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Os desafios institucionais de gestao hidrica em um modelo de participagao quatripartite: 0 caso do comité da bacia hidrografica do Rio das Velhas, Minas Gerais, Brasil The institutional challenges of water management in a quatripartite participation model: the Rio das Velhas Watershed Committee case, Hildelano Delanusse Theodoro Nilo de Oliveira Nascimento Léo Heller RESUMO: O artigo tem como questio central procurar apontar os prineipais obsticulos gestio de recursos hidri- cos que se utlizam do formato de comités de bacia para a tomada de decisées institucionais, principalmente quando utilizam do modelo quatripartite de participagio (sociedade civil, setor privado, setor piblico estadual,setor pablico mu- nicipal). Para tanto, analisa-se um caso em particular, o do ‘Comité da Bacia Hidrogrifica do Rio das Velhas (CBHRY), localizado no estado de Minas Gerais, Brasil. Este comité 6 avaliado tanto em termos intemnos (entre seus membros) como externos (como comité com outras organizacées! Instituig6es). trabalho objetiva identificar as principais resttigdes para que os procedimentos de gestio de recursos hidricos, em um modelo quatripartte como o do CBHRV, ppossam ocorrer de forma harménica para atuagio endégena (organizacional) c exégena (institucional). Nessa direséo, utiiza-se a metodologia de “riangulasto de métoda;”, onde so aplicadas as téenicas de coleta de dados de pesquisa de campo, anilise documental e entrevista individuais com liderangas do setor. Conjuntamente e de forma articulada sob a ética da andlises das politias piblicas relacionadas 20 objeto pequisado, esss tcnicas visam favorecer uma andlise cnitica do comité pesquisado. Iso ¢ feito em termos de seus desafios insttucionais para tealizagio de agbesintegradoras que superem conflitos de interesses diversos existentes na bacia hidrogrifica do Rio das Velhas, PALAVRAS-CHAVE: Gestio de Recursos Hidricos, Politicas Piblicas, Gestéo Integrada, Comités de Bacia Minas Gerais, Brazil Submetid 10-06-15 Revo: 19-06-15 Aprovado: 23-06-15 ABSTRACT: The central issue of this article is to try to identify the main obstacles concerning water management used in the watershed committee format for making institutional decisions, especially when the quatripartite participation model (civil society private sector, state public sector, municipal public sector) is used. For this purpose the analysis of a particular case, the Rio das Velhas Watershed ‘Committee (CBHRY, in Portuguese), located in Minas Gerais state, Brazil is used. This committee is assessed here both in internal (among its members) and external (as a ‘committee with other organizations/insticutions) terms. “The study aims to identify the main constraints to water ‘management procedures performed in a quatripartite mode! like CBHRY, for endogenous (organizational) and ‘exogenous (insticutional) performance, In this sense, we use the methodology of “iriangulation of methods” where the ‘techniques of gathering data from field research, document analysis and individual interviews with different water sectors leaders are applied. Together, these techniques aim to ‘encourage a critical analysis of the committee studied. This is done in terms ofits institutional challenges to performing incegrative actions that overcome many conflict of interests presenc in the Rio das Velhas watershed. KEYWORDS: Wacer Management, Public Policy, Inte- grated Water Management, Watershed Committees. 32 REGA Vol 12,0. 1, p. 31-42, jan un. 2015 INTRODUGAO Criado no ano de 1998, 0 Comité da Bacia Hi- drogréfica do Rio das Velhas (CBHRY), localizado no Estado de Minas Gerais, Brasil, possui uma larga experiéncia na gestio de seus recursos hidricos € também de debate de formatos institucionais pos- siveis pata a tomada de decisées que foram sendo aprimorados no decorrer de seus anos de existéncia (CAMARGOS, 2005; THEODORO; MARQUES, 2014; THEODORO, 2002). Dente esses, destaca-se seu formato atual de consulta e deliberagio deno- minado como quatripartite, ow seja, que engloba a sociedade civil, 0 setor privado, 0 setor piiblico estadual o setor publico municipal A questao do artigo proposto & tentar apontar os principais obstaculos para que a gestéo do CBHRV tanto em termos internos (entre seus membros) como externos (como comité com outras organizagées! instituigées) se consolide como publica, participativa, descentralizada e integrada. Ele objetiva elencar as res- tigdes para que os procedimentos de gerenciamento de recursos hidricos, em um modelo quatripartite como o do CBHRY, possam ocorrer de forma har- ménica para atuacao endégena (organizacional) ¢ exégena (institucional). Isso porqué, mesmo sendo © referido comité um dos com maior experiéncia em gestio compartilhada de recursos hidricos, ainda possui diversas arestas organizacionaisc institucionais que merecem ser melhor estudadas, tanto em sua dinamica quanto em seu arcabouso institucional. Conseguir estabelecer relagdes entre os principais conflitos (latentes ou no) entre seus participantes poderé favorecer o entendimento de como melhorar processos de tomada de decisio em ambiente difuso e complexo como o de um comité de caracteristicas to préprias. Dentre essas caracteristicas pode-se destacar: 1) Sua temporalidade de atuagio, desde 1998, logo apés a efetivagao da Politica Nacional de Recursos Hidricos, em 1997 (Lein® 9.43/97), 6 que acabou por se tornar um referencial na gestio hidrica estadual ao longo dos anos; 2) Existéncia de Regiéo Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), que € composta por 34 municipios’, sendo que destes 20 pertencem 20 * Baldim, Belo Horizonte, Betim, Brumadinho, Caeté, Capim Branco, Confins, Contagem, Esmeraldas, Floresta, Ibinté Igarapé, ltaguara, laiaiucu, Jabutcatubas, Juatuba, Lagoa Santa, Mério Campos, Mateus Leme, Matozinhos, Nova Lima, CBHRY. Outro ponto é que a RMBH possui um diferencial em relagio As outras regides metropolitanas brasileiras que ¢ a existéncia do chamado Colar Metropolitano, que possui 16 municipios’, de onde 4 fazem parte do CBHERV (IPEA, 2013). Isso totaliza no mini- mo 77 muniefpios interligados aos processos de gestio do Rio das Velhas, © que demanda se discutir sobre a gestio urbana (BRITTO; BARRAQUE, 2008; BONTEMPO et al., 2012; AROEIRA, 2010); 3) Organizagao interna com forte presenca da sociedade civil que, desde antes da oficializagio do comité, atuava de forma constante na bacia, principalmente através de ages educacionais ¢ de pesquisa. Essas agées exam ligadas & Univer- sidade Federal de Minas Gerais (UFMG), viaa Faculdade de Medicina e ao Projeto Manuel- v4o, um dos principais atores sociais da regiso € que mantém suas atividades na atualidade; 4) Estrutura para a tomada de decisses com modelo quatripartite, com vista a0 aumento da participagio, democraciae integracio entre 0s participantes do comité e que é 0 objeto de discussio desse artigo. Annevessidade da gestio ser cada vez mais institu cionalmente integrada para gerar ages coletivas néo é recente (ABERS, 2010; OLSON, 1999) merece scr aprofundada, principalmente ao nivel da anilise de governanga (GREEN, 20( GOOCH: HUITEMA, 2004; THEODORO; MATOS, 2015). Da mesma mancira, buscar um maior entendimento das dinami- cas existentes na gestio via bacia hidrogrifica, comicés ¢ agéncias € importante em termos institucionais. O modelo mais usual de gestio de recursos hidri- cos em operagio no pais remete & divisio triparte de segmentos para processos de consulta e deliberacio (TURTON et al., 2007; CAMPOS, 2004; CAM- POS; FRACALANZA, 2010), ou seja: Nova Unido, Pedro Leopoldo, Raposos, Ribeirdo das Neves, Rio Acima, Rio Manso, Sabara, Santa Luzia, So Joaquim de Bicas, Sa0 José da Lapa, Sarzedo, Taquaracu de Minas @ Vespasiano, 2 Bardo de Cocais, Belo Vale, Bom Jesus do Amparo, Bonfim, Fortuna de Minas, Funilandia, Inhaima, Itabiito, latina, Moeda, Pard de Minas, Prudente de Morais, Santa Barbara, Sao Gongalo do Rio Abaixo, Sdo José da Varginna e Sete Lagoas. Theodora, H.D.; Nascimento, N. O.; Helle, L. 1) Sociedade: formada a partir de organizagées civis estabelecidas na drea e institucionalmente reconhecidas; 2) Estado: formado com a participagio dos diver- s0s poderes piiblicos constituintes do governo estadual e municipal; 3) Mercado: formado por usuarios dos recursos hidricos que fazem captaséo dos mesmos com possibilidades de alteragées diversas de suas disponibilidades, em termos temporal e/ou espacial No CBHRY, hd uma divisio a mais nessa estrutura, clissica. Essa diferenciagio se dé no segmento estatal, onde poder estadual é separado do poder municipal, partindo-se do pressuposto de possuirem dinamicas ¢ capacidades de incervencao diferentes. A legislacao ino determina um mimero ideal de divisdes/segmen- tos, mas sim que haja representacdo democratica sem setor majoritirio existente, Um modelo quatriparte demanda constante interagio interna ¢ externa de seus membros, o que é uma dificuldade canto teérica quanto pritica de se realizar (KOOIMAN, 2008; ANA, 2013). Assim, a discussao contida nesse trabalho se rela- ciona com a dimensio integradora do CBHRY, que € entendida como a capacidade do objeto pesquisado em organizar e interagir institucionalmente seus segmentos na diregio de processos e/ou resultados cada vez, mais construidos e consolidados de formas democréticas, participativas¢ integradas. Mais ainda, a integracao foi considerada a partir também de outra possivel capacidade/intencionalidade do comité: de permitir que novos arranjos organizacionais ¢ insti- tucionais possam ser construidos coletivamente € na diego de contextos sociais cada vez mais amplos. Foi feito entao um recorte de anilise justamente nesses dois ambitos diferentes e interligados: o nivel interno de inceragao entre os membros do comité e o nivel ex- terno de interagao entre 0 comité ¢ os brgios gestores, © que se fer foi tentar apontar as principais resttig6es e também possibilidades que tal desenho institucional (CUNHA; THEODORO, 2014) con- tém para a gestéo dos recursos hidricos na area. As premissas foram que, internamente, o CBHRV néo possui ainda uma prética de gestéo incegrada entre seus membros ¢ que, externamente, existem grupos de pressio ¢ poder advindos dos diferentes atores sociais e institucionais existentes na bacia do Rio das Velhas que geram interagdes diversas entre 0 comité, a agéncia ¢ Estado. (Os desafios instucionais de gosto hidrica em um modelo de paricipagdo quatripartte, METODOS A partir do tipo de objetivo da presente pesquisa, de tentar identificar as principais restrigdes para que um modelo de gestio participativa funcione, a de- terminacao de um conjunto de métodos ¢ téenicas, mais do que apenas uma em particular, se mostrou accesséria. Na anilise de uma dimensio de integragio interna e externa de um organismo de bacia hidrogré- fica, além das tradicionais andlises documentais que perfilam os limites tedricos de atuagio de cada um ddessesfatores, as andlises de campo ¢, destacadamente, as anilises de contetido ganham um valor essencial para o aumento da capacidade de explicagio do tema selecionado (CAMARA, 2013). Isso porqué elas podem permitir um alcance maior nas interpretayes dos agentes institucionais e sociais envolvidos mais além do que as determinagécs legais, administra- tivas e similares que j se encontram estabelecidas (MINAYO, 2012), ‘Uma vez que se considera aqui o entendim sobre o processo de gestio dos recursos hidricos via o CBHRY, a busca pelo sentido das falas ¢ agées dos elementos participantes dos processos de decisio na bacia é fator crucial para se tentar identificar lacunas no gerenciamento institucional previsto em lei e do que se espera em si de um comité de bacia hidrografica Para se poder destacar os principais grupos de pressio, assim como qual o papel de acuacéo espe- ado de um comité como o CBHRY, a metodologia de “triangulagao de métodos’ (MINAYO, 2005) foi escolhida para ser utilizada, pois permite tanto 0 mento das experiéncias de campo, como a mativa e documental. Foram realizadas 23 centrevistas com liderangas de vatios setores direta ou. indirctamente relacionados ao tema de pesquisa, de forma a se estabelecer conexses de contetido pata as nndlises requeridas. A pesquisa assim se caracteriza, como de base qualitativa (FLICK, 2009) e com orientasio de conjugagio de anilises diferenciadas por técnicas de espagos e tempos diferentes, Utiliza-se aqui como ferramental de andlise: 1) Anélise de Campo: tem como principio a téen da “observagdo participante’ (HAGUETTE, 2000), consolidada como instrumento para se captar 0 modus operandi do(s) grupo(s) escolhido para investigacio. Detém como caracteristica a possibilidade que permite a0 pesquisador obter dados ¢ informagies através 33 34 REGA Vol 12,0. 1, p. 31-42, jan un. 2015 da lente do cotidiano ou de eventos particulares significantes ao wabalho proposto. Nessa técni- «a, a observasio ocorte na participagio junto a0 grupo observado, de forma direta ou indi- reta, possuindo dificuldades e possibilidades prOprias ao scu exercicio, como a necessidade de constante vigilincia sobre a objetividade de tudo 0 que & coletado ¢ interpretado. O procedimento utilizado foi o da observacio de diversos acontecimentos vinculados 0 CBH- RY, tais como: reunides plendrias ordinarias ¢ extraordindrias, cimaras técnicas, do CERH € do Comité da Bacia Hidrogrifica do Rio Sao Francisco (CBHSF); eventos culturais/ académicos. 2) Andlise Documental: tem como principio a organizagio dos dados ¢ informagées existences esta consequente categorizasio para posterior estudo. Caracteriza-se por permitir ao pesqui- sador a separagio, catalogagio e comparagio de informagées em fontes diferentes no tempo, espago, contetido, redagio e piblico-alvo. O rol selecionado de documentos inclui as determi- nagcs legais ¢ administrativas sobre 0 comit referido, como consultas, propostas, delibera- bes normativas e decisbes, como também a produsio teérica vinculada ao tema, tanto em Ambito governamental como académico. O foco é esse conjuntode informacées relaciona- das a0 tema pesquisado. Consequentemente os principais procedimentos metodologicos utilizados foram a selecio dos documentos anteriores em ermos de sua temporalidade (a partir dos anos 1980 até 2012), tematica (politicas publicas, recursos hidricos, gestéo) € objeto (organismos de bacia). 3) Andlise de Contetido: tem como principio estabelecer como um conjunto de técnicas de pesquisa que visa & busca de sentido(s) em um dado documento pela utilizacio de procedi- mentos sistematicos objetivos (BARDIN, 1994; CAMPOS, 2004). Possui como método a possibilidade de inferéncias sobre a produgio! recepgio/distribuigéo das mensagens avaliadas. foco se faz sobre o proceso de comunicagio existente em um determinado evento, ativida- de, pritica e nio somente nos dados em si. Em tal direcio, como procedimento metodolégico foi realizado um roteiro de entrevista a ser respondido pelas liderancas selecionadas para pesquisa. Ele foi construido a partir de 18 perguntas sobre 8 teméticas diferentes (uso ¢ ocupasio do solo; quantidade/qualidade de gua; bioindicadores; dimensio institucional, integracao, legal ¢ econémica-financeira) Assim se pode identificar os posicionamento dos representantes sociais escolhidos sobre os meios fisico, bidtico ¢ antrépico. A partir dai, 0s assuntos identificados como mais frequentes € destacados pelos entrevistados em relagio & gestao de recursos hidricos foram selecionados para anilise. Especificamente sobre 0 aspecto da dimensio integradora presente no CBHRV denczo da trian; Jaco proposta a anilise de contetido tem um espaco maior, uma vez que foi por ela, principalmente, que as questées subjacentes A gestéo hidrica tornaram-se evidentes a partir da série de entrevistas realizadas De acordo com Bardin (1994), séo necessirias de- rerminadas etapas para que as andlises qualitativas de contetido sigam um caminho mais orientado para captagio de dados ¢ de forma a serem também fundamentais como organizacio da técnica proposta, Primciramente, porém, sc faz necessirio xplicar como se dew o proceso de construcio dessas etapas, que foram realizadas no periodo entre 2012 ¢ 2015 de maneira a permitir resgatar a construgéo documental relativa ao tema proposto como também acompanhar as modificacées legais, administrativas e institucionais gue ocorreram no periodo. Cabe ressaltar também que processo de observacio patticipante sobre a gestio que deu suporte as andlises ocorreu desde 0 ano 2000, quando o primeiro autor desse trabalho passou a atuar direta e indiretamente em atividades do comité (reuniées plendrias, extraordindrias, cimaras xécnicas, eventos) Fosse como representante do setor de educacio superior (entre 2004 a 2011) ou como representante da Associagao Brasileira de Engenharia Sanitéria ¢ Ambiental (desde 2012), a opyéo pela observagio participante (ou seja, onde a “observacio” se dé pela *paticipasio” daquele que esta pesquisando um dado fendmeno ~ no caso, a gestio de recursos hidricos vvia comité) se mostrou a mais adequada para tentar compreender os discursos, os contetidos e as praticas existentes no CBHRV. Sobre os procedimentos em relagio aos documen- tos analisados, destaca-se: 1) Pré-andlise: esteuvuragao inicial do material a ser trabalhado: © intuito foi tentar identif Theodora, H.D.; Nascimento, N. O.; Helle, L. car as principais restrigées e potencialidades envolvidas na gestio de recursos hidricos via CBHRY, ¢ com foco na dimensio de inte- gragio das atividades deste. Assim, o recorte temporal foi feito levando-se em consideracio as principais legislagbes e documentos sobre recursos hidricos formulados a partir da década de 1980, quando aconteceu a institucionaliza- ‘do da tematica de forma mais abrangente. Esse movimento se deu principalmente a partir da Consticuigio Federal de 1988, que ressalrou a questio da participacio e democratizagio social em relacio ao meio ambiente, que passou a ser considerado como direito fundamental para © exercicio pleno da cidadania. Mais especifica- mente em relagio ao CBHRV, foram consi- deradas as consultas, propostas, deliberagées ¢ decisées diretas ou indiretamente ligadas 20 mesmo. 2) Exploragéo do material: escollas das categorias deandlise: As categorias de andlise consideradas foram aquelas que indicaram possibilidades de explicat 0 perfil do comité em termos de suas interagées internas ¢ externas. Sendo assim, elas cobrem a triade necessétia & avaliacio socioam- biental: meio fisico (usolocupacio do solo); meio bidtico (quantidade de 4gua; qualidade de Agua; bivindicadores); meio ante6pico (dimen- ses de cunho: institucional, integradora (ema deste artigo), legal e econémica-financeira). Consequentemente, nessa ctapa foi construida uma estrutura de roteito de entrevista formada por essas oito tematicas que foram cntio discu- tidas a partir de 18 perguntas, aplicadas a 23 lideransas que compuscram o painel de entre vistados selecionados. al selegio se deu pela lideranga ¢ reconhecimento dos entrevistados sobre a temitica do CBHRY, tanto no setor administrativo, técnico, social e académi O formato de entrevista permitiu a exploragio dos temas a parti da incerpretagio dos préprios escolhidos que, de forma geral, responderam todas as perguntas e permitiram a gravacio de suas respostas, salvo um Gnico caso, que duraram em torno de 50-60 minutos pata sua aplicasio, 3) Tratamento dos resultados: busca pela significa Gio e validagio dos dados: Apés a organizagio do material ¢ da definigao das categorias, 0 tra- tamento dos dados aconteceu pela identificagio dos principais temas que foram enunciados nas (Os desafios instucionais de gosto hidrica em um modelo de paricipagdo quatripartte, centrevistas ¢ confrontados com as experién- cias de campo ¢ andlise de documentos. Essa ttiangulagio permitiu o avango do trabalho no sentido deesclarecer posstveis potencialidadese restrigdes aos processos de integracéo do comité na medida em que no somente as informa- {gbes, mas também os sentidos inseridos nelas por seus autores. Essas significagées se deram principalmence pela anilise de contetido, que nfo se atém simplesmente ao discurso inerente acada entrevista/entrevistado. Ao contrario, cla permitiu tratar os dados na dirego de anslises ‘endo somente descrigées dos eventos. No caso da dimensio integradora isso foi fundamental por indicar caminhos para um maior conhe- cimento da gestio institucional de recursos hidricos da qual o CBHRV faz parte Cada uma das etapas descritas foi aplicada na pes- quisa e todas foram importantes para a identificagao das diversas questées latentes e explicitas na gestio ‘endégena c exégena do CBHRV. Essas mesmas ctapas, foram construidas a partir da perspectiva de manu- tencio da confiabilidade ¢ da validade das mesmas enquanto instrumentos metodalégicos de pesquisa (GOLAFSHANI, 2003), de forma a impedir andlises ‘cnviesadas sobre a gestio. Para a selegio ¢ execugio das entrevistas e da anilise documental, por exemplo, os preceitos de representatividade da amostra, pertinéncia dos temas ‘dos documentos ¢ da exaustividade dos temas foram considerados para aprofundar a pesquisa (BARDIN, 1994). Em relago 4 observacio participante, os cuidados tomados ¢ exercidos pelo primeiro autor deste artigo foram no sentido de um afastamento de suas fungées como membro do CBHRY, a partir do ano de 2012, de forma a possibilitar uma leitura mais objetiva e sistematica de suas decisdes ¢ agdes. RESULTADOS E DISCUSSAO De acordo com a Lei Federal n° 9.433/97 - que institui a Politica Nacional de Recursos Hidricos (PNRH) ecria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hidricos (SINGREH), formado pelos Conselhos, Ministério do Meio Ambiente (MMA)/ Secretaria de Recurso Hidricos e Ambiente Urbano (SRHU), Agéncia Nacional de Aguas (ANA), Orgios Estaduais, Comités de Bacia Hidrogréfica (CBH) e Agéncias de Agua) — a representacao nos comités deve ter individuos (Art. 39): da Unido; dos Estados e do 35 36 REGA Vol 12,0. 1, p. 31-42, jan un. 2015 Distrito Federal cujos territérios se situem, ainda que parcialmente, em suas respectivas dreas de atuacio; dos Municipios situados, no todo ou cm parte, em sua drea de atuagio; dos usuarios das aguas de sua drea de atuacio: das entidades civis de recursos hidricos com atuagio comprovada na bacia. Mais ainda, no pardgrafo primeiro deste mesmo artigo, salienta-se que o ntimero e critérios de compo- sigdo serdo estabelecidos nos préprios comités, desde que a representagio estatal nao seja maior do que a metade do ntimero total de participantes. Isto signi- fica que, teoricamente, 0 modelo de representagio proposto legalmente versa sobre a possibilidade da dimensio integradora no comité seja estabelecida por tum dislogo constance entre suas partes formadoras (sociedade civil, usudtios ¢ Estado). Nesse sentido, seria um pressuposto para priticas de boa governan- a, compreendida aqui, dentre as virias perspectivas possiveis (GREEN, 2007; THEODORO; MATOS, 2015), como aarticulagio de tidlogos institucionais com ampla participacio, capacidade de inclusio e de resposta as demandas dos participantes dos processos de decisao, que devem ser transparentes ¢ acessiveis. Porém, consequente & referida lei, foi editada a Resolugio n° 5/2000, pelo Conselho Nacional de Recursos Hidricos (CNRH), que defini valores méximo, minimo e fix para a composicéo de CBH’s no pais, tais como: Estado com 40% de representagao méxima; sociedade civil com 20% de representacio minima; usudtios com 40% de representacio fixa, respectivamente. O fato que demonstra a dificulda- de em se integrar os segmentos participantes, é que alguns CBH's jé tinham legislagio anterior por terem sido criados hé mais tempo do que a Resolugio n? 5/2000 ¢, consequentemente, se estruturaram de forma diferente da determinacio legal (BRASIL, 1997), Isto faz. com que existam diferentes desenhos institucionais para compor comités no pais, com os segmentos a terem maior ou menor espago tepres rativo, tal como se vé na Tabela 1. © CBHRY tem uma composigio onde o poder estatalé representado por 50% dos participates, o ni- vvel maximo permitido pela Lei Federal n° 9.433/97, ¢ superior ao limite indicado pela Resolucao n® 5/2000 do CNRH. Este comité possui a participagio igua- licéria de seus membros (25% do percentual cotal), que so 56 no total, sendo 28 titulares e 28 suplentes. Mas esse recorte representacional do CBHRY nio deve ser entendido apenas como uma configuracio legal ¢ tal desenho institucional encontra respaldo mais em suas origens histéricas do que no arcabougo juridico (NOGUEIRA, 2004). Desde sua criagéo por meio do Decreto Estadual 39.692, em 29 de junho de 1998, a questéo da representacio paritéria quattiparte foi colocada. De acordo com as anilises de con do realizadas junto &s entrevistas com liderangas, 0 diferencial deste comité em separar a representacio estatal em Poder Pablico Estadual e Poder Piblico Municipal foi resultado da preocupacio em evitar que as representagées locais a0 longo da bacia, leiam-se prefeituras, estivessem enfraquecidas ou com pouca pacidade de intervengio. Assim o modelo de gestéo quattipartite foi pensado como possibilidade de atuacio mais abrangente tanto TABELA 1 ‘Anélise comparativa entre alguns CBH’s Comité Poderes Péblicos Usuarios Organizagées Civis Alto Tieté (SP) 66,7 148 185 Vathas (MG) 30 Ey os Meia Ponte (60) 40 40 20 Curu (CE) 40 30 30 Ceivap (MG, Rue SP) 38 40 2 Recdncavo Norte (BA) 333 333 333 Tagos Sao Joao (RI) 3 3 3 [Ato Iguacu e Alto Ribera (PR) 316 368 316 Sinos (RS) 20 0 0 Fonte: ANA (2011). Theodora, H.D.; Nascimento, N. O.; Helle, L. da sociedade civil como dos outros segmentos, uma ‘ver que teriam de discutir e tomar decisées de forma ainda mais conjunta do que © modelo tripartite. A ideia de uma divisio de segmentos vai na ditecio de se evitar a formagio de maioria simples para a tomada de decisées por um segmento qualquer (NEDER, 2015). Dessa forma a condicionante de decisio conjunta cstaria colocada de forma mais distribufda, indo além da nogio tradicional de gestio como determinante do aparato estatal (SWYNGEDOUW, 2005). ‘Um possivel diferencial, a0 menos no nivel concei- tual, da representaco por modelo quatripartite seria justamente permitir maior ambiente de negociagio de propostas ¢ deliberacées institucionais entre os segmentos -mas mantendo-se o eariter de integragio governamental via o proprio comité de bacia (CAM- POS, 2004; CAMPOS; FRACALANZA, 2010) Nese sentido, ressalta-se que 0 modelo de gestio via comité presenta, tcoricamente, a proposta de interagéo organizacional para a agao, diferentemente de outros modelos de gestio por conselhos e afins. Os comités nao sio apenas consultivos, como também propositivos ¢, principalmente, deliberativos (comam decisées). Isto significa que possuem poder de Estado na medida em que definem a utilizagio ou no de um bem piblico, com poder legal para tal ¢ para se fazer executar (POMPEU, 2010; BRASIL, 1997). ‘Ao mesmo tempo, porém, uma verificagao sobre a competéncia legal dos CBH’s (Art. 38 da Lei Federal 9.433197) demonstra que esse poder de “deliberat” aparece de forma limitada e passivel de ser modifica- da em instincias superiores (Conselho Estadual de Recursos Hidricos (CERH); Conselho Nacional de Recursos Hidricos (CNRH) via recursos na esfera devida pelo proponente) Esta relacio é institucionalmente orientada para ctiar uma vinculaggo de governanga entre os entes fede- rados deforma ascendentes, Por exemplo, esta estrutura assegura espagos organizacionais de negociagio entre os intcresseslocais, regionais ¢ nacionais dos segmentos, principalmente quando se considera a perspectiva de tuma gestéo por bacia(s) hidrogréficals), ou seja, in- terdependentes. Verifica-se entio que este sistema de deliberagées escalares na verdade & uma prerrogativa de garantia de direitos e deveres para o fim de uma gestio compartilhada e integrada de recursos hidaicos. Ao mesmo tempo, considerar que o modelo de comité ¢ uma nova forma de participagio apenas porqué existe participagdo direta pode mascarar uma visio maior de como funciona o sistema de tomada de decisio sobre recursos hidricos ¢ suas interagées (Os desafios instucionais de gosto hidrica em um modelo de paricipagdo quatripartte, ‘em termos de governanga. Em termos priticos, por ‘exemplo, uma decisio tomada ao nivel do comité de bacia representa apenas uma das ctapas de discussio e deliberagio existentes dentto do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hidricos (ANA, 2011). Da mesma forma ocorre com as agéncias de gua, ‘em termos de limitagées de atuagio. Uma vez que indo tém papel de regulacio, que & dado 4 ANA, elas podem agit apenas como secretarias executivas de seus respectivos comités, inseridas em suas fungSes técnicas-administrativas. Sao por veres consulkivas. mas nio deliberativas dentro da escrucura atual (e nem poderiam, pois essa agio € definida pelos comités). Mas uma preocupacio recorrente identificada nas entrevistas foijustamente tentar compreender melhor qual o papel das agéncias dentro do sistema de gestio de bacia estabelecido, pois, para algumas liderangas, quem definiria a pauta de discusséo sobre os recursos hidricos em Minas Gerais, por exemplo, seriaa ANA. mais do que os préprios comités. Alerta-se, porém, que ha também reconhecimento, por parte dos ‘entrevistados, de uma gradativa e maior atuagio da agéncia de dgua responsivel, a “Associagio Executiva de Apoio a Gestio de Bacias Hidrogréficas Peixe Vivo” (AGBPV) ¢ também da ANA no sentido de auxiliar ‘© CBHRV a tomar suas decisoes de maneira mais integrada em termos organizacionais/institucionais. Os projetos hidroambientaise de formagio técnica ‘eadministrativa para planos municipais de sanemanto sio exemplos disso. Nota-se que o nivel de percepsio e limites sobre a atuago da agéncia e do comité tam- bém éum processo ainda em formagio, pois, al como registrado em entrevista com uma lideranga, deveria ficar claro a todos os membros que “(...0 CBHRV é 0 cérebro e a AGBPV séo os bragos.”. ‘Um problema é que essa eapacidade pretensa de atuagio integrada ¢ compartilhada demanda nivel de ‘organizagio interna e externa que pode nio ocorrer, visto que sio processos técnicos ¢ politicos de nivel também contextual. De natureza igual, o papel pre- visto de agéo do comité de bacia de ser capaz de fazer representar adequadamente diversos atores sociais ¢ institucionais em uma arena democratica e com: partilhada com vistas a0 aprimoramento da gestio hidrica pode nem sempre ou nunca ser exercido caso sua articulagéo interna ¢ externa néo se consolide Estruturagao endégena do CBHRV O CBHRV tem uma estrutura quatriparte pouco usual, mas que segue de forma bem préxima Aquela 37 38 REGA Vol 12,0. 1, p. 31-42, jan un. 2015 indicada nos érgios técnicos. Possui Plendtia para as reunides ordinatias de seus 56 membros € no membros (a se destacar que todos os encontros si0 de ordem e fé piiblica, e podem ser acompanhados por qualquer individuo pertencente ou nio 4 bacia hidrogréfica do Rio das Velhas); possui Presidéncia ¢ Diretoria Colegiada, que agem em conjunto para as interagdes politicas internas e externas; Camaras Técnicas (Projetos ¢ Controle; Institucional-Legal; Outorga ¢ Cobranca; Comunicacio) Secretaria Executiva (AGBPV). Comparativamente, a estrutu- ta do CBHRV é muico similar também ao tipo de desenho institucional encontrado no comié da bacia hidrogréfica ao qual € tributdrio, que é 0 do Rio Séo Francisco (CBHSF). Entretanto, esse possivel “mimetismo institu- cional” néo é uma regia nem encontra orientacio definitiva em nenhuma legislacio pertinente, mas sim orientagées de cunho geral para que sejam reali- zados os trimites administrativos requeridos em lei da melhor forma possivel. De acordo com as entrevistas, ficou identificado também que o nivel de conhecimento técnico sobre os assuntos tratados no comité sio por vezes assimé- tticos e, consequentemente favorecem a influéncia de alguns grupos citado vem dos grupos econémicos que permeiam 0 comité, com destaque aos setores de mineracao e agricultura, que utilizam recursos hidricos em suas operagécs. Foi identificado também que hé muito planeja- mento nos processos de gestéo de recursos hidricos que, para serimplantados, necessitam de um conheci- mento técnico minimo que nao se encontra em toda a bacia ou nos quadros de pessoal dos subcomiés ¢ prefeituras, De acordo com as liderangas, hi uma percepeio de que ha um peso politico ¢ administrative maior da representaco da RMBH do que dos outros ter- ritérios na bacia, seja pela capacidade de articulacao dos mesmos ou pelos atores insticucionais ¢ sociais envolvidos. Isso resulta em uma gestio limitada aos mesmos grupos institucionais e de interesses (SWYNGEDOUW, 2005) Apesar da participasio ser considerada alta tanto por membros quanto por especialistas, o saber téenico € a interagio politica pessoal ¢ institucional seriam facores importantes para arealizagio da gestio. Isso faz também com que o nivel de execusio de tarefas pelo comité seja considerado apenas regular, pois depende de outros organismos de bacia para acontecet. Outro fato que poderia justficar um pouco mais a relagio causal entre representacio precitia e execucio de decisées pode ser identificado pela dificuldade das instituigSes publicas em reconhecerem as decisoes .adas via modelos de comités e de representagio em geral (ABERS, 2010), fazendo com que articu- Jagoes governamentais muitas vezes ndo acontegam. Certamente que o CBHRY tem independéncia, po: dendo deliberar possiveis mudancas internas de sua estrucura, mas como responde a um sistema de gestéo de recursos hidricos maiot, seu nivel de influéncia ainda esté em consolidacio. Estruturagdo exégena do CBHRV Quando se observa a gestao de um dado comité de bacia hidrogréfica inscrido cm um sistema de gestio idrica maior e sob uma perspectiva de governanga, a questéo de seu relacionamento interinstitucional se torna fundamental para tentar entender seus niveis de atuagio. Na verdade, um dado comité é apenas um dos varios elementos componentes do SINGREH ¢, mesmo dada sua importincia como mecanismo de participagio social democratica, ele & interinsti- tucional ¢, como tal, deve compreender seus limites de atuacio dentro do sistema. Mais ainda, 20 se analisar a composigio do referido sistema, a documentagio legal institucional relativa 4s entrevistas realizadas, o papel dos CBH’s poderia ser identificado tanto como basilar como, a0 mesmo rempo, dependente de uma série de outras instivuiges pata poder exercer suas fungies da forma prevista Uina prova concreta dessa situagio pode ser de- monstrada quando se verifica que o poder de deciséo dado ao érgio é a Agéncia Nacional de Aguas (ANA) que ird exercer a acio regulatéria e de integragéo entre os organismos de bacia (comités, agéncias especificas por bacia, conselhos etc). Ou seja, ea, enquanto escri- X6rio técnico deve ser capaz de assessorar os comités a desempenhar suas fungées a todo instante, o que pode ter gerado a desconfianga sobre os limites de atuagio da instituigao por parte de alguns membros do CBHRV. Essa situagio de possivel concentragio de poder devis6rio na instancia federal via agéncia reguladora ja havia sido indicada anteriormente (THEODORO, 2002) ¢ também foi relatada intimeras vezes pelos entievistados e identificada de forma regular em varios documentos relativos as reunides ordinérias ¢ extraordindrias do CBHRV (CBHRY, 2012) ¢ eventos similares de outros drgios ¢ entidades ligadas ao ema e que foram pesquisados Theodora, H.D.; Nascimento, N. O.; Helle, L. Porém, o que se verifica em uma anilise mais ampla é que a ANA esté exercendo seu poder de re gulagio, mas nao de deliberacao sobre as decisées dos comités do pais ¢ do CBHRY, em particular, 0 que nem sempre est4 claro aos seus membros (ABERS, 2010). Esses membros identificam a ANA mais como um drgio estatal de grande influéncia do que um balizador das discussdes existentes no comité ¢ conselhos de recussos hidricos. Mesmo que um entrevistado tenha afirmado que “(..) a ANA é quem define a pauta sobre recursos hidricos em Minas Gerais”, existe uma capacidade de influéneia do érgio, mas nao de interferéncia nas decisécs, pois tal acao feriria 0 principio do préprio modelo de gestio de fortalecer as decisées locais da bacia hidrogréfica. De forma geral, o que se identifica € uma enorme constituigéo de Grgios ligados aos recursos hidricos, uma vez que existem indmeros departamentos, secretarias, superintendénciase afins em cada instituigao estadual ou nacional. Ao se tentar verificar os papéis de atuagio de varias delas, fica claro que sio recortes muito semelhantes ¢ até sobrepostos (WARNER, 2007), 0 que nao ajuda a se definir com tanto objetividade, qual 0 érgio responsivel por qual agio de planejamento, monito- (Os desafios instucionais de gosto hidrica em um modelo de paricipagdo quatripartte, ramento ou avaliagio, por exemplo. De acordo com as entrevistas e as andlises documentais, 0 pafs € 0 Estado de Minas Gerais ainda favorecem um tipo de desenho institucional de dificil interpreragio para 0 piiblico em geral, salvo os especialistas, sendo que tal dificuldade existe também dentro dos préprios CBH's (ABERS, 2010, NOGUEIRA, 2004) As instituiges foram eriadas em ambientes his- Xéricos, sociais e politicos diferentes, com tarcfas de perspectivas também distintas, Quando se adiciona a esta situagéo o fato de que o arcabougo institucional «juridico & diversificado e complexo vé-se que ainda é dificil a interagio entre os érgéos componentes. Percebe-se que a politica prescreve um modelo de gestio descentralizado, democratizado e participati- vo, mas, na realidade, a atuagio é considerada como centralizada e cartorial. Centralizada na medida em {que nem todos os membros se encontram nas mesmas condigées técnicas e de poder organizacional para influenciar os processos institucionais. E cartorial porque os procedimentos de tomada de decisies estio fortemente baseados nos preceitos legais ¢ adminis- trativos, mais do na gestio em si. Especificamente sobre a temitica institucional, ficou evidenciada a preocupasio das liderangas sobre QUADRO 1 Restrig « possibilidades @ integracdo endégena e exégena do CBHRV Integragao Endégena Integragdo Exégena 7) Niveis de informagao, formagao téonica ® capacidade de lideranga para discus- bes ¢ partcipacdo sdo muito dstinlos; 2) Capacidade de interpretagao dos processos (documents, interacionais de conteddo) est relacionada a0 segmento de atuagao dos membros, de forma geral 3) Os subcomités que formam o CBHRV estdo em stuagbes estruturais muito diferentes, sendo que os da RMBH tém demonstrado maior participagao condigdes de atuagao, Restrigées 7) Os nivels e tpos de atuagao institucional dos érgaos vincula- dos com a gestéo de recursos hidricos & muito dferenciada; 2) 0 desenho insitucional varia conforme o tipo de organismo de bacia € 0 tipo de servigo piblico a ser executado; 3) A gestéo da agua na bacia 6 considerada pela perspectva técnica; 4) As discussbes ainda so disciplines, em uma temética que multdsciplnar por esséncia, 5) Os CBH's mineiros esto desaparelhados e em situagées muito dstntas de organizacao: 6) AGBPV com mais poder de decisdo do que o proprio CBHRV. 7) Os bancos de dados!informagées entre os érgaos séo dife- Tentes ¢ alguns desatualizados. 7) 0 desenho institucional atual do CBHRV favorece o aparecimento de espagos de interagao e discusséo de propostas entre os membros 2) Ainstalagdo de reinamentos sistemat- cos 2 partir das deficiéncias do comité podem melnorar qualitavamente as iscussdes internas e diminuir confit, Possibilidades “T/A gestio dos recursos hidricos tem sido paulatinamente considerada mais pela perspectiva polltica; 2) Com a consolidagéo de dados ¢ informagdes via sistema estadval e nacional, existe a possibilidade de aumento da integragda do planejamento da bacia 39 40 REGA Vol 12,0. 1, p. 31-42, jan un. 2015 a real capacidade de atuagio do modelo de gestio via comité ser integrado atualmente, pois seria uma arena de discusses mais democrética que a usual, mas ainda de pouca influéncia no sistema como um todo. Um fato que identifica isto, ¢ que foi por vezes citado nas entrevistas ¢ nas pesquisas de campo, é que cada instituigao componente do sistema age por simesma e nio costuma gir conjuntamente a outras no planejamento de suas agées. © poder piblico, destacadamente, o estadual ¢ o federal, ignoram as decisées do comité e nfo dialogam com o mesmo de forma permanente, Casos de entidades da sociedade civil, inclusive ao nivel académico, n4o sio consulta- das sobre eventuais ages na bacia hidrogréfica, foram identificados em varios momentos da pesquisa— fosse como representagio do segmento da sociedade civil ou como consulta para tomada de decis6es A composigéo dos secretariados, municipais ¢ estadual, diretamente relacionados com a gestio ambiental ¢ hidrica é tida como exemplo da falta de interacio interinstitucional, na medida em que néo sio normamente alinhados, de acordo com os entre- vistados, com as propostas de gestéo em discussio ha varios anos no CBHRV. antes” nao sio muitas Mais ainda, seus “repre veaes pessoaslliderangas do setor ambiental/hidrico € assim, pouco dislogo institucional & realizado Isso reflete uma incapacidade da realizagio de uma politica de governanga na medida em que a participagio a0 maximo possivel de todos os atores sociais é um pres- suposto da mesma (TORTAJADA, 2001; GREEN, 2007; THEODORO; MATOS, 2015). ‘Ao mesmo instante, mostra uma possivel distorso do sistema institucional e politico, que € paradoxal ao determinar agées conjuntas que sio poucas vezes identificadas no modelo quadtipartie. Assim, pode-se identificar que 0 CBHRV tam- bém nao possui uma pritica de gestio integrada a0 nivel endgeno, analisada comparativamente no Quadro 1, pois: 1) A pratica da gestéo quatripartite é muito nova bem pouco usual dentro do sistema de gestio estadual ¢ nacional, 0 que acarteta diferentes Ieicuras pelos membros do poder piblico em outras instancias; 2) Mesmo sendo um dos pioneiros ¢ dos mais influentes comités de bacia hidrogesfica, 0 CBHRY se intere em discussées ¢ determi- rages que envolvem outros comités de cons- tituigdes muito distintas - lembrando que s6 no Estado de Minas Gerais ha 36 Unidades de Planejamento ¢ Gestéo de Recursos Hidricos (UPGRH'); 3) Os recursos necessitios para que haja uma estruturagio considerada como adequada pelos membros e especialistas na gestio dos recursos hidricos em termos institucionais ¢ que incluitia melhorias significativas na troca de informagées, integragio de dados ¢ infor mages esté muito aquém do necessitio: 4) Grupos econémicos tém demonstrado possuir muito mais poder de influéncia ¢ coalizayio de inceresses entte/inter insticuigées do que os (CBH's c o CBHRV, em particular; 5) Tal como no ambito endégeno, os instrumen: tos de gestio sio considerados em diferentes perspectivas, de acordo com os interesses de cada segmento; 6) As decisbes que sio tomadas ao nivel do comité rio sio necessariamente acetas, respeitadas ou implantadas como previstas pelas instituigées piblicas de dircito, fato ja evidenciado em Abers (2010); Theodoro; Marques (2014); Nogueira (2004). CONCLUSGES Nesse artigo foi possivel abordar alguns pontos pertinentes & gestio de recursos hidricos em um comité de hacia que adota um modelo quatripartive de tomada de decisées, que é 0 CBHRV. Para sua realizagio, vale notar que a aplicacio de metodologia de triangulagio de métodos (trabalho de campo: documentos; entrevistas com liderangas) se mostrou apropriada para a identificagio de algumas restrigbes potencialidades a serem consideradas em politicas publicas fuvuras Verificou-se que dente as principais resttigées do comié estudado para um bom desempenho funcio- nal, em cariter enddgeno, as assimetrias existences em termos de accesso ¢ interpretasio informacional, réenico ¢ estrutural estéo muito presentes, Isso se reflete em dificuldades para a construgio de uma agenda mais propositiva ao comité. Por outro lado, 0 modelo quatripartite favorece que haja maior interagio entre os atores institucionais com possibili- dades de decis6es mais participativas e democriticas 20 longo prazo. JAexternamente, o CBHRV enfienta como desafio a questio de que a gestio hidrica tem sido con- Theodora, H.D.; Nascimento, N. O.; Helle, L. siderada como um viés técnico muito mais recortente do que politico, que é a esséncia da ideia de comité. Esse fato corrobora a importancia de que modelos de desenho institucional de representagio na gestio, ndo s6 0 quattipartite, sejam cada mais implemen- tados pata se favorecer o acesso A tomada de decisbes por todos os segmentos interessados. No ambiente do comité estudado, os discursos e argumentaydes técnicas gankam espagos que, originalmente, foram pensados para serem ocupados pelas demandas sociais em processos de interagio ¢, assim, andlises como as aqui efetuadas devem se tornar constante para favo- recer maior aprofundamento do tema. Adiciona-se a isto que os governos nio tém de- monstrado uma aproximagéo com a sociedade civil, e a mesma nao participa de forma consultiva/delibera- tiva das definigdes governamentais relativas 4 agenda (Os desafios instucionais de gosto hidrica em um modelo de paricipagdo quatripartte, ambiental chidrica, o que enfraqueceria a consolida- ‘sio de um processo de governanga integrado ‘Mais ainda, se identificou que a estrutura no somente informacional, mas também fisica e de recursos humanos envolvidos na gestio é bastante varidvel. O que se identifica ¢ que os aprimoramentos. instivucionais necessitios para o modelo quatripartite avangar. no CBHRY, especificamente, suas discusses cc aplicagées, ainda estio em andamento, na direcéo de efetivamente praticarem uma boa governanga. Destaca-se que esse processo pata se efetivar politicas publicas sob uma ética da governanga é ato continuo fem termos institucionais e sociais. Nesse sentido, coloca-se a perspectiva de que andlises constantes das suas resttigbes e potencialidades para futuros aprimo- ramentos se mostra necesséria para a superacio dos desafios postos ao modelo quatripartite. ABERS, R. N... Agua o Politica: atores, insituigbes e poder nos Organismos Colegiados de Bacia Hidrogratica no Brasil. $0 Paulo: Ar nablume, 2010. /AROEIRA RM, Recuperaco ambiental de bciashitrogrcas, Bela Hoon, Basin: MACHADO, AT. G.M. ela (Org},Revaizagdo doris no mundo: América, Europa e Asia. Belo Hotzant: Projo Manolo, p. 221-240, 2010 ‘ANA~Agéncia Nacional de Agus (Bras. 0 Comité de Bacia droga: pra eprocedimento. Caderos de capactago em recursos hides, v2, Bras: SAG, 2011 . Conjuntura ds recursos hidricos no Brasi: informe 2013, Brasilia: ANA, 2013, BARDIN, L. Analise de conteddo, Lisboa: Edgdes 70, 1994 BONTEMPO, V.L; OLIVIER, C: MOREIRA, C. WS; OLIVEIRA, G. Gostdo de aguas urbanas em Bolo Horizonte: avanos e rettocessos. 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