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Coleco PHILOSOPHICA ‘coordenada por RACHEL GAZOUA + Acid #0 mundo moderne ‘Alfie North Whitehead ered a loaf aniga Premises e utes foramanas de trabalho” Livi Rosset + Busca do couhecimento: Esco de fla medial no lt Rosle Helena S, Persia (org) + Cosmos: Cnc ens sobre Fla de Natureza Rachel Gazolla (org) + Asambigudades do paz: Ero sobre o prazer me flo de Pltto Francisco Bravo + Safica Giovanni Casertano oe Ariteles na doriaa de News de Plating “Thomas Alexander Slezak ‘Aarte 20 pensamenta de Hedi: meio des gente com ridge omertrio ‘Charles Kahn + paca Vermeer maniac na fos no pnts ‘Sera Homi + Asabedoria rege (0) ~ Dons, Apolo, lus, Ore, Mey, Miers, Enigma Giorgio Cal +0 pensamerto de Gadamer ‘Jean Grondin (org) + rota sigifcodo dh Metofica de Aries Enrico Bert + Abra ds Sots: um interpreta flssee ‘Mario Uncerseiner Manio UNTERSTEINER A OBRA DOS SOFISTAS UMA INTERPRETAGAO FILOSOFICA PAULUS “Talo orignal: soft by Mario Uneersteiner (© 1996, Edition Scolasticne Bruno Mondaderi-Milfo © 2008, Pearson Paravia Bruno Moncadon SpA ISBN 978-88-6159-163.9 “radusdo: Resto Ambriio DiresSo edizoril: ZlfrineTonon ‘Coordenasto editorial: Claudino Aven dos Santos ‘Acsistente editorial: Jacqueline Mendes Fontes, Revisto: Ino Bezer Lopes Revisto ecrica enaina there Map Diagramasdo: Ane Lie Perencio Capa: Marcle Compan Immpressto ¢ acabamento: PAULUS ‘Dados Intomacionais de Catalogacto na PubkiagSo (CIP) (Cimara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Uncersteiner, Mario, 1899-1981 A obra dos Sofistas~ uma interprecagd flosfica/ Mario Untesteiner; tra- OK 80 B 9 (ch. nota 27, acm. j22) | Nora sosne a ote PaorAconas | Cilias! ¢ de Euripides, em cuja casa teria lido o inicio de seu escrito Sobre os deuses"" Das viagens que ele fez, como sofista, coberto de honras e procurado, conhecemos aquela a Sicilc, onde se encontrou com ‘0 jovem Hipias®, justamente nos diltimos anos de sua vida, se Hipias, como se supde, nasceu em 443°. E, dada a minha cro- nologia de Hipias, creio ser provavel que a permanéncia de Pro- tgoras na Sicilia tenha sido depois da terceira estadia em Ate- nas, em 421, ¢ anterior & expedicio dos atenienses contra ailha. A tradigio antiga (Didgenes Laércio, IX, 54) nos informa que Protagoras foi acusado por Pitodoro, “um dos Quatrocen- tos". Mas ja se notou que essa preciso em relacdo & pessoa do acusador nao indica que 0 processo tenha sido realizado em 411“, Portanto, essa notici deve ser revista, e 0 proceso localizado, como ja se disse, no periodo da paz de Nicias!. Mas também essa hipétese ¢ muito dlibia, ¢ Taylor ja tinha apresentado algumas objegdes a ela”. Mas é, sobretudo, Gigon que nega qualquer validade a infor- magio do proceso. Protégoras, no diilogo platénico, declara (317b-c) que nfo sofreu nenhum inconveniente devido a seu oficio de sofista, contrariando a noticia do processo e do conse- uente exilio, De resto, Didgenes Laéncio (IX, 54) narra que primeico livro publicado em Atenas foi o Tepl @edv, que seria causa do processo, o que & contraditérie, Allém disso, 0 Ménon , transmitida por varias Fontes", * vero Pag de lato, Na coméaia de Eupotis, Or ald (ag. 146 Vrotigers parece come “adulador,proveimente mo sentido de Spare iqea cena se pasta em boa pare en toro ce uma mesn seria de ss (Aon! Pegr adele, “Ann & Scola di Psa", 1947, 34 14 tamber Dupre Ser. 300 seq, e Meyer ev Al, V2, p 1 equine com Asay, Epis coon atau contra © Meso Sth bey Mp 190-183). Uo, Lage X54 (= KBD A 1), Nose deve prem divide not: ti At, Vip 888 ‘ip ma i826-¢ ve Mey Ge At, N 2.29%, nota 2 Camda noe 7 aye Pp 236, roa 133] | Maso Unrensrann | (@1 e= DKA 8) exclui a morte violenta do sofista. As duas pas- sagens, conclui Gigon, seriam incompreensiveis se fosse verda- deira a tradicao do exilio e da fuga: tudo isso pertence & lenda de Protigoras que circulava jé no século IV", No maximo ~ diz em outra passagem © mesmo Gigon — pode-se pensar que ha tum niicleo hist6rico, sufocado por uma boa quantidade de in- venges™, Se excluirmos a validade da noticia que diz respeito a0 processo ¢ & condenasio, pode-se, ao contririo, admitir que le tenha morrido em um naufrigio durante uma viagem pelo mar quando voltava da Sicilia (Didgenes Laércio, IX, 55), por- que, como bem nota Fritz, « noticia aparece sem ligagao com a historia do processo™. Dessa maneira, & considerada falsa.a noticia de que os atenienses teriam mandado recolher os livros de Protgoras na égora para que fossem atirados em chamas*! © motivo da imputacio de impiedade devido a0 perigo que a doutrina de Protigoras parecia suscitar contra o funda- mento religioso daquela constituigio pétria, a qual a oligarquia aspirava, retorna nos versos de Timao*: quiseram cinzas fazer de suas obras, porque ele escreveu nie saber nem poder investigar quais e quem seriam os numes: mostrava assim suma cautela e moderasio. Isso néo Ihe serviu, mas desejou a fuga para nio beber a fia bebida socrivica e descer assim ao Hades”. * Gigon. Pret, p. 116. ® Gigon, Sok, p. 141; assim também R. S. Bluck, em seu comentério ao Mion de Plato, Cambridge, 1961, p. 359. © Voa Fritz. Prot, 919; cf, além disso, Natorp. Erlerntinipr, p. 44, nota 1, {quemota como Plat, Tee, 177d, no alude Armorte por naulragio de Protagoras 5 Diog, Lar, 1X, $2; Eus., Cron, OL 84, 1(= DK BOA), ete Tayler. Pl, 237-238 2 Schmid. Lit, I, p. 28, nota 2 0 detalhe da cicuta ndo ¢, em todo cato, exato, porque ease modo de ‘morte no podria caber aos estrargeros (Schmid, Lt, ll, p28) Para o texto de Timdo, ver Sex., Cont. mat, 1K $6 = DK 80 A 12 frag, § Diels (PHF) Para 2s supostasalusdes de Euripides na Isione (Diog. Lage, IX, $5 = TGF2, p. 490) ‘¢1na Defesa de Polomedes (ag. 588 N2), c., por exemplo, Derenne. Pr, $4, no 1y Nestle, VMacl, p. 266, nota 12; Gomper2 Th. Per, il, p. 258, nota 0; Wil mowiz. PL, p. 1; Loreing. Ber, 1913, p. 1355 Schmid. Lit IM, p 477, notas 4 ¢ Se, sobretuda, p. 316, nota 5. Agora se pode ver tambien Davizon. Prot, p58. Captruso Secuno0 Osras DE PROTAGORAS § 1.A perda das obras dos! sofisias. Excessivo mimero de escritos atribuidos a Protagoras Determinar quais as obras efetivamente escritas por Pro- tagoras é tarefa drdua, se levarmos em conta o grande niimero de titulos que chegaram até nés ¢ a perda total, ou quase, dos tratados e dos discursos epiditicos nio sé de Protagoras, mas também dos sofistas em geral. Uma razio dessa falta de sobrevivéncia duradoura da li- teratura sofistica foi ilustrada por W. Jaeger. "Alguns traballnos mais marcadamente cientificos dos sofistas foram usados por virias décadas, mas em geral eles nio eram homens de cién- ia: seu objetivo era influenciar os contemporineos. A decls- magio (émiBeifis) no era, para usar as palavras de Tucidides, algo duradouro, mas demonstracao de destreza, destinada 20s ouvintes imediatos. Eno profundo trabelho educative dos s0- fistas, o melhor de suas forcas concentrava-se no comércio com, 2 pessoas vivas, € no na atividade literéria, como, de resto, & natural”' A tudo isso se deve acrescertar outras consideracées. Primeiramente, ¢ facil supor que boa parte das doutrinas ret6- ricay dos sofistas foi transmitida em obras sistematicas como a Zuvaycay’ Texvedv de Aristoteles, a Retérica de Anaximenes e escritos do género que reproduziam ou criticavam teorias sofis- ‘ticas sem mencionar o nome do autor Em segundo lugar, con- "Jaeger. Pa, 451-452. 13s] | Mano Urmasrenes | vvém ter presente que os sistemas filos6ficos, que se firmaram depois da sofistica, tinham outros objetivos e, portanto, eram levados a dramatizar uma antitese que, a0s poucos, deveria de- sembocar na damnatio memoriae em relacao aos predecessores. ‘A outra razio, valida principalmente para Protigoras, é a cexcessiva quantidade de titulos transmitidos pela tradicio, que deveriam corresponder a outras tantas obras do sofista, Tam- ‘bém aqui cabe uma oportuna consideragio ja conhecida e que se pode precisar, com Pohlenz, da seguinte mancira:"A respeito do modo de se fazer edigSes no século YV, sinceramente, sabe- ‘mos pouco. Mas, no caso do epos antigo, temos com suficien- te frequéncia diante dos olhos como mediante uma passagem extrinseca é relacionado um argumento totalmente novo. Na prosa, a propésito de Protégoras, estamos informados de uma série tio grande de titulos que, dificilmente, podem-se imaginar ‘como inscrigdes de livros auténomos”. Os titulos dos livros, de fato, eram pouco importantes para os antigo: § 2. As Antilogias No que diz respeito a Protégoras, possuimos um elenco “mutilado e nao totalmente confidvel"’, conservado por Dié- genes Laércio (IX 55 = DK 80 A 1), ¢ 0s titulos das obras nao incluidas nele, que nos foram transmitides por outras fontes. ® Pohens. Hipp. p30. CE. Gius, Pavano. Sulla cronlegia deli srt retrc di ions ch Acamasso, “aati della Reale Accad. di se. lttere ear di Palermo”, 5. IV, vo. l, parte I, 230. * Schmid. Lit Il p. 28-29. A expresso oeatiSueva, que se refere aos los de Protagoras (Dig, Liére, Dy SS), ¢ uma dara reeréncia 3 um catslogo de bibl tea, tanto que a ordem, andloga aquels das obras dos oradores, comega com ‘uma Teun teda, 3 qual seguen muitos livros com o tulo wspl krA.e depois mais trés obras (cf O Regenbogen. Tivab, RE, XX, 2, 1934), Por iso a lacuna Dressuposta por Diels no Califo nao dev ser colocada, como propse 0 proprio Diels, antes de Téxvn, mas logo depois deste ieulo, de maneira que se pode spor que 0 titulo Tipl Bedw encontrava-e imediacamente depois de Téun e antes de Ten mans, ou tales exivesse, mais logicamente, ances de Mepi Yay fy Aiou, Natorp. Erlenninsp.,p. 53, persa gue 0s liros de Procigoras foram cconservados att epoca Alexandrira, endo exstiim mais na epoca de Ciera (p 57) Tambim Lesly, GGL, p. 378, pensa que o catdlogo remonta a Bibloxeca de Alesandea, 36] 1 Opes be Prorkconas | Creio ter demonstrado® que o catilogo de Didgenes con- ‘tem somente os subtitulos das Antilogias, obra em dois livros, ‘como se esclarece no final do dito elenco. A meu ver, as Anti- logias tratavam de quatro problemas fundamentais: 1) sobre os deuses; 2) sobre o ser; 3) sobre as leis e todos os problemas que concernem ao mundo da polis e 4) sobre as artes". Portanto, os titulos referidos por Diégenes Laércio devem ser dispostos em tomo desses quatro temas fundamentais, cujas segdes aqueles titulos representam’. “Trata-se agora de precisar, nos limites do possivel, o tema desenvolvido em cada segio das Antilog AJA primeira era constituida do TIepi Gedav, Sobre os dew ses, ensaio que no apgrece no catilogo de Didgenes Laércio, mas que deve ter sido lemmbrado na lacuna do catilogo, razoa- velmente suposta pelos criticos. De resto, Didgenes alude a essa cobra em uma passagem precedente (IX, 51-52), ¢ sucessiva- mente (IX, 54) afirma que foi o primeiro, entre seus escritos, que leu, A tese de que essa tenha sido, a0 contririo, sua dltima obra, escrita no periodo em que foi acusado', ¢ refutada pela declaracio explicita de Didgenes Laércio®. A mesma sego con- vém atribuir 0 Tlepi tésv év “Aibou, Sobre a sorte no Hades"®. 0 tratamento desse problema pode muito bem ser atribuido @ Protégoras, apesar de uma obra com o mesmo titulo ser at * Ver Unterstener. Prot. Ant, estudo que ¢ base de tudo 0 que se dir, neste capitul, sobre as Ants de Protagoras. Minha disrbuigto das obras de Pro- tigoras foi, substancialmente, aceita por Pac. Pens pres. p. 129. Como ficou demonstrado no artigo ctado na nota precedent, essa quacri+ panicio das Antieyosbastia-se em Plat, Sof, 232b-c, °CE Gefen it Amn, |, . 279, nota 84, vertambém Natorp.Erkeninipr., 89: "“Antiloge’ representa de modo totalmente genérico o género a0 qual ¢ rscrito percencia”.Aos ttulos, segundo Diogenes Larcio, podem estar relacionae vs aubuiuls, ver a recente obra de von Fritz, Prt, 919, 13; cf p. 920, 22:30, Var teshy, OGL, p. 378, a realidace destes subtitulos nde ¢segu "CF. Bodrero, Prot Ip. 73, Derenne. Pr, p46, nota 2. Schmid, Lit, I, p. 28, nota 2; von Fritz, Pro, 920, 10-20, nto aereira na ‘vsténeia desea obra, citada também por Eusébio. PE, XV, 3,7 (~ DK 80 8 4): ty "69 wap) Bedw auryypauien, porque é dificl dizer © que ea poderia concer lem da famosa proposiglo, Masme parece que eta apona ¢ totalmente pata lu (ef tambérn Capizs. Pot, p. 242), Sehimid. Lit lp. 34 371 | Mago Unrenstene | buida a Demécrito (DK 68 B Oc), sem que se deva pensar em confusio"!, De fato, “se Protigoras extraiu das representagies tradicionais dos deuses influxos para 0 seu pensamento © a aco humana, le teria também de tratar das representagdes do além-simulo. Juntamente com o além, ele negava a existéncia separeda da alma, que the pareceu supérflua a0 lado dos sent dos (Didg. Laére., IX, 51 = DK 80 A 1)". B) A segunda segao das Antilogias pertencia o escrito Tepi ‘roi Syt0, Sobre o ser, que também nio é citado por Didge- nes Laércio, mas que & conhecido por Porfirio (DK 80 B 2). E inexata a hipétese, sugerida virias vezes, segundo a qual esse escrito de Protigoras seria um capitulo da obra fundamental A Verdade”, ow a pardfrase dela’, Era, em todo caso, uma re- futacio do ser eleata e, provavelmente, de outras doutrinas dos fildsofos pré-sofisticos'*. Penso que deveria estar em relagio de sel Geng. Sp 35s smb Boe Pt 102,13 Sc Us p34, ota 6; A. Ls, Gk = 34, wo 6 87H pea ecb esalorea as imagens erfcantes do mito. Diererttrente, lana, Bet, #7. ei a were Festa das crus eases dno dt Canaeadew wr ptchdo crs spostciome perameentorna dos Sees ° Schmi ct pr a: Wt Mp 32, nota 1. Ley Gb, p 3795 mas ch von Fi. ties utp 9% Contry Bhchinge, p22 Zier PR Ge, 12,1350, nor sumo 2367-3 Ze 98 Pa Nr ‘ohana ro eu nds que inde Motgean ce expla ofa deo 6 Propourdo do hone made ce qc o home fuivpov de Srree uh Sore Eifchmera con ov dent oto se ea Spanos to ris no informa que 3 obra ea pos, ois We 8 otyoros (62), por Sra cas dee Coat miso au Pam acer <2 ry, et anon dae ac nodes de ee pre peice or conics macen hadeion Gal mane I re (OC 278 10), dene dt aoe fctlona do fr 4ct oo t-socriticos, ainda que entendido de varias maneiras (cf. Mario Uneerstei - Sree Here aes poe) velar auc poten nce ‘igre ca Pach de tw cttado om snips aces, ae “eheager arog [Sobre Bache depsncs de Portree contém esa cus, eK: Dae Pg, RE, 2 8 goa Pr us ago eames ra apn a Rie, age hag 3h adiante, IM, Parte |, § 2, nota 77, Em nosso caso, pode-se 0 Sinha sugeizo Grote. Pl, il . 153, nota 1, que o pagio teria sido weifceds no Fe sed roaring mgr cl ieee 138] | Oss 0 Povscons | causa € efeito com essa obra ums segao conhecida como Téxvn iporncsy, Arte da eristica (incluida no catélogo de Diégenes Laércio). Fsta, como demonstrarei adiante, devia pertencer as “Antilogias. Nessa obra a descoberta das antilogias que a teo- Jogia © a metafisica tinham deixado transparecer de seu mis- tério ji desvelado eram aplicadas a casos priticos. Mas no € assentado que esse titulo ou, mais exatamente, subtitulo, deva set atribuido ao préprio Protégorss. © que jé foi notado pelos criticos mais sagazes, como'T. Gomperz, por exemplo, que ob- serva: "jé que ninguém deu a si mesmo 0 nome de eristico, mas ‘essa denominacio foi, ao contrério, considerada em todas as épocas uma injiria, no € possivel que Protigoras tenha dado cexatamente esse titulo a seu livro, Mas se isso... denotava uma srande habilidade argumentativa, ¢ instruia na arte do falar o- cdenadamente pro e contra uma tese, essa era bem uma razio saifclente para que nosso compilador, ou a fonte da qual cle ® Portanto, a ele, a partir compilava, o indicasse dessa maneira’ de Plata, foram atribuidas as culpas que se imputam 4 eristica ‘A noticia relativa a Arte da erfstica que, segundo Diégenes La~ ércio, Protigoras teria escrito, bastou “para induzir que os his- torisdores modemnos...fizessem remontar a Protégoras a seus companheiros sofistas todos 0s raciocinios ilusérios ¢ capciosos que se encontram no Eutidemo de Platdo e nos Das argumentos sofisticos de Aristoteles'. Esse apclido de eristica “foi inventado por Plato. Deve-se acrescentar, ¢ isso € decisivo, que, quando [Aristoteles fala de trabalhos preparatorios para a teoria da dis- lética e da eristica por ele elaborada, no s6 nfo sabe nada da scnica eristica de Protagoras, mas ainda declara expressamente que nunca existit algo semelhante (Dos argumentos sofisticos, que pretendem reftar cera doutrna, por exemplo, a eleata, devia, necessaria- ntite liza virios argumentesiSticosetratar cerca némero dees de mane rundlogat, Para a necesidade de uma polémica atileara por parce de Prot: (Jonas woh ainda Lana, Prot, p: 80-83. Da polémica de Protagoras contra Zeno, telaos urn teatemunho preciee (Simpl Pps, 1108, 18 seq, ~ 87a; Unterseiner. Sup. Bd), Ver ainda Di Benedero, Cor, p. 297-298, "= Gompere Th. Pent, I, p- 283, nora 0, 1391 | Mano Unesstenss | 34, 183b 34-36)". Aventou-se a hipotese de que a Ante da eris- fica, ou a seq30 a qual erroneamente foi atribuido esse titulo, pode ser pensada como semelhante as Tetralogias de Antifonte, ‘mas “somente com argumentos (@é015) filos6ficos, e Antifonte foi o primeiro a levar a forma protagérica a praxis processual”, Nao ¢ improvivel que a essa seco pritica das Antilogias, que consti dedugao e a conclusio daquela teolégica e metafi- sica, pertencesse a Aixn imip io80d, a Disputa judicidria sobre © pagamento do honoririo. O tema desse escrito pode ter tido como referéncia um caso, real ou inventado, concernente a uma questo judiciéria relativa a0 pagamento de honorarios" ‘C) Devem ter sido numerosos os capitulos da terceira se- ‘sto cas Antilogias, que tratava dos problemas das leis ¢ de tudo ‘© que dizia respeito a polis e, por conseguinte, também a virtu- de, pois esta, para Protigoras, culminava na rohrrii dpert. Ve- jamos, em primeiro lugar, os argumentos politicos stricto sensu. Qual era 0 contetido da Tlepi noArréias, Sobre o estado, parece dificil dizer. Certamente a hipétese mais sedutora a de E. Mass”, que viu uma influéncia de Protagoras no con- fronto e contraste entre as formas de governo desenvolvidas por Herédoto, quando o historiador, depois de ter narrado 0 as- sassinato dos magos, apresenta a discussio entre os trés chefes rebeldes, Otane, Megibizos e Dario, a respeito da melhor forma de governa, democracia,oligarquia e monarquia”. Essa tese de uma fonte protagérica de Herédoto foi virias vezes proposta ¢ Mae Soe, ,p. 207-208; cp. 210, nota 1 "Schmid. ty yp. 118. Para as relages entre 0 orador Antfonte ¢ rots goras, ver ep ct, p. 128 * Schmid, Lit, Il, p. 34 cf Bodrero, Prot, 1, p. 112-113: Lipsius, Dar athe Recht w Rechverfaren. Leipag, 1912, W, 2, ps 767, pensa que ese escrito de Procigoras nunea exist, mas foi somenteimaginade com base na anedote do Processo com Evatlos (Didg, Laer, K, 56 ~ 80 A 1). Ver van Pitz Prt, 910 /Apesar da afirnagao de Avs:oteles(Oidg. LX, $4~ frag. 67), Evatlos no tere Inenhuma relacio com 0 verdadero ou suposto processo de impiedade (cf, DK £50 8 6); para a cavlacto logcacolocada por Evatos contra Procigoras deme do uibunal, cf W. and M, Kneale. The Daetpment of age. Oxford, 1982, p14 * Wass E., Gor, p- 581-595, esta ¢, agora, eambem s tose de Ryffel, Met, 52, nota 95 He, 80:82, 14} | Oseas 0 Provéconas | refutada. Mas se o escrito sobre o estado realmente pertencia, como acredito, as Antilogias®, uma comparacio ~ ainda que independente daquela de Herédoto — entxe as varias formas de governo deve ser considerada plenamente provivel. ‘Uma consideragio especial merece o Tepi fis év dexi xaraoréce~s, Sobre a condico origindina do homem. Se se aceita a opinido corrente, deve-se admitir que © contetido do mito de Protigoras em Plato (Prot., 320:-322d) corresponde pelo menos a trama dessa seco das Antilogias”. Mas se ante~ A adh ernie em Je recites poo tr ado constudo por wa decusao sobre a formas de Siectnien Gavotte ee Sue eter amt ninaermeiemearai ae mer ees oceania oer oennas, unt ieukuminem in mgrentoan se tdeen ate has Soa Broa creates etter an Cami isan recmranneeceie, nanan ieetapaeme nate eed enter. ar Rank {Soda do casi material pont nk eps ei 0 fo Ce Heda Shareecnermamntieenentetoa Bes ah rettnaeromernal me erertoce Sete ie a aig gerne aesecon Pere marae tee reek cee tas oa Foren jsearmentero caso da mudanea des constaigdes, ques seri em 8 Reshma ucaecenterenaie tasers ceed irene seg ee beset Sere berate ot Sib utae oare eae een ce Preteen Se ea meatal ro okie comico pie Tecra reste ie a igi Sa ee a i cia stele Ws teet Se alee i oom lary | Manio Urensrones | pease Pi. sm omei6 significado do mito, parecer que ele representaria o estado origindrio do homem, visto ‘momento de seu nascimento e na primeira aquisiglo das ine tates necessérias para a existéncia, Mas somos levados, por Sorted visio mitica, também a ultima e definitiva fase da sings. Essa visio nao pode corresponder ao “estado origi- nro" Conssquenterent, rio que omite devia se encontrar masa Verdade, dado 0 cariter construtivo dessa obra. Ao ene Antilogias se representou apenas 0 estado pri- ee ial da sociedade humana, quando ainda era conturbada pelas contradigées da physis que, de um lado, deixa o homem one Seater de defesa ¢, de outro, 0 t e usufruie cra (fogs), que ° ifruir socialmente das forcas da natureza (0 fogo), we vc melhorar seu nivel de vida, Essas contradigoes entre 0 lever ser ¢ 0 ser podem muito bem coincidir com o tema geral das Antilogias, das quais esse rigindri escrito Sobre a condi, i do homem era parte constitutiva™, ici : sti aes rior aa Sommerer crea crenata taco de onanims do ind, et al pals per por an a Matted ‘organismo do Estado. a aie earacoraems ee liam igi eet ine gr courte tine nate notre cae th cas so pion re dr eps ho Spar ap den Siaieee me nese Siete nee epee =e rotégoras, Portanto, ele supde que a orn dese ten =a pe emery arate ety or ‘chetbung. Berne br sy ne ne, teeing siento 142) Qe ee ee ee | Onis p¢ Proéconss | Resta um grupo de ensaios, concementes ao problema éti- co, submetidos igualmente a uma critica, Mas determinar seu ‘conteado parece-me demasiadamente problematico. Pode ser aque no Tepl perc, Sobre as virtudes, se tratesse, dado o titulo tho plural, (e no Tepl Apes), nao das virtudes em sentido absoluto, mas das varias manifestagdes morais que completa fe separadamente tomam esse nomie™, Quando se fala de vi tudes no plural, que se dissolvem em partes da virtude, isso acarreta implicitamente a dissolugio desse conceito”. Poderia ser, portanto, que 0 Tlepl giAoTinlas, Sobre a ambigdo,fosse urn pectueno capitulo do epi perc. Mais transparente, em mew modo ver, é outro titulo TIepi rai ote ép8ds Tois avOpcomrois mrpacaoutveav, Acerca das agées realizadas nio retamente pelos homens. Considere-se que, conforme a demonstragio que de- senvolverei adiante, 0 conceito protagérice de ép86v corres onde 20 mais elevado grau de conhecimento, pelo qual s80 superados, no universal, os contrastes ¢ as contradicées contin- pentes™. A sbordagem de Protigoras, cla qual estamos falando, devia passar em revista as ages humanas isoladas, ¢, portant, contraditérias, porque nao estavam ainda sob o dominio de um pensamento coletivo generalizador (otx opts [= ob xo wostt~ Tout Réycal Mpaocoutveav). Obscuro pareceu aos estudiosos © escrito TIpoctaxrixés, Discurso imperativo. “Poder-se-ia pensar ‘cm um tratado sobre a sintaxe do imperative (DK 80 A 29), mas a proposiglo com o imperativo em Protigoras nao é char ‘mada Tipootaxrici, mas évtoRs} (Didg. Laére,, IX, 53 = DK 80 A 1}, Descartada essa hipétese, s6 resta pensar em um ‘escrito de tema ético, como implicitamente admite Nestle”, ‘e como me parece confirmado por uma passagern de Plutar- 2 nodeero, Prt, |, p. 105. 2» Bodrero, Pty Isp. 212. Disso se watard adiantt, Ver cap. pate I § 1 ees ii fp. 34, mows 8. Bodrero, Prt, |, p. 135-116, adie et area mas levanca também a hipécse de uma “enda biblogréfca” Bese ViMa.L, p: 296, nota 124, 1431 | Maso Unrenstenes | ‘qual se relata a doutrina de Crisipo, que afirma que 0 iprimento.perfeito do dever (karépBcoj.a) & um preceito (npéorayua) da lei; a culpa, por sua ver, é uma proibicao da lei. Poranto, a lei veta muitas coisas aos maus, mas nada thes ordena: de fato, no podem cumprir perfeitamente 0 seu dever. A isso Plutarco replica que, dessa mancira, tem-se uma con- cepsio contraditéria da lei, enquanto ela impSe aquilo que os ‘maus nio podem fazer e veta aquilo do que eles nao podem se abster. Esse texto, muito posterior & sofistica, serve pelo menos para provar que mpootégoe tem um valor ético e, portanto, © protagérico Mpootaxtixés concernia a um problema ético. Mas, talvez, nao é um acaso que Plutarco saiba aprender o as- ecto contraditério do conceito estéico de lei concebido como mpdorayua. Ele percebe isso muito mais facilmente, j que em sua época a critica a validade da lei era um lugar comum” de- pois da experiencia do periodo dos logdgrafos j6nicos, de Herd doto e do periodo dos sofistas. Portanto, nao ¢ improvavel que © cardter mpootaxrixéy da lei tenha sido frequentemente obje~ to de andlise critica, mesmo desconsiderando o tom particular que the dew a doutrina ética do estoicismo. E, talvez, também Protagoras, de maneira andloga, pode ter demolido a ideia de lei come mpéotayua. Em outras palavras, pode-se pensar essa abordagem de Protigoras como um exame das relagdes entre ética e politica, consideradas em seus aspectos criticos e ainda no resolvidos na nova (protagérica) unidade. Nestle” apresenta a hipotese que afirma que o Méyas Aé- 05, Grande tratado (DK 80 B 3), nio constitui um titulo que se pode atribuir a Protigoras, porque, 20 contririo, deve ser a definigio de alguém que o citava, Ele identifica esse Grande tratado com o Tlepi &petesv, e pensa que os outros escritos éti- cos, citados por Didgenes Laércio e discutidos por mim acima, Plat. De stoicorum repograntis, 1037, O-F ~ SVF, 175, 42. © Ver, or exemplo, Celso. Anti; MoyOs, V, 25.€34. Nese. Vidzl., p. 296, nota 124. Para von Fritz. Pret, 920, seria uma ‘obra aut8noma. 14a] | Ones oe Prorkcons | referem-se ao contetido desse Grande tratado, Eu, por minha vez, no posso aceitar essa hipdtese, pois o tinico fragmento do Grande tratado que chegou até nés (DK 80 B 3) refere-se, ‘como sera demonstrado a seguir™, & parte construtiva da dou- tring de Protigoras, nao aquela critica das Antilogias, is quais eu acredito que, sem divida, pertenca o Mepi apereav. Acredito que © Grande tratado s6 pode ser uma denominacao dada por outro ao escrito Verdade de Protigoras. D) A quarta segao das Antilogias devia tratar das artes para demonstrar seu valor empirico™, Provavelmente podemos pen- sar em um titulo genérico Tlepi vexvaau, Sobre as artes”, Podem ser consideradas segdes dessa parte das Antilogias o Tlepi néikns, Sobre a luta, ¢ 0 Tepi résv uatncreov, Sobre a matematica”. % cap, parce th §3,2 2S Versobre esse tema Unterssiner Prat Ant, p37 sq, % Nestle. VMLzL,p. 301 seq, Schr. Lt li p23 ¢29, nota 3, 2” referencia ag, em nota, ese de Gompers Th Apc Fem, 230 seq £296 seq, segundo sual o autor do escreo ep Tex, nus no corpo hipocratic, seria Potigoras. Mas esa hipotese¢ hoje peralmentereficad, ver, por exerpio, Natorp Pret, especialmente. 278-279; Rveud Der, p24, nota 515; Gompers H. Suh, p. 48, nota 6; Lortineg, 1913, p. 132; Bohlen Plt, 193 seq; Zeller. Phil. Grp. 1308, nota 4 1380, nota; 1375-1376, Neale Wate, p. 302-305; Schmid tp. 3, morse 186 214; von Fi Prt 920, 30-34; esky. GGL, p. 377. De qunlgver manera, podese admit com a maiona des tuna em tl obra dre od ao om ia a “na medicina devese cong conmtantementeosaberem cad aplcacto, ‘Semaneira que nunca se si do dominio do peovdvel, no qual profabidade & baxant stl econstulda de pondersves" (Rey. Sp'424). © problema do twstade pseudo hipeerdic Tei erg parece me agora brihantemerte reso vido por Vegtt. Pe que nota, ames de qualquer coisa, que autor dr obra um Floto, que, de um lado, mora prediegS0 pelos "manimos probs ter os", mas, por aur, pelo problema das ea em odor oF seus aspctos |p). Seus adversrios sho, portato, o8 “negadores da mecicna¢ das ida em set conjunc" (p. 24), Quanto 20 problema da identiieagio dessesadvrsaros das teint (p. 27 seq), ele noe como ele reconhecer como dna tere a do ier ‘risico« polemizam cones qualquer ours eve “Agua obvevaoes marge nals (01 BaBGAADWrES cap, 1; oT ips Myovees: cap, 1) parecer emer

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