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Criminologia

INTRODUÇÃO À CRIMINOLOGIA,
EVOLUÇÃO HISTÓRICA E ESCOLAS
CRIMINOLÓGICAS
Coordenadores
Flávio Marcelo Sérvio Borges, juiz federal
Gabriel Brum, juiz federal

Professores
Adrian Amorim, juiz federal
Ana Lya Ferraz da Gama Ferreira, juíza federal
Bernardo Lima Vasconcelos, juiz federal
Carlos Henrique Pereira Leite, procurador do trabalho
Carolina Rita Torres Gruber, promotora de justiça
Cristiane Bonfim, juíza de direito
Daniel Santos Rocha Sobral, juiz federal
Ermano Portela, juiz de direito
Eudóxio Cêspedes Paes, juiz federal
Francisco Vieira, juiz federal
Gabriel José Queiroz Neto, juiz federal
Gérson Henrique Silva Sousa, defensor público estadual
Guilherme Fernandes Ferreira Tavares, procurador da república
Gustavo André Oliveira Santos, juiz federal
João Paulo Abe, juiz federal
José Renato de Oliveira, procurador da fazenda nacional
Otávio Balestra, procurador da república
Paulo Augusto Moreira Lima, juiz federal
Paulo Sérgio Ribeiro, juiz federal
Rafael Ghattas, procurador do estado

Líder em aprovação nos mais exigentes concursos públicos.


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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Para um estudo doutrinário, indica-se a leitura das páginas 19 a 89 (DE OLIVEIRA, Natacha Alves.
Criminologia, 2ª edição)

Sumário
Conceito de Criminologia ................................................................................................................................................................................................. 3
História da Criminologia .................................................................................................................................................................................................. 3
Evolução Histórica do Direito de Punir e Formação da Sociedade Disciplinar ............................................................................................................... 7
Escolas Criminológicas .................................................................................................................................................................................................... 9
Escola Clássica (ou Retribucionista) ......................................................................................................................................................................................................................... 9
Escola Positiva (ou Positivista) ................................................................................................................................................................................................................................ 10
Cesare Lombroso (1835-1909) ......................................................................................................................................................................................................................... 11
Enrico Ferri (1856-1929) .................................................................................................................................................................................................................................... 12
Raffaele Garofalo (1851-1934).......................................................................................................................................................................................................................... 12
Escola de Lyon (Escola Antropossocial ou Criminal-Sociológica) ...................................................................................................................................................................... 13
Terza Scuola Italiana (“Terceira Escola Italiana”).................................................................................................................................................................................................. 13
Escola Técnico-Jurídica ........................................................................................................................................................................................................................................... 14
Escola Sociológica Alemã ......................................................................................................................................................................................................................................... 14
Escola Correcionalista............................................................................................................................................................................................................................................... 15
Escola da Nova Defesa Social .................................................................................................................................................................................................................................. 16
Movimento Psicossociológico ................................................................................................................................................................................................................................. 16
Movimento Lei e Ordem ............................................................................................................................................................................................................................................ 17

Finalidades da Criminologia........................................................................................................................................................................................... 17
Métodos da Criminologia ............................................................................................................................................................................................... 18
Objeto da Criminologia................................................................................................................................................................................................... 18
Delito ........................................................................................................................................................................................................................................................................... 18
Delinquente ................................................................................................................................................................................................................................................................. 19
Vítima .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 20
Controle Social ........................................................................................................................................................................................................................................................... 20

Criminologia e Direito Penal........................................................................................................................................................................................... 22


Criminologia e Política Criminal ..................................................................................................................................................................................... 22
Classificação da Criminologia ....................................................................................................................................................................................... 22
Modelos Teóricos da Criminologia ................................................................................................................................................................................ 25
Criminologia Clássica e Neoclássica ...................................................................................................................................................................................................................... 25
Criminologia Positivista ............................................................................................................................................................................................................................................ 25
Criminologia Moderna ............................................................................................................................................................................................................................................... 25

É expressamente proibida a divulgação deste material, cujo uso é restrito às partes contratantes, sob pena de se caracterizar violação à Lei 9.610/98, com a responsabilização civil e criminal dos envolvidos.
Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Conceito de Criminologia
Etimologicamente, a palavra criminologia vem de crimino (crime, em latim) e logos (estudo, do grego),
significando estudo do crime.

Trata-se de uma ciência autônoma, empírica e interdisciplinar, cujo objeto é o estudo do crime, do criminoso,
da vítima e do controle social do fato criminoso, visando a prevenção e o controle da criminalidade.

É empírica porque se baseia na experiência e na observação da realidade (método empírico-indutivo, também


chamado de indutivo-experimental ou indutivo-quantitativo). Foca no “ser”; não, no “dever ser” (valores; normas).
Difere, pois, do Direito, que é uma ciência do “dever ser”, situada no plano dos valores (normas).

Por outro lado, é interdisciplinar porque se vale do conhecimento de diversos ramos, como a sociologia, a
psicologia, o direito, a biologia, a medicina legal, a psiquiatria, a antropologia etc.

(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) A Criminologia adquiriu autonomia e status de ciência


quando o positivismo generalizou o emprego de seu método. Nesse sentido, é correto afirmar que a
criminologia é uma ciência.
a) do “dever ser”; logo, utiliza-se do método abstrato, formal e dedutivo, baseado em deduções lógicas
e da opinião tradicional.
b) empírica e teorética; logo, utiliza-se do método indutivo e empírico, baseado em deduções lógicas
e opinativas tradicionais.
c) do “ser”; logo, serve-se do método indutivo e empírico, baseado na análise e observação da
realidade.
d) do “dever ser”; logo, utiliza-se do método indutivo e empírico, baseado na análise e observação da
realidade.
e) do “ser”; logo, serve-se do método abstrato, formal e dedutivo, baseado em deduções lógicas e da
opinião tradicional.

Gabarito: (c).

História da Criminologia
Falaremos, preambularmente, sobre a história da criminologia, de uma maneira geral, e, na sequência,
abordaremos especificamente as várias Escolas Criminológicas, detalhando alguns aspectos que, nesta visão inicial
da evolução histórica da disciplina, serão meramente pincelados, de forma mais rápida.

Costuma-se dividir a história da criminologia em período pré-científico e período científico.

O período pré-científico vem desde a antiguidade, quando já se encontravam escritos revelando a preocupação
com o fenômeno criminoso.

É expressamente proibida a divulgação deste material, cujo uso é restrito às partes contratantes, sob pena de se caracterizar violação à Lei 9.610/98, com a responsabilização civil e criminal dos envolvidos.
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e Escolas Criminológicas

O início do período científico — que corresponde ao término do período pré-científico, logicamente — se deu
com Cesare Lombroso e sua obra O Homem Delinquente (L’Uomo delinquente, 1876). Segundo a doutrina majoritária,
é esse o nascimento da criminologia científica.

Alguns autores, no entanto, indicam o início da criminologia científica com o antropólogo francês Paul Topinard,
que teria sido o primeiro a utilizar o termo “criminologia”, em 1879. Outros apontam Rafaelle Garofalo, que, em 1885,
utilizou esse termo como título de uma obra científica, compreendendo a criminologia como a ciência da
criminalidade, do delito e da pena. Ainda, a Escola Clássica (que estudaremos a seguir) assevera que teria sido
Francesco Carrara o pioneiro da criminologia científica, no livro Programa de Direito Criminal (1859). No Brasil,
reconhece-se o seu surgimento com João Vieira de Araújo e sua obra Ensaios sobre Direito Penal (1884).

Na antiguidade, despontam os seguintes pensadores e suas reflexões em torno do crime e sua punição:

a) Protágoras (485-415 a.C.) intuiu o efeito preventivo da pena como mecanismo para evitar novas
infrações (exemplo aos demais indivíduos);

b) Sócrates (470-399 a.C.) defendia ensinar o criminoso a não reiterar a conduta delitiva
(ressocialização);

c) Hipócrates (460-355 a.C.) colocou as premissas da imputabilidade penal, relacionando os vícios à


loucura e reconhecendo a irresponsabilidade penal do homem acometido de insanidade mental;

d) Isócrates (436-338 a.C.) forneceu as bases do conceito de coautoria ao atribuir responsabilidade ao


agente que oculta o delito;

e) Platão (427-347 a.C.) dizendo que a cobiça (ganância, cupidez) gerava a criminalidade, ligou o crime a
fatores econômicos; e

f) Aristóteles (388-322 a.C.) também relacionou a criminalidade a fatores econômicos.

Ainda na antiguidade, merece menção o Código de Hamurabi (que acolhia a chamada Lei do Talião, olho por
olho, dente por dente). É curioso notar que se previa, nessa vetusta codificação, que ricos, por terem tido maiores
oportunidades, deveriam ser julgados com mais severidade do que os pobres.

Características do estudo sobre o fenômeno criminoso nesse período:

a) inexistência de um estudo sistematizado sobre o crime e o criminoso;

b) explicação sobrenatural ou religiosa para o crime, visto como pecado;

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c) demonismo, relacionando o mal com o demônio e atribuindo ao criminoso uma personalidade diabólica
(frise-se que os doentes mentais eram tidos como acometidos por possessão demoníaca, ideia só
superada por completo com a psiquiatria de Pinel).

Na Idade Média, com o sistema feudal e a expansão do cristianismo, o crime, sob a influência da filosofia
escolástica e da teologia, era associado ao pecado, e o criminoso, ao pecador. Devem ser mencionadas, também, as
ordálias ou juízos de Deus, que representava um meio de prova judiciária para identificar a culpa ou a inocência do
acusado mediante elementos aleatórios da natureza, cujo resultado era tido como um juízo divino sobre o caso.
Quanto aos pensadores, destacam-se:

a) Santo Agostinho (354-430 d.C.) via a pena — ao lado do seu caráter intimidatório — como medida de
defesa social e meio para a ressocialização do delinquente;

b) São Tomás de Aquino (1226-1274 d.C.): precursor da justiça distributiva (dar a cada um o que lhe é
devido, segundo critérios de igualdade), indicava a pobreza como uma das causas do roubo e, ao
justificar o furto famélico, esboçava o estado de necessidade como excludente de ilicitude.

Na Idade Moderna, é oportuno destacar, no século XVI, o pensamento de Thomas Morus (1478-1535), em sua
obra Utopia (1516), que relacionava o crime à desorganização social e à pobreza, considerando-o um reflexo da
sociedade.

Surgem, na sequência (séculos XVII e XVIII), os chamados fisionomistas, que buscavam associar a fisionomia
do indivíduo com a criminalidade. Destaque para Della Porta (1535-1616) e Johann Kaspar Lavater (1741-1801), este
com sua concepção sobre o “homem de maldade natural”, tomando por base a semelhança entre o comportamento
humano e o dos animais. Como expressão desse pensamento, o Marquês de Moscardi, em Nápoles, tinha o curioso
hábito de falar em “observada a face e a cabeça” como fórmula antecedente à sentença condenatória (veja-se que,
muito antes disso, o “Édito de Valério”, imperador romano do século IV, indicava que, no caso de dúvida entre dois
acusados, dever-se-ia atribuir a culpa ao mais feio).

A cranioscopia decorre desse pensamento fisionomista. Difundida por Franz Joseph Gall (1758-1828) e John
Gaspar Spurzhem (1776-1832), sustentava que, pela medição da cabeça e análise da forma externa do crânio, seria
possível determinar o caráter e a personalidade do indivíduo, inclusive a propensão ao crime.

No seguimento, a frenologia1 — considerada como precursora da moderna neurofisiologia e da


neuropsiquiatria, também atribuída ao médico alemão Franz Joseph Gall com sua teoria da localização ou teoria do
crânio, — voltava-se à análise das faculdades mentais do indivíduo, buscando identificar a localização física de cada
função anímica do cérebro e relacionando o comportamento criminoso a más formações dele.

1
Doutrina segundo a qual as faculdades mentais se localizam em uma parte do córtex cerebral e o tamanho de cada parte é proporcional ao desenvolvimento da
respectiva faculdade, sendo este tamanho indicado pela configuração externa do crânio.

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Ainda no século XVIII, a psiquiatria se desenvolve como ciência autônoma a partir dos estudos do médico
francês Philippe Pinel (1745-1826). Superando o pensamento demonológico (doente mental como um possuído pelo
demônio), Pinel também promoveu diagnósticos que distinguiam os criminosos dos enfermos mentais (aos quais
seria devido tratamento, e, não, castigo).

A chamada Escola Clássica (sobre a qual falaremos mais a fundo na sequência) aflora no final do século XVIII,
caracterizada pelo predomínio do método lógico-abstrato e dedutivo (silogismos) e pela fundamentação da
responsabilidade penal a partir da ideia de livre arbítrio. Destaque para Cesare Beccaria2 (e seu clássico Dos delitos
e das penas, 1764), Francesco Carrara e Giovanni Carmignani.

No século XIX, ganha impulso o empirismo e o método experimental ou indutivo (concretismo, verificação
prática do delito e do delinquente), com desprestígio ao método abstrato e dedutivo do silogismo clássico. E, no final
desse mesmo século, sob inspiração dos fisionomistas e da frenologia, nasce o positivismo criminológico, com a
Scuola Positiva italiana (Escola Positiva) cujos expoentes foram Lombroso, Ferri e Garofalo:

a) Cesare Lombroso (1835-1909): autor da obra O homem delinquente (“L’Uomo delinquente”), de 1876,
é considerado o pai da criminologia e criador da antropologia criminal, tendo adotado o método
empírico em suas investigações e defendido o determinismo biológico no âmbito criminal;

b) Enrico Ferri (1856-1929): com sua obra Sociologia Criminal, de 1914, diminuiu a relevância do livre-
-arbítrio, sustentando o determinismo social e considerando o delito como um fenômeno social
determinado por causas naturais;

c) Raffaele Garofalo (1851-1934): atribui-se-lhe a criação do termo “criminologia”, tendo defendido a


existência de duas espécies de delitos: os delitos legais e os delitos naturais (que estudaremos mais
abaixo).

De se mencionar, outrossim, a criação da estatística científica por Adolphe Quetelet (1796-1864), que
possibilitou o surgimento da estatística criminal. Autor da obra Física Social (1835), associou, com sua Teoria das
Leis Térmicas, determinados tipos de delitos às estações do ano (inverno, mais crimes patrimoniais; verão, mais
crimes contra a pessoa; primavera, mais crimes contra a dignidade sexual), a partir de três princípios: o delito é um
fenômeno social; os delitos são praticados de forma periódica; a criminalidade está relacionada a fatores como o
analfabetismo, a miséria, o clima etc. Foi Quetelet, ademais, que desenvolveu a ideia de homem médio, de ampla
utilização pelos operadores do Direito como parâmetro de qual seria o comportamento esperado de uma pessoa
mediana.

O período da sociologia criminal — sob a influência de Auguste Comte (1789-1857), criador da corrente
filosófica do positivismo e da sociologia moderna — compreende o crime como um fenômeno social e enfatiza a

2
Assim conhecido, mas cujo nome, na verdade, era Cesare Bonesana (1738-1796), marquês de Beccaria.

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e Escolas Criminológicas

influência dos fatores do ambiente social (fatores exógenos) sobre a conduta individual e a prática criminosa. Como
expoentes, citam-se:

a) Alexandre Lacassagne (1843-1924): fundador da Escola Francesa de Lyon e tido como um dos
principais opositores à Escola Italiana de Lombroso. Ideia fundamental: o criminoso apresenta uma
predisposição latente para o delito, que é impulsionada pelo meio social;

b) Durkheim (1858-1917) vê o crime como fenômeno normal na sociedade, contanto que observado o
limite estabelecido para cada tipo social. Crime não é uma “doença” social, mas algo natural;

c) Jean-Gabriel de Tarde (1843-1904) critica a obra de Lombroso, realçando a importância dos


condicionamentos sociais e da imitação como uma teoria antecipada da aprendizagem, que se
transmitiria por gerações.

No final do século XIX, também merece ênfase o surgimento da criminologia socialista em sentido amplo, que
explicava o crime a partir da natureza da sociedade capitalista, a ser solapada com a instauração do socialismo.
Principais expoentes: Karl Marx (1818-1883) e Friederich Engels (1820-1895). É da mesma época, também, a
antropometria criminal (conhecida como bertillonagem), de 1882, e atribuída a Alphonse Bertillon (1853-1914), que
visava a identificação de criminosos pelo registro de suas medidas e marcas pessoais (tatuagens, cicatrizes, sinais
de nascença etc.). Assim surgiu o assinalamento antropométrico e a fotografia judiciária. Na década seguinte, aliás,
adveio o sistema datiloscópico de identificação, demonstrado cientificamente em 1904 pelo croata-argentino Juan
Vucetich (1858-1925).

No início do século XX, apesar do ecletismo (mistura de correntes), restou abandonado de vez o antropologismo
lombrosiano, substituído, de modo gradativo, por teorias com viés psicológico, psicanalítico, psiquiátrico etc. Nesse
processo, mostrou-se relevante a influência moderadora da União Internacional de Direito Penal, fundada em 1889
por Hamel, Liszt e Prins.

Após a Primeira Guerra Mundial, ganhou destaque a sociologia criminal norte-americana (Sutherland e Sellin),
de caráter prático e sociológico, que se difundiu por vários países ocidentais, bem como o surgimento da criminologia
socialista em sentido estrito, debruçando-se sobre as causas do crime nos países socialistas, a partir dos princípios
do marxismo-leninismo.

Evolução Histórica do Direito de Punir e Formação da Sociedade


Disciplinar
De um modo geral, podemos falar em três períodos:

a) período da vingança privada, com três vertentes: (i) vingança privada stricto sensu (sob a Lei do Talião,
a vítima é detentora do poder punitivo — olho por olho, dente por dente); (ii) vingança divina (fase

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e Escolas Criminológicas

mitológica da criminologia): poder punitivo atribuído à Igreja, com a culpabilidade sujeita a ordálias
(juízos de Deus); (iii) vingança pública: o rei assume o poder punitivo, com execuções públicas e ritual
sádico (ciclo do terror), as quais, segundo Michel Foucault, eram uma “fornalha em que se acende a
violência”;

b) período humanista: inicia-se com o surgimento do Estado Liberal (séculos XVII e XVIII) e o iluminismo,
com destaque para John Locke, atribuindo-se à pena um caráter retribucionista. A passagem do século
XVIII para o século XIX trouxe consigo o progressivo abandono dos suplícios (execuções públicas). A
pena recai sobre a liberdade do indivíduo, e não mais sobre o corpo do delinquente. A dor e o sofrimento
físico (suplício) não mais são elementos integrantes da pena. Segundo Michel Foucault (1926-1984),
em sua clássica obra Vigiar e punir, a reforma penal ocorrida no século XVIII (também chamada de
reforma humanista do Direito Penal) teve como mote constituir uma nova economia e uma nova
tecnologia do poder de punir, cujos elementos importantes são a necessidade de uma classificação
paralela dos crimes e dos castigos e a necessidade de uma individualização das penas em
conformidade com as características de cada criminoso;

c) período científico: iniciado com o Naturalismo dos séculos XIX e XX, deu origem ao positivismo
criminológico e imprimiu à pena a finalidade de defesa social.

É pertinente observar que a humanização do sistema penal substitui a figura do carrasco por outros
profissionais (carcereiro, médico, psicólogo, psiquiatra e educadores), e a pena de morte perde resquícios de suplício
(ainda subsiste, mas ganha celeridade, no sentido de que o objetivo não mais é infligir sofrimento ao criminoso). O
sistema penitenciário funda-se na recuperação do condenado, na classificação dos presos segundo critérios de sexo,
personalidade, periculosidade etc., e no sistema progressivo de cumprimento. A pena, destarte, deixa de ter somente
um perfil retribucionista, prestando-se também ao controle do comportamento desviante, à neutralização da
periculosidade de indivíduos e à promoção da ressocialização. O indivíduo aceita as leis da sociedade — pacto social
—, e a prática de uma conduta definida como crime rompe esse pacto, legitimando a pena como defesa da sociedade.
A crença na certeza da punição, nesse contexto, é que traz em si o efeito dissuasório das condutas criminosas —
persuadindo o indivíduo a não cometer o delito; e, não, as violentas execuções públicas. Passa-se a estudar o delito
e suas causas, a pessoa do delinquente, os motivos do crime, as influências do meio social, sua índole,
hereditariedade etc. A interdisciplinariedade ganha força, com a abertura para profissionais de outros ramos do
conhecimento (ex.: psicologia, psiquiatria etc.).

No contexto histórico de ascensão da burguesia à classe política dominante no século XVIII e do surgimento
do Estado de Direito, assistiu-se também à formação da sociedade disciplinar, de que é expressão a modalidade
panóptica3 de poder. Michele Foucault (1926-1984), em sua clássica obra Vigiar e Punir (1975), fala em três
instrumentos para o exercício do poder disciplinar (“bom adestramento” é o termo que utiliza):

3
O termo panóptico ou pan-óptico foi originariamente difundido pelo filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham, em 1785, para designar uma penitenciária ideal,
em arquitetura que permite a um único vigilante (na torre de vigilância, central) observar todos os prisioneiros, sem que estes possam saber se estão ou não
sendo observados (ou seja, o medo de estarem sendo vigiados impele à adoção do comportamento desejado pelo vigilante).

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e Escolas Criminológicas

a) vigilância hierárquica: por meio de um aparato em que “as técnicas que permitem ver induzam a efeitos
de poder, e onde, em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se
aplicam”; observatórios da multiplicidade humana que permitem a vigilância hierarquizada, contínua e
funcional;

b) sanção normalizadora: sujeita-se à pena disciplinar todo desvio, inadequação, inconformidade às


regras etc., apresentando o castigo disciplinar um caráter corretivo, cuja finalidade é reduzir os desvios,
e privilegiando-se as punições, que são da ordem de exercício, visando a intensificar o aprendizado por
meio da repetição, de sua insistência redobrada, ao invés da noção de vingança pela lei ultrajada;

c) exame: combinando a vigilância hierárquica e a sanção normalizadora, tem como representação desse
modelo a figura arquitetural do panóptico de Bentham, consistente na organização das unidades
especiais que propicia um sistema de vigilância de efeitos permanentes, ainda que sua ação seja
descontínua, induzindo o detento a um estado consciente e perene de visibilidade, a fim de assegurar
o funcionamento do poder, que deve ser visível (observação constante pelo detento da torre central de
onde é vigiado) e inverificável (o detento não deve ter a certeza de que está sendo vigiado, mas, sim, da
possibilidade de sê-lo). Importa que o prisioneiro se sinta vigiado, ainda que efetivamente não o seja.
O monitoramento eletrônico de presos, via colocação de tornozeleiras eletrônicas, é exemplo de
panoptismo, cuja função de vigilância é exercida com auxílio de um software de georrastreamento.

Escolas Criminológicas

Escola Clássica (ou Retribucionista)


Surgida no século XVIII, no contexto da filosofia iluminista, caracterizou-se pelo predomínio do método lógico-
-abstrato ou dedutivo, focando no estudo do fenômeno criminoso e fundamentando a responsabilidade penal
segundo uma concepção contratualista (contrato social), em que o indivíduo, dotado de livre-arbítrio
(autodeterminação ou princípio do indeterminismo), ao descumprir a lei de forma livre e consciente, submete-se à
pena como resposta objetiva à prática delitiva e como modo de restabelecimento da ordem jurídica violada. Noutras
palavras, a pena — que deve ser certa, previamente estabelecida em lei e proporcional ao crime cometido — assume
um caráter retribucionista e dissuasório.

Cesare Beccaria é um grande expoente desse período. Em sua clássica obra Dos delitos e das penas (1764),
defendeu, de uma maneira geral, a humanização da pena e a limitação do poder estatal, enfatizando: os princípios da
legalidade e da anterioridade penal, com leis claras e simples; a proporcionalidade da pena; a vedação da tortura; a
finalidade preventiva da pena (utilidade), visando evitar a reincidência (efeito dissuasório); o julgamento por
autoridade judicial e o princípio da presunção da inocência, com prisões preventivas revestidas de cautelaridade, e,
não, como pena antecipada; vedação da pena de morte, salvo em caso de instabilidade político-social e desde que
seja o único meio para dissuadir a prática do delito.

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Francesco Carrara, também nesse período, concebe o delito como ente jurídico, não o considerando como um
simples fato, mas uma relação contraditória entre a conduta humana e a lei. Nele, têm-se uma força física (movimento
corpóreo de execução do crime e produção do resultado) e uma força moral (vontade livre e consciente de delinquir).

* Nomes associados à Escola Clássica (ou Retribucionista): Cesare Beccaria, Francesco Carrara, Jean
Domenico Romagnosi, Jeremias Bentham, Franz Joseph Gall, Anselmo Von Feuerbach, Giovanni Carmignani,
Pelegrino Rossi, Emílio Brusa e Enrico Pessina.

(MP/GO-promotor-2019-reaplicação) A chamada Escola Clássica do Direito Penal tem como


caracteres, dentre outros, os seguintes: o Direito tem uma natureza transcendente, segue a ordem
imutável da lei natural; o delinquente é, em regra, um homem normal, que se sente livre para optar
entre o bem e o mal, e preferiu o último; os objetos de estudo do Direito Penal são o delito, a pena e o
processo. Um importante autor dessa época é Carrara.
Gabarito: certo.

Interessa notar que a doutrina aponta a exigibilidade de conduta diversa (pressuposto da culpabilidade) como
um reflexo do classicismo na dogmática jurídico-penal. Também são indicadas duas teorias atuais que têm por base
o pensamento clássico:

a) Teoria da Escolha Racional (Clark e Cornish): ela explica a conduta criminosa em uma decisão racional
dos criminosos, pela lógica da maximização dos ganhos e da redução dos custos, e, não, a partir de
tendências psicológicas ou sociais;

b) Teoria das Atividades Rotineiras (L. E. Cohen e Felson): ela também considera a prática delitiva como
produto de uma escolha racional entre custos e benefícios, mas, sob a influência da Escola de Chicago,
entende que a organização social pode facilitar a prática de determinados crimes.

Escola Positiva (ou Positivista)


No século XIX, começa a se delinear um caráter científico aos estudos criminológicos, identificando-se o
nascimento da criminologia científica com a publicação, em 1876, da obra O homem delinquente (L’Uomo
delinquente), de Cesare Lombroso (entendimento majoritário, conforme vimos).

Prestigiando o método empírico-indutivo (indutivo-experimental ou indutivo-quantitativo), buscou explicar as


causas do delito (como fato humano e social) a partir da observação da realidade (mundo sensível, fenomênico) e
estabelecer formas de reação como defesa da sociedade. A figura do criminoso torna-se o centro do estudo da
criminologia, com predomínio da crença no determinismo (negação do livre-arbítrio) e na necessidade de tratamento
do criminoso.

A pena, por sua vez, serve menos à prevenção geral da prática de delitos do que à prevenção especial, como
instrumento de defesa social. Distanciando-se do caráter retribucionista da pena (enfatizado pela Escola Clássica),
Enrico Ferri e Raffaele Garofalo defenderam sua aplicação como instrumento de defesa social, ante a periculosidade
do delinquente.

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Costuma-se dividir a Escola Positiva em três vertentes:

a) antropológica ou antropobiológica: explicando o fenômeno criminal a partir de fatores biológicos e


dados estatísticos, ela tem em Cesare Lombroso (1835-1909) o seu principal expoente;

b) sociológica: é capitaneada por Enrico Ferri (1856-1929) e sua obra Sociologia Criminale;

c) jurídica: é liderada por Rafaelle Garofalo (1852-1934) e sua obra Criminologia.

* Nomes associados à Escola Positiva: Cesare Lombroso, Enrico Ferri, Rafaelle Garfalo, Maino Puglia, Calderoni,
Florian, Grispigni, Ranieri e Altavilla. No Brasil, as ideias da Escola Positiva encontram eco na obra eminentemente
racista de Raimundo Nina Rodrigues (autor do livro As raças humanas e a responsabilidade penal no Brasil , de 1894),
conhecido como “o Lombroso dos Trópicos”).

Pela relevância ímpar de Lombroso, Ferri e Garofalo para a Escola Positiva e o próprio desenvolvimento da
criminologia, vejamos os pontos essenciais do pensamento de cada um.

Cesare Lombroso (1835-1909)


Tido como pai da criminologia e criador também da antropologia criminal, o médico italiano defendia o
determinismo biológico no âmbito criminal (e, não, o livre-arbítrio esgrimido pela Escola Clássica).

Com sua obra L’Uomo Delinquente (1876), desenvolveu, sob a influência da fisionomia e da frenologia, a
concepção de criminoso nato (termo utilizado primeiro por Enrico Ferri, na obra Os criminosos na arte e na literatura,
de 1881) a partir do estudo da anatomia dos criminosos e da identificação de seus traços atávicos simiescos4
(reprodução de características do homem primitivo e de animais), que explicariam o seu comportamento selvagem.
Nessa ordem de ideias, aponta como características físicas do homem delinquente a existência de mandíbula grande,
ossos do rosto pronunciados, sobrancelhas fartas, orelhas grandes e deformadas, molares salientes etc. Também
cita características anímicas do criminoso, como a analgesia (sensibilidade à dor diminuída), a tendência a fazer
tatuagens, a falta de senso moral, o caráter impulsivo, a crueldade etc., indicando a epilepsia como fator relevante na
origem da criminalidade. Classifica os criminosos em: natos, loucos, passionais e ocasionais.

A distinção entre criminoso e não criminoso é feita, portanto, a partir de anomalias e estigmas. Para o
positivismo antropológico de Lombroso, o delito é um fenômeno biológico (e, não, um ente jurídico, como na Escola
Clássica), do que resulta que determinados indivíduos seriam mais propensos a delinquir, de acordo com as suas
características físicas e psíquicas. Frise-se, no entanto, que, posteriormente, Lombroso acabou reconhecendo a
influência de causas sociais para a criminalidade.

4
“Atávicos” vem de atavismo, significando, nesse contexto, hereditariedade biológica de características psicológicas, intelectuais, comportamentais; “simiescos”,
por sua vez, é relativo a ou parecido com macaco ('símio').

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É expressamente proibida a divulgação deste material, cujo uso é restrito às partes contratantes, sob pena de se caracterizar violação à Lei 9.610/98, com a responsabilização civil e criminal dos envolvidos.
Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Apesar da grande crítica a muitas das concepções lombrosianas, é inegável sua grande contribuição com o
desenvolvimento do método empírico-indutivo (ou indutivo-experimental) utilizado em suas pesquisas. É
interessante notar, outrossim, a influência sobre a criminologia clínica e o correlato desenvolvimento de estudos
biotipológicos, endocrinológicos e psicopatológicos, merecendo menção, ainda, a teoria da bioantropologia moderna,
que promove estudos a partir do DNA dos indivíduos.

Enrico Ferri (1856-1929)


Autor do livro Sociologia Criminale (1914), aponta como causas do delito os fatores antropológicos, sociais e
físicos ou telúricos (que derivam da natureza, como o clima, a temperatura, as estações do ano etc.). Defende o
determinismo social e a tese de negativa do livre-arbítrio, recusando a ideia de que o crime seria fruto da liberdade
de escolha do delinquente.

Atribui-se a Ferri a Lei da Saturação Criminal, segundo a qual há delitos que são cometidos em determinadas
condições sociais e, em circunstâncias excepcionais do meio social, pode haver um aumento nas taxas de
criminalidade (sobressaturação criminal).

A par disso, é de se notar que Ferri relaciona o determinismo ao crime e à periculosidade do seu autor, de modo
que a pena deve visar o delinquente, e, não, o delito (fato). Por isso, é necessária a neutralização do criminoso,
segregando-o do convício social como uma forma de defesa da sociedade.

A influência do pensamento de Ferri é perceptível na teoria dos substitutivos penais, segundo a qual deve haver
uma priorização dos meios preventivos no enfrentamento da criminalidade, com a adoção de medidas de ordem
econômica, política, científica, religiosa, educativa etc.

Assim como Lombroso, Ferri fala na figura do criminoso nato (a expressão, repise-se, é atribuída primeiro a
Ferri, na obra Os criminosos na arte e na literatura, de 1881). Distancia-se de Lombroso, no entanto, porque foca no
aspecto social (determinismo social), enquanto a concepção lombrosiana está centrada no fator individual
(antropologia criminológica). Note-se, porém, que Ferri, à semelhança de Lombroso, classifica os criminosos em:
natos, loucos, passionais, ocasionais e habituais.

Raffaele Garofalo (1851-1934)


Ministro da Corte de Apelação de Nápoles e autor da obra Criminologia (1885), é tido como o responsável pelo
surgimento da palavra criminologia, que, na sua concepção, significava a ciência da criminalidade, do delito e da
pena.

Para Garofalo, o crime deriva da natureza degenerada do indivíduo, representando um sintoma de uma
anomalia moral ou psíquica. Enfatiza, pois, o elemento psicológico, criando o conceito de temibilidade ou
periculosidade e defendendo a medida de segurança como nova modalidade de sanção penal, centrada na
necessidade de tratamento do criminoso. No mais, reforça a ideia de prevenção especial como finalidade da pena.

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É expressamente proibida a divulgação deste material, cujo uso é restrito às partes contratantes, sob pena de se caracterizar violação à Lei 9.610/98, com a responsabilização civil e criminal dos envolvidos.
Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Também é atribuída a Garofalo a classificação do delito em duas espécies:

a) delitos legais: eles não ofendem o senso comum de moralidade, altruísmo ou piedade, de sorte que a
sua tipificação como crime pode variar de localidade para localidade. É dizer, a depender da vontade
política de um cada Estado, poderão, ou não, ser definidos como crime;

b) delitos naturais: eles ofendem o senso comum de moralidade, altruísmo ou piedade,


independentemente da época ou localidade.

Quanto à classificação dos criminosos, Garofalo fala em: assassinos, violentos (enérgicos), ladrões
(neurastênicos) e lascivos (cínicos).

(MP/GO-promotor-2019-reaplicação) Dentre outros, são caracteres da Escola Positiva: o


entendimento do Direito Penal como um produto social, obra humana; o delito é um fenômeno
natural e social (fatores individuais, físicos e sociais); a pena é um meio de defesa social, com função
preventiva. Podem ser citados como importantes expoentes da Escola Positiva Cesar Lombroso e
Enrico Ferri.
Gabarito: certo.

(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) A criminologia tradicional examina a pessoa do infrator


como uma realidade biopsicopatológica, considerando o determinismo biológico e social.
Gabarito: certo.

Escola de Lyon (Escola Antropossocial ou Criminal-Sociológica)


Tendo como seu principal expoente Alexandre Lacassagne (1843-1924), a Escola de Lyon defende que o
delinquente apresenta uma predisposição pessoal para o crime, que permanece latente e aflora de acordo com sua
interação com o meio social. Destarte, reconhece um aspecto patológico da delinquência, mas enfatiza a importância
do fator social para a criminalidade. Daí a célebre frase de Lacassagne, para quem “as sociedades têm os criminosos
que merecem”; é interessante, ademais, a analogia que faz entre o crime e os micróbios, que permanecem inócuos
até o advento de condições (ambiente) que propiciem sua manifestação e desenvolvimento.

* Principais nomes da Escola de Lyon: Alexandre Lacassagne, Aubry, Martin y Locard, Bournet y Chassinand,
Coutagne, Massenet, Manouvrier, Letorneau e Topinard.

Terza Scuola Italiana (“Terceira Escola Italiana”)


Remontando ao início do século XX, a Terza Scuola Italiana (“Terceira Escola Italiana”) busca conciliar as ideias
clássicas e positivistas e reconhece o crime como um fenômeno individual e social, fundamentando a pena na
responsabilidade moral do delinquente, mas com base no determinismo. Ainda quanto à pena, atribui-lhe caráter
aflitivo com a finalidade de defesa social; para o controle da criminalidade, apregoa a necessidade de uma reforma
social. No mais, é característica dessa escola de pensamento a distinção entre imputáveis e inimputáveis.

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

* Principais nomes da Terza Scuola Italiana (“Terceira Escola Italiana”): Bernardino Alimena, Giuseppe
Impallomeni e Manuel Carnevale.

Escola Técnico-Jurídica
Surgida em 1905 como uma reação à Escola Positivista, compreende o crime como uma relação jurídica, de
conteúdo individual e social, e a pena como consequência e reação ao crime, com a finalidade de prevenção geral e
especial.

Defendeu a autonomia da ciência penal, apontando que o Direito Penal se deve limitar ao estudo do direito
positivo (exegese, dogmática e crítica).

* Principais nomes da Escola Técnico-Jurídica: Arturo Rocco, Manzini, Massari, Detiala, Cicala, Vanini e Conti.

Escola Sociológica Alemã


Também chamada de Escola de Política Criminal, Escola Moderna, Nova Escola ou Escola de Marburgo, a
Escola Sociológica Alemã foi capitaneada por Franz von Lizst (1851-1919), célebre por sua aula inaugural em
Marburgo (daí falar-se em Programa de Marburgo), em 1882, intitulada A ideia de fim no Direito Penal.

Liszt — que também se notabilizou pela tentativa de criar uma ciência global do Direito Penal, em negativa ao
determinismo positivista — propôs uma investigação sociológica do delito, sem abandonar o seu estudo dogmático.
Refutou, pois, a existência de um tipo antropológico de criminoso, sustentando a preponderância de fatores sociais.
Nesse sentido, falou em delito de ocasião ou momento (em que há prevalência do impulso exterior) e em delito crônico
ou por estado ou natureza (quando o deito é oriundo preponderantemente da personalidade ou predisposição do
criminoso, e, não, de impulso exterior).

Apregoando a necessidade de implementação de políticas sociais como principal fator no combate à


criminalidade, propõe, em substituição à pena retributiva da Escola Clássica, a ideia de uma pena finalista, que seria
justa quando for necessária a atingir o fim a que é dirigida, qual seja, a manutenção da ordem jurídica e do Estado,
afora a proteção coletiva. Focou na prevenção especial, mediante a adaptação artificial (conversão do criminoso em
membro útil à sociedade) ou a inocuização (retirada do convívio social). E, a partir da finalidade preventiva da pena
(com crítica a penas de curta duração, por faltar-lhes qualquer finalidade), esgrimiu o seu cumprimento conforme
três tipos de delinquentes: (i) delinquente ocasional (pena como recordação para que não pratique novos delitos), (ii)
delinquente corrigível (pena visa à ressocialização do criminoso) e (iii) delinquente habitual (pena visa à inocuização
do criminoso, retirando-o do convívio social). Essa finalidade, vale notar, se mostra presente tanto na cominação da
pena (advertência ou intimidação) quanto no momento da sua execução (confiança dos cidadãos e efeito
intimidatório, afora um sentimento de justiça para o ofendido).

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É expressamente proibida a divulgação deste material, cujo uso é restrito às partes contratantes, sob pena de se caracterizar violação à Lei 9.610/98, com a responsabilização civil e criminal dos envolvidos.
Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

(MP/SC-promotor-2019) Para Liszt, o fundamento da pena é orientado às finalidades de: a)


ressocialização dos delinquentes suscetíveis de socialização; b) intimidação dos que não têm
necessidade de socialização e; c) neutralização dos não suscetíveis de socialização.
Gabarito: certo.

No mais, impende notar que a Escola Sociológica Alemã substitui a ideia de livre-arbítrio da Escola Clássica
pela ideia de normalidade, chancelando a distinção entre imputabilidade e inimputabilidade e indicando a aplicação
da pena às pessoas “normais” e da medida segurança às pessoas “perigosas” (periculosidade).

(MP/GO-promotor-2019-reaplicação) Podem ser citados como caracteres da Escola Moderna Alemã:


a distinção entre o Direito Penal e as demais ciências criminais - criminologia; o delito como um
fenômeno humano-social e fato jurídico; a imputabilidade e a periculosidade; a pena com caráter
defensivo, orientada conforme a personalidade do delinquente.
Gabarito: certo.

Escola Correcionalista
Tendo origem alemã — com a obra Comentatio na poena malum esse debeat, publicada em 1839 por Cárlos
Davis Augusto Röder, sob a influência da filosofia panteísta de Karl Christian Friedrich Krause —, a Escola
Correcionalista acabou encontrando maior aceitação na Espanha (notadamente em vista da tradução da obra para o
espanhol, por Francisco Giner de los Ríos). Idealiza o desenvolvimento da piedade e do altruísmo, compreendendo a
pena como forma de correção moral. Seus três principais alicerces são:

a) o delinquente como portador de patologia de desvio social: os delinquentes, em vista das “falhas
pessoais” que o impedem de se comportar de acordo com as mais elementares regras de vida em
sociedade, necessitam de medidas assistenciais para sanar essa debilidade;

b) a pena como remédio social: se o crime é uma doença no corpo social, a pena é um remédio para tratar
o criminoso e curar a patologia do desvio social de que é portador. Por isso, deve ser constantemente
adaptada ao estágio do indivíduo e ter duração indeterminada, pelo tempo necessário para “curá-lo” e
permitir que aja conforme os ditames da sociedade;

c) o juiz como médico social: cabe ao magistrado aplicar o remédio social ao portador da patologia de
desvio social. Sua missão seria, pois, higienista e terapêutica, demandando conhecimento
interdisciplinar (sociologia, psicologia, antropologia etc.) e autorizando um agir sobre os males
presentes (saneamento social) ou sobre perigos que ameaçam a sociedade (profilaxia social). Em um
pensamento típico do Direito Penal do autor, as medidas curativas deveriam incidir sobre pessoas que
praticassem condutas que exteriorizem a patologia de desvio social, mesmo que elas não estejam
tipificadas como crime.

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

* Principais nomes da Escola Correcionalista: Giner de los Ríos, Pedro Dorado Montero, Concepción Arenal,
Romero Gíron, Alfredo Calderon, Luis Silvela, Félix de Aramburu y Zuloaga, Rafael Salillas e Luis Jiménez de Asúa.

De resto, apontam-se como contribuições da Escola Correcionalista para o Direito Penal brasileiro:

a) humanização das penas, com proscrição às penas de prisão perpétua ou de morte (salvo em caso de
guerra declarada), na forma do inciso XVII do art. 5º da CRFB;

b) a execução penal dirige-se a proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado
e do internado (art. 1º da LEP);

c) institutos da liberdade condicional e da progressão de regime, de acordo com o desenvolvimento do


condenado;

d) responsabilização de adolescentes por atos infracionais.

Escola da Nova Defesa Social


Surge após a 2ª Guerra Mundial com o intento de modernização e humanização do Direito, mormente quanto
às medidas punitivas. Repele a ideia de um sistema penal repressivo e foca na finalidade de proteção da sociedade
contra as práticas criminosas, em vez da punição do delinquente. Para isso, propõe um sistema preventivo e de
intervenções (re)educativas, de forma individualizada e humanitária, com o objetivo de fazer com que o delinquente
assuma sua responsabilidade com a sociedade (livre-arbítrio), integrando-o ao convívio social (pedagogia da
responsabilidade). Portanto, a Escola da Nova Defesa Social centra-se na prevenção do delito, na ressocialização do
criminoso e na garantia dos seus direitos individuais.

* Principais nomes da Escola da Nova Defesa Social: Adolphe Prins (1845-1919), Filippo Gramatica (1901-
1979) e Marc Ancel (1902-1990).

Movimento Psicossociológico
Liderado pelo sociólogo francês Jean-Gabriel Tarde (1843-1904), opôs-se ao determinismo biológico e social
defendido pela Escola Positiva, apregoando a preponderância dos fatores sociais sobre os fatores físicos e biológicos
da criminalidade.

Em sua obra As leis da imitação (1890), Jean-Gabriel Tarde propugnou a lei da imitação (ou da integração
social), segundo a qual, assim como ocorre com todo comportamento social, o criminoso imitaria, de modo
consciente ou inconsciente, o comportamento criminoso já praticado. Daí a sua célebre frase “todo mundo é culpável,
exceto o criminoso” (criminoso como receptor passivo dos impulsos delitivos).

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Pertinente referir que o Movimento Psicossociológico influenciou a teoria da associação diferencial, atribuída
a Edwin Sutherland (1883-1950), que se diferencia das ideias de Tarde porque, para Sutherland, haveria a necessidade
de um processo de comunicação pessoal (falaremos sobre o tema mais à frente).

Movimento Lei e Ordem


Capitaneada pelo alemão Ralf Dahrendorf (1929-2009), o Movimento Lei e Ordem (também chamado de
Movimento da Lei e da Ordem) idealiza um direito penal máximo, com a expansão das normas incriminadoras e a
exasperação do rigor das sanções penais, a fim de combater eficazmente a criminalidade. Tem a pena como um
castigo; a crimes graves, penas severas. Fala em estabelecimentos penais de segurança máxima (notadamente para
crimes com violência) e salienta que as pequenas infrações, quando toleradas, abrem espaço à prática de crimes
mais graves. Nessa toada mais severa, defende a ampliação do espectro de prisões provisórias, a fim de que
represente uma resposta penal diante da prática do delito.

(TJ/PA-juiz-2019-CEBRASPE) O movimento Tolerância Zero parte da ideia de que o Estado não deve
negligenciar fatos criminosos, por mais insignificantes que sejam, já que esses fatos contêm em si
uma fonte de irradiação da criminalidade.
Gabarito: certo.

(TJ/PA-juiz-2019-CEBRASPE) Os defensores do movimento Lei e Ordem reconhecem que o


agravamento das penas é medida necessária para combater a violência, embora acreditem que não
faça justiça às vítimas.
Gabarito: errado (o erro está em dizer que os adeptos a esse movimento acreditariam que não se
estaria fazendo justiça às vítimas)

O Movimento Lei e Ordem teve grande aceitação nos Estados Unidos (em especial na década de 70) e inspirou
a política de tolerância zero, adotada em Nova Iorque (1991) pelo então prefeito Rudolph Giuliani, a qual obteve
importante redução dos índices de criminalidade. Entretanto, a crítica que se faz a esse Movimento é a reificação
(coisificação) do criminoso, tratado como um verdadeiro inimigo do Estado (Direito Penal do Inimigo).

(MP/SC-promotor-2019) A política de repressão implementada nos anos 90 pelo então Prefeito de


Nova York, Rudolph Giuliani, orientada pelo chamado “movimento da lei e da ordem”, é criticada
porque resultou no aumento da violência policial e não obteve redução dos índices de
criminalidade.
Gabarito: errado.

No Brasil, cita-se como reflexo desse movimento a Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/1990), dentre
vários outros Diplomas.

Finalidades da Criminologia
Depois de todo esse olhar em torno da evolução histórica da disciplina e das várias Escolas Criminológicas,
podemo-nos posicionar para dizer que a criminologia tem por finalidade fornecer uma compreensão científica do

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

problema criminal à sociedade e aos poderes constituídos, a partir do estudo do crime, do criminoso, da vítima e dos
mecanismos de defesa social, visando ao controle e à prevenção criminal, mediante um diagnóstico qualificado e
conjuntural sobre o delito (evitando meras intuições ou subjetivismos), a partir da interdisciplinariedade. Noutros
dizeres, a criminologia volta-se para a explicação e prevenção do crime, intervenção na pessoa do infrator e avaliação
dos diferentes modelos de resposta ao crime.

Métodos da Criminologia
a) Empirismo: o advento da fase da criminologia científica conduziu à utilização do método empírico ou
experimental e indutivo, estudando o seu objeto (crime, criminoso, vítima e controle social) a partir da
análise dos fatos, da realidade (mundo do “ser”). Lembre-se de que a Escola Clássica enfatizava o método
abstrato e indutivo, ao passo que a Escola Positivista passou a difundir o método empírico e indutivo.

b) Interdisciplinariedade: o crime é um fenômeno cultural e humano, multifacetado, por isso exige uma
abordagem multidisciplinar (direito penal, filosofia, sociologia, psicologia, psiquiatria etc.), aberta, para sua
melhor compreensão.

Objeto da Criminologia
O objeto da ciência criminológica, conforme vimos, veio ampliando-se paulatinamente.

Beccaria focava no delito. A Escola Positivista, no delinquente. Na década de 50 (século XX), ela passou a
abranger a vítima e os mecanismos de reação social à criminalidade.

Atualmente, predomina o entendimento de que a criminologia tem por objeto: o delito; o delinquente; a vítima;
o controle social.

Delito
O delito é um fenômeno humano, social e cultural, só existindo na sociedade. Não há crime na natureza, que é
regida por leis próprias (naturais), afora a irracionalidade dos animais.

Cada sociedade, portanto, de acordo com seus próprios valores e costumes, define as condutas que
configuram infrações penais. Ex.: aborto é crime no Brasil, mas, em outros países, não o é.

O Direito Penal trabalha com três conceitos de crime:

a) conceito material: crime é a lesão ou ameaça de lesão a um bem jurídico relevante;

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e Escolas Criminológicas

b) conceito formal: crime é a conduta assim definida pela lei penal e por esta sujeita a uma pena;

c) conceito analítico: crime é a conduta típica, ilícita e culpável (entendimento majoritário).

Note-se que o Direito Penal incide a partir do início dos atos executórios, ao passo que a criminologia busca
antecipar-se a isso, visando compreender a dinâmica do crime e intervir nesse processo, com objetivo dissuasório.
Por isso, a ciência criminológica tem adotado conceitos diversos de crime. Garofalo, por exemplo, concebeu o
chamado delito natural como a lesão, em sua acepção moral, aos sentimentos altruístas fundamentais (piedade e
probidade) vigentes na sociedade, e o delito legal como aquele que não ofende o senso comum de moralidade,
altruísmo ou piedade, embora tipificado pela lei. Outros autores realçam a nocividade social da conduta ou a
periculosidade do autor.

A sociologia criminal utilizou o conceito de conduta desviada ou desvio, significando a violação do padrão de
comportamento esperado pela sociedade em determinado momento. O conceito de desvio é mais abrangente do que
o de crime (que se restringe aos comportamentos desviantes sancionados por lei).

Delinquente
Enquanto a Escola Clássica5 tinha como objeto principal o delito, a Escola Positivista ampliou esse objeto para
o estudo do criminoso, enfatizando a necessidade de defesa da sociedade contra a ação do delinquente. De fato, o
estudo da pessoa do infrator teve o seu protagonismo durante a fase positivista na evolução histórica da criminologia.
E, com o estudo do delinquente, passou-se a investigar a gênese do comportamento criminoso, ou seja, os motivos
que o levaram a violar o ordenamento jurídico.

É interessante notar a diferença de visões. A Escola Clássica tinha o delinquente como um pecador, uma pessoa
dotada de livre-arbítrio, que teria optado por direcionar a sua conduta para o mal, em vez do bem. O positivismo
antropológico (Escola Positivista), de seu turno, realçou a figura do criminoso nato. Por sua vez, a Escola
Correcionalista via o criminoso como alguém necessitado de ajuda, assumindo a pena uma função terapêutica, sem
conteúdo retribucionista.

De se notar que, a despeito do progressivo abandono das teorias biológicas defendidas pela Escola Positivista,
de certo modo elas ainda podem contribuir para a compreensão do fenômeno criminal, porém em uma perspectiva
biopsicossocial (e, não, biopsicopatológica, como se defendia na Escola Positivista), examinando o criminoso em
suas interdependências sociais. Da mesma forma, a psicologia criminal, direcionada ao estudo da personalidade e
do comportamento do criminoso, também contribui para a compreensão do fenômeno criminal, auxiliando na criação
de programas voltados à redução da reincidência criminal.

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Falaremos mais detalhadamente sobre as Escolas Criminológicas, logo abaixo.

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Vítima
A palavra vítima vem do latim victima, significando pessoa ou animal morto. O conceito de vítima adotado pela
criminologia é mais amplo do que o trabalhado no Direito Penal, que a considera como o sujeito passivo do crime.
Para a criminologia, o conceito de vítima alcança toda pessoa ou ente coletivo prejudicado por um crime (considerado
este segundo um conceito criminológico).

Na criminologia tradicional, a vítima sempre fora deixada em segundo plano, tida como mero objeto neutro e
passivo.

(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) A criminologia tradicional desconsiderou o estudo da


vítima por considerá-la mero objeto neutro e passivo, tendo polarizado em torno do delinquente as
investigações sobre o delito, sua etiologia e prevenção.
Gabarito: errado.

A ampliação do foco da criminologia — para alcançar a vítima do delito — teve impulso após a 2ª Guerra
Mundial, notadamente em vista das atrocidades cometidas pelo regime nazista contra os judeus e da necessidade
de defender os vulneráveis que demandem proteção especial. De fato, a partir de meados do século XX, surge a
chamada vitimologia, visando estudar a vítima e seu papel no evento danoso, inclusive sua participação e
contribuição para a ocorrência do crime. Ganhou força nas décadas de 70 e 80, sobretudo com o avança da psicologia
social.

(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) O redescobrimento da vítima e os estudos científicos


decorrentes se deram a partir da 1ª (Primeira) Guerra Mundial em atendimento daqueles que
sofreram com os efeitos dos conflitos e combates.
Gabarito: errado (não é 1ª Guerra Mundial, e sim 2ª Guerra Mundial)

Hoje, a preocupação com a vítima tem inspirado legislações (ex.: Lei Maria da Penha) e o surgimento de novos
institutos jurídico-penais, como a composição civil dos danos prevista na Lei nº 9.099/1995, cuja finalidade é
precisamente, em crimes de menor potencial ofensivo, o ressarcimento da vítima pelos danos sofridos. A par disso,
vale notar que o instituto do arrependimento posterior (CP, art. 16) também nasce da preocupação com a vítima, ao
mesmo tempo que a legislação penal considera o comportamento provocador da vítima para atenuar a resposta
penal, como no caso de homicídio praticado sob violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima
(CP, art. 121, § 1º).

Controle Social
A sociedade adota formas de controle (por isso, controles sociais) para compelir os indivíduos a observarem
os padrões de comportamento esperados, a fim de garantir uma convivência harmoniosa (paz social). A criminologia,
nesse contexto, estuda as formas de resposta social ao delito, sindicando a eficácia e os efeitos das sanções penais
no processo de controle e prevenção do crime.

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

De acordo com sua forma de manifestação, o controle social pode ser classificado em:

a) controle social informal: exercido pela sociedade civil (ex.: família, escola, opinião pública, mídia etc.),
com “sanções sociais” (castigo a crianças, estigma negativo, desapreço etc.);

b) controle social formal: atuação oficial do sistema de justiça criminal (polícia, Ministério Público,
magistratura e administração penitenciária), com as formas de reação ao crime previstas na lei.
Subdivide-se em: (i) primeira seleção, que diz respeito ao início da atividade de persecução penal, com
a atividade investigativa (pela polícia judiciária ou pelo Ministério Público 6) visando à apuração da
autoria e materialidade delitivas; (ii) segunda seleção, que corresponde ao início da ação penal
(oferecimento da denúncia pelo órgão de acusação); (iii) terceira seleção, com a tramitação do
processo penal e eventual aplicação da sanção penal.

(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) A polícia, o Judiciário, a administração penitenciária, por


exemplo, são instituições encarregadas de exercer o controle social formal.
Gabarito: certo.

Não confunda controle social formal de primeira, segunda e terceira seleção com prevenção primária,
secundária e terciária, estudadas, sobretudo, no Direito Penal. Prevenção primária se dá antes do crime,
representando estratégias de política cultural, econômica e social (ex.: educação na escola); prevenção secundária
se orienta aos grupos que ostentam maior risco de protagonizar o problema criminal, relacionando-se com a política
legislativa penal e com a atuação dos órgãos policiais; prevenção terciária foca na pessoa do condenado, visando a
evitar a reincidência da população presa por meio de programas reabilitadores e ressocializadores.

(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) No Estado Democrático de Direito a prevenção criminal é


integrante da agenda federativa passando por vários setores do Poder Público, não se restringindo
à Segurança Pública e ao Judiciário. Com relação à prevenção criminal, assinale a afirmativa
correta:
a) A prevenção primária se orienta aos grupos que ostentam maior risco de protagonizar o problema
criminal, se relacionando com a política legislativa penal e com a ação policial.
b) A prevenção secundária corresponde a estratégias de política cultural, econômica e social,
atuando, por exemplo, na garantia da educação, saúde, trabalho e bem-estar social.
c) A prevenção terciária se orienta aos grupos que ostentam maior risco de protagonizar o problema
criminal, se relacionando com a política legislativa penal e com a ação policial.
d) A prevenção secundária tem como destinatário o condenado, se orientando a evitar a
reincidência da população presa por meio de programas reabilitadores e ressocializadores.
e) A prevenção primária corresponde a estratégias de política cultural, econômica e social, atuando,
por exemplo, na garantia da educação, saúde, trabalho e bem-estar social.
Gabarito: (e)

6
Conforme entendimento sedimentado pelo STF em sede de repercussão geral: “O Ministério Público dispõe de competência para promover, por autoridade
própria, e por prazo razoável, investigações de natureza penal, desde que respeitados os direitos e garantias que assistem a qualquer indiciado ou a qualquer
pessoa sob investigação do Estado, observadas, sempre, por seus agentes, as hipóteses de reserva constitucional de jurisdição e, também, as prerrogativas
profissionais de que se acham investidos, em nosso País, os Advogados (Lei 8.906/1994, art. 7º, notadamente os incisos I, II, III, XI, XIII, XIV e XIX), sem prejuízo da
possibilidade – sempre presente no Estado democrático de Direito – do permanente controle jurisdicional dos atos, necessariamente documentados (Súmula
Vinculante 14), praticados pelos membros dessa Instituição.” (RE 593727

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

Criminologia e Direito Penal


A criminologia é uma ciência empírica (do “ser”), que se vale do método indutivo para analisar o delito.

O Direito Penal, de seu turno, é uma ciência jurídica e normativa (do “dever ser”), no qual predomina o método
dedutivo-sistemático para a apreciação do fato delituoso.

Criminologia e Política Criminal


Política criminal é o conjunto de medidas e critérios (jurídicos, sociais, políticos e econômicos) adotados pelos
Poderes Públicos para prevenir e reagir ao delito, com o objeto de controlar a criminalidade. Atribui-se a Franz von
Liszt, com a sua obra Princípios de Política Criminal (1889), o surgimento da política criminal.

É interessante notar que a criminologia deve orientar a política criminal, a qual, por sua vez, serve de ponte
entre a criminologia e o Direito Penal.

(PC/ES-delegado-2018-CEBRASPE) Na inter-relação entre o direito penal, a política criminal e a


criminologia, compete a esta facilitar a recepção das investigações empíricas e a sua
transformação em preceitos normativos, incumbindo-se de converter a experiência criminológica
em proposições jurídicas, gerais e obrigatórias.
Gabarito: errado (isso é algo que se encaixa no papel da política criminal, e não da criminologia).

Classificação da Criminologia
Dentre as várias classificações (ou sub-ramos) da criminologia, destacam-se:

a) criminologia científica é a ciência autônoma, empírica e interdisciplinar, que tem por objeto o estudo
do crime, do criminoso, da vítima e do controle social da conduta criminosa, visando à prevenção e ao
controle da criminalidade;

b) criminologia aplicada é aplicação dos conhecimentos angariados a partir da criminologia científica;

c) criminologia acadêmica é sistematização dos conhecimentos criminológicos para fins pedagógicos e


didáticos;

d) criminologia analítica verifica o cumprimento do papel das ciências criminais e da política criminal;

e) criminologia crítica, dialética ou radical: de base marxista, vê na atuação jurídico-penal do Estado


capitalista um processo de estigmatização da população marginalizada, cujo alvo preferencial do
sistema punitivo é a classe trabalhadora;

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(DP/ES-delegado-2019-Instituto Acesso) A Criminologia Crítica contempla uma concepção


conflitual da sociedade e do Direito. Logo, para a criminologia crítica, o conflito social.
a) se produz entre as pautas normativas dos diversos grupos sociais, cujas valorações são
discrepantes.
b) é funcional porque assegura a mudança social e contribui para a integração e conservação da
ordem e do sistema.
c) é um conflito de classe sendo que o sistema legal é um mero instrumento da classe dominante
para oprimir a classe trabalhadora.
d) representa a própria estrutura e dinâmica da mudança social, sendo o crime produto normal das
tensões sociais.
e) expressa uma realidade patológica inerente a ordem social.
Gabarito: (c).

f) criminologia da reação social estuda a criação das normas penais e sociais relacionadas ao
comportamento desviante;

g) criminologia organizacional: afora a criação das leis, também contempla a violação a tais normas e as
reações a tais violações;

h) criminologia clínica ou microcriminologia: valendo-se de conhecimentos médico-psicológicos,


compreende o criminoso e os motivos que o levaram a delinquir, visando ao tratamento do detento
durante a execução penal, a fim de promover a sua ressocialização;

i) criminologia verde (green criminology) estuda a responsabilidade penal das grandes corporações por
crimes ambientais (“delitos verdes”), visando à preservação do meio ambiente. Apontada como uma
manifestação da criminologia crítica, tem vertentes mais radicais, influenciadas pelo marxismo e
realismo de esquerda, com ataques a grandes corporações e acusações de que estariam lavando
capitais com a utilização do meio ambiente ( green washing);

j) criminologia do desenvolvimento: defendida por Patterson, Loeber, Le Blanc e Moffitt, promove um


estudo longitudinal e com enfoque dinâmico das variáveis do comportamento criminoso durante o
desenvolvimento da vida do indivíduo (idade e crescimento). Fala em: (i) ativação, com
desenvolvimento das atividades criminosas a partir do seu início, podendo haver aceleração (maior
frequência), estabilização ou diversificação (mudança para outras atividades criminosas); (ii)
agravação, com o aumento da gravidade dos delitos perpetrados; (iii) desistência, seja pela
desaceleração (menor frequência), especialização (menos tipos de delitos praticados), diminuição
(redução da gravidade) ou encerramento das atividades delitivas. Moffitt alude, ainda, a delinquentes
cuja atividade delitiva se limita à adolescência e em delinquentes cuja atividade delitiva perdura ao
longo de sua vida;

k) criminologia midiática: sem cientificidade e alheia a estudos acadêmicos, forja-se a partir da


informação, subinformação e desinformação veiculada pela mídia. O tom, à evidência, é de crítica;

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e Escolas Criminológicas

l) criminologia fenomenológica foca no estudo da realidade objetiva do fenômeno criminal, sem análise
dos sistemas de controle social e das mudanças legislativas;

m) criminologia cultural: abordagem teórica que surgiu nos Estados Unidos e no Reino Unido na década
de 90, com os estudos de Jeff Ferrell, Clinton Sanders, Keith Hayward, Mike Presdee e Jock Young,
compreendendo o crime e as agências de controle como produtos culturais. Critica o fundamentalismo
metodológico da criminologia ortodoxa e sustenta a adoção de metodologias de aproximação do
pesquisador com o crime e o controle social, mediante a etnografia e a observação participante, dentre
outros métodos de pesquisa. De abordagem interdisciplinar, é vista como parte das criminologias
alternativas e como derivação da criminologia crítica. Sua análise não se restringe ao crime e à justiça
criminal, mas abarca também a representação do crime pela mídia, os desvios não criminalizados de
políticos e elites econômicas, a exploração pela mídia das emoções das vítimas de crimes etc.;

n) criminologia feminista é a reação ao funcionamento sexista do sistema penal e às violências sofridas


por mulheres, tendo surgido na década de 70, no Reino Unido, durante a segunda onda feminista. Dá
especial ênfase ao estudo das relações de gênero (relações de poder, relações produtivas, relações
emocionais e relações simbólicas);

o) criminologia queer : na língua inglesa, queer significa estranho, esquisito, excêntrico. A teoria queer
surgiu nos Estados Unidos, no final da década de 80, assumindo contornos de uma criminologia crítica,
com aproximação a teorias feministas e foco na questão de gênero e da sexualidade, em especial as
agressões dirigidas a gays, lésbicas, bissexuais, transexuais e afins. Diz-se que a violência homofóbica
pode ser simbólica (cultura homofóbica), institucional (homofobia de Estado) e interpessoal
(homofobia individual). Vale frisar, nesse campo, o projeto de lei de criminalização da homofobia 7 no
Brasil, bem como o julgamento pelo STF da ADO 26 e do MI 4733.

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, julgou procedentes os pedidos formulados em


ação direta de inconstitucionalidade por omissão (ADO) e em mandado de injunção (MI) para
reconhecer a mora do Congresso Nacional em editar lei que criminalize os atos de homofobia e
transfobia. Determinou, também, até que seja colmatada essa lacuna legislativa, a aplicação da Lei
7.716/1989 (que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor) às condutas de
discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero, com efeitos prospectivos e mediante
subsunção. (...) Na ADO, o colegiado, por maioria, fixou a seguinte tese: “1. Até que sobrevenha lei
emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização
definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e
transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade
de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão
social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de
incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08.01.1989, constituindo, também, na hipótese de
homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121,
§ 2º, I, “in fine”); 2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou
limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada,

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PLC 122/2006.

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Introdução à Criminologia, Evolução Histórica
e Escolas Criminológicas

a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou
celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de
divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de
externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem
assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar
prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público
ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem
discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a
hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade
de gênero; (...)”. ADO 26/DF, rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 13.6.2019. (ADO-26)
MI 4733/DF, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 13.6.2019. (MI-4733)

Modelos Teóricos da Criminologia

Criminologia Clássica e Neoclássica


Ambos os modelos relacionam a dissuasão penal ao efeito inibitório da pena. Distinguem-se, no entanto,
porque o modelo clássico de prevenção do delito está centrado no rigor da pena, enquanto o modelo neoclássico
trata da prevenção do delito a partir do funcionamento do sistema normativo e sua percepção pelo indivíduo.

Criminologia Positivista
Busca distinguir os delinquentes e os não delinquentes por meio de suas características físicas, psicológicas
e sociais. Nega, pois, o livre-arbítrio e enaltece o determinismo, buscando identificar indivíduos com predisposições
ao cometimento de crimes.

Criminologia Moderna
Amplia o objeto de estudo. Se antes era focado no criminoso, agora passa a abarcar também a conduta delitiva,
a vítima e o controle social. A mera repressão do delito é substituída pela prevenção, realçando-se a busca pela
ressocialização do criminoso e a reparação do dano.

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