As Mulheres Na Sociedade Portuguesa Oitocentista. Algumas Questões Economicas e Sociais (1850-1900)

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GRUPOS SOCIAIS E ESTRATIFICACAO SOCIAL EM PORTUGAL NO SECULO XIX Benedicta Maria Duque Vieira (oxc.) AS MULHERES NA SOCIEDADE PORTUGUESA, OITOCENTISTA. ALGUMAS QUESTOES ECONOMICAS E SOCIAIS (1850-1900)' TRENE VAQUINHIAS | somnnrercomres errsansoe comm avrropucko. A historia das mulheres & uma das éreas de estudo que se desenvolveram nos iltimos «anos em Portugal, benefciande da abertura politica proporcionada pela Revolucdo de Abril de 1974, Relativamente jovem, esta trouxe para adiscplina historia novos temas de inves tigago bem como novos conceitos que, ajudando a preencher vazios historiogréfics, tem rmunleagbes, a partir de 1880, endo iniiatmente contratadas como ajudantes no servico telegnfico¢, «partir de 1900, sobreuo como tleonistas™ Fontes dispersas também gs permite identiticar como encarregadas de estagbes telefinicas (como acontecia em Fepisho, nos primeirs anos do sé. XX)”, ox come condutoras da mala do core, no inte vi do pais (caso de Poares, no distro Cotmia, por volta de 1890.” No seu conjunto, ests sectors, aos quais podemos assoclar as "empregadas de comes io, seguros ebancos",recenseavam una percentagen reduzia da populagdo activa fer nina, embora segundo Virgnla do Rosario Baptist, tenha sido no sector das servicos que pa cance Hen Ma, se sta ee, sit, Cen 187 aan enc, crenmee seston fr dyno sincere a tt OF 16 "note 9.28% a nase do cays enti “hie dee «pc ca erences ei ope Set em aso ect rene 95, Rog om, 200, 129-480 re resin, So emepanc yne pcas xnsntotsasine (187-175) se verficaram "as mais elevadas taxas de feminizagao*." [No que respeta ao tradicional mundo das profissbes femininas urbanas (eladas, amas, layadeiras, cozinheitas,costureiras,leltinas, et.) e que congregava uma parte signficaivs a poptagdo activ, ainda se sabe muito pouco,ndo obstante algumas amostragens locals Aestacarem a sua extrema vulnerabllidade econémica e socal.” Quanto & participardo das mulheres no sector industrial, as informagées disponiveis ouco mats avancam do que as taxas de feminlzacdo: cerca de 35% da popula feminina activa, em 1890, segundo Virginia Baptista, 24%, em 1940. Faltam os trabathos de con- junto, as sintesesexplicativas, emibora se dlsponha de estudos parcelaes sobre condigées de ida, detrabatho ede saétios, ou de pequenos flashes sobre a Intervene feminina no movi- ‘mento operdri, embora a sua partcipagio em grevesesteja mats bem documentada para 0 séoulo XX. Sobre o tabatho das mutheres nas minas (de subsolo ou a céu aberto) dispomos de Snformagdes Fagmentdrias, No entanto, © estudo desenvalvide por Paulo Eduardo CGuimardes sobre os miners alentejanos, de 1858 a 1938, permitiu a este autor coneluir que, no obstante algumas minas recorrerem & mio-de-obra feminina (minas de carvao e de voli ‘pequenas exploragies de manganés) no conjunto, "o trabaho feminino era con- juntural", nao estando *generalizado ds mulheres dos mineirosalentejanos".” (0 sexo feminino estava praticamente ausente das associagbes mutualistas,sendo a sua admissio dependente da prévia autorizagdo dos pats, tutores ou maridos. Aqui, como em tamtos outros aspects, faziam-se sentir os precetos legais que pendiam sobre a fami. ‘Apesar de tudo, séo eriadas algumas, como é o caso da Associagdo Conimbricense do Sexo Feminino, fundada em 1867, vinculada @ Associagto dos Artists.” Enquadrado por estutos mais geras sobre a génese do Fstado-Providencia em Portugal ‘ém-se analisado,embora lateralmente, as Tegstagdes que procuraram regularizaro traba ho das mulheres ede menores nas ofcinas¢ estabeecimentos industrials”, As lgislagdes nto promugadas (Cartas de Let de 10 de Fevereiro de 1890, 14 de Abril de 1891 e de 16 Whi Ri Bart, Asien me al ort msn tin (190-949), hg 1, 19999. 46 * va pat, od Lory Rs ec, Os do bs np se RET 170 Lr try 41, 200. 18327. "rd mes nec no Ox co ket (1858198), sh, Aes Ca eC ‘amet ds scan eae ess was obs Nour” Len Roa ip. 20-222, septa de AP ere ei sna ce» Lan trie Use, es a ‘stan eng dor ava x Ha, Oe, 21-23 cxurosSorasESTRATILEAKO Seta EM FORTUGAE HOCH de Fevereiro de 1893) procurayam sobretudo proteger a mulher gravida e a puérpera, proibindo o traballio no periado pés-parto (4 semanas), Porém, ndo sendo apoisda por ‘ququer ausito pecuntdrio ou vencimento, conduzla ao desemprego e & miséra, sitwasio que s6 a partir de 1927 se comecou a modifica.” E também neste contexto que stem as primetras maternidades ou retigios destinados a acolher as mdes desprotegidas, sobretuda se solteiras, que ali podiam descansar no perio- do antes e depois do parto,dispondo de apoto méiicoe de puercultura e onde, na verdad, sepodiam "esconder* dos olhos de mundo, Eo cas, entre outros, da Maternidadte Bensaide eda Maternidade da Compania dos Tabac, anibas em Lisboa, fundadas por fabrica, «do Regio Aboim Ascenso, em Faro, em funcionamento, pelo menos desde 1911." A letslaedo previa ainla« abertura de creches em estabelecimentos industria com um imero superior a cinquenta operérias. Porém, entre a teoria e a realidade, hd por vezes um ‘grande fsso, Em Lisboa, durante a 1* Repdblia, apenas funcionaram duas creches de tnt- ative empresarial aca Casa Grandela ea da Fabrica da Cordoaria, Abram, no ntanto, no limo quartel do século XIX, e, sobretudo, por iniciativ de instituigdes religiasas, algunas ‘reches em virios pontos do pais (Porto, Viana do Castelo, Lisboa, entre outs cidade). Dirigtas exctusivamente ds "classes pobrestrabalhadoras", as "creches*, também design sos trés anos de dae, exigindo-se «como condigao de ingresso que aquelasfossem baptizadas ¢ wcinadas e que as progenttoras Aas por *presépios", destinayam-se a aco eiangas at fossem no apenas pobres, mas notoriamente honestase trabalhadoras”, ou que, de acordo ‘com a terminologia do tempo, tvessem bom comportamento efassem "bem proceaidas” 0 discurso operdrio que, de um modo geral, manfestava hostiidade para com o traba- tho feminino fora do tar, sendo elogioso para com a *dona de casa poupada e déeil", tem sido ‘objecto de alguns estudes. Igualmente o tem sido as questes slarials,sendo, em regra, 0s saldrios femininos inferiores aos masculinos. A jusifcacdo para tal inferordade, aids for- ‘malizada einstitucionalizada no decurso do século XIX e convertda numa situagio comm, Dbaseava-se numa profunda assimetria de avaliagi do cleo dos saldros femininos e mas- culinas", Pura os economistas politicas do tempo que, nesta mater, fleram le, os saldrios "an tin Cie, enero amet: Act nol ce ae Edt ‘bi Discreet, to Fen eG aan Une Sr de ia Fre auto Cr sepa dA ee, 84 9120. Selects mats seo maar sire emanate ny ala X44 Que ttc aude 18s en pba ake oa dos homens deveriam assegurar ndo sé a sua subsisténcla como a da sua familia, enquanto ‘0s saris femininos eram consideraclos como um suplemento, devendo proporclonar tio-sé © suficiente para a sobrevivencia bisica, qualquer que fosse a sttuagio civil da mulher.” ‘Uma dea pouco explorada continua a sera das blografias, embara nos tilthmos anos, @ abertura ao piblico de arquivos privados tenha permitido "descobrir" personalidades fem nninas com papel de destaque no sector empresarial oitocentista e que obrigam a repensar a tradicional quséncla das mulheres no mundo dos negécios. Um exemplo paradigmatico é 0 dD. Anténia, a céebre Ferreirinha do Douro.” Neste, como noutros campos, o século XIX legou-nos uma imagem da mulher como ‘ausente dos espacos puiblicos mas com poderes nas esferas do doméstico e do privado, esten- enlo-os tentacularmente @ toda a sociedade, "Nao ¢ ela" ~ pergunta-se Sanches de Frias ~ "a mae do advogado, a esposa do ministro, «filha do proprio rei, a tra do magistrado, a prima do governador, a muther do deputado, « amiga ¢ parenta de uns, a compartheina pro- tectora e conselheira de outros?*". Como se as mulheres fossem possuldoras de um poder invisivel, oculto € os homens no passassem de marionetes manejadas pelas suas méos habilidosas, Captar a participagao feminina no mundo dos negécos, sobretudo tratando-se de ‘mulheres casadas, exige que se wltrapassem as idelas feitas e os esteredtipos dominantes, & sobretudo ao nivel de associagées que é possivel apreender a sua presenga: como sécias ondindtias ¢ extraondindrias dos sindicatos agricolas (coma é 0 caso do Sindicato Agricola de ‘Montemor-o-Velho), da Real Assoclacdo Central da Agricultura Portuguesa (RACAP), ow como accionistas de estabelecimentos de indole cultural e recreativo, Um caso. merecer par- ‘cular atengio é 0 de D. Maria Emilia Seabra de Castro, esposa de Luciano de Castro, que se distingulu como grande dinamtzadora da Associagdo Vinicola da Bairrada (juridicamente formatizada em 1893). fo WS A metas emCnge Oay he ret eme - Osel ran ade Mains sab oes ded Pl 1850193), Anca ek 1 ares Fi, ies yi gen aC Cs aa Ea sa, a EM coNcLUSO No termo desta breve sintese, na qual multo ficou por dizer € anaisar, uma das con- lusdes a retin & 0 do extremo cuidado que implica oestuco da tematica feminina ao nivel 4o século XIX, dado 0s constrangimentos socias ¢ ieoldgcos que pesavam sobre a partici- ‘pag das mulheres na economia eno mercado de trabalho do tempo. A propria feminizacio de determinados sectores proisionais no decurso deste século no pode ser interpretada como uma conquista, decorrendo, antes pelo contrdro, de uma utllzgto mais ractonal de eterminadas capacidades que se consideravam como especiicas do sexo feminine. Hd, ‘porém, ainda muito a investigar pata que nos seja permicido fazer uma avaliagio mais cor- recta da participacdo das mulheres no mundo das actividades econémicas e sociasoitocentis- ‘tasou primo-novecentistas. Exemplosrepresentatvos decreas lacunares€ 0 universo prois- sional das cantoras livicas ¢ das actrzes de teatro, actividades que rompiam com os arquéti- pos dominantes e que eram consideradas como vetculos de promote ndtvidual, Faltam ainda os estos sobre as donas de casa out mesmo sobre o discurso que sobre elas era produ ido, © séeulo XIX continua a ser, no tocante ao feminino, um continente ainda muito esconhecido..

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