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TECNOLOGIA FARMACEUTICA Biblioteca da de do Formacle UFRJ lo do Farmacia ihlioteca da Fee% 9 UFRJ FORMAS FARMACEUTICAS OBTIDAS POR DISPERSAO MOLECULAR: SOLUGOES 9.1. GENERALIDADES As solugdes so misturas homogéneas formadas por dois componentes distintos: 0 solvente e © soluto, também designado por solvido ou dissolvido. Quando, porém, s6 um dos componentes ¢ liquido, este designa-se sempre por solvente, e, no caso de todos serem liquidos, considera-se como solvente aquele que figure em maior proporedo. Do ponto de vista teérico, podemos admitir a existéncia de solugdes cujo solvente € um sélido, um gis ou um liquido, se bem que, habitualmente, 0 termo solugdo se aplique, apenas, aos sistemas em que o solvente é representado por um liquido. E este, alias, 0 dinico caso que trataremos no presente capitulo, pois nele esto incluidas as solugdes farmacéuticas. A solubilidade de uma substincia num determinado solvente nao ¢ ilimitada, De facto, quando se pde um sélido em contacto com um liquido que n&o exerga sobre aquele qualquer ace2o quimica, pode acontecer que 0 sélido se dissolva totalmente no liquido em questo, se dissolva apenas parcialmente ou seja praticamente insolivel nele. Tal facto significa que uma substincia pode ser mais ou menos soliivel num certo liquido, isto 6, cada produto tem um coeficiente de solubilidade caracteristico, © qual & definido como sendo a concentragio, a determinada temperatura, da respectiva solugdo saturada. Esta, por sua vez, é toda a solugo que se encontra em equilibrio com um excesso de solvido, dizendo-se que € ndo saturada quando esse equilibrio nao tenha sido atingido e sobressaturada quando a sua concentragao ultrapassa a da solugto saturada. Nas solugdes verdadeiras as substincias dissolvidas atingem um alto grau de dis- persio, apresentando as particulas dimensOes inferiores a 0,001 um, o que representa as condigdes ideais para a absorgiio dos compostos medicamentosos pelo organismo, sendé esse um dos motivos por que a forma galénica Soluedo & to largamente utilizada, Na realidade, as solugdes ocupam hoje em dia um lugar destacado em todas as far- macopeias, representando a forma farmacéutica geralmente preferida para a administra- do de medicamentos. 788 Mereé disso, ¢ porque ¢ uma das operagdes mais rotineiramente executada em todos os laboratérios, ha o risco de criar-se a ideia preconcebida de que a dissolugio é uma operagdo banalissima e praticavel sem qualquer dificuldade de maior, quando a rea- lidade € bem outra. So tantos ¢ tdo variados os factores que nela intervém, como a temperatura, interacgdes solvente-soluto, estado de divisio da substancia a dissolver, agi- ago, constante dieléetrica do soluto e do solvente, pH, etc., que a sua simples enun- ciagdo dé jd uma palida ideia das dificuldades que podem surgir ao praticar-se uma ope- ragdo que a primeira vista parece tao simples de executar. Exactamente por isso, ndo ¢ exagero dizer que se a dissolugdo € uma operagdo que muitas vezes se reveste de extrema facilidade, também no é menos verdade que, nal- guns casos, levanta problemas bastante dificeis, cuja resolucdo exige do farmacéutico um conhecimento adequado dos varios fenémenos com ela directa ou indirectamente relacionados, os quais procuraremos discutir mais adiante. 9.2, MODOS DE EXPRIMIR A SOLUBILIDADE Uma vez que numerosas substincias sio prescritas sob a forma de solugdo, é¢ da maior conveniéneia que o farmacéutico esteja familiarizado com a solubilidade dos macos de uso mais corrente. Em muitos casos, as farmacopeias indicam, com preciso, essa solubilidade, sendo de ter em conta, porém, que a maneira de a exprimir varia de um livro para 0 outro, Assim, a Farmacopeia Portuguesa IV indicava que a solubi- lidade, quando no houvesse indieagdo especial, era referida a temperatura de 15°C e definia-a como o mimero de partes de solvente necessdrias para dissolver uma parte de solu. A nossa actual Farmacopeia adopta um critério menos rigido, designando a solu- bilidade de uma substancia nela descrita, na rubrica caracteristicas, por termos como muito solivel, facilmente soltivel, etc., cujo significado se dé na Tabela CXV. Tabola CXV. Termos usados na Farmacopeia Portuguesa V para indicar a solubiidade aproximada de uma substancia, para uma temperatura compreendida entre 15 € 25°C Quantidade relativa de solvente, em volume, Termos para I parte de solu, em massa Muito soldvel seen Menos de 1 parte Facilmente SOIVEL sinner De 1a 10 panes Solivel. sonnnnnnn . De 10 a 30 partes Ligeiramente solivel tla De 30 a 100 partes Pouco soltvel De 100 a 1000 partes Muito pouco solivel .nn:nnnsnnm dale De 1000 a 10.000 partes Praticamente insolivel aa) Mais de 10 000 partes 789 9.3. MODOS DE EXPRIMIR A CONCENTRACAO DAS SOLUCOES ‘A quantidade de substéncia dissolvida em qualquer solugdo pode indicar-se de varias maneiras: em percentage, molaridade, normalidade, equivalentes ou miliequiva- lentes, Em Farmécia, porém, a concentragio de uma solugio exprime-se quase sempre fem percentagem, a qual, segundo a Farmacopeia Portuguesa V, pode ser indicada de quatro modos diferentes: 1.°—Percentagem expressa em massa de substdncia dissolvida em 100 ml de solusiio (m/V). — Neste caso entende-se que em 100 ml de solugo existem x g de substincia dissolvida, Assim, uma solugo a 5% (m/V) de glucose contém em 100 ml de solugdo $ g daquele agiicar. 2° — Percentagem expressa em massa de substéncia dissolvida em 100 g de solu- ¢do (mim). — Significa que cada 100 g de solugio tém dissolvidos x g de soluto. Exemplo: a solugao a 10% (m/m) de cloreto de sddio contém em 100 g de solugio 10 g daquele sal. E 0 critério mais utilizado nas prescri- ‘Bes magistrais. 3.°— Percentagem expressa em volume de substancia dissolvida em 100 ml de solugo (V/V). — Indica o nimero de ml de produto dissolvido em 100 ml de solucdo, Deste modo, uma solugao de glicerina a 10% (V/V) conteré em 100 mI 10 ml daquele liquido. 4° — Percentagem expressa em volume de substancia dissolvida por massa de solucdo (Vim). — Indica o nimero de mililitros de substincia em 100 g de produto final A Farmacopeia Portuguesa V cita ainda a expressio partes por milhdo (ppm), muito utilizada em Quimica Analitica e que se refere habitualmente a massa por massa. A concentragdo de uma solugdo pode ainda exprimir-se em miliequivalentes. (mEq), que indicam as concentrades dos ides existentes nas solugdes de clectrdlitos destinadas a serem administradas, geralmente, por via endovenosa. Um mEq corresponde a 1/1000 de um Ey, sendo este 0 peso de uma substincia que se combina com um atomo-grama de hidrogénio. Portanto, um Eq € 0 peso de um tomo-grama ou de um radical dividido pela respectiva valéncia. Assim, por exemplo, 0 peso atémico do Na* € 22,98 (aproximadamente 23) ¢ 0 seu Eq determina-se dividindo esse peso pela valéncia daquele metal, que € 1. Temos, pois, que o Eq do Na® é 23:1, ou seja, 23 g, € 0 seu miliequivalente é igual a 23:1000, ou seja cerca de 0,023 g ou 23 mg. Um mEq de Na* combina-se com um mEq de Cl, originando um mEg de NaCl que, por seu turno, & igual a cerca de 0,0585 g ou 58,5 mg. 790 No entanto, se 0 catido do sal for bivalente ou o sal contiver dois catides mono- valentes, 0 Equivalente-grama destes compostos obtém-se dividindo 0 respectivo peso molecular por 2; analogamente, no caso do composto conter trés catides monovalentes, © seu Egg corresponderi ao respectivo peso molecular, mas agora dividido por 3. E de notar que a agua de hidratagao de um composto tem que ser considerada na determinagdo do seu peso molecular, embora no interfira na valénci ‘A titulo de exemplo, vejamos como se determinam os Egg de varios sais: NaCl, NaHlPO,_ NH,Cl, NaHCO, CaCly,6H,0_K3PO,,12H: 2 3 0 calculo do nimero total de mq num determinado volume de uma solugao pode fazer-se dividindo a quantidade de electrélitos, expressa em g, existente nesse volume, pelo respectivo még, também expresso em g. Vejamos dois exemplos: 1) Suponhamos uma solugao contendo 1,20 g de bicarbonato de sédio em 20 ml e que pretendiamos saber 0 niimero de mEg nela contidos. © PM. do bicarbonato de sédio é 84,02, pelo que o seu mEq é igual a 0,084, Como a solugdo contém, em 20 ml, 1,2 g desta substincia, 0 nimero de mEq existente 12 : 7 : nnesse volume ser 14,3 ou seja, a solugdo em referencia contém 14,3 mEg de 0,084 Nat © 14,3 mEg de HCO}. 2) Suponhamos uma outra solugdo contendo 6 g de cloreto de sédio e 5,6 g de lactato de s6dio em 1000 ml. Para determinar os mEq nela existentes temos: 0 PM. do NaCl é 58,5, pelo que o seu mEq € igual a 0,0585 ¢ 0 niimero de mEq 02,6 mEq de Nae 102,6 mEg de Cl correspondente a 6 g deste sal & 0.0585 Por outro lado, 0 PM. do lactato de sédio € 112 € 0 seu mEq =0,112. Logo, 56 50, que significa que a solugio contém 50 mEg de Na* correspondentes 0.112 5,6 g deste sal ¢ mais 50 mBq de lactato. Deste modo, o nimero total de mEq, em 1000 ml desta solugao sera: svone (102,6 + 50) = 152,6 mEq 102,6 mEq 50,0 mEq Nae cl. Lactato... 71 Na Tabela CXVI indicamos a composigaio de algumas solugdes electroliticas, com 1 correspondéncia entre as respectivas composigdes, expressas em g/100 ml, € 0 nimero de mEq de cada um dos seus componentes, também em 100 ml de solugao. Tabela CXVI. Correspondéncia entre as concentragses dos components {de varias solugdes, em g/100 mie em mEq Componentes Bicarbonato de sédio NalICO,, P.M. 84,02 Cloreto de aménio NH,CI, P.M. 53,50 Cloreto de calcio CaCl, 6H,0, P.M. 219,09 Cloreto de potéssio KCI P.M, 74,55 Cloreto de sédio NaCl, P.M. $8.45 Concen- tracgoes 6 09 50 10.0 200 4g 84,02 84,02 58,45 58.45 58,45 mEq 0.0840 0.0840 0.0535 0.0535 01095, 0.0746 0.0746 0.0746 0.0585 0.0585 o,0585 0.0585 2 de mEg de cada ‘componente em 100 mi Nav HCO; Nat HCO; NAY cr Kt a Kw a Ke cl Na" cr Na" cl i cr Na® cr na m4 952 95.2 168 168 374 374 913 913 100,5 100, 1340 B40 182.3 1823 154 154 855 855 1709 1709 3419 3419 71 Na Tabela CXVI indicamos a composigaio de algumas solugdes electroliticas, com 1 correspondéncia entre as respectivas composigdes, expressas em g/100 ml, € 0 nimero de mEq de cada um dos seus componentes, também em 100 ml de solugao. Tabela CXVI. Correspondéncia entre as concentragses dos components {de varias solugdes, em g/100 mie em mEq Componentes Bicarbonato de sédio NalICO,, P.M. 84,02 Cloreto de aménio NH,CI, P.M. 53,50 Cloreto de calcio CaCl, 6H,0, P.M. 219,09 Cloreto de potéssio KCI P.M, 74,55 Cloreto de sédio NaCl, P.M. $8.45 Concen- tracgoes 6 09 50 10.0 200 4g 84,02 84,02 58,45 58.45 58,45 mEq 0.0840 0.0840 0.0535 0.0535 01095, 0.0746 0.0746 0.0746 0.0585 0.0585 o,0585 0.0585 2 de mEg de cada ‘componente em 100 mi Nav HCO; Nat HCO; NAY cr Kt a Kw a Ke cl Na" cr Na" cl i cr Na® cr na m4 952 95.2 168 168 374 374 913 913 100,5 100, 1340 B40 182.3 1823 154 154 855 855 1709 1709 3419 3419 792 ‘Tabela CXVI. (Continuago) Concen- 2 de mEq de cada Componentes traccbes Eg mEq componente em 100 ml Clon de sto oar seas oosss gS Cloreto de potissio 013 74,55 0.0746 x WW ; oY cr V7 ; NH; 69 Cloreto de aménio 037 53,50 oss. 7 Glicose 1000 — - — 7 Total. Na'-6,3; K'-1,7; CI=14,9; NHj-69 Lactato de sédio 167 CHjCHOHCOONa, PM, 11216811206 0.1120 167 ; Ne 85 Cloreto de soaio 0.500 5845 oss N 7 mn kK 10 Cloreto de potéssio oo7s 7455 ogre KN Cloreto de magnésio Mg 03 Reece 00st 101,70 oor? MB 08 ; ce 06 Cloreto de céleio 0.063 109,54 o,tovs_ 7 Citrto de sécio Ne 08 CeHsNayO>, 2H,0, PM, 294,12 0077 980 9.0989 rat 08 Acctato de s6dio Ne 47 CHACOONa, 3H,0, PM. 13609 OF 13602 OI361 Acetate 4.7 Glicose so _ assEens Total: Na'14,0; K*-1,0; CI Mg?*-0,3; Cal*-0,6; Acet-4,1; Citrato-0,8 Como esti indicado na Tabela CXVI, os nimeros de mEq nela reproduzidos refe- rem-se a 100 ml de solugo. Querendo saber-se o nimero de mEq em x ml de cada uma das solugdes mencionadas, basta dividir 0 nimero de mEq em 100 ml por 100 & multiplicar 0 resultado obtido por x. 793 9.4. SOLUGOES IDEAIS E SOLUGOES REAIS Diz-se que uma solugdo € ideal quando as moléculas dos seus constituintes nao se atraem por forgas especiais € quando n&o se manifesta qualquer variagao da energia interna ao misturarem-se os seus componentes. Nestas condigdes, o nico efeito obser- vado é 0 de uma simples diluicéo dos constituintes, nio se registando, ao juntarem-se os componentes da solugdo, desenvolvimento ou absorgao de calor, nem contracgo ou aumento de volume. A lei de Ravoit estabelece que numa solucdo ideal a pressio de vapor de cada constituinte & proporcional sua fracgao molar e, segundo Datton, a pressio total de vapor da solugdo seré dada pela soma das pressdes parciais dos respectivos consti- tuintes, Assim, se tivermos uma solugdo ideal formada por dois componentes Ae B, a ten- so de vapor do constituinte 4, p, sera igual a presso de vapor p? da substincia no estado puro, multiplicada pela fracgio molar de A: ¢ a pressio total de vapor da solugao sera P4= Pat Pa Pir X4* Pie Xp GB) Uma vez conhecidos os valores das presses de vapor de cada constituinte puro para uma temperatura determinada, pode construir-se um diagrama representando as variagdes das pressdes parciais ¢ totais de vapor a essa mesma temperatura em fungao da composigao da solugdo, como se mostra na Fig. 267. No caso das solugdes ideais, as tes permanecem inalteradas € nao sto prati- propriedades de cada um dos seus consti camente influenciadas pela presenga dos outros constituintes, pelo que estas obedecem & lei de RAout, mas ja 0 mesmo nao acontece com as solugdes ndo ideais ou reais, as quais se afastam, nitidamente, da referida lei, mercé de interacgdes de diversa natureza estam entre as moléculas dos seus constituintes. que se mar 794 ‘Suponhamos, entio, uma solugdo constituida por duas substincias, A e B, € que ela as forgas de atracgao entre as moléculas de Ae de B stio mais fracas do que as Fig. 267. Pressbes de vapor parcais totais de uma solugdo ideal para uma ‘determinada temperatura das moléculas de cada um dos constituintes entre si. Num caso destes, a solugio apresentaré um desvio positivo em relagdo a lei de Routt © a respectiva curva das presses de vapor passa, em certas circunstancias, a apresentar um maximo, como se pode ver na Fig, 268 Se, entretanto, as forgas de atracgdo entre as moléculas de A e B forem mais intensas do que as forgas de atracgdo de A para A e de B para B observa-se um desvio negativo, apresentando, entdo, a curva das pressdes de vapor um minimo desde que esse afastamento seja suficientemente grande. Em tal caso, como & compreensivel, as curvas das presses de vapor tém o aspecto das da Fig. 268 vistas em posigao invertida. Estes desvios em relagdo a lei de RAOULT so a consequéncia de fenémenos ‘ocorridos durante a dissolugdo de uma substincia noutra, como a solvatagdo € a asso- ciagdo, A solvatacdo traduz-se por um desvio negativo, isto é, corresponde ao caso em que as forgas de atracgao entre os dois consti quando isso se verifica acontece que a solu- bilidade matua das duas substancias € aumentada. Por sua vez, os desvios positives a referida lei traduzem-se por uma diminuigo da solubilidade mitua dos dois componen- tes da solugdo sto devidos, em grande parte, a uma interacgdo especifica mani- festada entre as moléculas do mesmo cons- tituinte, a qual provoca a associagaio das respectivas moléculas em dimeros ou pol meros. No fundo, pode atribuir-se estes afastamentos & diferenga existente entre as forgas de coesio das moléculas da substin- cia dissolvida, as quais condicionam um certo niimero de interacgdes solvente-soluto, como passamos a expor. tes da solugdo so mais fortes, Pressoes de vapor Fracgoes molares 268. Pressbes de vapor parcials @ totais dde uma solugdo no ideal a uma temperatura determinada, apresentando um afastamento positvo @ le!'de Raout, para uma temperature determinada 795 9.5. INTERACGOES SOLVENTE-SOLUTO Para que as moléculas possam existir agregadas sob a forma de liquidos ou sélidos existem varias forgas intermoleculares que as mantém unidas. Quando, porém, duas moléculas actuam uma sobre a outra, duas espécies de forgas se manifestam: as forgas repulsivas e as forgas atractivas. Estas dltimas so necessirias para manter as moléculas coesas, enguanto que as primeiras exercem uma acg3o completamente oposta, de modo que 0 comportamento das moléculas de um composto & governado por ambas. A repulsdo € devida 4 interpenetrasao das niivens electrénicas das moléculas aumenta exponencialmente com a diminuigao da distincia entre as mesmas, existindo, porém, uma distancia de equilibrio, equivalente a 3 ou 4 A, em que as forgas atractivas © repulsivas se igualam. A essa distancia a energia potencial de duas moléculas ¢ minima e o sistema atinge 0 seu estado mais estavel. Sto virias, por outro lado, as forgas atractivas intermoleculares, como as ligagdes electrovalentes € covalentes, forgas de Van Der WAALS ¢ outras, e, ainda, as ligagdes hhidrogénio, as quais si mais ou menos poderosas conforme 0 respectivo tipo & pos- sem uma certa energia que pode ser tomada como indice da forga da ligagao conside- rada. Assim, uma ligagdo electrovalente tem uma energia aproximada de 100-200 kcal. mol-t; uma ligagao covalente possui uma energia de 50-150 kcal. mol-', a qual se situa entre 1-10 keal. mol-! no caso das varias forgas de Van Der WAALS, enquanto que a energia de uma ligagao hidrogénio é, conforme os casos, de 2-7 keal. mol!, Estas forgas exercem, pois, como que uma pressio interna tendente a manter unidas as moléculas, a qual é expressa em caloria por ml ¢ pode ser calculada pela equagao: pin HRT yy em que Aly é a variagao do calor latente de vaporizagao da substincia considerada ¢ V © seu volume & temperatura absoluta 7. Do que ficou dito, depreende-se que para se obier a dissolugdo de uma substincia € necessétio vencer as forgas atractivas que se manifestam tanto no soluto como no sol- vente. Isto exige, porém, como é evidente, uma certa energia, a fornecer por interacgSes mituas entre as moléculas dos dois componentes da soluao e, por isso, a solubilidade de um composto depende, em larga medida, das suas caracteristicas fisicas e quimicas, bem como das do préprio solvente. E do conhecimento geral que a 4gua constitui um bom solvente dos sais e agiica- Tes, a0 paso que o éter, © benzeno e os dleos, em regra, dissolvem facilmente as subs- tancias pouco soliveis ma agua. A observagio destes factos levou a afirmar-se que 0 semethante dissolve 0 semethame, querendo isto significar que a solubilidade depende, fundamentalmente, da circunstancia de 0 soluto € 0 solvente possuirem determinadas 796 caracteristicas em comum, como, por exemplo, @ mesma ou aproximada polaridade. ‘Vejamos, pois, como essas caracteristicas condicionam as interacgdes solvente-soluto influenciam a solubilidade de uma substincia qualquer num liquido, para o que vamos considerar os solventes agrupados em trés classes: polares, néio polares e semipolares.. 9.5.1. SOLVENTES POLARES ‘A solubilidade de um composto depende, em larga medida, da polaridade do sol- vente utilizado ou, por outras palavras, da sua constante dieléctrica, Assim, os solventes polares dissolvem os compostos iénicos ¢ outras substincias polares, pois s6 eles so capazes de vencer a energia das forgas atractivas intermoleculares que mantém coesas jis substdncias. E por este motivo que a Agua dissolve grande niimero de compostos, tais como sais, dcidos, bases, produtos polhidroxilados, e se mistura em todas as pro- porgdes com o Aleool e a glicerina. Repare-se, porém, que HILDEBRAND demonstrou que no sio apenas os momentos dipolares que explicam, de modo cabal, a dissolugdo de muitos compostos polares na gua, De facto, muitos casos ha em que a facilidade com que o soluto forma ligagées hidrogénio com aquele liquido representa um factor muito mais importante do que a polaridade propriamente dita e, assim, 0 nitrobenzeno, cujo momento dipolar € maior do que 0 do fenol, & no entanto, bastante menos solivel na agua do que este dltimo, Na realidade, a agua dissolve dlcoois, aldefdos, cetonas, aminas € outros compostos oxigenados ¢ azotados desde que estes formem com ela ligagdes hidrogé: i i R-6-0...11-0. Ligsedo hidrogénio aleido-agua i RIN....H-O Ligssgo hidogénio cetone- gua Ligagao hidrogénio amina-égua A solubilidade de um composto depende, ainda, de certos caracteres estruturais da sua molécula, em particular da proporgao dos grupos polares e nao polares nela existentes. Assim é que, a medida que o tamanho da parte nao polar de uma molé- cula aumenta, a sua solubilidade na égua como acontece, por exemplo, com os Aleoois alifaticos. Também os compostos de cadeia linear com mais de 4 ou 5 atomos de carbono, como Aleoois monohidroxilados, aldeidos, cetonas e acidos, so pouco soli- 07 eis na agua porque ndo formam com esta facilmente ligagdes hidrogénio. Por outro lado, a presenga de mais de um grupo polar numa molécula aumenta a solubilidade desta na égua, 0 mesmo acontecendo quando 0 composto tem uma estrutura ramificada, sendo por este motivo que o Alco! butilico terciério ¢ miscivel com a agua em todas as proporgdes, ao passo que o Alco! butilico normal apenas se dissolve na proporgao de 8/100 ml de agua a 20°C. Pode dizer-se, em resumo, que 0s liquidos polares, como a Agua, actuam como sol- vente por um dos trés mecanismos seguintes: 1 — Devido & sua elevada constante dieléctrica (cerca de 80, no caso da agua), os solventes polares reduzem a forga de atracgdo entre iGes com carga eléctrica posta, solubilizando, portanto, compostos com ligagdes electrovalentes. 2—Os solventes polares so capazes de quebrar as ligagdes covalentes de electré- litos potencialmente fortes por reacgdes dcido-base, uma vez que tais solventes so anfipréticos. E por este motivo que a agua promove a ionizagdo de com- postos como 0 HCI: HCl+ H,0 -> Hy0*+ CP Os Acidos orginicos fracos ndo sdo apreciavelmente ionizados pela 4gua e a sua solubilidade parcial nesta é atribuida a formagao de ligagdes hidrogénio; no entanto, aqueles compostos € 0s fendis dissociam-se facilmente em solugdes de bases fortes: i) ° R-ce 4 NAOH R= CZO-Nat + H,0 ‘OH 3—Por iiltimo, repare-se que os solventes polares sto capazes de solvatar molé- culas e ides através de forgas de interacgdes dipolares, particularmente pela formagdo de ligagdes hidrogénio, de que resulta um aumento da solubilidade de muitos compostos. Para que isto se verifique € necessério, contudo, que 0 soluto seja também de natureza polar, pois muitas vezes tera que competir ‘com as ligagdes das moléculas do solvente ja associadas € s6 assim podera obter lugar nessa estrutura previamente formada. Como exemplo de uma interacgio deste tipo pode citar-se a que ocorre entre 0 oleato de sédio © a égua: p Q of 00 wHg-C-O" Nat +n¥.O) = CyHs-C—0- + GONE QD) PY OW 798 9.5.2, SOLVENTES NAO POLARES s liquidos nao polares, tais como os hidrocarbonetos, tém uma baixa constante dieléctrica. Nestas condigdes, sio manifestamente incapazes de neutralizar as forgas atractivas intermoleculares dos electrélitos fortes ou fracos, assim como também nao destroem as ligagdes covalentes nem ionizam os electrélitos fracos, visto serem solven- tes aproticos. Por estas razSes, 05 solutos de natureza iénica ou polar so praticamente insoliveis ou apenas muito pouco soliveis nos solventes apolares. Estes solventes 6 dissolvem, na realidade, compostos igualmente ndo polares que tenham uma pressio interna semelhante, através de acgdes entre dipolos induzidos, sendo as moléculas do soluto mantidas em solugdo por forgas de Van Der Waats- -LONDON. Os dleos, gorduras sélidas, alcaldides (forma base) € dcidos gordos sto exem- plos de compostos tipicamente soliiveis em solventes apolares. 9.5.3, SOLVENTES SEMIPOLARES Certos liquidos semipolares, como as cetonas e alcoois, podem induzir um certo ‘grau de polaridade nas moléculas de solventes nao polares, actuando de modo a favore- cerem a miscibilidade de um liquido nao polar com outro polar. Assim, a acetona aumenta a solubilidade do éter na agua e 0 propilenoglicol aumenta a solubilidade miitua da agua e esséncia de hortela-pimenta € da égua e benzoato de benzilo. 9.6. TIPOS DE SOLUGOES Existem duas categorias de solugdes, ambas, alids, largamente utilizadas em farmé- cia: as solugdes simples e as solucdes extractivas, as primeiras das quais passamos a estudar seguidamente. 9.6.1. SOLUCOES SIMPLES Entende-se por solugdo simples a que resulta da dissolugdo total e completa de uma substincia de composigdo homogénea num solvente determinado. Dado, porém, que © presente capitulo se limita a0 estudo das solugdes cujo solvente & um liquido, apenas consideraremos os trés casos seguintes: solugdo de gés em liquido, solugdio de liquido em liquido € solugdo de sétido em liquido. 799 9.6.1.1. Solugdes de gases em liquidos A solubilidade dos gases nos liquidos depende de varios factores, uns inerentes propria natureza dos dois elementos constitutivos da solugdo ¢ A presenga de substincias estranhas dissolvidas, sendo os outros representados pela pressio e a temperatura A influéneia da pressio na solubilidade dos gases ¢ expressa pela lei de HenRy, a qual estabelece que a concentragio do gis dissolvido num dado solvente & proporcional & pressfio parcial do mesmo gis ndo dissolvido e em contacto com a solucdo, desde que 1 temperatura permanega constante. Esta lei pode ser expressa pela equagdo ¢=k p, em que ¢ é a concentragiio em g/f, do gis dissolvido, p € a pressio parcial do gés em con- tacto com a solugio € & uma constante, cujo valor depende da natureza do gis e do sol- vente em causa. Entretanto, conhecem-se varios casos de gases que em solugio aquosa se afastam, nitidamente, da referida lei e apresentam uma solubilidade na agua maior do que aquela que a teoria prevé. Sdo exemplos disto, entre outros, 0 acido cloridrico, 0 amoniaco, € © anidrido carbénico, mas o seu comportamento € explicado pelo facto de tais compos- tos reagirem com a agua, fendmeno tido como responsavel pelo aumento de solubilidade com eles observado. Em geral, € costume exprimir a solubilidade de um gas num liquido pelo coefi- ciemte de absorgdo de BUNSEN, 0 qual se define como sendo o niimero de litros de um gis, medido nas condigdes normais de presso € temperatura, que se dissolve em | litro de solvente a uma determinada temperatura e pressio de 760 mm de mercirio. Na Tabela CXVIL indicam-se os coeficientes de absoredo de varios gases na gua a diver- sas temperaturas e a pressfio constante, os quais mostram que a elevagio da temperatura faz diminuir a solubilidade do gas, mantendo-se constante a pressio. De facto, 0 aumento da temperatura provoca uma diminuigao da solubilidade da maioria dos gases devido a, nessas condigdes, aumentar a sua expansibilidade. Esta pro- priedade impde, por conseguinte, que se adoptem certas precaugdes ao destapar reci- pientes contendo solugdes gasosas conservadas em locais aquecidos, recomendando-se que, em tais casos, os recipientes sejam, previamente, arrefecidos. Tabela CXVI. Cosficientes de absorgdo de varios gases na agua a pressto de 760 mm de Hg Gas Temperaturas em °C ° 20 30 Hy 0,021 0018 — Ny 0.0245 0,016 0.0134 Oy 0,0489 0,031 0,026 CO, L713 0.88 0,665 800 Por outro lado, € frequente acontecer que a solubilidade de um gés num determi- nado liquido diminua por adigdo, a este, de substincias nele soliveis, particularmente se forem electrOlitos. Em tais casos, verifica-se que parte do gas dissolvido abandona a solugéo, designando-se este fendmeno por efeito de salting-out, 0 qual é devido grande atracgio para a agua dos ides ou moléculas da substancia adicionada, de que resulta uma diminuigao da concentrago do solvente nas proximidades das moléculas do as dissolvido. 9.6.1.2. Solugées de liquidos em liquidos E de certo modo frequente associarem-se dois ou mais liquidos numa preparacio farmacéutica, misturas essas que podem constituir solugdes ideais ou reais, de acordo com o conceito anteriormente dado. Na pratica, os sistemas liquido-liquido agrupam-se ‘em duas categorias, conforme a solubilidade dos respectivos constituintes um no outro: 4a) sistemas completamente misciveis e 5) sistemas parcialmente misciveis, designando o termo miscibilidade a solubilidade miitua dos componentes do sistema considerado. 9.6.1.2.1. Sistemas completamente misciveis A miscibilidade de dois liquidos depende, fundamentalmente, da sua natureza. Assim, a jungdo de dois liquidos polares ou de um polar € outro semipolar, tais como a agua e glicerina, égua e alcool, glicerina e éleool e élcool com acetona, origina a for- magio de uma mistura homogénea qualquer que seja a proporgdo de cada um dos liqui- dos, dizendo-se que, em tais casos, eles so completamente misciveis. Do mesmo modo, alids, se comportam as misturas de liquidos nao polares, como o benzeno € 0 tetraclo- reto de carbono, por exemplo. 9.6.1.2.2. Sistemas parcialmente misciveis Se bem que alguns liquidos, como acabémos de ver, sejam misciveis em todas as proporgdes, outros hé que uma vez misturados originam duas camadas distintas, cada uma das quais representa uma solugo saturada de um dos componentes do sistema no ‘outro, que desempenha o papel de solvente, Assim, se misturarmos gua e éter, pasado pouco tempo formar-se-do duas fases distintas, correspondendo a superior a uma solugao de agua no éter (este € 0 solvente porque esté em maior quantidade), enquanto a camada inferior representa uma solugao de éter na agua 801 As solubilidades miituas de tais liquidos, mantendo-se constante a pressio, so niti- damente influenciadas pela temperatura, como se mostra na Fig. 269, onde se representa © diagrama da composigio das fases do sistema fenol-igua! em fungdo da temperatura, exemplo classicamente adoptado para ilustrar 0 assunto em discuss. Se misturarmos gua e fenol a temperatura de 0°C, obter-se-do duas fases: uma delas constitui uma solugio saturada de fenol na agua (cerca de 7% em peso) e a outra é uma solugo satu- rada de Agua (27%) em fenol, cujas composigdes correspondem, respectivamente, aos pontos ae 6 do grafico da Fig. 269. A medida, porém, que se eleva a temperatura, a solubilidade mitua das duas substncias aumenta e a0 atingir aquela um certo valor, Macbitdade omelet get ao * we we we Amt cot eS ts ° Fig. 269, Diagrama representando @ composigSo das fases do sistema fenolAgua ‘em funglo da temperatura denominado temperatura critica de dissolugdo, no exemplo presente 65,85°C, a compo- sigdo das duas misturas torna-se idéntica, passando ambas a conter 34,5% de fenol © 65,5% de agua, a0 passo que acima de 65,85°C os dois liquidos se tornam todas as proporgdes € passam a constituir um sistema homogéneo. Do ponto de vista pritico, o grifico da Fig. 269 mostra-nos que todas as misturas cuja composi¢ao se localize dentro da curva originardo sempre duas fases, enquanto que as correspondentes a pontos situados fora dela constituirdo um sistema homogéneo. Suponhamos, por exemplo, que pretendiamos preparar uma solugio de fenol na agua 4 temperatura de 20°C. Nestas condigdes, s6 € possivel dissolver até um maximo iveis em 10 fenol & um sdlide de p. £.=42"C, mas considera-se neste caso liquide, pois a adigio de uma ‘quantidade minima de égua faz baixar imediatamente o seu p. f.€ 0 sistema passa a ser constituldo, nestas condigées, por duas fases lguidas. 802 de 8.4%, em peso, de fenol, conforme se pode ver no diagrama da Fig. 269, em que o ponto a da a composigao da solugo aquela temperatura, sendo evidente que se adicio- narmos mais fenol a composi¢ao da mistura passa a cair no interior da curva e, auto- maticamente, formar-se-do duas camadas. Pela mesma razdo, torna-se possivel obter referida temperatura de 20°C uma solugdo perfeita de 4gua em fenol, cuja concentragao maxima é definida pelo ponto 6 da mesma curva, Em Farmécia utiliza-se uma preparagiio designada por fenol liquido, obtida mistu- rando 100 partes, em peso, de fenol, aquecido a 45°C, com 10 partes de agua, a qual, mesmo depois de arrefecida, se mantém perfeitamente homogénea, pois a sua composi- do situa-se fora da zona correspondente & formagio das duas camadas. Repare-se, porém, que nem todos os liquidos imisciveis se comportam como o sis- tema Agua-fenol. Na realidade, certos pares de liquidos apresentam uma maior solubili- dade mitua quanto a temperatura baixa, Deste modo, a sua temperatura critica de dis- solugao corresponde a um valor minimo e, portanto, a mistura desses liquidos s6 & homogénea para valores de temperatura situados abaixo daquele. Outro exemplo é repre- sentado pelo que acontece com o sistema nicotina-dgua, o qual tem duas remperaturas criticas de dissolugdo, entre as quais existe, portanto, uma zona em que estes liquidos apenas so parcialmente misciveis. Finalmente, certos sistemas no possuem qualquer temperatura critica, significando isto que nunca se poderi obter com eles uma mistura homogénea, qualquer que seja a temperatura a que se encontrem. 9.6.1.2.3. Influéncia de substancias estranhas A adigao de uma substincia a uma mistura bindria de liquidos parcialmente misci- veis pode originar efeitos variéveis. De facto, se a substincia adicionada apenas for solivel num dos componentes ou for predominantemente soliivel num deles, regista-se uma diminuigao da solubilidade mitua dos dois componentes. Isto traduz-se, na pratica, por uma variagio da temperatura critica de dissolugdo do sistema considerado, a qual, por adigdo de uma terceira substincia com as caracteristicas referidas, sobe ou desce em relagao ao seu valor inicial, Assim, ao adicionarmos naftaleno a uma mistura de agua ¢ fenol verifica-se que a temperatura critica do sistema sobe cerea de 20°C em relagdo ao seu valor original (65,85°C), pois aquele hidrocarboneto apenas é soliivel no fenol, ao passo que a adigio de cloreto de potassio, solivel unicamente na agua, origina uma subida de cerca de 8°C. Quando, porém, a substancia adicionada a uma mistura bindria de dois liquidos se distribui, aproximadamente, em igual concentragdo nas duas fases, 0 efeito observado & contrério ao cima descrito. Em tal circunsténcia, acontece, de facto, que a solubilidade miitua dos componentes & acrescida ¢, como consequéncia disso, uma temperatura critica 803 de dissolugo originalmente alta torna-se mais baixa, ao passo que outra, baixa, é elevada. E isto 0 que acontece, por exemplo, quando se adiciona um sabao alcalino a0 sistema fenol-agua. 9.6.1.3. Solugdes de sdlidos em liquidos As solugdes de sélidos em liquidos constituem a grande maioria das solugdes far- macéuticas ¢ por isso vamos consideré-las com certo pormenor. Estas solugdes séo influenciadas por varios factores, como a temperatura, calor de fusiio € ponto de fusio do soluto, etc. Seguidamente, vamos passar em revista a aco desses diversos factores, ‘comegando pelos atrés citados, examinando como actuam no caso de solugdes ideiais no ideais. 9.6.1.3.1. Solugdes ideais Segundo a lei de RAOULT, pode considerar-se que a pressio parcial de vapor p, de uma substincia dissolvida & igual a presstio de vapor p? da mesma substncia pura, no estado liquido ¢ a igual temperatura, multiplicada pela sua fracgiio molar x. Deste modo: P,=P2.%, representando p? a pressio de vapor do sélido puro, quando fundido, Por outro lado, a actividade, a,, da substincia dissolvida é a relagdo entre a sua pressio parcial de vapor e a pressio de vapor que a mesma apresenta quando pura ¢ no p,/p sendo evidente que a actividade da substincia no estado sdlido € inferior & que a mesma apresenta no estado liquido € apenas ambas se igualam quando se atinge 0 ponto de fusdo. A solubilidade ideal de uma substincia sélida pode ser calculada a partir da equa- go de CLAUSIUS-CLAPEYRON: dine, HH, Hy (sy aT RP RT? em que: H, € 0 calor latente de vaporizagao do sélido no estado liquido; HH, € 0 calor latente de sublimagio do s6lido; Hy € 0 calor latente de fusio. Substituindo a presstio de vapor pela actividade, a,, temos: 804 Uma vez, porém, que a actividade do soluto numa solugio corresponde ao produto da sua concentragio pelo respectivo coeficiente de actividade, se a concentragio estiver expressa em fracgao molar, x, podemos escrever que: fm em que f representa 0 coeficiente de actividade. Contudo, nas solugdes ideais f=1 e, assim, a actividade as toma-se igual a x, pelo que ~log as =-log x=—S#!_(H-T) (gy 2,303 R\ 7. em que Tf € a temperatura absoluta de fusto do sélido T a temperatura absoluta da solugdo. Daqui resulta, por conseguinte, que a fraccdo molar, x, numa solugdo ideal, para determinado valor de temperatura, € uma constante independente do solvente. A partir da equagdo (8), HILDEBRAND deduziu duas regras gerais relativas solubi- lidade dos sélidos, as quais se podem enunciar da seguinte maneira: 1°—A solubilidade de um sélido aumenta com a temperatura. 2.° Se dois sdlidos se encontram & mesma temperatura e possuem calores laten- tes de fusdo proximos, seré mais soltivel 0 que tiver menor calor latente de usd. 9.6.1.3.2. Solugdes nao ideais Como atras dissemos, a actividade de um soluto numa solugdo é dada pela equa- eo (7), que na sua forma logaritima é: log a,= log x+log f (9) Dado que nas solugdes nio ideais fx 1, combinando as equagdes (8) ¢ (9) obtere- mos a solubilidade de uma substincia neste tipo de solugdo, a qual serd definida por: AHf_( Tf-T mlog x= 2303 R\.T ) Hees (10) significando isto que a solubilidade numa solugdo real corresponde a solubilidade de ‘uma substincia numa solugdo ideal mais 0 logaritmo do respectivo coeficiente de acti- vidade. A medida, porém, que o valor de f tende para 1, 0 comportamento de uma solu- 40 nao ideal aproxima-se cada vez mais do comportamento de uma solugao ideal, 805 motivo por que a equagio (10), quando f=, se transforma em (8). Entretanto, rara- mente acontece que a solubilidade determinada experimentalmente nas solugdes reais, coincida com valor calculado utilizando a equagdo da solubilidade ideal, e isto porque © coeficiente de actividade, f depende de varios factores, como a natureza do soluto © do solvente © a temperatura da solugao. © termo log f que figura na equagdo (10) € obtido considerando as forgas inter- moleculares de atracgdo que devem ser vencidas ou, por outras palavras, o trabalho que € necessério realizar para remover uma molécula do soluto e deposité-la no solvente, 0 qual pode considerar-se como sendo executado em trés fases | 1—A primeira destas fases envolve a remogdo de uma molécula do soluto a uma temperatura determinada ¢ implica a realizagdo de um trabalho que destrua as suas liga- ges com as moléculas adjacentes € permita, assim, a sua passagem ao estado de vapor. Esse trabalho realizado para destruir as ligagdes entre duas moléculas adjacentes é 2Wo3, em que o indice 2,2 se refere a interacgdo entre moléculas do soluto. Quando, porém, uma molécula abandona 0 soluto, 0 espago assim criado fecha-se ¢ metade da energia dispendida ¢ recuperada deste modo, pelo que o trabalho dispendido neste pro- cesso é, afinal, apenas W2 2. Esquematicamente, pode representar-se 0 que acabémos de dizer do seguinte modo: ee ee coo eotre eo ee Sola Lubertagbo de uma moléula 0 soto 2—O passo seguinte consiste na formagao, no solvente, de um espago suficiente- mente grande para acomodar a molécula do soluto anteriormente libertada, 0 que envolve a realizagio de um trabalho Wy), referindo-se o indice 1,1 a energia da inte- racgdo entre as moléculas do solvente. oOo oo oo oO Oo 0° oo Solvente Formagso de um espace no solvente 4 Segundo Mann, Piysical Pharmacy, pig. 357. 806 3—A molécula do soluto é, finalmente, acomodada no espago criado no solvente € 0 ganho em trabalho ou diminuigio da energia potencial neste passo é -W,., refe- rindo-se 0 indice 1,2 a interacgdo do soluto com o solvente. Como o espago aberto no solvente durante a fase 2) foi, agora, fechado, regista-se uma diminuigo adicional de energia, -W;2, €, por conseguinte, o trabalho total dispendido na solut este esquema é (W22+ Wy, -Wia)- oo oo °° o+1e—oeo oOo oo Solvente Motécula Solugio 0 soluto Foi demonstrado por ScarcHaro € por Hitpearand € Wooo que o logaritmo do coeficiente de actividade & ainda proporcional ao volume do soluto, considerado como um liquido superarrefecido, € a fracgdo do volume total da solugaio ocupada pelo sol- vente, de modo que se pode escrever: In foe Wag + Wi-2 M2) (MN) In fx 7 pe 22+ Miy-2M dA representando V> 0 volume molar do soluto liquido, $ a fracgio do volume total cocupada pelo solvente € T a temperatura absoluta da solugo. A equacdo (11) pode ser transformada nesta outra Vy @2 RT In f= [M2 - P22)" (12) nia qual os termos W!? sto aproximadamente iguais ao termo a/V? da equaglo de Van eR WALLS para liquidos ¢ gases nao € servem para medir as pressdes internas (pag. 795) do solvente e do soluto em solugdes ideais apolares ou moderadamente pola- res, Aos referidos termos W'? chamam-se pardmetros de solubilidade © sio designados pelos simbolos 8, © 8s, respectivamente, para 0 caso do solvente € do soluto. Fazendo as necessarias substituigdes na equagao (12), podemos escrevé-la, agora, pasando para ogaritmos decimais, do modo seguinte: 2 @! = pw. Gy bee f-O1- oP sep 807 Portanto, se substituirmos na equacdo (10) log f pelo seu valor, teremos que a quantidade de soluto nao polar ou moderadamente polar dissolvida, expressa em fracgio molar é “log (8-8: (14) Af (1 rn). Vy a 2,303 RVD.) 2,303 RT Quanto mais préximos forem os valores de 8 para os dois componentes da solugio, maior ser a solubilidade mitua de ambos e, porque 6 representa as forgas de coesio interna entre moléculas sethelhantes, segue-se que quando 8, © 5, sfo iguais, as forgas de coesio do solvente e do soluto so também iguais. Neste caso, ;~ 820, ¢ 0 lltimo termo da equago (14) sera, do mesmo modo, igual a zero, pelo que, em tal ci cunstincia, a solubilidade do soluto se toma independente da sua actividade © apenas fica dependente do calor latente de fusdo, do respectivo ponto de fustio ¢ da tem- peratura, Vem a propésito assinalar que as regras de solubilidade dos sélidos numa solugao ideal, tal como foram enunciadas na pag. 804, se aplicam, também, nos casos das solu- ‘GOes nao ideais, podendo verse nas Tabelas CXVIIL € CXIX exemplos que ilustram a segunda destas regras, 0s quais mostram como a solubilidade de alguns barbitiricos © sulfamidas diminui progressivamente 4 medida que os respectivos pontos de fusdo aumentam, ‘Tabela CXVIll, Solubiidade de diferentes barbitiricos no dleoo! em fungo do seu ponto de fuséo Produto PL EC Solubilidade em éleool Secobarbital 95.96 I gem 2m Pentobarbital 132-133 ly» 4» Amobarbital 156-158 I>» So» Fenobarbital 174-178 I>» 10» Barbital 188-189 I> > 1» Tabela CXIX. Solubildade de diferentes sullamidas em agua (25°C) em fungo {do respectivo ponto de fusso Produ PLC Solubilidade na éigua Sulfanilamida 164-166 I gem 0,125 1 Sulfatiazol 173-175 Io» 17 » Sulfapiridina 191-193, I>» 35 » ‘Sulfamerazina 234-238 Ip» 5» Sulfadiazina 252.256 ly > Bo» 808, 9.6.1.3.2.1. Fenémenos térmicos ocorridos durante a dissolugao Como vimos (pags. 805-806), 0 mecanismo da dissolugao envolve a neutralizagio das forgas intermoleculares que tornam coesos os ides ou as moléculas da substancia a dissolver, a separagdo das moléculas do solvente para que as particulas do solvido fencontrem espago onde se encaixem, sendo ainda de considerar as interacgdes miituas solvente-soluto. Como entio dissemos, a anulagio das pressdes intemas dos constituintes de uma solugio s6 pode conseguir-se 4 custa de certo trabalho ou energia ¢, se esta for representada pelo calor, é evidente que tal fendmeno sera endotérmico, ao passo que as interacgdes soluto-solvente libertam calor e so, por conseguinte, exotérmicas. Deste modo, ao fazer-se uma dissolugdo haverd, simultaneamente, uma absorgdo de calor necessério para vencer a coesio das moléculas ou ides do soluto € do solvente, e, portanto, a dissolucdo provocaré um abaixamento da temperatura que, por vezes, & extraordinariamente acentuado. Caso, porém, a quantidade de calor libertada pelas interacgdes dos componentes seja elevada € sobreleve a energia calorifica necesséria para vencer as pressdes intemas daqueles, a dissolugdo seré acompanhada de libertagdo de calor, nao havendo, por outro lado, qualquer modificago da temperatura quando a magnitude dos fendmenos endotér- micos e exotérmicos se iguala. Acontece que a solubilidade dos sélidos nas solugdes altamente ndo ideais pode ser tratada usando calor de dissolugao em vez do calor de fusdo, exprimindo-se, neste caso, a fraccdo molar do soluto do seguinte modo: AH (B-7 log 22. wey 15 ee aR Ve) em que x; € x2 so as solubilidades expressas em fracgGes molares as temperaturas absolutas 7; e 7, respectivamente, e AH € 0 calor de dissolugdo em cal. mol-!, calor de dissolucdo representa, pois, 0 nimero de calorias dispendidas por 1 mol de substincia dissolvida, e, conforme hé um abaixamento ou uma elevagio de temperatura, assim 0 calor de dissolucdo ter, respectivamente, um valor positivo ou negativo, querendo isto significar que no primeiro caso a dissolugiio se faz com absor- 0 © no segundo com libertagdo de calor. 96.1.3.2.2. Dissolugéo de sais na agua Os fendmenos térmicos a que acabimos de aludir sio bem patentes ao dissolver-se um sal na agua. O efeito da temperatura na dissolugdo destes compostos esta represen- tado nos grificos da Fig. 270, verificando-se que uma subida de temperatura aumenta a 809 idade dos compostos que absorvem calor a0 dissolverem-se. Como, neste caso, © processo de dissolugdo & endotérmico, a temperatura inicial do solvente baixa sempre de modo mais ou menos acentuado; compreende-se, por isso, que o aquecimento da mistura aumente a solubilidade do sélido, 0 que, alis, est explicito nas expresses que regem Ty 7 quer a solubilidade ideal, quer a no ideal Inversamente, porém, quando a dissolugao & uum processo exotérmico, a solubilidade dimi- nui com a subida da temperatura, Se bem que a maioria dos sélidos absorva calor quando sto dissolvidos, casos ha em que isso ndo se verifica, Assim, repare-se na curva de solubilidade do sulfato de sédio hidratado, reproduzida na Fig. 270. Segundo ela, verifica-se que até 32°C a dis- » 3 Solubiidade (0 (100 g de dove) solugio deste sal é endotérmica e, portanto, favorecida por um aumento da temperatura. i A partir desse ponto, porém, a curva comega a descer, pois o sal torna-se anidro e, por- wba fo tanto, a sua dissolugao passa a constituir um TI WT OF TT OT OF fenémeno exotérmico. O cloreto de sédio, Temperatura em &© Por seu turno, constitui exemplo de uma _ Fig. 270. Curas de solubiidade de vrios substincia cuja dissolugio na 4gua nao sals em fungdo da temperatura implica absorga0 ou libertagao de aprecidvel quantidade de calor, pelo que a respectiva solubilidade, tal como se depreende do exame da Fig. 270, pouco ou nada & modificada pela variago da temperatura Como dissemos na pig. 808, estes fendmenos podem ser explicados em termos do calor de dissoluedo, SH. Entende-se por calor de dissolugdo de uma substincia crista- lina a diferenga entre 0 calor de sublimagdo do sétido, dado pela energia reticular, € 0 calor de hidratagio dos ides na solugao: AH (c. dissol.) = AH (cal. subl.) —AH (cal. hide) (16) A energia reticular & a energia necessiria para separar um ido grama da rede cris- talina, Por sua vez, 0 calor de hidratagdo € 0 calor libertado quando os ides livres sio hidratados e, desde que seja capaz de fomecer a energia necessaria para vencer as pres- sbes intemnas que os mantém unidos na rede cristalina, os ies respectivos serdo liberta- dos do cristal e o sal dissolver-se-4 Repare-se que, por defini¢ao, nas solugdes ideais nao hd qualquer acgdo entre © solvente € 0 soluto, , portanto, nelas no se verifica a hidratagtio ou solvatagao do dissolvido. Em tal caso, a quantidade de calor absorvida corresponde exactamente a 810 que € necesséria para que os cristais se liquefagam, sendo este 0 motivo porque na equagdo (8), que traduz a solubilidade ideal (pag. 804), apenas figura o calor de fusio do soluto. 9.6.1.3.3. Outros factores que influenciam a solubilidade dos sélidos Passada em revista a influéncia da temperatura ¢ factores a ela associados (calor latente de fusio, calor de dissolugio e ponto de fustio) na solubilidade dos sélidos, con- sideremos, agora, outros elementos que podem, igualmente, influencié-ta. 96.1.3.3.1. Sistemas completamente misciveis A estrutura quimica do sélido desempenha um papel de enorme importancia na res~ pectiva solubilidade. Como tal assunto foi, porém, considerado a propésito do estudo das interacgdes solvente-soluto, dispensamo-nos de mais consideragdes a esse respeito, ‘Apenas acrescentaremos que muitos compostos insoliiveis ou pouco solliveis na gua podem transformar-se em derivados soliiveis naquele solvente a custa da intro- dugdo, nas respectivas moléculas, de radicais polares, sendo numerosos os exemplos de substincias medicamentosas tornadas hidrossoliveis por este proceso, sem que, mercé disso, as suas propriedades terapéuticas sejam alteradas Na Tabela CXX indicamos algumas das reacgdes correntemente utilizadas para a obtengao de detivados soliveis na agua, de acordo com BELLAVITA. 96.13.32. Estado fisico e grau de solvatagao A forma cristalina ou amorfa sob que um sélido se encontra tem uma marcada influéncia na respectiva solubilidade. Acontece, de facto, que muitos compostos podem apresentar-se em duas ou mais formas cristalinas, as quais se distinguem nao s6 pelo aspecto, como, também, pelos seus pontos de fusdo, densidade ¢ coeficiente de solubili- dade. Em regra, as substincias polimérficas sao instiveis, tendendo, por isso, a conver- terem-se na sua forma estivel, que, geralmente, se caracteriza por ter um ponto de fustio mais elevado e menor coeficiente de solubilidade. Assim, 0 anidrido arsenioso pode apresentar-se em trés formas distintas: prismatica, vitrea e octaédrica. O produto oficinal (estavel) corresponde a0 anidrido arsenioso octaédrico, que se dissolve em 80 partes de agua e tem a densidade de 3,69, 20 passo que a forma vitrea tem a densidade de 3,7 € dissolve-se em 25 partes de agua. sil Tabela CX. Tipos de reacgbes de esterifcagso ou de eteriicagso de hidroxlos aleodloas fendicos para a obtengao de composios hidrossoliveis Composiedo do derivado _Exemplos de compostos hidrossoli- Reagente wilizado formado veis a que a reaceao condi: CLHSO, R.O.S03H Esteres sulfiricos do metilesculetol, da diosmina* do dietilbestrol, de vitaminas K. ChPO R.O.P.O(OH)s Esteres fosforicos de mianesina, de vitamina K. chp (R.0),0 Fosfito neutro de guaiacol (CH,CO),0 R.O.COCH, Diacetilmorfina (heroina). (-CH,.CO),.0 R.O.CO.CH;.CH;,COOH —_Essteres hemissuecinicos da hidroxi- pregnandiona, do metilandrosteno- diol, do cloranfenicol CLC00.CH, R.0.COO.C,H, Ester etilearbénico da quinina (eugu nina). (CaHs):80, ROGH, Eter etilico da morfina (dionina).. CLCHCH, N(CH), R.OCH;CH,N(CH.). ter dietilaminoetandlico da quelina, do dietibestrol Glucose, lactose, (O-Heterésidos Osheterésidos da desoxicorticoste- maltose ona, do estradiol, testosterona, colesterol cICH,COoH Esteres mono ¢ dicarboxilados da diosmina *. CICH,OH Derivados hidroxietilados da dios- mina * + Moundo, M. C. — Preparagdo de derivados hidrossoliveis da diosmina, Dissertga0 de Dovtorament, Fas Farmcia do Porto, 1990, © enxofre sublimado ¢ uma mistura polimérfica de cristais octaédricos com pro- duto amorfo, sendo os cristais muito mais solaveis no sulfureto de carbono (37,15%) do que a variedade amorfa. Do mesmo modo, 0 fésforo branco é solivel em sulfureto de carbono (1:0,8 ml) € no benzeno (1:35 ml), a0 passo que o fisforo vermelho & insoli- vel naqueles liquidos. Um exemplo curioso deste polimorfismo é-nos dado pela riboflavina ou vitamina B;, sendo mais solivel na agua aquela que apresenta menor ponto de fusiio, 0 que, alids, esté de acordo com a regra de HILDEBRAND. 812 Também o grau de solvatagdo de um sélido condiciona a sua solubilidade. Assim, verifica-se, em regra, que as moléculas hidratadas apresentam menor solubilidade do que as formas anidras, admitindo-se que a inclusio de agua na rede cristalina provoca uma diminuigao da energia disponivel para a solvatagao. De acordo com o que afirmémos anteriormente, a forma anidra deveri corresponder um menor ponto de fusdo. Um exem- plo clissico deste fenémeno é 0 caso da ampicilina, cuja forma anidra apresenta um ponto de fusio de 200,5°C e uma solubilidade na agua de 10,1 mg/ml, ao passo que o Ponto de fusdo ¢ a solubilidade da molécula tri-hidratada so 203°C e 7,6 mg/ml, res- pectivamente. ‘Ao contritio do que acontece com a formago de hidratos, a solvatagdo com molé- culas orgdnicas tende a aumentar a solubilidade na égua. Neste caso, o aparecimento de moléculas orgénicas no seio da rede cristalina torné-la-ia mais fraca, facilitando a disso- lugdo em agua 96.13.33. Estado de divisao e agitagao Como 0 mecanismo da dissolugao implica uma acgdo de superficie, é evidente que quanto menores as particulas do soluto maior sera a area deste em contacto com o sol- vente; por isso, uma substéncia em po sera mais rapidamente dissolvida, em igualdade de condigdes, do que se estiver sob a forma de grandes cristais, como se depreende da equagdo de Noves-WHITNEY: de < =O) (17) a (KSC WD em que K & uma constante, dependente da agitagao e do coeficiente de difustio do sélido no liquido, S € a area do soluto, C & a concentragio da solugdo no tempo 1 © C, € a concentrago do soluto na zona de difusio que rodeia a porgdo daquele ainda nao dissolvida Compreende-se, portanto, que quanto mais dividido estiver 0 sélido a dissolver mais rapidamente se obteré a sua dissolugdo, acontecendo, ainda, que quando as pat culas de um sdlido apresentam dimensdes inferiores a 2 um observa-se uma diminuigzio do respectivo ponto de fusio, de que resulta um aumento de solubilidade (pag. 804), ‘Também a agitagao da mistura soluto-solvente exerce uma influéncia marcante na velocidade de dissolugdo de um sélido, como igualmente se deduz da equagdo atrés referida, De facto, como C, pode ser tomada como representando a concentragdo da solugio saturada do sélido em causa, isto significa que se a mistura soluto-solvente for mantida em repouso depressa se formaré a volta do sélido uma zona, que, para todos os efeitos, corresponde a uma solugdo saturada daquele. Deste modo, compreende-se que a dissolugdo da substincia dependera do seu coeficiente de difusdo no solvente, 0 qual, como € evidente, pode ser aumentado pela agitagiio da mistura. 813 E por este motivo, aliés, que vulgarmente se procura apressar a dissolugiio agitando a mistura sélido-liquido com uma vareta ou com um agitador mecinico ou magnético, como os representados nas Figs. 271 ¢ 272. Fig. 271. Agitador mecanico Fig, 272, Agtador magnético Ao preparar-se uma solugo, o sélido €, normalmente, colocado no fundo do recipiente, sendo este 0 motivo por que se pode formar & volta daquele a zona de satu- ragdio a que atrés aludimos. Todavia, é possivel evitar-se a formagio dessa zona € dispensar-se, por consequéncia, @ agitagdo, se 0 sélido for suspenso, dentro de um invé- lucro permeavel, a uma altura préxima da superficie do solvente. Deste modo, como a Fig. 273 mostra, a solugo for- mada a volta do soluto desce rapidamente porque & mais densa que 0 solvente, sendo este obrigado a circular por correntes de difusdo, de modo que 0 sdlido estaré sempre em contacto com solvente renovado, 0 que garante uma aprecivel velocidade de dissolugdo, sem que, para isso, seja Fig. 273, Dissolugdo por necessério utilizar-se qualquer processo de agitagio, ee 9.6.1.3.3.4. Constante dieléctrica do solvente Como tivemos ocasitio de referir ao tratarmos das interacgdes solvente-soluto, a solubilidade de uma substancia é, em grande parte, condicionada pela polaridade que ela € 0 solvente possuem, a qual, como se sabe, pode ser expressa em termos de constante dieléctrica, 814 Para fixarmos ideias, relembremos que quanto mais polar for uma substincia maior sera a respectiva constante dieléctrica e que, nestas condigdes, se podera dizer que os compostos altamente ionizdveis ou polares apenas se dissolverio em liquidos de elevada constante dieléctrica, a passo que 0s compostos apolares unicamente se dissolvem em solventes de baixa constante dieléctrica Apesar de a polaridade, s6 por si, nfo explicar completamente a solubilidade de uma substincia num determinado solvente (pig. 796), a verdade & que o conceito de que 0 semelhame dissolve o semelhante mais uma vez se confirma € conduz a resulta- dos muito curiosos quando a dissolugao € encarada sob 0 aspecto de semelhanga entre as constantes dieléctricas do solvente € do soluto, ‘Assim, uma vez que a solubilidade de uma substincia esté, de certo modo, rela- cionada com a sua constante dieléctrica e, ainda, com a do solvente, verificou-se que nalguns casos se torna possivel substituir um dado solvente, tido como o melhor para determinado composto, por outro ou por uma mistura de varios liquidos, desde que o segundo solvente tenha a mesma constante dieléetrica que © primeiro. Este conceito tem-se revelado bastante itil, dado que veio abrir novos caminhos a resolugdo do problema da dissolugiio de certos produtos farmacéuticos apenas soliiveis em liquidos t6xicos, e, portanto, sem qualquer possibilidade de utilizagdo na preparagio de solugdes medicamentosas. Numa circunstincia destas, 0 liquido dotado de bom poder dissolvente para a droga que se pretende dissolver, mas condenado pela sua toxicidade, sera substituido por outro, nfo téxico, que apresente a mesma constante dieléctrica que ele. Desde que 0 novo solvente seja constituido por uma mistura de dois ou mais liqui- dos, a constante dieléctrica do sistema depende, como é dbvio, da constante de cada um deles e da respectiva percentagem na mistura, sendo facil calculé-la de modo apro- ximado, uma vez conhecidos estes elementos, da seguinte maneira: ea, = SAOA+ AB .£%M a Assim, por exemplo, supondo que pretendiamos calcular a constante dieléetrica de um sistema constituido por 50% de agua, 30% de alcool e 20% de glicerina, teriamos, de acordo com a equacdo dada acima e os valores constantes da Tabela CXXI: Eu * 50+ Egle X30+ Eyrecing X20 sec 100 80,4 x 504.21 x30 +43 x 20 = 551 100 Tabola CX, Constantes eléctricas de vatlos lquidos * Bis Constante dieléctrica Liquide 220°C Acetona...... —— Peele 214? Acido cloridrico 46 Agua om 8048 AlCO0 ssoene 13,1 Azei€ on 3 Benzeno ; 23 Benzoato de benzilo ; 49 Cloroférmio oo 48 Etano! SAsesneenn 257 ter etile0 ssn 434 Eeileelossolve 1435 Dioxano ta 2226 Formamida 109 Giicerot ; 8 Metanol 337 Propilenoglicol m2 Tetracloreto de carbon... 224 Vaselina liquide 25 ‘Tabela CXXIl, Constantes dieléctricas de algumas substincias medicamentosas determinadas em dioxano a 254C3 Substincia Constante diléctrica Acido acatisaiclico. 2.5830 Androsterona. ————— —— 2.2146 Bait. .osssnsnnnnnnnnnnnnn 2.2556 Colesterol 22134 Deidrocolesterol. nla 22111 Fenobarbital nnnsonnnsnnnnnnnnn 22447 Metiltestosterona..... bvssense bsseneennscn 2.2130 Sulfanilamida. 23496 TeStOSEFONA sn 22127 1 Segundo Magn, Joe et, pig. 16 2 Determinadas a 25°C, > Segundo KuMien © KUKARN, apud MARTI, Je. cit, pg. 116 816 Varios casos de dissolugao de substincias medicamentosas tém sido resolvidos & luz deste conceito, como o da progesterona, por exemplo. Esta substincia & solivel no benzoato de benzilo na concentrago de 100 mgiml, mas ndo & aconselhivel injectar-se este solvente puro em virtude da sua toxicidade. Entretanto, sabendo-se que a constante dieléctrica do referido liquido ¢ igual a 4,9, procurou-se obter um sistema inécuo com uma constante dieléctrica aproximada daquele valor ¢ em que a solubilidade da referida droga fosse da mesma ordem de grandeza da regis- tada no benzoato de benzilo. Um sistema cor- respondendo a tais requisitos € representado pela mistura de 6% de etanol, 3% de alcool benzilico, 20% de benzoato de benzilo ¢ 71% de dleo de sésamo, o qual pode ser injectado sem qualquer inconveniente. Acontece, por vezes, que © composto apre- 108 de solubilidade correspon- dentes a valores distintos da constante dielée- trica do solvente. E 0 que se verifica, por exemplo, com 0 Acido salicilico, que exibe na sua curva de solubilidade (Fig. 274) dois picos para valores de c= 15 €=25, respectivamente, senta dois ma ye 0 ow Constante dielectica Fig. 274, Solbildade do acido salictico a 30.6°C vs. a constante dieléctrica de 16 solventes puros, 1, Dioxano, 2, benzeno; 3, eloroférmo; 4, acetato de eto: 5, etice- lossolve; 6, acetona; 7, etanot, 8, propanol 9. mbutanol: 10, cicishexanol, 11, élcoo! Denzlico; 12, metanol; 13, propilenogico 14, etilenoglical; 15, glicerina; 16, agua {segundo PaRutA) facto atribuido a diferentes espécies moleculares presentes na solugo. Porque a méxima solubili- dade se verifica a €=15, este valor da cons- tante dieléctrica representa aquilo que PARUTA € colab. designam por exigéncia dieléctrica' do soluto, neste caso particular, a exigéncia dieléc- trica do Acido salicilico. Este composto & mais soliivel na etilcelossolve do que em qualquer outro solvente puro, 0 que, alias, é perfeita- mente légico, uma vez que o valor de © para a etilcelossolve ¢, aproximadamente, de 15, 0 que coincide, praticamente, com a exigéncia dieléctrica do acido salicilico, Entretanto, ¢ possivel substituir a etilcelossolve por misturas binarias de variadissi- mos solventes sem que a solubilidade do acido salicilico diminua em relagao @ que apresenta na etilcelossolve, com a condigao de que o valor de © do par utilizado seja igual a 15, Por vezes, PARUTA verificou existir mesmo um aumento de solubilidade do lo salicilico em certas misturas, como no caso do sistema cloroférmio-etanol, facto atribuivel a interacgdes soluto-solvente, | Panura uailiza a expressto dielectric requirement, que ttaduzimos por exigéncia dielétrica 817 Paruta também observou que a adigdo de sacarose 4 Agua faz baixar a constante dieléctrica daquela, baixa essa tanto mais acentuada quanto maior for a quantidade adi- cionada. Assim, a solugiio a 65% de sacarose na agua, que no ¢ mais do que 0 xarope comum, tem uma constante dieléctrica vizinha de 60, a0 passo que a da agua pura como vimos, de cerca de 80. Este facto, aparentemente sem interesse, faz, porém, com que 0 xarope seja melhor dissolvente de certos compostos do que a agua, como se pode ver na Tabela CXXIII, isto sem divida porque aquele liquido esta mais proximo das exigéncias dieléctricas dos compostos que nela figuram TTabela CXXIIl Solvbiidades comparadas de alguns compostos na Agus («= 60.4) © no xarope comum (€= 60) ilubilidade a 25°C, mg/ml Substincia Agua Xarope comum Fenobarbital 10 21 Quinina 03 ut Sulfnitamida 80 123 Acido p-aminobenzsico 48 86 Caso semelhante acontece com os barbitiricos. Tomemos como exemplo o fenobar- bital, 1 g do qual € aproximadamente solivel em 1000 ml de agua, em 40 ml de clo- roférmio, em 1S ml de éter e em 10 ml de Alco! etilico. O estudo da solubilidade deste composto na agua tem sido objecto de investigagao por parte de varios autores, 0 quais chegaram a conclusdo de que & possivel exceder a sua solubilidade normal naquele liquido (0,1 g/100 ml) desde que se the associe um ou mais solventes, con- forme se mostra na Tabela CXXIV. Assim, verifica-se que a adigio de 20% de alcool agua toma possivel dissolver 0,22 g de fenobarbital em 100 ml desta mistura, concentragao igualmente obtida quando © solvente € constituido por 25% de propilenoglicol e 75% de agua. Fazendo variar os componentes do sistema dissolvente e a respectiva proporgdo, a solubilidade do fenobar- bital aumenta, sendo possivel conseguir-se uma solugao contendo 1,77 g deste composto por 100 ml de solvente constituido, por exemplo, por 50% de propilenoglicol, 10% de alcool e 40% de égua. facto citado nada tem de especial, pois desde ha muito esté empiricamente esta- belecido que vérios compostos so mais soliveis numa mistura de solventes do que num linico liquido, Todavia, se atentarmos na coluna da Tabela CXXIV que nos dé os valo- res de e teoricamente calculados para os varios sistemas propostos para a solubilizagio do fenobarbital, € facil estabelecer-se uma relagdo de causa e efeito sobre o poder dis- solvente desses sistemas. Repare-se que a solubilidade do fenobarbital na agua, cuja 818, Tabela CXXIV, Solvbidade do fenobarbital em varias misturas de soWventes 1 Solubilidade —Propileno Glicerina Aleool Agua 2% glicol % % % % © do sistema? =32 en ©= 257 = 304 022 0 0 20 80 695 25 0 0 15 683 50 0 50 67 0.44 0 30 70 64 25 0 10 65 28 35 0 0 65 65 0 50 3 45 59 0.66 0 0 35 65 614 43 0 0 38 58,6 30 10 40 563 088 0 0 40 60 50 0 0 50 0 50 15 35 133 0 0 45 35 50 0 5 4s 177 0 ° 50 50 53,1 50 0 10 40 52,7 0 50 25 25 479 constante dieléetrica € de 80,4, € apenas de 0,100 g/100 ml, a qual, porém, aumenta progressivamente 4 medida que a constante dieléetrica dos diversos solventes diminui, até atingir 0 maximo de 1,77 g/100 mI nos sistemas considerados, quando a constante dieléctrica destes se situa a volta de 50. Quer isto dizer que quando o valor de © da ‘gua pura diminui de 80,4 para cerca de 50, por acgdo de outros liquidos a ela adicio- nados, a solubilidade do fenobarbital aumenta cerca de 18 vezes, nimeros redondos. Se bem que nunca seja de excluir a possivel intervengio de uma acgdo solvente- -soluto neste aprecidvel aumento da solubilidade do fenobarbital em tais condigdes, parece que © paralelismo registado entre este aumento de solubilidade, por um lado, ¢ a diminuigdo da constante dieléctrica do solvente, por outro, é por demais significative para que possa negar-se uma correlacdo entre os dois fenomenos referidos. | Segundo os dados de varios autores, modificados por MaktiN, oe. cit, pig. 377. 2 Calculado pela equagdo indicada na pig. 814, 819 96.1335. pH e solubilidade dos electrélitos fracos Numerosos compostos quimicos dotados de importantes propriedades terapéuticas, pelo facto de se comportarem como acidos ou bases fracas, so muito pouco ou mesmo quase insoliveis na agua, podendo, no entanto, assumirem, dentro de limites bem defi- nidos de pH, a forma de ides, geralmente hidrossoliveis. Compreende-se, portanto, a importincia de que se reveste 0 conhecimento do comportamento de tais produtos em face do pH do meio, pois sé através desse conhecimento se toma possivel obter solu- ‘ges aquosas desses compostos, afinal aquelas que mais se utilizam como forma medi- camentosa. Assim, 0s dcidos orginicos com mais de cinco étomos de carbono sao rela- tivamente insoliveis na Agua mas reagem com solugdes aquosas diluidas de hidréxidos alealinos, carbonatos e bicarbonatos, originando sais soliiveis na agua. Por sua vez, os 4cidos gordos sio praticamente insoliveis na agua ¢ soliveis em liquidos de baixa cons- tante dieléctrica, mas podem solubilizar-se na égua quando sob a forma de sabes de metais alcalinos ou de etanolaminas. ‘Ao contririo do que acontece com os Acidos carboxilicos atrés mencionados, os hidroxideidos so bastante soltiveis na agua, dada a circunstincia de se solvatarem com ela por formagao de ligagdes hidrogénio através dos hidroxilos existentes nas respectivas moléculas. Também os acidos aromiticos reagem com as solugdes aquosas diluidas de ailcalis, formando sais soliveis que, no entanto, so facilmente decompostos pela adigdo de substancias de carécter mais Acido, 0 que provoca a precipitagio do acido organico, insolivel na 4gua. Esto neste caso varios compostos, como os acidos benzdico € sali- cilico, sendo de notar que, apesar de este diltimo ser um hidroxidcido, tal facto em nada concorre para a sua dissolugao na Agua pela circunstincia de 0 seu hidroxilo estar com- prometido numa ligag4o intramolecular com um dos oxigénios do grupo carboxilico. Também 0 fenol se comporta como uma substincia fracamente acidica € & apenas ligeiramente solivel na agua, mas dissolve-se facilmente em solugdes diluidas de hidré- xidos alealinos. Acontece, no entanto, que o fenol é um Acido ainda mais fraco do que © HsCO;, motivo por que nfo € solivel nas solugdes de carbonatos ¢ bicarbonatos. ‘So numerosissimos os compostos organicos usados como agentes terapéuticos con- tendo, na respectiva molécula, um atomo de azoto basico. Entre eles podemos mencio- nar os alcaléides, aminas simpaticomiméticas, anestésicos locais © tantos outros, Estes compostos caracterizam-se por serem derivados aminados, de formula geral RNH,, dotados de fraca polaridade e, por conseguinte, muito pouco soliveis na agua € soliveis nos solventes apolares. Entretanto, desde que 0 pH do meio seja suficiente- mente baixo, originam sais soliiveis na égua, sendo este 0 mecanismo mercé do qual se consegue a sua dissolugdo naquele solvente: RNH, + HCI—> [R NH] CI- 820 E isto 0 que acontece, por exemplo, com a cocaina, cuja solubilidade é de 1 g/600 mi de agua, a qual, porém, aumenta para 1 g/0,4 ml em presenga de acido clo- ridrico, Tenha-se em atengdo, no entanto, que a adigio de um alcali as solugdes destes compostos promove a sua precipitagio a partir de certo valor de pH, pois tais compos- tos, como ja dissemos, tem uma solubilidade muito diminuta na 4gua quando sob a forma de bases. Ao contrério do que sucede com os compostos anteriores, o azoto alifético das sul- famidas tem caricter suficientemente negativo para impedir a formagio de sais com os ficidos €, por isso, aquelas comportam-se como acidos fracos. Nestas condigdes, as sul- famidas formam sais hidrossoliiveis com solugdes alcalinas, os quais, porém, so decom- postos por adigao de um Acido forte. ly H—N Na ‘Anito do sufanitamida Os barbitiricos comportam-se de modo anilogo as sulfamidas, dado 0 caricter aci- dico dos carbonil S presentes nas suas moléculas. Assim, o barbital, em presenga de uma solugdo diluida de hidréxido de sédio, assume a forma aniénica, solivel na dgua: + on 7 voc’ onc’y Sects NH—C=0O ‘Aniao do barbital Na Tabela CXXV indicam-se as solubilidades do sulfatiazol na agua, a diferentes valores de pH, € 05 nimeros que nela figuram sao elucidativos sobre a importincia da reacgio do meio na solubilidade deste composto, como, aliés, de tantas outras drogas. g21 Tabola CXXV. Solubildade do suifatiazol na agua em fungio do pH da solugso Valor de pH Solubilidade na éigua a 25°C 60 60 mg/100 mt 18 235 mg/100 ml 935 1.000 mg/100 mi 102 10000 mg/100 mt 9.7. SOLVENTES UTILIZADOS Considerando 0 assunto de um modo geral, € evidente que qualquer liquido poder ser usado como solvente. Todavia, o niimero de solventes utilizados na pritica farma- céutica € bastante limitado, pois estes tém que obedecer a determinados requisitos. De facto, todos os solventes usados em farmacia terdo que ser desprovidos de toxi- cidade e nao devem originar irritago das mucosas sobre que se apliquem, exigindo-se- -lhes, ainda, que sejam inertes do ponto de vista fisioligico € se mostrem compativeis com os firmacos a dissolver. Dado, porém, o niimero extraordinariamente consideravel de substincias usadas como agentes terapéuticos, as quais diferem tanto umas das outras na sua estrutura qui- mica, facilmente se compreende a necessidade que ha de recorrer a varios solventes para conseguir dissolver tantos desses farmacos. Acontece, porém, que, apesar da sua grande diversidade de composigao quimica, os composts que formam a enorme legido dos férmacos apresentam determinados porme- nores estruturais comuns a muitos deles. E essa circunstincia, alias, que explica 0 motivo por que compostos globalmente {20 diferentes uns dos outros se dissolvem num mesmo solvente, devendo-se isso, no fundo, unicamente a existéncia de um factor comum entre eles, a confirmar 0 aforismo de que 0 semethante dissolve 0 semethante. S6 assim se compreende que, apesar das restrigdes a que esta sujeita a escolha dos solventes ul tantos liquidos obedecendo as caracteristicas antes referidas e capazes de dissolverem izaveis na preparagio de solugGes farmacéuticas, seja possivel encontrar uns uma multidio de substincias aparentemente tio dessemelhantes. Feitas estas consideragdes preliminares, vejamos, agora, quais os solventes suscepti- veis de terem aplicagao no campo, farmacéutico, fazendo-se, simultaneamente, uma breve resenha das suas caracteristicas mais salientes. 822 9.7.1. AGUA A gua & 0 solvente mais utilizado em farmécia porque além de dissolver inime- ras substincias € um dos constituintes normais dos tecidos € ndo exerce qualquer a vidade fisiologica Dado que possui uma constante dieléctrica e polaridade elevadas, a égua é 0 sol- vente por exceléncia dos compostos electrovalentes, como os sais, bases ¢ dcidos mine- rais, Além disso, dissolve também muitos compostos organicos, nomeadamente os que possuam radicais hidréfilos, tais como grupos OH, -CHO, -CHOH, ~CH,OH, -COOH, -NO>, -CO, -NH; € -SO3H. E de notar, entretanto, que esta hidrossolubilidade geral dos compostos orginicos a que acabamos de nos referir varia bastante dentro de uma mesma série homéloga, Na verdade, ela diminui progressivamente com 0 aumento do peso molecular dos membros da série considerada, acontecendo, ainda, que os de cadeia ramificada so, em geral, mais soliiveis que os de cadeia linear. E oportuno lembrar que sendo a agua miscivel com varios compostos organicos liquidos, 0 que se verifica sempre que estes sejam dotados de certo grau de polaridade, se recorre, por vezes, a essa propriedade para se conseguir a dissolugdo de compostos com baixo coeficiente de solubilidade na agua pura, conforme se refere a propésito do efeito da constante dieléctrica do solvente, na pagina 813. Dai, 0 emprego, na tecnologia farmacéutica, de misturas hidroalcodlicas, hidroglice- rinadas, hidrogliceroalcodlicas € outras, as quais permitem a obtengdo de solugdes de concentrages impossiveis de atingir utilizando unicamente a agua como dissolvente. Repare-se, no entanto, que a par das suas inegéveis vantagens como solvente para solugdes de uso terapéutico, entre as quais avultam 0 seu custo relativamente baixo, grande capacidade de dissolugdio ¢ inércia fisiolégica, a Agua nao é isenta de inconve- nientes. Na realidade, se tivermos presente que a agua ¢ indispensdvel a todos os seres vivos, niio causara estranheza 0 facto de muitas solugdes aquosas serem invadidas por bactérias, leveduras e fungos, pois ndo raramente a sua composigdo oferece condigdes propicias & multiplicagdo desses microrganismos. Trata-se de um fenémeno bastante generalizado e responsivel pela alteragao de numerosas solugdes aquosas, as quais devem ser imediatamente rejeitadas sempre que nelas se observe proliferagao microbiana, Por isso, a fim de se eliminar ou reduzir ao imo tal proliferagdo, & hoje pritica corrente adicionar as preparagdes aquosas subs- tancias antimicrobianas, prolongando-se, deste modo, o seu prazo de utilizagao. 0 outro grande inconveniente apontado as solugdes aquosas é 0 de muitas delas serem instaveis do ponto de vista quimico. De facto, dois fenémenos principais podem observar-se ao dissolver uma droga na Agua— hidrdlise ou oxidagdo —, constituindo qualquer deles os factores destrutivos mais frequentemente responsaveis pela inactivagio, em meio aquoso, de numerosas substincias me 823 Assim, entre os firmacos que podem softer uma decomposi¢ao hidrolitica con- tam-se, por exemplo, a procaina, as sulfamidas, os barbitiricos, a aspirina, os sais de alguns alcaldides, 0 fosfato de hidrocortisona e a penicilina. Nao menos importantes, do ponto de vista da alteragdo das drogas, sio os fenéme- nos oxidativos registados quando estas sto dissolvidas na gua. A oxidagio depende, neste caso, entre outros factores, da quantidade de oxigénio contida na agua e da pre- senga de metais pesados, sobretudo ferro e cobre, sendo muito extensa a lista dos far macos do maior interesse terapéutico susceptiveis de serem decompostos por oxidagao. Mencionam-se, entre eles, a adrenalina, a estreptomicina, a resorcina, a morfina, a vita- mina A, etc, etc.. © que acabamos de dizer mostra como, por vezes, ¢ dificil preparar solugdes aquo- sas estiveis de alguns compostos de uso terapéutico. Para enfrentar os problemas que Ihe surjam e poder resolvé-los correctamente, o farmacéutico terd que possuir um bom conhecimento das propriedades fisicas quimicas dos firmacos ¢ dos fundamentos teé- ricos da dissolugdo, pois s6 assim estaré habilitado a escolher 0 modo operatério. mais, recomendavel a cada caso especifico. 9.7.1.1. Qualidades de 4gua De um modo geral, 0 fabrico de medicamentos é sempre feito com dgua submetida a diversos tipos de tratamentos. De facto, s6 um reduzidissimo nimero de preparagdes & por indicagao expressa da Farmacopeia Portuguesa IV, feito com 4gua potavel, como, por exemplo, as solugdes de potassa sulfurada e de soda clorada ou Agua de Javel. Fora, porém, desses rarfssimos casos, que constituem meras excepgdes, a gua uti lizada nos laboratérios farmacéuticos ¢ sempre agua tratada por diversos processos © que obedece, consoante a finalidade a que se destina, a caracteristicas diferentes € descritas nas monografias correspondentes de diversas Farmacopeias. ‘A Farmacopeia Portuguesa V inclui duas monografias respeitantes & égua, a saber, Agua purificada e Agua para preparacdes injectiveis, diferenciando, neste Gltimo caso, 12 Agua para preparages injectéveis e a Agua esterilizada para preparagoes injectaveis. Numa primeira fase deste subcapitulo faremos uma breve referéncia as qualidades de Agua oficializadas no nosso pais, referindo também a agua potavel. Em seguida abor- daremos, do ponto de vista técnico, os diferentes processos de tratamento da dgua. 9.7.1.1.1. Agua potavel E a gua destinada a alimentagdo humana e & utilizada para preparar a «Agua puri- ficada» e a «Agua para preparagées injectaveis», devendo satisfazer 4s normas estabele- cidas pelas autoridades nacionais. 924 9.7.1.1.2. Agua purificada ‘A gua purificada & preparada quer por destilagdo, quer com 0 auxilio de permuta- dores de ides, quer ainda por outro processo apropriado, a partir de uma 4gua potavel que satisfaga as normas em vigor. Qualquer que seja 0 processo de obtengdo, a 4gua purificada deve apresentar-se como um liquide limpido, incolor, inodoro e insipido. Demais, segundo a Farmacopeia Portuguesa V, 0 residuo de evaporagdo da gua purificada ndo deve ultrapassar 0,001%. Esta, por outro lado, ndo deve acusar a presenga de cloretos, sulfatos, célcio ¢ magnésio, nem ultrapassar os limites nela fixa- dos para as substéncias redutoras, nitratos, aménio € metais pesados. Quando se destine & preparagdio de solugdes para didlise deve satisfazer ao ensaio limite do aluminio (0,01 ppm mi) ‘A gua para diluicdo das solugdes concentradas para hemodidlise merece atengio especial, jé que a Farmacopeia Portuguesa V inclui um texto descrevendo os métodos analiticos € 0s limites propostos para a validagao do processo de purificagao utilizado. Indicando que este tipo de agua é obtido a partir da égua potivel (e salvaguardando a hipétese de, caso nio seja possivel recorrer as técnicas de purificagdo indicadas, se poder utilizar Agua potavel nas didlises domilicidrias), a Farmacopeia descreve técnica € limites respeitantes presenga de substincias oxidiveis, cloro total disponivel, cloretos, nitratos, sulfatos, aluminio (0,01 ppm miv), aménio, calcio, magnésio, mercirio, metais, pesados, potéssio, sédio, zineo, contaminagio microbiana e endotoxinas bacterianas, 9.7.1.1.3. Agua para preparagées injectaveis A Farmacopeia Portuguesa V descreve ainda esta qualidade de agua, que € obtida destilando a agua potével ou purificada em aparelhos cujas superficies de contacto com a gua so de vidro neutro, de quartzo ou de metal apropriado. Estes aparelhos sto munidos de dispositivos eficazes para impedirem o arrastamento de goticulas. A agua obtida deve, ainda, ser isenta de pirogénios e satisfazer aos ensaios da monografia Agua purificada Como se referiu anteriormente, nesta monografia descreve-se também a Agua este- rilizada para preparagdes injectaveis, que se distingue da anterior nao s6 pelas suas caracteristicas, mas também pela sua utilizaga0, Assim, a Agua para preparagdes injec- taveis destina-se A preparagio de medicamentos administrados por via parentérica cujo veiculo & aquoso, a0 passo que a dissolugdo ou diluigao de substancias ou preparagdes para administragao parentérica no momento do emprego deve ser feita com Agua esteri- izada para preparagdes injectiveis. Por outro lado, ¢ além de algumas diferengas respeitantes & presenga de substincias redutoras e de cloretos, esta deve satisfazer aos ensaios de esterilidade € de endotoxinas 825 bacterianas. Também o valor limite do residuo por evaporagao € diferente, sendo de 0,004% para recipientes com volume nominal igual ou inferior a 10 ml e 0,003% para (05 que apresentam volume nominal superior a 10 ml. Repare-se que estes valores sdo res a0 permitido para a Agua purificada (0,001%), mas esta maior tolerincia relaciona-se com 0 facto de, por vezes, a esterilizagao poder alterar as caracteristicas iniciais da agua. 9.7.1.2. Técnicas de purificagao da Agua 9.7.1.2.1. Destilagao ‘A dgua destilada &, sem diivida, o veiculo mais utilizado na preparagdo de solugdes medicamentosas destinadas a serem administradas per os ou por via parenteral, repre- sentando, por isso, uma das matérias-primas que maior consumo tem nos laborat6r farmacéuticos. Entretanto, a destilagdo da gua para uso farmacéutico, sobretudo aquela destinada & preparagdo de solugdes injectiveis, deve ser feita por processos adequados, pois a gua destilada tem que obedecer a condigbes bem especificadas, tais como nao ser pirogénica e no conter metais ou gases dissolvidos, ete., devendo satisfazer aos rigoro- 80s ensaios de controlo inscritos em todas as farmacopeias. Dada, pois, a importancia que este produto representa para a actividade farmacéu- tica, achamos justificdvel darmos uma ideia, ainda que sumria, dos principais modelos de aparelhos utilizados na sua preparagdo. Na generalidade, a agua destilada & preparada a partir da gua potével, devendo os aparelhos utilizados na destilagio satisfazer a certos requisitos, alguns deles de ordem meramente técnica e outros de ordem econdmica, sobretudo a atender quando se trate de produgo em grande escala, Assim, um aparelho utilizado na destilagao da agua deve recuperar 0 calor latente de vaporizago, 0 que torna a produgio mais econémica, Além disso, nao deve ocasio- nar 0 arrastamento de goticulas de 4gua pelo vapor, 0 que elimina a presenga de subs- tincias dissolvidas ou suspensas € de pirogénios no destilado, nfo deve ceder & propria gua destilada as substincias de que € feito e deve promover a eliminagao dos gases dissolvidos naquela antes da destilago propriamente dita. Os aparelhos de destilag%o so de muitos e variados modelos, sendo uns construi- dos de vidro e outros de metal. O vidro utilizado na fabricagio dos destiladores deve ser dotado de alta resisténcia hidrolitica, isto é, no deve ceder, mesmo em quantidade minima, nenhum dos seus constituintes 4 agua. Exige-se, pois, mais de que um vidro neutro, um vidro muito resistente ao ataque pela gua a quente, como os vidros Pyrex € Jena, Normalmente, estes aparelhos so de baixo rendimento e relativamente caros, além de frigeis ¢ dificeis de montar, dado o niimero de pegas que os constituem 826 Como metais usados na fabricagdo de destiladores podemos mencionar o cobre, geralmente estanhado, e 0 ago inoxidavel, sendo, por vezes, os refrigerantes prateados no sew interior. 97.12.14. Aparethos de vidro Entre 05 aparelhos deste tipo termos 0 de SchowtsJena, de rendimento muito limi- tado, que pode trabalhar acoplado com outro igual, produzindo directamente égua bides- tilada, A Fig. 275 reproduz um esquema deste aparelho. Mais pritico e de rendimento um pouco mais elevado € 0 bidestilador Ye/, também inteiramente de vidro, reproduzido na Fig, 276, Fig. 275. Apavelno de Schottlena Fig. 276. Aparelno de Vel Outros modelos totalmente de vidro so 0 Konradest, © Elekirodest, © Fontavapor, © Salvis, © Aquast e 0 Biquast, cujas caracteristicas, segundo GRePeIN, indicamos segui- damente. Kontadest (Geb. MOLLER 1934). — E 0 tipo de aparelho completamente de vidro com alimentagio de 4gua. Compde-se de um bald no qual a Agua € levada a ebulig&o por uma chama de gés. © vapor é conduzido por um tubo de vidro para o reftigerante, também de vidro. Débito: cerca de | litro por hora. Elektrodest (EvGEN Post, 1930). — Este aparelho é feito, também, inteiramente de vidro pyrex, numa sé pega, mas de uma concepgaio muito mais moderna que o prece- dente. A agua & aquecida por dois eléctrodos de corrente alterna que mergulham direc- 827 tamente no baldo, 0 que tora o funcionamento deste destilador muito mais econdmico. ‘A passagem da corrente € faci ‘ada pela presenga de nitrato se sédio, que se adiciona & gua a destilar, sendo a corrente interrompida automaticamente quando a agua falta Débito: 2 ou 4 litros por hora, segundo o modelo, O prego da Agua toma-se muito menor do que nos modelos precedentes. Fontavapor (Buctt, 1950). — Baseado no mesmo principio que © Elektrodest, nfo exige a presenga de electrélito em virtude do emprego de dois eléctrodos de grande superficie. O aparelho com- poe-se de duas partes: Debito: 3-5 | por hora, sendo 0 custo da égua igual a0 da produzida pelo Elektrodest. Salvis. — Aparetho inteiramente de vidro, com aquecimento eléctrico exterior, para agua bidestilada. O primeiro baldo é alimen- tado por agua da canalizago © 0 segundo pela égua destilada que sai do. primeiro. A destilagio € muito lenta de regular, devendo ser constantemente vigiada, Débito: cerca de 0,5 1 por hora. Aquast. — Este aparelho, de origem alema, € constituido de molde a produzir uma dgua de qualidade superior. Todo de vidro Jena 20, 0 aquecimento € feito externamente, por meio de uma espi ral eléctrica, estando o refrigerante e 0 regulador de nivel colocados no interior do baldo de destilacao. regulador esta construido de maneira a produzir um efeito de depressio semelhante ao duma trompa de agua exactamente depois, da primeira zona de condensagdo do vapor de gua. Deste modo, enquanto que este jé se transformou em fase liquida, 0 anidrido car- bénico, os vestigios de amoniaco © produtos de decomposigao orgé- nica, voléteis a 100°C, sao eliminados. © Biguast € a combinagao com um segundo aparelho seme- Ihante a0 primeiro, para a obtengao de 4gua bidestilada. Eis os Fig, 277, Destiador dados técnicos destes aparelhos: Fontavepor Condutividade Resistividade Débito Aguast 1,9 108 526315 ohm x em 1 litrothora Biquast 1,3 x 106 769230 ohm x em 400 mifhora Biquast ¢! refrig, quartzo 1,0 x 108 1000000 ohm x em 828 9.7.1.21.2. Aparethos de metal Dentre os aparelhos metilicos mais usados na preparagio da gua destilada pode- mos citar os destiladores Manesty e Stokes, 0 primeiro de otigem inglesa e 0 segundo de procedéncia americana, mas ambos iguais. Tais aparelhos podem ser aquecidos a is, gasolina, vapor ou electricamente, sendo apresentados em varios tamanhos e mode- los, cujo rendimento varia desde cerca de 1,9 litros a pouco menos de 400 Whora. A Fig. 278 representa um aparelho destes em corte, operando-se 0 seu funcionamento da seguinte maneira: A gua a destilar entra por De sobe ao longo de B, provocando a condensagao dos vapores descendentes. Em. virtude da troca de calor entre 0 vapor e a gua refrigerante, esta & aquecida a uma tem- peratura elevada, de que resulta que os gases nela dissolvidos se evolem e saiam do desti- lador pela abertura G. Uma certa quantidade desta agua assim pré-aquecida passa para a caldeira 4, para substituir a égua evaporada, © 0 excesso sai do aparelho pelo orificio H, estando cal- culado que sio necessérios 8 litros de agua para se obter 1 litro de agua destilada, podendo aproveitar-se os 7 litros de gua res- tante, que sai aquecida por H, para outros Fig. 278. Aparelno Manesty para destlagio fins. Como se pode ver na Fig. 278, ha uma sae zona de agua na parte de cima do condensa- dor que, estando a um nivel superior ao da saida para H, ndo € removida sendo para substituir a dgua evaporada na caldeira. ‘Acontece, por outro lado, que @ 4gua acumulada nesse ponto € mantida constantemente 4 ebuligao pelo vapor libertado na caldeira e que comega a descer ao longo do conden- sador, sendo ai que o amoniaco e outros gases se libertam. Repare-se que a extremidade superior do condensador se eleva bem acima do nivel da Agua na camara de ebuligio ‘esta protegida por uma espécie de tampa de vidro, £, de modo que nao existe perigo de se verificar arrastamento de égua juntamente com 0 vapor. Outro tipo de destilador metélico representado pelo aparelho de Barnstead, com numerosos modelos de capacidade variavel, os quais ainda sao utilizados em alguns laboratirios. Em qualquer das 4 edigdes da Técnica Farmacéutica e Farmdcia Galénica este aparelho € descrito pormenorizadamente. 829 9.7.1.2.1.3. Destilago por termocompressao A destilagdo por termocompressao € realizada mantendo a caldeira a uma pressio inferior & existente no condensador. Os destiladores que para este fim se empregam sio de patente italiana ¢ assentam em bases tedricas completamente novas. A casa produtora é a firma PoNzini ¢ Mascanint, sendo conhecidos estes aparelhos por destiladores de Mascarini ou destila- dores de Ponzini, Nos primeiros modelos comereializados a caldeira era mantida a uma pressio ligei- ramente inferior pressio atmosférica, realizando-se em seguida a compressio © a condensagdo do vapor assim produzido a uma pressdo ligeiramente superior a mesma pressio atmosférica. Como inovagao curiosa, 0 destilador ndo contém qualquer refrigerante © 0 aque- cimento ¢ feito electricamente, sendo 0 aparelho calorifugado, efectuando-se o seu funcionamento do seguinte modo: Numa caldeira de destilagdo (1), a agua € mantida a nivel constante gragas a um alimentador automético provido de um sistema de boia (7). Por meio de um dispositivo de aquecimento de pequeno poder (resisténcias, 5,6), aquece-se temperatura necessaria a agua contida em quantidade limitada na caldeira. Depois disso, 0 aquecimento & consideravelmente reduzido € nao é utilizado senfo para compensar as perdas de calor devidas a irradiago € ao transporte pela agua a saida do escoador. Fig. 279. Aparelho de destlagso por termocompressio (esquema) 830 Inicia-se, entio, © ciclo de produgao, entrando em movimento aspirador-compres- sor de vapor (2), que tem por fim aspirar 0 vapor & medida que este se forma na cal- deira e criando aio grau de vazio necessério. O vapor ligeiramente comprimido & con- densado, depois, no condensador de grande superficie (3), e durante esta mudanga de estado cede Agua da caldeira todas as calorias de vaporizagio, de modo que | kg de vapor condensado produz outro kg de vapor na caldeira. Em (4) a agua destilada assim obtida ¢ arrefecida ¢ cede ainda as restantes calorias a agua que, em contra-corrente, ali- menta o aparelho. Segundo 0 fabricante, 0 processo apresenta as vantagens seguintes: 12 —Obtengdo de uma agua destilada absolutamente pura € apirogénica; 22— Consumo de energia insignificante — 15 litros por kw/h consumido, nas pequenas instalagdes, 3.1— Inicio muito répido da destilagdo devido ao pequeno volume de égua contido nna caldeira; 42—Consumo nulo de agua de refrigeragao; 51—0 aparelho & de construgio sélida, de manobra simples, nao necessita de pessoal especializado e oferece as melhores garantias de duragdo e funciona- mento ininterrupto; 62—O rendimento, sempre elevado, varia segundo as dimensdes dos diferentes modelos (de 5 a 1000 fitros por hora). Os aparethos podem ser fornecidos ainda com um dispositive de regulagao para funcionamento inteiramente automético, gragas ao qual o aquecimento € regulado de modo a manter 0 grau de vazio nos limites desejados. Existem modelos especiais para a destilagdo de agua do mar, para bases navais instalagdes a bordo de barcos, etc. Os primeiros aparelhos apresentavam o inconveniente, comum, de resto, & maioria dos destiladores de movimentagao continua, de nao permitirem uma desgaseificagio con- veniente da agua. Além disso, no conseguiam evitar eficazmente o arrastamento de goticulas de agua liquida, comprometendo assim a apirogenia e a pureza microbiolégica da égua obtida, Deste modo, surgiram os denominados «Ponzinis de segunda geragao», em que © sistema de desgaseificagdo € os processos utilizados para impedir a passagem de agua liquida para 0 condensador so muito aperfeigoados. Todavia, a qualidade microbiolégica da dgua obtida nestes aparelhos ainda nao € satisfatéria De modo a obviar este inconveniente, e considerando que o facto de a destilagao se processar a temperaturas inferiores a 100°C poderia dificultar a eliminagdo de micror- ganismos, a firma produtora comercializou os «Ponzinis de terceira gera¢don, nos quais se mantém a grandeza do diferencial de pressGes (e de temperaturas) entre a caldeira e © condensador, mas em que a pressdo, em cada um deles, € sempre superior & pressao atmosférica, Deste modo, a manutengdo de todo o circuito sob pressio ¢ @ temperaturas 831 superiores a 100°C contribui decisivamente para a melhoria da qualidade microbiologica da égua destilada, que passa a apresentar caracteristicas muito mais satisfatérias do que a anteriormente obtida. 9.7.1.2.2. Desionizagao Ha jé varios anos que existem processos eficazes para a remocdo de sais dis- solvidos na agua, os quais sao baseados na sua adsorgdo por determinadas substancias. Tais métodos so extraordinariamente econdmicos ¢ originam uma Agua muito mais desmineralizada que a agua destilada, se bem que menos pura do ponto de vista bacte- riolégico. As técnicas hoje utilizadas resultaram do conhecido processo da zeolite! para 0 tra- tamento de agua com grande dureza, com a diferenga, porém, de que os permutadores de ides actualmente usados so resinas sintéticas de elevado peso molecular. Estes compostos, insoliiveis na Agua e caracterizados por terem um elevado con- tetido de grupos aminados, sulfinicos e carboxiticos livres, foram descobertos em 1935 por ADAMS € HOLMES e so de dois tipos: os permutadores 4 que fazem a substituigao dos catides dissolvidos pelo hidrogénio, e os permutadores bésicos ou aniénicos, que removem os acidos. Inicialmente, as instalagdes depuradoras de Aguas continham dois tipos de resinas em colunas separadas, mas actualmente preferem-se os dispositivos em que as duas resi- nas estiio misturadas na mesma coluna, 0 que torna a aparelhagem mais barata, mais compacta € muito menos volumosa. © modo como estas resinas funcionam pode indicar-se, resumidamente, assim: 1. Fase permuadora dcida ou catiénica: — Nesta fase 0s catides so substituidos pelo hidrogénio, ficando adsorvidos na resina H-Resina + M*+X> — M-Resina + H* +X, representando M* € X°, respectiva- mente, 0 catiéo e 0 anido presentes na solucaio. 2. Fase permutadora bisica ou aniénica: — A Agua passa, seguidamente, através de uma resina basica, geralmente uma poliamida, e 0 anido é retido de acordo com a seguinte reacgio: Resina —NH,OH + H* + X- — Resina—NHX + H,0 As permutagdes iGnicas que se passam removem os sais dissolvidos ¢ apenas sai da coluna agua praticamente isenta de sélidos estranhos. 1 A zeolite, comerializada sob a designagao de permutite, ¢ um silicato de alu ALO,, 2 SiO, 6 H,0. io ¢ sbdio, NasO, Tabela CXXVI, Afnidade re iva de diferentes ides para com as resinas catiénicas @ aniénicas (Gs valores entre paréntesis exprimem as massas moleculares relatvas) Resina catiénica Lit = 1,00 (7) H0° = 1,26 (19) Na’ = 1,88 (23) .22 (18) 89 (85) Resina eniénica OH = 0,09 (17) cr=10 Br =2,8 (80) NO} =3,8 (62) 28,7 (127) A capacidade de permuta das resinas nao é ili tada, ja que, no decorrer da utili- zagio. os locais de adsorgio dos ides vao ficando progressivamente saturados, 0 que obriga & regeneragio periddica destes materiais. Esta operagdo ¢ relativamente simples consiste apenas na lavagem das resinas catiénicas ou aniénicas com solugdes aeidas ou aicalitias, respectivamente. Por outro lado, também a afinidade dos diferentes ides para Fig. 280. Desionizador de leito mist, tendo um condutivimetro incorporado para controlo da qualdade da Sgua tratada as resinas no € igual, sendo tanto maior quanto maiores forem as respectivas massa molecular e valéncia, Além disso, 0 volume do proprio iéo tam- bém interfere neste valor. Na Tabela CXXVI apre- sentamos as afinidades relativas dos principais ides. A afinidade relativa 6 uma medida indireeta da forca de ligaao as resinas, pelo que os ides ‘com menor massa e com menor valéncia sio os ilmente etiminados da égua ou os que aparecem em primeiro lugar numa agua desionizada obtida num equipamento cujas resinas estejam pro- ximo da saturagao. No caso de 0 anido ser um carbonato ou um bicarbonato, 0 anidrido carbénico originado perma- nece dissolvido na gua € como a sua quantidade insignificante ndo altera a pureza daquela. No entanto, se aqueles anides esto presentes em gran- des quantidades 0 anidrido carbénico tibertado devera ser removido por arejamento da agua. A Fig. 280 representa um desionizador de leito misto !, que emprega resinas permutadoras mais d "Estes apareihos, com capacidade de tratamento de agua com as mesinas resinas variando entre 400 « 4500 I, conforme as respectivas dime de Sousa, 92, 2.° Esq°, 4445 Ermesinde Jes. lo fabricados por A. J. Teixeira de Sousa, Rua Mario Pais 833 catiénica € aniénica, Duolite, na proporgio de 1:2, com unidade de controlo incorpo- rada, sendo as resinas facilmente regeneriveis. ‘A Agua purificada por este processo é reconhecida por varias Farmacopeias, além da nossa, permitindo-se a sua utilizagao na preparagao de solugées medicamentosas, com excepgao das destinadas ao uso parenteral ‘Como atrs se disse, uma agua desmineralizada através de uma coluna cheia com resinas trocadoras de ides apresenta-se muito mais pura, do ponto de vista quimico, do que uma agua destilada. Entretanto, como também jé acentuimos, a agua desionizada no tem sido utilizada nna preparagdo de solugdes injectiveis, dado que poderé conter microrganismos cedidos. pelas colunas € seus produtos metabslicos, especialmente pirogénios. E certo que os pirogénios podem ser eliminados pelas resinas trocadoras de ides, sobretudo quando tenham sido recentemente regeneradas, mas tal reten¢o no € abso- luta. Em face disto, hé sempre a ter em conta a possibilidade de tais substincias conta- minarem uma agua desionizada, Entretanto, SAUNDERS, LoRcH € Hasset conceberam um aparelho que permite a obtengao de uma 4gua purificada por desionizagao, a qual obedece a todos os requisitos para ser usada em preparagdes farmacéuticas, pois, além de estéril, nao contém piro- ‘génios. Na Fig. 281 reproduz-se um diagrama do aparelho de SAUNDERS € colab., 0 qual sre das vulgares colunas trocadoras de ides por ter acoplado um cartucho purificador contendo resinas especiais ¢ terminando por uma série de membranas filtrantes. Fig, 281. Esquema do aparelno de Saunoers, Loncn @ Hassel para a obtengo de agua desionizada estén e isenta de pirogénios ‘A entrada da agua potével; B, pré-purifcador cheio de resinas trocadores aniénicas @ ‘catiOnicas misturadas; C, célula de condutividade ligada & corrente da agua; , vaivula com mandmetro; E, resinas macroreticulares; F, membranas fitrantes; G, saida da qua purifcada 834 Tais aparelhos sio produzidos pela firma Elga Products !, mostrando a Fig. 282 um purificador Tipo EA 4, capaz de produzir 200 litros de Agua desionizada estéril por hora, ‘A inovagao presente nestes desionizadores consiste na existéncia do cartucho de purificagao ja referido, cuja parte superior (Fig. 281, E) est cheia com uma mistura de resinas trocadoras de ides de duas qualidades: uma é denominada XE238 a outra & uma resina macrorreticular catiénica — a Amberlite 200, © cartucho que serve de suporte as resinas € um tubo acrilico com o volume total de 0,71. A agua desionizada entra pelo orificio superior (Fig. 283 A), sendo obrigada a Fig. 283. Pormenor do cartucho de purificagao do aparelho de SAUNDERS ef al. A, entrada da Fig. 282. Puticador de gua, tio EA gua vinda do pré-purificader: 1 = entrada da dgua a puricar, 2desionzador Elgastat; 3~saida da 8: fe8inas macrorreticulares, ‘gua purficads; 4 cbula medidora; 5 controlador da qualidade da C, membrana filtrantes em ‘gua; 6-enitada da Agua purifcada para o Steraskreen. 7—Stcraskeen paralelo; D, saida da agua ‘0 carucho puricador, 8 —saida da agua este aprogénica esti "Lane End, Buckinghamshire, Inglaterra 835 atravessar a camada de resinas e 0 filtro de membranas constituido por trés elementos com 9 cm de didmetro e abertura de poros de 0,22 um, dispostos em paralelo. Um tal dispositivo permite 0 fluxo de 110 Im a uma presstio de 0,7 bar. © tubo, depois de cheio com as resinas ¢ colocados os filtros, & fechado em ambas, as extremidades, encerrado num invélucro de polietileno e esterilizado por exposigio a uma dose de radiagiio y de Co igual a 2,5 megarad. © invélucro e as extremidades apenas devem ser abertos quando se liga 0 cartucho a0 aparelho pré-purificador, recomendando-se que a colheita da agua biologicamente pura se faga numa sé operacao. Todavia, se o cartucho for usado intermitentemente 0 tubo de saida (Fig. 283 D) deve ser mergulhado em solugio acidificada de hipoclorito de sédio, para evitar qual- quer contaminagao por microrganismos existentes no ar. 9.7.1.2.3. Electrosmose A purificagdo de uma agua por esta técnica baseia-se no principio da electrélise, utilizando-se, para isso, aparelhos constituidos por varios elementos, como o que esta representado na Fig. 284, 05 quais esto reunidos em série. Fig, 264. Aparetho para a preparagio de agua puriicada por electrosmose 1— Contactor, 2—corrente continua de 110-220 V; 3—tomeira eléctica; 4— Agua; 5— agua catbdica; 6 — alimentagso: 7 — limpeza; 8 — agua ccatédica; 9 — agua anddica; 10 — agua desmineralizada; 11 — decantacéo; 12 —esgoto

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