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Wee Ye NN a ee \ LITERATURA DE CORDEL Ganesha Produgées / Capa: MAERCIO SIQUEIRA / Fortaleza-CE, agosto de 2019 ee 4 Autora: Julie Oliveira “s A FALTA ae’ VOCE FAZ A histévic, a dor ea voz de milhares de familias de pessoas desaparecidas Tal qual um rio a correr A vida tem seus caminhos De alegrias, de flores, Mas ha também os espinhos Que sangram o cora¢gado Pondo-nos em desalinhos. As dores de cada um Nao ha quem possa medir. Cada qual tem seu sofrer Seu olhar, o seu sentir... De certo, ha sempre um modo De a gente contribuir. Nesses versos de cordel Hoje quero relatar A dor que fere milhées E parece nao passar, A dor de esperar alguém Sem saber se ird voltar. o1 No desaparecimento A espera é sempre cruel Auséncia e divida sao Sentimentos em tropel Fazendo a quem procura Sentir um amargo fel. No inicio o choque traz Um desespero total Uma procura intensa Em todo e qualquer local Nas ruas, becos, esquinas Cemitérios, hospital. Num relato uma mGe me diz: “Nao sabia o que fazer... Quem iria me ajudar? A quem posso recorrer? Fiquei vagando a buscar Alguém pra me socorrer!” “E nessa busca doida Uma dor maior chegou: A dor da indiferenga, Meu coragado amargou Ouvindo palavras duras De quem nao se importou”. 02 Nessa hora eu larguei A caneta que escrevia Chorei junto com mae Que aquilo tudo dizia E senti como nos falta Boa dose de empatia. Nao bastasse toda a dor De um ente procurar Sem noticias, sem saber Se ird o encontrar E até ter que ouvir Alguém a vitima culpar?! Os pés de quem procura NGo cansam de caminhar Os seus olhos sempre atentos Percorrem todo lugar Na esperanca de um dia A pessoa encontrar! O sono jaé nao existe Hd sempre perturbacao A psiqué afetada Nao encontra condicao De relaxar um momento, S6 quer uma solucdao. 03 Com a foto de quem se foi A roupa vira cartaz. A busca se torna a vida, De sorrir nao é capaz. O dia a dia é um ciclo Que nada de bom lhe traz. Asatde é afetada Nao ha sono ou lazer, Falta-lhe disposicado E a vontade de comer; O seu corpo inteiro ddi, Faltam forcas pra viver. Ha familiares que Adoecem seriamente Com dores no coragao E o corpo inteiro sente... Os mais idosos até Falecem precocemente. Isolamentos também Sao fatores pra citar, Pois a incompreensao E comum observar. Ela as vezes vem de perto, De um proprio familiar. 04 Reclamam da tristeza Que o outro “teima” em sentir A presenca vira um fardo E vivem a repetir: “Por que vocé nado desiste?! Vocé precisa seguir!” “Seguir em frente”, dizem... Mas, nado é a solucaéo. A solucaéo é cuidar, Ouvir, prestar atencao. Importar-se realmente, Nao dizer que é em vao. Nas histdérias que ouvi Para este cordel tecer Me assustou a maldade Que alguns vém cometer Enviando trotes as familias, Aumentando o padecer. E volto pra empatia, Para nossa compaixdo, Rogo pra que o nosso olhar Sofra uma transformagao, Percebendo a dor do outro Acolhendo com atengao. 05 Por isso eu narro aqui Relatos, percepcées De familias sufocadas Em suas decepcgées Numa busca incessante Querendo resolucées. Quem procura nunca cansa E grande a falta, o sofrer A incerteza corrdi, Mas é maior o querer. E nessa busca cruel Ha muito para fazer. De forma pratica também Tudo é impactado, Pois a lei ainda carece Dum olhar mais apurado Para assistir melhor Ao familiar afetado. Os desgastes sao varios: Fisico, emocional... O financeiro também E um ponto crucial, Deixando muitas familias Sem amparo social. 06 Uma esposa aflita Certa hora relatou: “Ficamos sem condicées, E tudo que ele guardou Eu nao poderia usar, Assim o banco falou”. “Fomos todos despejados, E sem casa pra morar Com criangas bem pequenas Vi nossa dor aumentar... As vezes nao tenho forcas Sequer de me levantar”. E é, entado, nesse cendrio De total devastagao Com familias a sofrer E em busca de protecdo Que também surgem pessoas Alhes estender a mao. E claro que esse apoio Nem sempre é familiar, Nem todo mundo é capaz De se sensibilizar, Olhar o outro com afeto Com bragos para amparar. ov Nao é preciso sentir Na pele essa grande dor Para oferecer ajuda Carinho, afeto e amor Ha sempre um modo de ser Um amigo apoiador. E hoje, além de numeros, Esta reflexdo traz O individuo, a pessoa, De modo que nos compraz, Como meio de dizer: A FALTA QUE VOCE FAZ! E esta explanacgdao Necessdania, eficaz Porque, nos sensibiliza E a empatia nos traz, Porque sé quem sofre sabe A falta que 0 outro faz! 08 rs O texto deste cordel foi inspirado nos relatos de familias de pessoas desaparecidas acompa- nhadas pelo Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV). O programa de Familiares de Pessoas Desaparecidas tem como objetivo identificar e compreender suas necessidades e contribuir para reduzir seu sofrimento. Com o intuito de visibilizar este grave proble- ma, o CICV organizou a mostra imersiva "A falta que vocé faz”, que retrata o vazio e as incertezas vividas por essas familias. Delegagao Regional para Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai SHIS QI 15 Conj. 05, Casa 25, Lago Sul, 71635-250 +55 61 3106-2350 +55 61 3148-7908 bra_brasilia@icrc.org.br fi facebook.com/cicv © twitter.com/cicv_br @afaltaquevocefaz2019 https://www.icrc.org/pt/afaltaquevocefaz © CICV, agosto de 2019. (SR, © poe cicy DERM:

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