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Nosso Caminho
Liga dos Camponeses Pobres
2018

Escrito: Em 2000, revisado em 2018 - veja a versão de 2006


Primeira Edição: Em forma completa como Linha Política Geral, estabelecido e adotado pelas LCPs no 1º
Congresso da LCP, em 2000.
Fonte: (Desconhecida)
Transcrição e HTML: Anônimo
Direitos de Reprodução: licenciado sob uma Licença Creative Commons.

“Juramos pelo sangue


derramado dos nossos
companheiros
na fazenda
Santa Elina, levar a
qualquer custo a luta pela
terra, pela democracia,
justiça e trabalho até a
vitória final.”

Juramento feito pelos


resistentes da Batalha de
Santa Elina na fundação do
MCC, em Jaru-RO, 25 de
fevereiro de 1996. Juramento assinado
pelos continuadores da luta de Santa Elina e
fundadores da LCP.

Apresentação

Companheiras e companheiros,

Nosso Caminho apareceu pela primeira vez há mais ou menos dez anos, em meados de
1996. Continha o resumo dos estudos e idéias resultantes da prática social, principalmente
na luta de classes, de centenas de companheiras e companheiros militantes revolucionários
e das massas populares de diferentes regiões do nosso país. O seu propósito era servir de
orientação básica para a intervenção no movimento camponês na luta pela conquista da
terra e pelas transformações necessárias à libertação social e política do povo pobre do
campo em particular, e da libertação do povo brasileiro e da nossa Nação do jugo do
imperialismo, no geral.

Sob o impacto dos dramáticos acontecimentos de 9 de agosto de 1995 em Corumbiara


— Rondônia, onde na fazenda Santa Elina, milhares de camponeses ali acampados
impuseram a mais feroz resistência à selvageria do latifúndio e seu velho Estado burocrático
genocida em seu ato covarde de semear o terror e realizar o despejo de mais de 600
famílias, o movimento camponês de nosso país começou uma nova etapa de sua história.

Aqueles acontecimentos marcaram profundamente a história do movimento popular no


estado de Rondônia e em nosso país, fazendo também profundamente uma demarcação de
campo entre as diversas correntes políticas do movimento popular e na sociedade brasileira.
Com eles iniciou-se uma luta aberta no interior do movimento camponês sobre os rumos,
métodos de organização e de luta. Na verdade deu início a um processo de separação e
depuração necessários e inevitáveis ao movimento camponês em seu longo e complexo
curso em nosso país.

Aqueles acontecimentos marcaram profundamente a história do movimento popular no


estado de Rondônia e em nosso país, fazendo também profundamente uma demarcação de
campo entre as diversas correntes políticas do movimento popular e na sociedade brasileira.
Com eles iniciou-se uma luta aberta no interior do movimento camponês sobre o rumo, linha
política e métodos de organização e de luta. Na verdade deu início a um processo de
separação e depuração necessários e inevitáveis ao movimento camponês, da luta no seu
seio entre os dois caminhos — o proletário ou o burguês, o democrático ou o burocrático —
em seu longo e complexo curso em nosso país.

Tal luta é a que se dá entre o caminho do oportunismo, que é o mesmo caminho


burocrático da burguesia e do latifúndio, que sempre subordinou o movimento camponês
aos projetos eleitoreiros, tratando os camponeses como classe secundária na luta de
classes, e o caminho revolucionário, único capaz de efetivamente conquistar a terra através
da destruição completa do latifúndio, por guiar-se no programa revolucionário de
transformações para o campo e por considerar os camponeses pobres como a força
principal para as transformações democráticas revolucionárias de nosso país, assentadas
na aliança operário-camponesa.

Desde a heroica Batalha de Santa Elina, ao longo de 23 anos, a experiência da luta


popular no país só confirmou a análise e a orientação do Nosso Caminho. Também
apresentou importantes desafios que têm exigido novas respostas para novos problemas
nos impondo a necessidade de revisar e ajustar aspectos de nossa orientação, como
ocorreu ao longo dos 13 anos e meio de gerenciamento do oportunismo
PT/PCdoB/PSB/PDT, apoiados pelo restante da “esquerda eleitoreira”, pela CONTAG, MST, as
centrais sindicais e outras organizações controladas pelo oportunismo.

Com o triunfo eleitoral de Luiz Inácio em 2002, as direções oportunistas, que embora
cada vez mais decadentes, ainda têm prevalecido no movimento camponês, tiveram todas
as oportunidades para demonstrar e comprovar a quem realmente serve suas teses: à
grande burguesia, os latifundiários e ao imperialismo. Menos aos camponeses pobres.
Senão vejamos: aqui estamos após 13 anos e meio de seus governos (Luiz Inácio e Dilma),
na verdade mero gerenciamento de turno do velho Estado de grandes burgueses e
latifundiários, serviçais do imperialismo que desembocou no seu mais completo fracasso,
afundado na crise econômica e geral de decomposição do capitalismo burocrático e em
meio da crise geral do imperialismo. Mais ainda, da grave crise política que depôs por
impeachment Dilma Rousseff, expressão que é da briga das frações das classes dominantes
em razão da mesma crise econômica. Em todos estes anos os camponeses pobres só
podem dizer que sua situação piorou. Não foi Luiz Inácio quem disse, entre tantas
promessas de campanha, que “se tivesse que tomar só uma medida em seu governo, ela
seria a de fazer a reforma agrária”? Sim, foi ele mesmo! Não foram os oportunistas que
obtiveram, nada mais nada menos, que o controle do Ministério do Desenvolvimento Agrário
e não foram os quadros ligados à direção nacional do MST e da CONTAG que ocuparam os
mais importantes cargos do INCRA em nível nacional e nos estados? Sim, foram eles
mesmos!

E para que tudo isto serviu? O que tudo isto está servindo é para que todos os
camponeses pobres vejam o fracasso da velha conversa fiada de sempre da “reforma
agrária do governo”. Isto está servindo é para desmascarar todos oportunistas, eleitoreiros
descarados que são, e todo este governo, que revelou ser nada mais que uma gerência de
turno do velho Estado de grandes burgueses e latifundiários serviçais do imperialismo. Que
somente resta ao movimento camponês levar a luta por uma verdadeira revolução agrária.
Mas para isto se necessita rechaçar o podre caminho oportunista da conciliação e tomar o
caminho revolucionário espinhoso e nada fácil da luta pela destruição completa do
latifúndio.

E é para travar esta luta e dar grande impulso ao movimento camponês que aqui está
Nosso Caminho, sempre novo, invariável, revigorado e irrenunciável.

A comissão de revisão e redação,


Goiânia, junho de 2018.

Por um Programa Agrário de transformação radical do campo

I. Introdução

A questão agrário-camponesa no Brasil, ao contrário da secundarização de seu


significado a que relega a reação, os acadêmicos burgueses, os monopólios dos meios de
comunicação e os oportunistas de diferentes filiações, segue sendo central, de importância
fundamental para a solução de grandes problemas nacionais e está na base para se
alcançar uma verdadeira democracia. Não é por acaso que a luta pela terra nunca se deteve
e veio crescendo nas últimas décadas, a ponto de as próprias classes dominantes terem que
tocar a questão como ponto central em suas políticas de governo, e claro, não para alterar
em nada em relação a sua estrutura, mas como tentativa de paralisar o crescente e
combativo movimento camponês.

A crise geral econômico-social do sistema, com o avanço do capital financeiro no


campo, provocando a mais brutal expulsão de milhões de suas terras através do
açambarcamento destes para os megaprojetos de produção primária para exportação (cana,
soja, café, além de gado, florestas homogêneas e a expansão desbragada da mineração). Às
massas de camponeses pobres sem terra ou com pouca terra somam-se os povos
indígenas, remanescentes de quilombolas, dezenas de milhões acossados pela
concentração da terra em mãos de uma ínfima minoria de latifundiários e corporações
transnacionais, pelo trabalho servil e pela falta de qualquer apoio e incentivo governamental.
Esta situação agrava-se ainda mais com a aplicação continuada das políticas de “ajustes” e
liberalizações à livre ação do capital estrangeiro exigidas pelo império, aprofundam-se as
contradições de classe no campo, fazendo explodir por todas as partes do país
mobilizações, ocupações e tomadas de terras confrontadas com a perseguição do poder
judiciário, com a repressão mais brutal pelas forças policiais e militares do Estado, ataques
de pistoleiros e bandos paramilitares, com leis ambientais proibitivas. Frente a isto, os
camponeses pobres respondem de forma mais organizada, despontando como o fator mais
dinâmico e impulsionador da luta popular.

Para a grande burguesia e para os diferentes setores latifundistas a alteração da


estrutura fundiária no país é inaceitável, pois que é fator determinante como sustentáculo do
imperialismo e reprodução do capitalismo burocrático que impulsiona no país. Assim, como
sempre foi, as classes dominantes seguem empregando todas as formas de violência para
impedir qualquer reforma, seja ela a mais superficial, combinando a ação jurídica e policial-
militar do velho Estado com a dos bandos de pistoleiros e paramilitares na repressão,
assassinatos seletivos e massacres em massa. Nos últimos vinte e dois anos, mais de duas
mil pessoas, entre camponeses, advogados, religiosos, foram assassinados no campo.
Quatro massacres selvagens, Corumbiara-1995 e Eldorado dos Carajás-1996, Colniza-Mato
Grosso, 2016 e Pau D’Arco-Pará, 2017, são a demonstração mais dramática do peso que a
questão da terra tem e da centralidade da contradição entre camponeses pobres e
latifundiários na luta de classes em nossa sociedade.

Atualmente, após 13 anos e meio da gerência do oportunismo (frente eleitoreira


encabeçada pelo PT, PCdoB, PSB, etc.) aprofundou-se a aplicação das políticas “neoliberais”
ditadas pelo imperialismo, particularmente no sentido do fortalecimento do país da sua
condição de produtor de bens primários para exportação (alimentos primas in natura).

Isto acarretou um incremento na valorização das terras através do crescimento do


açambarcamento de grandes extensões para esta produção, seja despojando os pequenos
proprietários de suas terras, seja com a incorporação massiva e gratuita de terras públicas
(de 2003 a 2015 mais de 150 milhões de hectares de terras públicas foram doadas aos
latifundiários através do “Terra Legal”), significando um reforço colossal e fortalecimento da
velha classe latifundiária. Ao lado disto, e como decorrência direta, paralisou-se por
completo o já tímido programa de reforma agrária, aumentou a repressão contra o
movimento camponês combativo e desencadeou-se uma ofensiva latifundista através do
poder judiciário com ondas de despejos e revisão de decisões de “assentamentos” e
campanhas de difamação da luta camponesa pela imprensa burguesa. Em uma só frase, a
política de reforma agrária da gerência oportunista reduziu-se unicamente em repressão ao
movimento camponês combativo, além de facilitar projetos e transações do Estado com
MST e CONTAG.

Com a grave crise política que depôs por impeachment Dilma Rousseff, expressão que é
da briga das frações de classes dominantes em razão da mesma crise econômica.
Com a
posse do bandido Temer, junto ao prosseguimento da ofensiva reacionária no campo,
desatou-se a ofensiva contra os operários e demais trabalhadores assalariados com cortes
de direitos, duramente conquistados em anos de duras lutas da classe, com a aprovação
pelo congresso da “reforma trabalhista” e preparação pela aprovação da “reforma da
Previdência”, além de toda sorte de ataques contra a educação pública gratuita e outros
direitos do povo. Com a posse do bandido Temer, junto ao prosseguimento da ofensiva
reacionária no campo, desatou-se a ofensiva contra os operários e demais trabalhadores
assalariados com cortes de direitos duramente conquistados em anos de duras lutas da
classe com a aprovação pelo congresso da “reforma trabalhista” e preparação pela
aprovação da “reforma da Previdência”, além de toda sorte de ataques contra a educação
pública gratuita e outros direitos do povo. O impeachment de Dilma e posse de Temer foi a
reação do mundo político oficial contra a “Operação Lava-Jato” movida pelos guardiões
deste velho Estado, que através do Ministério Público pretendeu fazer uma faxina na
fachada de suas instituições e sistema político desmoralizados e cada vez mais sem
legitimidade alguma ante as massas populares. Tudo para tentar salvar a velha ordem de
seu colapso geral, desviando o ódio das massas contra todo este sistema de exploração e
opressão, instigando-as contra a corrupção, como se fora esta podridão a principal causa de
tanta injustiça, abusos, miséria e abandono de que padecem, bem como da rapinagem e
subjugação da nação.

A crise só fez aprofundar-se, e os massacres, chacinas, prisões e repressão brutal


contra as massas em luta pela terra e em defesa dos seus direitos pisoteados no campo e
na cidade não para, porque a farsa eleitoral se desmascarou por completo e não há outro
caminho para o povo que não seja a luta cada vez mais cruenta. As massas populares
precisam preparar conscientemente sua inevitável rebelião. Diante da crise e divisão das
classes dominantes e crescente revolta das massas, o braço armado do velho Estado, as
forças armadas reacionárias, já puseram em marcha um golpe militar contrarrevolucionário
preventivo a essa rebelião. As massas de nosso povo em geral e dos camponeses na luta
pela terra em particular, estão diante de um grande desafio.

Para dar respostas a esta questão, na luta cotidiana pela conquista da terra,
entendemos que é extremamente necessário que o movimento sindical classista, ao lado do
movimento camponês combativo, tenha uma consciência profunda sobre esta realidade
para estabelecer e desenvolver a mais profunda e sólida aliança operário-camponesa, força
determinante para realizar as grandes transformações pendentes, a começar pela questão
agrária, que as massas empobrecidas e a nossa Pátria exigem e necessitam. Para tal faz-se
necessário um exame da realidade histórica de nosso país, partindo da sua formação
econômico-social na qual o problema da terra ocupa papel central e determinante, para
fundamentar e formular um autêntico programa agrário que parta da necessidade de romper
por completo as velhas relações de propriedades da terra existentes secularmente no país e
nunca alteradas, senão sempre reforçadas e reproduzidas.

II. A sociedade em que vivemos

O capitalismo é um sistema baseado na exploração do homem pelo homem. A


sociedade capitalista está dividida em classes antagônicas e de interesses irreconciliáveis.
Fundamentalmente, a classe exploradora (a burguesia), dona dos bancos, das fábricas, das
empresas, das terras (os grandes proprietários de terras, latifundiários), que acumulam suas
riquezas explorando o trabalho da classe explorada, o operariado, ou proletariado. O sistema
capitalista é o que domina por completo o mundo hoje, e ele não é um capitalismo em geral.
Ele é o capitalismo monopolista como um sistema mundial, o imperialismo. E o capitalismo
que se desenvolveu em nosso país foi o que o imperialismo, principalmente inglês
inicialmente e depois principalmente o norte-americano, impôs na condição semicolonial do
país e apoiado na sua base semifeudal, o capitalismo burocrático. Condições particulares
importantes que determinaram o atraso e conservação de estruturas totalmente arcaicas e
retrógradas no econômico, social, político e cultural do país, vigente ao longo de mais de
século até os dias de hoje.

A partir do final do século XIX (1890 a 1900), o capitalismo passou à sua etapa
monopolista (deixou de ser um regime baseado na livre concorrência e passou a um regime
de monopólios), se transformando num sistema único internacional imperialista. Em razão
direta disto o mundo foi dividido em nações opressoras e nações oprimidas e foi repartido
entre as grandes potências. Assim, o desenvolvimento do capitalismo no Brasil se dá
apoiado sobre uma base semifeudal e sempre esteve submetido pelo imperialismo
(capitalismo monopolista) na condição de semicolônia, primeiramente pelo inglês e a partir
da Segunda Guerra Mundial pelo norte-americano principalmente.

O capitalismo surgiu em nosso país na segunda metade do século XIX e cresceu mais a
partir do início do século XX (a partir de 1901). Assim, o capitalismo surgiu no Brasil num
período em que ele já se encontrava em sua fase monopolista, ou seja, a fase imperialista.
Ele foi introduzido aqui pelo imperialismo inglês, principalmente, em aliança com os grandes
proprietários de terras (as oligarquias rurais latifundiárias) e grandes negociantes locais
importadores (burguesia comercial e compradora). Tal origem e desenvolvimento nunca
alterado radicalmente determinou que, por mais que ao longo de um século tenha se
desenvolvido o capitalismo, o Brasil continua sendo um país atrasado, submetido à
dominação estrangeira e milhões de nosso povo vivendo na miséria, doentes e analfabetos.

Assim, ainda que tenha se desenvolvido o capitalismo, ele não conduziu à


democratização sequer e minimamente da propriedade da terra, como ocorreu nos países
imperialistas: Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Inglaterra, França, Japão, etc. Ao
contrário, o desenvolvimento do capitalismo no Brasil só acentuou o monopólio e
concentração da propriedade da terra, bem como as relações atrasadas que originam e
reproduzem, ainda que muitas vezes de forma subjacente, através da evolução de suas
formas.

Atrasada, a nossa sociedade está dividida não somente em classes burguesas e


proletárias, existe a classe de latifundiários, donos de grandes extensões de milhares e
mesmo dezenas de milhares de hectares, latifúndios de tipo improdutivo e de tipo produtivo
(o chamado agronegócio) que explora e oprime os camponeses pobres. Existem ainda
setores médios que são classes de médios e pequenos proprietários (industriais,
comerciantes e fazendeiros) que compõem a média e pequena burguesia, também
oprimidas pela grande burguesia local e o imperialismo. Além do mais, existem outras
classes exploradas formadas de funcionários do setor privado e público, empregados do
comércio e dos serviços e outros, como vendedores ambulantes.

Por isto mesmo a questão da terra no Brasil está relacionada profundamente não
somente com a formação das classes sociais, como também tem determinado o tipo de
Estado burocrático, semifeudal, genocida e corrupto, necessário para a manutenção do
poder nas mãos dos latifundiários e grandes burgueses, lacaios e a serviço do imperialismo.
Desde quando aqui chegaram, os portugueses apossaram-se das terras, e para isso
fizeram o massacre das nações indígenas; depois, o rei de Portugal distribuiu terras aos
amigos e protegidos seus, através de sesmarias (grandes extensões de terras).
Imediatamente a Coroa portuguesa proibiu a posse de terra devolutas pelos pobres e, em
1850, com a Lei da Terra, o Estado instituiu que a posse de terra só seria reconhecida
através da sua compra, precavendo-se quanto à situação que já se delineava com a
inevitável abolição da escravatura e crescente ingresso no país de imigrantes pobres.

Ao longo dos anos foi se formando uma população de camponeses pobres que viviam
explorados pelos grandes senhores de terras, trabalhando como colonos, agregados,
parceiros e meeiros, etc., ao lado da escravização dos negros, que durante mais de 300 anos
foram trazidos da África, e que conformavam um sistema de servidão destinado
exclusivamente a abastecer as metrópoles européias. Com a abolição da escravatura em
1888, surge uma grande massa de alguns milhões de trabalhadores sem terras, os ex-
escravos e imigrantes pobres indesejados em seus países e empurrados para fora. Grande
parte deste contingente se embrenhou pelas profundas extensões de terras e se
estabeleceram como posseiros, e parte dos imigrantes foram absorvidos em sistemas de
colônias, principalmente na cultura do café.

Assim a luta pela terra no Brasil foi se tornando uma aguda contradição entre
camponeses pobres e o latifúndio, e, consequentemente, com seu Estado. O camponês
aspira conquistar a terra para poder tirar dela o seu sustento e nunca mais precisar de
vender, um dia sequer, a sua força de trabalho a um latifundiário. Ao latifúndio e à burguesia
em geral interessa a concentração da terra e o fracasso da pequena produção, expulsando
os camponeses da terra, gerando força de trabalho (mão-de-obra) abundante para ser
explorada no seu interesse, e uma grande e permanente massa de desempregados.
Interessa, ainda, a estas classes reacionárias a existência em determinado nível de uma
massa que vive da economia camponesa, capaz de abastecer o mercado interno de gêneros
de primeira necessidade (alimento, matérias-primas e pequenos utensílios artesanais), de
forma totalmente submetida e explorada pelo capital que a condena a uma existência
permanentemente arruinada. Esta é uma realidade nunca alterada de forma qualitativa. Nas
últimas cinco décadas, principalmente, a crescente exploração mecanizada de grandes
extensões de terra, o emprego de alta tecnologia, de sementes melhoradas, do uso intensivo
de fertilizantes e defensivos agrícolas deixaram o pequeno produtor, em sua maioria
integrado ao mercado, totalmente incapaz de concorrer com os grandes produtores, cada
vez mais formados por monopólios.

Os pequenos e médios camponeses não conseguem sobreviver num país dominado


pelos monopólios como o Brasil, a não ser na constante ruína. Toda a pequena e média
propriedade está submetida à espoliação do capital financeiro. O sistema burguês-
latifundiário protege o grande capital e o latifúndio, massacrando sistematicamente a
pequena e média propriedade e explorando e espoliando ao extremo o proletariado e as
massas populares, dentro delas o campesinato pobre sem terra. Por isto, além da conquista
da terra que vai destruindo o latifúndio, é fundamental a organização da pequena produção
em formas associativas para torná-la minimamente viável como economia de resistência.
Organizar cooperativas, grupos coletivos de ajuda mútua ou qualquer modalidade de
trabalho conjunto é fundamental para que o camponês não desista da terra conquistada e
ela não retorne às mãos do latifúndio e sirva de ponto de apoio para sustentação e
continuidade da luta.

As tarefas que correspondem às necessárias e urgentes transformações radicais no


campo, nenhum governo surgido dentro da atual ordem pode realizar. Só pode ser obra do
próprio movimento camponês organizado no seu objetivo e em aliança com a classe
operária urbana e rural. Tais tarefas programáticas implicam numa luta prolongada para ir
tomando a terra, distribuí-la aos camponeses pobres sem terra ou com pouca terra, libertar
as forças produtivas através da organização da produção de forma coletiva com base na
associação das parcelas nos vários níveis de cooperação e organizar o exercício do poder
político nas áreas tomadas e circundantes (vilarejos e pequenas cidades), fazendo dessas
vitórias novos pontos de apoio para continuar golpeando o latifúndio e todo esse sistema de
fome, miséria e exploração sustentado pelo velho Estado.

Mantendo em perspectiva a estatização das grandes empresas capitalistas rurais e a


própria “nacionalização da terra”, desenvolvendo e fortalecendo com a classe operária a
aliança estratégica, ampliando-a com os outros setores oprimidos do povo na frente única
para confiscar as terras do latifúndio parte por parte e pôr abaixo o velho Estado burocrático-
latifundiário, serviçal do imperialismo, por meio do aprimoramento da forma de luta que
mais fortaleceu a sua luta pela terra, a da guerra camponesa, para edificar o poder popular
de nova democracia como o único caminho possível para realizar a verdadeira
transformação agrária e conquistar a democracia, a justiça, terra e trabalho.

III. A luta pela terra no Brasil

A luta pela terra no Brasil vem desde a chegada dos portugueses com a revolta dos
povos indígenas em defesa de suas terras. Em seguida tivemos longos anos de resistência
dos povos trazidos como escravos da África. Eles se rebelavam e organizavam bases de
resistência e retaguarda da guerra contra os escravocratas — os Quilombos — em terras de
difícil acesso em longínquas e isoladas regiões dos domínios dos senhores de escravos.
Também para cá vieram muitos colonos europeus, alemães, italianos, poloneses que se
fixaram principalmente no sul do país e que se transformaram e se multiplicaram
rapidamente em uma volumosa massa de camponeses pobres.

Nos últimos anos do século XIX e início do XX, ocorreram muitas lutas pela terra. Elas
são conhecidas preconceituosamente como revoltas “messiânicas” por se constituírem,
aparentemente, de seguidores de “messias”. Assim foi Canudos, no sertão da Bahia (1870-
1897), que teve como líder Antônio Conselheiro e foi a mais importante luta camponesa da
época. Contestado, em Santa Catarina/Paraná (1912-1916), liderada pelo monge José Maria.
Todos esses movimentos foram ferozmente reprimidos pelo Exército Brasileiro,
transformando-se em grandes massacres de milhares de camponeses.

Depois ocorreram movimentos no nordeste, como os liderados pelo padre Cícero e


outros (Caldeirão, Pau de Colher, etc.), e surgiu também o cangaço como revolta de
camponeses contra a miséria e a violência dos “coronéis” latifundistas (nordeste) e o
jagunçado (norte de Minas, de Goiás de então e sertão da Bahia), dentre outros semelhantes
em outras regiões do país. A partir de 1940 começaram a surgir novas lutas pela terra com
um caráter político mais definido. Foram lutas principalmente de posseiros que se viam
ameaçados por grandes fazendeiros ou empresas de despojo de suas terras, após
trabalharem anos e décadas a terra ocupada. As mais importantes foram em Porecatu, no
Paraná (1950-1954) e Trombas e Formoso, em Goiás (1952-1958), que tiveram apoio e
direção do Partido Comunista do Brasil (P.C.B.).

No final dos anos de 1950 surgem várias organizações camponesas, principalmente


sindicatos e a ULTAB — União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil —
resultado de um maior trabalho do Partido Comunista junto aos camponeses. No Nordeste,
principalmente, mas não somente lá, surgem Ligas Camponesas que organizavam dezenas
de milhares de camponeses na tomada de engenhos. As Ligas Camponesas foram as mais
importantes organizações de massa de camponeses na luta pela terra. O seu crescimento
colocou a questão da reforma agrária como uma questão nacional de primeira ordem e
radicalizou a luta de classes no país com a palavra de ordem “reforma agrária na lei ou na
marra”. A grande burguesia, o latifúndio, e o imperialismo norte-americano se sentiram
gravemente ameaçados e organizaram o golpe militar de 1º de abril de 1964, destinado a
destruir as organizações populares, principalmente as Ligas Camponesas, e deter o
crescente movimento de massas reformista.

Na luta contra a ditadura militar pró-ianque, que protegia a ferro e fogo o latifúndio,
muitas tentativas foram feitas de resistência e luta armada pela terra, como foi a luta no
interior do Maranhão, na Zona da Mata, nos canaviais nos estados litorâneos do Nordeste e
na região do Araguaia, no sul do Pará. No final dos anos de 1970, a luta pela terra começa a
ter novo crescimento, com a atuação de setores reformistas da Igreja Católica (Pastoral da
Terra) e outros movimentos populares. No começo dos anos de 1980, a luta pela reforma
agrária ganha novo impulso, e muitos sindicatos de trabalhadores rurais passam a ter
direções combativas; no sul do país, surge o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra.

A luta pela terra em Rondônia: um novo capítulo

De colonização relativamente recente, Rondônia tem suas melhores terras nas mãos do
latifúndio. Atraídos pelas promessas de terras férteis e ajudas do governo, dezenas de
milhares de famílias camponesas migraram para aquele Estado. Ali chegando a grande
maioria tornou-se mão-de-obra barata para a exploração dos latifundiários. O sonho da
conquista da terra só começou de fato a virar realidade com as primeiras tomadas de terras
que aconteceram no Estado. Em todas elas tiveram que enfrentar a violência do latifúndio
através dos bandos de pistoleiros e da polícia.

O grande volume de massas camponesas pobres sem terra abandonadas à própria


sorte teve a reação imediata e preventiva dos latifundiários já escolados em massacrar
aldeias indígenas no sul de Rondônia e noroeste de Mato Grosso para se apossarem de seus
territórios. As tomadas de terra espontâneas se desencadearam. Com a violência e a
covardia do latifúndio, usando a polícia e seus bandos de guaxebas (pistoleiros funcionários
das grandes fazendas de gado), tentou-se paralisar as tomadas de terras. Foram as
agressões, os assassinatos covardes, massacres bárbaros que obrigaram o movimento a
avançar na sua organização e autodefesa. Ou seja, face à violência crescente do latifúndio e
do governo é que a defesa das massas de camponeses nas tomadas e acampamentos
exigia uma maior mobilização, organização, combatividade e coragem das suas direções.

A radicalização na luta pela terra provocou um deslinde de posições no movimento


camponês e consequentemente sua divisão em Rondônia. A cúpula do MST naquele Estado
passou a ter uma atitude vacilante e policialesca, tendo o PT se aliado com o governo do
PMDB de Valdir Raupp, hoje senador, tentando isolar os companheiros mais combativos e
adotando uma atitude conciliadora na luta pela terra. Estes companheiros, que
correspondiam às aspirações de luta das massas, foram, um a um, rompendo com aquela
cúpula vacilante e se juntaram na preparação da histórica tomada da fazenda Santa Elina,
em Corumbiara.

A Batalha de Santa Elina

A região sul de Rondônia tem as melhores e mais sadias terras do Estado. Grande parte
delas improdutivas, eram — e continuam sendo a melhor alternativa para as 40 mil famílias
de camponeses pobres da região. Já haviam ocorrido, nos anos 80 e início dos anos 90, as
tomadas vitoriosas de Verde Seringal, Vitória da União e Adriana. Continuar enfrentando o
latifúndio, encabeçado pelo coronel do exército reformado Antenor Duarte, que com seus
jagunços espalhava o terror tentando intimidar as massas e suas lideranças, exigia coragem
e combatividade. Foi isso que um grupo de companheiros demonstrou quando iniciou a
mobilização e organização de mais de 600 famílias para tomar um latifúndio, a fazenda
Santa Elina, com 18 mil hectares, no Município de Corumbiara.

Ao ser convidada para contribuir com a tomada, a direção do MST de Rondônia não só
se recusou como delatou ao governo estadual nomes de companheiros que estariam
encabeçando a mobilização. Já nesta época o PT tinha fechado acordo com o PMDB e
participava do governo de Valdir Raupp. Esta traição foi a senha para que os latifundiários
planejassem, junto com o governo do Estado, o bárbaro massacre que ocorreu a partir da
madrugada do dia 9 de agosto de 1995. Resultado, 16 mortos, 7 desaparecidos, mais de 200
companheiros com graves sequelas resultantes da selvageria desencadeada pela polícia e
vários companheiros perseguidos. O número de vítimas só não foi maior porque os
camponeses organizaram a resistência com as armas que tinham: paus, foices e
espingardas de caça.

O massacre foi uma ação intencionalmente preparada, com planejamento militar, com o
objetivo de espalhar o terror entre as famílias de camponeses e assim paralisar as tomadas
de terras dos latifúndios em Rondônia e no país. No entanto, ao contrário do que se
esperava, a repressão sangrenta gerou uma enorme solidariedade e fez explodir o ódio das
massas, levantando uma onda de novas tomadas em todo o Brasil.

Os oportunistas e conciliadores da direção do MST em Rondônia foram completamente


desmascarados e os companheiros que lideraram aquela luta passaram a ter a
responsabilidade de dar prosseguimento à luta contra o latifúndio no Estado, honrando o
generoso sangue daqueles companheiros que tombaram na luta pela terra. Alguns meses
após, mais uma derrota para os oportunistas: vitória da oposição para a direção da
FETAGRO, sendo eleitos companheiros que apoiaram a luta em Santa Elina, derrotando a
situação, apoiada por aquela direção do MST.

A luta aberta pela Batalha de Santa Elina de uma forma geral demarcou dois caminhos
no movimento camponês brasileiro e, neste sentido, se tornou um marco fundamental da
história do movimento camponês, principalmente de sua fase mais recente. Essa cisão
dentro do movimento camponês seguiu se aprofundando, não como um enfraquecimento do
mesmo, e sim, pelo contrário, como a possibilidade de desenvolvimento de um autêntico
movimento camponês combativo. Da luta de Santa Elina surgiu o MCC — Movimento
Camponês Corumbiara no propósito de seguir sustentando a herança da luta de Santa Elina.
Com o tempo a luta se instaurou no interior do próprio MCC dando curso ao processo de
depuração iniciado com a Batalha de Santa Elina. Da luta dentro do próprio MCC contra a
influência do oportunismo vertido principalmente pelo petismo e pela igreja católica e pelo
aprofundamento do movimento camponês combativo que avançava a largos passos no
Norte de Minas, surgiu a Liga dos Camponeses Pobres.

Com o surgimento das Ligas de Camponeses Pobres e sua multiplicação por outras
regiões do país, o movimento camponês entrou numa nova fase, a de desempenhar seu
papel histórico de principal força na revolução democrática que se encontra entravada no
país. O nível de organização e os métodos de luta ganharam novos contornos sob a bandeira
de "Conquistar a terra" e "Destruir o latifúndio". Novas e mais massivas batalhas são dadas
pelo movimento camponês, que enfrenta maior recrudescimento da repressão jurídico-
policial do velho Estado, da ação paramilitar dos latifundiários e das campanhas de
difamação por parte da imprensa burguesa. Também, a luta entre os dois caminhos — o de
seguir o oportunismo e a burguesia com sua “reforma agrária” a conta-gotas e o de seguir o
da luta revolucionária pela destruição de todo o latifúndio — passou a um patamar mais
avançado que coloca para curto e médio prazos o desmascaramento completo de todo o
oportunismo no movimento camponês, representado principalmente pela direção do MST,
pela CONTAG e sua estrutura de federações estaduais e sindicatos assistencialistas. E esta
é a principal vertente do movimento camponês combativo que segue se desenvolvendo e
buscando orientar-se por um programa revolucionário de transformação do agrário, um
programa que combata as influências da burguesia e do oportunismo e que contemple a
aliança operário-camponesa. Enfim, um programa em que a classe operária apoiando
objetivamente a luta dos camponeses pobres pela destruição do latifúndio seja a base para
as profundas transformações não só no campo, mas de toda a sociedade brasileira.

IV. A questão agrária

Muitos estudiosos da questão fundiária em nosso país e, inclusive, partidos políticos


que se autodefinem como socialistas e até comunistas, têm defendido que uma reforma
agrária no país não é mais necessária para resolver o problema da produção de alimentos e
de matérias primas, alegando que, hoje, a solução destes problemas está garantida com a
agroindústria, o “agronegócio”, como tanta alardeia a Rede Globo “a indústria riqueza do
Brasil”, com a aplicação de modernas técnicas, novas tecnologias e avançados
equipamentos, e que a necessidade da reforma agrária só se coloca em função do problema
social de grandes desigualdades e marginalização de milhões de brasileiros. E, portanto,
basta que seja alguma e qualquer reforma.

Tais conclusões não correspondem à realidade. Primeiro, porque a grande produção


onde se aplicam os recursos mais modernos está voltada para a exportação e com base na
monocultura, concentrada na região centro sul e centro-oeste, ocupando as melhores terras.
Segundo, que seguindo os ditames do capital monopolista, está voltada para a obtenção do
lucro máximo, e não da satisfação das necessidades do país e da população. Terceiro, que
por consequência, a tão propagandeada produção de grãos, com suas safras recordes, que
só tem resultado numa deformação da economia nacional e no aprofundamento da
dependência do país, sua relação per capita (720 kg/pessoa/ano) está muito abaixo dos
padrões internacionais. Inquestionavelmente, o abastecimento de alimentos básicos do país
é feito pelas pequenas e médias propriedades, submetidas cada vez mais à mais completa
exploração da agroindústria.

Não se trata, portanto, de realizar uma “reforma agrária” tal ou qual para desenvolver o
capitalismo no campo como sempre foi enfocado a questão agrária no país, pois o
capitalismo pelo caminho burocrático penetrava no campo mantendo as relações
semifeudais através da evolução de suas formas, tanto nas relações de propriedade da terra
quanto nas demais relações sociais e culturais delas derivadas. Ou de “nacionalizar a terra”,
tornando-as todas terras públicas para seu usufruto e não propriedade privada (estatizar), o
que asseguraria o maior impulso no desenvolvimento do capitalismo no campo, permitindo
o livre acesso à terra pela burguesia sem o obstáculo do latifundiário que cobra renda ou ter
de empacar capital na sua compra. Tampouco se trata de sua estatização para, como
difundem os oportunistas eleitoreiros que se escondem atrás da autodenominação de
“socialistas” propondo a “coletivização da terra”, enquanto na prática, apoiam e promovem
as políticas que só reforçam os latifundiários e a manutenção, em última instância, das
vigentes relações de propriedades de monopólio e concentração da terra.

A alta concentração da terra no país (1% dos proprietários detém quase 50% das terras,
enquanto que os 91% detêm apenas 20% delas) vem se acentuando e quanto mais penetra o
capitalismo no campo mais esta tendência se acelera. Inclusive, o próprio crescimento da
agroindústria não tem significado um aumento do operariado agrícola (por volta de 4,5
milhões). A utilização de maquinarias modernas têm reduzido drasticamente os postos de
trabalho, exemplo disto é a região canavieira para produção de açúcar e álcool, de Ribeirão
Preto, e o emprego crescente de formas arcaicas de exploração da força de trabalho, como
semisservil nas tradicionais culturas de café e outras.

A concentração da terra no Brasil

Tamanho da propriedade Número de


Porcentagem Área (ha) Porcentagem
(ha) propriedades
Menos de 10 ha 2.543.681 51% 7.993.969 2%
De 10 a menos de 100 ha 1.980.684 40% 63.810.646 18%
Tamanho da propriedade Número de
Porcentagem Área (ha) Porcentagem
(ha) propriedades
De 100 a menos de 1.000
420.719 8% 112.257.692 32%
ha
De 1.000 ha e mais 51.203 1% 167.227.511 48%
Total 4.996.287 100% 351.289.818 100%
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário, 2017

Por mais que a economia nacional não seja mais essencialmente agrícola, como fora
até 40 anos atrás (a produção total da agropecuária tem chegado a quase 40% do PIB), a
força de trabalho ligada diretamente à produção agropecuária ultrapassa a casa dos 50
milhões de pessoas. O país segue importando grandes quantidades de alimentos, além do
que, a aplicação de novas tecnologias, equipamentos, insumos, fertilizantes, venenos, etc.,
têm acentuado de forma exponencial a dependência do país ao capital estrangeiro, que por
sua vez passou a dominar também a agroindústria.

A concentração da terra no Brasil tem concorrido para a manutenção e agravamento da


crise econômico-social historicamente, ao constituir-se na base de sustentação desse
capitalismo burocrático, contribuindo decisivamente para a manutenção de um colossal
exército de reserva, da existência de uma economia camponesa permanentemente arruinada
que serve ao abastecimento de alimentos (reposição da força de trabalho explorada pelo
capitalista) e matérias primas à indústria e que têm sido fatores fundamentais para
obtenção de elevadas taxas de lucros pela burguesia, para a formação do capital financeiro e
hoje, mais do que nunca, como fonte geradora da massa de excluídos e de um enorme
lumpesinato. Por fim, como resultado, funciona como freio da luta operária e elemento para
sua desorganização.

A modernização da agricultura, ocorrida principalmente nos últimos 30 anos, se baseou


na grande propriedade, na monocultura e voltada para exportação (café, cana de açúcar,
soja, fumo, cacau, laranja para suco, algodão), concentrada na região centro-sul e centro-
oeste, em torno da área mais industrializada do país, aumentando a concentração da terra e
expulsando, por diferentes formas, o homem do campo. Além do que, a utilização crescente
da mecanização, automação, sementes melhoradas e o emprego sistemático de adubos,
fertilizantes e diferentes tipos de venenos aumentou violentamente a dependência
estrangeira, já que a indústria estatal e nacional da petroquímica, de máquinas e
implementos, ou foram privatizadas e entregues aos monopólios, ou liquidadas por
completo, reinando livremente as Monsanto, Cargill, Agroceres, Massey Ferguson, etc.

A violência do latifúndio

Consequentemente a concentração da terra tem sido historicamente a causa principal


da aguda desigualdade social de extrema miséria de milhões de famílias de camponeses, do
inchaço das grandes cidades, da marginalização, fome, miséria e violência permanente que
se abate sobre os pobres do campo. Na luta de resistência contra a sua expulsão da terra ou
pela conquista dela, os camponeses enfrentam a mais sistemática e prolongada violência
desatada pelo velho Estado reacionário brasileiro e pelos bandos paramilitares dos
latifundiários, com o acobertamento criminoso “Justiça”, na mais descarada impunidade que
açula ainda mais a selvageria das classes dominantes.

Como demonstra o quadro abaixo, a violência com mortes segue aumentando ao longo
das últimas décadas, o que revela a intensificação da ação repressiva do velho Estado,
combinado com o braço armado do latifúndio, como ocorreu no massacre de Corumbiara,
Eldorado dos Carajás, entre outros, onde o despejo foi realizado por tropas da PM
juntamente com pistoleiros, que inclusive utilizaram fardamento da polícia. Os oito anos de
governo de FHC e de Luiz Inácio, à parte da grande publicidade sobre reforma agrária,
revelam-se como meras gerências administradoras do velho Estado de grandes burgueses e
latifundiários, que a ferro e fogo tem sabido muito bem zelar pelos interesses da reação.

Violência no campo no Brasil

1976 a 1991 Mais de 1000 assassinatos


1991 a 1995 268 assassinatos
1995 a 2002 292 assassinatos
2003 a 2013 402 assassinatos
2013 a 2017 251 assassinatos*
Dados aproximados — fonte: imprensa nacional, CPT

Todo este quadro se constitui como fator fundamental na engrenagem do sistema


dominado pelo capital financeiro internacional, mantendo o país num permanente
redemoinho de crise econômica, aprofundando de forma assustadora a crise social, com
fome para milhões, miséria, violência e morte. Portanto, a questão agrária é uma questão
central e de importância fundamental não só para os camponeses, mas para todos os
trabalhadores, para os setores médios e para a independência e progresso da Nação.

Os 4 pilares fundamentais das transformações do agrário brasileiro

Ademais de partir das reivindicações imediatas e gerais dos diferentes setores de


trabalhadores rurais, pequenos produtores e assalariados, temporários (como os bóias-
frias) donde imperam tanto, sob denominação formal de assalariamento, variadas formas de
relações servis e semisservis (relações tratadas pela legislação do velho Estado por
“análoga ao trabalho escravo”), questões já presentes no programa geral de resistência dos
trabalhadores, considerando que o problema fundamental e basilar do agrário é a questão da
propriedade da terra, o programa agrário para realizar as transformações radicais exigidas
supõe a destruição total do latifúndio e entrega imediata de parcelas da terra aos
camponeses pobres sem terra ou com pouca terra. Para conquistar este objetivo os
camponeses só podem contar com suas próprias forças, em primeiro lugar, e com o apoio
decidido da classe operária urbana e rural. Esta é uma luta radical que não tem espaço para
conciliações, é em si uma questão política e de poder. Nas condições históricas e atuais de
organização dos camponeses pobres, esta conquista torna-se completamente impossível
ser realizada da noite para o dia, e demandará um longo tempo e prolongado processo. Os
camponeses, por isto mesmo, não devem renunciar a este programa em troca das
promessas e migalhas ofertadas pela burguesia e os oportunistas com suas reformas
agrárias de faz de conta. Devem lutar desde já, como estão fazendo, pela aplicação deste
programa nas áreas tomadas do latifúndio, até que com a completa conquista em todo país
das grandes transformações democráticas seja finalmente concluído, dando início a uma
nova etapa de total nacionalização, estatização e coletivização das terras defendidas e
aplicadas pelo próprio movimento camponês.

1 — destruição do latifúndio e entrega das terras aos camponeses pobres sem terra ou
com pouca terra;

2 — libertação das forças produtivas do campo nas áreas tomadas do latifúndio, através
da eliminação de todas as relações de produção baseadas na exploração do homem com a
adoção de formas cooperadas. A organização em formas associativas das parcelas em
diferentes níveis de cooperação segundo sua experiência, desde os Grupos de Ajuda Mútua,
forma elementar a formas superiores de cooperação, passando por outros níveis de formas
cooperativas. Adoção de meios de produção e instrumentos de trabalho mais avançados e
das técnicas mais modernas.

Organização cooperada do sistema de produção, distribuição, comercialização,


abastecimento e troca entre as diversas áreas e regiões, da infra-estrutura como armazéns,
transporte, estradas, pontes, saneamento básico, etc.;

3 — organização e exercício do Poder político das massas nas áreas tomadas.


Organização das diversas formas da participação das massas nos diferentes níveis para a
tomada de decisões e embrião do seu autogoverno (Assembleia Popular e o Comité
Popular). Organizar a vida cultural, suas diversas manifestações. Organizar o sistema de
autodefesa de massas. Organizar a nova Escola Popular baseada nos três princípios de
estudar, trabalhar e lutar (investigação científica, produção e luta de classes) para liquidar o
analfabetismo e promover a elevação do conhecimento científico e técnico de todos.
Organizar um sistema popular de saúde preventiva e curativa (policlínicas);

4 — defesa desde já da futura estatização das grandes empresas capitalistas rurais e


controle de sua produção e gestão pelos trabalhadores quando se estabelecer o novo Poder
nas regiões que estas se acham instaladas.

V. A questão indígena e quilombola

O problema indígena em nosso país se insere no conjunto dos grandes problemas


nacionais e democráticos. Para compreendê-lo corretamente, se faz necessário
investigações e estudos sobre o mesmo. No entanto, não poderíamos desde já deixar de
tomar uma posição clara frente a ele. Reconhecemos no problema indígena não uma mera
questão de direito à demarcação de terras. A questão indígena, questão dos povos
originários destas terras, é um problema de nacionalidades e hoje, mais que nunca, é o
problema de minorias nacionais oprimidas pelo velho Estado brasileiro de grandes
burgueses e latifundiários serviçais do imperialismo. As populações indígenas que se
somam hoje mais de 700.000 resulta de uma longa heróica e trágica resistência contra a
cultura de dominação, exploração, destruição e genocídio dos brancos colonizadores,
grandes senhores de terras indevidamente apropriadas, grandes comerciantes, grandes
burgueses e imperialistas. Sustentamos em nosso programa agrário e na luta por uma nova
democracia o direito inalienável de autodeterminação das nações indígenas. Empenhamos
nossos esforços para integrar nossa luta pela terra e pela nova democracia com a luta
indígena, a qual passa pelo rechaço à intervenção e controle exercido pelo velho Estado
através de seu instrumento de tutela a Funai, bem como as intervenções de instituições
religiosas e ONGs, nacionais e estrangeiras, que em nome da “defesa dos povos indígenas”
buscam traficar com seus interesses e servir a interesses escusos e das potências
estrangeiras.

Partindo do reconhecimento de que são povos originários destas terras, sendo assim
comunidades de mesma língua, cultura, costumes e psicologia habitando um mesmo
território, constituem-se, portanto, nacionalidades em conformação que passaram à
condição de nacionalidades oprimidas no curso dos últimos 500 anos. Inicialmente através
do processo de conquista (genocídio), em que o branco colonizador se impôs e adonou-se
dos territórios que vieram a compor o Brasil enquanto um novo país e na continuidade do
genocídio com o advento e conformação do Estado brasileiro já na era do colonialismo
modemo capitalista, o imperialismo. Assim como também os brancos pobres e explorados,
os trabalhadores, são povos oprimidos por este Estado fundado pelos colonizadores
portugueses (Brasil colônia) e logo explorados por potências estrangeiras, monopólios e
capital financeiro (Brasil semicolônia), os povos indígenas também seguiram sendo
oprimidos por este mesmo velho Estado.

Da mesma forma defendemos incondicionalmente a reivindicação histórica das


comunidades remanescentes de quilombolas pelas terras que, em sua resistência contra a
escravidão e logo contra todas as formas de exploração, segregação, preconceitos e
racismo, territórios onde construíram seu modo de vida. As comunidades remanescentes de
quilombolas, expressão mais tradicional da resistência cultural do povo preto, sempre
marginalizadas e alvo de permanente pressão e despojo de suas terras tiveram, nos anos de
gerenciamentos do oportunismo, ao mesmo tempo de um impulso em sua mobilização em
defesa da demarcação e regularização de “territórios” reivindicados, uma institucionalização
que conduziu à sua corporativização, dependência e subordinação ao projeto político
petista.

Na busca do total controle por parte do velho Estado, suas políticas, com a iniciativa dos
governos do oportunismo, fazendo-se passar por “grande conquista”, estabeleceu a
homologação de “territórios quilombolas” na condição de posse para usufruto coletivo,
subordinada à reacionária legislação sobre o uso do subsolo, equivalente à tutela que se
impõe às terras indígenas. A tradição de luta das comunidades quilombolas caminharam ao
lado, semelhante e simultaneamente com a luta dos camponeses pobres no apossamento
das terras legalmente da União, em diferentes fases históricas. Ademais de que a imensa
maioria do campesinato brasileiro ser composto por pretos e pardos e mesmo muitas
comunidades remanescentes de quilombolas que mantiveram-se mais fechadas, isto nunca
foi base para conflitos e hostilização, mesmo que o racismo, muitas vezes velado, nunca
tenha sido superado.

A partir do reconhecimento desta condição dos povos indígenas e das comunidades


quilombolas verificamos que estes e todo o restante do povo brasileiro têm um inimigo
comum, o velho Estado de grandes burgueses e latifundiários serviçais do imperialismo. As
causas de cada um são parte integrante da luta de libertação de nosso povo e nossa pátria.
A frente única revolucionária baseada na aliança operário-camponesa tão fundamental para
a luta e seu triunfo não poderia ser de todo democrática, popular e revolucionária se não
abarcasse os povos indígenas e sua demanda histórica, seu direito à autodeterminação, bem
como das reivindicações das comunidades quilombolas. Tal aliança se fundamenta como
necessidade de uma frente única revolucionária em cujo programa se inscreve e realiza com
a construção de um novo Estado democrático, popular e revolucionário. Somente com base
no reconhecimento do direito à autodeterminação dos povos indígenas, que de forma
democrática, com autodecisão e autoconsentimento poderá se realizar; tal realização por
sua vez só é possível numa República de Nova Democracia.

VI. O caminho da revolução agrária

A Liga dos Camponeses Pobres luta para destruir o latifúndio, única via de garantir a
terra para os camponeses pobres e de impedir que a pequena e média propriedade rural
continuem sendo massacradas pelos latifundiários e pelo governo. Esta luta pela terra
atinge diretamente o governo.

O latifúndio faz parte do bloco de classes que dá sustentação ao poder burguês e à


política oficial para o agrário, bem como as instituições (Ministério do Desenvolvimento
Agrário, INCRA, etc.) e órgãos técnicos (Embrapa, Emater, etc.) são para atender e viabilizar
seus interesses. A luta radical contra o latifúndio e pela sua completa destruição, conduz
inevitavelmente ao choque com as classes dominantes em seu conjunto e com os
interesses do imperialismo, que se expressa no confronto direto com o aparelho repressivo
jurídico e policial-militar do Estado.

A revolução agrária é a bandeira em torno da qual mais setores da sociedade podem se


aglutinar. Nesta luta os camponeses têm como aliados os operários, estudantes, intelectuais
honestos, os setores médios, pequenos e médios comerciantes e as massas populares da
cidade e do campo.

O velho Estado e suas diferentes gerências independentes de qual partido ou coligação


de partidos seja (PFL, PMDB, PSDB, PT, PTB, PCdoB, PP, PL, PSB, PDT, PPS, etc.) enfrentam a
luta dos camponeses de duas maneiras e da combinação delas: pela repressão e pela
cooptação. Uma hora usa a violência contra os camponeses em luta, em outra hora propõe
negociações e entendimentos, apresentando políticas e programas de “reforma agrária” só
para publicidade. O governo busca com isto frear a luta pela terra, tentando isolar os setores
mais combativos e cooptando os setores conciliadores e oportunistas do movimento.

Como comprova a história da luta dos camponeses no país que só com as formas
violentas de luta conquistaram a terra, ainda que não puderam sustentar e mantê-las, as
lutas recentes têm mostrado que para conquistar a terra e desenvolver formas que
assegurem sua conquista é necessária uma organização cada vez maior dos camponeses,
dando particular atenção ao sigilo dos planos das tomadas e à organização da autodefesa
ativa. E o que se apreende de experiência numa tomada, seus erros e acertos devem ser
utilizados como base para a continuidade da luta.

VII. A LCP: princípios, objetivos, organização e formas de atuação

A construção da LCP

Surgido do processo de depuração no movimento camponês, as Ligas de Camponeses


Pobres tem sido resultantes e continuação das históricas lutas pela terra no país de uma
forma geral e particularmente da luta combativa dos camponeses de Rondônia, desde os
anos de 1970, cujo desenvolvimento culminou com a histórica Batalha de Santa Elina que,
em agosto de 1995, estabeleceu um divisor de águas e uma nova fase na luta pela terra não
só em Rondônia, mas também de todo o país.

Desde este crucial momento as LCP vem lutando para superar os obstáculos que se
apresentam no caminho da luta pela terra, bem como travando uma tenaz luta contra o
oportunismo no meio do movimento camponês em geral e particularmente de organizações
que buscam arrastar o movimento para a conciliação, para o colaboracionismo e para servir
de instrumentos para projetos políticos pessoais.

Ao longo destes dezesseis anos a LCP, enfrentando toda sorte de dificuldades, de


ataques por parte da direita e dos oportunistas, enfrentando a perseguição de seus líderes
pela Justiça, polícia e pistoleiros, enfrentando as intrigas e difamações pelo governo e a
imprensa burguesa, não tem se cansado de lutar e tem ativa participação na luta popular no
país.

As LCP tem buscado, a despeito de suas dificuldades e defeitos, realizar inúmeras


atividades internas de formação e de luta contra os vícios para avançar sua organização, os
dirigentes e militantes de base. A LCP tem considerado como principal debilidade a ser
superada as atividades pós-tomada de terras, de maior integração, organização e atividades
produtivas nas áreas tomadas (mesmo naquelas reconhecidas pelo INCRA denominadas de
Projetos de Assentamentos). Um melhor e mais eficiente trabalho nas áreas tomadas é o
desafio principal e constante. Outros problemas como os de organização nos vários níveis e
esferas, finanças e formação, também são importantes tarefas para a construção e
desenvolvimento das LCP.

VIII. O Programa Geral das Ligas dos Camponeses Pobres

Por que e por quem lutam as LCP


As LCP lutam por destruir o latifúndio como única via para realizar uma verdadeira
transformação agrária, para entregar a terra a quem nela trabalha, entregar a terra aos
camponeses pobres sem terra ou com pouca terra e organizá-los de forma a avançar para a
compreensão de que, somente através das formas coletivas de trabalho — na produção,
armazenamento, comercialização, saúde, educação e organização social — será possível
viabilizar a seu progresso frente a dominação do capital monopolista. Ao lado de definir
como objetivo principal imediato a conquista da terra, as LCP levantam também a luta
reivindicativa por créditos para os pequenos proprietários e por organizá-los em
cooperativas, ajudando-os a avançar sua consciência para a coletivização. Lutam por uma
nova política agrícola voltada para ampliar a produção voltada fundamentalmente para
melhorar as condições de vida dos trabalhadores do campo, da cidade, da população em
geral e dos interesses da nação. As LCP lutam para defender todos os trabalhadores
assalariados do campo e por conformar com eles e os da cidade para conquistar melhores
condições de vida e trabalho.

Criar os Comitês da Revolução Agrária no campo para organizar impulsionar e


centralizar a aplicação do seguinte programa:

1 — Fim do latifúndio, a terra para quem nela trabalha;

2 — A terra com destinação social segundo os interesses da imensa maioria do nosso


povo e dos interesses nacionais;

3 — Nacionalização da terra e estatização das grandes empresas capitalistas rurais, em


perspectiva;

4 — Por nova política agrícola e de créditos voltada para viabilizar os pequenos e médio
proprietários;

5 — Criação de agrovilas e promoção da agroindústria em toda região rural do país;

6 — Criação do sistema de saúde dotado de toda infra-estrutura no campo;

7 — Criação do sistema de educação centrado na concepção da Escola de novo tipo


vinculada à produção e a luta de classes;

8 — Organização social e política independente baseada na democracia direta das


Assembleias Populares;

9 — Política especial para a região de seca (semi-árido) região nordeste;

10 — Política especial para a região amazônica, fim da exploração predatória e


fortalecimento da produção agrícola segundo as vocações do meio geográfico, os
interesses das massas trabalhadoras e da Nação;

11 — Apoio à luta dos trabalhadores da cidade, desenvolver e fortalecer a aliança


operário-camponesa;

12 — Reconhecimento e apoio ativo à autodeterminação das nações e povos indígenas;


13 — Fortalecimento e desenvolvimento ideológico-político das massas voltadas à
coletivização da terra em perspectiva;

14 — Por uma nova economia, uma nova cultura, uma nova política de nova democracia
e um novo Poder Democrático Popular;

15 — Solidariedade internacionalista com a luta dos povos contra o imperialismo e pelo


progresso.

Ressalta-se que os pilares fundamentais do Programa Agrário que orientam e


submetem todas suas tarefas e já mencionados anteriormente são:

1 — destruição do latifúndio e entrega das terras aos camponeses pobres sem terra ou
com pouca terra;

2 — libertação das forças produtivas do campo nas áreas tomadas do latifúndio, através
da eliminação de todas as relações de produção baseadas na exploração do homem com a
adoção de formas cooperadas. A organização em formas associativas das parcelas em
diferentes níveis de cooperação segundo sua experiência, desde os Grupos de Ajuda Mútua,
forma elementar a formas superiores de cooperação, passando por outros níveis de formas
cooperativas. Adoção de meios de produção e instrumentos de trabalho mais avançados e
das técnicas mais modernas.

Organização cooperada do sistema de produção, distribuição, comercialização,


abastecimento e troca entre as diversas áreas e regiões, da infra-estrutura como armazéns,
transporte, estradas, pontes, saneamento básico, etc.;

3 — organização e exercício do Poder político das massas nas áreas tomadas.


Organização das diversas formas da participação das massas nos diferentes níveis para a
tomada de decisões e do seu autogoverno (Assembleia Popular e o Comité Popular).
Organizar a vida cultural, suas diversas manifestações. Organizar o sistema de autodefesa
de massas. Organizar a nova Escola Popular baseada nos três princípios de estudar,
trabalhar e lutar (investigação científica, produção e luta de classes) para liquidar o
analfabetismo e promover a elevação do conhecimento científico e técnico de todos.
Organizar um sistema popular de saúde preventiva e curativa (policlínicas);

4 — Estatização das grandes empresas capitalistas rurais e controle de sua produção e


gestão pelos trabalhadores desde já nas áreas tomadas.

Os objetivos de curto, médio e longo prazos das LCP

A curto e médio prazos as LCP lutam por desenvolver sua organização para transformá-
la num grande movimento das massas camponesas em todo país, buscando unir-se com
todas as organizações populares, combativas, ajudando a construir a aliança operário-
camponesa e fazer avançar a luta pela terra, pela democracia e pela justiça em todo o país.
A longo prazo as LCP têm como objetivo fortalecer a luta contra todo o sistema
burguês-latifundiário serviçal do imperialismo, pela sua destruição e pelo estabelecimento
do poder popular para edificar uma democracia nova, conquistar a independência e
progresso da Nação e do nosso povo, construindo a sociedade socialista.

IX. O trabalho de massas da LCP

As LCP partem do princípio de que o centro de tudo são as massas, são elas que
decidem tudo, são elas que fazem a história. A luta só tem sentido se está centrada nas
massas como forças fundamentais para resolver seus problemas, para conquistar e realizar
seus amplos interesses. A razão de ser da luta parte da existência das massas nas duras
condições em que vivem.

Para realizar os interesses das amplas massas populares é indispensável que elas se
organizem cada vez mais adquirindo consciência profunda dos seus problemas e das
formas justas de resolvê-los. Nada nem ninguém poderá resolver os problemas das massas
a não ser elas mesmas. Só as massas podem transformar a realidade.

As LCP são um processo de construção de uma organização das massas camponesas


pobres do nosso país. É um movimento de massas que luta pelos interesses econômicos,
sociais, políticos e culturais dos camponeses, principalmente os camponeses pobres. Por
mais que possa avançar uma direção, ela tão somente poderá auxiliar como força dirigente,
pois a força para mover obstáculos, desimpedir o caminho e transformar a realidade, só as
massas a possuem e só elas podem realizar. Por isto as LCP propõem a seus ativistas unir-
se com a maioria das massas, viver como elas, aprender com elas e servir a elas.

Exatamente por isto a razão de existir das LCP só tem sentido realizando um
permanente e paciente trabalho entre as massas. Este trabalho não pode ser qualquer um,
tem que ser de um determinado tipo, ou seja, classista, que se processe nas esferas política,
ideológica, cultural e orgânica, obedecendo a etapas diferentes para seu desenvolvimento:
antes da tomada da terra, durante a tomada e, após a conquista da terra, na organização da
vida na área tomada.

De um modo geral o trabalho de massas nas suas distintas etapas deverá no plano
político levantar as reivindicações mais sentidas, apontar a origem do sofrimento do povo,
as causas que provocam e mantêm o povo na miséria e debaixo da opressão, denunciando
os diferentes governos como governos de plantão da grande burguesia e do latifúndio a
serviço do imperialismo.

Denunciar suas políticas, tal como vem ocorrendo na etapa atual com a chamada
política “neoliberal” iniciada pelo governo Collor de Mello e por FHC e aprofundada aos
extremos por Luiz Inácio, que seguindo os ditames do capital financeiro internacional e as
ordens do Estados Unidos completam a desnacionalização da economia e entrega do nosso
país através de leiloatas das Estatais que chamam de privatizações, liquidando o resto de
soberania destroem a indústria nacional e arruina a agricultura com as altas taxas de juros,
impõem um desemprego cruel semeando a fome e a miséria por todos os lados, sucateiam
os serviços públicos como de saúde, educação e de seguridade social, promovem
“reformas” para retirar direitos históricos adquiridos pelos trabalhadores através de muita
luta e sacrifícios e avassalar o país à sanha das potências estrangeiras e de seus
monopólios.

Para aprofundar o trabalho de massas na esfera política é necessário esclarecer estas


questões para levantar o combate contra tal política, defendendo uma nova política
econômica voltada para os interesses da imensa maioria do povo brasileiro e de defesa dos
interesses e soberania nacionais.

No ideológico, apontar que este sistema de exploração e opressão é o sistema


capitalista mundial, o imperialismo que mantém no poder dos países dominados as classes
reacionárias com um sistema de capitalismo burocrático que lhes servem e o velho Estado
burocrático-latifundiário, que só espalha fome, doença, morte, ódio, egoísmo, injustiça e
opressão para a esmagadora maioria da população. Mostrar que a altemativa é de classe, é
o socialismo, sistema social dos trabalhadores e que para atingi-lo é necessário construir a
aliança operário-camponesa, desenvolvendo a luta radical contra o latifúndio, a grande
burguesia e o imperialismo a quem servem, para destruir seu sistema podre, conquistar o
poder popular que assegure a construção da nova sociedade.

Além do que é decisivo, para fortalecer o trabalho ideológico de massas, educar-nos


todos do ponto de vista de classe, difundir a ideologia da classe operária, termos claro o
papel do Estado como instrumento de dominação e violência da burguesia, do latifúndio e do
imperialismo. Educar as massas na luta contra o aparelho policial-militar e judicial.
Desenvolver e encarnar os símbolos da luta como a bandeira vermelha do movimento, as
canções combativas e o seu Hino.

No cultural, desenvolver a luta contra a cultura apodrecida que o latifúndio, a burguesia e


o imperialismo dissemina para manter sua dominação, cultura do individualismo, egoísmo,
consumismo e de destruição dos valores humanos, além de esmagar toda manifestação da
cultura nacional e popular, impondo uma verdadeira lavagem cerebral através do controle
dos meios de comunicação de massas e da difusão de músicas, novelas, publicações,
verdadeira pornografia cultural. Desenvolver e promover a cultura popular, principalmente
com a música, a dança e o teatro e estimular, organizar e desenvolver a educação física e as
diversas modalidades de esporte.

No orgânico, desenvolver pacientemente a organização baseada na democracia popular,


fortalecendo o trabalho de base como elemento determinante e a promoção permanente da
participação cada vez maior das massas nas instâncias de direção. A criação e
fortalecimento de núcleos e grupos de base é fundamental para assegurar um maior
enraizamento do movimento, além de intensificar a sua participação nas comissões para
diferentes assuntos, elevando assim o compromisso e a consciência política das massas.

Desenvolver e estimular a organização das mulheres, da juventude e das crianças,


construindo-se para isto organizações específicas que possam zelar pela maior atividade
destes setores. Difundir a importância da disciplina, da conduta correta perante o inimigo e a
vida de uma forma geral.
A vida nos Acampamentos e nas Áreas conquistadas

O período de acampamentos e seu regime que impõe muitas restrições devem ter a
menor duração possível. O objetivo do movimento não é o acampamento, ele é uma
necessidade, porém é uma fase transitória. De uma forma geral a vida nos acampamentos e
nas áreas tomadas têm que ser regulada por um conjunto de normas que são aprovadas
pela Assembleia Geral do Acampamento e da Área, segundo as definições disciplinares do
movimento. Especificamente durante o período de acampamento vigorará o regime com
normas disciplinares definidas pelo movimento. Já nas áreas, o regime deve ser definido e
aperfeiçoado permanentemente pela Assembleia Popular. A vida nos acampamentos e
áreas deve estar regulada por direitos e deveres aplicados a todos e o seu processo de
definição tem que passar por amplas discussões com as massas.

Para assegurar uma maior organização da vida nestes locais, o conjunto da massa
deverá fazer parte de uma das comissões encarregadas das distintas atividades que dizem
respeito ao seu funcionamento, tais como:

A distribuição de atividades e responsabilidades nos acampamentos:

coordenação do acampamento;
segurança;
cozinha coletiva;
limpeza e condições sanitárias;
arrecadação de agasalhos e alimentos;
agitação (assembleias, festas, atos, manifestações);
finanças;
educação;
saúde;
cultura.

No caso das áreas conquistadas, devem se reproduzir o mesmo nível de organização,


no entanto é necessário observar o grau de desenvolvimento da consciência das massas, as
particularidades de cada área no objetivo de estar constantemente buscando elevar o nível
de organização, para que o máximo de membros daquela área tenha a mais efetiva
participação da vida coletiva.

A questão da produção

A luta pela produção é o objetivo mais imediato e importante para as massas e é


decisiva para assegurar o desenvolvimento e sustentação da luta pela terra. Toda a nossa
atividade deve ter como base o trabalho de organizar e viabilizar a produção. As massas
lutam por possuir um pedaço de terra para organizar a sua vida e a de suas famílias, assim
sendo, lutam inicialmente pela posse individual da terra. As LCP reconhecem e apoiam este
direito das massas e lutará para mostrar-lhe que frente à existência do latifúndio e do
monopólio da terra, a pequena produção individual é muito difícil de se viabilizar e de uma
forma geral reforçam a ideologia burguesa da propriedade sobre meios de produção e
exploração do trabalho. Deve-se mostrar que o caminho para enfrentar ambos problemas é a
cooperação, iniciando pelas formas mais simples da Ajuda Mútua na produção, desenvolvê-
la em formas superiores e mais avançadas de cooperativização, tendo como perspectiva
futura a coletivização completa no campo.

Mas só a prática, através da persistência na experiência concreta no longo prazo,


poderá levar as massas a compreender que a coletivização é a única alternativa. Para isto é
necessário estimular, todo o tempo e de forma paciente, formas de trabalho coletivo,
associação das parcelas particulares para produção e distribuição/comercialização
coletivas. No entanto, é determinante compreender que é necessário ajudar os que ainda
não compreendem e não aceitam estas formas, estimulando-os sempre a se organizar em
cooperativas e associações de ajuda mútua, debatendo permanentemente as diferenças e
vantagens entre umas e outras formas.

Realizada a tomada é decisivo iniciar os trabalhos de roças coletivas, procurando


fortalecer ao máximo a autossustentação de cada acampamento. Durante o período de
acampamento, temos de lutar para que todas as formas de organização se realizem de
forma coletiva, particularmente a produção. Na esfera da produção o movimento tem como
objetivo estimular e avançar ao máximo a viabilização dos processos coletivos de produção,
mas sem de modo algum impô-los às massas. Os mesmos esforços e objetivos são
necessários à comercialização da produção.

Educação e saúde

Na vida diária dos acampamentos e assentamentos devemos trabalhar duramente por


solucionar os problemas de educação e de saúde. As comissões responsáveis devem
assumir a iniciativa de não permitir que estas questões fiquem em segundo plano. Lutar para
arrancar do governo as condições para funcionamento da escola regular nestas áreas é
decisivo e importante por duas razões: Primeiro, por assegurar a permanência das famílias
que têm filhos na idade escolar; segundo, para garantir a educação regular de todas as
crianças como um direito fundamental e necessário para seu desenvolvimento. O
movimento deve lutar para ganhar a simpatia de professores para aplicar a concepção da
escola de novo tipo do ensino ligado à produção e à luta de classes, segundo os objetivos do
movimento. Enquanto não se obtenha este objetivo em cada área deve de imediato ser
organizada a Escola da Família Camponesa, de mesma concepção só que totalmente
sustentada pelos próprios camponeses de cada área. Alfabetizar e elevar a escolaridade de
crianças, jovens e adultos é de vital importância para o movimento e para a luta.

Da mesma forma, a questão de saúde deverá receber a mesma atenção, buscando


viabilizar postos de saúde e periódica visita de profissionais nas áreas, dando atenção
especial aos problemas da saúde de mulheres e crianças. É de grande valia a organização
de campanhas e de ações de prevenção a doenças.

Contribui para a organização e o bem estar geral do acampamento e das áreas tomadas
a execução e manutenção da limpeza geral, assegurando as condições necessárias à
higiene coletiva, bem como de serviços que melhorem o saneamento (água e esgoto). Para
executar tais atividades é extremamente importante a preparação do máximo de promotores
de saúde.

Esporte, lazer e cultura

Estimular, organizar e promover ao máximo as atividades esportivas, de lazer e de


cultura (artes e literatura) para assegurar um completo e sadio desenvolvimento das
massas, particularmente à juventude e às crianças. Tais atividades são determinantes
também para estimular os jovens a não se afastarem dos acampamentos, das áreas
tomadas e da própria luta pela terra e pela nova sociedade.

A justa conduta moral

Uma das mais importantes lutas que tem que ser travadas cotidianamente no interior do
movimento, dos acampamentos e áreas é por animar a todos ao esforço por adotar uma
conduta correta, como fator determinante para destruir-se toda a podridão da moral
burguesa hipócrita, individualista, egoísta, desonesta e corrupta. A luta por nossos objetivos
maiores só poderá triunfar se construirmos desde já uma nova forma de convivência e
relacionamento baseados no coletivismo.

Combater todas as atitudes incorretas, não acobertá-las, não conciliar com condutas
levianas, malandras, espertas, sabidas, desleais e desagregadoras, partam elas de quem for,
é a luta principal que podemos realizar para forjar a moral e confiança coletivas e o
crescimento de cada um. Praticar de forma sistemática a crítica e autocrítica é o modo
correto de combater as mazelas que a sociedade burguesa faz penetrar em todos nós. A
sociedade pela qual lutamos e sonhamos um dia realizar, o socialismo, é feita de
fraternidade e solidariedade coletivas e desde já temos que praticá-las. Lutemos para
transformar nossa organização em embriões da sociedade futura.

Uma das questões a destacar-se nesta luta é o enfrentamento do problema do


alcoolismo e das demais drogas. Todos sabemos o quanto é destruidor para os seres
humanos do ponto de vista da saúde física e mental e da vida social e familiar. A sociedade
capitalista estimula e facilita a utilização das drogas por duas razões: a primeira é que ela
representa um fabuloso negócio onde se lucra bilhões de reais; a segunda, é que a droga, o
alcoolismo são instrumentos eficientes para afastar as massas da compreensão real dos
seus problemas, tornando-as apáticas e descrentes, facilitando sua exploração e
dominação.

Relação com os órgãos do Estado


Na luta contra o velho Estado, seja por arrancar as reivindicações mais exigidas pelas
massas ou de construção de nossa organização, temos que nos defrontar com seus órgãos
federais, estaduais e municipais. Toda a política dos diferentes governos não tem por
objetivo atender nenhum dos nossos interesses, ao contrário, o velho Estado, através dos
seus gerentes de turno, procura desmoralizar-nos e destruir nossa luta. Em nossas relações
com os órgãos governamentais devemos nos manter sempre vigilantes e alertas. O inimigo
utiliza estes relacionamentos para tentar atingir seus objetivos.

Quando o governo demonstra atender uma exigência, não podemos confiar em


promessas e alardear vitória. O inimigo é traiçoeiro e utiliza desse lero-lero para desacreditar
a liderança perante as massas. Não confiar, não acreditar, só realizar entendimentos que
sejam corretos às claras e na presença das massas, pressioná-los todo o tempo, é a nossa
tarefa. É preciso ter em conta que a chamada “negociação” é um artifício que os
exploradores desenvolveram para destruir as organizações populares combativas. As
“negociações” aparecem nos momentos de conflito como instrumento para desestabilizar a
posição de força que um movimento desenvolve e que ameaça o poder dos exploradores. É
necessário que todos sejam muito bem preparados para os embates contra as formas duras
(repressão) e as formas brandas (negociações) empregadas pelos nossos inimigos.

Relação com as ONGs

Questão em que se deve ter a maior atenção é a possível relação com as ONGs —
organizações não governamentais — que a cada dia proliferam por toda parte. No caso das
regiões amazônicas elas existem aos milhares. Grande parte destas instituições são
instrumentalizadas desde o estrangeiro, são financiadas por instituições do imperialismo
destinadas a corromper, domesticar e destruir as organizações combativas dos povos dos
países dominados. Em relação às ONGs no seu conjunto devemos ter uma posição de
vigilância a seu respeito.

As ONGs não têm surgido pelos objetivos que se autoproclamam. Trata-se de uma
política deliberada em escala internacional, voltada principalmente para interferir nos países
dominados, como é o nosso. Esta política tem por objetivo envolver as “comunidades
carentes”, as “minorias”, como os indígenas, os de defesa de “gênero” (mulher), “proteção
ambiental” como “defesa da floresta amazônica”, etc. Estas organizações aparecem com
muitos recursos financeiros e passam a financiar projetos de saúde, de desenvolvimento
agrícola, de produção, de preservação ambiental, de defesa dos direitos humanos, etc.

Esta é uma política destinada a criar toda uma estrutura paralela ao Estado, enquanto
este vai se desobrigando através das “reformas” que promovem os governos. Esta é uma
estratégia do capital internacional para retirar do Estado qualquer atividade de serviços
públicos em favor do povo. Posteriormente tais organizações dirão que os recursos
financeiros acabaram, e seu papel estará cumprido. Além do mais, cumprem o papel de
corromper dirigentes e lideranças populares através do seu assalariamento, mudança de
padrão de vida, afastamento das bases, etc.
Muitas destas organizações abrigam agentes de governos de potências estrangeiras
destinados a espionar e infiltrar as organizações populares combativas. Umas e outras são
controladas por pessoas honestas que pretendem verdadeiramente apoiar a luta do povo.
Conhecendo-as bem devemos buscar estabelecer relações em prol da organização e do
fortalecimento da luta, mas sempre mantendo-se alertas e vigilantes.

Relação com a imprensa

A imprensa é outro setor com o qual necessitamos ter o maior cuidado no


relacionamento. De uma forma geral, os meios de informação e comunicação estão sob o
forte controle da grande burguesia e têm como objetivo manipular a realidade, mentir,
desinformar para manter o povo sob sua influência. Frente à luta popular, os meios de
comunicação, a imprensa cada vez mais cumpre papel decisivo a favor do inimigo. Hoje é o
principal instrumento de informação, mapeamento, conhecimento interno dos movimentos
de luta e de desvirtuamento dos objetivos visando criar uma imagem negativa da luta dos
trabalhadores.

No nosso relacionamento com a imprensa devemos ser vigilantes e atuar de forma


extremamente organizada e objetiva para reduzir ao máximo as margens de manipulação e
distorção das informações que nos interessa passar à opinião pública. Alerta especial para
as técnicas de cooptação em que a imprensa, particularmente a Rede Globo de Televisão, se
especializou, através da promoção, endeusamento, criando ilusões da importância pessoal
das lideranças. Devemos lutar contra todos estes instrumentos do inimigo agindo de
maneira firme, enérgica e sem contemplações para com os mesmos. Toda relação com
estes órgãos deve ser feita de forma planejada através de responsáveis definidos pela
organização e segundo os interesses da organização.

Amigos e inimigos

Definir clara e objetivamente quem são, em nossa árdua luta, os nossos verdadeiros
amigos, e quem são nossos inimigos jurados, é também uma questão fundamental para o
fortalecimento e êxito do nosso movimento. De forma geral, nossos amigos são todos
aqueles que vão sendo beneficiários direta ou indiretamente dos resultados da luta pela
terra, e que no futuro o serão plenamente. São também aqueles que já possuem uma
consciência democrática e honesta. Ou seja: os trabalhadores da cidade e do campo, o povo
de uma maneira geral. São os pequenos proprietários rurais e urbanos, pequenos
comerciantes, estudantes, professores, intelectuais honestos, “políticos” sinceros (de rara
existência no país), organizações sindicais e populares e de defesa dos direitos do povo
(devemos desconfiar de muitos órgãos que se dizem defender “direitos humanos”, dado que
geralmente são ONGs ou órgãos do Estado), artistas comprometidos e religiosos
progressistas.

Nossos inimigos são os latifundiários, grandes fazendeiros e seus bandos de


pistoleiros, grandes comerciantes, a grande burguesia e seus partidos cheios de políticos
corruptos, os partidos eleitoreiros que se dizem de “esquerda”, os órgãos de governo, a
burocracia da Justiça e o aparelho repressivo policial-militar. Existem ainda alguns setores
que poderíamos chamar de “médios” dentre os quais, uma parte devemos lutar para
neutralizar ou mesmo atrair para ganhar seu apoio.

A necessidade de se proteger: autodefesa de massas

Por todas as razões que implicam a luta pela terra, desde as condições históricas como
as atuais, o movimento não pode ter a ingenuidade de esperar qualquer tratamento
democrático por parte do velho Estado e do latifúndio. Tirando as lições da experiência
histórica e pesado tudo que se tem passado na luta pela terra no Brasil, é necessidade e
obrigação moral assumir todas as tarefas necessárias para defender o nosso movimento e
nossas organizações dos diferentes tipos de ataques de nossos inimigos.

Para manter a situação imutável, o velho Estado brasileiro e o latifúndio tem larga
experiência e não medem esforços para destruir qualquer organização que contrarie seus
interesses e que principalmente trabalhe concretamente por transformar a situação fundiária
e destruir seu sistema de exploração e opressão. O sistema se utiliza não só de todos os
instrumentos que o Estado dispõe para reprimir e destruir nossa luta, mas também conta
com inúmeras organizações políticas e paramilitares para executar seus planos criminosos.

Conscientizar as massas sobre a repressão, sobre o real e verdadeiro conceito de


Estado e do que é em essência o velho Estado brasileiro, do seu papel, bem como denunciar
a ação dos bandos de pistoleiros, é decisivo. O velho Estado junto com a imprensa trata de
difamar e descaracterizar toda a luta social combativa, buscando em seguida criminalizá-la
para justificar toda repressão sobre ela. Mas não basta apenas denunciar os seus métodos e
objetivos, é preciso combatê-los com firmeza e determinação. E isto só se pode fazer com a
definição de uma política de autodefesa e a preparação de todo o movimento em exercê-la.
Diante da necessidade de autodefesa, muitas atividades devem ser desenvolvidas e
organizadas. A começar pela participação de todos na defesa de nossa organização, das
massas e de nossas lideranças, que são o alvo principal de eliminação por parte do inimigo.

A vigilância permanente contra a infiltração do inimigo, a vigilância sobre a


movimentação do inimigo, a obtenção de informações permanente do inimigo e a contra-
informação são atividades imprescindíveis para nossa proteção e das quais todos devem
participar. A proteção da identidade dos companheiros mais expostos também é importante
e necessário. Nos atos que conduzem ao enfrentamento deve-se estar minimamente
preparado para não facilitar a ação bandida e criminosa do inimigo. Nos enfrentamentos
necessários à conquista de nossos objetivos, nas tomadas de terra e ocupação de órgãos da
administração do velho Estado, é necessário a utilização de recursos de camuflagem e
cobertura do rosto para proteger a identidade de nossos companheiros.

Educar as massas sobre a experiência histórica da luta dos povos e do nosso povo
brasileiro, cujas conquistas, sejam elas quais forem, só foram possíveis a vitória através da
luta violenta. Educar as massas a respeito de que o inimigo exerce permanentemente a
violência criminosa contra o povo e que o povo tem o direito sagrado de defender-se
lançando mão da violência justa. Levantar a palavra-de-ordem: “A rebelião se justifica”.

Normas disciplinares e de funcionamento

Artigo 1º — Para garantir o adequado funcionamento das diferentes relações no interior


dos acampamentos e demais áreas é necessário o estabelecimento de normas disciplinares
baseadas em direitos e deveres a que todos, sem nenhuma exceção, estão obrigados;

Artigo 2º — A instância de decisão suprema da coletividade é sua Assembleia Geral. O


funcionamento desses órgãos é baseado no centralismo democrático, ou seja, todos
participam das discussões e decisões, aprovadas por unanimidade ou por maioria. Após
tomadas as decisões todos estão obrigados a colocá-las em prática. A prática fratema da
crítica e autocrítica é o meio para buscar a superação de falhas e erros;

Artigo 3º — São direitos de todos os membros de acampamentos e áreas, bem como de


núcleos de preparação para novas tomadas, participar das definições dos rumos da luta e da
vida da coletividade, de eleger e ser eleito para as distintas instâncias de direção, de criticar
em público ou não os dirigentes e quaisquer membros da coletividade;

Artigo 4º — São deveres de todos, sem nenhuma exceção, defender a unidade da


coletividade, zelar e ser vigilante contra os desagregadores, cumprir as tarefas para as quais
foi eleito prestando contas periodicamente ao movimento e a todos interessados, de ajudar
na construção política e material do movimento, guardar segredos do movimento e pagar
contribuições definidas democraticamente pela assembleia da coletividade;

Artigo 5º — Estarão impedidos do exercício do direito de eleger e ser eleito para


instâncias dirigentes todo aquele que estiver sob sanção por atos de indisciplina e violação
das normas;

Artigo 6º — É expressamente proibido o porte, uso e comércio de bebidas alcoólicas e


qualquer tipo de droga no interior do acampamento. Nas áreas é proibido o porte e uso de
drogas bem como o comércio destas e de bebidas alcóolicas;

Artigo 7º — É expressamente proibida a prática ou apologia de discriminação por motivo


de raça, religião e gênero (sexo);

Artigo 8º — É expressamente proibida a prática e apologia de prostituição, jogos de azar


e outras formas de corrupção moral;

Artigo 9º — É terminantemente proibida a venda ou negócio que envolva direito de


posse, lote, terreno ou qualquer objeto relativo à conquista da luta coletiva;

Artigo 10º — É terminantemente proibido fornecer informações da vida interna da


organização e da coletividade para estranhos, agentes dos latifundiários e do Estado;

Artigo 11º — São consideradas violações graves o descumprimento dos artigos 6º, 7º,
8º, 9º e 10º, que serão sancionadas com punições especiais definidas por Tribunal Popular
formado pela Assembleia Geral da coletividade;

Artigo 12º — As demais violações serão sancionadas com base nas Medidas
Disciplinares referidas no Artigo 13º, aplicadas pela organização a que esteja ligado
(comissão, grupo de trabalho, etc.);

Medidas disciplinares

Artigo 13º — De acordo com a gravidade das violações, as medidas vão desde a simples
advertência e crítica formalizada e pública à coletividade, afastamento das funções e perda
de direitos de eleger, ser eleito e de receber informações sobre o rumo do movimento por
tempo determinado; expulsão do movimento, expulsão da coletividade;

Artigo 14º — São considerados atos de traição toda e qualquer forma de colaboração
com o inimigo e delação;

Artigo 15º — Os atos considerados de traição serão sancionados de imediato, a partir de


sua comprovação, com a expulsão desonrosa do movimento e da coletividade;

Artigo 16º — Todos os acusados de violações terão direito de ampla defesa, perante as
comissões de investigação e da instância responsável por encaminhar o processo.

X. Como se organiza as LCP

As LCP têm como base os camponeses organizados:

nos acampamentos;
nas áreas tomadas;
nos núcleos de camponeses pobres mobilizados para novas tomadas.

Em cada um destes locais, o órgão máximo de decisão são as assembleias, onde todos
os companheiros e companheiras têm o direito de participar, de votar nas propostas que
forem apresentadas, de eleger e de ser eleito para as comissões que forem constituídas.

As tarefas a serem cumpridas devem ser sempre de responsabilidade de uma comissão


de companheiros e companheiras, buscando-se sempre a participação de novas pessoas no
trabalho. Com isto evita-se a centralização excessiva e possibilita-se o desenvolvimento de
novas lideranças.

As decisões tomadas e os compromissos assumidos têm que ser cobrados pelo


coletivo. Quem assumiu tarefa tem que prestar conta ao coletivo do trabalho realizado.

A Coordenação dos Acampamentos e Áreas, as Comissões e Setores de


Organização
Várias tarefas surgem na organização e mobilização dos acampamentos e áreas:

segurança;
produção coletiva;
alimentação e cozinha coletiva;
limpeza e saúde;
educação e formação;
arrecadação e controle de finanças;
mobilização de mulheres, jovens, crianças, etc.
juventude;
mulheres;
crianças.

Para execução destas tarefas, é importante a formação de comissões ou setores,


buscando envolver o máximo de pessoas nas tarefas. Os membros de cada comissão ou
setor devem eleger um coordenador para dirigir os trabalhos.

A coordenação deve ser eleita na assembleia dos acampados e membros das Áreas.
Ela deverá se reunir regularmente para discutir os problemas que surgem e acompanhar e
coordenar o trabalho das comissões ou setores. A coordenação é um órgão de direção
colegiada onde deve sempre se fortalecer o coletivo, combatendo os desvios do
individualismo, do mandonismo, do carreirismo e do personalismo.

A coordenação e as comissões (ou setores) devem estar sempre em condições de


prestar contas de seus trabalhos e de seus atos nas Assembleias e reuniões com as bases.
Deve-se dar particular atenção às prestações de contas das atividades de finanças
(arrecadação e gastos) e do controle da utilização do patrimônio coletivo. A administração
dos recursos e do patrimônio do movimento será sempre feita pela Comissão de Finanças
nunca, portanto, por uma só pessoa.

A Coordenação Regional

A Coordenação Regional é eleita nos Encontros da LCP da Região (uma região está
composta por partes de estados — da divisão política oficial) onde participam os delegados
escolhidos nos diversos acampamentos e áreas dirigidos pelo movimento.

Na Coordenação Regional também deverão ser organizadas comissões e setores que


auxiliarão o desenvolvimento das mesmas comissões e setores nos acampamentos e áreas.
Em nível Regional será organizada uma comissão de imprensa que cuidará da elaboração de
notas, panfletos e jornais das LCP.

O Conselho de Representantes

O Conselho de Representantes será formado por um ou mais membros de cada


acampamento ou área ao nível de Região. Seu caráter é de órgão consultivo, podendo
convocar o Encontro de Delegados ou reuniões extraordinárias da Coordenação, por decisão
de 2/3 de seus componentes.

O Congresso

O Congresso é uma instância de massas de caráter emulativo e de coesão do


movimento, aberto à participação das bases que devem organizar sua participação por
acampamento e área. O Congresso referenda ou não as decisões tomadas pelos Encontros
de Delegados (Regionais).

O papel do dirigente

Os dirigentes das LCP, em qualquer nível, devem ser exemplos de disciplina, de


seriedade, de retidão moral e de responsabilidade no cumprimento das tarefas. Devem ser
exemplo de combatividade, de solidariedade e de compromisso com os objetivos e
programa do movimento. Devem ser firmes no enfrentamento com o inimigo, estando
sempre atentos em preparar as massas para enfrentar a violência que o latifúndio e o velho
Estado praticam contra elas.

O dirigente não pode deixar-se iludir com a bajulação que às vezes o governo, a
imprensa, os latifundiários e os políticos fazem com as lideranças do povo. Isto é sempre
para comprá-las, para tirá-las da luta. O companheiro ou companheira que assume a função
de direção deve ter a consciência de que a cobrança sobre eles será sempre maior, que deve
ser sempre a primeira pessoa a cumprir as decisões das bases e que todos estarão
vigilantes sobre sua conduta política e moral.

O dirigente não pode nunca usar sua condição de membro da direção para tirar
vantagem própria ou para projetos pessoais. Ninguém é obrigado a aceitar a função de
direção; mas se aceitou, sabe que suas responsabilidades são maiores; se acha que não tem
condições de assumi-las, que renuncie.

O dirigente deve ser atencioso, paciente, simples e humilde no trato com as massas,
servi-las de todo o coração. Deve estar sempre preocupado em se desenvolver, em estudar,
em participar de cursos e atividades de formação organizadas pelo movimento.

A direção deve ter uma atenção particular em sempre apoiar e estimular a participação
da mulher. Sem a participação e a presença organizada da mulher, nosso movimento não
tem chances de vitória em seus objetivos.

Nossa luta será penosa e longa. Por isso é também importante integrar os jovens e
crianças na luta. Estimular o estudo, o esporte, a cultura, desenvolver neles o amor pela terra
e incorporá-los cedo na luta contra o latifúndio.

Tomar todas as terras do latifúndio!


Viva a revolução agrária!

Conquistar a Terra
(Versão original de Benedito Monteiro; Modificado
por Carlos Prexedes)

Agora nós vamos pra luta


A terra que é nossa ocupar

A terra é de quem trabalha

A história não falha, nós vamos ganhar.

Já chega de tanto sofrer


Já chega de tanto esperar


A luta vai ser tão difícil

Por mais que demore, vamos


triunfar.

(Bis)

Quem gosta de nós somos nós


e aqueles que vêm nos ajudar


Por isso confia em quem luta


ganhar.
A história não falha, nós vamos

Já chega de tanto sofrer


Já chega de tanto esperar

A luta vai ser tão difícil

Por mais que demore, vamos triunfar.

Se a gente morrer nessa luta


O sangue será uma semente


Justiça vamos conquistar

A história não falha, nós vamos ganhar.

Já chega de tanto sofrer


Já chega de tanto esperar

A luta vai ser tão difícil

Por mais que demore, vamos


triunfar.

Já somos uns 30 milhões


O povo sem terra e sem pão


O jeito é lutar por nosso chão


A história não falha, nós vamos ganhar.

Já chega de tanto sofrer


Já chega de tanto esperar

A luta vai ser tão difícil


Por mais que demore, vamos
triunfar.

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