You are on page 1of 29

Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 0301/21.4BELRA
Data do Acordão: 09-12-2021
Tribunal: 2 SECÇÃO
Relator: JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores: OMISSÃO DE PRONÚNCIA
DEVER DE CONFIDENCIALIDADE
DIREITO À INFORMAÇÃO
Sumário: I - A nulidade por omissão de pronúncia, prevista no art. 125.º,
n.º 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário
(CPPT) (Que segue o disposto no art. 615.º do CPC) se verifica
quando o tribunal (a norma refere o juiz, mas é aplicável aos
acórdãos dos tribunais superiores), em violação do seu dever de
cognição, consagrado no n.º 2 do art. 608.º do CPC, aplicável ex
vi da alínea e) do art. 2.º do CPPT, deixe de pronunciar-se sobre
questões que deva apreciar, ou seja sobre «todas as questões
que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas
aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a
outras».
II - Como a jurisprudência tem vindo a afirmar reiteradamente,
não há omissão de pronúncia sobre questões colocadas quando
o seu conhecimento é expressamente recusado pelo tribunal ou
quando este se abstém de conhecer de uma questão mas indica
as razões pelas quais não conhece dela.
III - Por esse prisma, sendo a tese da Recorrente a de que a
decisão sumária de que reclama incorreu em erro de julgamento
ao enquadrar as questões que lhe foram colocadas e nessa
medida solicita a intervenção da conferência para corrigir esse
seu enquadramento, tal erro não é qualificável como nulidade da
decisão sumária, por falta de pronúncia (até porque o
Reclamante não identifica qualquer nulidade), mas sim erro de
julgamento decorrente da remissão da fundamentação para
acórdão proferido noutro processo.
IV – É que, no regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC
a reclamação para a conferência da decisão sumária proferida
apenas pelo relator faz retroagir o conhecimento em conferência
do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão
sumária, conhecimento limitado às questões especificadas pelo
recorrente nas conclusões de recurso, sem prejuízo de o
recorrente, ora reclamante, restringir na reclamação o objecto
recursório anteriormente definido nos termos do art° 635° n° 4
CPC.
V - Com a introdução, em 2013, de uma nova excepção ao dever
de confidencialidade - constante da alínea e) do n.º 2 do artigo
64.º da LGT - forçoso se torna concluir que o legislador não só
configura as duas informações ali previstas (NIF e domicílio
fiscal) enquanto “dados pessoais”, como apenas parece aceitar a
transmissão das mesmas nas circunstâncias estritas ali
expressamente previstas.
VI - O direito à informação a que se reportam aqueles normativos
não é um direito absoluto e não pode, sem mais, prevalecer
sobre a tutela outorgada, também constitucionalmente, à reserva
da intimidade da vida privada.
Nº Convencional: JSTA000P28656
Nº do Documento: SA2202112090301/21
Data de Entrada: 22-07-2021
Recorrente: AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1: A................
Votação: UNANIMIDADE
Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do
Supremo Tribunal Administrativo

1. – Relatório

A…………………, com os sinais dos autos, vem, nos termos dos artºs 1º
do CPTA e artºs 652º nº 1 c) e nº 3 ex vi 656º CPC, reclamar para a
conferência da Decisão Sumária proferida em 08-09-2021, que decidiu
conceder provimento ao recurso e revogar a sentença do TAF de Leiria,
substituindo-se por outra que julgue improcedente o pedido de intimação
para prestação de informações, deduzido contra a Autoridade Tributária
e Aduaneira – Serviço de Finanças de Alcobaça.

O reclamante A………………….. veio apresentar os fundamentos que se


seguem:

Quanto à diferença com o processo 856/20.0BELRA,


1. Refere a decisão que as questões que se suscitam no presente
recurso são precisamente as mesmas do recurso no processo
856/20.0BELRA, mas, salvo melhor entendimento, entendemos que tal
não sucede.
2. Na sentença do TAF de Leiria, no âmbito do processo 856/20.0BELRA,
não havia sido demostrado qualquer interesse, cfr motivação da não
procedência da intimação para prestação do NIF no doc_1, que refere
que “o Autor não demostra interesse direto pessoal e legitimo na
obtenção da informação pretendida.”
3. Já na sentença do TAF de Leiria do presente processo foi demostrado
e provado o interesse no acesso à informação, e por isso tinha a ação
sido procedente para a prestação do NIF, cfr doc_2, que refere que
“resulta dos autos que o Demandante desenvolveu diligências para
obtenção da informação relativa aos prédios confinantes na Câmara
Municipal de Alcobaça, Conservatória do Registo Predial de Alcobaça e
Direção-Geral do Território (…) que o terreno se encontra à venda (…)
consta na descrição predial 2.000 metros quadrados mas terá cerca de
3.400 metros quadrados (…) trata-se de assegurar a segurança jurídica
nas transações de bens imóveis e a correta definição do direito de
propriedade constitucionalmente consagrado (…) as demais entidades
administrativas informaram não ter qualquer forma de facultar a
informação solicitada (…) consideramos que o demandante demostra ter
interesse pessoal direto e legítimo, constitucionalmente protegido e
suficientemente relevante para a obtenção da informação em causa”.
4. Pelo qual não se concorda que seja proferida decisão sumária com o
fundamento de se tratar de uma questão apreciada anteriormente.
Quanto à falta de pronúncia,
5. O objeto do presente recurso não é avaliar se existe de facto interesse
no acesso à informação (essa matéria já foi assente), mas sim se o NIF
pode ser fornecido quando se demostra esse interesse.
6. Aplicando o ainda mais recente acórdão do STA de 9 de junho de
2021, no âmbito do processo 1079/20.4BELRA de 9 de junho de 2021,
que refere que o acesso aos dados constantes na matriz predial rege-se,
também, pelo disposto na lei de acesso aos documentos administrativos
e à informação administrativa – Lei n.º 26/2016, de 22 de agosto, a
informação solicitada pode ser obtida. E quanto a isso a decisão não se
pronuncia.
7. Caso se entenda que a informação não é acessível pela Lei n.º
26/2016, existirá contradição com o referido acórdão do STA do processo
1079/20.4BELRA. No âmbito desta lei nº26/2016, dados pessoais de
terceiros podem ser revelados, feita a ponderação a que alude a alínea b)
do ponto 5 do artº 6º (demonstração de interesse direto pessoal e
legitimo – o que foi feito).
8. Pelo que, em face da demostração do interesse direito pessoal e
legítimo, e da possibilidade de aceder à informação aplicando a Lei n.º
26/2016, diferente do que aconteceu no processo 856/20.0BELRA, deve
o tribunal de se pronunciar sobre as alegações de recuso entregues.
9. Pese embora tal já tenha sido explicado, à cautela, se reitera: no
presente processo o requerente explicou e provou que necessita saber
quem são os vizinhos (proprietários dos prédios confinantes) para com
eles confirmar as estremas dos seus prédios, uma vez que nenhuma
outra entidade tem essa informação.
10. Necessita do NIF, primeiro, para corretamente identificar de forma
inequívoca o titular do direito, e depois, para obter a caderneta predial do
prédio (por intermédio de profissional qualificado), onde pode consultar o
nome e morada do titular e os elementos identificativos do prédio.
11. Ou seja, o NIF é meramente instrumental para obter a morada,
necessária para conseguir contactar os titulares para confirmar as
estremas do prédio. Era nesse sentido que ia o pedido alternativo e inicial
feito à AT - caso não fosse fornecido o NIF, era pedido, em alternativa, os
elementos identificativos do prédio e a morada do titular. Porque era esse
o objetivo final do acesso ao NIF.
12. Toda esta informação - NIF, nome e morada do titular e elementos
identificativos do prédio - podem livremente ser consultados no registo
predial, se os prédios tiverem registados.
13. O que também é do interesse do titular do NIF, para se evitar
eventuais conflitos futuros quanto à localização exata das estremas dos
prédios. Porque, lembre-se, o direito de propriedade tem efeito erga
omnes, e ainda que o direito não esteja registado, ele existe, e é público
– afinal é essa uma característica intrínseca dos direitos reais.
14. Por ter sido explicado o motivo da necessidade do NIF no pedido feito
à AT, a sentença em primeira instância foi favorável, ao contrário do que
aconteceu no processo 856/20.0BELRA.
15. Por ter sido, salvo melhor entendimento, erroneamente considerado
igual, houve falta de pronúncia.
16. Também não houve pronúncia quanto ao pedido alternativo formulado
perante à AT (morada e elementos identificativos do prédio), que o
tribunal de primeira instância se absteve de conhecer por ter dado
provimento ao primeiro pedido (NIF).
Quanto à inconstitucionalidade,
17. No processo 856/20.0BELRA também não tinha sido suscitada
quaisquer inconstitucionalidades das normas invocadas, ao contrário dos
presentes autos.
18. No presente processo foi suscitada a inconstitucionalidade. E como
bem referiu a sentença do TAF de Leiria no presente processo, “no
modelo de fiscalização judicial difuso ou desconcentrado, consagrado na
constituição da República Portuguesa, recai sobre todos os juízes o
dever de, por um lado aferir da constitucionalidade da interpretação, e,
por outro lado, de, no caso concreto, a título acidental, e na
eventualidade de entender existir uma interpretação desconforme à
constituição, promover a desaplicação.”
19. Assim, e apesar de a sentença em primeira instância ter sido
favorável ao autor, nas contra-alegações de recurso, à cautela, logo foi
suscitada a inconstitucionalidade da norma contida no ponto 1 e ponto 2
alínea e) do art. 64 da LGT, caso seja interpretada no sentido de
considerar que o NIF pode apenas pode ser fornecido nos casos
elencados naquele ponto 2, por ser considerado um elemento relativo à
intimidade das pessoas, quando o NIF é um elemento obrigatoriamente
público no registo predial de acordo com a alínea e) do artº 93º do Código
do Registo Predial e é solicitado à AT pela identificação do número de
artigo do prédio na matriz predial, por violação do ponto 2 do artº 268º da
CRP e nº 2 do art 18º da CRP. Pelo que, tendo esta norma agora sido
aplicada na decisão sumária, deve de o tribunal se pronunciar quanto à
sua inconstitucionalidade nesta aplicação, ou desaplicá-la.
20. Caso fosse dado provimento ao recurso, suscitou‐se também a
inconstitucionalidade da norma contida no nº1 do artigo 130.º do CIMI.
Esta norma também permitiria o acesso à informação. Não sendo dada a
informação, e sendo interpretada no sentido de considerar que o NIF é
um elemento respeitante à intimidade das pessoas e que por isso não
pode ser revelado, ainda que ponderado com o interesse direto, pessoal
e legítimo demostrado pelo autor, por violação do ponto 2 do artº 268º da
CRP e do nº 2 do art 18º da CRP.
21. Considerar que o NIF é um elemento relativo à intimidade das
pessoas quando ele tem que ser obrigatoriamente público no registo
predial e é solicitado à AT pela identificação do número de artigo do
prédio na matriz predial, viola o ponto 2 do artº 268º da CRP.
22. Da mesma forma, suscitou‐se também a inconstitucionalidade das
normas contidas no ponto 5 do artº 6º da Lei n.º 26/2016 caso seja
aplicada e interpretada no sentido de considerar que o NIF é um
elemento relativo à intimidade das pessoas e por isso não pode ser
fornecido quando ele é obrigatoriamente público no registo predial, cfr já
referido, e é solicitado à AT pela identificação do número de artigo do
prédio na matriz predial, por violação do ponto 2 do artº 268º da CRP.
23. Por fim, suscitou-se também a violação do nº 2 do art 18º da CRP,
caso seja vedado o acesso ao NIF por aplicação do ponto 1 e ponto 2
alínea e) do art 64 da LGT, porque a lei só pode restringir os direitos,
liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na
Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para
salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente
protegidos. Existindo a possibilidade de o acesso ao NIF ser feito,
também, pela aplicação da lei 26/2016 e do nº1 do artigo 130.º do CIMI,
não deve de ser aplicada a norma mais limitativa, limitando ao autor o
acesso à informação, quando demostrou o interesse direto pessoal e
legítimo, e o acesso à propriedade privada em segurança é um direito
protegido.
24. A alínea b) do ponto 5 do artº 6º da lei 26/2016, o nº1 do artigo 130.º
do CIMI, e bem assim a obrigatoriedade de constar o NIF no registo
predial decorrente da alínea e) do artº 93º do Código do Registo Predial,
são todos casos excecionais previstos para acesso a dados pessoais de
terceiros, previstos no ponto 4 do artº 35º da CRP.
25. Repara-se que o NIF é obrigatório em escrituras públicas, no registo
predial, bem como na lista pública de devedores à AT, publicidade de
insolvência, como em muitos outros casos onde o NIF é um elemento de
identificação publicitado, pelo que, ainda que o aditamento em 2013
constante da alínea e) do nº2 do artigo 64º da LGT possa ter alterado o
dever de confidencialidade, o legislador previu outras formas de aceder a
aquela informação. Inclusive formas de acesso especificadas em
legislação mais recentes (lei 26/2016) e mais específica (CIMI) para o
acesso à matriz predial. Note-se também que a matriz predial rústica tem
natureza pública para permitir a todos saberem a localização dos prédios,
especialmente importante onde não existe cadastro geométrico da
propriedade rústica.
26. Ademais, neste caso, o acesso aos elementos solicitados é
devidamente justificado.
Termos em que devem, por ter sido provado em primeira instância o
interesse no acesso à informação, e sem prejuízo de melhor
entendimento, os presentes autos ser remetidos a conferência, afim de
haver pronúncia sobre as questões suscitadas, uma vez que não se
entende que este processo seja análogo ao processo 856/20.0BELRA.

Notificada para se pronunciar, a Autoridade Tributária e Aduaneira veio


expor o seguinte:

1º O Requerente incorre em erro ao presumir que o dado NIF, qualificado


como dado pessoal, poderá ser transmitido desde que se demonstre
interesse no referido dado (“O objeto do presente recurso não é avaliar
se existe de facto interesse no acesso à informação (essa matéria já foi
assente), mas sim se o NIF pode ser fornecido quando se demostra esse
interesse.”)
2.º O Requerente traz à colação o Acórdão proferido no Proc.º
1079/20.4BELRA, e ao sublinhar que “o acesso aos dados constantes na
matriz predial rege-se, também, pelo disposto na lei de acesso aos
documentos administrativos e à informação administrativa – Lei n.º
26/2016, de 22 de agosto, a informação solicitada pode ser obtida. E
quanto a isso a decisão não se pronuncia.”, incorre em erro, tendo sido
largamente explanado quais os dados que, ao abrigo da Lei de Acesso
aos Documentos Administrativos podem ser transmitidos (vg. artigo 1.º
n.º 4, al. d), da Lei 26/ 2016, de 22 de Agosto, sendo que o artigo 6.º n.º
5, al. b) e artigo 7.º, n.º 4, in fine, ambos da LADA, impõe que sejam
mensurados os direitos fundamentais em presença e a informação
transmitida esteja constitucionalmente protegida que fundamente o
acesso), tendo sido decidido a favor do ora Requerente porque “Não
podendo a informação pretendida pelo Recorrente considerar-se
abrangida pelo segredo fiscal, não pode opor-se à aplicação da LADA…”
3.º O Acórdão proferido no Proc.º 856/20.0BELRA, que o Recorrente
obviamente não desconhece, esclarece, relativamente à alegada violação
dos artigos 5.º e 6.º, números 5, alínea b) e 9 da Lei n.º 26/2016 e artigo
268.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP):
«Ora, a este respeito, importa esclarecer que o direito à informação a que
se reportam aqueles normativos não é um direito absoluto e que, em
consequência, não pode prevalecer sobre a tutela outorgada, também
constitucionalmente, à intimidade da vida privada e à exigência de um
correspondente dever de sigilo imposto à AT quanto aos dados elevados
por lei à condição de “dados pessoais”.»
4.º Inexiste qualquer contradição entre o estatuído na Lei 26/2016 e o
Acórdão proferido no Proc.º 1079/20.4BELRA atendendo que neste
processo não estavam em causa o acesso a dados pessoais, tendo
concluído o douto Tribunal que, não estando a informação pretendida
abrangida pelo segredo fiscal, nos termos da al. d), n.º 4, artigo 1.º,
poderia ser transmitida.
5.º Ora, o dado NIF, elemento identificativo de determinado cidadão,
através de qual se acede a outros dados protegidos constitucionalmente,
dado através de qual se acede a outros dados pessoais assim como
informações patrimoniais, dado que é transmitido aos serviços da AT pelo
cidadão, na sua relação jurídico tributária, que permite através do Portal
das Finanças aceder a informação contida na base de dados da AT, é um
dado que, à semelhança do número de identificação civil, impende sobre
ele um manto denso de proteção.
6.º Sobre o acesso à informação constante nas matrizes prediais (nos
quais estão incluídos dados pessoais e entre eles o dado NIF), foi a
matéria muito bem explanada pela mui Douta Conselheira Anabela
Ferreira Alves e Russo no seu voto de vencida, no Acórdão respeitante
ao processo 1079/20.4BELRA.
7.º Ainda sobre a mesma matéria discorre a Ficha Doutrinária n.º
2018000677 – IVE n.º 13512, com despacho concordante, de
2018.03.29, da Subdiretora-Geral da Área de Gestão Tributária –
Património assim como a Deliberação 632/2016 da Comissão Nacional
de Proteção de Dados, anexados aos autos.
8.º A AT reitera tudo o que foi explanado no Recurso apresentado e que,
por economia processual, considera aqui reproduzido.
9.º Apesar do Requerente alegar inexistência de identidade entre o
pedido formulado no processo 856/20.0BELRA e o presente processo
301/21.4BELRA, recorrendo à petição inicial de ambos os processos se
verifica que: no primeiro (856/20.0BELRA) é requerido a divulgação do
NIF de determinado cidadão por estar interessado em contactá-lo (apesar
de conhecer a morada do mesmo), e no presente processo
(301/21.4BELRA ) o autor solicita o NIF constante nas matrizes dos
prédios que confrontam com um outro prédio que, alegadamente,
pretende adquirir.
10.º Em conclusão, o que está em causa? Obviamente alcançar o NIF,
dado pessoal protegido pelo dever de sigilo.
11.º Não está em causa o fim para que pretende esse elemento, mas a
obtenção do elemento NIF que integra os dados protegidos pela
confidencialidade fiscal, por força do artigo 64.º da Lei Geral tributária.
12.º E não venha o Requerente defender que, por constar em
documentos públicos, o NIF deixa de ter caráter reservado, tendo sido
bem explanado na Deliberação 632/2016 da CNPD:
“E a eventual circunstância de os dados pessoais terem sido publicados
não afasta essa natureza, nem liberta qualquer ulterior tratamento, que
sobre eles incida, do regime jurídico de proteção de dados pessoais. É
esse o entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia, como se
depreende dos acórdãos C-73/07, de 16.12.2008 (onde se afirma que
uma operação sobre dados pessoais contidos em documentos que são
públicos é ainda abrangida pela Diretiva 95/46/CE), C-468/10 (que
assenta no facto de um dado tornado público pela administração não
estar excluído da proteção que o artigo 7.º da Diretiva confere - n.ºs 44 e
49), e C-131/12, de 13.05.2014 (n.º 30).”(sic)
Nestes termos, e nos demais de direito aplicáveis, e sempre com o mui
douto suprimento de V. Exas., deverá improceder a presente reclamação,
mantendo-se a decisão de revogação da sentença proferida pelo TAF de
Leiria, tendo a mesma matéria sido decidida no processo
856/20.0BELRA, por esse douto Tribunal, que negou provimento ao
pedido.

Convidado a manifestar-se, o Exmo. Magistrado do Ministério Público


veio emitir o seguinte parecer:

Na sequência da decisão sumária proferida a 08/09/2021, veio o


Recorrente apresentar reclamação para a conferência, ao abrigo do
disposto nos artigos 652º, nº1, alínea c), e nº3, do CPC.
O Reclamante insurge-se contra o facto de na fundamentação da decisão
ter sido feita por remissão para o acórdão proferido no processo nº
856/20.0BELRA, por no seu entender as questões que foram colocadas
num e noutro processo não serem as mesmas, atento que as decisões
de 1ª instância perfilharam entendimentos diversos sobre a
demonstração e prova do interesse no acesso à informação.
O Reclamante alega falta de pronúncia do tribunal sobre a questão de
saber se tendo sido demonstrado interesse no acesso à informação, o
número de identificação fiscal (NIF) pode ser fornecido, ao abrigo do
disposto na Lei nº 26/2016.
Considera o Reclamante que ao ter equiparado o caso dos autos ao do
processo nº 856/20.0BELRA, no qual não foi abordada esta questão, este
tribunal deixou de emitir pronúncia sobre a mesma.
Segundo percebemos as alegações do Recorrente, o mesmo entende
que a decisão sumária incorreu em erro de julgamento ao enquadrar as
questões que lhe foram colocadas e nessa medida solicita a intervenção
da conferência para corrigir esse seu enquadramento.
Afigura-se-nos, salvo melhor opinião, que não é arguida a nulidade da
decisão sumária, por falta de pronúncia (até porque o Reclamante não
identifica qualquer nulidade), mas sim erro de julgamento decorrente da
remissão da fundamentação para o acórdão proferido no processo nº
856/20.0BELRA.
*

Sem vistos, os autos vêm à conferência para decidir.


2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1.- Motivação de Direito

Em face dos termos em que foi enunciada no requerimento da


reclamação pelo recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a
saber se a decisão vertida na decisão sumária, a qual decidiu conceder
provimento ao recurso e revogar a sentença do TAF de Leiria,
substituindo-se por outra que julgue improcedente o pedido de intimação
para prestação de informações, padece de nulidade por omissão de
pronúncia sobre a questão de saber se tendo sido demonstrado interesse
no acesso à informação, o número de identificação fiscal – NIF - pode ser
fornecido, ao abrigo do disposto na Lei nº 26/2016, acrescendo que ao
ter equiparado o caso dos autos ao do processo nº 856/20.0BELRA, no
qual não foi abordada esta questão, este tribunal deixou de emitir
pronúncia sobre a mesma.
Vejamos.
Antes do mais, importa ter presente que a nulidade por omissão de
pronúncia, prevista no art. 125.º, n.º 1, do Código de Procedimento e de
Processo Tributário (CPPT) (Que segue o disposto no art. 615.º do CPC.)
se verifica quando o tribunal (A norma refere o juiz, mas é aplicável aos
acórdãos dos tribunais superiores.), em violação do seu dever de
cognição, consagrado no n.º 2 do art. 608.º do CPC, aplicável ex vi da
alínea e) do art. 2.º do CPPT, deixe de pronunciar-se sobre questões que
deva apreciar, ou seja sobre «todas as questões que as partes tenham
submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja
prejudicada pela solução dada a outras».
Como a jurisprudência tem vindo a afirmar reiteradamente, não há
omissão de pronúncia sobre questões colocadas quando o seu
conhecimento é expressamente recusado pelo tribunal ou quando este se
abstém de conhecer de uma questão mas indica as razões pelas quais
não conhece dela.
Nas palavras de ALBERTO DOS REIS, «uma coisa é o tribunal deixar de
pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, outra é invocar razão,
boa ou má, procedente ou improcedente, para justificar a sua abstenção»
(Código de Processo Civil, Anotado, Coimbra Editora, reimpressão, vol.
V, pág. 143.).
O Requerente considera que a decisão sumária proferida a 08/09/2021
da qual veio apresentar reclamação para a conferência, ao abrigo do
disposto nos artigos 652º, nº1, alínea c), e nº3, do CPC padece de
nulidade por omitiu pronúncia porque a sua fundamentação ter sido feita
por remissão para o acórdão proferido no processo nº 856/20.0BELRA,
quando, no seu entender as questões que foram colocadas num e noutro
processo não serem as mesmas, atento que as decisões de 1ª instância
perfilharam entendimentos diversos sobre a demonstração e prova do
interesse no acesso à informação. E a questão cuja cognição foi omitida
é, nesse contexto, a de saber se tendo sido demonstrado interesse no
acesso à informação, o número de identificação fiscal (NIF) pode ser
fornecido, ao abrigo do disposto na Lei nº 26/2016.
Em abono da sua tese aduz a reclamante que ao ter equiparado o caso
dos autos ao do processo nº 856/20.0BELRA, no qual não foi abordada
esta questão, este tribunal deixou de emitir pronúncia sobre a mesma.
Ora, secundando a posição do Ministério Público, entende-se que a tese
da Recorrente e ora Requerente é a de que a decisão sumária terá
incorrido em erro de julgamento ao enquadrar as questões que lhe foram
colocadas e nessa medida solicita a intervenção da conferência para
corrigir esse seu enquadramento. Todavia, tal erro não é qualificável
como nulidade da decisão sumária, por falta de pronúncia (até porque o
Reclamante não identifica qualquer nulidade), mas sim erro de
julgamento decorrente da remissão da fundamentação para o acórdão
proferido no processo nº 856/20.0BELRA.
O regime da decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator foi
introduzido pelo DL 329-A/95, podendo a parte afectada pela decisão
reclamar desta para a conferência conforme disposições conjugadas dos
art°s. 705° e 700° n° 3 CPC, hoje, art°s. 656° ex vi 652° n° 1 c) e n° 3
CPC da revisão de 2013.
Assim, deduzida reclamação para a conferência o colectivo de juízes
reaprecia as questões que foram objecto da decisão singular do Relator
e, nesse sentido, caso se esteja perante a decisão sumária do recurso,
reaprecia novamente o recurso, naturalmente sem qualquer vinculação
ao anteriormente decidido.
Pelas razões de direito expostas, no caso concreto cumpre reapreciar as
questões suscitadas pelo Recorrente em sede de conclusões de recurso,
fazendo retroagir o conhecimento do mérito do recurso ao momento
anterior à decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator.
Esta é do seguinte teor:

“1 – Relatório

A AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA interpôs o presente


recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de
Leiria (TAFLRA), de 12/06/2021, que julgou procedente o pedido de
intimação para prestação de informações ao abrigo do art.º 104.º e
seguintes do CPTA, considerando que o demandante desenvolvera “(…)
as razoáveis e exigíveis diligências procedimentais …” para obter a
informação pretendida e que “ (…) no domínio da regra geral do artigo
64.º da LGT (…) o NIF não integra o conceito infraconstitucional de
«situação tributária dos contribuintes» nem de «elemento de natureza
pessoal» (…) não integrando, também, o conceito constitucional de
«intimidade das pessoas» …” assim, decidindo julgar “(…) procedente a
ação, intimando-se a Ré a prestar, no prazo de 10 dias, a informação
respeitante ao número de identificação fiscal que consta na matriz predial
rústica para os artigos nºs …. e …. da freguesia de S. Martinho do Porto,
concelho de Alcobaça.”
Termina a sua alegação apresentando o seguinte quadro conclusivo:
“56.º
A sentença ora posta em causa ao decidir como decidiu, desclassificando
o dado NIF como dado pessoal e sujeito à proteção conferida por lei,
desconsiderou a lei substantiva da proteção de dados e à qualificação
nele integrada de “Dados Pessoais”, fazendo da norma errada
interpretação.
57.º
Na mesma medida, ao não considerar o dado NIF como dado pessoal
sujeito a proteção atribuída por lei, viola igualmente toda a jurisprudência
atual sobre a matéria, assim como as Deliberações da Comissão
Nacional de Proteção de Dados (autoridade de controlo nacional para
efeitos do RGPD e da Lei 58/2019, de 8/8).
58.º
A cedência de dados protegidos pelo dever de confidencialidade por
parte de um funcionário da AT, sem que exista fundamentação legal que
a permita, implica não só responsabilidade disciplinar como
responsabilidade criminal para o funcionário que atue em
desconformidade com a lei.
59.º
A informação solicitada pelo Intimante encontra-se coberta pelo sigilo
fiscal e não estão verificadas nenhumas das situações em que a LGT
admite a sua derrogação.
60.º
Compreende igualmente o artigo 130.º, n.º 1 do CIMI, a possibilidade de
derrogação do sigilo, acedendo aos dados constantes nas matrizes por
qualquer titular de um interesse direto, pessoal e legítimo, condições que
o Autor não logrou demonstrar, invocando somente um suposto interesse
em adquirir o artigo rústico que confronta com os artigos sobre os quais
requer a informação.
Nestes termos, e nos demais de direito aplicáveis, e sempre com o mui
douto suprimento de V. Exas., deverá ser concedido provimento ao
presente recurso, revogando-se a sentença ora recorrida por a mesma
configurar violação do previsto no artigo 130.º, n.º 1 do CIMI, artigo 64.º
da LGT conjugado com a Lei 58/2019 e 59/2019, de 8 de Agosto, e artigo
26.º, artigo 35.º, n.º 4 e artigo 266.º, todos da Constituição da República
Portuguesa, absolvendo a AT do pedido, com as legais consequências.”

Contra-alegou a recorrida, concluindo nos seguintes termos:

“50. Sendo o NIF do titular de um direito real obrigatoriamente público por


via do registo predial, também o deverá de ser na própria matriz predial
da AT, quando solicitado por via da indicação do número da matriz,
porque nesse acesso aplica‐se a LADA (lei 26/2016).
51. Sem prejuízo de se considerar que o pedido também se enquadra
nos termos do nº1 do art.º130º do CIMI, e que a alínea e) do art 64 da
LGT não obsta à sua divulgação, a sentença recorrida não merece
censura porque está de acordo com preceituado no nº 1 do artº 5º e na
alínea b) do ponto 5 do artº 6º, ambos da LADA, porque o acesso à
matriz predial também se faz com recurso aquela lei, de acordo com o
concluído no acórdão nº 1079/20.4BELRA do STA de 9 de junho de
2021. Só esse entendimento está de acordo com o ponto 2 do artº 268º
da CRP.
52. Por isso, suscita-se a inconstitucionalidade das normas contidas no
ponto 5 do artº 6º da Lei n.º 26/2016, no nº1 do artigo 130.º do CIMI, e no
ponto 1 e ponto 2 alínea e) do art 64 da LGT, caso sejam interpretadas no
sentido de considerar que o NIF é um elemento relativo à intimidade das
pessoas e por isso não pode ser fornecido quando ele é obrigatoriamente
público no registo predial de acordo com a alínea e) do artº 93º do Código
do Registo Predial e é solicitado à AT pela identificação do número de
artigo do prédio na matriz predial, por violação do ponto 2 do artº 268º da
CRP.
Nestes termos, e nos demais de direito aplicáveis, e sempre com o mui
douto suprimento de V. Exas., não deverá ser concedido provimento ao
recurso, por a sentença recorrida estar de acordo o previsto no nº1 do
artº 5º conjugado com a alínea b) do ponto 5 do artº 6º da Lei n.º
26/2016, bem como de acordo com o nº1 do artigo 130.º do CIMI, tudo
interpretado de acordo com o ponto 2 do artº 268º e ponto nº2 do artº 18º
da Constituição da República Portuguesa, com as legais consequências.”

A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta junto deste Supremo


Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso
por apelo ao fundamentado e decidido no recente Ac. deste STA de
17/02/2021, proferido no Processo n.º 0856/20.0BELRA, in www.dgsi.pt.,
como infra melhor se explicitará.

Foi suscitada oficiosamente a excepção da incompetência hierárquica


deste Tribunal nos seguintes termos: “Neste recurso jurisdicional,
interposto em meio processual acessório de intimação para a prestação
de informações (consulta de processos ou passagem de certidões) - Cf.
artigos 104.º segs. do CPTA e 146.º n.º 1 do CPPT-, presente o valor
fixado à causa, de € 30.000,01, e o disposto no artigo 151.º n.º 1 do
Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), a
competência, em razão da hierarquia, para o apreciar e decidir, não está,
por lei, atribuída ao Supremo Tribunal Administrativo (STA).
Porém, antes que assim se julgue, nos termos e para os efeitos dos arts.
3.º n.º 3, 655.º n.º 1 do CPC e 281.º do CPPT, notifique as partes para,
querendo, em 10 dias, se pronunciarem, sobre a matéria da identificada
exceção.”

Exercendo-se o atinente contraditório, veio a recorrida sustentar que a


mesma não se verificava por estarmos perante uma acção de valor
indeterminado.

Cumpre decidir.
*

2.- Fundamentação

2.1.- Da incompetência

Sobre a matéria de excepcionalidade propendemos para dar razão à


recorrida pois, na verdade, compulsados os autos, estes objectivam que
se o valor da ação é indeterminado, pois versa sobre o direito à
informação o qual reveste natureza análoga aos direitos, liberdades e
garantias protegidos constitucionalmente, pelo que se insere nas acções
de valor indeterminado, que, mesmo que as partes quisessem dispor de
outra forma, não poderiam, por se tratar de um direito indisponível.
Também decorre dos autos que somente para efeitos de possibilidade de
recurso (superior ao da alçada do Tribunal Central Administrativo), foi
fixado o valor da ação em 30.000,01 euros, ao abrigo das disposições
conjugadas do art.º 34.º, nºs 1 e 2, do CPTA, do art.º 6.º, n.º 4, do ETAF,
e do art.º 306.º, n.º 2, do CPC (aplicável ex vi art.º 1.º do CPTA). E para
efeitos de pagamento de taxa de justiça foi fixado o valor da ação em
2.000,00 euros, nos termos do art.º 12.º, n.º 1, alínea b), do RCP.
Destarte, acabamos por entender que de conformidade com o artigo 151º
nº1 do CPTA, que referencia que “os recursos interpostos de decisões de
mérito proferidas por tribunais administrativos de círculo são da
competência do Supremo Tribunal Administrativo quando as partes, nas
alegações, suscitem apenas questões de direito e o valor da causa seja
superior a 500 000 (euro) ou seja indeterminada (…)”, o presente recurso
está correctamente colocado em razão da hierarquia ao Supremo
Tribunal Administrativo.
Não se verifica, pois, a ajuizada excepção, havendo que conhecer do
objecto do recurso, o que se fará de seguida.

*
2.2- Do mérito do recurso

Não se controvertendo no recurso a matéria de facto fixada na sentença,


haverá que aquilatar se a sentença incorreu nos erros de julgamento que
lhe imputa a recorrente AT.
Nesse sentido, na esteira do douto Parecer do Ministério Público, que,
com a devida vénia passamos a transcrever:
“Sobre esta matéria já se pronunciou este STA, no recente Ac. de
17/02/2021, proferido no Processo n.º 0856/20.0BELRA, in www.dgsi.pt.
2. A questão que aqui se suscita tem exactamente os mesmos contornos,
pedidos e os mesmos protagonistas que se encontram no âmbito do
processo supra identificado (sendo irrelevante que se encontrem neste
recurso em posição inversa), mostrando que se pode estar em presença
de um caso de litigância repetitiva, tendo sido decidida, por este STA nos
seguintes termos:
“(…) na leitura que fazemos da regulação trazida a esta sede pelo
Decreto-Lei n.º 14/2013, de 28 de Janeiro, o legislador passou a adotar
uma posição muito mais rígida a respeito desta informação.
Assim, como bem sublinha o Parecer do Ministério Público, e se bem
lemos o propósito da nova regulação vertida em lei – que, em larga
medida, transpõe uma crescente preocupação com a tutela e tratamento
de dados individuais - o NIF é considerado como um dado pessoal (artigo
2.º deste diploma), tutelado nos termos do Capítulo II, “Da protecção de
Dados Pessoais” do mesmo diploma, estabelecendo o artigo 37.º que,
com exceção de desideratos estatísticos e de investigação, só deve ser
transmitido nos termos do artigo 64.º da LGT – norma que se torna, deste
modo, decisiva.
Aliás, tal leitura apresenta conformidade com o próprio conceito de “dado
pessoal”, vertido actualmente no Regulamento EU 2016/678, de 27 de
Abril de 2016, e que, em termos muito amplos, é definido como:
“informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável
(«titular dos dados»); é considerada identificável uma pessoa singular
que possa ser identificada, direta ou indiretamente, em especial por
referência a um identificador, como por exemplo um nome, um número de
identificação, dados de localização, identificadores por via eletrónica ou a
um ou mais elementos específicos da identidade física, fisiológica,
genética, mental, económica, cultural ou social dessa pessoa singular”.
Ora, é no artigo 64.º da LGT que vamos, por conseguinte, encontrar a
leitura que o legislador passou a fazer a este respeito.
IV. Sucede que este normativo foi alterado, também em 2013, passando
a dispor que: “1 - Os dirigentes, funcionários e agentes da administração
tributária estão obrigados a guardar sigilo sobre os dados recolhidos
sobre a situação tributária dos contribuintes e os elementos de natureza
pessoal que obtenham no procedimento, nomeadamente os decorrentes
do sigilo profissional ou qualquer outro dever de segredo legalmente
regulado.
(…)
Ora, tendo esta alteração, ocorrida em 2013, passado pela introdução de
uma nova exceção, constante da alínea e) do n.º 2 do artigo 64.º da LGT,
forçoso se torna concluir que o legislador não só configura aquelas duas
informações (NIF e domicílio fiscal) enquanto “dados pessoais”, como
apenas parece aceitar a transmissão das mesmas nas circunstâncias
estritas ali expressamente previstas.
(…) E sublinhe-se, ainda, que tal sentença se estribou, para tal efeito,
numa recentíssima decisão do Tribunal Central Administrativo Sul,
proferida no processo n.º 2796/19, de 25 de Junho de 2020, onde esta
matéria foi densa e devidamente abordada, em termos que não merecem
qualquer reparo.
Conclui-se, portanto, que não incorre em qualquer ilegalidade a decisão
da AT em negar o fornecimento de tal informação ao ora Recorrente.”
Assim, como ficou patente, as questões que se suscitam no presente
recurso são precisamente as mesmas que se suscitavam naqueloutro e o
julgamento que aí se fez – no sentido da revogação da sentença
recorrida - será reiterado também aqui, por integral adesão à douta
fundamentação do acórdão dele constante, para a qual expressamente
se remete, pois que se trata de caso análogo, entre as mesmas partes e,
como tal, merecedor do mesmo tratamento, acrescendo que este relator
interveio naquele processo como 2º adjunto.
Assim, sem mais delongas, e pelos fundamentos constantes do aludido
Acórdão cuja cópia se anexa, haverá que negar provimento ao recurso.

3.- Decisão

Termos em que, face ao exposto, em que se decide na Secção de


Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, em conceder
provimento do recurso e consequentemente, revogar a sentença do
TAFLRA, substituindo-se por outra que julgue improcedente o pedido de
intimação para prestação de informações, deduzido contra a Autoridade
Tributária e Aduaneira – Serviço de Finanças de Alcobaça.

Custas pela recorrida.”


*

Aderindo inteiramente a essa linha de entendimento, procede o recurso


jurisdicional interposto, devendo a decisão contida na sentença ser
alterada no sentido da improcedência da acção.
E esta conferência confirma o julgado na decisão sumária ainda pela
seguinte ordem de razões:
Em primeiro lugar, o Recorrente incorre em erro ao presumir que o dado
NIF, qualificado como dado pessoal, poderá ser transmitido desde que se
demonstre interesse no referido dado (“O objeto do presente recurso não
é avaliar se existe de facto interesse no acesso à informação (essa
matéria já foi assente), mas sim se o NIF pode ser fornecido quando se
demonstra esse interesse.”)
Depois, o Recorrente convoca a doutrina do Acórdão prolatado no Proc.º
1079/20.4BELRA, e ao sublinhar que “o acesso aos dados constantes na
matriz predial rege-se, também, pelo disposto na lei de acesso aos
documentos administrativos e à informação administrativa – Lei n.º
26/2016, de 22 de agosto, a informação solicitada pode ser obtida. E
quanto a isso a decisão não se pronuncia.”, incorre em erro, tendo sido
largamente explanado quais os dados que, ao abrigo da Lei de Acesso
aos Documentos Administrativos podem ser transmitidos (vg. artigo 1.º
n.º 4, al. d), da Lei 26/ 2016, de 22 de Agosto, sendo que o artigo 6.º n.º
5, al. b) e artigo 7.º, n.º 4, in fine, ambos da LADA, impõe que sejam
mensurados os direitos fundamentais em presença e a informação
transmitida esteja constitucionalmente protegida que fundamente o
acesso), tendo sido decidido a favor do ora Recorrente porque “Não
podendo a informação pretendida pelo Recorrente considerar-se
abrangida pelo segredo fiscal, não pode opor-se à aplicação da LADA…”
Acresce que o Acórdão proferido no Proc.º 856/20.0BELRA elucida,
relativamente à alegada violação dos artigos 5.º e 6.º, números 5, alínea
b) e 9 da Lei n.º 26/2016 e artigo 268.º, n.º 2 da Constituição da
República Portuguesa (CRP):
«Ora, a este respeito, importa esclarecer que o direito à informação a que
se reportam aqueles normativos não é um direito absoluto e que, em
consequência, não pode prevalecer sobre a tutela outorgada, também
constitucionalmente, à intimidade da vida privada e à exigência de um
correspondente dever de sigilo imposto à AT quanto aos dados elevados
por lei à condição de “dados pessoais”.»
Daí que não existe qualquer contradição entre o estatuído na Lei 26/2016
e o Acórdão proferido no Proc.º1079/20.4BELRA atendendo a que neste
processo não estavam em causa o acesso a dados pessoais, tendo
concluído o Tribunal que, não estando a informação pretendida abrangida
pelo segredo fiscal, nos termos da al. d), n.º 4, artigo 1.º, poderia ser
transmitida.
Sucede que, o dado NIF, elemento identificativo de determinado cidadão,
através de qual se acede a outros dados protegidos constitucionalmente,
dado através de qual se acede a outros dados pessoais assim como
informações patrimoniais, dado que é transmitido aos serviços da AT pelo
cidadão, na sua relação jurídico tributária, que permite através do Portal
das Finanças aceder a informação contida na base de dados da AT, é um
dado que, à semelhança do número de identificação civil, impende sobre
ele um manto denso de protecção.
Sobre o acesso à informação constante nas matrizes prediais (nos quais
estão incluídos dados pessoais e entre eles o dado NIF), foi a matéria
muito bem explanada pela Conselheira Anabela Ferreira Alves e Russo
no seu voto de vencida, no Acórdão respeitante ao processo
1079/20.4BELRA e que se transcreve por abarcar também as questões
de inconstitucionalidade suscitadas pelo requerente no seu recurso:
“A sentença recorrida julgou improcedente o pedido de intimação com
fundamento em que o Recorrente não alegou e, consequentemente, não
provou ser titular de um interesse pessoal, directo e legítimo na obtenção
de elementos constantes da matriz que solicitou relativamente a prédios
sitos na freguesia que indicou, limitando-se a afirmar que apenas
pretendia saber “os números de artigos validados na freguesia de SMP
onde moro, a fim de tentar compreender em que termos o Serviço de
Finanças de Alcobaça valida ou não as declarações”.
No acórdão que ora se vota ficou reconhecido que o Recorrente não
invocou a existência do referido interesse directo, pessoal e legítimo,
limitando-se a sustentar o pedido da forma supra indicada. Mas também
se conclui que o não tem que fazer. Porque nos termos do artigo 5.º da
LADA, qualquer pessoa, sem necessidade de enunciar qualquer
interesse, têm direito de acesso aos documentos administrativos, o qual
compreende os direitos de consulta, de reprodução e de informação
sobre a sua existência e conteúdo. E que esta interpretação e
densificação do direito consagrado no artigo 5.º da LADA é a que vem
merecendo acolhimento constitucional, citando-se particularmente o
acórdão do tribunal constitucional n.º 117/15, de 12 de Fevereiro de 2015,
proferido no processo n.º 686/12.
Discordamos por duas ordens de razões.
Por um lado, porque há que distinguir direito de acesso e condições de
acesso. Por outro, porque existe uma especial regulamentação quanto ao
direito de acesso a elementos constantes da matriz.
Começando por esta última objecção, realçamos que o artigo 130.º, n.º 1
do CIMI veda expressamente o acesso a elementos da matriz a outros
que não os próprios sujeitos passivos do imposto (o que, obviamente,
não é o caso) salvo se um terceiro (como é o caso) invocar e demonstra
um interesse directo, pessoal e legítimo (“O sujeito passivo ou qualquer
titular de um interesse directo, pessoal e legítimo, pode consultar ou obter
documento comprovativo dos elementos constantes das inscrições
matriciais“).
Ao estabelecer esse regime o legislador restringiu e quis restringir o
acesso a esses elementos a quem alegasse e demonstrasse ser titular
desse interesse, o que fez através de uma norma especial que não pode
entender-se derrogada pelo artigo 5.º da LADA. E não se diga que a
interpretação que realizamos contende com a essência do regime
consagrado no artigo 5.º da LADA, com a amplitude desse direito ou com
a interpretação que o Tribunal Constitucional vem veiculando quanto à
interpretação constitucional conforme do direito reconhecido no referido
normativo legal.
Desde logo, porque a própria LADA admite restrições ao direito de
acesso aos arquivos e registos administrativos. Restrições que de forma
expressa e directa enuncia (artigo 4.º) e restrições contidas noutros
diplomas legais que também expressamente salvaguarda (artigo 7.º, n.º 1
da LADA “Sem prejuízo das demais restrições legalmente previstas …”).
Como é o caso do regime especial de acesso a documentos
comprovativos dos elementos constantes das inscrições matriciais
disciplinado no artigo 130.º, n.º 1 do CIMI. Depois, porque o que o que o
Tribunal Constitucional vem densificando, com pertinência para a questão
que ora se aprecia, particularmente no acórdão do Tribunal Constitucional
convocado em abono da tese que fez vencimento, é o direito de aceder à
informação e não dos requisitos para o acesso. No caso não se está a
discutir se ele tem ou não direito, ou seja, se o direito que ele invoca é
um interesse fundamentado, mas sim que o não fundamentou nos termos
especialmente previstos e, consequentemente, não accionou
devidamente o direito de acesso à informação.
O princípio do arquivo aberto assegura o direito à informação, mas não
invalida que o legislador possa impor critérios para o exercício desse
direito, como sucede neste caso (artigo 130.º, n.º 1 do CIMI). Não se
pode confundir a existência e a garantia de um direito com as condições
de exercício do mesmo, sobretudo quando está também em causa o
funcionamento de um serviço público. As condições de exercício (neste
caso, a necessidade de invocar um interesse, directo pessoal e legítimo)
neutralizam situações de exercício do direito por razões fúteis, que
penalizariam o funcionamento do serviço.
A isso acresce, neste caso, o que parece ser também um exercício do
direito à informação, que o legislador quis que fosse exercido de forma
harmonizada com a privacidade dos direitos dos titulares dos bens
matricialmente inscritos, pelo que a preponderância do primeiro impõe
que esteja em causa a satisfação de um interesse juridicamente tutelado
ou, pelo menos, diferenciado de um mero interesse de facto no acesso à
informação. Em síntese, concordando com a tese que obteve vencimento
na parte em que diz, como o Recorrente invocou, que estamos perante
uma pretensão de acesso a documentos fundado no direito de acesso
aos arquivos e registos administrativos consagrado pelo artigo 5.º da
LADA, salvaguardando esta Lei eventuais restrições a esse direito que
estejam consagradas em outros diplomas legais (7.º, n.º 1 da LADA) e
vedando o artigo 130.º, n.º 1 do CIMI o acesso por parte de terceiros a
elementos constantes da matriz a terceiros, salvo se alegarem e
demonstrarem serem titulares de um interesse pessoal, directo e
legítimo, concluiria que o Recorrente tinha que alegar e provar ser titular
desse direito. Não o tendo feito, confirmaria, com a presente
fundamentação, a sentença recorrida.”
Assim, em consonância com o ponto de vista da reclamada e recorrida,
não obstante o Recorrente e ora Requerente alegue inexistência de
identidade entre o pedido formulado no processo 856/20.0BELRA e o
presente processo 301/21.4BELRA, recorrendo à petição inicial de
ambos os processos vê-se nitidamente que no primeiro (856/20.0BELRA)
é requerido a divulgação do NIF de certo cidadão por estar interessado
em contactá-lo (apesar de conhecer a morada do mesmo), e no presente
processo (301/21.4BELRA) o autor solicita o NIF constante nas matrizes
dos prédios que confrontam com um outro prédio que, alegadamente,
pretende adquirir.
Pelo que é pertinente a conclusão de que o que está em causa é,
evidentemente, obter o NIF, dado pessoal protegido pelo dever de sigilo.
Destarte, não está em causa o fim para que pretende esse elemento,
mas a obtenção do elemento NIF que integra os dados protegidos pela
confidencialidade fiscal, por força do artigo 64.º da Lei Geral Tributária.
Sendo despiciendo o que o Recorrente esgrime no sentido de que, por
constar em documentos públicos, o NIF deixa de ter carácter reservado,
como bem se demonstra na Deliberação 632/2016 da CNPD:
“E a eventual circunstância de os dados pessoais terem sido publicados
não afasta essa natureza, nem liberta qualquer ulterior tratamento, que
sobre eles incida, do regime jurídico de proteção de dados pessoais. É
esse o entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia, como se
depreende dos acórdãos C- 73/07, de 16.12.2008 (onde se afirma que
uma operação sobre dados pessoais contidos em documentos que são
públicos é ainda abrangida pela Diretiva 95/46/CE), C-468/10 (que
assenta no facto de um dado tornado público pela administração não
estar excluído da proteção que o artigo 7.º da Diretiva confere - n.ºs 44 e
49), e C-131/12, de 13.05.2014 (n.º 30).”
Termos em que improcede a presente reclamação e se confirma a
decisão sumária que decretou a revogação da sentença proferida pelo
TAF de Leiria.

*
3.- Decisão:

Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário


do Supremo Tribunal Administrativo em indeferir a reclamação da decisão
sumária.

Custas pelo reclamante.


*
Lisboa, 09 de Dezembro de 2021

José Gomes Correia (relator) – Aníbal Augusto Ruivo Ferraz – Pedro


Nuno Pinto Vergueiro.

0856/20.0BELRA
Data do Acordão: 17-02-2021
Tribunal: 2 SECÇÃO
Relator: GUSTAVO LOPES
COURINHA
Descritores: DEVER DE
CONFIDENCIALIDADE
DIREITO À INFORMAÇÃO
Sumário: I – Com a introdução,
em 2013, de uma nova
exceção ao dever de
confidencialidade -
constante da alínea e)
do n.º 2 do artigo 64.º
da LGT - forçoso se
torna concluir que o
legislador não só
configura as duas
informações ali
previstas (NIF e
domicílio fiscal)
enquanto “dados
pessoais”, como apenas
parece aceitar a
transmissão das
mesmas nas
circunstâncias estritas
ali expressamente
previstas.
II - O direito à
informação a que se
reportam aqueles
normativos não é um
direito absoluto e não
pode, sem mais,
prevalecer sobre a
tutela outorgada,
também
constitucionalmente, à
reserva da intimidade
da vida privada.

Nº Convencional: JSTA000P27211
Nº do Documento: SA2202102170856/20
Data de Entrada: 27-01-2021
Recorrente: A............
Recorrido 1: AT - AUTORIDADE
TRIBUTÁRIA E
ADUANEIRA
Votação: UNANIMIDADE

Aditamento:
Texto Integral
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário
do Supremo Tribunal Administrativo

I – RELATÓRIO

I.1 Alegações
A…………, melhor identificado nos autos, vem
recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e
Fiscal de Leiria proferida 03 de Dezembro de
2020 que julgou improcedente o pedido de
intimação para prestação de informações por si
deduzido contra Autoridade Tributária e
Aduaneira – Serviço de Finanças de Alcobaça.
Apresenta as suas alegações de recurso,
formulando as seguintes conclusões:
16. Nestes termos, deve de ser julgado
procedente o presente recurso e ser revogada
a sentença recorrida, por violação do artigo 5º e
do artigo 6º, número 5 alínea b) e número 9 da
Lei n.º 26/2016, de 22 de Agosto, e do ponto 2
do artigo 268º da Constituição da República
Portuguesa.
17. Não estando o NIF do titular de um
determinado prédio sujeito ao sigilo fiscal nos
termos do artigo 64º da LGT, interpretou mal o
tribunal a quo aquele preceito, porque aquele
dado do contribuinte não configurar a situação
prevista no nº 1 do dito preceito (situação
tributária dos contribuintes ou elementos de
natureza pessoal obtidos no procedimento),
que tem que ser interpretado,
necessariamente, à luz do ponto 2 do artigo
268º da Constituição da República Portuguesa.
Sendo antes um dado público e por isso não
respeitante à “intimidade das pessoas”,
conforme obriga o artigo 108º do Código do
Registo Predial, tem que o tribunal a quo
intimar a AT a faculta-lo.
18. Por isso, deve a sentença recorrida ser
substituída por outra em que o tribunal a quo
intime a AT a divulgar o NIF de B…………,
titular inscrito na Conservatória do Registo
Predial de Alcobaça no prédio que na matriz
predial rústica da freguesia de São Martinho do
Porto, concelho de Alcobaça, tem o n.º de
artigo 1257.

I.2 – Contra-alegações
A Recorrida, Autoridade Tributária e Aduaneira
apresentou contra-alegações a fls. 108 e
seguintes do SITAF, sustentando, em suma,
que deve ser negado provimento ao recurso,
mantendo a decisão do tribunal “a quo” de
acordo com o preceituado no artigo 64.º da
LGT, conjugado com as Leis n.ºs 58/2019 e
59/2019, ambas de 8 de Agosto, e com os
princípios constitucionais previstos no artigo
26.º, 35.º e 266º da CRP, sustenta em síntese
que é legitima a recusa da AT nos termos da
Lei, devendo ser absolvida do pedido com as
legais consequências.

I.3 – Parecer do Ministério Público


É o seguinte o teor do Parecer junto ao
presente Recurso:
«A…………, veio, inconformado com a
Sentença proferida em 03/12/2020, no
processo supra e à margem referenciado
interpor o recurso; nos termos da Sentença
recorrida o tribunal a quo julgou improcedente a
acção de intimação para prestação de
informações por si proposta e absolveu a Ré do
pedido.
Desde logo importa considerar que o aqui
recorrente requereu à Autoridade Tributária e
Aduaneira, em 17/09/2020, através do e-balcão
que lhe fosse fornecido “o número de
identificação fiscal (NIF) de B………… ”.
Para justificar o seu pedido o requerente
alegou que B………… é titular inscrito no
prédio vizinho ao seu, necessitando do
respectivo NIF “a fim de o contactar para
verificação de extremas”.
Em 21/09/2020 a ATA enviou ao recorrente a
seguinte informação:
“(…)
Em resposta ao mail infra, informo que na
consulta efetuada à matriz, as confrontações
registadas desde 1957 do artigo rústico 1261
da Freguesia de S. Martinho do Porto, do qual
V.Exa. é atualmente titular, são:
Norte com Estrada Nacional; Sul e Nascente
com Caminho e do Poente com Agueiro.
Consultada a matriz do artigo rústico nº 1257
da mesma Freguesia constatou-se que
nenhuma das confrontações registam como
confinantes quaisquer nomes dos
antepossuidores do artigo rústico 1261 de S.
Martinho do Porto.
Assim sendo, e tendo em conta que os
elementos solicitados estão abrangidos pelo
sigilo fiscal nos termos do artigo 64º da LGT e
pela Lei de Proteção de Dados, não tem
legitimidade para efetuar o pedido.”
Inconformado o recorrente propôs contra a
Autoridade Tributária e Aduaneira – Serviço de
Finanças de Alcobaça (Ré), com invocação dos
art.ºs 146.º, n.º 1 do Código de Procedimento e
de Processo Tributário (CPPT), e 104.º e 105.º
do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos (CPTA, pedindo, a final, que a
Ré seja intimada a “divulgar o NIF de
B…………, casado com C………… no regime
de Comunhão geral, morador em ………,
Monte Real, Leiria, ainda que para isso tenha
que fazer uma pesquisa por nome de cidadão a
fim de o encontrar.”
Como supra já se referiu o tribunal a quo julgou
improcedente a acção de intimação para
prestação de informações e absolveu a Ré do
pedido.
São as conclusões da Alegação da Recorrente
que definem o objecto e delimitam o âmbito do
recurso, ressalvando-se as questões que,
sendo de conhecimento oficioso, encontram
nos autos os elementos necessários à sua
consideração (cf. artº 635º nº 4 do CPC, ex vi
artº 1º do CPTA).
Nas conclusões da alegação do recorrente,
consta o seguinte:
“…
16 Deve de ser julgado procedente o presente
recurso e ser revogada a sentença recorrida,
por violação do artigo 5º e do artigo 6º, número
5 alínea b) e número 9 da Lei n.º 26/2016, de
22 de Agosto, e do ponto 2 do artigo 268º da
Constituição da República Portuguesa.
17. Não estando o NIF do titular de um
determinado prédio sujeito ao sigilo fiscal nos
termos do artigo 64º da LGT, interpretou mal o
tribunal a quo aquele preceito, porque aquele
dado do contribuinte não configurar a situação
prevista no nº 1 do dito preceito (situação
tributária dos contribuintes ou elementos de
natureza pessoal obtidos no procedimento),
que tem que ser interpretado,
necessariamente, à luz do ponto 2 do artigo
268º da Constituição da República Portuguesa.
Sendo antes um dado público e por isso não
respeitante à “intimidade das pessoas”,
conforme obriga o artigo 108º do Código do
Registo Predial, tem que o tribunal a quo
intimar a AT a facultá-lo.
18. Por isso, deve a sentença recorrida ser
substituída por outra em que o tribunal a quo
intime a AT a divulgar o NIF de B…………,
titular inscrito na Conservatória do Registo
Predial de Alcobaça no prédio que na matriz
predial rústica da freguesia de São Martinho do
Porto, concelho de Alcobaça, tem o n.º de
artigo 1257. “
Defende o recorrente que deve ser concedido
provimento ao presente recurso e, por via dele,
ser revogada a sentença recorrida, tudo com as
legais consequências.
Analisando as conclusões:
Defende o recorrente que a Sentença violou os
art.ºs 5º e 6º, n.º 5 al. b) e número 9 da Lei n.º
26/2016 e bem assim o art.º 268º n.º 2 da
Constituição da Republica Portuguesa (CRP).
É certo que de acordo com o artº 268.º da CRP
os cidadãos têm o direito de ser informados
pela Administração, sempre que o requeiram,
sobre o andamento dos processos em que
sejam directamente interessados, bem como o
de conhecer as resoluções definitivas que
sobre eles forem tomadas (cf. n.º 1);
2.Os cidadãos têm também o direito de acesso
aos arquivos e registos administrativos, sem
prejuízo do disposto na lei em matérias
relativas à segurança interna e externa, à
investigação criminal e à intimidade das
pessoas.
Do preceito constitucional resulta, desde logo,
que o direito à informação não é um direito
absoluto, encontrando-se eventualmente,
limitado por direitos de outrem, como seja um
direito de personalidade; em consequência o
interessado pode ter de alegar e demonstrar
que tem um direito legítimo à obtenção da
informação ou do documento que pretende.
O “direito de acesso” previsto no art.º 5.º da Lei
n.º 26/2016 respeita a documentos
administrativos e realiza-se independentemente
da integração dos documentos administrativos
em arquivo corrente, intermédio ou definitivo. O
art.º 6.º n.º 5 al. b) estipula por seu lado que um
“terceiro” só tem direito de acesso a
documentos nominativos se demonstrar,
fundamentadamente, ser titular de um interesse
directo, pessoal, legítimo e constitucionalmente
protegido, suficientemente relevante, após
ponderação, no quadro do princípio da
proporcionalidade, de todos os direitos
fundamentais em presença e do princípio da
administração aberta, que justifique o acesso à
informação.
O número de contribuinte de um cidadão não é
seguramente um documento administrativo e
não cabe, seguramente, na previsão do art.º 5º
Lei n.º 26/2016.
De notar que o número de identificação fiscal
(NIF) foi instituído pelo Decreto-Lei n.º 14/2013
(cf. art.º 1.º) e de acordo com o art.º 2.º o
número de identificação fiscal, abreviadamente
designado por NIF, é um número sequencial
destinado exclusivamente ao tratamento de
informação de índole fiscal e aduaneira. Assim
sendo nem sequer pode ser utilizado para fim
diferente daquele para que foi instituído. O NIF
está expressamente mencionado no art.º 35.º
no Capítulo II, “Da protecção de Dados
Pessoais”, donde concluímos com segurança
que ele consubstancia um “dado pessoal”,
beneficiando da protecção inerente.
Aqui chegados, teremos necessariamente de
incluir o NIF, enquanto elemento de natureza
pessoal, na previsão de confidencialidade
constante do art.º 64.º da Lei Geral Tributária
(LGT) cujo n.º 1 estabelece que “os dirigentes,
funcionários e agentes da administração
tributária estão obrigados a guardar sigilo sobre
os dados recolhidos sobre a situação tributária
dos contribuintes e os elementos de natureza
pessoal que obtenham no procedimento,
nomeadamente os decorrentes do sigilo
profissional ou qualquer outro dever de segredo
legalmente regulado”.
Veja-se, a este propósito o Ac. proferido pelo
TCAS em 25/06/2020 no processo n.º
2796/19.7BELRS segundo o qual “I - O Número
de Identificação Fiscal a atribuir
automaticamente é um elemento de
identificação do contribuinte e como tal,
encontra-se protegido pelo dever de sigilo
fiscal, previsto no artigo 64.º/1 da LGT.
2. Poderá ser revelado pela AT, entre outras,
nas situações previstas na alínea d) do n.º 2 do
art. 64º da LGT, em colaboração com a justiça
nos termos do Código de Processo Civil”.
Aliás, o recorrente não demonstrou cabalmente
em que medida o NIF pretendido é importante
para que ele possa proceder ao
reconhecimento das extremas do seu prédio
rústico, sendo certo que da informação
fornecida pela ATA resulta que o seu prédio
nem confina com o prédio do titular do NIF que
ele pretende. Como bem se referiu na
Sentença recorrida o aqui recorrente nem
sequer demonstrou ter legitimidade para obter
a informação que pretende.
E não se compreende a relevância da obtenção
do NIF, se ele tem todos os elementos de
identificação dos donos do prédio que ao que
diz é confinante com o seu.
O recorrente não demonstrou que tem
interesse directo pessoal e legítimo em obter a
informação que pretende.
Sendo assim, pelas razões que, sinteticamente
deixámos expostas, resulta o nosso
entendimento de que o recurso não merece
provimento uma vez que a Sentença não
padece de qualquer vício e não merece a
censura que lhe faz o recorrente.»

I.4 - Com dispensa de vistos, dada a natureza


urgente do processo, cabe apreciar.

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – De facto
O tribunal a quo deu como provada a seguinte
matéria de facto:
1) Pela AP. 16 de 1996/04/02, B…………,
casado com C…………, no regime de
comunhão geral, com morada na ………,
Monte Real, Leiria, registou na Conservatória
do Registo Predial de Alcobaça, a aquisição a
D…………, casado com E…………, do prédio
rústico situado em ………, inscrito na matriz
predial rústica da freguesia de São Martinho do
Porto, concelho de Alcobaça, sob o n.º 1257,
composto de terra de pinhal e mato,
confrontando a norte e nascente com Caminho,
a sul com …………, e a poente com Caminho e
Agueiro (cfr. teor da certidão junta com a p.i.,
de fls. 4 e 5 do documento do SITAF n.º
005221953, e certidão de teor de prédio
rústico, Modelo A, constante do cadastro da AT,
de fls. 49 do SITAF, cujo teor aqui se dá por
integralmente reproduzido).
2) Consta dos dados do Cadastro da AT que
B……….., faleceu em 26/01/2000 – (cfr. artigos
32.º e 55.º da contestação).
3) Pela AP. 3044 de 2020/08/25, o Autor
registou na Conservatória do Registo Predial
de Vila Nova de Poiares, a aquisição a
F…………, do prédio rústico denominado de
“………”, inscrito na matriz predial rústica da
freguesia de São Martinho do Porto, concelho
de Alcobaça, sob o n.º 1261, composto de
pinhal e mato, confrontando a norte com a
Estrada Nacional, a sul e nascente com
Caminho, e a poente com Agueiro (cfr. teor da
certidão junta com a p.i., de fls. 2 e 3 do
documento do SITAF n.º 005221953, , e
certidão de teor de prédio rústico, Modelo A,
constante do cadastro da AT, de fls. 50 do
SITAF, cujo teor aqui se dá por integralmente
reproduzido).
4) Em 17/09/2020, o Autor solicitou através do
e-balcão, no sítio da internet da sua área
pessoal da AT, o seguinte:
“(…)
Nos termos do art 268º nº2 da Constituição da
República Portuguesa, do art 130º nº 1 do
Código do IMI, e por ser titular do prédio rústico
com o nº artigo 1261, vizinho do rústico com o
nº artigo 1257, ambos da freguesia de São
Martinho do Porto, concelho de Alcobaça,
solicito:
O NIF de B…………, casado com C…………
no regime de Comunhão geral, morador em
………, Monte Real, Leiria, ainda que para isso
tenha que fazer uma pesquisa por nome de
cidadão a fim de o encontrar.
Ele é o titular inscrito no prédio vizinho e
preciso saber o seu NIF, a fim de o contactar
para verificação de extremas. Mesmo que o
NIF não esteja na matriz, deve de me fornecer
essa informação, porque o NIF é um elemento
a levar a registo e que deve de constar na
matriz. O meu NIF também consta publicitado
no registo predial.
Junto 5 anexos: planta, registo do meu e do
prédio vizinho, email da conservatória que
considera obrigatório o NIF para o registo, e
parecer do MP do Supremo que considera que
o NIF deve de ser dado (ainda que não esteja
registado).”
(…)” - (cfr. documento junto com a p.i., de fls. 1
do documento do SITAF n.º 005221952, cujo
teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
5) Em 21/09/2020, a AT, em resposta ao pedido
a que se alude no ponto anterior, pronunciou-se
nos seguintes termos:
“(…)
Em resposta ao mail infra, informo que na
consulta efetuada à matriz, as confrontações
registadas desde 1957 do artigo rústico 1261
da Freguesia de S. Martinho do Porto, do qual
V.Exa. é atualmente titular, são:
Norte com Estrada Nacional; Sul e Nascente
com Caminho e do Poente com Agueiro.
Consultada a matriz do artigo rústico nº 1257
da mesma Freguesia constatou-se que
nenhuma das confrontações registam como
confinantes quaisquer nomes dos
antepossuidores do artigo rústico 1261 de S.
Martinho do Porto.
Assim sendo, e tendo em conta que os
elementos solicitados estão abrangidos pelo
sigilo fiscal nos termos do artigo 64º da LGT e
pela Lei de Proteção de Dados, não tem
legitimidade para efetuar o pedido.

(…)” - (cfr. documento junto com a p.i., de fls. 1


do documento do SITAF n.º 005221952, cujo
teor aqui se dá por integralmente reproduzido).
6) a presente ação deu entrada neste Tribunal
em 12/10/2020 – (cfr. fls. 1 a 3 do SITAF).
II.2 – De Direito
I. Vem o presente recurso interposto da decisão
do Tribunal Administrativo e Fiscal do Leiria, de
03 de Dezembro de 2013, que julgou
improcedente o pedido de informação
formulado pelo recorrente A………… à
Autoridade Tributária para que lhe seja
facultado o número de identificação fiscal
(doravante, NIF) de B…………, seu suposto
vizinho, a fim de o contactar para verificação de
extremas de terrenos alegadamente
adjacentes.
Vejamos, então, se assiste razão ao
Recorrente.

II. Comecemos por recordar que não é a


primeira vez que esta questão vem endereçada
a este Supremo Tribunal.
Com efeito, pelo acórdão lavrado no âmbito do
Processo n.º 0838/11, de 16 de Novembro de
2011, foi então sufragado entendimento
segundo o qual o NIF não integrava a esfera da
intimidade da vida privada, cuja tutela se
encontrava suportada no artigo 64.º da Lei
Geral Tributária. E, na linha da leitura que
então se fez deste preceito, assim como do
enquadramento constitucional da questão, foi
esclarecido que: “II - A consagração da regra
do sigilo fiscal, constante do artigo 64.º da Lei
Geral Tributária, corresponde, precisamente, à
extensão e reconhecimento do direito à
privacidade no âmbito da actividade tributária,
estando por ele abrangidos os dados de
natureza pessoal dos contribuintes (pessoa
singular ou colectiva) e os dados expressivos
da sua situação tributária, os quais só podem
ser revelados a terceiros - outros sectores da
Administração ou particulares - nos casos
expressamente previstos na lei, para responder
a um motivo social imperioso, e só na medida
estritamente necessária para satisfazer o
equilíbrio entre os interesses em jogo.
III - Podem, contudo, ser revelados os dados
pessoais livremente cognoscíveis (dados
públicos ou dados pessoais constantes de
documento público oficial, como acontece, por
exemplo, com o número de identificação fiscal,
com a identificação dos bens inscritos na matriz
predial ou no registo predial e comercial) bem
como os dados fiscais que não reflictam nem
denunciem a situação tributária dos
contribuintes.” Era o caso, precisamente, do
NIF, informação que, pelas suas próprias
características - desde logo pela sua
sequencialidade, automaticidade e inocuidade -
não configurava informação susceptível de
revelar qualquer traço ou aspecto da vida
económica-fiscal-patrimonial do sujeito passivo,
podendo por isso ser transmitida pela AT sem
violação do dever de sigilo a que esta se
encontra vinculada.
Tratava-se, como está fácil de ver, de
jurisprudência que se encontrava solidamente
ancorada numa conceção funcional e, assim,
flexível de abordagem ao dever de
confidencialidade e à protecção dos dados do
contribuinte.
Sucede que, entretanto (mais precisamente,
em 2013), o legislador interveio; e, em nossa
opinião, ao fazê-lo, alterou estruturalmente os
dados que enquadram esta problemática,
tornando assim esta referida jurisprudência
inaplicável.

III. Com efeito, na leitura que fazemos da


regulação trazida a esta sede pelo Decreto-Lei
n.º 14/2013, de 28 de Janeiro, o legislador
passou a adotar uma posição muito mais rígida
a respeito desta informação.
Assim, como bem sublinha o Parecer do
Ministério Público, e se bem lemos o propósito
da nova regulação vertida em lei – que, em
larga medida, transpõe uma crescente
preocupação com a tutela e tratamento de
dados individuais - o NIF é considerado como
um dado pessoal (artigo 2.º deste diploma),
tutelado nos termos do Capítulo II, “Da
protecção de Dados Pessoais” do mesmo
diploma, estabelecendo o artigo 37.º que, com
exceção de desideratos estatísticos e de
investigação, só deve ser transmitido nos
termos do artigo 64.º da LGT – norma que se
torna, deste modo, decisiva.
Aliás, tal leitura apresenta conformidade com o
próprio conceito de “dado pessoal”, vertido
actualmente no Regulamento EU 2016/678, de
27 de Abril de 2016, e que, em termos muito
amplos, é definido como: “informação relativa a
uma pessoa singular identificada ou
identificável («titular dos dados»); é
considerada identificável uma pessoa singular
que possa ser identificada, direta ou
indiretamente, em especial por referência a um
identificador, como por exemplo um nome, um
número de identificação, dados de localização,
identificadores por via eletrónica ou a um ou
mais elementos específicos da identidade
física, fisiológica, genética, mental, económica,
cultural ou social dessa pessoa singular”.
Ora, é no artigo 64.º da LGT que vamos, por
conseguinte, encontrar a leitura que o
legislador passou a fazer a este respeito.

IV. Sucede que este normativo foi alterado,


também em 2013, passando a dispor que: “1 -
Os dirigentes, funcionários e agentes da
administração tributária estão obrigados a
guardar sigilo sobre os dados recolhidos sobre
a situação tributária dos contribuintes e os
elementos de natureza pessoal que obtenham
no procedimento, nomeadamente os
decorrentes do sigilo profissional ou qualquer
outro dever de segredo legalmente regulado.
2 - O dever de sigilo cessa em caso de:
a) …;
b) …;
c) …;
d) …;
e) Confirmação do número de identificação
fiscal e domicílio fiscal às entidades legalmente
competentes para a realização do registo
comercial, predial ou automóvel.” (sublinhado
nosso)
Ora, tendo esta alteração, ocorrida em 2013,
passado pela introdução de uma nova exceção,
constante da alínea e) do n.º 2 do artigo 64.º da
LGT, forçoso se torna concluir que o legislador
não só configura aquelas duas informações
(NIF e domicílio fiscal) enquanto “dados
pessoais”, como apenas parece aceitar a
transmissão das mesmas nas circunstâncias
estritas ali expressamente previstas.
Podemos, é certo, questionar se o actual
regime não se revela desnecessariamente
garantístico; mas não vemos como seja
possível concluir que é distinta a solução
decorrente da lei, a qual foi, igualmente,
subscrito pela sentença recorrida. E sublinhe-
se, ainda, que tal sentença se estribou, para tal
efeito, numa recentíssima decisão do Tribunal
Central Administrativo Sul, proferida no
processo n.º 2796/19, de 25 de Junho de 2020,
onde esta matéria foi densa e devidamente
abordada, em termos que não merecem
qualquer reparo.
Conclui-se, portanto, que não incorre em
qualquer ilegalidade a decisão da AT em negar
o fornecimento de tal informação ao ora
Recorrente.

V. Defende, ainda, o Recorrente que a


Sentença violou os artigos 5.º e 6.º, números 5,
alínea b) e 9 da Lei n.º 26/2016 e, bem assim, o
artigo 268.º, n.º 2 da Constituição da República
Portuguesa (CRP).
Ora, a este respeito, importa esclarecer que o
direito à informação a que se reportam aqueles
normativos não é um direito absoluto e que, em
consequência, não pode prevalecer sobre a
tutela outorgada, também constitucionalmente,
à intimidade da vida privada e à exigência de
um correspondente dever de sigilo imposto à
AT quanto aos dados elevados por lei à
condição de “dados pessoais”.
Aliás, pela solução adotada pelo legislador,
desde 2013, entendemos inevitável concluir
que se reforçou, assumidamente, a tutela deste
direito constitucional à intimidade da vida
privada em detrimento daquele direito
constitucional à informação em termos
exigentes, mas não desproporcionais.

VI. Cumpre, assim, negar provimento ao


presente Recurso.

III. Conclusões
I – Com a introdução, em 2013, de uma nova
exceção ao dever de confidencialidade -
constante da alínea e) do n.º 2 do artigo 64.º da
LGT - forçoso se torna concluir que o legislador
não só configura as duas informações ali
previstas (NIF e domicílio fiscal) enquanto
“dados pessoais”, como apenas parece aceitar
a transmissão das mesmas nas circunstâncias
estritas ali expressamente previstas.
II - O direito à informação a que se reportam
aqueles normativos não é um direito absoluto e
não pode, sem mais, prevalecer sobre a tutela
outorgada, também constitucionalmente, à
reserva da intimidade da vida privada.

IV. Decisão
Termos em que acordam os Juízes da Secção
de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal
Administrativo em negar provimento ao
Recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 17 de Fevereiro de 2021. – Gustavo


André Simões Lopes Courinha (relator) -
Anabela Ferreira Alves e Russo – José Gomes
Correia.

You might also like