ao Senhor), e dizendo: Mestre, que farei para herdar a vida
eterna?” Certamente ele esperava que o nosso Senhor desse uma opinião pessoal,
Sua, que ele, advogado, provaria que não era coerente com o ensino da lei. Mas o
nosso Senhor replicou-lhe perguntando: “Que está escrito na lei? Como lês?” (Lucas
10:25-26). Noutras palavras, Ele tomou “a espada do Espírito, que é a Palavra
de Deus”. Foi assim que o nosso Senhor lidou com aquele homem. “Que está escrito
na lei? O que você lê, o que você vê nas Escrituras?” Há um exemplo parecido no
Evangelho Segundo João: “Os judeus pegaram então outra vez em pedras para o
apedrejar. Respondeu-lhes Jesus: tenho-vos mostrado muitas obras boas procedentes
de meu Pai; por qual destas obras me apedrejais? Os judeus responderam-lhe,
dizendo: não te apedrejamos por alguma obra boa, mas pela blasfêmia; porque,
sendo tu homem, te fazes Deus a ti mesmo”. Um ataque verdadeiramente astuto! Jesus
respondeu-lhes: “Não está escrito na vossa lei: Eu disse: sois deuses? Pois, se a lei
chamou deuses àqueles a quem a palavra de Deus foi dirigida (e a Escritura não
pode ser anulada), àquele a quem o Pai santificou, e enviou ao mundo, vós dizeis:
blasfemas, porque disse: Sou Filho de Deus?” (João 10:31-36). Notem a arma! Ele
tomou “a espada do Espírito” e os feriu com ela. Não somente Se defendeu,
derrotou-os. E Ele constantemente agia dessa maneira.

É como nós também temos que I idar com estes ataques gerais a toda a verdade. O
que aqueles homens estavam sempre tentando fazer era desacreditar o nosso Senhor,
provar que Ele não era o que se dizia ser, e mostrar que o Seu ensino era errôneo. E
os homens continuam fazendo a mesma coisa. A “nova abordagem da verdade”,
assim chamada, o

questionamento fi losófico sobre como estas coisas podem ser verdadeiras à luz do
nosso conhecimento quanto a milagres e a questões que tais, é apenas um exemplo
disso. Estamos enfrentando hoje uma tentativa de desacreditar a revelação toda e a
essência mesma do nosso evangelho. E o ensino do apóstolo aqui é que o único
modo de deter tais ataques é tomar “a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”.

Vejam outro exemplo do uso desta “espada”. Lemos em Atos, capítulo 17, sobre
Paulo indo à sinagoga de Tessalônicae enfrentando a oposição dos judeus. O que nos
é dito é que ele “disputou com Eles sobre as Escrituras, expondo e demonstrando
que convinha que o Cristo padecesse e ressuscitasse dentre os mortos. E este Jesus,
que vos anuncio, dizia ele, é o Cristo”. (ARA: “arrazoou com eles, acerca
das Escrituras...”; VA: “arrazoou partindo das Escrituras...”.) Ele “arrazoou partindo
das Escrituras.” Invariavelmente, era esse o seu método. Suas Epístolas estão
repletas de citações bíblicas, necessariamente do Velho Testamento. Os Evangelhos
registram o mesmo procedimento. “Assim se cumpriu”, dizem eles, “o que foi dito
pelos profetas.” E mais tarde, os apóstolos, ao escreverem às igrejas para firmar
doutrina e para fundamentar as pessoas na verdade, sempre apresentam, como
seu argumento final, uma palavra das Escrituras, a Palavra de Deus.

O que foi feito pelos apóstolos, foi feito também pelos mártires e militantes
confessos da Igreja. Em particular vemos que foi precisamente isso que Martinho
Lutero fez nos dias da Reforma Protestante. Lutero era mantido nas trevas pelo
diabo, apesar de ser um monge. Ele tentava salvar-se pelas obras. Jejuava, suava e
orava; e, contudo, sentia-se miserável, infeliz eem escravidão. O supersticioso
ensino católico--romano o mantinha cativo. Mas ele foi 1 ibertado pela palavra da
Escritura: “Ojusto viverá pela fé”. Desde aquele momento ele começou a
entender esta Palavra como nunca antes, e quanto mais a entendia, mais ele via
os erros ensinados por Roma. Ele viu o erro das suas práticas, e assim se fortaleceu
a sua intenção de reformar a igreja. Passou a fazer tudo em termos de exposições das
Escrituras. Os grandes doutores da igreja romana se levantaram contra ele. Às vezes
tinha que ficar sozinho e enfrentá-los em intenso combate, e invariavelmente firmava
sua posição nas Escrituras. O padrão pelo qual até a Igreja Cristã deve ser julgada
é as Escrituras. E, embora ele fosse apenas um homem, a princípio resistindo
sozinho, pôde combater o sistema papal e doze séculos de tradição. Ele o fez
tomando “a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”.
Os nossos “pais” protestantes, neste país, fizeram precisamente a

mesma coisa. As Escrituras eram as únicas armas que eles usavam. Os puritanos
também procederam de igual maneira. E por isso que os primeiros protestantes se
preocuparam tanto em que houvesse uma confiável tradução inglesa da Bíblia, que
todos os seus leitores pudessem entender. Tyndale tomou a resolução de que todo
lavrador, homem ou rapaz, todas as pessoas simples, haveriam de poder ler e
entender, para que fossem salvaguardadas contra o falso ensino da igreja
católica romana. A maneira de fortalecer as pessoas nesse aspecto é propiciar-lhes o
conhecimento da Palavra de Deus. Daí o grande anseio por precisas e fidedignas
traduções da Bíblia na língua inglesa.

Podemos enfrentar o diabo desta maneira, seja qual for o argumento que os seus
agentes apresentem. Nem todos somos entendidos em ciência, nem todos somos
entendidos em filosofia. Como, então, poderemos resistir às pessoas que apresentam
argumentos anticristãos? Há somente um modo de fazê-lo. Tomem a sua posição.
Tomem aquilo que vocês são capazes de usar, a Palavra de Deus. Aí está uma coisa
que está ao alcance de cada um de nós. E, se vocês conhecerem esta Palavra, serão
capazes de responder à filosofia, à ciência, a toda e qualquer coisa que se levante
contra vocês. Mantenham-se firmes na Palavra, mantenham-se firmes em seu ensino,
e invariavelmente farão o inimigo fugir.

Há outro aspecto muito interessante deste assunto. Sempre, desde a Reforma


Protestante do século dezesseis, o verdadeiro protestantismo tem pelejado no
combate contra Roma em termos da Bíblia, porque sempre foi o meio que funcionou
e que foi honrado por Deus. Durante todo aquele período a igreja católica romana
mantinha a Bíblia afastada do povo, pois, evidentemente, era o conhecimento da
Bíblia que 1 ibertava as pessoas das falsas doutrinas romanas. Ela não permitia que
as pessoas tivessem a Palavra numa língua que elas pudessem entender. Ela
a mantinha longe delas; ela as desistimulava de lê-la, dizendo que elas não tinham a
mínima possibilidade de entendê-la. Ela denunciava a doutrina protestante do
sacerdócio universal de todos os crentes e o ensino de que a todo aquele sobre quem
estiver o Espírito é possível entender. A igreja romana alegava que só ela pode
interpretar as Escrituras.

Hoje em dia, porém, a igreja católica romana mudou sua política. Agora ela dá a
Bíblia ao seu povo e o anima a lê-la. Por que a mudança de política? Para mim, essa
é uma das coisas mais significativas deste século. Por que é que agora ela dá as
Escrituras ao seu povo, e por que não tem mais medo de fazê-lo? A resposta é
significativa. Cito as palavras de um dignatário da igreja católica romana, não ditas
em público, mas privadamente, a um protestante que levantou a questão para ele. É
uma

franca explicação da inversão da sua pol ítica do clero romano. Disse ele: “Vou
dizer-lhe porque mudamos a nossa política. Não há mais nenhuma necessidade de
temermos as Escrituras, por esta razão, que vocês protestantes, não crêem mais nas
Escrituras. Foram vocês, protestantes”, disse ele, “que, com a sua crítica destrutiva
das Escrituras, solaparam a confiança do povo nas Escrituras. Por isso podemos d
izer que somos só nós que representamos as Escrituras”.

Essaé a situação com que nos defrontamos! A igrejacatólicaromana diz que as


Escrituras são a Palavra de Deus. É verdade que ela acrescenta a sua tradição, mas
ela representa a Palavra, e até recentemente ela se opunha à Alta Crítica. Mas o
protestantismo, em sua cegueira e loucura, completamente derrotado e escravizado
pelo diabo, solapou a sua própria autoridade. Agora ele não tem nada com que
manter o combate contra Roma. Não tem nada com que combater a filosofia. Não tem
nada com que combater a “ciência”. Sua autoridade não é mais a revelação que
se acha na Bíblia, não é mais o fato de que a Palavra é inspirada por Deus, dada por
Deus e honrada por Deus. Os protestantes modernos alegam que estão lutando contra
o mal em termos da filosofia, da ciência e do conhecimento moderno, e isso não
pode levar a nada, senão à derrota. Há somente um meio pelo qual combater o in im
igo em seus ataques a todo o evangelho cristão, seja ele uma igreja apóstata, ou
sejam os infiéis, com o seu conhecimento moderno, com a sua ciência moderna e
com a sua filosofia moderna. A única maneira de combater e repelir o inimigo
é empunhar esta “espada do Espírito, que é a Palavra de Deus”. Se você não tem
certeza que ela é a Palavra de Deus, se não confia plenamente, absolutamente nela,
se não acredita que ela é inerrante, então você tem nas mãos uma espada quebrada,
já foi derrotado pelo inimigo. Empunhe esta espada e use-a no poder do Espírito, e
não me causarão cuidado quais universidades ou eruditos ou seja o que for que se
levante contra você; como Martinho Lutero, com a Palavra você estará equipado
divinamente, e será capaz de repelir e fazer recuar os seus inimigos.

Mais um ponto requer a nossa consideração. Quando estávamos interpretando a


primeira peça- “tendo cingidos os vossos lombos com a verdade”-eu disse que teria
de mostrar a diferença entre a verdade com a qual devemos cingir os nossos lombos,
e a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus. A diferença é que, quando o
apóstolo diz que devemos ter os nossos lombos cingidos com a verdade, ele está se
referindo à verdade central da salvação, o grande método, plano e esquema
da salvação como um todo. No entanto não é esse o sentido aqui. Quando

Paulo diz, “a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”, está se referindo ao


nosso detalhado conhecimento dessa Palavra. Refere-se ao conhecimento das
Escrituras em suas particularidades, e à nossa capacidade de selecionar e usar a
palavra ou passagem apropriada em qualquer ponto. A figura é do inimigo
avançando e do meu ato de tomar a espada. Repito que isso é perfeitamente ilustrado
pela narrativa da tentação do nosso Senhor. O inimigo vem com as suas três
sugestões. Mas o nosso Senhor sabia exatamente que parte das Escrituras escolher,
que parte usar, que palavra aplicar, em cada caso particular. Todavia, usando
a espada desta maneira, com a resposta específica das Escrituras, Ele repele o
inimigo e o faz desaparecer, embora “por algum tempo” (Lucas 4:13).

Essa, creio eu, é a diferença entre estas duas peças da armadura. Noutras palavras,
se havemos de vencer como o nosso Senhor venceu, não somente devemos conhecer
o método de salvação, e saber que estamos sal vos; também devemos conhecer as
nossas Escrituras, temos que conhecê-las minuciosamente. E não só isso, devemos
aprender a usar as Escrituras, a citar a palavra mais eficaz quando alguém tentar
abalarmos. Todo cristão bem preparado deve conhecer isso em sua
experiência pessoal, tanto negativa como positivamente. Conheço cristãos
que, quando procuram ajudar um incrédulo, dizem: “A Bíblia diz nalgum lugar...”.
Mas o incrédulo diz: “Tem certeza que isso está na Bíblia?” E o cristão responde:
“Bem, eu sei que está aí, nalgum lugar”. Contudo não sabe onde. O incrédulo diz:
“Bem, você não me pode provar que isso está nas Escrituras”. E é claro que não
pode, porque não é capaz de localizá-lo. Mas, por outro lado, se você puder dizer:
“veja isto”, o outro será levado a ouvir-e a ver! Não significa necessariamente que
você poderá persuadi-lo a crer, porém pelo menos ele terá sido levado a encarar
as Escrituras. E você verá que geralmente o incrédulo é muito ignorante
das Escrituras, o que se explica em parte, talvez, por ser ele um incrédulo.
Lê filosofia, ou ciência, lê os jornais, lê os ataques feitos às Escrituras; mas não
conhece as Escrituras. A melhor maneira de lidar com ele é ensiná-lo com base nas
Escrituras, elucidar o ensino delas e dar-lhe respostas específicas tiradas delas. O
termo “espada”, reitero, neste contexto, não se refere ao conhecimento geral do
plano de salvação, mas, antes, à capacidade de usar as Escrituras e de dar a resposta
apropriada em qualquer ponto específico, como o nosso Senhor fez na tentação a que
se submeteu.

A espada nos é dada; temos a Bíblia aberta. Mas temos que conhecê-la. Temos que
conhecer a totalidade dela. Não é suficiente aprender

apenas certos textos-provas; você tem que conhecer as Escrituras todas. Observe
como o nosso Senhor citava o livro de Deuteronômio. Obviamente ele conhecia o I i
vro todo. Temos que embeber-nos nas Escrituras, temos que “tê-las nas pontas dos
dedos”, como se diz, para que, quando formos tentados, a Palavra apropriada nos
ocorra; o Espírito no-la dará; Ele nos conduz à Palavra, às Escrituras. Ele nos
ilumina, nos dirige, nos guia. Não devemos contentar-nos em ler uns poucos
versículos, imaginando que quando lemos a nossa porção diária, já estudamos as
Escrituras. Devemos dedicar tempo a isso, devemos aprofundar-nos, devemos
ler todo o conteúdo da B íblia, devemos impregnar-nos do conhecimento de todas as
suas partes. Então, a qualquer momento, teremos a resposta apropriada, eo inimigo
não somente será repel ido; será derrotado, fugirá de nós.
Este conhecimento nos é possível a todos. Conheci mu itos operários, pouco
instruídos, mas queconheciam aB íbliae que podiam fazerhomens cultos parecerem
tolos. Um homem bem preparado estava tentando divertir-se às custas de um pobre
trabalhador de estradasjunto à rodovia. Com o seu conhecimento e a sua cultura, ele
estava tentando confundir o cristão hum ilde. Todavia não conseguiu. O cristão hum i
Ide conhecia as Escrituras, conhecia a Palavra de Deus, e foi ele que pôde fazer o
homem culto parecer tolo e escafeder-se, derrotado. Não se trata aqui de capacidade
natural ou de cultura ou de conhecimento humano. Deus nos mune da Palavra, o
Espírito no-la oferece. E se Ele estiver sobre você e em você quando você ler a
Palavra, Ele a fixará em sua mente e em seu coração, e Ele lhe mostrará como usá-la
conforme o exija a ocasião.

Estamos vivendo em dias desesperados, em que o inimigo está procurando solapar a


posição toda. “Tomai a espada do Espírito, que é a palavra de Deus.” Façamos isso,
e façamos uso dela, brandindo-a para a Sua glória e para o Seu louvor.

ORANDO NO ESPÍRITO

“Orando em todo o tempo com toda oração e súplica no Espírito, e vigiando nisto
com toda a perseverança e súplica. ”

- Efésios 6:18

O apóstolo, neste ponto, chega à sua derradeira declaração com respeito àquilo que,
como povo de Deus, temos de fazer quanto ao nosso conflito e combate contra o
diabo e os principados e potestades, contra os príncipes das trevas deste século,
contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais.

Onosso bendito Senhor, quando esteve aqui naterra, esteve engajado no mesmo
conflito. Ele, “como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado”. O diabo O atacou, e
todos estes poderes foram usados contra Ele. E o simples fato de que somos cristãos
significa que estamos inevitavelmente envolvidos nesta luta e conflito. Não há nada
mais fatal do que começar a vida cristã com a idéia de que agora que somos
cristãos, acabamos com todos os problemas e dificuldades. Isso está longe de
ser verdade. Na realidade é quase a antítese da verdade. Ao contrário, o Novo
Testamento dá a impressão de que, visto que somos cristãos, devemos esperar
ataques contra nós de um modo que nunca conhecemos ou percebemos antes. Mas,
graças a Deus, não só nos é dito que temos de pelejar e lutar desta maneira, porém
também nos é dito como habilitar-nos a fazê-lo com sucesso.

Qual será o sentido desta exortação adicional e final? Qual será a relação deste
“orando em todo o tempo” com o que o apóstolo tinha apresentado até aqui? A
resposta é que esta parte não é uma peça adicional da armadura. Alguns a entendem
rio sentido de que Paulo ainda está falando de toda a armadura de Deus e que está
dizendo: “Agora, a próxima peça, a peça final, é a oração”. Mas isso, seguramente,
está inteiramente errado, simplesmente pela razão de que, em todos os outros casos,
ao tratar das peças da armadura, o apóstolo seguiu a sua analogia, de perto e
cuidadosamente. Ele tinha em mente o soldado romano, e tomou as várias peças da
armadura que era usada pelo soldado romano, e as c itou nominalmente. Mencionou,
como vimos, o cinto, a couraça, as sandál ias, o escudo, o capacete e a espada.
Todavia aqui não há menção de nenhuma peça da armadura, e isso, em si, é suficiente
para decidir a questão. O

apóstolo descrevera seis peças da armadura; e esse é o quadro total quanto à


analogia concernente a “toda a armadura de Deus”. Além disso, não há aqui nenhuma
referência a alguma parte particular do corpo, nem ao corpo como um todo.

Tampouco estas palavras são, como alguns sugerem, uma elaboração de “a espada
do Espírito, que é a palavra de Deus”. “Orando em todo o tempo com toda a oração
e súplica” significa, eles sugerem, que se usa a espada do Espírito “orando no
Espírito”. Isso, ao que parece, é uma interpretação inteiramente artificial.

Bem, então, qual será a conexão? Certamente é que este “orando no Espírito” é algo
que temos de fazer, e continuar fazendo, em conexão com o uso de toda a armadura, e
na verdade com toda a nossa posição como cristãos em conflito com o mundo,
acarne e o diabo. Paulo diz: “Tornem estas várias partes da armadura e vistam-nas,
vistam-nas cuidadosamente, e façam uso delas da maneira descrita... porém, em
acréscimo a tudo isso, sempre, em todo o tempo e em todas as circunstâncias,
continuem orando.” Há dois hinos que dão o que eu considero como a
interpretação da conexão existente entre “a oração” e “toda a armadura de
Deus”. Um dos hinos faz esta colocação:

Veste a armadura do evangelho,

Veste cada peça em oração.

O outro hino o expressa assim:

Manter brilhante a tua armadura Requer cuidado constante;

Do teu Capitão sempre sob as vistas,

Em oração vigilante.

Ambas as estrofes foram inspiradas pelo versículo que estamos examinando, e eu


acredito que a interpretação que fazem é boa e correta. “Veste cada peça em oração.”
De fato, tudo quanto temos que fazer deve ser feito com este espírito e com esta
atitude de constante oração.

Significa, então, que a armadura que nos é dada por Deus não pode ser usada, a não
ser havendo boas relações e comunhão com Deus. Jamais se deve pensar na
armadura que Deus nos dá em termos mecânicos, e muito menos em termos mágicos.
O perigo, a tentação, é achar que, tão logo vistamos esta armadura, não será preciso
fazer mais nada; está tudo bem, a armadura por si mesma nos protegerá, e o fará

mecanicamente. Assim, tendo-a vestido, podemos relaxar e pôr de lado a vigilância.


Mas isso é exatamente o oposto da posição verdadeira, diz o apóstolo; pensar desta
maneirajá é estar derrotado. Deve-se conceber a armadura e sua aplicação espiritual
de maneira vital e vivida. Cada peça, isoladamente, por excelente que seja, não nos
será suficiente e não terá proveito para nós, a não ser que sempre e o tempo todo
estejamos em viva relação com Deus, dEle recebendo força e poder. Vejam mais
uma vez as coisas que estivemos estudando. “Tendo cingidos os vossos lombos com
a verdade” - a grande e gloriosa verdade acerca da salvação como um todo e em
geral. A “couraça dajustiça”-ver com clareza a doutrina da justificação somente pela
fé, e provar que a vemos vivendo uma vida justa. “Calçados com os pés na
preparação do evangelho da paz” - uma fé zelosa e todas as coisas maravilhosas que
ela pode fazer. “O capacete da salvação” - aquela “bendita esperança”! E “a espada
do Espírito”. E, todavia, de acordo com o apóstolo, mesmo tendo todas estas
coisas, podemos falhar e ser derrotados completamente. Noutras palavras, vocês não
podem confiar nem nestas coisas, em si mesmas, e imaginar que, visto que as têm,
jamais cairão nem fracassarão.

Para expor o ponto de forma diferente, o que o apóstolo nos está dizendo é que nem a
ortodoxia é suficiente. Temos que ser ortodoxos, temos que ter toda a armadura de
Deus; não haverá esperança para nós, se não a tivermos. Vocês não conseguirão
combater o diabo com a filosofia, não conseguirão combatê-lo com o idealismo, não
conseguirão combatê-lo com coisa alguma, exceto com a verdade de Deus, da
qual estamos munidos. Mas o ponto é que, nem mesmo com a doutrina ortodoxa
vocês conseguirão combater o diabo, se tentarem fazê-lo com a sua própria força e
poder. Ortodoxia mortaé coisa que existe. Ao cristão é possível ser perfeitamente
ortodoxo e, contudo, ser derrotado e viver uma vida fracassada e inútil. Ele entende
a verdade com a mente, conhece-a, pode apontar erros no ensino de outros; e,
todavia, a sua vida não tem valor para ninguém, porque ele está sendo derrotado
pelo d iabo. Tal vez tenha se tomado intelectualmente orgulhoso do seu
conhecimento, do seu entendimento e da sua apreensão das Escrituras. Se acontece
isso, ele já é um homem derrotado. A mera familiaridade com a verdade, embora
absolutamente essencial, não nos pode resguardar da derrota.

O mesmo se aplica, é evidente, a uma igreja, a um grupo de igrejas, a uma


denominação. Houve na história da Igreja, igrejas que eram totalmente ortodoxas,
mas que foram completamente ineficientes e inúteis, do ponto de vista da evangel
ização e de levar homens e mulheres ao conhecimento da verdade. Não influíam em
nada em suas áreas, ou em

seus vários países. Isso pode ocorrer devido a este conceito falso, mecânico, quase
mágico, de toda a armadura de Deus. Começam com o cinto da verdade, revestem-se
de todas as outras partes da armadura, são capazes de usar, assim pensam, a espada
do Espírito. Entretanto são paralizadas pelo diabo. De um modo ou de outro, sua
posse da verdade não parece ter valor ativo em seu trabalho como ramos da Igreja
de Deus.

Este estado de coisas, como digo, pode ser ilustrado com fatos da longa história da
Igreja; também pode ser ilustrado mediante o registro de fatos da Igreja no presente.
Não há nada que seja tão trágico quanto uma igreja ortodoxa morta; e a explicação
sempre é que se esqueceram desta exortação adicional. Tendo vestido cuidadosae
completamente cada uma das peças da armadura, não foram adiante para lembrar-se
desta injunção - “Orando em todo o tempo”. Este é um fato aterrador e, de certo
modo, a situação mais alarmante possível -talvez mais alarmante, especialmente
quanto àqueles de nós que têm mentalidade teológica. Pode acontecer que os mais
ortodoxos sejam os que menos percebem o valor da oração. Conheci cristãos que
conheciam bem a teologia da Bíblia, e a conheciam extraordinariamente bem, porém
que não acreditavam em reuniões de oração, que pareciam não ver a total e absoluta
necessidade de “orar sempre”, “o tempo todo”, da maneira aqui indicada pelo
apóstolo.

É uma lástima, mas o diabo pode fazer-nos concentrar tanto a nossa atenção num
aspecto da verdade que nos esquecemos inteiramente dos outros aspectos. Mas,
tratemos de não cair nessa armadilha; sigamos o apóstolo e vamos até onde ele nos
levar. O que ele quer dizer é que se deve fazer tudo de maneira espiritual, trazido à
existência e vivificado pelo Espírito. Se não acontecer isso, haverá pouco benefício,
se é que haverá algum. “A letra mata e o Espírito vivifica”, e podemos transformar
até esta gloriosa doutrina da salvação em nada mais que outra espécie de legalisrrto
ou escolasticismo. No momento em que o fizermos, já estaremos derrotados pelo
diabo. Portanto, sempre deve haver esta “vida”, este “poder”, esta capacidade de
usar o que Deus nos dá.

Noutras palavras, na verdade o apóstolo está repetindo neste versículo oquejá


dissera no versículo 10:“Nodemais, irmãos meus, fortalecei-vos no Senhor e na
força do seu poder”. Ele começou com esse preceito, porém, como ele sabe muito
bem que temos a tendência de concentrarmos na última coisa que ouvimos, prossegue
e nos fala de toda a armadura de Deus em detalhe. Ele sabe também que muitos
provavelmente dirão: “Esta armadura é a única coisa que importa”, esquecendo-se
daquilo com o que Paulo começou; por isso ele o traz de novo à baila- “Orando em
todo o tempo.” É desta maneira que “nos fortalecemos no Senhor e

na força do seu poder”; “orando em todo o tempo, com toda a oração e súplica no
Espírito”. Dependemos completamente de Deus e do Senhor Jesus Cristo; e devemos
dar-nos contade que, se não permanecermos em constante contato e comunhão com
Deus, seja o que for que tenhamos feito tendo vestido a armadura, de nada nos
valerá. Temos que manter sempre esta essencial e íntima relação com Deus. Nunca
nos esqueçamos de que na vida cristã a oração é essencial.

É notável o lugar que o Novo Testamento dá à oração. Vejam-no na própria vida do


nosso Senhor. Como Filho de Deus, Ele possuía um conhecimento maravilhoso, e às
vezes o demonstrava, para espanto dos fariseus, dos escribas e de outros; e, todavia,
notem a freqüência com que Ele Se isolava para orar a Deus. Ele costumava passar a
noite inteira em oração, costumava levantar-Se muito antes do alvorecer, a fim de
orar a Deus e manter esta comunhão. Ele achava que isso era essencial ao
Seu ministério. E por isso não é surpreendente que Ele ensinasse os Seus discípulos
“sobre o dever de orar sempre, e nunca desfalecer” (Lucas 18:1). É a única
alternativa ao desânimo, é o único meio de evitar o desânimo. Ou oramos sempre ou
ficamos desanimados.

Por isso lhes faço uma pergunta, nesta altura: qual o lugar da oração da sua vida?
Que proeminência tem ela em nossas v idas? É uma questão que eu dirijo a todos. É
tão necessário que alcance o homem versado nas Escrituras e que tem conhecimento
da sua doutrina e da sua teologia, como também que alcance toda e qualquer outra
pessoa. Que papel a oração desempenha em nossas vidas, e até que ponto ela é
essencial para nós? Acaso compreendemos que sem ela ficamos
desanimados? Praticamo-la da maneira aqui indicada pelo apóstolo? Não há
como duvidar da resposta dada pelas vidas dos santos a esta questão.

A nossa posição fundamental como cristãos é provada pelo caráter da nossa vida de
oração. É mais importante que conhecimento e entendimento. Não fiquem
imaginandoque estou diminuindoa importância do conhecimento. Passo a maior parte
da minha vida procurando mostrar a importância de se ter conhecimento e
entendimento da verdade. Isso é vitalmente importante. Há só uma coisa mais
importante, a oração. A prova final do meu entend imento do ensino escriturístico é
quanto tempo eu passo em oração. Como ateologia é, em última análise o
conhecimento de Deus, quanto mais teologia eu conhecer, mais ela me levará a
buscar conhecer a Deus. Não apenas saber algo “sobre” Ele, mas conhecê-lO! O
grande objetivo da salvação é levar-me ao conhecimento de Deus. Posso falar
doutamente acerca da regeneração, todavia, que é a vida eterna? É “que te conheçam,
a ti só, por único Deus verdadeiro, e a Jesus

Cristo, a quem enviaste” (João 17:3). Se todo o meu conhecimento não me leva à
oração, há algo errado nalgum lugar. É o que lhe cabe fazer. O valor do
conhecimento é que ele me dá tal entendimento do valor da oração que eu dedico
tempo à oração, e o faço com prazer. Se o conhecimento não produz estes resultados
em minha vida, háalgo errado e espúrio em torno disso, ou então eu o estou
conduzindo erradamente. Estou convencido de que o problema é que temos a
tendência de parar na colocação de toda a armadura de Deus. “Aqui estamos
completos”, dizemos a nós mesmos. E assim o diabo nos leva a enfunar-nos pelo
nosso conhecimento, e com isso ele nos derrota.

Sigamos, pois, o apóstolo na instrução minuciosa que ele nos dá quanto a este v ital
tema da oração. Embora falte pouco para conclu ir a sua Epístola, ele ainda se sente
compelido a entrar em detalhes. Como ele era sábio! Que mestre profundo! Ele não
nos deixa no “orando em todo o tempo”. E o que nos inclinamos a fazer. Mas ele nos
conhece, sabe dos nossos defeitos, da nossa ignorância, sabe que precisamos
receber instrução de maneira detalhada - “orando em todo o tempo com toda
a oração e súplica no Espírito, e vigiando nisto com toda a perseverança”.

Talvez se possa dividir o ensino de Paulo sobre a oração, a verdadeira oração, em


geral e particular. Pode-se dizer que a instrução geral é a forma da oração distinta do
espírito de oração. “Oração” é um termo geral, e o apóstolo o subdivide em duas
partes-em primeiro lugar, “toda a oração”, e, em segundo lugar, “súplica”. “Orando
com toda a oração” sign ifica, em parte, oração em geral, tudo incluído sob o título
de oração. Entretanto, há um sentido mais profundo. O apóstolo quer dizer
realmente que devemos orar sempre com todas as formas ou espécies de
oração. Vocês devem orar em particular, devem orar em público. “Toda a oração”,
todo tipo de oração! Existe a oração secreta, a oração reservada, a oração a sós, a
oração isolada, e devemos estar sempre empenhados nela. Mas não é só. Há também
a oração pública, a oração da igreja, a oração em comum, a oração que fazemos
juntos, como se lê no livro de Atos dos Apóstolos que os cristãos primitivos faziam.

No entanto, há outra espécie de d ivisão. Às vezes se faz oração com palavras -


oração oral! Mas nem sempre é preciso usar palavras para orar. Pode-se orar sem de
fato proferir palavras; a oração pode ser impronunciada, bem como oral. Paulo diz:
entregue-se a todos os tipos de oração. Não é necessário que vocês se inclinem e se
ajoelhem quando orarem. Às vezes vocês estão andando pela rua, pode vir a
tentação, e vocês começam a orar em seu pensamento, em seu coração e em
seu espírito.

Ainda a oração às vezes é formal, no sentido de que é ordenada. Notem a ordem que
se vê, por exemplo, na oração Pai Nosso. É evidente que há nela ordem, desígnio e
plano. E essa é a verdade a respeito de muitas das grandes orações que encontramos
na Bíblia. Devemos orar da mesma maneira. As nossas orações devem ser
inteligentes. Écorreto que haja certa ordem e certa disposição formal em nossas
orações. Mas essa não é a única forma de oração. Há outro tipo de oração que pode
ser igualmente proveitosa, igualmente eficaz. As vezes é apenas umaexcla-mação, às
vezes um gemido, um brado do coração: “O mesmo Espírito intercede por nós”, diz
Paulo, “com gemidos inexprimíveis”. São os nossos gemidos. O Espírito não precisa
gemer; nós é que gememos. E às vezes essa é toda a oração que fazemos; apenas um
suspiro, apenas um gemido, um “Oh!” Leiam as orações de gente como Isaías: “Oh,
se fendesses os céus...!” (Isaías 64:1). Aquele “Oh!” O que o apóstolo está dizendo é
que devemos orar por todos os meios e de todas as maneiras, usando todas as formas
e espécies de oração. Orar sempre e incessantemente.

Mas o apóstolo especifica um certo tipo de oração em particular; em seu contexto


isso era necessário-“Súplica!” refere-se àquela parte bem definida da oração que
chamamos “petição”; é oração referente a pedidos e desejos especiais. Devemos
dedicar-nos à oração em geral, em todas as suas formas e tipos - adoração, serviço,
louvor e ação de graças. Mas depois passar aos “pedidos”. O apóstolo sempre adota
esta mesma ordem. Faz isso quando escreve aos fi lipenses, onde ele diz: “Não
estejais inquietos por coisa alguma, antes as vossas petições sejam
conhecidas diante de Deus pela oração e súplica, com ação de graças” (4:6).
Nesta espécie de oração geral que devemos elevar sempre a Deus, Pau lo d iz
que devemos apresentar particularmente estas “súplicas”, estas petições específicas,
e continuar fazendo isso, a medida que vemos as diversas necessidades surgirem e
que vemos as necessidades alheias, e assim por diante. Em todas estas diferentes
formas e maneiras, diz ele, sintam-se 1 ivres, e orem em geral, orem em particular,
apresentem as suas petições, “as vossas petições sejam conhecidas diante de Deus”.

São essas, então, as instruções gerais quanto à oração. Mas vamos concentrar-nos na
próxima parte, que me aventuro a chamar o segredo da verdadeira oração. Consta em
duas palavras - “no Espírito”. “Orando em todo o tempo com toda a oração e súpl
ica no Espírito.” Esta é a real essência, a própria vida e espírito da oração. Vê-se
nesta Epístola, no capítulo dois, versículo 18: “Porque por ele”, diz o apóstolo
referindo-se ao nosso Senhor, “ambos temos acesso ao Pai em um mesmo

Espírito”. Ele tratara do mesmo assunto na Epístola aos Romanos, capítulo 8,


versículo 26. Seu tema ali é o mesmo-estamos num mundo marcado por provações,
sofrimentos e tentações. Ele os lembra - e se alegra ao fazê-lo - de que “as afl ições
deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser
revelada”. Não obstante, a vida é muito difícil. “Nós mesmos, que temos as
primícias do Espírito, também gememos em nós mesmos, esperando a adoção, a
saber, a redenção do nosso corpo. Porque em esperança somos salvos. Ora,
a esperança que se vê não é esperança” - não a recebemos ainda, somente a vemos
como num espelho, obscuramente, vêmo-la à distância, pela fé - “porque o que
alguém vê, como esperará? Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o
esperamos” (Romanos 8:23-25). Essa é a situação do cristão neste mundo -
perseguido, provado e tentado. No entanto, Paulo continua: “E da mesma maneira
também o Espírito ajuda as nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de
pedir como convém, masomesmo Espírito intercedepornóscom gemidos
inexprimíveis. E aquele que examina os corações sabe qual é a intenção do Espírito;
e é ele que segundo Deus intercede pelos santos” (versículos 26-27).

A mesma idéiase encontra em Filipenses 3:3, onde Paulo, descrevendo o cristão, diz:
“A circuncisão somos nós, que servimos a Deus em espírito” - ou, “pelo Espírito” -
“e nos gloriamos em Jesus Cristo, e não confiamos na carne”. A ênfase recai em “nós
servimos a Deus” (ARA: “nós adoramos a Deus”; VA: “nós prestamos culto a
Deus”). Diferentemente dos judeus e dos judaizantes, adoramos a Deus “em
espírito”. Vemos o mesmo ensino na Epístola de Judas, quando ele escreve:
“Mas vós, amados, edificando-vos a vós mesmos sobre a vossa santíssima
fé, orando no Espírito Santo, conservai-vos a vós mesmos no amor de
Deus, esperando a misericórdia de nosso Senhor Jesus Cristo para a vida eterna”
(versículos 20-21).

Por que Paulo não se contenta em dizer, “Orando em todo o tempo com toda a oração
e súplica”? Por que acrescenta, “no Espírito”, como faz noutras Epístolas, e como
faz Judas? Isso para mim é um ponto vital, concernente à oração. O acréscimo é vital
a este ponto - que, se não nos lembrarmos dele, não oraremos realmente. Orar, diz
Paulo, de várias maneiras, oração audível ou inaudível, de pé, dejoelhos ou em
qualquer posição, não é fundamentalmente o elemento vital da oração. Naturalmente,
essas coisas têm o seu lugar; mas, acima de tudo, toda oração deve ser “no Espírito”.

Significa, negativamente, que “vãs repetições” não é orar. “Muito falarem”! Os


fariseus pensavam que por isso eram ouvidos. Eles

julgavam e avaliavam uma oração por seu comprimento e por sua publicidade. E por
certo aqui está envolvida toda a questão do uso da liturgia. Pode-se repetir orações
mecanicamente, leras mesmas orações, ou recitá-las de cor, domingo após domingo.
Isso não se restringe à parte litúrgica da Igreja; os que desdenham a liturgia podem
ser culpados da mesma coisa; podemos entregar-nos a vãs repetições, a
meramente proferir palavras. Podemos fazê-lo privadamente, podemos fazê-lo
publicamente; podemos orar por mero hábito e costume, simplesmente
porque acreditamos que é certo dizer as nossas orações de manhã e de noite.
Mas muitas vezes isso não é orar! Pode ser que estejamos apenas
proferindo palavras, e não orando “no Espírito”. A verdadeira oração é a que é
feita “no Espírito”. É o oposto de por a confiança em formas e no ritual.

Nãodêemouvidosaessesjudaizantes, diz Paulo aos Filipenses; eles dirão que vocês


só poderão adorar num templo, ou que só poderão adorar se adotarem certas formas
e cerimônias, de certo ritual. Depois ele profere a palavra positiva: “A circuncisão
somos nós, que servimos a Deus no Espírito”, isto é, de maneira espiritual. Toda e
qualquer outra adoração ou oração é mecânica, externa, formal; não é aceitável a
Deus.

Vemos, pois, a necessidade desta exortação, deste acréscimo: “no Espírito”. Há


pessoas para as quais certos tipos de edifícios são essenciais para poderem orar.
Tenho ouvido gente assim dizer: “Naturalmente o segmento católico da igreja dá
mais atenção à adoração do que o não conformismo”. O que se quer dizer com isso é
que os católicos têm certos tipos de edifícios, com vitrais coloridos, e usam certas
formas e cerimônia e ritual, e pensam que isso é prestar culto; e, naturalmente,
se você não se ajoelhar para orar na igreja, não estará orando. A mera postura é
para eles uma grande e vital questão. Entretanto, para o apóstolo Paulo, o que
importa é se o seu espírito está inclinado diante de Deus. O que importa é se você
está “no Espírito”. Esse é o contraste.

Podemos dizer ainda que “orar no Espírito” é o oposto das orações frias, formais,
que não vêm do coração. Nada me apavora mais do que ouvir, às vezes, num culto,
ou pelo rádio, ou pela televisão, falar-se em “dizer uma oração”. Lembro-me de uma
vez que ouvi um homem descrever uma visita que ele havia feito a certa cidade.
Contou-nos que de repente viu uma catedral “e entrei”, disse ele, “e disse uma
oração”. Depois continuou a contemplar as vistas da cidade. “Dizer uma
oração”! Isso me parece o exato oposto de “orar no Espírito”. Ou, pior ainda, há o
tipo de homem cujo procedimento religioso é perfeito, homem que foi treinado
perfeitamente nas finuras da direção de um culto religioso, e que, quando chega a
certa parte do culto diz: “Agora, uma oração”. “Agora,

uma oração”! Isso é a antítese da oração no Espírito. “Dizer uma oração”! “Agora,
uma oração”! A leviandade, a superficialidade, a facilidade disso tudo! Acho muito
difícil deixar de dizer que, em minha avaliação, esse comportamento é pouco menos
que blasfêmia; é a antítese da oração no Espírito. É orar só com a mente .Você pode
orar com a mente fazendo uma oração correta, uma oração muito “bonita”, e,
todavia, nunca orar verdadeiramente “no Espírito”. Por essa razão, jamais gostei de
orações impressas. “Uma bela oração!”. Como se a dicção e a linguagem do homem,
ao dirigir-se ao Todo-poderoso, fosse a coisa importante! Uma composição perfeita,
e doutrinariamente correta, não faz a verdadeira oração. Você pode igualmente orar
pelas coisas certas e, contudo, não estar fazendo uma verdadeira oração.

Você estaria sugerindo, perguntará alguém, que Paulo está falando de oração
emocional? Não é o que quero dizer tampouco, porquanto a frase não se refere ao
nosso espírito; refere-se ao Espírito Santo -oração no Espírito! Isto significa que o
Espírito Santo dirige a oração, cria a oração dentro de nós, e nos capacita a elevá-la
a Deus. “Não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito
intercede por nós.” Ele faz isso em nós, Ele nos dá as petições, Ele ordena a
nossa mente, Ele nos dá a oração, Ele a dirige, Ele a reveste de poder.

Esse proceder sempre redunda em verdadeiro culto, em verdadeira adoração, em


verdadeiro louvor; e em nós é caracterizado pelo calor de espírito e pela liberdade.
Não há na terra nada mais maravilhoso do que a liberdade na oração. Vocês não se
enchem de prazer e alegria quando subitamente lhes é dada liberdade? Pode ser que
tenham estado lutando em oração, achando difícil concentrar-se, achando difícil
juntar os seus pensamentos, achando difícil fazer contato - porém, de repente, é-
lhes dada liberdade. Vocês não têm notado isso também na oração pública? Alguém
pode estar tropeçando e parando, orando como deve com a sua mente, ordenando os
seus pensamentos, juntando as suas petições. É certo fazer isso. Mas isso é somente a
estrutura, o andaime; e a pessoa não se contentará com isso. De repente sobrevêm o
Espírito e a domina, e as palavras se derramam, e a pessoa sabe que está falando
com Deus e que está ocorrendo um intercâmbio. Ele está na esfera do Espírito
e experimenta algo da gloriosa liberdade dos filhos de Deus.

“Orando no Espírito”! Qualquer pessoa que já teve alguma experiência disso sabe o
que é. Como é difícil expressá-lo com palavras! Posso recordar e dar graças a Deus
por duas reuniões de orações públicas nas quais estive presente, quando isso foi
experimentado de maneira incomum. Nunca as esquecerei, enquanto eu viver. Uma
reunião de oração

começou certa noite, às 19h 15, numa igreja de Gales do Sul. Era uma quente noite
de verão, numa segunda-feira. Doishomenstinham tomado parte, orando. Então
levantou-se um homem, que todos conheciam muito bem, um homem não importante,
homem destituído de dons e cujas orações podiam sertediosas, formais, áridas e
desalentadoras. Começou a orar, e de repente algo lhe aconteceu. O homem se
transformou por completo. Sua voz se aprofundou, e ele começou a derramar uma
das mais eloqüentes orações que já ouvi em toda a minha vida. E ele elevou
a reunião toda, a mim inclusive. Cada um de nós passou a estar “no Espírito”, nos
domínios do Espírito. E a reunião prosseguiu, orando um após outro. Homens e
mulheres que eu tinha ouvido orar noutras ocasiões, agora estavam orando como eu
nunca os ouvira orar antes - linguagem, pensamento, tudo era perfeito, e o calor, a
soltura e a liberdade eram notáveis. E continuaram assim, até dez para as vinte e
duas horas. Tínhamos esquecido o tempo. Estávamos na esfera do Espírito, estáva-
mos na eternidade. Já não importava a hora, nada importava. E o que acontece nos
avivamentos; e nós estávamos recebendo o privilégio de sentir o gosto dele.

É a isso que o apóstolo nos está exortando. As orações formais não são suficientes, o
mundo e a Igreja estando como estão hoje. Necessitamos desta “oração no Espírito”.
Precisamos agarrar-nos a Deus, “não lhe deis descanso”, para usar as expressivas e
dramáticas palavras do profeta Isaías (62:7, VA). E vocês nunca se agarrarão a
Deus, se não estiverem “no Espírito”. Orações formais, orações lidas-não são
estes os meios pelos quais podemos “agarrar-nos a Deus”. Mas, se vocês estiverem
no Espírito, poderão fazê-lo. É isso queo Espírito nos capacita a fazer, e os nossos
corações se aquecem, e experimentamos esta gloriosa soltura e liberdade que
somente o Espírito nos pode propiciar. Essa é a parte mais importante da oração.

Haveria alguma coisa que seja uma real oração, senão essa? Sim, graças a Deus que
há. Eu creio que Deus honra as nossas intenções, apesar delas serem pobres e
indignas. Ora, não descansemos nas intenções; procuremos aprender a orar “no
Espírito”. Uma vez que vocês o tenham aprendido, não ficarão satisfeitos com nada
menos que isso, sentirão que tudo mais é falho e leva ao fracasso. Ser tomado
pelo Espírito, saber que Ele está iluminando a sua mente e movendo o seu coração,
dando-lhes liberdade de palavras, liberdade de expressão, e entendimento das coisas
da esfera espiritual, é disso que precisamos. E quando tivermos isso, não somente
combateremos os nossos inimigos espirituais, mas também seremos “mais do que
vencedores”.

0 apóstolo conclui dizendo: fiquem firmes nisso; sempre, em todo o tempo, em todas
as ocasiões, em todas as épocas. “Orai sem cessar”, diz ele aos tessalonicenses. É
isso que, em certo sentido, ele está dizendo aos efésios-e a nós! “Orando em todo o
tempo”! Não uma vez ou outra, não simplesmente quando estamos com problemas,
não somente quando as coisas vão mal. “Sempre”! “Em todo o tempo”! Vigiando
sempre! Não caia no sono, fique acordado, esteja atento, esteja vigilante, nunca seja
negligente, levante-se, nada de preguiça! Se você perceber que está negligenciando a
oração, ponha mãos à obra. Faça isto - “vigiando n isto com toda a perseverança”.
Mantenha-se nisso, não o faça “aos arrancos”, não tenha espasmos de oração. Seja
persistente, continue fazendo isso, nunca desista, nunca cesse de orar: os homens têm
“o dever de orar sempre, e nunca desfalecer”.

Certamente esta é a maior de todas as necessidades na hora presente. Mas tratemos


de cumprir a ordem do apóstolo. Vistamos “toda a armadura de Deus”. Vistamos
toda a armadura, peça por peça, porém vistamos cada peça com oração.

Manter brilhante a tua armadura Requer cuidado constante;

Do teu Capitão sempre sob as vistas,

Em oração vigilante.

Ponha vida na oração! Faça-a inflamar-se! Veja que o seu conhecimento seja
iluminado, que o Espírito o leve a um conhecimento de Deus, conhecimento
indescritível, tal a sua glória. “Orando em todo o tempo no Espírito”!
ORANDO POR TODOS OS SANTOS

“Orando em todo o tempo com toda a oração e súplica no Espírito, e vigiando


nisto com toda a perseverança e súplica por todos os santos, epor mim; para que
me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra com confiança, para fazer
notório o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador em cadeias; para que
possa falar dele livremente, como me convém falar. " - Efésios 6:18-20

Chegamos por fim à exortação final, que o apóstolo dirige aos membros da igreja de
Éfeso. Os versículos 21 a 24 formam um pós-escrito pessoal; o grande ensino da
Epístola termina no versículo 20.

É digno de nota que o apóstolo tenha concluído com essa palavra especial sobre a
oração porque, como observamos tantas vezes, esta Epístola, acima de todas as
outras do Novo Testamento, foi dedicada à doutrina, ao ensino, e à demonstração dos
grandes princípios teológicos que governam a vida do cristão individual e a vida da
Igreja em geral. É provavelmente o auge dos esforços deste apóstolo; e nela temos
todas as grandes doutrinas. Por isso é interessante observar que, ao dar a sua última
palavra, sua preocupação é com a oração. Portanto, eu torno a salientar o fato de que
a prova final da vida cristã é quanto tempo dedicamos à oração. Mas a minha
afirmação pode induzir a erro, porque pode apresentar a oração como dever. A
oração é um dever, porém é muito mais. Deve ser um prazer, deve ser a expressão
máxima da vida cristã.

O fim a que todo o conhecimento e ensino das Escrituras nos pretendem levar é
conhecer a Deus, ter comunhão com Deus, compreender a nossa total dependência
dEle e da “força do seu poder”. Por isso

0 apóstolo termina com essa observação. O conhecimento é de pouco valor, se lhe


falta a comunhão com Deus. O que o apóstolo diz em

1 Coríntios, capítulo 13, sobre o amor, é igualmente verdadeiro acerca da oração.


O conhecimento “incha”, se não leva ao amor, à oração e à comunhão com Deus.

Já consideramos como orar, e vimos que o que importa acima de tudo é que oremos
“no Espírito”.

Mas agora devemos passar a considerar pelo que orar. Aqui também o apóstolo não
nos deixa em nenhuma dúvida ou incerteza. Primeiro,

devemos orar por nós mesmos. Ele está se dirigindo à pessoas engajadas no conflito
e combate cristão, e nos diz que, se não “nos fortalecermos no Senhor e na força do
seu poder”, nem a armadura terá qualquer valor para nós. Portanto, precisamos estar
constantemente em contato com Deus e com o Senhor Jesus Cristo. “A nossa
comunhão é com o Pai, e com o seu Filho Jesus Cristo.” Devemos, pois, ir
regularmente à presença de Deus e dar-Lhe graças por sermos Seu povo. Antes de
chegarmos às petições, é preciso que haja ações de graças, louvor, prestação de
culto, adoração! Todos nós sabemos o que é auferir benefícios de estar na presença
de Deus. Quanto mais tempo passarmos na presença de Deus, mais fortes seremos, e
mais eficiente e efetivo será o nosso serviço.

Assim é que o apóstolo nos concita a estarmos “vigiando nisto com toda a
perseverança”, jamais nos tornando negligentes, sempre anelantes na presença de
Deus, falando com Deus, fazendo-Lhe conhecidos os nossos problemas e
dificuldades, e fazendo-Lhe os nossos pedidos, as nossas petições. É desse teor a
exortação de Paulo aos filipenses: “Não estejais inquietos por coisa alguma” - nunca
se aflija, nunca fique num estado de angustiosa ansiedade, “à beira”, sem saber o que
fazer, e quase fora de si, diz o apóstolo. “Não estejais inquietos por coisa alguma;
antes as vossas petições sejam em tudo conhecidas diante de Deus pela oração e
súplica, com ação de graças.” Portanto, se você se vir passando por um período
extraordinariamente árduo, difícil e duro em sua vida cristã, ore ao máximo, lembre-
se de que não está só, que você faz parte do povo de Deus, de que você é um
componente do exército de Cristo, e de que, como você pertence a Ele, tem direito
de buscá-10 para receber ajuda em todas as suas dificuldades e necessidades. Ele
tem recursos inesgotáveis, ilimitados. Vá, por assim dizer, ao grande arsenal, ao
grande quartel-general, vá lá constantemente. Noutras palavras, em sua constante
e diária luta contra o diabo e os principados e potestades, certifique-se de que se
mantém renovado em suas forças! Podemos renovar-nos diaapós dia! Seja o que for
que tenha acontecido ontem, “dia após dia” podemos ser renovados em nossas forças
e poder, e em tudo que precisarmos. Por isso o apóstolo nos concita a buscar a Deus
constantemente, e a orar desta maneira em favor de nós mesmos.

Essa, no entanto, não é a maior ênfase no que ele nos diz aqui. A ênfase maior é à
chamada “oração intercessória”, isto é, à oração a favor dos outros. Começamos
com a oração por nós, mas não ficamos nisso. Diz o apóstolo: “vigiando nisto com
toda a perseverança e súplica portodos os santos”! “Por todos os santos”! Por que
ele exorta estes efésios, no final da carta, não somente a orar por si, mas também a
orar uns pelos

outros? A resposta é que estamos todos envolvidos no mesmo combate. Somos todos
participantes, como diz Judas em sua Epístola, da “salvação comum” (versículo 3).
A salvação não é apenas individual e pessoal, é “salvação comum”, é algo que
compartilhamos com todos os cristãos. Mas é igualmente certo que estamos
enfrentando um inimigo comum, e que estamos todos sujeitos aos mesmos problemas
e dificuldades.

O culto público é de grande importância por esta mesma razão. O diabo gostaria que
imaginássemos e pensássemos que a religião é inteiramente pessoal e que somente
nós estamos envolvidos nela. E aí, dando ouvidos a ele, inclinamo-nos a sentar-nos
em nossos cantos e a pensar que estamos passando por momentos
extraordinariamente difíceis; ficamos com autopiedade, lamentamo-nose
completamente abatidos. Eassim, o diabo éque sai vitorioso. Um dos melhores
antídotos contra esse tipo de perigo é compreender, como diz o apóstolo em 1
Coríntios 10:13, que “Não veio sobre vós tentação, senão humana” (ou: “senão o que
seja comum aos homens”, VA). Não estamos sozinhos nisto: é a porção que cabe a
todos os cristãos. É isso que o apóstolo acentua aqui -que somos partícipes da
mesma salvação, e nos confrontamos precisamente com o mesmo inimigo. A mesma
astúcia, as mesmas manhas são estendidas contra cada um de nós.

Não se deve exagerar nesse ponto. Falo baseado em minha experiência pastoral, e
também com relação à medicina. Tenho visto, no passar dos anos, que com
freqüência as pessoas se espantam quando lhes digo que outras pessoas estão tendo
as mesmas dificuldades que elas estão enfrentando. Evidentemente o diabo, com a
suaastúcia, levou-as a pensar que estavam sós, e as persuadiu disso. No momento em
que se apercebem de que outras pessoas estão envolvidas e estão experimentando
as mesmas provações, imediatamente sentem alívio; também sentem que podem
tornar a levantar-se e enfrentar o in im igo. Por isso o apóstolo nos diz que sempre
façamos súplicas por todos os santos, porque eles estão engajados no mesmo
combate e conflito em que nós estamos.

Mas, em segundo lugar, temos que compreender que o combate no qual estamos
engajados não somente nos envolve a nós e a todos os santos, porém, em última
instância, não é combate nosso, e sim de Deus. Vemos esta mensagem salientada de
maneira clara e dramática na história de Josafá, no Velho Testamento. O inimigo o
estava confrontando, e Josafá e os filhos de Israel estavam em terrível dificuldade.
Não sabiam o que fazer. Todavia, veio a ordem para que ficassem firmes, e veriam a
salvação que lhes viria de Deus, “pois a peleja não é vossa, senão de Deus” (2
Crônicas 20:15). A nossa dificuldade é que sempre temos

a tendência de ver os nossos problemas somente de maneira pessoal e subjetiva. Eu


penso em meus problemas, em minhas dificuldades, em meus temores e em minhas
esperanças. O resultado é que me tomo inteiramente autocentralizado e introspectivo,
e assim sou derrotado. O que temos de compreender é que o que acontece conosco,
como indivíduos, o que acontece com todos nós juntos, é apenas um incidente num
combate que se dá num âmbito muito mais amplo que o nosso. A verdade
fundamental é que são Deus e o Senhor Jesus Cristo que estão engajados neste
combate. É um combate cósmico. Quanto mais pensarmos nisso nestes termos, e
quanto menos o façamos em termos de nós mesmos e da nossa situação pessoal,
melhor será para nós. Esta é a grande batalha dos séculos - Deus e o diabo, o céu e o
inferno. Esse é o conflito real, e o apóstolo está acentuando que na medida em que
nos apercebermos de que estamos envolvidos neste grande combate de Deus contra o
diabo, essa é a medida em que seremos fortes. Seremos libertados do nosso
subjetivismo mórbido, e veremos exatamente o que está acontecendo, e assim
combateremos com novo espírito e com nova perspectiva.

Para usar a analogia óbvia, é exatamente o mesmo que acontece quando um país
entra em guerra. Não é uma guerra privada. Certamente há alguns que parecem
pensar que se trata de algo privado, mas o interesse é do país envolvido; os
indivíduos estão nela porque são membros do país que está em guerra. Parece que a
mesma coisa é válida naesfera espiritual. Por isso, devemos livrar-nos do nosso
subjetivismo e pensarem termos deste tremendo conflito espiritual, e
compreenderque não passamos de unidades nele, e que nos foi concedido o grande
privilégio de podermos tomar parte na batalha do Senhor, na batalha de Deus,
na grande cruzada do Deus eterno contra o diabo e todas as suas forças e poderes.

Devemos pensar também nos outros santos como estando exatamente na mesma
situação. Eles, como nós, são apenas unidades no grande exército de Deus, na
tremenda cruzada espiritual que o céu está travando contra o inferno. É desse modo
que devemos pensar nisso; assim, o apóstolo evidentemente nos d iz que oremos e
façamos súpl icas por todos os santos porque eles estão nesse combate da mesma
maneira que nós.

Outro ponto emerge agora. Visto que “somos membros uns dos outros”, segue-se que
o fracasso de qualquer de nós está fadado a afetar a campanha toda. Mais uma vez
fazemos uso de uma ilustração militar. Pensem numa grande 1 inha de batalha - as
forças de Deus. Confrontando-a está a linha dos “principados e potestades, dos
príncipes das trevas

deste século, das hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais”. O inimigo se
põe a sondar, nalgum ponto, tentando conseguir uma entrada, tentando forçar recuo,
tentando fazer a linha ceder nalguma parte, para poder empreender um ataque
violento, avançando e fechando o adversário por dois lados. Segue-se, pois, que o
fracasso num ponto qualquer vai afetar a linha inteira, todo o exército. Assim o
apóstolo nos diz que façamos súpl icas por todos os santos.

É muitíssimo importante, reitero, que sempre pensemos em nós em termos da Igreja.


Não somos indivíduos somente, somos membros da Igreja, que é o corpo de Cristo.
O apóstolo tinha usado essa analogia duas ou três vezes nesta Epístola aos Efésios.
E, contudo, constantemente
nos inclinamosaserindividualistas,eaconsideraronossoconflitoespiritual unicamente
como um combate pessoal, um problema pessoal. Não pensamos em ninguém mais,
não oramos pelos outros - é sempre meu problema. Estou sempre falando sobre ele,
pensando nele, orando sobre ele, e raramente oro por outra pessoa. Isso é totalmente
ruim para mim, como daqui a pouco vou mostrar. Mas também é um erro,
especialmente deste ponto de vista: “Nenhum de nós vive para si, e nenhum morre
para si” (Romanos 14:7). Somos mutuamente interdependentes, saibamos disso ou
não; e não pode acontecer nada com algum cristão sem que todos sejam envolvidos.
Se um cristão falha ou cai, cada um de nós sofre, inevitavelmente, porque todos nós
somos membros do Corpo, estamos todos neste exército, somos todos partes desta
linha de combate. O fracasso em qualquer ponto significa que toda a 1 inha estará
envolvida, e será preciso que se façam reajustes.

Todos nós tomamos conhecimento disso, às vezes. Vemos como o diabo e suas forças
se regozijam quando um indivíduo cristão cai. Vemos como ele é levado às
manchetes dos jornais e como vasculham o seu passado. Se alguma vez o homem
colaborou numa Escola Dominical, o cabeçalho diz: “Professor da Escola Dominical
é culpado de...”. Não importa se o homem não tenha colaborado na Escola
Dominical nos ú ltimos vinte ou trinta anos, isso é sempre exposto ao público. É algo
que alegra o diabo. Deus foi derrotado, por assim dizer. E não só isso, a coisa toda é
por demais desanimadora e deprimente para o restante da igreja! Por isso o apóstolo
nos pede que oremos uns pelos outros e que façamos súplicas por todos os santos.
De qualquer maneira, é tolice não orar por todos os santos. Nada acontece com eles
que não afete você; portanto, diz Paulo, lembre-se de toda a linha de combate. Não
fique sempre olhando para si mesmo e se concentrando em si mesmo; considere
a posição toda, e ore para que cada homem possa manter a sua posição.

Não é só você que precisa permanecer firme; o seu vizinho também precisa, e o
seguinte, e o seguinte. Ore no sentido de que todos permaneçam firmes, a fim de que
esta grande cruzada de Deus avance. Esta é a maneira de evitar o seu próprio
desânimo. É a maneira pela qual você pode ter certeza de que pertence a um exército
vitorioso, e de que absolutamente nadatemqualquerpossibilidade de derrotar a causa
à qual você pertence.

Depois o apóstolo leva isso adiante, dizendo: “...com toda a perseverança e súplica
por todos os santos”. Alguns santos estão em posições de peculiar dificuldade,
provação, pressão, tensão e angústia. Quantas vezes pensamos neles? Quantas vezes
pensamos atualmente nos cristãos de tantos outros países? “Ah”, você diz, “eu
mesmo estou passando por um período terrivelmente difícil. Estou tendo este
problema e aquela dificuldade, e o diabo está me atacando.” Concordo; mas procure
por um momento transportar-se para a situação de algumas dessas outras pessoas.
Elas não sabem o que lhes vai acontecer a qualquer momento, não sabem se vão
estar vivas logo mais à noite, não sabem o que o futuro lhes reserva. Seus países
estão passando por um período de transição, de incerteza e reajustes, e a situação
geral é tão negra e terrível quanto é possível ser para muitos deles. Quantas vezes
pensamos nessas pessoas? São irmãos e irmãs, são unidades componentes do
exército do Deus vivo; e muitas delas, neste exato momento, podem estar em
condições de tão aguda pressão e tensão que dificilmente poderão orar por si
mesmas. Todavia, independentemente dos outros países, há muitos cristãos
que sofrem dura pressão na própria Grã-Bretanha, cristãos que estão carregando
cargas terríveis, fardos medonhos, e que enfrentam dificuldades esmagadoras.
Quantas vezes nos lembramos deles e oramos por eles? Não fique pensando sempre
em você, diz o apóstolo, lembre-se desses outros. Seja o que for que esteja
acontecendo com você, a situação deles é muito pior. Lembre-se daqueles cristãos
que estão quase a ponto de entrar em colapso. Faça súplicas por eles, ore por eles.

Tal é o substrato desta exortação particular do apóstolo. Ele nos ministra um notável
ensino sobre a oração como um dos grande mistérios da fé cristã. A oração faz
diferença, a oração ajuda. Há pessoas que às vezes perguntam tolamente: “Se Deus
sabe tudo, de que vale orar?” Mas é Deus mesmo que nos manda orar. Em 2
Coríntios, capítulo primeiro, o apóstolo fala de um grande problema que lhe
sobreviera, e diz: “Não queremos, irmãos, que ignoreis a tribulação que nos
sobreveio na Ásia, pois que fomos sobremaneira agravados mais do que poderíamos
suportar, de modo tal que até da vida desesperamos. Mas já em nós mesmos

tínhamos a sentença de morte, para que não confiássemos em nós, mas em Deus, que
ressuscitaos mortos; o qual nos livrou de tão grande morte, e livrará; em quem
esperamos que também nos livrará ainda, ajudando-nos também vós com orações por
nós”.

Ora, isso é extraordinário; é um problema, é um mistério; não tentemos entendê-lo.


Tudo o que sabemos é que é o Novo Testamento que nos ensina desta forma a orar
uns pelos outros. Deus poderia fazer tudo sem nós, porém Ele escolheu fazê-lo em
nós e por meio de nós. Ele abençoa o Seu povo pela instrumentalidade da oração.
Assim, somos exortados a orar, somos concitados a que sejamos persistentes, e a
que perseveremos nas súplicas por todos os santos. Lembremo-nos disso no presente
momento, quando meditamos no quinhão de nossos irmãos e irmãs de muitas terras
estrangeiras. Pensemos no missionário pioneiro, sob forte pressão e solitário, cuja
suprema tentação talvez seja a de desanimar-se e de sentir-se desamparado e em
desespero, lutando como luta contra o clima, e contra doenças e fraqueza, tendo os
pés vacilantes, e enfrentando a lentidão das pessoas para aprenderem, e tendo que
lidar com as ocasionais falhas delas. E-nos dado o grande privilégio de
fazer súplicas por ele, e portodos os que se encontram em situações semelhantes, de
elevá-los e colocá-los diante de Deus, de pedir a Deus que olhe por eles e os
abençoe, sabendo que Deus está pronto a ouvir-nos.

A oração é o soberano remédio para muitas doenças e enfermidades da alma que


tendem a derrotar-nos a todos. E o soberano remédio para a introspecção, para a
morbidez e para a mórbida preocupação da pessoa consigo mesma. O ego é o
inimigo final. É o ego que causa a maior parte dos nossos problemas. Sentamo-nos e
nos pomos a pensar em nós mesmos e no que vai acontecer conosco, em qual será o
efeito disto ou daquilo sobre nós. Trazemos aquilo sobre nós, sentimos dó de
nós mesmos, lamentamo-nos por nós mesmos, e passamos o tempo em autocom
iseração. Um dos melhores meios de I ivrar-nos dessas condições é orar por outras
pessoas. Levante a cabeça, olhe para longe de si próprio, procure aperceber-se da
situação toda, e, quando fizer isso, você se esquecerá de si próprio.

Pode-se ilustrar isso de maneira muito interessante. Há estatísticas que provam além
de toda a dúvida que durante a Guerra Civil Espanhola, pouco antes da Segunda
Guerra Mundial, este mesmo princípio que estou enunciando funcionou literal e
verdadeiramente na prática. Neste caso não foi tanto uma questão de oração, como
de pura reação psicológica. Antes da eclosão da Guerra Civil Espanhola, havia em
Barcelona, Madri e noutras localidades, clínicas psicológicas com grande número de

neuróticos recebendo tratamento mediante drogas, e outros indo lá regularmente, em


busca de psicanálise e coisas semelhantes. Eles tinham os seus problemas pessoais,
as suas preocupações e ansiedades, as suas tentações, e tinham que ir às clínicas
semana após semana, mês após mês, para poderem continuar levando a vida. Então
irrompeu a guerra civil; e um dos primeiros e mais extraordinários efeitos daquela
guerra foi que virtualmente esvaziou as clíncas psicológicas e psiquiátricas.
Aqueles neuróticos de repente foram curados por uma preocupação maior,
pela preocupação com toda a sua situação, se os seus lares continuariam existindo,
se os seus maridos sobreviveriam, se os seus filhos seriam mortos. As preocupações
maiores puseram abaixo as menores. Tendo que dar atenção ao problema maior,
esqueceram-se dos seus problemas pessoais, de certo modo problemas
insignificantes. Esse foi um fato literal.

Em certa medida isso aconteceu também na Grã-Bretanha durante a Segunda Guerra


Mund ial. U m medo maior expu lsa os medos menores; e eu estou aplicando esse
princípio a toda esta questão de oração. Quando você se sentir numa espécie de
turbilhão, e não conseguir esquecer-se de si próprio; quando você estiver
preocupado consigo próprio e achando que está passando por um período
extraordinariamente duro, com tudo contra você, tão duro que quase o leva ao
desespero, um dos melhores remédios é sentar-se e dizer: “Que dizer de Fulano?
Que dizer sobre esta pessoa, sobre aquela pessoa, sobre os cristãos doutros países?”
Dobre-se sobre os seus joelhos e ore por eles, e logo você se levantará e verá que
se esqueceu de si mesmo. Portanto, à parte de todas as outras razões,
é psicologicamente sábio fazer súplicas portodos os santos. Você verá que, ao orar
por eles, estará resolvendo os seus próprios problemas, e obterá alívio.

O apóstolo conclui com a seguinte observação: “E por mim”. Isso é ainda mais
extraordinário. “E por mim”! Elequer que eles orem por ele. E estonteante pensar
que este poderoso homem de Deus, este apóstolo excepciona], este grande pregador,
o maior que a Igreja conheceu, este incomparável fundador de igrejas, esteja pedindo
a estas pessoas que orem por ele! Foi assim porque ele era um tão grande cristão.
Quanto maior o cristão, mais ele percebe a sua dependência das orações dos outros.
Foi esse o homem que foi a Corinto “em fraqueza, e em temor, e em grande tremor”.
Não havia autoconfiança no apóstolo Paulo, de maneira nenhuma. Ele sabia o que
fazia, sabia a quem representava e conhecia o poder que estava contra ele. Seu único
temor era que, num ou noutro ponto, ele falhasse com o seu Senhor e Comandante, e
com o exército do Deus vivo. Ele ocupava uma posição proeminente, e um erro

da sua parte teria repercussões terríveis. Por isso ele treme, e pede aos cristãos
efésios que orem por ele.

Ele não os deixa em dúvida sobre o que eles devem rogar a Deus em seu favor. Dá-
lhes instrução: “E por mim; para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra
com confiança, para fazer notório o mistério do evangelho, pelo qual sou embaixador
em cadeias; para que possa falar dele livremente, como me convém falar”. Quando o
apóstolo escreveu estas palavras, ele era um prisioneiro, entretanto não lhes pede
que orem paraque ele seja libertado da prisão. Era um homem doente, mas não
lhes pede que orem para que ele seja curado. Paulo nunca foi meramente subjetivo, e
nunca se considerou a si primordialmente. Estava sempre pensando nos outros. Não
é um pedido puramente pessoal ou humano que ele lhes faz. Ele está interessado
unicamente numa coisa, naquilo que sempre o interessou desde que se encontrara
com Cristo no caminho de Damasco, a saber, a pregação do evangel ho! Este m
istério do evangelho! Ele lhes falara sobre isso no capítulo três - “Como me foi este
mistério manifestado pela revelação, como acima em pouco vos escrevi; pelo
que, quando lerdes, podeis perceber a minha compreensão do mistério de Cristo, o
qual noutros séculos não foi manifestado aos filhos dos homens, como agora tem sido
revelado pelo Espírito aos seus santos apóstolos e profetas” (Efésios 3:3 ss). O
mistério que agora tem sido revelado! Esta mensagem, este glorioso evangelho de
Cristo! As “insondáveis riquezas de Cristo”! É nestas coisas que o apóstolo está
interessado. E o que ele deseja é que os cristãos orem em favor da pregação do
evangelho e da propagação do reino de Deus.

Pois bem, observemos mais minuciosamente aquilo em que ele está interessado.
Primeiro, “que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra com confiança”.
Orem por m im, diz o apóstolo, para que eu tenha o poder da palavra e 1 iberdade na
comunicação, quando eu tiver oportunidade de falar. O fato é-e nos inclinamos a
esquecê-lo-que o apóstolo Paulo não era, pelos dotes naturais, um bom orador.
Alguns de Corinto haviam zombado dele, dizendo: “A presença pessoal dele é fraca,
e a palavra desprezível” (2 Coríntios 10:10, ARA). Orador era Apoio. Paulo não, e
por isso ele rogou a estes cristãos- orem por mim, para que me seja dado falar com
confiança, paraque, quandoeu tiver oportunidade de falar, eu tenha as palavras, eu
tenha liberdade no falar e seja capaz de aproveitar bem a oportunidade. Orem, diz
ele, para que a minha língua seja liberada, que os meus lábios se tornem ágeis e que
eu possa falar com liberdade. E sumamente interessante observar que este poderoso
homem de Deus, reconhecendo as suas deficiências e imperfeições, roga a estes
efésios

que orem por ele para que ele possa falar livremente, fluentemente, sem ficar
parando e sem tropeçar.

Mas Paulo acentua em particular a palavra ousadamente (VA) -“para que eu possa
abrir ousadamente a minha boca”. Ele a repete: “para que eu possa falar
ousadamente, como devo falar”. Isso é da maior importância atualmente. Vocês oram
pelos pregadores do evangelho? Vocês se dão conta do que acontece toda vez que um
homem sobe a um púlpito-frágil, falível, fraco e, todavia, chamado por Deus para ser
Seu representante e intérprete da Sua gloriosa verdade? Vocês oram
pelos pregadores do evangelho? E porventura oram em particular no sentido de que
eles possam “falar ousadamente”? Com “ousadamente” o apóstolo quer dizer
livremente, ffancamente, sem reter nada. Permitam-me transcrever as palavras
utilizadas pelo apóstolo, dirigidas aos presbíteros desta igreja de Éfeso quando
outrora se despedia deles, segundo o registro de Atos, capítulo 20. Disse ele que não
tinha deixado de declarar-lhes “todo o conselho de Deus”. Orem para que eu não
retenha nada, disse ele, para que eu dê toda a verdade, para que eu possa entregar o
evangelho em toda a sua abrangência. Orem, diz Paulo, para que eu fique livre do
erro de restringir o evangelho, e a minha exposição dele, mediante cuidadosas
e intermináveis modificações ditadas pela preocupação com a minha reputação ou
com a minha segurança pessoal.

Dou ênfase a esta matéria porque é um grande problema do presente. Somos todos
tão diplomáticos, tão preocupados com a dignidade, tão preocupados em sermos
“eruditos” e não causarmos ofensa; temos tanto medo do fanatismo! Não oramos hoje
para que os pregadores falem “ousadamente”; preferimos que eles falem
ecumenicamente. Podemos ler sermões que digam: “Embora isto seja verdadeiro,
não obstante...”! Temos medo demais de sermuito extremistas, muito enfáticos!
“Embora seja certo dizer isso- não obstante vocês devem lembrar sempre que...”! - e
assim, intermináveis restrições tornam a mensagem indefinida e incerta. O resultado
é que o povo não sabe o que é o evangelho. O que se diz no começo é muitas vezes
retirado no fim, e você não sabe onde está, e a trombeta dá sonido incerto. Temos
tanto medo de ofender as pessoas que nos inclinamos a reter a verdade; e assim a fé
cristã está correndo perigo na presente hora. “Ah, mas”, você dirá, “não
devemos dizer nada que ofenda à igreja romana, vamos ter um diálogo com ela,
e assim precisamos ser muito cautelosos.” Não é em favor disso que o apóstolo pede
a estas pessoas que orem. “Ousadamente”, diz Paulo, isto é, sem restrições. Orem
para que eu seja honesto, para que eu seja verdadeiro, para que eu possa entregar a
mensagem que me foi confiada,
para que eu não me preocupe com coisa alguma, exceto agradar a Deus e ser fiel à
Sua Palavra.

Noutras palavras ele diz: orem para que eu seja liberto do medo do homem, e da
cultura do homem e da sua suposta sabedoria. Lembra-nos o apóstolo que ele se
fizera “louco por amor de Cristo”. Os filósofos de Corinto riam e zombavam dele.
Vejam esse homem, diziam, sempre dizendo a mesma coisa, nada mais do que aquela
mensagem simples sobre aquilo que ele chama “a cruz”. Ele não argumenta nem
raciocina baseado nas grandes filosofias, não nos faz nenhuma dissertação vigorosa;
o homem é louco. Tudo bem, diz Paulo, “eu me fiz louco por amor de Cristo.”

Qualquer homem que pregar hoje o simples evangelho será criticado pelos
sofisticados e pelos cultos. Dizem eles: é uma fantasia continuar crendo na Bíblia; é
uma fantasia continuar crendo no nascimento virginal e em milagres! Estultícia! Tudo
isso é obsoleto, é antiquado, o homem é um louco! Orem, diz Paulo, paraque eu não
dê ouvidos a tais críticas, orem para que eu possa continuar pregando o evangelho
ousadamente, digam eles o que quiserem. Orem para que eu tenha forças para pregá-
lo sem restrições, sem temor. Longe de mim qualquer desejo de ser
considerado culto, de ser considerado erudito, de ser considerado um orador
político. Há muitos entre os ouvintes nas igrejas que talvez estejam esperando
pelo que eles chamam “um belo feitio de frase”. Orem para que eu seja liberto desta
armadilha, e para que eu possa pregar o evangelho ousadamente, não elegantemente;
para que eu possa pregá-lo segundo a verdade, não da maneira que atraia o gosto do
público. E paraque eu nunca seja alguém que queira agradar os homens, ou que tema
enfrentar o escárnio e os insultos dos homens.

Precisamos orar pelos pregadores hoje para que possam pregar dessa mesma
maneira. Orar para que o pregador, em sua difícil situação nalgum pequeno povoado
do interior, talvez, seja liberto não somente do temor do intelecto de certos homens e
do seu suposto conhecimento, mas também seja liberto do temor do dinheiro deles. É
provável que chegue o dia em que alguém que virtualmente domina a igreja
financeiramente lhe diga: “Se você continuar a pregar essa mensagem, vou suspender
a minha contribuição”. Isso aconteceu muitas vezes, e ainda acontece. Orem, diz o
apóstolo, para que os servos do Senhor sejam capacitados a continuar pregando
ousadamente, venha o que v ier, pondo a sua confiança no Deus vivo, não em homem
algum. Orem por ousadia, honestidade, segurança e certeza, apesar dos homens e do
seu poder, por maior que este seja.

Mas então Paulo introduz mais um pensamento-“como se convém

falar” (ou, VA: “como devo falar”) - “para que eu possa falar dele ousadamente,
como devo falar”. Ele já nos explicara no capítulo 4, versículos 14 e 15, o que ele
quer dizer: “Para que não sejamos mais meninos inconstantes, levados em roda por
todo o vento de doutrina, pelo engano dos homens que com astúcia enganam
fraudulosamente. Antes, seguindo a verdade em amor” - essa é a restrição! Orem por
mim, diz o apóstolo, para que eu possa apresentar esta verdade ousadamente,
e, contudo, orem para que o meu espírito se mantenha brando, que eu não me torne
partidarista, que eu não me torne fanático, que eu não me torne sectarista, ou
meramente um homem de partido lutando por um rótulo. Orem, diz Paulo, para que eu
me interesse unicamente por Deus, pelo Senhor Jesus Cristo, pelo Espírito Santo,
pelo reino de Deus, pela salvação dos homens e pelo progresso da verdade. “Como
devo falar.”

Aí está o poderoso homem de Deus que, devido conhecer as suas fraquezas, as suas
tendências e a fragilidade da natureza humana, pede aos efésios que orem por ele. E
os homens e as mulheres da Igreja Cristã devem estar orando pelos pregadores do
evangelho no presente. Orando para que eles sejam libertos do espírito de concessão
comprometida, orando para que eles não sejam guiados pela diplomacia ou pela
conveniência pessoal, orando para que eles sejam libertos do temor por si mesmos;
mas orando também para que, ao contrário, sejam eles semelhantes aos apóstolos,
aos primeiros mártires, aos reformadores protestantes, aos puritanos, aos pactuários,
e aos vigorosos homens de Deus dos primeiros tempos. Orando para que a verdade
venha em primeiro lugar, para que possamos falar com ousadia e, todavia, para que
tenhamos corações cheios de amor, misericórdia e compaixão.

Porque devemos lutar pela verdade? Porque é a única coisa que pode salvar os
homens! Olhemos para além dos homens, para as suas almas perdidas, e não nos
preocupemos com nada senão a glória de Deus e a salvação dos homens e mulheres.
Assim é que o apóstolo nos exorta a orar com toda a perseverança e súpl icas no
Espírito por todos os santos, por todos os pregadores do evangelho, quaisquer que
sejam as suas circunstâncias e condições, para que eles possam falar do mistério de
Cristo ousadamente, como devem falar. E assim ele conclui.

Vejamos a seguir o pós-escrito puramente pessoal de Paulo: “Ora, para que vós
também possais saber dos meus negócios, e o que eu faço, Tíquico, irmão amado, e
fiel ministro do Senhor, vos informará de tudo. O qual vos enviei para o mesmo fim,
para que saibais do nosso estado, e ele console os vossos corações”. E então a
bênção final: “Paz seja com os irmãos, e amor com fé da parte de Deus Pai e da do
Senhor Jesus Cristo.

A graça seja com todos os que amam a nosso Senhor Jesus Cristo em sinceridade”.
São essas as pessoas que importam, as que amam o nosso Senhor Jesus Cristo com
sinceridade, de todo o seu coração, sem nenhuma mistura, sem quaisquer motivos
ulteriores; somente e sempre, tudo por Ele e para Ele. “A graça”, diz ele, “seja com
todos esses.” Diante disso só podemos dizer: “Amém e Amém”.

O SOLDADO CRISTÃO
O perfil do cristão como soldado é uma das ilustrações mais vividas encontradas nas
Epístolas do apóstolo Paulo. No entanto, o que está envolvido em ser alistado numa
guerra espiritual? Quais são as provisões que Deus faz para Seus servos?

Neste volume o Dr. Martyn Lloyd-Jones responde a essas perguntas ao examinar


“toda a armadura de Deus”. Ele analisa os princípios gerais de guerra espiritual, e
em seguida trata detalhadamente de cada peça da armadura mencionada pelo
apóstolo. Seu ensino abunda em percepções práticas e inclui exposições valiosas de
outras passagens das Escrituras...

Toda página se caracteriza por longos anos de pregação e experiência pastoral.


Cristãos em todos os estágios de desenvolvimento espiritual encontrarão nestas
páginas um guia valiosíssimo quanto ao viver a vida cristã no mundo contemporâneo.

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