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Cap. 9 * CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 605, parcial, bem como a fusio, ciszo ou incorpora¢do, no admitidas no edital ¢ no contrato” e “a dissolugio da sociedade ou o falecimento do contratado”. Nao obstante, a regra segundo a qual os contratos administrativos so celebrados intuit personae nao € absoluta. A Lei 8.666/1993 prevé a pos- sibilidade de subcuntratucio parcial, coutanto que esteja pievisia uu edital e no contrato © que seja autorizada, em cada caso, pela administrago, que deve estabelecer os limites das partes do objeto do contrato cuja execugao poderd ser subcontratada. O art. 72 da lei afirma que “o contratado, na execucdo do contrato, sem prejuizo das responsabilidades contratuais ¢ legais, poder subcontratar partes da obra, servigo ou fornecimento, até o limite admitido, em cada caso, pela Administragao” Diversamente, o art. 13, § 3.°, estabelece uma vedacao absoluta a sub- contratagao, no caso da prestacao de servigos téenicos especializados, nos seguintes termos (grifamos): §3.° A empresa de prestacio de servigos técnicos especializados que apresente relacdo de integrantes de seu corpo técnico em procedimento licitatério ou como elemento de justificagao de dispensa ou inexigibilidade de licitago, ficard obrigada a garantir que os referidos integrantes realizem pessoal e diretamente os servigos ohjeta da contrato Saas USULRS EXORBITANTES |) As assim denominadas el4usulas exorbitantes caracterizam os contratos administrativos, sio a nota de direito piiblico desses contratos, as regras que os diferenciam dos ajustes de direito privado. Sao chamadas exorbitantes justamente porque exorbitam, extrapolam as cléusulas comuns do direito privado e no seriam neste admissiveis (nos contratos de direito privado as partes estdio em situacaio de igualdade juridica). As cléusulas exorbitantes podem ser explicitas ou implicitas. A Lei 8.666/1993, seguindo a sistematizacto doutrinéria, expressamente passou a prever todas as clausulas exorbitantes apontadas tradicionalmente pelos administrativistas. Segundo o entendimento do Prof. Hely Lopes Meirelles, elas podem roproscntar uma vantagem (prerrogativa) ou uma restri¢fo 4 administrago ou ao contratado. Pensamos ser relevante, contudo, consignar que os demais autores somente se referem as cléusulas exorbitantes como disposigdes que 606 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO + Marcela Alaxandrina & Vicente Paulo iraduzem poderes, prerrogativas especiais para a administracéio, e nfo como cléusulas que impliquem restrigées ao poder ptiblico. Nossa opiniéo é que a expresso “clusulas exorbitantes” deve ser uti- lizada como sindnimo de prerrogativas especiais da administracao publica nos contratos administrativos, decorrentes do regime juridico de direito pi- blico a que se sujeitam esses contratos, mais especificamente, derivadas do principio da supremacia do interesse piiblico, e nfo como restrigdes especiais impostas 4 administracao. De todo modo, deve-se atentar para o fato de que os contratos adminis- tativos so apenas predominantemente regidos pelo direito publico. Deveras, aplicam-se a eles, subsidiariamente, as normas e principios de direito privado, pertinentes 4 denominada “teoria geral dos contratos”. E explicito quanto a essa aplicagiio subsidiéria aos contratos adminis- trativos das normas de direito privado o art. 54 da Lei 8.666/1993, abaixo transcrito: Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas suas cléusulas e pelos preceitos de direito piblico, aplicando-se-thes, supletivamente, os principios da teoria geral dos contratos e as disposigdes de direito privado As principais cléusulas exorbitantes estio enumeradas no art. 58 da Lei 8.666/1993, cujo teor convém reproduzir na integra: Art. 58. O regime juridico dos contratos administrativos insti- tuido por esta Lei confere 4 Administragao, em relagdo a eles, a prerrogativa de: I ~ modificé-los, unilateratmente, para melhor adequagao as finalidades de interesse piblico, respeitados os direitos do contratado; TI ~ rescindi-los, unijateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; II — fiscalizar-thes a execugao; IV ~ aplicar sangdes motivadas pela inexecugao total ow parcial do ajuste; V — nos casos de servigos essencisis, ocupar provisoriamente bens méveis, iméveis, pessoal e servigos vinculados ao objeto do contrato, na hipétese da necessidade de acautelar apuragdo administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipétese de rescisio do contrato administrativo. Gap. 8 + CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 607 § 1 As cléusulas econémico-financeiras e monetérias dos contratos administrativos n&o poderdo ser alteradas sem prévia concordancia do contratado. § 2.° Na hipdtese do inciso I deste artigo, as clausulas econé- mico-financeiras do contrato deverio ser revistas para que ce mantenha o equilfbrio contratual. A seguir, além das cléusulas exorbitantes listadas nos incisos I a V trans- critos acima, sero estudadas: (a) as restrigdes A oposicHo, pelo contratado, da denominada “excegio do contrato nao cumprido” (art. 78, XV); (b) as normas acerca de exigéncia de garantia pela administragdo (art. 56); ¢ (c) a possibilidade de a administragto exigir do contratado medidas de compen- sagdo comercial, industrial ou tecnolégica e acesso a condigées vantajosas de financiamento (art. 3.°, § 11). Esta ultima (letra “c”), embora no esteja inserida entre as disposigdes especificamente concementes aos contratos administrativos, deve ser acrescentada a lista de cldusulas exorbitantes, uma vez que traduz prerrogativa da administragao publica passive! de ser imposta unilateralmente aos administrados que com ela contratem. AA. Poder de alteracao unilateral do contrato A alteragio unilateral do contrato administrative deve sempre ter por escopo a sua melhor adequagdo as finalidades de interesse piblico. Devem, ademais, ser respeitados os direitos do administrado, especialmente o direito a observancia dos limites legais de alteragdo por parte da administragdo ¢ 0 direito 20 restabelecimento do equilibrio econdmico-financeiro originalmente estabelecido. Devido a essa pretrogativa de alleragfo unilateral do contralo por uma das partes (a administracao), diz-se que aos contratos administrativos nao se aplica integralmente 0 postulado pacia sunt servanda. Esse principio traduz a obrigago de cumprimento das cléusulas contratuais conforme foram esta- belecidas inicialmente — e é um dos mais importantes postulados dentre os que regem os contratos privados. O art. 65, I, da Lei 8,666/1993 especifica os casos em que é cabivel a alteracdo unilateral do contrato pela adminisiraciio, nestes termos (grifamos): Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderdo ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: I~ unflateralmente pela Administracao: a) quando honver madificagio do projeto ou das especificacées, para melhor adequagio técnica aos seus objetivos; 608 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO = Mercelo Alexanctina & Vicente Paulo b) quando necessiria a modificagdo do valor contratual em decorréncia de acréscimo ou diminuigao quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei; Como se vé, esto autorizadas alteragdes: (a) qualitativas (alinea “a”), em que o objeto do contrato nao sofre acréscimos ou diminuigdes (0 contrato é alterado em decorréncia de modificago do projeto ou das especificagées); e (b) quantitativas (alinea “b”), quando 0 objeto do contrato sofre acrésci- mos ou dimimuigées e, por esse motivo, é necesséria a modificagiio do valor coutiatual. Os limites de alteragao contratual unilateral estao fixados no § 1.° do art, 65. Nos literais termos desse dispositivo, “o contratado fica obrigado a aceitar, nas mesmas condigdes contratuais, os acréscimos ou supressdes que se fizerem nas obras, servicos ou compras”: a) até 25% do valor inicial atualizado do contrato (é a regra geral); e b) até 50% do valor inicial atualizado do contrato, no caso especifico de acréscimos em coniratos de reforma de edificio ou de equipamento (para . permanece o limite de 25%) Abrimos um parntese para registrar que a lei admite que esses limites sejam excedidos na hipétese, exclusivamente, de “supressdes resultantes de acordo celebrado entre os contratantes”. Nao se trata, porém, de uma clausula exorbitante, nao traduz prerrogativa da administragao publica ante o particular contratado, haja vista que pressupde acordo entre as partes, Existe divergéncia na doutrina quanto a aplicahilidade dos limites per- centuais estipulados no § 1.° do art. 65 da Lei 8.666/1993: alguns autores defendem que eles somente incidem no caso de alteragdes quantitativas, enquanto outros sustentam a necessidade de sua observancia também na hipotese de alteraces qualitativas. A segunda corrente citada argumenta que a alteragfio do contrato decorren- te da “modificagao do projeto ou das especificacbes, para melhor adequagao técnica aos seus objetivos”, terd repercussdo no valor contratual, ¢ a prerro- gativa de alterar esse valor ilimitadamente poderia implicar destespeito aos direitos do contratado, ao principio da proporcionalidade e, especialmente, fraude a licitagao. Em reforgo, invoca 0 § 2.° do art. 65, nos termos do qual “nenhum acréscimo ou supressdo poderd exceder os limites estabelecidos no paragrafo anterior” (salvo as supressdes resultantes de acordo celebrado entre os contratantes). Cap. 8s CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 609 O Tribunal de Contas da Uniéo (TCU) possui decisio em que afirmou a aplicabilidade dos limites estabelecidos no § 1.° do art. 65 da Lei 8.666/1993 tanto no caso de alteracao unilateral quantitativa quanto no de qualitativa (Decis&o Plendria 215/1999). A nosso ver, a reda¢io dos dispositivos legais ora em foco ndo di margem a interpretagdo advogada pela segunda corrente doutrinaria (¢ pelo TCU). Obtemperamos, sucintamente, que: (a) a lei diz que a alteragio quantitativa é cabivel “quando necesséria a modificagéio do valor contratual em decor- réncia de acréscimo ou diminuicZo quantitativa de seu objeto, nos limites permitidos por esta Lei”; (b) nao ha referéncia aos “limites permitidos por esta Lei”, tampouco a acréscimos ou diminuigdes do objeto do contrata, no preceito que versa sobre a alteragao qualitativa; (c) o § 1.° do art. 65 fala em “acréscimos ou supressdes que se fizerem nas obras, servicos ou com- pras”, ou seja, ele trata de “acréscimo ou diminuicao” do objeto do contrato, © que remete ao dispositivo acerca da alterago quantitativa; e (4) 0 § 2° do art. 65, ao estatuir que “nenhum acréscimo ou supressao podera exceder ‘os limites estabelecidos no pardgrafo anterior”, reporta-se exatamente an § 1°, que, como visto, versa exclusivamente sobre “acréscimos ou supresses que se fizerem nas obras, servigos ou compras”, isto €, sobre “acréscimo ou diminuig&io” do objeto do contrato. Em suma, filiamo-nos A linha doutrindria que entende somente serem aplicaveis os limites percentuais previstos no § 1.° do art. 65 da Lei 8.666/1993 as alteragécs unilaterais quantitativas Isso mo significa, de modo algum, que se defenda a possibilidade de a administragao proceder a alteragées qualitativas ilimitadas, Estas jamais poderao ser de tal monta que cheguem ao ponto de desnaturar 0 objeto do contrato, Ademais, elas s6 so possiveis quando houver modificacao do projeto ou das especificagdes que resulte em aperfeicoamentos de ordem técnica. Cumpre ponderar que, sob pena de fraude & licitacdo, a margem que a administracao tem para modificar o projeto ou as especificagdes sem- pre é bastante restrita (ainda que no haja repercussto financeira relevante). Além disso, serd necessaria a comprovacao de que a modificacao do projeto ou das especificagées atende & exigéncia de proporcionar “melhor adequagaio técnica aos seus objetivos” (nao se trata de decistio amplamente discricionéria), Alias, seria até possivel imaginar uma alteracao qualitativa que, mesmo sem modificar 0 valor do contrato, devesse ser considerada ilfcita, por desnaturar © seu objeto. O que no nos parece vidvel ¢ aplicar limites percentuais predefinidos, que a lei estabelece para hipéteses de aumento ou diminuigao do objeto do contrato, a alteragdes que no se referem, diretamente, a au- mento ou diminuicao do objeto do contrato, No caso de supressio de obras, bens ou servigos, se 0 contratado jé houver adquirido os materiais e posto no local dos trabalhos, estes deverao 610 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO « Mercelo Alexancinno & Vicente Paulo set pagos pela administrago pelos custos de aquisigao regularmente com- provados e monetariamente corrigidos, podendo caber indenizagao por ou- tros danos eventualmente decorrentes da supressio, desde que regularmente comprovados. A possibilidade de alteragio unilateral do contrato pela admimistragao somente abrange as cléusulas regulamentares (também chamadas cldusulas de servico ou de execucao), que so aquelas que dispdem sobre o objeto do contrato © a sua execugo — e n&o sobre a remuneraciio do contratado. Nunca podem ser modificadas unilateralmente as denominadas cliusu- las econémico-financeiras dos contratos, que estabelecem a relagio entre a remuneragdo € os encargos do contratado, a qual deve ser mantida durante toda a execugo do contrato. A impossibilidade de alterag4o unilateral de tais clusulas ¢ a necessidade de manuten¢%o do equilfbrio econdmico-financeiro do contrato esto expressamente previstas nos §§ 1.° e 2.° do art. 58 da Lei 8.666/1993. Beles Manutencao do equilibrio econémico-financeiro do contrato Embora possa a administracdo alterar unilateralmente o objeto e as condigées de execugao dos contratos administrativos, modificando, dentro dos limites da lei, suas cléusulas ditas de execu¢io, regulamentares, ow de servico, é garantida ao contratado a impossibilidade de alteragao, por ato unilateral, das clausulas econémico-financeiras do contrato (art. 58, §§ oa) Assim, a equacao financeira originalmente fixada no momento da cele- bracao do contrato deverd ser respeitada pela administracdo. Esta terd que proceder, sempre que houver alteragio unilateral de alguma clausula de execucao que afete a equacdo financeira original, & revisio do contrato, é dizer, aos ajustamentos econdmicos necessérios 4 manutengdo do equilibrio financeiro denotativo da relagio encargo-remuneraco inicialmente estabele- cida para o particular como justa e devida (art. 65, § 6.9). Tome-se como exemplo um contrato que preveja a pavimentagiio de 200 Km de uma rodovia, com remuneragao de R$ 300.000,00 a empresa contratada para a execugdo. Como se sabe, a administrago poder alterar unilateralmente a quantidade de quilémetros a serem pavimentados, para mais ou para menos ~ desde que esses acréscimos ou supress6es nao ul- trapassem 0 correspondente a 25% do valor inicial (atualizado) do contrato (art. 65, § 1). Imaginando que a administrac&o determine, unilateralmente, a pavimenta- gio de uma extensdo de rodovia maior do que a inicialmente contratada, ela Gap. 9 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS étt seré obrigada 4 revisiio do valor do contrato para mais ~ podendo chegar, no maximo, a R$ 375.000,00 (desconsiderando eventual atualizacdo). Supondo, para efeito de simplificagao, que 0 valor do contrato fosse estritamente proporcional ao namero de quilémetros pavimentados, entéo, no nosso exemplo, a administragdo poderia determinar, unilateralmente, que a contratada pavimentasse até 50 Km a mais de rodovia, chegando a um total maximo de 250 Km, mas ficaria obrigada a promover a revisio do valor do contrato, proporcionalmente, até RS 375.000,00, a fim de assegurar a manutencdo do seu equilibrio econdmico-financeiro O mesmo raciocinio se aplica na hiptese de redugZo unilateral do objeto do contrato. Outra consequéncia da inalterabilidade do equilibrio financeiro do contra- to € a previsio legal e contratual de reajuste periédico de pregos e tarifas, conforme expressamente estipulado no art. 55. III, da Lei 8.666/1993. A lei esclarece, fambém, que a variagio do valor contratual para fazer face a0 re- ajuste de pregos previsto nele préprio no caracteriza alterag4o do contrato, podendo ser registrada por simples apostila, dispensando a celebracao de aditamento (art. 65, § 8.°). Conquanto muitas vezes seja feita alguma confusio no emprego desses vocabulos, deve-se, tecnicamente, diferenciar a revisio do mero reajuste. A revisio do contrato tem lugar quando a admumistracdo procede a alteracaio unilateral de suas cléusulas de execugao, afetando a equagio eco- némica original, ou quando algum evento, mesmo que externo ao contrato, modifica extraordinariamente os custos de sua execugao. Nessas hipdteses, 0 contratado tem direito 4 chamada reviséo do contrato, para restabelecimento de seu equilfbrio econémico-financeiro. O mero reajuste é algo que ocorre periodicamente, estando relaciona- do A inflagdo ordinaria ou a perda ordindria de poder aquisitive da moeda, seguindo indices determinados, tudo conforme previamente estabelecido no prdprio contrato. A revisio no é algo que ocorra periodicamente, nenhuma relagdo tem com inflago ordindria ou perda ordindria de poder aquisitivo da moeda, descabendo, por isso, cogitar de “indices preestabelecidos”, como ocorre na hipétese de reajuste. Ambos, revisdo e reajuste, entretanto, ttm como fundamento a inalte- tabilidade do equilibrio econémico-financeiro do contrato e, vale repetir, as vezes sio cmprcgados indiscriminadamentc, como cxpressées sinénimas. Finalizando este tépico, nao é demais transcrever, dada a sua importancia, os preceitos pertinentes, todos eles vazados no art. 65 da Lei 8.666/1993: 612 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO + Marcelo Alexanciino & Vicente Paulo Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderio ser alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes casos: Gd Il — por acordo das partes: G) 4) para restabelecer a relago que as partes pactuaram inicialmen- te entre os encargos do contratado ¢ a retribuico da administra- 20 para a justa remunerago da obra, servigo ou fornecimento, objetivando a manutengo do equilibrio econémico-financeiro iniciai do contrato, na hipétese de sobrevirem fatos imprevisiveis, ou previsiveis porém de consequéncias incalculivcis, vetardado- res ou impeditivos da execugao do ajustado, ou, ainda, em caso de forga maior, caso fortuito ou fato do principe, configurando flea econdmica extraordinaria ¢ extracontratual G2) § 52 Quaisquer tributos ou encargos legais criados, alterados ou extintos, bem como a supervenséncia de disposigées legais, quando ocorridas apés @ data da apresentagio da proposta, de comprovada repercussio nos pregos contratados, implicario a revistio destes para mais ou para menos, conforme 0 caso. § 6° Em havendo alteragao unilateral do contrato que aumente 05 encargos do contratado, 2 Administragéo deverd restabelecer, por aditamento, o equilfbrio econdinico-fiuanceiro inicial (2 § 8° A variacdo do valor contratual para fazer face ao reajuste de pregos previsto no préprio contrato, as atualizagdes, compen- sages ou penalizac&es financeiras decorrentes das condigdes de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotacdes orgamentérias suplementares até o limite do seu valor corrigido, nao caracterizam alteracio do mesmo, podendo ser registrados por simples apostila, dispensando a celebragao de aditamento. 4.2. Possibilidade de rescisdo unilateral do contrato No direito privado, em regra, nao existe a possibilidade de resciséo uni- jateral de um contrato, uma vez que as partes se encontram em posicao de igualdade juridica. Os contratos administrativos, diferentemente, so regidos predominantemente pelo direito piblico, 0 que confere a uma das partes ~ a administrago piblica — posigéo de supremacia juridica ante 2 outra ~ 0 particular. ‘Uma das mais expressivas manifestages dessa desigualdade juridica entre as partes em um contrato administrativo consiste na possibilidade que a lei Cap. 9 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 613 confere & administracao publica de rescindir unilateralmente 0 contrato, isto é, extingui-lo antes do prazo, sem necessidade de recorrer ao Poder Judiciério ou de obter o consentimento do particular contratado. A maioria das hipdteses autorizadoras de rescisdo unilateral diz respeito a situagdes em que ocorre algum inadimplemento contratual inescusivel pelo particular contratado. Porém, é tamanha a extensdo dessa prerrogativa da administragaio pliblica que a lei admite a rescisio unilateral até mesmo fundamentada em “razées de interesse piblico, de alta relevancia e amplo conhecimento”, ou seja, sem que tenha havido qualquer descumprimento contratual por parte do particular. Também na hipétese de forca maior ou caso fortuito a rescisdo unilaieral ¢ prevista. A Lei 8.666/1993, em seu art. 58, II, confere 4 administracao a prerro- gativa de rescindir unilateralmente os contratos administrativos, sempre que verificadas as hipéteses enumeradas no seu art. 79, I. As hipdteses de resci~ so unilateral ¢ suas consequéncias para a administragao e para o particular contratado serdo detalhadas em outro tdpico, acerca das formas gerais de extingdo dos contratos administrativos. . Fiscalizag&o da execugde do contrato A prerrogativa, que possui a administragtio, de controlar e fiscalizar a execugdo do contrato administrative ¢ um dos poderes a cla inerentes ¢, por isso, a doutrina assevera estar esse poder implicito em toda contratagéio pablica, dispensando cléusula expressa. De qualquer forma, a Lei 8.666/1993 expressamente enumera como prerrogativa da administragdo a fiscalizagio da execugio dos contratos administrativos (art. 58, IID). Nos termos da Lei 8.666/1993, deverd ser designado um representante da administragio especialmente para acompanbar e fiscalizar a execugo do contrato, permitida a contratago de terceiros para assisti-lo e subsidié-lo de informagées pertinentes a essa atribuigGo (art. 67). Esse poder-dever de fiscalizagio e acompanhamento € permanente e abrange todo o periodo de execugtio do contrato. E oportuno transcrever o art. 67 da Lei 8.666/1993 Art. 67. A exeongao do contrato deverd ser acompanhada ¢ fiscalizada por um representante da Administraga0 especialmente designado, permitida a contratacao de terceiros para assisti-lo ¢ subsidié-lo de informagdes pertinentes a essa atribuicao. § L° O representante da Administragdo anotaré em registro préprio todas as acorréncias relacionadas com a execugio do contrato, determinando o que for necessitio a regularizagao das faltas ou defeitos observados. 614 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLIGADO + Marcelo Alexandrina & Vicente Paulo §2.° As decisdes e providéncias que ultrapassarem a competéncia do representante deverfo ser solicitadas 2 seus superiores em tempo hébil para a adocdo das medidas convenientes. De sua parte, 0 contratado deve manter preposto, aceito pela admi- nistragao, no local da obra ou servigo, para representé-lo na execugaio do contrato (art. 68). E importante enfatizar que a fiscalizagao no exclui ou reduz a respon- sabilidade do contratado pelos danos que, por culpa ou dolo, a execugao do contrato venha a causar a terceiros, consoante explicita o art. 70 da Lei 8.666/1993, abaixo reproduzido: Art. 70. O contratado responsavel pelos danos causados direta- mente & Administragao ou a terceiros, decorrentes de sua culpa ou dolo na execugao do contrato, nfio excluindo ou reduzindo essa responsabilidade a fiscalizago ou o_acompanhamento pelo drgio interessado. 4.4. Aplicac3o direta de sangées A administra¢io piblica tem o poder-dever de aplicar ao contratado sangdes administrativas na lei previstas, desde que the assegure o exerci- cio do contraditério e da ampla defesa prévios, no ambito de um processo administrativo regularmente instaurado. Tais sangdes serfio impostas direta- mente pela administragao pitblica, isto é, sua aplicacao independe de prévia manifestag3o do Poder Judiciério. As sangfies administrativas previstas na Tei 8.666/1993 sfin as segnintes- a) multa de mora, por atraso na execugio do contrato (art. 86); b) adverténcia (art. 87, Ds ¢) multa, na forma prevista no instrumento convocatério ou no contrato, por inexecugio total ou parcial do contrato (art. 87, ID; 4) suspensao temporaria da possibilidade de participagao em licitagao e impe- dimento de contratar com a administragéo, por prazo nfo superior a dois anos (art. 87, 1M); ©) declaragao de inidoneidade para licitar ou contratar com a administragio publica (art. 87, IV). Para aplicar qualquer dessas sangées, a administragéo deve facultar ao particular a apresentaglio de defesa prévia, no prazo de cinco dias Cap. 9 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 65 Gteis (art. 87, § 2.°). A Lei 8.666/1993 nao explicita o termo de inicio de contagem desse prazo, mas podemos inferir que os cinco dias iiteis serio contados da intimagao do administrado para apresentar sua defesa. Nessa intimagao, obviamente, serio comunicadas ao interessado todas as falhas ou inegulatidades que Lhe estiverem sendo imputadas, e outras informagaes relevantes sobre 0 processo administrativo respectivo, cuja vista, desde logo, ser-Ihe-4 franqueada. Tanto a multa de mora quanto a multa decorrente da inexecucdo total ou parcial do contrato podem ser aplicadas cumulativamente entre sie cumu- lativamente com as demais sangdes administrativas acima enumeradas (art 86, § 1°, e art. 87, § 2.9. As multas aplicadas pela administragdo podem ser diretamente des- contadas da garantia prestada pelo contratado, quando houver. Ademais, se a multa aplicada for superior ao valor da garantia prestada, além da perda desta, responder o contratado pela diferenca, que seré descontada, pela prépria administragao, dos pagamentos por ela eventualmente devidos ao contratado (art. 86, §§ 2.° € 3.°, e art. 87, § 1.°). Conforme se constata, a exigéncia das multas, nessas hipdteses, reveste-se de autoexecutorieda- de. Entretanto, se néo houver pagamentos devidos pela administragao a0 contratado, ou se o valor deles for inferior a diferenga entre as multas ¢ a garantia prestada, a parcela remanescente das multas tera que ser cobrada judicialmente, vale dizcr, a cxigéncia dessa parcela das multas, cin Lal hupétese, nfo sera autoexecutéria Ao aplicar a penalidade de suspensdo temporaria de participagéo em licitagdes e contratagbes, a administragao deve estipular a duragio da medida no caso concreto, tendo em conta a gravidade das infracdes comprovadas no processo administrativo correspondente, n&éo podendo a restrigao ultrapassar © prazo de dois anos. Da aplicagaio das penas de adverténcia, suspensio temporaria ¢ multa cabe recurso, no prazo de cinco dias titeis, a contar da intimagio do ato (art. 109, I, “f"). Se a licitagao tiver sido efetuada na modalidade convite, © prazo sera de dois dias titeis (art. 109, § 6.°). Esse recurso, em regra, no tem efeito suspensivo, mas a Ici faculta a autoridade administrativa competente atribuir-the tal eficdcia, “motivadamente € presentes razées de interesse piblico” (art. 109, § 2.°). Trata-se de um recurso hierdrquico, haja vista que “serd dirigido & autoridade superior, por intermédio da que praticou o ato recorrido, a quai poder reconsiderar sua decisaio, no prazo de 5 (cinco) dias titeis, ou, nesse mesmo prazo, fazé-lo subir, devidamente informado, devendo, neste caso, a decistio ser proferida dentro do prazo de 5 (cinco) dias titeis, contado do recebimento do recurso, sob pena de responsabilidad” (art. 109, § 4.°). eis DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO * Marcolo Alexandrina & Vicente Paulo A declaracio de inidoneidade para licitar ou contratar com a adminis- tragdo piblica é sancio de competéncia exclusiva de ministro de Estado, de secretirio estadual ou de secretério municipal, conforme o caso. Deve a administragaio publica facultar ao interessado a apresentagao de defesa final, no prazo de dez dias, contados da abertura de vista dos autos do processo (art. 87, § 3.) Configura a defesa final uma segunda defesa, posterior aquela defesa prévia apresentada no prazo de cinco dias iiteis, comum a todas as sangdes administrativas aqui estudadas (art. 87, § 2.°). A defesa final — que s6 é prevista para a sang&o de declaragiio de inidoneidade — ¢ apresentada depois de concluida toda a parte instrutoria da tramitagfio provessual, quando o administrado ja tem possibilidade de conhecer todos os elementos trazidos aos autos, inclusive a proposta de aplicagdo da penalidade, enderegada & autoridade competente (ministro de Estado, secretirio estadual ou secretirio municipal). Ou seja, a defesa final € apresentada imediatamente antes da tomada de deciso quanto @ aplicacao, ou nao, da sangao de declaragio de inidoneidade proposta nos autos do processo. O Superior Tribunal de Justiga ja decidiu que “a auséncia de abertura de prazo para oferecimento de defesa final sobre a possivel aplicagdo da pena de inidoneidade acarreta nulidade no processo administrativo a partir desse momento processual”? Du uplicaydu dessa sangéo cabe pedide de reconsiderago, no prazo de dez dias titeis, contados da mtimagio do ato (art. 109, Ill), impedimento de licitar ou contratar com a administragao permanecera enquanto perdurarem os motivos determinantes da punigao, ou até que soja promovida a reabilitacao perante a propria autoridade que aplicou a penali- dade. A reabilitagdo somente pode ser requerida apés dois anos da aplicagao dessa sangao ¢ sera concedida sempre que o contratado ressarcir a adminis- traco. pelos prejuizos resultantes da inexecuco total ou parcial do contrato. Existe muita controvérsia na doutrina acerca da abrangéncia das pe- nalidades de suspensio do direito de licitar e contratar ¢ de declaragio de inidoneidade. Sobre esse ponto, cumpre, de infciv, uuutar que a Lei 8,666/1993, nos incisos XI e XII do seu art. 6.°, apresenta, expressamente, as seguintes de- finigGes: Art. 6.° Para os fins desta Lei, considera-se: G) 2 MS 17431/0F, rel. Min. Castro Meira, 26.09.2012 (Informativo 505 do ST¥). Cap. 9+ CONTRATOS ADMINISTRATIVOS ei XI — Admimistrag&o Publica: a administragao direta e indireta da Unido, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municipios, abrangendo inclusive as entidades com personalidade juridica de direito privado sob controle do poder piiblico e das fundacies por ele instituidas ou mantidas; XII — Administrag&io: drgio, entidade ou unidade administrativa pela qual a Administra¢o Publica opera e atua concretamente; O inciso II do art. 87 da Lei 8.666/1993 textualmente fala em suspensio do direito de licitar e contratar com a “administracdo”. Diversamente, o inciso TV do mesmo artigo se refere a declarago de inidoncidade para licitar on contratar com a “administragao publica” Em razio dessa diferenca literal nas expresses empregadas pelo legis- lador, parte da doutrina entende que a suspensto sé alcancaria os érgios © entidades administrativos do proprio ente federado que aplicou a sangio, a0 passo que a declaragao de inidoneidade abrangeria toda a administragio publica brasileira, em todos os niveis. Em que pese a plausibilidade do argumento, na junsprudéncia do Superior Tribunal de Justica prevalece o entendimento de que tanto a penalidade de suspensdo quanto a penalidade de declaracio de inidoneidade aplicadas por um ente federado produzem efeitos perante todos os demais, vale dizer, abrangem a administragao piblica da Unido, dos estados, do Disirito Federal e dos municipios. Em pelo menos uma ocasio, a mesma orientacdo foi adotada pelo TCU." B oportuno abrir um paréntese para observar que, no caso especifico do pregio, a sane andloga, prevista no art. 7.° da Lei 10.520/2002, ¢ ficar © infrator “impedido de licitar © contratar com a Unido, Estados, Distrito Federal ou Municipios”. Dessa forma, quanto ao pregito, nfo ha divida: a penalidade de impedimento de licitar e contratar sé se estende aos érgaos e entidades administrativos do ente federado que a aplicou. A aplicagio de sangdes pela administragio publica no impede que ela, cumulativamente, decrete a rescisfo unilateral do contrato. Evidentemente, qualquer aplicagiio de sangio, bem como a rescisio unilateral ocasionada por imregularidades imputadas ao contratado, devem ser precedidas de processo administrativo em que se assegure ao contratado o direito ao contraditério e a ampla defesa. E relevante observar que a jurisprudéncia do Superior Tribunal de Justica firmou-se pela inexisténcia de efeito rescisério automatico como decorréncia 3” REsp 161,567/RUJ, 25.02.2003; REsp 174.274/SP, 19.10.2004; REsp 520.553/RJ, 03.11.2008. * Acdrdao 2.218/2011 (1.9 Camara), 12.04.2011. 618 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO + Marcelo Alexandnno & Vicente Paulo da aplicago das sangées de declaracao de inidoneidade ¢ de suspensao do direito de contratar e licitar. Significa dizer que essas penalidades sé tém efeitos prospectivos (ex nunc), obstando, enquanto a sancaio durar, a celebracio de futuros contratos. Blas nao autorizam que se considerem automaticamente rescindidos os contratos administrativos j4 aperfeigoados juridicamente ¢ em curso de execugao.5 Cabe desiacar, porém, embora seja um tanto ébvio, que essa falia de efeito rescisdrio automatico nfo impede que, sendo o caso, @ administragdo publica adote os procedimentos necessarios para rescindir contratos que tenha com aquele particular que sofreu a penalidade de declaracao de inidoneidade ou de suspensdo, desde que demonstre estar presente alguma situagao que se enquadre nas hipdteses legais autorizadoras de rescisdo contratual, sempre observados 0 contraditério e a ampla defesa, 4.5. Ocupacao temporaria Quando o objeto do contrato for a prestagéio de um servico essencial, a administragio pode “ocupar provisoriamente bens méveis, iméveis, pessoal e servigos vinculados ao objeto do contrato, na bipdtese da necessidade de acautelar apuracdo administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipétese de rescisao do contrato administrativo” (art. 58, V). Conforme se constata, hd duas situagoes distintas em que ¢ prevista a ocupacio tempordria (ou proviséria). Na primeira delas, a ooupac&o configura medida acautelatéria, que visa a possibilitar a apuracio de irregularidade na execucéo do contrato. O contrato esté em execugio e a ocupagiio provisdria tem apenas o intuito de assegurar a sua continuidade enquanto se apuram as eventuais faltas impu- tadas ao contratado. Ao final da apuragdo poderd, ou ndo, haver a rescisao unilateral do contrato. A segunda possibilidade de ocupagiio temporéria prevista no inciso V do art. 58 da Lei 8.666/1993 ocorre imediatamente apés a rescisdo do conirato administrative. O seu fundamento é 0 principio da continuidade dos servicos publicos, Uma vez rescindido o contrato, a administracdo assume o seu objeto © promove a ocupago ¢ a utilizagdo provisérias dos recursos materiais humanos do contratado que forem necessérios para evitar a interrupgao da execugéo do contrato. No capitulo acerca dos servigos piiblicos sera visto que, no caso par ticular dos contratos de concessio e de permissio de servigos piblicos, a = MS 14.002/DF, rel. Min. Teori Zavascki, 28.10.2009; REsp-AgR 1148.351/MG, rel. Min. Herman Benjamin, 18.03.2010. a Cap. 9s CONTRATAS AMMINISTRATIVOS e190 cléusula exorbitante estudada neste t6pico recebe a denominagio especifica de intervencao. 4.6. Restrigées & oposicéo da excesév du contrato ndo cumprido (exceptio non adimpleti contractus) Nos contratos onerosos regidos pelo direito privado é permitido a qualquer dos contratantes suspender a execugao de sua parte no contrato enquanto 0 outro contratante nao adimplir a sua propna. Assim, 3c José contrata a prestagau de uu servigo mensal a ser reali- zado por Pedro e este deixa de prestar o servigo, digamos, 20 quinto més, é licito a José suspender 0 pagamento até que Pedro cumpra as suas obri- gag6es contratuais. Da mesma forma, se José nao efetua 0 pagamento na data combinada, fica Pedro autorizado a nao prestar o servico enquanto néo efetivado o pagamento. A essa suspensio da execugdo do contrato pela parte prejudicada com a inadimpléncia do outro contratante di-se o nome de oposicdo da excecao do contrato nao cumprido (exceptio non adimpleti contractus). Em relagiio aos contratos administrativos, a doutrina tradicional defendia a inoponibilidade, contra a administragio, dessa excegao do contrato néo cumprido, ou saja, nfo seria licito ao particular interromper a execucio da obra, 0 fornecimento dos bens, a prestacao do servico objeto do contrato, mesmo que a administragdo permanecesse sem pagar pela obra, pelos bens ou pelo servigo. Ao particular prejudicado somente caberia indenizacao pelos prejuizos suportados, cumulada ou nao com resciséo contratual judicial por culpa da administragao. Invocava-se, para justificar essa prerrogativa da admi- uistracdo, o principio da continuidade dos servicos ptiblicos (a expressao “servigos piblicos”, aqui, é empregada cm sentido amplo, como sinénimo de “atividade de administragao piblica em sentido material", alcangando, portanto, todas as atividades propriamente administrativas executadas sob regime juridico de direito piblico). Essa orientagio doutrindria, extremamente rigorosa em prejuizo do contratado, resultou afastada com a edigo da Lei 8.666/1993, que passou a possibilitar, como regra, a oposigaio da excecao do contrato néo cumprido pelo particular, estabelecendo, contudo, restrigdes a0 exercicio desse direito, A partir da Lei 8.666/1993 tomou-se adequado aludir meramente a uma temporaria inoponibilidade da excegaio do.contrato nao cumprido. Com efeito, @ oposicao dessa cléusula implicita pelo particular passon a ser expressamente autorizada na bipétese de atraso superior a noventa dias dos pagamentos devidos pela administragdo decorrentes de obras, servigos ou fornecimento, ou parcelas destes, jé recebidos ou executados (art. 78, XV). 620 DIREITO ANMINISTRATIVO DESCOMPLICADO + Marcelo Alexandrina & Vicente Paulo Cumpre ressaliar que a excegao do contrato ni cumprido nfo € opo- nivel, mesmo diante de etraso de pagamento superior a 90 dias, em caso de calamidade publica, grave perturbacSo da ordem interna ou guerra: Consideramos oportuno transcrever 0 inciso XV do art. 78 da Lei 8.666/1993, dada sua grande importancia: ‘Art. 78. Constituem motivo para resciséo do contrato: (2) XV — 0 atraso superior a 90 (noventa) dias dos pagamentos Gevidos pela Administrago decorrentes de obras, servigus ou fornecimento, ou parcelas destes, j4 recebidos ou executados, salvo em caso de calamidade piblica, grave perturbaco da ordem interna ou guerra, assegurado ao contratado o direito de optar pela suspenstio do cumprimento de suas obrigacGes até que seja normalizada a situagio; Conforme se constata, ressalvada a ocorréncia de calamidade publica, grave perturbagao da ordem interna ou guerra, o atraso da administracao, por, mais de 90 dias, no pagamento de parcela devida ao particular contratado, acarreta para ele a faculdade de escolher, a seu critério, entre: (a) suspender a execucdo do contrato; ou (b) obter a rescisdo judicial ou amigével do contrato. Se o contrato for rescindido por esse motivo, o particular contratado terd direito a ser ressarcido dos prejuizos comprovados que houver sofrido, tendo ainda direito 4 devolucdo da garantia, aos pagamentos devidos pela execugao do contrato até a data da resciséo e ao pagamento do custo da desmobilizagio (art. 79, § 2.°). ‘A lei, portanto, assegura o direito A indenizagao dos denominados danos emergentes, mas, frise-se, niio ha nela nenhuma disposisao prevendo inde- nizagao a titulo de Iucros cessantes (indenizagao baseada no valor estimado do lucro que 0 contratado teria com a execugio do contrato, e deixaré de obter em decorréncia da rescisio). E oportuno anotar que no caso dos contratos de concessao e de permis- sao de servigos pablicos nao ¢ cabivel a suspcnstio da execugiio do contrato pela concessionaria ou permissionéria, seja qual for o inadimplemento da administracdo, dure quanto durar. Nesses contratos, o descumprimento de obrigaco da administragio para com a concessiondria ou permissionéria enseja unicamente a rescisdo judicial, por iniciativa do particular, e os ser vigos prestados nfo poderdo ser interrompidos ou paralisados, até o trinsito em julgado da deciso judicial. Por tiltimo, deve-se atentar para o fato de que, no caso de inadimplemento do particular, a administragao sempre pode opor imediatamente a excegio do Cap. 9 CONTRATOS ADMINISTRATIVOS e2t contrato nao cumprido e, automaticamente, deixar de cumprir suas obrigagdes para com o contratado inadimplente (suspendendo os pagamentos a ele devidos, por exemplo, sem prejuizo das demais sangGes previstas na lei ¢ no contrato). 4.7. Exigéncia de garantia A exigéncia de que os particulares contratados (¢ também os licitantes) prestem garantias & administragao visando a assegurar o adequado adimple- mento do contrato, ou, na hipétese de inexecugao, facilitar o ressarcimento dos prejuizos softidos pela administragio, constitui uma das caracteristicas dos contratos administrativos, considerada, por alguns autores, uma cldusula exorbitante, uma vez que o respectivo regramento legal confere prerrogativas 4 administragao publica. ‘A exigéncia de garantia dos licitantes integra a fase de habilitagfo do procedimento licitatério, especificamente a comprovagao de qualificagio econémico-financeira. A garantia prestada pelos licitantes (art. 31, IID), quando o objeto da licitagdio for a celebracao de contratos de obras, servicos e compras, é limitada a.um por cento do valor estimado do objeto da contratagao e sera prestada nas mesmas modalidades e segundo os mesmos critérios previstos para a garantia passivel de ser exigida na celebracZo dos contratos administrativos. A garantia prestada pelos contratados, nas contratagdes de obras, servicos ¢ compras, seré exigida, em cada caso, a criteria da autoridade competente, desde que prevista no instrumento convocatdrio (art. 56). A garantia oferecida pelos particulares contratados nao excedera a cinco por cento do valor do contrato e teré o seu valor atualizado nas mesmas condigées daquele. Para obras, servicos e fornecimentas de grande vulto envolvendo alta complexidade técnica ¢ riscos financeiros consideraveis, demonstrados através de parecer tecnicamente aprovado pela autoridade competente, o limite de garantia poderé ser elevado para até dez por cento do valor do contrato. Nos contratos de concessdo de servigo piiblico precedida da execuciio de obra piblica é obrigatéria a exigéncia de garantia relativa a essa parte espe- cfifica do contrato a realizagiio da obra ~, adequada a cada caso e limitada ao valor da obra (Lei 8.987/1995, art. 18, XV, e art. 23, pardgrafo tinico, II). Nos contratos de parcerias piiblico-privadas deverd ser exigida do parceiro privado a prestagio de garantia de até dez por cento do valor do contrato (Lei 11.079/2004, art. 5.°, VID). ‘Nos casos de contratos que importem na entrega de bens pela adminis- trag&io, dos quais 0 contratado ficaré depositdrio, a0 valor da garantia deverd ser acrescido o valor desses bens. 622 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO « Marcalo Alexandrina & Vicente Pauio ‘A lei prevé trés diferentes modalidades de garantia, ficando a critério do contratado optar por uma delas. As modalidades so: a) caucio em dinheiro ou titulos da divida pitblica, devendo estes ter sido emitidos sob a forma escritural, mediante registro em sistema centralizado de liquidago ¢ de custédia autorizado pelo Banco Central do Brasil ¢ avaliados pelos seus valores econémicos, conforme definido pelo Ministério da Fazenda; b) seguro-garantia; A lei define seguro-garantia como “o seguro que garante o fiel cum- primento das obrigagdes assumidas por empresas em licitagtes e contra- tos”. Trata-se de garantia oferecida por empresa seguradora em que esta se obriga a completar as proprias custas 0 objeto do contrato ou a pagar A administragdo o valor necessario para tanto, no caso de inexecugdo por parte do contratado. ©) fianga bancaria. Nessa modalidade, um banco se responsabiliza a pagar um determinado valor 4 administracao na hipétese de inadimplcuento do contratado. O banco é obrigado a pagar até o limite do valor afiangado © nilo ha beneficio de ordem nessa espécie de fianga. ‘A garantia prestada pelo contratado seré liberada ou restituida apos a execugao do contrato e, quando em dinheiro, atualizada monetariamente. Sao as seguintes, em sintese, as regras sobre a exigéncia de garantia do contratado: a) a exigéncia ou nfo de garantia é decistio discriciomiria da autoridade competente (“a critério da autoridade competente”); no caso especifico da concessio de servigo piblico precedida da execugao de obra piblica ¢ obrigatéria a exigéncia de garantia relativa realizaclo da obra, adequada 2 cada caso ¢ limitada ao valor da obra; também no caso especifico dos contratos de PPP é obrigatoria a exigéncia de garantia do parceiro privado, de até dez por cento do valor do contrato; b) para poder ser exigida a garantia, é obrigatoria @ previsao no instrumento convocatério (edital); ©) caberé 20 contratado optar por uma das modalidades previstas em lei (caugio em dinheiro ou titulos da divida piblica, seguro-garantia ou flanga bancéria); Gap. 9+ CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 623 d) regra geral, a garantia nao poderd exceder a cinco por cento do valor do contrato ¢ seré atualizada nas condigdes deste (esse limite poderd ser clevado para até dez por cento do valor do contrato nes contratagées de grande vulto que envolvam alta complexidade técnica e riscos financeiros consideriveis); e) nos casos de contratos em que haja a entrega de bens pela administragao, dos quais o contratado ficara depositirio, ao velor da garantia, estabelecido com base nos percentuais aludidos no item precedente, devera ser acrescido © valor desses bens; f) findo o contrato, a garantia prestada ser liberada ou restituida ¢, quando em dinheiro, atualizada monetariamente. 48. ancia de medidas de compensacao A Lei 12.349/2010 introduziu significativas mudancas na Lei 8.666/1993, com 0 escopo, principalmente, de possibilitar que as licitacbes piblicas pa sem a ser utilizadas como instrumento de “prumugav du desenvolvimento nacional sustentavel”. Subjacente esti a nogéio de que as compras governamentais tém um peso to grande na formacio da demanda agregada nacional que podem, e devem, ser utilizadas para, entre outros objetivos, fortalecer 0 mercado in- terno — com aumento correspondente do emprego ¢ da renda —, favorecendo © desenvolvimento do Pais. Ademais, 0 préprio poder de barganha do Estado, decorrente do vulto das compras de bens e servigos que realiza, permite que ele imponha aqueles que desejam com ele contratar condigdes que normalmente nfo seriam aceitas pelo setor privado, Tal raciocinio nao € novo. Entre particulares é absolutamente corriqueiro que o negociador de grande porte utilize como instrumento de pressio o tamavho potencial das suas contratagdes — presentes e futuras — para obter da contraparte concessdes e vantagens com as quais ela jamais consentiria caso estivesse negociando com parceiros menores. Pois bem, coma edigao da Lei 12.349/2010 essa mesma légica concernente ao poder de barganha dos grandes compradores passou a ter possibilidade de ser adotada nas contratagGes realizadas pelo poder publico. E o que defiui do § il do art. 3° da Lei 8.666/1993, acrescentado pela Lei 12.349/2010, cuja redago cabe reproduzir: § 11. Os editais de licitagiio para a contratago de bens, servi- 0s e obras poderéo, mediante prévia justificativa da autoridade competente, exigir que 0 contratado promova, em favor de érgaio ow entidade integrante da administragaio piblica ou daqueles por ela indicados a partir de processo isonémico, medidas de 624 DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO - Marcelo Alexandrino & Vicente Paulo compensagio comercial, industrial, tecnolégica ou acesso a condigSes vantajosas de financiamento, cumulativamente ou n40, na forma esiabelecida pelo Poder Executivo federal. © Decreto /.546/2011 assim define medida de compensagéo industrial, comercial ow tecnoldgica: “qualquer prética compensatéria estabelecida como condigao para o forlalecimento da produgao de bens, do desenvolvimento tecnoldgico ou da prestagio de servigos, com a inteng&o de gerar beneficios de natureza industrial, tecnolégica ou comercial concretizados, entre outras formas, como: (a) coproducéio; (b) produgdo sob licenga; (c) produgao sub- contratada; (d) investimento financeiro em capacitagao industrial ¢ tecnuldyiva, (©) transferéncia de tecnologia; (f) obtenc&o de materiais e meios auxiliares de instrugao; (g) treinamento de recursos humanos; (h) contrapartida comercial; ou (i) contrapartida industrial”. ‘A primeira observagdo pertinente & que a imposiggo das exigéncias a que se refere o transcrito § 1] é discriciendria: serd feita a critério da adminis- tracdo, conforme andlise efetuada. em-cada caso e.devidamente justifieada O segundo ponto relevante a destacar é que o dispositive abrange con- tratos cujo objeto sejam bens (0 que inclui compras ptiblicas), prestagao de servigos ou realizagio de obras. Em terceiro lugar, nota-se que sio duas as espécies de exigéncias que podem ser feitas, cumulativamente ou nfo, desde que previstas no edital de licitagto, a saber: 2) que 0 contratado promova, em favor de érgio ou entidade da administra- do, ou em favor de pessoas que ela indique, medidas de compensacio comercial, industrial ou tecnolégica; b) que o contratado promova, em favor de érgio ou entidade da administracto, ou em favor de pessoas que ela indique, acesso « condigdes vantajosas de financiamento. Com base no § 11 do art. 3° da Lei 8.666/1993 seria possivel, por exem- plo, nu vaso de uma concorréncia internacional mediante a qual 0 governo brasileiro pretendesse adquirir uma ampla rede de radares de grande porte, visando a modemnizar 0 controle de todo o espago aéreo nacional, que o edital exigisse do futuro contratado medidas de compensago ‘comercial ~ como a obtengo de acesso favorecido aos mercados do pais cuja empresa vencesse a licitagao —, ou, ainda exemplificando, medidas de compensasio tecnolé- gica — como a truusferéucia de conhecimento das tecnologias empregadas nos radares para uso por empresas brasileiras fabricantes de componentes eletrénicos relacionados a essa Area. Cap. 9 + CONTRATOS ADMINISTRATIVOS 625 Bem mais obscura ¢ a autorizagao para que o edital contenha exigéncia de que 0 contratado promova, em favor de érgfo ou entidade da administra- do, ou em favor de pessoas que ela indique, acesso @ condigdes vantajosas de financiamento. © Decreto 7.546/2011 nada esclareceu acerca das possibilidades de aplicagao de tal exigéncia, limitando-se a afirmar que ela deve ser feita “na forma estabelecida em decreto” ¢ a explicitar que “a aplicacao das condigdes vantajosas de financiamento para servigos e obras de que trata o § 11 do art. 3.° da Lei n.° 8.666, de 1993, observara o disposto no § 3.° do art. 7° da referida Lei” O mencionado § 3.° do art. 7.° da Lei 8.666/1993 ~ dispositivo que versa especificamente sobre licitagdes para a execugio de obras e para a presta- eo de servigos ~ preceitua que “é vedado incluir no objeto da licitagéo a obtengao de recursos financeiros para sua execugo, qualquer que seja a sua origem, exceto nos casos de empreendimentos executados e explorados sob © regime de concessto, nos termos da legislagao especifica” Por fim, é interessante destacar que a parte final do § 11 do aft. 3.° da Lei 8.666/1993 prevé que as exigéncias a que ele se refere ocorram “na forma estabelecida pelo Poder Executive federal”. Como a Lei 8.666/1993 contém normas gerais aplicdveis a todos os entes federados, & estranha essa previsio de regulamentacaio de um de seus dispositivos - que nao esta expressamente restrito 4 Unio — pelo Poder Executivo federal. A bem da verdade, nfo € dificil perceber que a norma ora em esiudo tem o seu campo de aplicaco por exceléncia nas licitagdes de Ambito internacional promovidas pelo governo brasileiro, isto é, pela Unido. Contudo, pelo menos literalmente, © pardgrafo nao esté limitado a essa hipdtese, fato que, vale repetir, torna realmente inusitada essa referéncia a uma regulamentacdo a ser feita somente pelo Poder Executivo federal. Como regra geral, a durag4o dos contratos administrativos é limitada a vigencia dos respectivos créditos orgamentarios (ert. 57, caput). A Lei 8.666/1993, entretanto, estabelece as seguintes excegdes: 2) contratos relativos aos projetos cujos produtos estejam contemplados nas metag cotabelecidas no Plano Plurianual, os quais poderfo ser prorrogados se houver interesse da administragao e desde que isso tenha sido previsto no ato convocatério (art. 57, 1);

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