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eee (Olcep tecociologico “Oatcaath 216 idee) ae Seen ee 0 Aiskeectitajoramn — 220 Alehdioawite meme: 221 235} Acetate Dasa a ‘Rooiatlo anntods oni saatseeetsrnertanas aes USO puitotiaits © comeco da primeira aventura de Harry Potter, da autora J. K. Rowling, Harry Potter e a pedra filosofal, 0 as- ‘tuto migico Albus Dumbledore deixa Harty, um bebé que acaba de ficar 6rfio, na porta da casa de seus tios, que ndo sio magicos, Harry ji havia mostrado que tinha poderes singulares, mas Dumbledore preocupa-se que, se ficar no mundo dos magicos, Harry nao cresceré com sade, “Isso seria suficiente para virar a cabeca de qualquer garoto’ diz. “Famoso antes de caminhar e falar! Famoso por algo de que nem lembraria. Vocé nao vé como ele ficaré melhor, crescendo longe de tudo isso até estar pronto?” (Rowling, 1998). As histérias do Harry Potter, cada uma acompanhando o garoto por um ano escolar, baseiam-se no principio de que nao existe aventura maior do que a de crescer. A Escola de Magia e Bruxaria de Hogwarts pode ser inco- mun, mas ainda € uma escola que ajuda as criangas a desenvolverem um conjunto de valores para toda a vida Todos passamos por estigios importantes na vida, como a passagem da infincia para a adolescéncia e para a ida- de adulta, e os livros do Harry Potter também acompanham essas transicées, Por exemplo, medida que a série avanca, Harry sente o comeco dos desejos sexuais, aos quais responde com um embaraco totalmente comum. Os esportes representam uma atividade importante, durante a qual as criangas aprendem sobre camaradagem e ambi- ‘©, ¢ Harry pratica 0 esporte dos bruxos, o “quadribol”. A funcao de muitos classicos da literatura infantil é tornar compreensivel o processo de crescer, independentemente de acontecerem em um universo de contos de fadas, em ‘nosso mundo ou ~ como na série do Harry Potter — em ambos, aio Anthony Giddens ara os sociélogos, a socializagio & 0 processo pelo qual ‘oimpotente bebé humano gradualmente se torna uma pessoa autoconsciente e culta, hébil nos modos da cultura em que rasceu. A socializacio dos jovens possbilitao fendmeno mais igeral da reproducio social ~ 0 processo pelo qual as socieda- des mantém continuidade estrutural ao longo do tempo. No decorrer da socializaclo, especialmente nos primeiros anos de vida, as criancas aprendem os modos dos mais velhos, perpe- tuando valores, normas e priticas sociais. Todas as socieda- des tém caracteristicas que perduram por longas extensbes de ‘tempo, mesmo que seus membros morram e nascam novas pessoas. As sociedades t8m muitos aspectos sociais eculturais ‘caracteristicos, que persistem ha geragbes — entre eles, as dife- rentes linguas faladas por seus membros. ‘Como veremos neste capitulo, a socializagao conecta as, diferentes geragées. O nascimento de uma crianga altera a vida daqueles que séo responséveis por sua criagio ~ 08 quai, portanto, passam por novas experiéncias de aprendizagem. ‘A criaglo geralmente conecta as atividades dos pais e filhos pelo restante de suas vidas. Os idosos ainda sio pais depois ‘quese tornam avs, é claro, forjando assim outro conjunto de relagbes que conectam as diferentes geracbes. Embora o pro- cesso de aprendizagem cultural seja muito mais intenso na infancia do que mais adiante, a aprendizagem e a adaptacio continuam por toda a vida da pessoa. ‘As segdesa seguir tratam do tema da “natureza versus edu- cago", um debate comum em sociologia. Vamos comegar ana~ lisando as principais interpretagdes tebricas propostas por dife- rentes autores sobre como e por que as criancas se desenvolvem, das maneiras conhecidas, incluindo teorias que explicam como desenvolvemos identidades de género. Depois, discutiremos os principais grupos e contextos sociais que influenciam a socia~ lizagio no decorrer da vida dos individuos, da infancia a velhi- ce. Finalmente, analisamos algumas das questdes sociolégicas ais importantes relacionadas com o envelhecimento, Cultura, sociedade e socializacaéo das criangas Teorias sobre o desenvolvimento infantil ‘Um dos aspectos mais caracteristicos dos seres humanos, ‘em comparagio com outros animais, ¢ que 0s humanos so ‘utoconscientes. De que maneira devemos entender a emer- sgéncia de um senso de self a consciéncia de que o individuo tem uma identidade distinta, separada dos outros? Durante 0s primeiros meses de vida, 0 bebé tem pouco ou nenhum, entendimento das diferencas entre os seres humanos € os, objetos materia ao seu redor, e ndo tem consciéncia de si ‘mesmo. As criancas nao usam conceitos como “eu’, “mint ¢ “vocé” até 0s 2 anos. E apenas de um modo gradual que elas passam a entender que as pessoas tém identidades, conscién- cia e necessidades distintas e separadas das suas. © problema da emergéncia do self tem sido bastante debatido ¢ ¢ considerado de formas bastante distintas em perspectivas tedricas contrastantes. Até certo ponto, isso se dé porque as teorias mais proeminentes sobre 0 desenvolvi ‘mento infantil enfatizam aspectos diferentes da socializacao. Jean Piaget e os estagios do desenvolvimento cognitivo (© suigo que estudou comportamento infantil, Jean Piaget, trabalhou com muitos aspectos do desenvolvimento infan- til, mas suas obras mais conhecidas dizem respeito & cogni- ‘do ~ a maneira como as criangas aprendem a pensar sobre si mesmas e seu ambiente. Piaget enfatizava muito a capaci dade ativa da crianga de compreender o mundo. As criangas no recebem informacdes passivamente, mas selecionam e interpretam o que veem, ouvem € sentem no mundo que as rodeia. Piaget descobriu varios estigios distintos do desen- volvimento cognitivo, durante os quais as criancas aprendem a pensar sobre si mesmase seu ambiente. Cada estigio envol- ve a aquisicdo de novas habilidades e depende da conclusio adequada do estagio anterior. Piaget chamou o primeiro estégio, que dura do nasci- mento até a dade de 2 anos, de estigio sensério-motor, pois 1 bebés aprendem principalmente tocando os objetos, ma- nipulando-os e explorando seu ambiente fisicamente, Até a idade aproximada de quatro meses, 0s bebés nao conseguem se diferenciar do seu entorno. Por exemplo, uma crianga néo entende que seus movimentos fazem barulho ao tocar as la- terais do berco. O bebé nio diferencia objetos de pessoas € no tém consciéncia de que existe algo fora do seu campo de visio. Os bebés aprendem gradualmente a distinguir pessoas de objetos, passando a enxergar que eles tém uma existéncia independente de suas percepgées imediatas. A principal rea- lizagdo desse estagio é que, ao terminar, as criangas entendem {que o seu ambiente tem propriedades distintas e constantes. ‘A seguinte fase, chamada de estagio pré-operacional, foi & qual Piaget dedicou a maior parte das suas pesquisas. Esse estigio dura entre as idades de 2 a 7 anos. Durante ele, as criangas adquirem dominio da lingua e se tornam capazes, de usar palavras para representar objetos e imagens de ma- neira simbdlica. Uma crianga de 4 anos pode usar um movi- mento da mao, por exemplo, para representar o conceito de “avid Piaget chamou o estagio de “pré-operacional” porque as criangas ainda nao so capazes de usar sistematicamente a capacidade mental que esté desenvolvendo. As criangas que se encontram nesse estagio so egocéntricas. Conforme Pia get, esse conceito nao se refere a egofsmo, mas & tendéncia de a crianga interpretar o mundo exclusivamente em relacio a sua propria posiga0. Durante esse periodo, a crianga nio entende, por exemplo, que as outras pessoas enxergam 05 ob- jetos a partir de uma perspectiva diferente da sua. Ao segurar ‘um livro, uma crianga pode perguntar sobre uma imagem contida nele, sem entender que a outra pessoa sentada a sua frente somente pode ver a capa dé livro. ‘As criangas que se encontram no estigio pré-operacional no conseguem manter conversas entre si. Na fala egocéntri- ca, 0 que cada crianga diz é mais ou menos desconectado do que o interlocutor disse. As criangas falar juntas, mas no en- tre si, no mesmo sentido que os adultos. Durante essa fase do desenvolvimento, as criancas nao tém uma compreenséo geral das categorias de pensamento que os adultos tendem a consi- derar ébvias: conceitos como causalidade, velocidade, peso ou rimero. Mesmo que a crianga enxergue alguém passando gua de um copo alto e fino para um copo mais baixo e mais largo, socioioga (211 HiateSGlesesehl| George Herbert Mead e o self social 0 problema de pesquisa comum se dizer que os seres humanos so as tnicas criaturas que sabem quo existem e que morreréo. Do ponto de vista socio- J6gten, isso significa que os seres humanos s80 autoconscientes. Com umn momento de rellexdo, todos podemos aceitar que isso 6 verdad. Mas como os humanos adqulrem essa autoconsclén- cla? Soré inata ou aprendida? Esse certamente 6 um problema de pesquisa para o pensamento em psicologia, mas por que os socidlogos se interesseriam pelo self individual? O socidlogo & fidsofo norte-emericano George Herbert Mead investigou como as eriangas aprendem a usar 0s conceftos de “eu @ “mim para se desereverom. Porém, do um mado incomum para a época, Mead insistia que seria necessério usar ume perspectiva sociol6gica para entender como o selfemerge e se desenvolve. Avisio de Mead Como as idolas de Mead formaram a principal base de uma tadi- fo geral de pensamento teéico- interacionismo simbélico ~ las tveram um impacto muito amplo na socilogia. 0 interacio- nismosimbdlio enfatiza que a interagSo entre os seres muanos ‘corre por meio de simbolos © a interpretagao de signifiados {vor Capitulo 1). Contudo, além disso, a obra de Moad traz uma ‘explicagdo sobre as principas fas do dasenvolvimento inant prestando especial atengfo & emergénie do sonso de sol Segundo Mead, bebés e criangas pequenas se desenvolvem, antes de tudo, como seressociats, imitando as agbes das pessoas om seu entomo. Brincar 6 uma das formas em que iso aconte~ ce e, em suas brincadetras as crangas imitam o que os adultos ‘ezem, Uma crianga pequena faz totas de lama, pois obgervou um adulto coinhndo, ou cava com uma colher, pois vu alguém twabathando no jdm, As brincadeiras das criangas evoluem da simples imitagdo para jogos mais complicados, nos quais&crin- 2 de 4 ou 8 anos dramatize o papel de adulto. Mead chemava Isso de “assumir 0 papel do outo* — aprender como ¢ estar no lugar de outra pessoa. E apenas nesse estégio quo as criangas adquirom um senso de solfdasenvolvdo, As ciancas obtém uma comprecnsio de si mesmas como agontes separados ~ como um “eu ~ enxergando-s0 pelos alhos de outres pessoas. Chegamos a auloconscléncla, segundo Mead, quando aprendemos a distinguir o “mim do “eu”. 0 “eu” ¢ o bebé no socializado. um conjunto de vontades @ desejos esponténeos. O "mim, da mansira como Mead usou o termo, & 0 sel social. 0s individuos desenvolvem @ autoconsciéncis, canforme Mead, cenxergando-se da maneira como os outros 08 enxorgam, o que ppnmite uma ‘conversa interna" entre o “eu” individual eo "mim" social, Segundo a teoria de Mead, essa converse é o que chama- mos de "pensamento’. Um outto estégio no desenvolvimento infant, de acordo com Mead, ocore quando a cranga tam por volta de 8 ou 9 anos. Essa 6 a idade om quo as ciangas tendem a paricipar de jogos ogenizads, om vez de brincadeiras no sistemétices. & nesse perioda que elas comegam a entender os valores gore © a mo- zaldade segundo a qual a vida socal ¢ conduaida. Para apren- der jogos organizados, as ctiangas devem entender as regras © nogdes de imparcialidade e participaglo igual. Nese estagi, as crlangas aprendem a compreender 0 que Meed denominou de outro generalizado 08 valores eregras morais gorais da cultura em qua ostao so desonvolvendo. ‘ss brincadeiras das criangas tém um lado sério, possibili- tando que comecem a desenvolver um self social, Pontos de critica ‘Atooria do sei social de Mead fo cticada por vétias raades. Pi- moiramente, alguns autores argumentam que ela elimina efetiva- ‘mente todas es in uéncias bioldgicas sobre o desenvolvimento do sell, quando fica claro, a partir da biologia e da neurociénela, que 0 sel/humano tem base bioldgica. Todavia, essa citica parece no reconhecer que a nogéo de Mead do eu" representa 0 “bebé no, socilizado". Em segundo luger, a teoria de Mead parece contar que o “eu ¢ o “mim” trabalham cooperativamente para garantir 0 funefonamento coreto do self Porém, os aticas argumentam que {sso diminui as tensées ¢ os conflitos ineriores que as pessoas ‘ém em um nivel profundo, ¢ que as teorias de Freud e Chodorow parecem mais capazes de explicar (ver as paginas 292-295 para etalhes das teorias de Froud ¢ Chodorow). Mead também tom ppouco a dizer a respelto dos efeitos do desequibrio nas rlagSes, de poder sobre a socializagdo das criancas. Finalmente, e de novo 0 contrério de Freud, a visto de Mead nao delxa esoago para ‘2 mente inconsciente como uma forea motivadora do comporta- ‘mento humano e, consequentemente, nao contém o conceito de “ropresséo', quo se mastrou essencial& prtica psicanaliica. 212) anthony Giddens Relevancia contempordnea O trabalho de Mead fot muito importante para o desenvolvimen- to da sociologia. Sua teoria fot a primeira teoria genuiriamente socioligica sobre a formagto © o desenvolvimento do self, que insistia que, para nos entendermos adequadaments, devemos partir do proceso social de interagio humana, Desse modo, ele ‘mostrou quo o solfndo é uma parte inata da nossa biologia, ou que simplesmente emerge com o desenvolvimento do cérabro ‘humano. 0 que Mead demonsirou & que o estudo do self do in- cla ndo entender que o volume de agua continna o mesmo ~e concluird que existe menos gua porque o nivel esta mais baixo. Um terceiro periodo, 0 estagio operacional concre- to, dura entre as idades de 7 a 11 anos. Durante essa fase, as, crianges dominam nogdes légicas abstratas. Elas sto capazes de lidar com ideias como causalidade sem mute dificuldade. [Uma crianga nesse estégio de desenvolvimento reconheceré o raciocinio falso envolvido na ideia de que 0 copo mais largo contém menos agua do que o mais fino, mesmo que os niveis de gua sejam diferentes. Blase torna capaz de realizar as ope- rages matemiticas de multiplicaglo, divisao e subtracio. AS criangas nesse estigio sio muito menos egocéntricas, No esté- gio pré-operacional, se perguntarmos a uma garota: “quantas irmas voce tem, ela responders corretamente: "uma: Porém, se perguntarmos “quantas irmés tem a sua irma?’, ela prova- velmente responderé “nenhuma’, pois nao consegue se enxer- gar pelo ponto de vista da irma. A crianga no estagio opera- ional concreto consegue responder essa pergunta facilmente. ‘A idade de 11 a 15 anos cobre aquele que Piaget chamou de estigio operacional formal, Durante a adolescéncia, a crianca em desenvolvimento se torna capaz de entender ideias muito abstratas e hipotéticas. Ao enfrentar um proble- ‘ma, as criangas dessa idade conseguem revisar todas as ma- neiras possiveis de resolvé-lo e analisé-las teoricamente para chegar a uma solugdo. No estégio operacional formal, 0 jo- ‘vem consegue entender por que certas questdes sto compli- cadas. O individuo talvez nao consiga dar @ resposta correta, para a pergunta “que criaturas sio, ao mesmo tempo, poodles, e cdes?", mas entenderé por que a resposta “poodles” esté cer- ta ¢ compreenderé o humor na resposta Segundo Piaget, os trés primeiros estigios do desenvolvi- ‘mento sao universeis; porém, nem todos 0s adultos alcangam, 0 terceiro, o estégio operacional formal, O desenvolvimento do pensamento operacional formal depende em parte dos, processos de escolarizacio. Adultos com niveis educacionais limitados tendem @ continuar a pensar em termos mais con- tetos e manter grandes tracos de egocentrismo. psicélogo russo Lev Vygotsky (1986 [1934]) fez uma critica valiosa das influentes ideias de Piaget. Ele argumenta que os processos de aprendizagem que Piaget descreve de- pendem de estruturas ¢ interacbes sociais. Vygotsky mos- tra que as oportunidades de aprendizagem disponiveis para criangas de grupos sociais variados diferem consideravel- mente, ¢ iss0 influencia em muito a capacidade das criangas, de aprender em suas relagdes com o mundo além do seu self. Em suma, a aprendizagem e o desenvolvimento cognitive ividuo no pode ser divorcado do estuso da sociedade ~ @ i880 cexige ume perspectva sociolégica. ‘Embora a abordagem de Freud & psique humana talvez tenha ‘obscuracido @ de Mead durante o século XX, pelo menos em rela~ ‘Go & prética psiolégica e ao tatamento de transtomos mentais, Oo interactonisma simbdlico continua a proporcionarvisbes interes- santes, em uma perspectva fandamentada nas teorias socolégi- ‘as de Mead. Nesse sentido, as ideias de Mead ainda tém muito a bferecer és noves geragOes de pesqulsadores socoldglcos. nao so imunes as estruturas sociais em que esto inseridos. Assim como essas estruturas limitam certos grupos e possi- bilitam que outros se tornem ricos, elas também limitam e possibilitam o seu desenvolvimento cognitive. REFLEXAO CRITICA Refletindo sobre os processos de socializagdo, como eles + Aiferem das idelas, baseadas no senso comum, de “lavagem cerebral” e “doutrinago"? Que impacto pode a falta de s0- ializagdo precoce ter sobre a formagdo da autoconsciéncia do bebé humano? Explique sua resposta fazendo referencia ‘s teorias discutidas, Agéncias de socializago 3s socislogos muitas vezes falam da socializacao como algo que ocorre em duas fases amplas, envolvendo diversas agen- cias diferentes de socializagio. As agéncias de socializacio so grupos ou contextos sociais onde ocorrem processos sig- nificativos de socializacao. A socializacio priméria ocorre na primeira infancia ena infancia e € 0 periodo de aprendizagem caltural mais intenso. Fa época em que as eriancas aprendem 6 padrdes linguisticos e comportamentais bésicos que for- ‘mam a base para a aprendizagem futura. A familia &0 principal agente de socializagéo durante essa fase. A socializacao secun- daria ocorre mais adiante na infancia e na maturidade. Nessa fase, outros agentes de socializacdo assumem parte da respon sabilidade da familia. Escolas, grupos de amigos, organizacbes, (os meios de comunicagio e, finalmente, o local de trabalho se tornam forgas socializantes para os individuos. As interacOes sociais nesses contextos ajudam as pessoas a aprender valores, normas ¢crengas que formam os padrées da sua cultura. Afamitia Como os sistemas familiares variam amplamente, a varieda- de de contatos familiares que o bebé tem nao é padronizada nas diferentes culturas. Em toda parte, a mie costuma ser 0 individuo mais importante no inicio da vida da crianga, mas a natureza dos relacionamentos estabelecidos entre as mies € seus filhos ¢ influenciada pela forma e regularidade de seu Contato, que é condicionada pelo carster das instituig6es fa- miliares e sua relacio com outros grupos da sociedade. ‘Nas sociedades modernas, a maior parte da socializacao precoce ocorre dentro do contexto de pequena escala da famt- lia, es criangas passam seus primeiros anos em uma unidade 7 doméstica, contendo a mae, o pai e talvez. uma ou duas crian- as. Em muitas outras culturas, em comparacio, tios e avés costumam fazer parte de um tinico lar e atuar como cuidado- res, mesmo para bebés muito pequenos. Ainda assim, mesmo nas sociedades modernas, existem muitas variagbes na natu- reza dos contextos familiares. Algumas criangas crescem em Jares uniparentais, algumas sio criadas por dois agentes ma- ternos e paternos (pais divorciados e padrastos ou madrastas). ‘Uma grande proporgio de mulheres com familias proprias hoje trabalhe fora de casa e volta ao trabalho remunerado logo depois do nascimento dos filhos. Apesar dessas variagbes, a fa- :ilia normalmente continua sendo a principal agéncia de so- cializagéo da primeira inféincia & adolescéncia ealém dela ~ em ‘uma sequéncia de desenvolvimento que conecta as geragBes. — Analisamos questies relacionadas com a familia ‘om mais detalhe no Capitulo 9, “Familias e relacionamentos intimos’ As familias tém “lugares” variados dentro das institui- bes gerais de uma sociedade. Na maioria das sociedades, tradicionais, a familia em que a pessoa nascia determinava a posicao social do individuo pelo resto da vida. Nas socie~ dades modernas, a posicio social néo é herdada a0 nascer essa mancira, mas a regio ¢ a classe social da familia em {que o individuo nasce afetam os padrdes de socializacio de ‘modo bastante caracteristico. As criangas aprendem modos de comportamento caracteristicos de seus pais e outras pes- soas em seu bairro ou comunidade. ‘Analisamos questdes ligadas & classe social em maior profundidade no Capitulo 11, "Estratificagio e classe social”. Padrées variados de disciplina e criagio dos filhos, jun- tamente com valores e expectativas contrastantes, so encon- trados em diferentes setores das sociedades de grande escala. £ facil entender a influéncia de diferentes tipos de origem familiar se pensarmos em como é vida, digamos, para uma crianga que cresce em uma familia de uma minoria étnica pobre que mora em uma drea degradada de uma determi- nada cidade com uma que nasce em uma familia branca rica nos subiirbios da cidade (Kohn, 1977) £ laro, sio raras as criangas que adotam a perspectiva de seus pais sem questioné-la. Iss0 & especialmente verdadeiro no mundo moderno, onde a mudanga ¢ tao comum. Além. isso, a simples existéncia de uma variedade de agencias so- alizadoras nas sociedades modernas leva a muitas diver- géncias entre as perspectivas das criangas, dos adolescentes eda geracio parental. Escolas ‘Outra importante agéncia socializadora é a escola. A escola- rizagdo & um processo formal: os alunos seguem um curri- culo com disciplinas definidas. Ainda assim, as escolas sto agéncias de socializagéo em sentidos mais sutis. Espera-se ‘que as criangas facam siléncio na aula, sejam pontuais para as Sociologia alas ¢ observer as regras da disciplina escolar. Elas devem, aceitar ¢ responder & autoridade da equipe de ensino. As rea- ges dos professores também afetam as expectativas que as, criancas tém para si mesmes. Essas expectativas, por sua vez, sao relacionadas com sua experiéncia profissional depois que deixam a escola. Os grupos de amigos normalmente se for- mam na escola, €0 sistema de agrupar as criangas em turmas conforme a idade reforca seu impacto. Discutimos a socializagio dentro de sistemas educacionais no Capitulo 19, "Educagéo'. Relacionamentos com amigos Outra agencia de socializacio € 0 grupo de amigos. Os gru- ‘pos de amigos consistem em criancas de idade semelhante. Em certas culturas, particularmente em pequenas socieda- des tradicionais, os grupos de amigos sio formalizados em classes etarias (normalmente limitedas aos homens). Existem. ceriménias e ritos especificos que marcam a transigdo dos homens de uma classe etéria para outra. Aqueles que esto em uma determineda classe etaria geralmente mantém lacos de proximidade e amizade por toda a vida. Um conjunto ti- pico de classes etérias consiste de infancia, guerreiro apren. diz, guerreiro, adulto e ancido. Os homens avangam por essas classes no como individuos, mas como grupos intelros. ‘A importancia da familia na socializacao ¢ dbvia, pois a experiéncia do bebé eda crianga pequena se forma em um grat. ‘ais ou menos exclusivo dentro dela. Fica menos claro, espe- cialmente para aqueles que vivem em sociedades ocidentas, de que maneiras os grupos de amigos io significativos. Contudo, ‘mesmo sem classes etsrias formals, s criangas acima de 4 0u 5 anos geralmente passam grande parte do tempo na companhia, de criangas da mesma idade. Com os dois pais trabalhando atualmente,¢ provavel que as relagdes entre criangas que brin- cam juntas em creches se tornem ainda mais importantes do que eram no passado (Corsaro, 1997; Harris, 1998). As relagdes entre os pares provavelmente tém um impacto significativo para além da infancia e da adolescéncia, Geral- mente, grupos informs de pessoas de idades semelhantes, no trabalho eem outras situagdes, tém uma importéncia duradou- +a em moldar as atitudes ¢ 0 comportamento dos individuos. Os meios de comunicagdo de massa Os jornais e ou revistas floresceram no Ocidente a partir do inicio dos anos 1800, mas eram confinados a um grupo pequeno de leitores. Apenas um século depois € que 0s pri ‘meiros materiais impressos se tornaram parte da experiéncia cotidiana das pessoas. A disseminacio dos meios de comuni- cagio de massa envolvendo documentos impressos logo foi seguida pela comunicacao eletrénica - ridio, televisio, discos videos, trazendo com eles preocupagées quanto & influéncia indevida sobre opini6es, posturas e comportamentos. A mi- dia desempenha um grande papel em nossa compreensio do mundo e, portanto, na socializacao. Grande parte das primeiras pesquisas sobre a influéncia dos meios de comunicacio, especialmente da televisto, no desenvolvimento infantil tendia « enxergar as criangas como 213 214) Anthony Giddens 8.1 Socializacéo no patio da escola Em sou livro Gender Play (1093), a socidloga Barrie Thome analisou a socializagdo obsorvando como as cxlangas interagem no patio. Como outros antes dela, fla quetia entender como as criangas vinham a sa~ ‘ber o que significa ser homem ou mulher. Em vez de considerar que as crangas aprendem passtvamente 0 significado do género com seus pais e protessores, ela analisou a manelra em que as criangas criam 0 1o- criam ativamente o'significado dos géneros em suas Interagdes entre si, As atividades socials que as crian- (28 escolares fazem juntas podem ser tio importantes quanto outios agentes para sue socalizago. ‘Thome passou dois anos observando alunos de quarta e quinta séries em duas escolas em Michigan Cauiférnia, sentada na sala de aula com eles e obeer- vando suas atividades fora da sala. Bla observou jo- {gos como “pagar e bajar” conhecido no Reino Unido como ‘Kiss-catah’ ~ para aprender como as criangas constroem e experimentam os signifiados do género ha sala de aula e no patio da escola. ‘Thome observou que o8 grupos de amigos tém uma grande influéncia sobre a socalizagdo do género,particu- Jarmente quando as criangas falam sobre as mudangas em seus compos, um tema de muita fescinagGo. O contexto social ctiado ‘por essas criangas determinava se as mudancas corporis eramn vivides com embarago ou ostentadas com orgulho. Conforme observou Thome (1993); Se as mulheres mais populares comeravam a menstruar ou usar suié mesmo que ndo precisassem),outras garotas também queriam ter essas mudangas. Porém, se as mais ‘Populares néo usassom sutlas @ go tivessem.. comegado sous poriodos, esses fatos seam considerados menos de- sajvels, passivos ¢ indiscriminados em suas reagdes aquilo que assis- tiam, Porém, Hodge e Tripp (1986) enfatizaram que as res- postas das criangas& televisio envolvem interpretar, ou “ler’, © que assistem, e no apenas registrar o contetido dos pro- ‘gramas. Desde entio, os pesquisadores chegaram @ um en- tendimento mais equilibrado sobre a influéncia dos meios de comunicagéo de massa nos processos de socializacio, e hoje consideram a televisdo, por exemplo, como uma importante agéncia de socializacao, juntamente com varias outras. A socializagao do género ‘As agéncias de socializagZo desempenham um papel impor- tante na maneira como as criancas aprendem os papéis de REFLEXAO CRITICA Como voct acha que o equilibrio das agéncias de socializa- ‘qo esta mudando, em uma era de rapida globalizagio? Que ‘agéncias de socializagéo esto se tornando mais influentes fe quais esto se tommando menos significativas? Que proble- ‘mas isso pode gerar para a socializagdo dos novos membros a sociedade? No patio da escola, a5 garotas tendem a brincar apenas ‘com outras garotas, ¢ 08 garotos, apenas com outros garo- tos. Por que é assim? A pesquisa de Thome @ um forte lembrete de que as crian- (28 So atores socials que ajudam a criar su mundo social a Influenciar a sua propria socializapdo. Ainda assimn, o impacto das influéncias da sociadade @ da cultura é enorme, pois as, atividades que as criangas procuram e os valores que sequen ‘so determinados por influéncias como suas familias ¢ os meios de comunicacao, igénero. Vamos agora passar ao estudo da socializagio do xgénero, a aprendizagem de papéis de género por meio de fa- tores sociais como a familia eos meios de comunicagéo. Reagoes de pais e adultos Jé foram realizados muitos estudos sobre o grau em que as, diferengas de género resultam de influéncias sociais. Estu- dos sobre a interacio entre mie e bebé mostram diferencas, no tratamento de garotos e garotas, mesmo quando os pais, acreditam que suas reagdes a ambos sdo iguais. Adultos que avaliam a personalidade de um bebé dao respostas diferentes se acreditarem ou ndo que a criahca é uma garota ou um ga roto, Em um experimento, cinco jovens mées foram observa~ das em interacéo com um bebs de seis meses, de nome Beth. Blas tendiam a sorrir para ela com frequéncia, e ofereciam bonecas para ela brincar. Ela era considerada “doce’, com um “choro suave’. A reacio de um segundo grupo de mies a uma crianga da mesma idade, chamada Adam, era notavelmente diferente. O bebé era mais provavel de receber um trem ou outros “brinquedos masculinos” para brincar. Beth e Adam, nna verdade, eram a mesma crianga, vestida com roupas dife- rentes (Wil et al., 1976) Aprendizagem do género ‘A aprendizagem do género por bebés é, quase, inconsciente. ‘Antes que as criangas possam se rotular precisamente como garotos ou garotas, elas recebem uma variedade de pistas pré-verbais. Por exemplo, homens e mulheres adultos geral- mente seguram bebés de maneira diferente, Os cosméticos que as mulheres usam contém aromas diferentes dos que ‘0 bebé pode aprender a associar « homens. Diferengas sis- tematicas nas roupas, no penteado e outras coisas do géne- ro proporcionam pistas visuais para 0 bebé no processo de aprendizagem. Aos 2 anos, as criancas tfm uma compreensio parcial do seu género, Elas sabem se so garotos ou garotas, e geralmente sabem categorizar os outros corretamente. Tc davia, somente depois dos 5 ou 6 anos é que a crianca saberd que 0 género de uma pessoa ndo muda, que todos temos um, género e queaas diferencas sexuais entre garotas e garotos tém base anatémica, Brinquedos, livros ilustrados e programas de televisio com que as criangas pequenas tém contato tendem a enfa- tizar as diferengas entre atributos masculinos e femininos. As lojas de brinquedos e catdlogos de vendas pelo correio geralmente categorizam seus produtos segundo o género. ‘Mesmo alguns brinquedos que parecem neutros em ter ‘mos de género, na prética, nao sao. Por exemplo, gatinhos e coelhinhos de brinquedo so recomendados para garotas, 8.2 Literatura, televisdo e filmes para criangas HA mais de 30 anos, Lenore Weitzman e colaboradores (1972) {izeram uma analise dos papeis de género em alguns dos livros infantis mais usados na pré-escola ¢ encontraram diferengas claras nos papéis dos géneros. Os homens tinham um papel ‘muito maior em historias e imagens do que as mulheres, sendo | observados com mais frequéncia, a razAo de 1 para 1. Quan do animais com identidados de género eram inciuidos, arazo cra de OS para |. As atividedes masculinas e femininas tam- j| bém eram diferentes, Os homens envolviam-se om atividades ventureias 0 ao ar livre, que exigiam forga e independéncia, (Quando apareciam garotas, las eram retratadas como passivas ‘ese confinavam principalmente a atvidades dentro de casa. AS

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