A infinita fiadeira A aranhiça levou o namorado a visitar a sua colecção de teias, ele que escolhesse uma, ficaria A aranha ateia diz ao aranho na teia: prova de seu amor. o nosso amor está por um fio! A família desiludida consultou o Deus dos bichos, para reclamar da fabricação daquele espécime. A aranha, aquela aranha, era tão única: não Uma aranha assim, com mania de gente? Na sua parava de fazer teias! Fazia-as de todos os alta teia, o Deus dos bichos quis saber o que tamanhos e formas. Havia, contudo, um senão: poderia fazer. Pediram que ela transitasse para ela fazia-as, mas não lhes dava utilidade. O bicho humana. E assim sucedeu: num golpe divino, a repaginava o mundo. Contudo, sempre inacabava aranha foi convertida em pessoa. Quando ela, já as suas obras. Ao fio e ao cabo, ela já amealhava transfigurada, uma porção de teias que só ganhavam senso no se apresentou no mundo dos humanos, logo lhe rebrilho das manhãs. exigiram a imediata identificação. Quem era, o E dia e noite: dos seus palpos primavam obras, que fazia? com belezas de cacimbo gotejando, rendas e — Faço arte. rendilhados. Tudo sem fim nem finalidade. — Arte? Todo o bom aracnídeo sabe que a teia cumpre as E os humanos se entreolharam, intrigados. fatais funções: lençol de núpcias, armadilha de Desconheciam o que fosse arte. Em que consistia? caçador. Todos sabem, menos a nossa aranhinha, Até que um, mais-velho, se lembrou. Que houvera em suas distraiçoeiras funções. um tempo, em tempos de que já se perdera Para a mãe-aranha aquilo não passava de mau memória, em que alguns se ocupavam de tais senso. Para quê tanto labor se depois não se dava improdutivos afazeres. Felizmente, isso tinha a indevida aplicação? Mas a jovem aranhiça não acabado, e os poucos que teimavam em criar esses fazia ouvido. E alfaiatava, alfinetava, cegava os pouco rentáveis nós. Tecia e retecia o fio, entrelaçava e produtos — chamados de obras de arte — tinham reentrelaçava mais e mais teia. Sem nunca fazer sido geneticamente transmutados em bichos. Não morada em nenhuma. Recusava a utilitária se lembrava bem em que bichos. Aranhas, ao que vocação da sua espécie. parece. — Não faço teias por instinto. — Então, faz por quê? COUTO, Mia. O fio das missangas. São Paulo: — Faço por arte. Companhia das Letras, 2009. p. 73-75. Benzia-se a mãe, rezava o pai. Mas nem com preces. A filha saiu pelo mundo em ofício de O CONTO FANTÁSTICO infinita teceloa. E em cantos e recantos deixava a 1. Responda às perguntas a respeito dos sua marca, o engenho da sua seda. Os pais, após elementos que compõem o conto concertação, a mandaram chamar. A mãe: “A infinita fiadeira”. — Minha filha, quando é que assentas as patas a) Quem são as personagens da narrativa? na parede? b) Em que espaço acontece a história? E o pai: c) As ações ocorrem em um tempo definido? — Já eu me vejo em palpos de mim... Explique. Em choro múltiplo, a mãe limpou as lágrimas dos muitos olhos 2. No conto, as ações são concentradas e narradas enquanto disse: de modo preciso para prender a — Estamos recebendo queixas do aranhal. atenção do leitor. Então, identifique os principais momentos da ação. — O que é que dizem, mãe? — Dizem que isso só pode ser doença apanhada Descreva a situação inicial: de outras criaturas. Qual é o Conflito? Até que se decidiram: a jovem aranha tinha que Qual é o Clímax (momento mais tenso da história) ser reconduzida aos seus mandos genéticos. ? Aquele devaneio seria causado por falta de Explique o Desfecho: namorado. A moça seria até virgem, não tendo nunca digerido um machito. E organizaram um amoroso encontro. — Vai ver que custa menos que engolir mosca — disse a mãe. E aconteceu. Contudo, ao invés de devorar o singelo namorador, a aranha namorou e ficou enamorada. Os dois deram-se os apêndices e