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TRADIGOES E ESTILOS NA ARTE RUPESTRE NO NORDESTE BRASILEIRO * Alice Aguiar da Universidade Federal de Pernambuco Com 0s resultados dos dltimos trabalhos publicados ou em vias de publicagdo, sobre a arte parietal no Nordeste, 6 possivel estabelecer, pela primeira vez, as “tradi- cGes” e “estilos” pictéricos localizados na regio, a partir das pesquisas realizadas pela sso arqueolégica franco-brasileira no Piaui € posteriormente a implantacio do Nucleo de Estudos Arqueolégicos do Mestrado em Histéria da Universidade Federa’ de Pernambuco. As duas equipes utilizaram a mesma metodologia e técnica de interpre- tagéo, comparando os dados obtidos e tratando de relacionar estilos e variedades da arte rupestre, assim como, os respectivos “habitats”, na procura de denominadores comuns que evitassem o cunho estritamente pessoal na hora das interpretacées ‘Ao se estudar a arte rupestre no Nordeste, devemos lembrar o nome de alguns pesquisadores que isoladamente tentaram mostrar o que existia nas suas regides, j6 desde os comegos do século. Pesquisadores de outras éreas do conhecimento referi- * Pesquisa financiada pelo Conselho Nacional de Pesquisas — CNPq. 1 ram-se, esporadicamente, & abundancia de pinturas e gravuras indigenas na regiéo. Como exemplo citaremos 0 jornalista Mario Melo que identificou numerosos s{tios com pinturas em Pernambuco, publicadas em vérios nimeros da revista do Instituto Histérico, Geo- gréfico Arqueolégico de Pernambuco. Porém, o primeiro que realizou uma pesquisa arqueolégica sistemética do tema foi Valentin Calderén, na Bahia, que sintetizou seu trabalho na Nota prévia sobre trés fases da arte rupestre no Estado da Bahia, O autor utiliza 0 termo “tradic&o”, pela primeira vez aplicado a arte rupestre, no sentido do ‘diferenciar grupos humanos, regiées e técnicas pictéricas, definido como: “o conjunto de caracteristicas que se refletem em diferentes sitios ou regides, associados de maneira similar, atribuindo cada uma delas ao complexo cultural de grupos étnicos diferentes, que as transmitiam e difundiam, gradualmente mo- dificadas, através do tempo e do espaco”. Define as “fases" que compdem as tradigdes como: “momentos histéricos de- finiveis de sua evolugao”. Cada “fase” foi denominada por um top6nimo escolhido entre os lugares onde as pinturas aparecem com maior intensidade, diante da impossibilidade de se atribuir as mesmas qualquer grupo étnico conhecido, Da andlise das pictografias estudadas, Calderén separou duas “tradigdes", com ‘suas respectivas “fases”. Tradi¢ao Realista — Determinada pela marcante inten¢éo de reproduzir homens, animais e plantas da forma mais fiel, na tentativa de copiar os modelos reais. Nesta “tradi¢éo”, Calderon identificou a fase Irecé, com silhuetas de frente ou de perfil de pouco dinamismo; a fase Jaboticaba, com figuras de grande realismo, pouco esquematizadas e abundancia de detalhes adicionais e a fase Orobé que apresenta grande dinamismo com figuras dangando, correndo ou lutando. Tradi¢do Simbolista — que aparece com maior intensidade, Séo figuras geomé- tricas ou grosseiramente figurativas, com as fases Maniacu, de figuras estilizadas, de execugéo muito complexa, sem a intengao de reproduzir os modelos e a fase Sincora, de desenhos isolados, totalmente esqueméticos e exclusivamente simbélicos, tals como: espirais, circulos, quadrados, etc. Ruth Trindade Almeida (1973), concentrou seu trabalho na regiéo geografica de- nominada “Cariris da Paraiba". Dos 49 sitios por ela estudados, 34 sao de pinturas, 12 so de gravuras e 2 apresentam as duas manifestagdes associadas no mesmo painel. Em sua grande maioria os desenhos sio abstratos, sendo o objeto representado de forma esquemética ou simplificada. Em menor nimero de sitios a arte naturalista ou fi- gurativa, também aparece Os petroglifos dos “Cariris Velhos", estudados por Ruth Almeida sao encontra- dos nas proximidades dos rios, enquanto que os sitios com pinturas rupestres se en- contram geralmente a uma distancia que varia de 1 a 3 km dos cursos d’dgua. © vermetho, em seus varios tons, predomina nos sitios pintados, 0 amarelo tam- bém se faz presente, e 0 preto e o branco sé raramente aparecem. 92 No seu trabalho, Ruth de Almeida limitou-se a fazer a descricao do sitio e, su tamente, do tipo de pintura ou gravura localizado, sem determinar para seus achados a tradigao a que poderiam pertencer. Posteriormente com a continuagéo das pesquisas em Pernambuco, vimos que os sitios localizados nos “Cariris da Paraiba", podem sor incluidos na tradigao “Agreste” de que falaremos depois. A.F. Laroche em Contribuigées para a Pré-Histéria Pernambucana — (1975), in- forma que na Serra de Acai, vérias inscrigdes foram encontradas, porém, como seu trabalho € dedicado, especialmente, ao estudo do material litico e ceramico, ndo contem descrigdes das Marcos Albuquerque (1971), estudando alguns sitios com pinturas em Brejo da Madre de Deus (Pe) propés que, além da diviséo em Tradig&o e Fases, se determinasse Tipos Basicos, para a elaboracdo de seriagdes, tomando-se como universo o total de desenhos do sitio. Porém, o autor ndo determina o que ele considera tradi¢aéo, nem fase, nem explica quals seriam os Tipos Bésicos vélidos para a seriacéo, se bem que chama a atencdo para o perigo da “projecio psicolégica do observador em relagio as pinturas”. Os trabalhos citados apresentam o defeito da falta de desenhos ou fotografias das pinturas, sem a publicacéo de painéis inteiros, dependendo apenas da descricio do ‘autor que, como sabemos, s6 poderé ser subjetiva e que 6 um dos maiores problemas dc estudo da arte rupestre, problema tratado mais amplamente por Niéde Guidon no seu trabalho Da aplicabilidade das classificacdes preliminares na arte rupestre (1982), © por A.M. Pessis em Methodes d’interpretation de l'art rupestre: andlyses prelimiaires par niveaux, (1982). Nossa maior preocupacao tem sido, de acordo com as autoras citadas, estabele- ‘cer uma linguagem néo pessoal e valida, pelo menos, para todos os que trabalham na mesma 4rea sobre pinturas rupestres. Os termos tradi¢éo e fase foram tomados da linguagem ceramica princinalmente, estabelecida como metodologia basica pelo Programa Nacional de Pesquisas Arqueolégi- cas (PRONAPA), Porém, é importante salientar que nas representacées rupestres entra um elemento novo e importante que € a intencionalidade estética. Mesmo que alguns autores, entre eles Niéde Guidon, néo aceitem a pintura ru- pestre como arte e achem a denominacao “arte rupestre” errénea, néo podemos negar que 0 gosto estético do autor das pinturas pesa na hora de representar 0 que ele es- tava pensando. O termo tradi¢go & aceito como definidor da temética das pinturas porém numa tradi¢éo onde a temética principal seja cenas de caca, danga e luta, haverd que explicar a forma como esses temas foram interpretados, porque caca, danca e luta so temas universais da arte rupestre mundial por serem representagdes da vida cotidia- na dos povos primitivos. Consequentemente a tradi¢ao é definida pela tematica e pelas formas como essa temética é interpretada, tais como movimento ou estatismo, figuras grandes ou pequenas, monocromas ou policromas, etc. O termo fase foi substituido pelo estilo, atendendo uma concepcao estética € se- gur.do norma tradicional na Histéria da Arte, onde um mesmo tema pode ser interpre- tado com estilos diferentes. 93 O termo estilo aplicado ao estudo da arte rupestre corresponderia a técnica uti- lizada na realizagio dos grafismos. Uma terceira divisfo chamada “variedade”, tem sido utilizada por Niéde Guldon ne Piaui, com conotagéo estritamente local, correspondente a um sitio ou pequeno grupo de sitios relacionados entre si Estudando a arte rupestre no Nordeste do Brasil foram detectadas as seguintes tradigoes: Tradi¢éo Nordeste — cor vermelha, amarela, branca, preta e alguns casos verde e azul, O termo Tradigéo Nordeste surge a partir de numerosos sitios com pinturas loca- lizadas na regiéo de So Raimundo Nonato no SW do Piauf. Estudos posteriores de- monstram que as caracterfsticas desta tradi¢éo eram extensivas a outras regides do Nordeste e que poderiam ser a arte figurativa de grupos de cacadores. Na realidade, as caracteristicas das pinturas da Tradigéo Nordeste, correspondem as mesmas da chamada Tradicéo Realista de Calderén, porém como o termo “Realista” 6 aplicavel a pintura de outras regiées da América do Sul, achamos que o termo “Tra- digo Nordeste” 6 mais ilustrativo da regio em estudo. Os elementos que determinam a Tradicéo Nordeste séo: a quantidade equilibrada entre dois tipos de grafismos de composicéo (zoomorfos e antropomorfos) e grafismos puros em menor nimero. Foi convencionado utilizar o termo grafismo, segundo proposta de A.M. Pessis, no lugar de desenho, figura, etc., como forma mais abrangente de descric&o. Grafismos de agdo corresponderia a cenas com antropomorfos e zoomorfos © grafismos puros indicaria qualquer signo abstrato ou simbélico. A Tradi¢éo Nordeste facilmente identificdvel pela variedade dos temas, tais como numerosas formas de dangas, a riqueza de atributos e adornos que acompanham a figura humana. Nos seus diversos estilos, encontramos um verdadelro retrato das atl- vidades dos grupos humanos aos quais pertencem. Os grafismos de composicio séo, geralmente, de pequeno tamanho se bem que apresentem diferencas marcantes entre os diferentes estilos. Até 0 momento a Tradigéio Nordeste tem sido claramente identificada na Bahia, no Municipio do Morro do Chapéu — na Chapada Diamantina, no SW do Piaut e no Sul do Rio Grande do Norte. Na Bahia, como vimos, Calderén assinalou trés “fases” ou estilos, que infelizmente com seu falecimento, néo completou o estudo. No Piaui, Niéde Guidon entre mais de 200 sitios pesquisados, separou o estilo “Vérzea Grande”, o melhor estudado e varios outros estilos @ variedades, completando 0 maior quadro até agora conhecido desta tradi¢ao. As pinturas do estilo Vérzea Grande, segundo os estudos de Niéde Guidon (1976), ocupam paredes, tetos e faces de blocos em abrigos abertos, iluminados pelo sol, algumas vezes as figuras foram feitas em pleno sol, outras em recénditos sombrios. ‘As raz6es para a escolha dos abrigos, néo podem ser determinados, néo sendo 94 nem a orientagao em relagdo aos pontos cardeais, nem o meio ambiente, nem a altura que ocupam na escarpa. Varias so as técnicas de pintura. Os tragos que contornam a figura séo geralmente finos e as vezes desaparecendo sob a pintura de preenchimento. Em alguns casos eles ‘880 largos ¢ bem visiveis, principalmente nas figuras maiores. Na maioria das pinturas a linha de contorno é continua, porém aparecem também figuras desenhadas por pontos ou tracinhos, Séo encontrados também contornos abertos, formados por linhas que n&o sé encontram. As figuras podem ter o interior do corpo vazio, porém geralmente 0 preenchimento 6 feito por pintura lisa, espalhada de maneira homogénea ou apresentando os tracos da espétula utilizada, Os antropomorfos s4o geralmente desenhados de face, mas exis- tem muitos de perfil. Entre os zoomorfos predominam os representados de perfil, em- bora alguns ornitomorfos sejam vistos de face. Em alguns grupos aparecem as figuras maiores na frente das menores, dando assim uma impressdo de perspectiva. Os z0o- morfos e antropomorfos sé desenhados no plano do observador, enquanto que os sapos © os animais que rastejam sdo representados, como se vistos do alto. As figuras naturalistas desse estilo, so representadas na sua maioria, de forma dindmica, ja as ongas, os enimais que rastejam, os peixes e invertebrados aparecem de forma estatica. Uma caracteristica do estilo Varzea Grande 6 0 jogo entre o nimero, tamanho e posicéo das figuras dos diferentes grupos, como nos sitios em que o nimero de an- tropomorfos 6 maior, porém como os zoomorfos séo de tamanho muito maior, parecem ser as figuras principais do abrigo. © estilo se caracteriza pelo predominio das figuras naturalistas, representadas a0 lado de grafismos puros e que podem ser sinais, pictogramas ou mitogramas ou ape nas elementos decorativos. Uma caracteristica marcante do estilo 6 a presenca de mos, em sua maioria em positivo, porém aparecem algumas desenhadas. © tema 6 a mais importante caracteristica do estilo "Varzea Grande”. As figuras formam cenas, que representam temas bem definidos. Algumas cenas sfo comuns a toda a regio, podendo apresentar algumas variagSes gréficas, outras aparecem apenas em determinadas éreas. No presente trabalho nao incluimos desenhos do estilo “Varzea Grande”, por ser bastante conhecido na bibliografia especializada, © estilo Seridé (Gabriela Martin, 1981 e 1982) foi detectado ao longo do vale do rio Serid6 e dos seus afluentes Acaud e Carnatiba, na regio do Seridé, no Rio Grande do Norte, onde se sucedem uma série de abrigos sob rocha, de pouca profundidade, situados em torno de 300mts sobre o vale. As pinturas estdo realizadas com pince', traco firme e tinta vermelha, além de amarela e branca em ntimero menor. Representam cenas de grande vivacidade, com temas de caca, luta, danga e sexo, sendo o ultimo em menor ntmero. As figuras antro- pomorfas, zoomorfas e algumas esqueméticas, sao de pequeno tamanho, variando de 5 a 15cm., apresentando atributos, armas e adornos, tais como cocares, saias, pintura 95 corporal, arcos, bordunas e propulsores. Entre os zoomorfos destacam-se os veados, as emas e grande variedade de ornitomorfos. Barcas ou pirogas com remos aparecem em alguns abrigos. Vérios temas repetem-se nos diferentes abrigos. Por exemplo: duas figuras hu- manas contrapostas que dao a idéia de proteger uma menor, colocada no meio, cenas de danga em torno de uma érvore ou figuras dancando com ramos nas méos, além de _gtupos de figuras com arco @ objeto arredondado no braco, representando cabacas ou “sacolas” e a figura de um passaro gigante com aspecto de totem isolado. Outra carac- teristica ¢ a presenca da “paisagem”, separando as cenas, com desenhos que sugerem vegetacdo rasteira, Oe esta tradicao. Serid6, foi inserido na Tradigao Nordeste, pois a tematica coincide com Os elementos que compéem o estilo Serid6, tem pontos de contato com o estilo Varzea Grande, embora néo se posse por enquanto estabelecer uma relacdo cronolégica entre 0s dois estilos, porém, pode-se assinalar que uma tradigéo rupestre de cacadores, teve seu nticleo de disperséo no SW do Piaui,onde a concentragao de sitios 6 maior, estendendo-se por outras regides do Nordeste. As principais caracteristicas do estilo Seridé seriam o traco firme do desenho, © pequeno tamanho das figuras, a pouca determinacao do sexo nas figuras antropomor- fas, a grande agitagéo e movimento das figuras e a face representada de perfil, como se gritassem. Atualmente temos bem determinados dentro da Tradigao Nordeste, os estilos Varzea Grande (Piaui), Seridé (RN) e os trés estilos Irecé, Jaboticaba © Orobé, deter- minados por Calderén, dentro do que ele chamou “Tradicao Realista” e que séo também veriedades desta grande tradicéo que determinamos chamar “Nordeste”. Outros esti- los tém sido detectados, porém estdo ainda em estudo. Tradi¢do Agreste — cor: vermelha e amarela Incluimos dentro da Tradigéo Agreste numerosos sitios com pinturas rupestres no Cearé, Rio Grande do Norte, Paraiba, Pernambuco e o Piaui, com a maior concen trago de sitios, até agora assinalados no Agreste pernambucano, motivo pelo qual he termos dado esse nome, As caracteristicas gerais da Tradigdo Agreste séo grafismos de grande tamanho sejam eles de composicéo ou puros. Os grafismos de acao (cenas) s4o raros, quando oxistem, representam cenas isoladas com um ou dois individuos ou animais, como por exemplo um Gnico homem cagando ou pescando. Grafismos puros simples ou muito elaborados (dependendo dos estilos) acompanham os zoomorfos e antromorfos, equili- bredos ou com ligeira predominancia dos ultimos, Tipico da Tradigdo Agreste 6 a re- presentacéio de um antropomorfo, as vezes de grande tamanho, de desenho propositade- mente grotesco, lembrando um espantalho que Niéde Guidon chamou de “bonecio” 2 que encontramos, por exemplo, no estilo “Castelo” do Piaui, no “Cariris Velhos” (G. Martin et alii, 1980), em Pernambuco e na Bahia na fase “Itacira” (Calder6n, 1870 p. 17). Emas e quelénios, estéticos, sem nenhuma sensagéo de movimento, alguns de grande tamanho também aparecem com frequéncia. Tipico da Tradicdo Agreste sao também fi- guras de péssaros de asas abertas e longas penas, alguns com tendéncia ao antropofor- mismo como uma tentativa de representar a figura de um pdssaro-homem. 96 Dentro da Tradigéo Agreste, o estilo melhor estudado 6 o Cariris Velhos, locali- zado em Pernambuco na nascente do Vale do Capibaribe e Serra do Cariris Velhos nos municipios de Taquaritinga do Norte, Brejo da Madre de Deus e Santa Cruz do Capiba- ribe € na Serra do Bucu nos municipios de Alagoinha, Venturosa, Pedra, Buique e Arco- verde. Com 30 sitios exaustivamente estudados e j4 em vias de publicagao pela autora do presente trabalho. Os elementos principais do estilo Cariris Velhos sa — Predominancia de grafismos de composicéo, sem formar cena: — Nos grafismos de composigéo maior numero de zoomorfos que antropomorfos, com Poucas representagdes de sexo; — Marcas de mao em positive, sempre na parte superior dos painéis: — Acesso as pinturas relativamente facil — Pinturas sobre matagdes de granito. Geologicamente o estilo “Cariris Velhos” se assenta em éreas onde os granitos de granulagéo média e grossa e coloragdo acinzentada, constituem importantes intru- s6es que pelo efeito da erosio nas rochas mais brandas circundantes, emergem na forma de grande monolitos arredondados onde geralmente se encontram as pinturas rupestres. © estilo Cariris Velhos, poderé ser datado, como resultado das escavagées rea- lizadas no sitio Peri-Peri (Venturosa, Pe), onde foram encontrados restos de tinta com material litico e duas fogueiras. O material das fogueiras j4 foi encaminhado para a detacdo radio-carbénica. Estilo Geométrico elaborado — cor: vermelho. Chamamos assim um estilo “sui generis” de pintura geométrica que lembra tecido pintado ou bordado ou mesmo decoragao geométrica sobre cerdmica. Geralmente ocupa grandes painéis de 5 a 10 metros com um Gnico desenho; alguns desenhos menores lembram carimbos ou anténticos bordados, dado a cuidada elaboracio do desenho. Estes motivos aparecem também pintados sobre matacdes de granito, as vezes associado com o estilo Cariris Velhos e outras iscladas. Pela localizagao dos sitios deste estilo, geralmente em dreas planas, vélidas para sua utilizagao agricola e a presenga de ce- ramica arqueolégica nas proximidades dos sitios é de supor que o estilo Geométrico Elaborado possa relacionar-se com grupos culturais agricolas e ceramistas, sem o que perém, a afirmativa seja categorica. Estilo Castelo — cor vermelho e amarelo. No Centro @ Norte do Piaui, localizado numa série de abrigos, principalmente no municipio de Castelo. Inserido na Tradigéo Agreste e ainda em estudo por Niéde Guidon, Na regio do Sio Francisco, em Sobradinho, municipio de Petrolina e Juazeiro foram localizados alguns sitios com pinturas, pela equipe da Associagao de Arqueologia 6 PréHist6ria da Bahia (Calderon, 1977) e que poderiam ser inclufdos na Tradig&io Agres- te, porém néo foram publicados painéis completos, nem realizado ainda um estudo que Permita filiar essas pinturas a um estilo determinado. Como resultado das pesquisas do Nucleo de Estudos Arqueolégicos da Universi 97 dade Federal de Pernambuco, em colaboracdo com a Universidade Regional de Mossoré (RN), identificamos uma série de abrigos no municipio de Apodi, com pinturas que podem ser incluidas na Tradicéo Agreste. O sitio “Soledade” é o mais extenso de todos, ao longo de um riacho estreito entre rochedos, onde a pouca distancia do chéo (50cm a 1m), sucedem-se numerosos zoomorfos e esqueméticos, tais como passaros e de- senhos serpentiformes. Um estilo que poderia ser chamado Soledade ou Apodi, porém, precisa-se de maior numero de sitios e um estudo mais aprofundado da regiéo. No momento, incluimos esses sitios na Tradicéo Agreste, sem determinar o estilo. Tradi¢éo Itacoatiara — gravuras sobre rocha. A tradi¢ao Macoatiara, de gravuras esqueméticas sobre rochas 6 a mais extensa e de mais dificil estudo. Seu expoente maximo esté na “Itacoatiara” da Pedra do Inga (G. Martin, 1975) e nas pedras de “Tanques”, na regio do Serid6, com pedras de mais de 20m, repletas de gravuras. A tradigéo tem grande concentragéo no Nordeste, porém, encontra-se desde 0 Amazonas até o Rio Grande do Sul, com grandes concen- trages de gravuras em Goiés e no Mato Grosso, Sempre ligada as correntes d’égua (rios, cérregos, etc.), 0s desenhos séo sempre esqueméticos ou ideogréficos, com al- gumas manifestagées zoomérficas, geralmente de quel6nios. Linhas onduladas que imi- tam o movimento das Aguas e representacdes das estrelas e do sol, so as mais co- muns. Que a tradigao Itacoatiara esté ligada ao culto das dguas é indubitavel, assim mesmo, muito delas nos fazem pensar em cultos de tipo cosmogénico ligado as forcas da natureza e ao firmamento. Porém, depois dessas possiveis interpretacdes, sempre du- vidosas, pois o fator subjetivo de nossa cultura nao pode ser descartado, pouco pode- mos dizer a respeito desta tradi¢ao. Como as gravuras da tradicao Itacoatiara em 99% das vezes foram feitas nos cursos d’4gua, em contato direto com ela, nfo hé a menor possibilidade de escavagdes arqueolégicas, nem de filiagdo das mesmas a alguma cul- tura material pré-historica, de forma que, fica sempre no terreno de conjectura, maiores esclarecimentos sobre a mesma. Porém, 6 importante assinalar que trata-se de uma tradigao muito difundida em toda a América do Sul, 0 que nao implica tenham sido feitas pelos mesmos grupos cul- turais, e que podem ter cronologias muito dispares entre si, Culto das 4guas e cosmo- g@nicos s4o crengas universais que podem produzir representacées semelhantes entre grupos em estégios culturais diferentes. Um exemplo 6 ilustrativo: 6 espantosa a se- melhanca das itacoatiaras nordestinas com os petroglifos galegos da Peninsula Ibérica, dos que existe farta bibliogratia (Antonio de la Pend Santos e S.M. Vazquez Varela, 1979 e Alfredo Garcia Alem e Antonio de la Pend Santos, 1981). Algum deles parecem feitos pela mesma mo, sem que isso, implique em nenhum tipo de relacdo cultural. Existem indiscutivelmente. sinais “universais", que se repetem em muitas cultu- ras sem ter havido contato entre elas e tentar relacioné-las, somente baseado nas pos- siveis semelhangas, através de grandes distancias geogréficas 6 sempre perigoso. Os. possiveis estilos da tradicéo Itacoatiara estdo, ainda, por determinar. Porém um estilo esté bem definido: o estilo Boi Branco (lati, Pe), de grandes painéis, onde predominam linhas onduladas gravadas na pedra e pinturas com tinta vermelha dentro do desenho gravado. O fato no 6 apenas do estilo Boi Branco, 0 mesmo caso repete-se no sitio “Grossos", Acari (RN) onde ao longo de um curso d'égua encontramos gra- 98 vuras recheadas de tinta vermelha e em outros lugares do Nordeste, porém, ainda no podemos afirmar que se trate de um mesmo estilo, mesmo que todos esses sitios pertencam & tradicao Itacoatiara, Este resumo do estado atual do estudo da arte pré-histérica na regiéo Nordeste, néo teria sentido se as pesquisas iniciadas nao tivessem uma continuidade sistemética. Come dissemos no comeso, o grande problema do estudo da arte préhistorica no Bra- sil, assim como da arqueologia brasileira em geral & 0 excesso de “notas prévias” que nunca passam para monografias completas. As dificuldades de publicagéo de pinturas e gravuras cujos desenhos e fotografias encarecem os custos editoriais sio um dos vérios problemas. Desde o n° 3 da revista CLIO, 0 Nucleo de Estudos Arqueoldgicos da UFPe tem procurado a publicacao de sitios rupestres na sua totalidade com os painéis completos que 6 0 que pretendemos continuar fazendo no futuro. Assim uma monografia sobre 30 sitios da tradigéo Agreste e outra sobre o estilo Seridé entéo em andamento. NOTAS AGUIAR, Alice et alii, Sitios Arqueolégicos Cadastrados em Pernambuco, “Clio” n.° 04 1981 UFPE, Recife. ALBUQUERQUE, Marcos Nota prévia sobre a ocorréncia de pictografias no municipio de 1971 Brejo da Madre de Deus, Separata do Boletim n° 18 do Irstituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Socials, Recife. ALMEIDA, Ruth Trindade de. A arte rupestre nos Cariris Velhos, Editora Universitaria, 1979 UFPb, Joo Pessoa. CALDERON, Velentin. 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