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Neuropsicologia - Casos Clinicos
Neuropsicologia - Casos Clinicos
Casos clínicos
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2
Karina Kelly Borges
Shaday Prudenciatti
(Organizadoras)
Neuropsicologia:
Casos clínicos
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Copyright © Autoras e autores
Todos os direitos garantidos. Qualquer parte desta obra pode ser reproduzida, transmitida
ou arquivada desde que levados em conta os direitos das autoras e dos autores.
Neuropsicologia: casos clínicos. São Carlos: Pedro & João Editores, 2020. 150p.
ISBN: 978-65-87645-88-9
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SUMÁRIO
Apresentação 7
5
Capítulo 06 - Transtorno de Aprendizagem Não- Verbal – 103
TANV
Letícia Franco Flores Silvério
Karina Kelly Borges
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Apresentação
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obra resume a dedicação das nossas supervisoras e seus alunos, no
objetivo de tornar a Neuropsicologia cada vez mais conhecida e
aprimorada no campo da Psicologia.
As organizadoras:
Karina e Shaday
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Capítulo 01
Introdução
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epidemiológicos, a prevalência da demência aumenta com a idade,
atingindo cerca de 7% da população com mais de 65 anos e 30% da
população com mais de 80 anos. A Demência de Alzheimer (DA) e a
Demência Vascular (DV) são as duas principais demências
neurodegenerativas e irreversíveis, representando 60% e 20% de
todos os quadros, respectivamente (Santos, Rodrigues, Zogheib,
Malachias & Rezende, 2017).
A distinção entre esses dois tipos de demência foi feita em 1955,
por meio da observação de lesões agudas isquêmicas e/ou
microisquemias focais, sendo denominada como DV, e quando
causada por processo neurodegenerativo cortical DA. A diferenciação
entre as duas é muitas vezes difícil e envolve a necessidade de testes
clínicos e exames de imagem (O’Brien & Thomas, 2015). A
identificação do tipo de demência é extremamente importante, pois
o tratamento correto depende do diagnóstico (Santos, et. al., 2017).
A DV é progressiva e afeta habilidades cognitivas devido à
redução do fluxo sanguíneo no cérebro. Os pacientes com DV podem
sofrer de esquecimentos, depressão ou ansiedade, desorientação,
alterações nas funções executivas, como a resolução de problemas,
raciocínio abstrato, julgamento e planejamento, principalmente em
tarefas mais complexas, além de heminegligência visuoespacial,
déficit atencional, e por vezes, anosognosia que se refere à
autopercepção quanto seu desempenho, em geral, deficitário
(Venkat, Chopp & Chen, 2015).
A neuropsicologia é uma especialidade que possibilita a
identificação de forças e fraquezas da cognição, por meio da
avaliação das funções neuropsicológicas e que por consequência se
mostram preservadas e/ou comprometidas (Carvalho & Guerra,
2010). Tem sido um importante recurso clínico para auxílio
diagnóstico e diagnóstico diferencial, principalmente no que se refere
a transtornos neurocognitivos (Napolitano & Triaca, 2007).
Nesse cenário, este relato de caso visou corroborar a relevante
contribuição da neuropsicologia à compreensão dos processos
demenciais, objetivando investigar o funcionamento cognitivo de
uma idosa através da identificação de potencialidades e limitações
por meio da caracterização das funções cognitivas e capacidade para
execução de atividades de vida diária, para, por fim, auxiliar no
processo e na definição diagnóstica.
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Método
Participante
L. é uma paciente de 85 anos de idade, do sexo feminino, viúva,
com quatro anos de escolaridade formal, dona de casa. Atuou como
enfermeira durante a juventude, e foi responsável pela administração
de propriedades até o falecimento do companheiro, seis meses antes
da presente avaliação. Foi trazida à consulta pelo sobrinho por
apresentar alterações em seu funcionamento cotidiano, como fala
desconexa e esquecimentos. A paciente dirigia bem e sempre foi a
responsável pelo pagamento de funcionários, das contas de sua casa e
da propriedade rural. Atualmente, por apresentar dificuldades para
dirigir possui um funcionário que a auxilia levando-a aos lugares; a
administração das propriedades e funcionários foi assumida pelo
sobrinho recentemente. No autocuidado, o informante relata que não
foram observadas mudanças, embora a paciente negue qualquer
dificuldade. Refere episódios de esquecimento após o falecimento do
marido, mas relaciona ao fato de estar muito cansada devido aos
cuidados que ele necessitava na época. No que tange à personalidade,
refere nunca ter sido ansiosa e não possuir histórico de doenças
psiquiátricas ou neurológicas na família. Possui bom relacionamento
com os amigos, além de ser sempre muito comunicativa. Relata ser
organizada, porém sem altas exigências quanto a isso; tende a ser um
pouco rígida quanto à resolução de problemas.
Em consulta com neurologista, pontuou 19 no miniexame do
estado mental, sendo encaminhada para avaliação neuropsicológica
com a hipótese diagnóstica de transtorno neurocognitivo maior.
Instrumentos
Os instrumentos utilizados para avaliação neuropsicológica
incluíram observação clínica da paciente; Índice de KATZ: para
avaliação das atividades básicas e instrumentais de vida diária;
Entrevista de anamnese com o informante, onde se levantaram
dados a respeito do histórico e desenvolvimento das queixas, assim
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como alterações no cotidiano da paciente; Escala de Inteligência
Wechsler para Adultos (WAIS-III): Cinco subtestes: Cubos;
Semelhanças; Dígitos; Vocabulário; Completar Figuras; Teste de
Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey (Rey Auditory Verbal Learning
Test - RAVLT) para avaliação da memória (retenção imediata e tardia)
e capacidade de aprendizagem verbal; Trail Making Test – A e B - que
avalia componentes atencionais e velocidade de processamento;
Wisconsin Card Sorting Test (WCST), para avaliação das funções
executivas (flexibilidade mental e formação de conceitos); Figuras
Complexas de Rey, para avaliação das habilidades de
visuoconstrução, visuoespaciais, planejamento e memória visual;
Teste Comportamental de Memória de Rivermead, que avalia os
conjuntos mnemônicos gerais; Teste de Reprodução Visual (WMS-R),
que avalia memória visual de curto e longo prazo; Teste de nomeação
de Boston, que avalia a capacidade de nomear objetos por meio de
confronto visual; Fluência verbal fonêmica e semântica, que avalia a
capacidade de produção verbal com restrições quanto aspectos
fonológicos e categóricos;
Procedimentos
A bateria de testes neuropsicológicos foi aplicada durante um
mês, sendo cinco sessões no total. As sessões tiveram duração de 60
minutos.
Foram efetuadas análises a partir dos pontos ponderados e
escore Z (escore do caso – média do grupo normativo ⁄desvio-padrão
(DP) do grupo normativo), utilizando o ponto de corte sugerido pela
literatura de Z≤-1,5 (Kavé, Heled, Vakil, & Agranov, 2010). Os
resultados obtidos foram analisados à luz do referencial teórico
pesquisado relacionado à hipótese diagnóstica de Síndrome
Demencial (CID-F03).
Resultados
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Na tabela abaixo estão expostos os resultados encontrados
após avaliação das funções executivas, flexibilidade mental e
formação de conceitos:
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Tabela 3. Desempenho nos testes de linguagem. Teste de nomeação de
Boston, Vocabulários, Semelhanças e Fluência Verbal Fonética e Semântica
Animais.
Escore Bruto Desempenho
14
Tabela 5. Desempenho nos testes de memória de aprendizagem e memória
tardia verbal. Rey Auditory Verbal Learning Test - RAVLT.
Escore Obtido Desempenho
Interferência 4 Médio
Reconhecimento 10 Inferior
Reconhecimento 1 Inferior
15
previamente apresentadas dentre outras figuras. Nos resultados do
teste comportamental de memória do Rivermead, a paciente
apresentou um desempenho moderadamente comprometido.
Devido à dificuldade visual apresentada, foi realizada a tarefa de
Cancelamento de Sinos, na qual a paciente foi solicitada a riscar todos
os sinos dentre outros estímulos espalhados em uma folha. A
paciente identificou grande parte dos sinos localizados ao lado direito
da folha (1ª etapa – riscados em vermelho), negligenciando os
localizados do lado esquerdo, surgindo à hipótese de
heminegligência visuoespacial. Localizou os estímulos apenas quando
movimentou a folha para seu lado direito (2ª etapa – riscados em
verde). Por fim, observa-se maior número de omissões ao lado
esquerdo (circulados em azul) que podem ser vistos na Figura 1.
16
Discussão
17
em seu lado direito, observando os estímulos do lado esquerdo
apenas se movimentasse a folha ou o rosto.
Também foi observado que a paciente não apresentou
percepção sobre suas dificuldades, verbalizando ao final das tarefas
um feedback positivo quanto ao seu desempenho, característico de
um quadro de anosognosia. Segundo Vannini et. al. (2017) muitos
estudos têm apontado a associação entre anosognosia e disfunção
no córtex pré-frontal, incluindo a região dorsolateral e orbitofrontal,
bem como nas regiões têmporo-parietal e córtex parietal inferior.
Estas regiões estariam não apenas ligadas ao funcionamento
cognitivo, mas também aos processos auto-referenciais – capacidade
de autopercepção.
Em contrapartida, nas atividades verbais, o desempenho de L.
permaneceu dentro da média, demonstrando suas potencialidades.
Considerando a questão da lateralidade, é achado em literatura, que
o hemisfério esquerdo está mais relacionado ao domínio da
linguagem e o direito a habilidades visuoconstrutivas e visuoespaciais
(Oliveira, Antunes & Haase, 2015), a hipótese da existência de uma ou
várias microlesões no hemisfério direito tornou-se mais evidente.
Para confirmar a hipótese diagnóstica foi realizada uma
Ressonância Magnética (RM). Exames de imagem, como Tomografia
Computadorizada e RM são muito utilizados para diferenciar as
causas demenciais além de permitir analisar o grau de atrofia. No
caso da DA é esperada alguma alteração na estrutura da região
parietal com ênfase no hipocampo, enquanto na DV é esperada a
existência de várias microlesões (Santos, et. al., 2017). Neste estudo,
o resultado do exame de RM mostrou achados de aspecto sequelar
de eventos isquêmicos, caracterizando atrofia mesial temporal à
direita e sinais de microangiopatia leve nas porções do encéfalo.
Estes achados de imagem corroboraram com os achados
neuropsicológicos.
Deste modo, as queixas apresentadas em conjunto com os
resultados desta avaliação, reforçaram a hipótese diagnóstica de
demência vascular. Segundo Iadecola (2013) a redução de fluxo
sanguíneo cerebral global pode prejudicar a cognição independente
da localização das isquemias. Porém, conforme apontado por Venkat,
Chopp e Chen (2015), pacientes com DV apresentam diminuição da
capacidade de resolução de problemas, raciocínio abstrato,
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planejamento e execução de tarefas, além de heminegligência
visuoespacial e anosognosia. Estes déficits foram encontrados neste
caso estando em consonância com a bibliografia.
Conclusões
Referências
19
Iadecola, C. (2013). The Pathobiology of Vascular Dementia. Neuron,
80(4), 844–866. https://doi.org/10.1016/j.neuron.2013.10.008
Ivany, J., Santos, D., Rodrigues, C. J., Zogheib, J. B., Vinícius, M.,
Malachias, B., … Rezende, B. A. (2017). Avaliação de parâmetros
hemodinâmicos e vasculares na doença de Alzheimer, demência
vascular e alterações cognitivas leves: um estudo piloto Assessment
of hemodynamic and vascular parameters in Alzheimer’s disease,
vascular dementia and mild cognitive abn. https://doi.org/10.1590/1981
-22562017020.160211
Kavé, G., Heled, E., Vakil, E., & Agranov, E. (2010). Which verbal
fluency measure is most useful in demonstrating executive deficits
after traumatic brain injury? Journal of Clinical and Experimental
Neuropsychology, 1 (1), 1–8.
Napolitano, R. A.; Triaca, T. P. (2007). Hemineglicência: um estudo de
caso. Arquivos de Ciências da Saúde da UNIPAR, Umuarama, v. 11, n.º
2, p. 137- 143.
O’Brien, J. T., & Thomas, A. (2015). Vascular dementia. The Lancet,
386(10004), 1698–1706. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(15)00463-8.
Oliveira, L. D. F. S., Antunes, A. M., & Haase, V. G. (2015). Os diferentes
tipos de diagnóstico em neuropsicologia: nosológico, sindrômico,
topográfico e ecológico. Neuropsicologia: Aplicações clínicas.
Santos, José Ivany dos, Rodrigues, Chrystian Junior, Zogheib, Juliana
Barroso, Malachias, Marcus Vinícius Bolívar, & Rezende, Bruno
Almeida. (2017). Avaliação de parâmetros hemodinâmicos e
vasculares na doença de Alzheimer, demência vascular e alterações
cognitivas leves: um estudo piloto. Revista Brasileira de Geriatria e
Gerontologia, 20(5), 670-678. https://dx.doi.org/10.1590/1981-
22562017020.160211
Vannini P, Hanseeuw B, Munro CE et al (2017) Hippocampal
hypometabolism in older adults with memory complaints and
increased amyloid burden. Neurology 88:1759–1767. https://doi.
org/10.1212/WNL.0000000000003889
Venkat, P., Chopp, M., & Chen, J. (2015). Models and mechanisms of
vascular dementia. Experimental Neurology, 272, 97–108.
https://doi.org/10.1016/j.expneurol.2015.05.006
20
Capítulo 02
AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DO
TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE:
ESTUDO DE CASO EM PACIENTE ADULTO.
21
Introdução
22
frequente. Geralmente o indivíduo movimenta-se todo o tempo, têm
dificuldades em manter-se parado ou quieto, o que costuma acarretar
problemas em ambiente escolar ou profissional. Há também uma
manifestação importante de impulsividade ou impaciência, refletidos
como decisões abruptas, dificuldade de esperar, pouco interesse em
avaliar riscos e tendência a gratificação imediata. A manifestação
combinada representa a atuação igualmente significativa dos dois
aspetos anteriores (Silva, Silva & Menezes, 2019).
Considerando os tipos atencionais, estes são descritos como:
atenção concentrada, dividida e alternada. A primeira refere-se à
capacidade de suprimir elementos distratores e focar-se em uma
tarefa individual por um período de tempo mais extenso. A atenção
dividida representa a capacidade de selecionar dentre eventos
distratores, quais serão os focos atencionais em primeiro plano. Por
último, a atenção alternada reflete a intenção de se dividir o foco
atencional entre dois ou mais estímulos simultaneamente (Santos,
Andrade & Bueno, 2015).
Segundo Castro & Lima (2018), o diagnóstico de TDAH, embora
seja fortemente influenciado por marcadores genéticos é, sobretudo,
um diagnóstico clínico. Reforça ainda que uma visão multidisciplinar e
que engloba os diversos aspectos da vida do paciente é de
fundamental importância para que a avaliação diagnóstica seja feita
de maneira apropriada.
O transtorno apresenta maior força sintomática na infância e
adolescência. Em idade adulta, tais comportamentos tendem a sofrer
variações, rescindindo os sintomas. Adultos tendem a apresentar
declínio de 70% nos sintomas de hiperatividade, 50% nos de
impulsividade e 40% nos desatencionais. (Hart et al., 1995, Biederman
et al., 2000 como citado em Sampaio, 2017).
Ainda assim, o DSM – 5 (APA, 2014) aponta um índice de
prevalência de 2,5 % em adultos. As implicações negativas mais comuns
nesta faixa etária são a inquietude, dificuldade de planejamento,
impulsividade (dificuldade de conter impulsos) e desatenção.
No caso de pacientes adultos, a proporção de subtipos se modifica.
Os tipos hiperativos refletem um comportamento que se aproxima mais
da impulsividade e somam 8,3% dos casos adultos. 18,3% referem-se ao
subtipo desatento. A maioria dos casos (70%) enquadra-se no subtipo
23
combinado (Salvi, Migliarese, Venturi, Rossi, Torriero, Viganò, Cerveri &
Mencacci, 2019).
No que tange ao TDAH, a avaliação neuropsicológica é de
fundamental importância para verificação das áreas de
comprometimento cognitivo, bem como para instrumentalizar o sujeito
para que possa adaptar-se à condição e minimizar os prejuízos em seus
afazeres. Prejuízos estes que tendem a comprometer significativamente
sua performance profissional ou acadêmica (Silva et al., 2019).
Para se realizar o diagnóstico, é necessário que um indivíduo
adulto apresente ao menos 5 manifestações dentre uma lista de
critérios com 18 itens para desatenção e hiperatividade. Estes
aspectos têm de ser observados por pelo menos 6 meses. Outro
critério diagnóstico importante é a presença de sintomas em dois ou
mais ambientes, de modo a descartar-se que os fatores ambientais de
um cenário específico possam interferir na manifestação de tais
comportamentos sintomáticos. Um alto índice de comorbidades é
comum ao TDAH, sendo estatisticamente esperado que um sujeito
que apresente o transtorno também seja acometido por outros
transtornos ou condições psiquiátricas. (APA, 2014).
As comorbidades mais frequentes em adultos com TDAH são:
distúrbios afetivos, distúrbio depressivo maior, distúrbios de
ansiedade, abuso de substâncias e distúrbios decorrentes do uso de
substâncias. Em indivíduos adultos com TDAH, 77,1% terão ao menos
uma comorbidade ao longo da vida. Distúrbios de ansiedade
representam 34,3% dentre as comorbidades apresentadas em
adultos. (Sobanski, Brüggermann, Alm, Kern, Deschner, Schubert,
Philipsen & Rietschel, 2007).
Agati, Curatolo & Mazzone (2019) apresentam uma prevalência
ainda mais alta para transtornos de ansiedade, variando entre 47-53%
em indivíduos adultos com TDAH. Apontam ainda que estes índices
podem variar de acordo com critérios de pesquisa.
Considerando o transtorno de ansiedade, este é descrito pelo
DSM – 5 (APA, 2014) como um estado de alerta constante e uma
preocupação excessiva. Apresentam frequente tensão, pensamentos
de ordem irracional, medos, sensação de insegurança e desconfiança.
Do ponto de vista físico, os sintomas são: taquicardia, sudorese,
tremores, palidez, respiração acelerada e um estado de alerta ou
agitação. São necessários atender ao menos três critérios entre os
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seguintes sintomas: agitação ou nervosismo, cansaço fácil,
dificuldade de concentração, irritabilidade, tensão muscular ou
alterações do sono. Estes sintomas devem estar presentes na maior
parte dos dias por um período maior do que 6 meses.
O DSM-5 (APA, 2014) ainda aponta que tais preocupações ou
comportamentos tendem a ser distanciados do contexto concreto do
problema, muitas vezes sendo maximizados a ponto de se tornarem
desproporcionais à probabilidade real de impacto significativo do
evento antecipado. Este transtorno afeta 2,5% da população adulta e
sua chance de incidência ao longo da vida de um sujeito é de 90%.
Mulheres apresentam uma probabilidade duas vezes maior em
relação aos homens de desenvolverem o transtorno. Há ainda uma
contribuição de um terço de probabilidade de manifestação atribuída
a fatores genéticos, reforçando sua herdabilidade.
O transtorno tem manifestações dinâmicas, variando de
intensidade de acordo com o contexto ambiental, e as características
sociais e biológicas do indivíduo. Em idade adulta, o momento de
vida, demandas profissionais e acadêmicas, socialização e estado de
saúde física e mental podem interferir drasticamente na intensidade
do transtorno. Contextos estressores como avaliações, cobranças,
cenários em que o sujeito é colocado para testar seu desempenho,
excesso de responsabilidades, impactos imprevistos sobre a vida
diária e prejuízos no estilo de vida (afetando família, finanças ou
saúde), tendem a ser os “gatilhos” mais comuns para o agravamento
dos sintomas. (Brentini, Brentini, Araújo, Aros & Aros, 2018).
Este estudo teve, portanto, o objetivo de proceder um
diagnóstico diferencial, analisando as capacidades cognitivas de um
adulto com TDAH com comorbidade de um Transtorno de Ansiedade
Generalizada, na perspectiva de identificar, quantificar e propor
possibilidade de ajuste ou intervenção para facilitar seu rendimento
acadêmico e demais aspectos da vida cotidiana.
Método
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Participante
Um homem, adulto, 25 anos, frente a um Transtorno de Déficit
de Atenção e Hiperatividade de apresentação combinada, com
comorbidade de um Transtorno de Ansiedade Generalizada.
O avaliado apresentou preocupação com seu desempenho
acadêmico. Embora tenha um rendimento satisfatório, deseja
ingressar em uma faculdade de Medicina, o que demanda um
aprimoramento de desempenho. Percebeu então dificuldades de se
concentrar durante as aulas ou tarefas, esquecimentos, irritabilidade,
inquietude e dificuldades para dormir.
O avaliado se dedica ao curso preparatório para vestibular no
intuito de ingressar na faculdade de Medicina. Este é o primeiro ano que
está no curso. Durante as aulas, tem percebido períodos de distração
que eventualmente dificultam seu rendimento ou compreensão da
matéria. Há também alguns esquecimentos de pertences, objetos
pessoais e compromissos que o fizeram procurar uma avaliação. Estes
sintomas têm se apresentado nos últimos 6 meses.
O mesmo relatou momentos de ansiedade, dificuldade de se
fazer entender ao falar, dificuldades para dormir, tristeza eventual,
uso frequente de álcool, irritabilidade e distanciamento de parte das
relações sociais devido a mudança de rotina com os estudos. O início
dos sintomas coincide com o início do curso pré-vestibular.
Nos aspectos cognitivos, sempre teve bom desempenho,
aprendendo com facilidade e geralmente apresentando uma
compreensão acima do esperado. Assimilou a leitura e a fala sem
nenhuma dificuldade. Não há nenhum diagnóstico de transtornos
mentais ou de aprendizagem na família. Ainda assim, menciona que
ele e sua família (mãe e irmãs) tem uma tendência à esquecimentos e
distrações, assim como comportamentos “estabanados”,
derrubando coisas ou esbarrando em outras pessoas com alguma
frequência. Alguns exemplos de esquecimento ou distrações do
avaliado são: perda de objetos, esquecimento de datas ou horário de
compromissos, fácil dispersão durante a aula ou eventual dificuldade
de se lembrar de uma palavra ou conceito quando está falando.
Do ponto de vista social, é bastante comunicativo, animado e
extrovertido. Sempre teve diversas amizades e bom relacionamento
familiar. Por ser bastante expansivo, eventualmente acaba “passando
26
do limite” com brincadeiras ou com o consumo de bebidas e já se
expôs algumas vezes a situações potencialmente perigosas.
Atualmente, o mesmo não faz uso de nenhum medicamento de
forma contínua. Faz acompanhamento psicoterapêutico semanal.
Instrumentos
O paciente foi submetido à entrevista, observação e aos seguintes
testes: TEACO / TEADI / TEALT (Rueda & Sisto, 2010) – Instrumento
utilizado para avaliar o desempenho atencional em seus três aspectos
distintos. Atenção Concentrada, Dividida e Alternada. O desempenho é
medido considerando sua assertividade em função do tempo.
Técnica Figuras Complexas de Rey (Oliveira & Rigoni, 2014) –
Avalia habilidades visuoconstrutivas e visuoespaciais. Percepção
visual, atenção, memória de curto prazo, planejamento e organização
também são observadas.
Teste de aprendizagem auditivo – verbal de Rey (RAVLT) (Paula &
Malloy-Diniz, 2018) – Avalia aprendizagem auditivo-verbal, memória
episódica verbal, codificação e o armazenamento e recuperação de
informações.
Fluência Verbal Fonêmica (F-A-S) (Opasso, Barreto & Ortiz, 2016)
– Avalia a linguagem por meio de estímulo auditivo verbal. Demanda
também uma capacidade executiva de organização em função do
tempo, para filtrar e evocar as palavras necessária.
Teste dos Cinco Dígitos (FDT) - (Sedó, Paula & Malloy-Diniz,
2015). Quantifica em função do tempo capacidades executivas de
flexibilidade e controle inibitório. Também recruta e avalia aspectos
atencionais e velocidade de processamento.
Escala de Prejuízos Funcionais TDAH (EPF – TDAH) (Oliveira &
Nascimento, 2016) – Questionário investigativo de auto avaliação
incluindo aspectos diversos da vida como saúde, desempenho
acadêmico, finanças e socialização, englobando aspectos comumente
comprometidos pelo TDAH.
Teste Wisconsin de Classificação de Cartas (Heaton, Chelune,
Talley, Kay & Curtiss, 2005) – Avalia funções executivas, sobretudo a
flexibilidade, solução de problemas, raciocínio abstrato e
desenvolvimento de estratégias frente a um cenário mutável.
Tarefa do Hotel (Zimmermann & Fonseca, 2017) – Avaliação
ecológica, simulando um contexto cotidiano que investiga e
27
quantifica aspectos da organização, planejamento, memória
prospectiva e atenção.
Torre de Hanói com avaliação qualitativa – Observação de
aspectos do planejamento, elaboração e manutenção de estratégias,
solução de problemas.
Todos os resultados e condutas foram compreendidos pelo viés
teórico da Neuropsicologia.
Procedimentos
Foram realizadas 4 sessões de avaliação com 1,5h de duração
cada. Foram efetuadas análises a partir dos pontos ponderados e
escore Z (escore do caso – média do grupo normativo ⁄desvio-padrão
(DP) do grupo normativo), utilizando o ponto de corte sugerido pela
literatura. Os resultados obtidos foram analisados à luz do referencial
teórico pesquisado relacionado à hipótese diagnóstica
Resultados
28
Tabela 1. Pontos, percentil e classificação de resultados dos testes de
atenção concentrada, dividida e alternada (TEACO, TEADI E TEALT).
TEACO - ATENÇÃO CONCENTRADA
Pontos Percentil Classificação
90 25 Média Inferior
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Tabela 2. Pontuação bruta, percentil e classificação das etapas do Teste de
Aprendizagem Auditivo – Verbal de Rey.
Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal
Categorias Pontuação Percentil Classificação
Evocação
A1 6 25-50 Média
Imediata -
Aprendizagem
A2 8 25-50 Média
A3 8 25 Média
A4 10 25 Média
A5 14 75 Média
Distrator B1 9 95 Superior
Evocação
Imediata – Após A6 11 50 Média
Distrator
Evocação Tardia A7 11 50 Média
Reconhecimento 13 50 Média
Índices de
Escore Total 46 25-50 Média
Aprendizagem
Índice de Aprendizagem
retenção ao longo das 16 25-50 Média
tentativas
Índice de Velocidade de
1 50 Média
interferência esquecimento
30
imagem do que havia obtido na cópia. Ainda assim, em ambas as
etapas, apresentou um tempo mais elevado do que o esperado.
Demonstra então uma dificuldade de planejamento (funções
executivas) devido a um comportamento impulsivo, percebido pelo
avaliado em momento posterior. Apresentou resultados
quantitativos mais baixos no que se refere a capacidade
visuoconstrutiva (Percepção Visual), possivelmente influenciado
também pelo fator impulsividade, visto que os resultados de Cópia e
Memória são bastante distintos.
31
Tabela 4. Resultados brutos, escore Z e interpretação do desempenho na
atividade de Fluência Verbal Fonêmica.
FLUÊNCIA VERBAL FONÊMICA
Resultados brutos Escore Z Interpretação
F – 17 palavras 0,34 Média
A – 18 palavras 0,87 Média
S – 14 palavras 0,02 Média
Total FAS – 49 0,5 Média
32
Tabela 5. Resultados do desempenho no Teste Wisconsin de Classificação de
cartas, apontado em índices brutos, percentuais e interpretativos.
TESTE WISCONSIN DE CLASSIFICAÇÃO DE CARTAS
Escore Percenti Interpretaçã
Bruto l o
Número de Categorias
8 >16 Superior
Completadas
Ensaios para Completar a Primeira
27 ≤1 Inferior
Categoria
Fracasso em Manter o Contexto 1 >16 Superior
Aprendendo a Aprender 13,13 06 - 10 Média
Erros Perseverativos 8 47 Média
33
Tabela 6. Resultados do Teste dos Cinco Dígitos em índices de tempo, erros
e seus respectivos percentis.
TESTE DOS CINCO DÍGITOS
Leitura Percentil Escolha Percentil
Tempo 25 25 Tempo 38 40
Erros 0 nulo Erros 0 Nulo
Inibição 50
Flexibilidade 75
34
nas demais passagens. De toda forma, foi capaz de concluir a tarefa e
na passagem seguinte retomou a estratégia prévia sem erros.
Este erro pode indicar certa dificuldade em remanejar
estratégias e lidar com estímulos que saem da proposta prevista,
relacionando-se ao constructo de Atenção e Funções Executivas
(flexibilidade e planejamento) e com sua ansiedade.
Quando avaliado especificamente critérios para TDAH por meio
da Escala de Prejuízos Funcionais TDAH (EPF – TDAH) foram
observados os resultados apresentados na tabela 7.
Discussão
35
são: não prestar atenção em atividade ou cometer erros por
descuido, dificuldade de sustentar atenção durante tarefas,
dificuldade em organizar tarefas ou gerenciar o tempo de execução,
frequentemente perde coisas, distração por estímulos externos (em
adultos pode se referir a pensamentos intrusivos). Demonstrou
também sensação de inquietude, fala excessiva (em contexto social),
emite resposta antes da conclusão da instrução ou pergunta,
interrompe conversas e tem dificuldade de organizar e expor
pensamentos (também em âmbito social). Segundo o DSM - V (APA,
2014), todos estes comportamentos enquadram-se nos critérios
diagnósticos e se mantém presentes em mais de dois ambientes por
um período superior a seis meses.
Outros sintomas relatados pelo avaliado: alterações do sono,
exposição a situações de risco, tomada de decisões inconsequentes
(com prejuízo físico, emocional ou financeiro), uso de substâncias,
práticas sexuais de risco e relacionamentos amorosos de curta
duração. No que tange a testagem específica para o TDAH, os
critérios de diagnóstico não são plenamente correspondentes em um
critério de auto-avaliação. Entretanto, o contexto global da avaliação
é congruente aos critérios diagnósticos necessários. Castro & Lima
(2018) apontam que critérios de auto-avaliação em indivíduos com
TDAH devem considerar que o discernimento do sujeito acerca do
transtorno é enviesado por sua própria condição, onde o mesmo
tende a minimizar seus impactos. Também evidenciam que os
sintomas citados são indicadores relevantes ao diagnóstico do
transtorno em adultos.
De acordo com Salvi et. al. (2019) o TDAH é geralmente
acompanhado por comorbidades. Afirmam ainda que estes índices de
prevalência de comorbidades variam bastante de acordo com a
amostra ou método de pesquisa, relatando estudos que apresentam
índices entre 57 e 92%. No entanto os autores apontam índices
médios acima de 60% de correspondência com comorbidade em
adultos. Dentre estas há o transtorno de ansiedade generalizada.
Indicam ainda um alto nível de comorbidade entre o TDAH de
apresentação hiperativa/impulsiva e os transtornos de ansiedade,
com correspondência em 60% dos casos.
Estudos em populações americanas encontraram maior
correspondência de transtornos de ansiedade em indivíduos com
36
TDAH de apresentação combinada, reforçando a distinção dos
contextos de cada amostra populacional (Agati, et. al., 2019).
Os sintomas ansiosos observados durante o processo são
congruentes às dificuldades apontadas pelo avaliado. O mesmo
relatou: pensamentos recorrentes relacionados a capacidade de
desempenho, sensação de incapacidade ou fracasso, tensão
muscular, irritabilidade (com relação aos estudos), distúrbios do
sono, sensação de cansaço, dificuldades de concentração, respiração
acelerada e taquicardia (durante avaliações ou provas). Houve
preocupação excessiva com desempenho acadêmico e também com
seu desempenho durante a testagem. Tal cenário relatado, em
conjunto ao tempo de apresentação dos sintomas e seu impacto
funcional e observável durante as atividades aponta para uma
Transtorno de Ansiedade Generalizada, comorbidade referente ao
TDAH em questão (APA, 2014).
Frente aos resultados apresentados pelo avaliado na testagem,
é notável uma dificuldade maior dentro do campo de atenção
concentrada. Os testes atencionais apresentam forte discrepância,
sendo a atenção concentrada a função de maior prejuízo. As funções
atencionais dividida e alternada apresentaram resultados superiores
à média. Desta forma, a primeira atividade do teste refletiu em um
resultado muito aquém ao obtido nas demais atividades atencionais.
Este prejuízo na atenção concentrada é característico do TDAH, mas
observou-se severa contribuição dos fatores ansiosos. Sampaio
(2017), reforça esta observação ao descrever que comprometimentos
neuropsicológicos em adultos são fortemente influenciados por suas
comorbidades, não se limitando aos sintomas do próprio TDAH. Toda
manifestação sintomática em adultos é, portanto, uma manifestação
derivada da interação entre o TDAH e suas comorbidades.
A observação da dinâmica do avaliado apontou para um pico de
ansiedade a cada variação do critério de testagem. A transição de
testes apresentou um ciclo repetitivo de ansiedade inicial, seguida por
diminuição das manifestações no seu decorrer e seu iminente retorno
assim que uma nova atividade era proposta. De acordo com o
constatado durante as atividades, houve influência de fatores internos,
como pensamentos de incapacidade, medo do fracasso e frustração ao
identificar os próprios erros durante o processo. Tais manifestações
atuavam como pensamentos intrusos, e pôde-se verificar um prejuízo
37
em performance em conjunto aos comportamentos supracitados. Tão
logo compreendeu e se ajustou aos parâmetros do teste, demonstrou
maior confiança e conseguiu minimizar os efeitos estressores das
exigências internas, concentrando-se na atividade em questão e
resultando em melhor desempenho. Tal cenário pôde ser observado
no teste Wisconsin de Classificação de Cartas. A capacidade de
flexibilidade era frequentemente impactada devido a exigências
internas que inviabilizavam a resolução do problema. A literatura
reforça esta tendência ao apontar que a capacidade de flexibilidade
(referente ao funcionamento frontal do cérebro) costuma ser
impactada frente a eventos estressores (Fuentes, Malloy-Diniz,
Camargo & Cosenza, 2014).
Para Castro e Lima (2018), as dificuldades práticas relacionadas ao
TDAH têm íntima relação a disfunções executivas, como: controle
inibitório de pensamentos, emoções e impulsos, capacidade de elencar
prioridades, tomada de decisão e uso de estratégia, assim como
resolução de problemas. Complementam ainda que tais prejuízos
orbitam em três eixos: dificuldade em inibir uma resposta principal, em
suspender uma resposta iniciada ou em controlar interferências.
Dentro do contexto de avaliação, foi possível reconhecer que
estes comportamentos atuaram de maneira correspondente ao
TDAH e aos sintomas ansiosos, e evidenciou uma estreita relação
entre os mesmos, onde os transtornos se retroalimentam. As
disfunções atencionais fizeram emergir a ansiedade, e o cenário de
ansiedade interferiu no desempenho cognitivo e fez emergir
disfunções atencionais.
Sob a perspectiva de um diagnóstico diferencial entre os dois
transtornos, concluiu-se que estes são concomitantes e não
excludentes. Os sintomas (mentais ou comportamentais) não se
justificam integralmente ao se considerar somente um dos
diagnósticos. Apenas o TDAH não é suficiente para compreender os
sintomas físicos como as alterações cardiorrespiratórias,
pensamentos cíclicos e autocríticos, bem como a insegurança sobre o
próprio desempenho. Em contrapartida, o Transtorno de Ansiedade
não engloba os comportamentos impulsivos, dificuldades de tomada
de decisão assertiva, exposição ao risco e comprometimento
atencional pontual. Todos os demais sintomas e critérios apontados
38
pelo DSM-V (APA 2014) também são satisfeitos para enquadrar
ambos os transtornos, constatando a comorbidade.
A memória apresentou resultados medianos, não indicando
comprometimento significativo. As dificuldades apresentadas nestes
testes referiram-se a imprecisões de atenção, planejamento ou
demora para estruturar uma estratégia, como no teste de
Aprendizagem Auditivo Verbal de Rey. Observou-se alto nível de
apreensão nas atividades, o que, somado aos aspectos atencionais já
citados, indica que o constructo da memória, apesar de mostrar-se
bem ajustado, acaba por ser impactado devido à interferência destes
demais fatores. Fuentes et. al. (2014) reforça esta verificação quando
aponta que o constructo da memória é uma “via de mão dupla”,
sofrendo fortes influências do constructo atencional.
Os aspectos de linguagem do avaliado mostram-se como um
constructo bem ajustado em comparação com seu próprio
desempenho em outras atividades. Há um bom repertório verbal e
eloquência. Embora o TDAH possa interferir no processamento da
linguagem, dentro do contexto de testes e da própria anamnese, não
é possível verificar esta dificuldade. Ao contrário, observou-se que a
linguagem bem ajustada, alinhada a uma personalidade extrovertida
e interessada atuam como uma forma de equilíbrio funcional, capaz
de manejar os aspectos de ansiedade e ajudar a traçar estratégias
compensatórias às funções que apresentam maior
comprometimento. A literatura indica um cenário semelhante, ao
partir da premissa que indivíduos com TDAH poderiam apresentar
resultados de processamento de linguagem deficitário em
decorrência de seu funcionamento executivo prejudicado. Os
resultados, entretanto, se mostraram contrários ao previsto,
indicando valores equivalentes a indivíduos sem o transtorno
(Albuquerque, Maia, França, Mattos & Pastura, 2012).
As funções executivas apresentaram bons resultados, salvo as
vertentes do controle inibitório e planejamento, cujo desempenho é
comprometido. Verificou-se que atividades mais ecológicas
resultaram em melhor desempenho. O avaliado apresentou-se mais
focado e menos ansioso. Tal caráter ecológico também demandou
bastante de seus constructos atencionais mais fortes (atenção
dividida e alternada), o que contribuiu para um resultado positivo.
Nos testes de contexto ecológico (como a Tarefa do Hotel), foi
39
possível observar um aumento do nível atencional, maior capacidade
de organização, desempenho mais fluido e ágil, além de maior
interesse e engajamento durante a tarefa. Seu resultado mostrou-se
mais eficiente e o mesmo conseguir modular os prejuízos atencionais
associados ao TDAH durante o processo. Verificou-se que atividades
ecológicas podem ser usadas como estratégia para o manejo de
performance e para facilitar as atividades diárias em virtude da queixa
apresentada pelo avaliado. Soma-se ainda que tais atividades foram
apresentadas num momento mais tardio da testagem, permitindo
que o mesmo já estivesse mais habituado ao contexto e, portanto,
menos sujeito ao estresse da avaliação, potencialmente minimizando
o gatilho da ansiedade. Brentini et al (2018) reforçam a importância
do controle ambiental para a supressão dos sintomas ansiosos.
Apontam também que a supressão de tais sintomas é fundamental
para um bom desempenho cognitivo geral.
Notou-se que esta ansiedade influencia negativamente no
desempenho de exames e no aprendizado, devido à apreensão ou
nervosismo. Como contraponto, é possível verificar atividades em que
a apreensão do teste é vista pelo avaliado como um desafio, ou algo a
ser superado. Neste caso, há uma melhora em seu empenho e
concentração, resultando em um aprimoramento de performance. O
avaliado oscila entre as duas posturas ao longo dos testes. Tal
manifestação é contemplada na literatura, ao mencionar que aspectos
internos (pensamento, motivação, atenção) são capazes de manejar a
ansiedade. A qualidade deste manjo impacta diretamente na produção
subsequente (Macher, Paechter, Papousek & Ruggeri, 2011).
Conforme o mesmo foi se “habituando” ao teste proposto, seu
rendimento tendeu a melhorar de maneira expressiva. Foi possível
observar uma substituição da preocupação com o tempo por uma
preocupação em não cometer erros durante a atividade. Passou
então a fazer as atividades mais lentamente e com maior
assertividade. De acordo com Erthal et. al. (2016), este
comportamento pode ser interpretado como um esforço para
manejar a oscilação atencional, reduzindo a intensidade de produção
para dar conta da demanda externa, uma vez que a atenção e a
memória operacional frequentemente estão sobrecarregadas em
uma situação de avaliação.
40
Houve também os momentos de autocrítica, onde o avaliado
mencionou perceber algum erro cometido ou dificuldade
apresentada. Uma vez identificada a tendência, tratou então por
corrigi-la ou compensá-la de alguma forma. Estudos indicam que tal
percepção é comum em transtornos ansiosos, muitas vezes
remetendo-se a uma sensação de incapacidade, pensamentos de
fracasso e insegurança (Boruchovitch, Santos, Costa, Neves, Cruvinel,
Primi & Guimarães, 2006).
Foi perceptível que tal circunstância de autocrítica acabou ainda
por servir de elemento distrator, interagindo de maneira sinérgica ao
TDAH. De acordo com Castro & Lima (2018), pensamentos ou eventos
intrusos durante as tarefas tendem a ser moduladores da capacidade
atencional (autorregulação), implicando na dificuldade de controlar
interferências.
Sobre os aspectos positivos da cognição, o avaliado mostrou-se
particularmente bom em desenvolver estratégias compensatórias para
tais dificuldades. Durante a testagem procurou valer-se de estímulos
ambientais ou de referência dos testes anteriores para facilitar
processos de memorização ou atencionais. Macher et al. (2011)
embasam esta observação ao relatar que tais comportamentos são
frequentes em adultos com TDAH, visto que a maturação das funções
executivas, bem como o desenvolvimento da estrutura cerebral e seu
aspectos químicos, tendem a fornecer mais elementos para que o
indivíduo possa equilibrar funções cognitivas menos adaptadas.
Diante dos dados colhidos nesta avaliação, constatou-se que o
avaliado apresentou discrepância significativa em seus processos
atencionais, o que acabou contaminando suas atividades diárias e
também impactou (ainda que de forma discreta) nos demais
constructos cognitivos. Pôde-se verificar esta atuação no padrão
existente entre as atividades aplicadas, tendo em vista um
desempenho mais lento ou menos preciso nos primeiros minutos da
tarefa, sempre que uma nova atividade foi apresentada. Entretanto,
no decorrer de cada uma das tarefas (segunda metade das
atividades), o avaliando demonstrou melhor desempenho, muitas
vezes apresentando facilidade de execução.
41
Conclusões
Referências
42
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45
46
Capítulo 03
47
Maior. Quanto aos aspectos cognitivos, constatou-se que a paciente
apresentou resultados abaixo da média em alguns domínios
cognitivos, como em funções executivas, atenção e velocidade de
processamento. No entanto, apresentou bom desempenho nos
demais domínios cognitivos, demonstrando, inclusive, capacidade
para a realização das atividades de vida diária. Com base nos
resultados da avaliação neuropsicológica, verifica-se a associação
entre déficits cognitivos e sintomas de depressão, assim como
aponta a literatura.
Palavras-chaves: Transtorno Depressivo Maior; Envelhecimento; Déficits
cognitivos.
Introdução
48
realizada por Fechine e Trompieri (2012), a senescência é o processo
normal/fisiológico de envelhecimento, que atinge, de forma
progressiva, todos os seres humanos. Nesse estágio, as alterações
ocorridas no organismo não estão associadas a doenças, mas sim, ao
“declínio progressivo do metabolismo celular e ao funcionamento
dos sistemas fisiológicos principais” (BICALHO E CINTRA, 2013, p.43).
Essas alterações podem comprometer a estrutura ou a função do
organismo, sem, no entanto, ocasionar limitações diretas das
atividades de vida diária e da participação social. Por outro lado, há o
envelhecimento patológico quando, segundo Birren e Schroots
(1996, apud Fechine e Trompieri, 2012), ocorrem doenças que não se
confundem com o processo normal de envelhecimento, ocasionando,
por exemplo, lesões cardiovasculares e cerebrais.
De acordo com Mallmann e Doring (2017), tanto no
envelhecimento normal, quanto no patológico pode ocorrer o declínio
cognitivo gradual – a depender de fatores como educação, saúde,
personalidade, e nível intelectual global. Como função cognitiva
entende-se por processamento de informação, percepção,
aprendizagem, memória, atenção, vigília, raciocínio e solução de
problemas (CHODZKO-ZAJKO & MOORE, 1994 apud MATOS &
MOURÃO, 2016). Conforme apontam estudos, tal declínio cognitivo no
idoso também pode estar relacionado aos distúrbios psiquiátricos e
neurodegenerativos mais prevalentes na terceira idade: a depressão e
as demências (NICOLATO E ALVARENGA, 2013; DINIZ, 2017).
De acordo com Nicolato e Alvarenga (2013), a depressão é o
transtorno psiquiátrico com maior incidência em hospitais gerais,
abrangendo de 20 a 33% dos pacientes idosos. De maneira geral, ao
realizar uma revisão sistemática de literatura, Diniz (2017) relatou que
a prevalência de sintomas depressivos significativos – presentes nos
Transtornos Depressivos Maior, Distimia e Depressão Menor –, pode
chegar a ocorrer em 38% da população idosa. Para o autor, além de
declínio cognitivo, os sintomas depressivos podem acarretar declínio
funcional e maior morbidade e mortalidade. Em outro estudo,
Bretanha et. al (2015) ao estudarem 1.593 indivíduos acima de 60 anos
no sul do Brasil, observaram que 18% apresentaram sintomas
depressivos, com a seguinte caracterização: maioria do sexo
feminino, classificação econômica mais baixa, menor escolarização,
idade mais elevada, com incapacidade para atividades básicas e
49
instrumentais da vida diária. Da mesma forma, Matos e Mourão
(2016), em revisão bibliográfica sobre a depressão em idosos,
também relataram que os estudos têm associado a depressão ao
comprometimento cognitivo e funcional, principalmente quanto aos
domínios da velocidade de processamento de informação, memória
episódica, atenção e funções executivas. Os autores apontaram que
essa correlação foi ainda mais evidenciada em idosos
institucionalizados.
Para Diniz (2017), as características clínicas dos sintomas
depressivos no idoso são mais heterogêneas quando comparadas aos
sintomas em indivíduos mais jovens, tornando o diagnóstico mais
difícil na prática clínica. Para o autor, o idoso tende apresentar “maior
quantidade de sintomas somáticos (como dor crônica, alterações do
sono e de apetite) em relação aos sintomas psíquicos (como tristeza
e anedonia)” (DINIZ, 2017, p.291). Nicolato e Alvarenga (2013)
também referiram que as queixas psicossomáticas sem causas
aparentes estão presentes na depressão do idoso, dentre elas: os
sintomas ansiosos, sensação de desamparo e desesperança,
preocupações excessivas, queixas de memória, lentificação motora e
irritabilidade, afetando o funcionamento do cotidiano.
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais – 5ª edição (DSM-V), o Transtorno Depressivo
Maior é caracterizado por episódios distintos de pelo menos duas
semanas de duração (embora a maioria dos episódios dure um tempo
consideravelmente maior) envolvendo alterações nítidas no afeto, na
cognição e em funções neurovegetativas, e presença de remissões
interepisódicas. Para o diagnóstico é necessário apresentar um
conjunto de cinco ou mais sintomas, entre eles: alteração do humor,
acentuada diminuição do interesse nas atividades, redução ou
aumento do apetite, alterações do sono, agitação ou retardo
psicomotor, fadiga ou perda de energia, excessivo sentimento de
culpa ou inutilidade, alteração da concentração ou de tomada de
decisão e pensamento suicida recorrente. Além desses sintomas, os
episódios depressivos não são em decorrência de efeitos fisiológicos
de uma substancia ou em decorrência de outra condição médica; e
não são melhores explicados por transtornos esquizoafetivo,
esquizofrenia, transtorno delirante, outro transtorno do espectro da
50
esquizofrenia e outro transtorno psicótico especificado ou transtorno
da esquizofrenia e outro transtorno psicótico não especificado.
Como apontado, os achados neuropsicológicos mais recorrentes
no estado depressivo no idoso estão a redução das habilidades de
atenção, alterações de memória e lentidão de pensamento
(ROZENTHAL ET AL, 2004). Com frequência, esses achados são as
primeiras queixas apresentadas pelo paciente ao clínico. De acordo
com a literatura, a avaliação neuropsicológica se faz necessária e de
suma importância para o diagnóstico diferencial entre demências e
sintomas depressivos. Para Mallmann e Doring (2017), dentre os
quadros patológicos que apresentam declínio cognitivo, encontram-
se as demências, sendo as mais comuns a Doença de Alzheimer (DA)
e a Demência Vascular (DV).
Carneiro e Cabral (2016) apontaram que as queixas de memória
podem cursar com indícios de sintomas depressivos ou como um
possível estágio de transição para a demência. No entanto, de acordo
com Ramos (2014), as características da depressão não são tão graves,
quanto na DA, não mostrando, por exemplo, “reduções na capacidade
de linguagem ou na retenção de informações” (RAMOS, 2014).
Como vimos, nos estudos apresentados, as alterações cognitivas
podem ser manifestações de diferentes transtornos mentais. Desse
modo, o objetivo do presente trabalho é relatar o processo de
avaliação neuropsicológica de uma idosa com queixa inicial de déficit
de memória, a fim de estabelecer o diagnóstico diferencial entre
depressão e demência.
Método
Participante
Senhora, do sexo feminino, com 67 anos a época da avaliação,
aposentada, e com escolaridade até o segundo ano do ensino médio.
A procura para uma avaliação partiu de sua filha que apresentou
a queixa de que sua mãe vinha apresentando falhas de memória, ou
seja, frequentes esquecimentos das datas de consultas médicas e
esquecimentos para executar tarefas do cotidiano. Relatou, também,
51
que constantemente perdia a chave de casa e o cartão do banco. De
acordo com a filha, tais sintomas observados e relatados eram
semelhantes ao da avó materna que foi diagnosticada com
Alzheimer. Em entrevista com sua filha, a mesma relatou que a
paciente antes mantinha a casa sempre limpa e tinha iniciativa para
realizar as tarefas, como dar ordem para que a neta tomasse banho,
mas há aproximadamente três anos os sintomas começaram a surgir
e ela foi deixando de realizar até o que era prazeroso para a sua vida,
como viajar. O seu estado emocional tem sido mais triste e ela chora
com frequência, sem motivo aparente.
Já em entrevista com a paciente, a mesma demonstrou ter
consciência das queixas apresentadas pela filha e julgou ter sintomas
de depressão, chegando a procurar atendimento psiquiátrico. Em
consulta com psiquiatra, foi sugerido o uso de medicação
antidepressiva – ao qual não soube informar o nome –, no entanto, a
paciente fez uso apenas por algumas semanas. Segundo a paciente,
ela apresenta medo de adoecer como sua mãe, por esse motivo,
buscou atendimento neurológico, ao qual fez eletroencefalograma e
ressonância magnética do encéfalo. No entanto, não apresentou os
laudos dos exames, pois não se recordou onde os guardou, mas
relatou que tais exames estavam normais.
No questionário sobre sua história de vida, a paciente relatou ser
aposentada há dez anos, ao qual trabalhou como cozinheira,
inspetora e cuidadora. E, na maior parte de sua vida trabalhou em
dois empregos ao mesmo tempo. Foi casada durante 19 anos e está
divorciada há vinte e três anos. Desde o divórcio morou com os dois
filhos, e sempre teve um dos filhos morando com ela nas
dependências da casa. A época da avaliação estava morando sozinha
há um ano. Em sua história familiar relatou ser a filha mais velha de
três irmãos e que há, na família, casos de dependência química e de
transtorno neurocognitivo maior.
A época da avaliação, sua rotina incluía cuidar da casa, fazer
compras, realizar pagamentos, cozinhar e ajudar como voluntária em
um projeto social. Já o seu lazer era passear com a neta e com as
amigas, em lugares como shoppings, cinemas e restaurantes. Relatou
ter uma boa alimentação, sem fazer uso de álcool e cigarro. Há mais
de quinze anos toma o medicamento clonazepan de 5 mg, e relatou
52
não conseguir dormir sem essa medicação. Segundo seu relato
muitos de seus familiares apresentam insônia.
A paciente informou que é hipertensa, tem reumatismo, artrite e
faz tratamento para fibromialgia há mais de quinze anos. Relatou que
sente muitas dores e toma uma série de medicamentos: difosfato de
cloroquina 200 mg, diacereína 200 mg, corus h 50mg, aceclofenaco
100mg e cloridrato de ciclobenzaprina. Possui talassemia, que no
momento está controlada. Durante o ano de 2018 (ano da coleta de
dados e avaliação neuropsicológica) ficou internada e tomou muitos
antibióticos por causa de diverticulite e cistite.
Aos 63 anos sofreu uma queda e rompeu o ligamento do braço,
deixando seu ombro com desgaste, a paciente relatou que o médico
orientou fazer uma cirurgia para colocação de prótese, no entanto,
apesar das dores constantes, ela recusou fazer o procedimento.
Instrumentos
Para a realização da avaliação neuropsicológica, buscou-se
avaliar habilidades, como capacidade intelectiva (cognitiva), funções
executivas, atenção, memória, habilidades visuoconstrutivas e
visuoespaciais, motricidade, humor e comportamento. Tais
habilidades foram avaliadas por meio de instrumentos específicos
como mostra o Quadro 1 a seguir:
- Funções executivas
Teste dos Cinco Dígitos (FDT) - Velocidade de processamento
- Atenção
53
Bateria Psicológica para Avaliação da
- Atenção
Atenção (BPA)
54
B. Teste Comportamental de Memória de Rivermead (Rivermead
Behavioral Memor. Test– RBMT): é um teste que possui caráter
ecológico, isto é, avalia habilidades mnêmicas, simulando situações do
cotidiano. O Teste é dividido em 12 subtestes que avaliam orientação,
planejamento, memória imediata (verbal e visual), reconhecimento e
memória recente (verbal e visual). O tempo médio de aplicação do
teste é de 25 minutos e pode ser aplicado em indivíduos até 95 anos de
idade. Estudos como os de Yassuda (2010) e Steibel (2016),
demonstram que a versão brasileira do teste apresenta boa validade de
constructo e confiabilidade.
C. Teste dos Cinco Dígitos (Five Digit Test – FDT): foi desenvolvido por
Sedó (2007) com o objetivo de medir, em qualquer idioma, a
velocidade de processamento, a atenção e as funções executivas
(subcomponentes controle inibitório e flexibilidade cognitiva). O teste
apresenta quatro etapas: leitura, contagem, escolha e alternância; e
que se baseia em “conhecimentos linguísticos mínimos: a leitura dos
dígitos de 1 a 5, a contagem de quantidades de 1 a 5, a capacidade em
ignorar uma rotina de processamento automática (leitura) para
controlada (contagem) em estímulos incongruentes e a capacidade de
alternar entre processos de litura e contagem” (CAMPOS ET AL, 2016).
Estudos como os de Campos et al (2016) demonstraram que o FDT
apresenta evidências de confiabilidade na população adulta.
55
F. Nine Hole Peg Test (9 HPT): Avalia destreza manual e velocidade de
execução de movimentos finos, por meio de um tabuleiro com nove
buracos e nove pinos, em que o indivíduo necessita preencher os
buracos com os pinos e, posteriormente retirá-los o mais rápido
possível com a mão dominante e, em seguida, com a mão não
dominante. O escore é calculado pela média de tempo.
56
de culpa ou inutilidade, alteração da concentração ou de tomada de
decisão e pensamento suicida recorrente.
Procedimentos
O procedimento de avaliação se deu em clínica particular, em
sala isolada, individualmente, em contexto de mesa. Os
testes/questionários foram aplicados com um familiar próximo (sua
filha) e com a própria paciente, durante sete sessões; sendo: uma
sessão com sua filha e seis sessões com a paciente. Os encontros
ocorreram semanalmente, sendo cada encontro com duração de uma
hora.
Após a realização das avaliações, foi solicitada à paciente a
autorização dos dados avaliativos a fim de compor um estudo de
caso. A paciente foi informada e orientada sobre os objetivos do
estudo e assegurada o sigilo de identidade.
Resultados
57
Processamento
Legenda: WAIS-III: Escala de Inteligência Wechsler para adultos; Q.I.:
Quociente de Inteligência.
FIGURA 1. Subtestes do WAIS-III com apresentação dos Pontos
Ponderados.
58
classificado como médio inferior, destacando uma maior lentificação
no processamento grafomotor e da emissão da resposta. O subteste
do WAIS-III Códigos (pontos ponderados: 6) sugere uma maior
dificuldade na velocidade de processamento, na memória de curto
prazo, aprendizado, percepção visual, motora, atenção e motivação.
b.) Teste dos Cinco Dígitos (FDT): foi utilizado para avaliar as funções
executivas, a velocidade de processamento e a atenção, aos quais os
resultados estão expostos no Quadro 3, a seguir:
59
(em Inibição obteve percentil 5, ou seja, desempenho inferior). O
mesmo ocorreu no índice Flexibilidade, em que mostrou sua
dificuldade em deliberar alternadamente entre duas operações
mentais diferentes, ou seja, prejuízo na capacidade de flexibilizar o
pensamento para a tomada de decisões.
AA 27 10 – Inferior 10 – Inferior
60
Quadro 5. Resultado do teste comportamental de memória Rivermead (RBMT).
ESCORE
ESCORE DE
RBMT PADRONIZADO
TRIAGEM
(2, 1, 0)
1 - Nome 2 1
2- Sobrenome __________ 1
3 - Pertence 2 1
4 - Consulta 1 1
5 - Figura 2 1
6 a - Estória 1 0
6 b - Estória após intervalo 1 __________
7 - Rostos 2 1
8 a - Caminho 2 1
8 b - Caminho após intervalo 2 1
9 - Recado 1 1
10 - Orientação 2 1
11 - Data 2 1
61
Quadro 6. Resultado do teste de Figura Complexa de Rey.
PONTUAÇÃO
PERCENTIL TEMPO PERCENTIL
TOTAL
60 – Médio
Cópia 32 07:17 75 – Superior
Superior
70 – Médio 60 – Médio
Memória 14 03:40
Superior Superior
f.) Nine Hole Peg Test (9 HPT): foi utilizado para avaliar a motricidade
manual e a velocidade de execução dos movimentos finos. Os
resultados estão expostos no Quadro 7, a seguir:
62
moderado (muito perturbador, nem sempre é fácil lidar com o
problema), a mesmas respostas são marcadas para apatia/
indiferença e irritabilidade/ labilidade. A ansiedade é de frequência
ocasional e de intensidade leve.
63
Quadro 8. Síntese dos Resultados obtidos na avaliação neuropsicológica de
acordo com os domínios cognitivos.
VOLOCIDADE DE
PROCESAMENTO (WAIS- MÉDIA INFERIOR
III)
VELOCIDADE DE
PROCESSAMENTO CÓDIGO (WAIS-III) MÉDIA INFERIOR
FIGURAS COMPLEXAS DE
MÉDIA SUPERIOR
REY
BPA INFERIOR
SINTOMAS
HUMOR NPI SIGNIFICATIVOS DE
E DEPRESSÃO
64
COMPORTAMENTO SINTOMAS
GDS SIGNIFICATIVOS DE
DEPRESSÃO
SINTOMAS
DSM-5 SIGNIFICATIVOS DE
DEPRESSÃO
Discussão
65
deterioração da qualidade de vida e, em idosos, pode acarretar
declínios cognitivo e funcional, além de maior morbidade e
mortalidade” (DINIZ, 2017, p.290).
No mesmo sentido, de acordo com o Caderno de Atenção Básica
(CAB) elaborado pelo Ministério da Saúde (MS) em 2006, a depressão
é um dos transtornos psiquiátricos mais comuns na população idosa;
e no Brasil, a prevalência nessa população varia de 4,7% a 36,8%, a
depender do instrumento avaliativo utilizado e da gravidade dos
sintomas; com maior ocorrência em mulheres. Em revisão de
literatura, Braga et al (2015), também verifica que a depressão é um
dos diagnósticos mais frequentes em serviços de psiquiatria. Carneiro
e Cabral (2016) também apontam que há prevalência do gênero
feminino na depressão de idosos.
Ainda para o MS, a presença de depressão na população idosa
pode ter impacto negativo na qualidade de vida, ocasionando maior
comprometimento físico, social e funcional. Para o Ministério da
Saúde, assim como aponta Diniz (2017), a depressão nessa população
é uma doença com apresentação clínica inespecífica e atípica. Embora
a maioria das pessoas idosas desenvolva um envelhecimento
saudável, elas apresentam maior vulnerabilidade para os distúrbios
psiquiátricos quando comparada às mais jovens.
É importante, em quadros depressivos, observar os possíveis
fatores causais ou concomitantes. De acordo com o CAB, aspectos
como isolamento, dificuldades nas relações pessoais, problemas de
comunicação e conflitos familiares podem contribuir ou desencadear
a depressão. Além desses antecedentes depressivos prévios, fatores
como doenças dolorosas (como neoplasisas, doença osteoarticular
deformante), e uso de alguns medicamentos também podem estar
associados. Nessa mesma perspectiva, outros estudos apontam que a
depressão pode ocorrer em decorrência de diversas condições ou
estar associadas a elas, como doenças relacionados a idade (doenças
cardiovasculares, inflamatórias, endócrinas, autoimunes, índices
elevados de colesterol); uso de medicamentos contínuos e
associados (anti-hipertensivos, antineoplásicos, propranolol,
corticosteroides); e eventos adversos da vida (empobrecimento,
isolamento social, abandono ou falta de solicitude de familiares,
famílias pouco estruturadas, viuvez/divórcio incapacidade funcional,
66
vulnerabilidade social). (Nicolato e Alvarenga, 2013; Wannmacher,
2016; Matos et al, 2016; Matias et al, 2016; Carneiro e Cabral, 2016)
A esse ponto, é importante ressaltar a importância de uma boa
anamnese e a observação dos relatos pessoais e familiares para a
realização de um diagnóstico adequado da depressão, enfocando os
possíveis fatores causais ou concomitantes, uma vez que, como
apontam Carneiro e Cabral (2016) frequentemente o diagnóstico de
depressão é mascarado por problemas somáticos, fato que pode
prorrogar o diagnóstico e consequentemente o tratamento.
Relembrando o caso apresentado, a paciente apresentou fatores de
risco para o desenvolvimento da depressão (ou aspectos somáticos,
já em decorrência da depressão), ou seja, apresentou quadros de
doenças crônicas como hipertensão, reumatismo, artrite e
fibromialgia, episódios de cistite e diverticulite, e dores constantes,
além da ingestão de diversos medicamentos. Outro fator ressaltado
da história clínica é que a paciente apresentou quadro de queda com
fratura e consequente necessidade de cirurgia. Tais fatores podem
ter, como aponta a literatura, levado ao quadro depressivo ou, ainda,
agravado esse quadro. Diniz (2017), também aponta que, nos idosos,
há maior quantidade de sintomas somáticos como dor crônica,
alterações do sono e de apetite, em relação a sintomas psíquicos
como tristeza e anedonia, podendo as queixas da paciente serem
sinalizações da presença de alteração do humor.
Além dos fatores de risco e agravos da depressão, a literatura
aponta que podem estar associados distúrbios cognitivos. A esse
ponto, lembra-se a segunda queixa identificada no relato da paciente
e de sua filha, ou seja, quanto ao déficit cognitivo evidenciado,
principalmente, pela falha de memória. De acordo com os dados
avaliativos, a paciente mostrou-se abaixo da média em alguns
domínios cognitivos, como funções executivas, atenção e velocidade
de processamento. No entanto, mostrou estar preservados os
aspectos da inteligência global, das habilidades visuoconstrutivas,
motricidade, atividade de vida diária e memória.
Em primeiro lugar, de acordo com Bertola et al (2017), os
domínios cognitivos apresentam declínios naturais ao longo da vida.
Os autores classificam tais domínios em dois grupos: os fluídos e os
cristalizados. Os domínios fluídos compreendem a memória
episódica, a velocidade de processamento, as funções executivas, a
67
atenção e as habilidades visuoespaciais. Já os domínios cristalizados
compreendem a memória semântica, a linguagem e a memória
implícita. Para os autores, os domínios fluídos apresentam início de
declínio normal a partir dos 30 anos de idade. Dessa forma, a
memória de curto prazo, vai apresentando-se com aumento da
presença de esquecimentos sobre fatos cotidianos e eventos
pessoais recentes; a velocidade de processamento se torna mais
lentificada ao processar as informações internas e externas; as
funções executivas tornam uma maior dificuldade em gerenciar seus
objetivos e comportamentos diante de objetivos de curto, médio e
longo prazo. Já os domínios cristalizados iniciam o declínio mais
tardiamente, por volta dos 70 anos. Embora haja tais declínios
cognitivos, os autores ressaltam que no envelhecimento saudável
eles não são intensos e não causam prejuízos funcionais e cotidiano
na vida do idoso. Essa distinção é, portanto, “de extrema importância
para o diagnostico diferencial entre idosos que estão em um
processo saudável de envelhecimento cognitivo e aqueles que
iniciaram um processo patológico.” (Bertola et al, 2017, p.49)
Segundo a literatura (Trindade et al, 2013; Lopes et al, 2014;
Braga et al (2015); Nobrega, 2015; Matos et al, 2016; Matias et al, 2016;
Mallmann e Doring, 2017), a depressão está frequentemente
associada aos distúrbios cognitivos e, muitas vezes, apresenta pior
desempenho em testes neuropsicológicos. Em revisão de literatura,
Braga et al (2015), mostra que mesmo em pacientes com função
cognitiva global dentro da normalidade, alguns aspectos cognitivos
podem estar afetados. De acordo com os autores, a depressão no
idoso está relacionada com diferentes sintomas, como diminuição da
saúde física, disfunções cognitivas, queixas somáticas, diminuição da
independência, aumento de doenças e de uso de medicações. Em
Lopes et al (2014), ao correlacionarem desempenho cognitivo de
idosos com sintomas de depressão e fatores como ansiedade e idade,
verificaram que quanto maior a idade desses idosos, maior o déficit
cognitivo. Outro achado, foi que em idosos com sintomas
depressivos mais graves apresentam menores escores nos testes
neuropsicológicos. De acordo com Porto et al (2002), os domínios
globais com maior comprometimento encontram-se a sustentação da
atenção, função executiva, velocidade psicomotora e raciocínio não
verbal. No entanto, os autores apontam que tais disfunções
68
associadas ao quadro de Transtorno Depressivo Maior dependem de
características individuais, variando de individuo a indivíduo. Os
autores apontam ainda, que nem todos os pacientes deprimidos
apresentam esses déficits. Desse modo, se pode observar na
literatura, que a maioria dos idosos com sintomas de depressão
apresentam déficit em algum domínio cognitivo, no entanto, tais
déficits variam em diferentes indivíduos.
Apesar de se mostrar intensificado em quadros de depressão,
Mattos e Paixão Junior (2010) apontam que a diminuição de índices
de velocidade de processamento, ou seja, a diminuição de material
que pode ser processado em uma só vez, é uma característica do
envelhecimento normal. Essa modificação pode acarretar
rebaixamento também de outros domínios cognitivos, como a
atenção, a memória, a linguagem e as funções executivas. Fato que
poderia ter contribuído com os rebaixamentos na velocidade de
processamento, na atenção e nas funções executivas apresentadas
pela paciente nesta avaliação. Além disso, os autores observam que
os déficits em função executiva são mais proeminentes na depressão
do que nos quadros demenciais iniciais de uma forma global.
Outro fator que deve ser ressaltado de avaliações
neuropsicológicas, refere-se a dificuldade em se isolar certos
constructos, já que pode haver uma sobreposição de habilidades
cognitivas. É o caso da atenção, que, de acordo com Yassuda et al
(2010, p.259), “prestar atenção significa detectar mudanças no meio
externo, deter-se sobre elas e, ao mesmo tempo, inibir a interferência
de outros estímulos concorrentes”, misturando-se assim, a outras
habilidades, como a memória e as funções executivas. Ainda quanto
ao constructo atenção, Cabral e Carneiro (2016), apontam que “face à
falta de interesse do idoso deprimido é normal que ocorra alguma
desatenção, menor destreza e algum desinvestimento na realização
de tarefas, justificando-se a possibilidade de falsos positivos nos
testes de screening” (Cabral e Carneiro, 2016, p.121)
Como verificado nos estudos descritos, embora os déficits
cognitivos estejam presentes em idosos deprimidos Ramos (2014),
em revisão de literatura, mostra que, eles não apresentam
características tão graves quanto nas demências. Além disso, Gurian
et al (2012), apontam que doenças crônicas e o próprio estado
69
depressivo podem influenciar negativamente no desempenho dos
testes neuropsicológicos.
Ainda quanto aos aspectos cognitivos, a principal queixa
apresentada pela paciente e sua filha, ao qual levou a mesma a
procurar uma avaliação neuropsicológica foi quanto às falhas de
memória. No entanto, nos testes aplicados na avaliação
neuropsicológica, evidenciaram não haver comprometimento. De
acordo com Carneiro e Cabral (2016) é justamente a queixa de
alterações na memória que mais leva o idoso a procurar
acompanhamento. Para as autoras, o declínio da memória é um
processo fisiológico do envelhecimento, no entanto, não deve ser
uma queixa negligenciada nessa fase da vida, uma vez que pode ser
um possível estágio de transição para uma demência ou como indício
de quadro depressivo.
Uma justificativa para a discrepância entre a queixa da paciente
e o desempenho nos testes objetivos de memória, é quanto uma
possível percepção subjetiva da memória, baseada em autorrelato,
uma vez que o idoso pode ter uma visão mais pessimista com relação
ao desempenho da sua memória. De acordo com Gomez (2013) as
queixas de memória em idosos em uma importante proporção são
consideradas subjetivas e podem em sua maioria estar relacionadas
com a depressão ou a perfis específicos de personalidade.
Quanto a última queixa identificada no relato da paciente e sua
filha, ou seja, quanto aos prejuízos na funcionalidade, evidenciadas
pela falta de iniciativa para execução de tarefas do cotidiano. A escala
realizada (Escala de Pfeffer) não evidenciou incapacidade para a
realização das atividades de vida diária. Embora estudos apontem
para a associação intrínseca entre a depressão e dependência
funcional para as Atividades de Diária, Santos et al (2012), assim como
na presente avaliação, encontraram uma correlação baixa entre essas
duas variáveis. Portanto, como aponta os autores, não é possível
estabelecer uma relação de causa e efeito entre elas.
Conclusão
70
(evidenciada pelas falhas de memória); e as perdas funcionais
(evidenciadas pela falta de iniciativa para execução de tarefas do
cotidiano). Desse modo, para a avaliação neuropsicológica foram
selecionados protocolos de avaliação que permitissem verificar a
funcionalidade de nove domínios cognitivos, a fim de confirmar (ou
não) déficits relacionados às queixas, sendo eles: humor e
comportamento, inteligência, funções executivas, atenção,
velocidade de processamento, memória, habilidades
visuoconstrutivas, motricidade e atividades instrumentais de vida
diária (funcionalidade).
Com relação à primeira queixa, ou seja, quanto às variações de
humor/comportamento, os resultados da avaliação neuropsicológica
evidenciaram sintomas significativos de depressão. Tanto o
Inventário Neuropsiquiátrico (respondido pela filha), quanto a Escala
de Depressão Geriátrica (respondido pela própria paciente),
demonstram que a paciente apresenta grau de perturbação
moderado, sendo verificada grande correlação com apatia e
irritabilidade. Nos critérios diagnósticos para Transtorno Depressivo
Maior do DSM-V, a paciente apresentou cinco dos doze sintomas,
preenchendo o diagnóstico desse transtorno, uma vez que, de
acordo com o DSM-V, para o diagnóstico é necessário apresentar um
conjunto de cinco ou mais sintomas.
Já em relação a segunda queixa, ou seja, quanto a percepção de
déficits cognitivos, foi constatado na avaliação que a paciente
apresentou resultados abaixo da média em alguns domínios cognitivos,
como nas funções executivas, atenção e velocidade de processamento.
Por fim, em relação à terceira e última queixa, ou seja, quanto a
percepção de déficit da funcionalidade, a avaliação demonstrou que a
paciente apresenta capacidade para a realização das atividades de vida
diária.
Com os resultados descritos nesta avaliação neuropsicológica,
principalmente quanto aos sintomas de Transtorno Depressivo Maior
associado aos déficits cognitivos, sugere-se que a paciente mantenha
o acompanhamento psiquiátrico e seja encaminhada para a
psicoterapia. A literatura aponta haver um bom prognóstico quando
da associação da psicoterapia e tratamento psicofarmacológico
(Carneiro e Cabral, 2016), dessa forma, sugere-se que a paciente
mantenha o acompanhamento psiquiátrico. Recomenda-se também a
71
reabilitação cognitiva, uma vez que o humor deprimido afetou o
funcionamento das funções executivas, fazendo-se necessário
estimular a flexibilidade do pensamento, o planejamento das ações e
o controle inibitório.
A paciente tem conhecimento do que afeta o seu cotidiano e ao
longo do tempo desenvolveu estratégias que pudessem acarretar
uma melhor qualidade de vida, por isso buscou ser voluntária em um
projeto social que atende crianças vulneráveis. Desse modo, sugere-
se sua permanência nesta instituição, pois esse trabalho tem se
mostrado muito benéfico para ela. Outra sugestão é a prática de
atividades físicas, uma vez que, de acordo com a literatura, a prática
de exercícios físicos pode contribuir para a melhoria do quadro.
Por fim, sugere-se a realização de acompanhamento
neuropsicológico, através de avaliações neuropsicológicas regulares,
uma vez que, de acordo com Nicolato e Alvarenga (2013), o
Transtorno Depressivo Maior é um fator de risco para as demências.
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75
76
Capítulo 04
Shaday Prudenciatti
Karina Kelly Borges
77
de Transtorno de Ansiedade Generalizada, uma vez que foram
identificados déficits no comportamento, relacionados à ansiedade e
apesar de desempenhos rebaixados relacionados à linguagem a
paciente não preenche, no momento, os critérios para transtorno de
aprendizagem específico, dislexia.
Palavras-chave: Transtorno de Aprendizagem; Dislexia; Ansiedade
Generalizada; Avaliação Neuropsicológica.
Introdução
78
acadêmicas (MOUSINHO & NAVAS, 2016). Os sintomas surgem no
início dos anos escolares e não podem ser explicados por deficiências
intelectuais ou por outros transtornos. O quadro clínico da dislexia é
acompanhado de componentes executivos prejudicados como a
memória de trabalho, controle inibitório e o planejamento
(MOUSINHO, ALVES & CAPELLINI 2015).
Crianças que vivenciam a ansiedade de forma intensa podem
sofrer diversos prejuízos, como por exemplo, no âmbito escolar
(DINELLI & ASSUMPÇÃO, 2018). Uma pesquisa realizada por Semple
(2005) demonstra que a ansiedade presente nas crianças pode
interferir e inibir a capacidade de controlar a atenção, de apreender e
absorver informação e, consequentemente, torna mais difícil
conseguir superar as dificuldades encontradas no contexto escolar.
A ansiedade é um estado psicológico e fisiológico caracterizada
por elementos cognitivos, somáticos, emocionais e
comportamentais, que fazem parte do desenvolvimento humano
podendo tornar-se patológica, quando acontece de forma exagerada
e sem uma situação real ameaçadora que a desencadeie (CAÍRES &
SHINOHARA, 2010).
Segundo consta no Manual de Diagnóstico e Estatístico de
Transtornos Mentais (DSM-V, 2014), a ansiedade é caracterizada por
preocupações excessivas, de difícil controle, que ocorrem na maioria
dos dias por pelo menos seis meses e se relacionam a inúmeros
eventos ou atividades, estando associados a três ou mais dos seguintes
sintomas: inquietação ou sensação de estar no limite; cansar-se
facilmente; dificuldade de concentração; irritabilidade; tensão
muscular; distúrbios do sono. Os sintomas físicos, preocupação ou
ansiedade causam sofrimento clinicamente significante ou
incapacidade em atividades sociais, ocupacionais ou outras.
A intervenção na dislexia deve visar diretamente os processos
deficientes de reconhecimento de palavras, já a intervenção para a
ansiedade requer psicoterapia modalidade Terapia Cognitivo
Comportamental (TCC) e em alguns casos tratamento medicamentoso
com prescrição médica (ARAÚJO & ASSUNÇÃO, 2017).
Sendo assim se faz necessário o diagnóstico diferencial entre os
diferentes quadros visando intervenção adequada a fim de propiciar a
melhoria do quadro e dos sintomas apresentado pelo paciente. Com
isso, esse trabalho teve como objetivo avaliar uma criança com
79
queixa de dificuldade de aprendizagem e realizar o diagnóstico
diferencial entre transtorno específico de aprendizagem e o
transtorno de humor.
Método
Participante
A participante do estudo, com iniciais I. A. I, do sexo feminino com
7 anos e 10 meses, cursando o segundo ano do ensino fundamental,
submeteu-se à avaliação neuropsicológica decorrente de queixas
relacionadas a dificuldades de aprendizagem, como dificuldades de
leitura, escrita, concentração e memorização de palavras.
Em entrevista realizada com a mãe e o pai, os mesmos relatam
que a paciente apresenta dificuldade atencionais em atividades
escolares, agitabilidade dificuldade na leitura e em memorizar palavras.
Essas dificuldades foram percebidas pelos pais há aproximadamente 4
meses em observação de tarefas escolares. Apresentar
comportamentos ansiosos, como por exemplo, impulsividade
alimentar e ganho de peso, discurso agitado, o que causa omissões de
palavras e pressa para terminar qualquer atividade proposta.
A paciente tem medo de ficar desacompanhada dos pais em
qualquer lugar, para ir ao banheiro precisa que a mãe vá junto, assim
como medo de escuro e dificuldade para dormir sozinha. Também diz
que a filha se queixa de dores físicas em dias de prova na escola,
como motivos para não ir à aula.
Em reunião com a escola (diretora, psicóloga e professora),
alegam que I. A. I é uma aluna agitada, se dispersa em sala de aula e
neste ano vem apresentando dificuldades relacionadas à leitura,
escrita e interpretação de textos, o que tem prejudicado seu
desempenho nas provas e atividades escolares. Declaram que a
paciente parece não entender o que lê, além de apresentar
dificuldade na leitura e escrita de palavras com omissões e troca de
letras. Não consegue esperar as coordenadas dadas pela professora
até o final e tem pressa para terminar as atividades. Segundo a
diretora da escola, I. A. I declara frequentemente estar com dores de
cabeça ou na barriga, observado que isso ocorre em dias de provas,
ou antes, de alguma atividade dada pela professora que a paciente
tem dificuldade de realizar.
80
Residi com a avó materna, os pais e um irmão mais velho. Bom
relacionamento familiar. Segundo a mãe, I. A. I é uma criança afetiva
e tem boa interação tanto com as pessoas da família como com
pessoas de fora dela.
I. A. I nasceu de parto cesárea agendada, com 37 semanas
gestacionais, pesando 3,500 kg e com 48 cm. Não houve nenhuma
intercorrência durante o parto.
Segundo relatos da mãe, o paciente desenvolveu controle dos
esfíncteres, sem intercorrências, sentou-se, engatinhou e andou
dentro do tempo normal esperado.
A paciente tem brônquio asma e faz tratamento e
acompanhamento com o pediatra.
Exames sanguíneos atuais detectaram aumento de triglicéris e
colesterol justificados pelo ganho de peso. Foi sugerido pelo pediatra
controle alimentar e atividade física.
Instrumentos
Visando identificar os recursos cognitivos foram selecionados
instrumentos para investigar a capacidade intelectual, a linguagem,
atenção e controle mental, visuoconstrução e visuopercepção,
memória, as funções executivas e os aspectos emocionais cognitivo-
comportamentais.
81
(PAULA & MALLOY-DINIZ, 2018)
Teste Wisconsin de Classificação de Cartas
(WCST) (MIGUEL, 2005);
Funções Executivas
Teste dos Cinco Dígitos (FDT) (SEDÓ, PAULA &
MALLOY-DINIZ, 2015)
Escala Multidimensional de Ansiedade (MASC);
Aspectos emocionais
Escala de Rastreio de Ansiedade Infantil
cognitivo-
(SCARED);
comportamentais
DSM-5, 2014.
Procedimentos
A participante foi encaminhada pela coordenação da escola
particular na qual está regularmente matriculada. Foram realizadas
08 sessões com duração de 50 minutos cada, em consultório
particular. Os procedimentos realizados em cada sessão para
avaliação neuropsicológica, foram descritos na tabela abaixo.
Resultados e Discussão
82
indivíduos da sua mesma faixa etária, a paciente teve desempenho na
média.
Os resultados relacionados ao Índice de Memória Operacional,
que avalia a capacidade de sustentar atenção e concentração e
exercer controle mental demonstram desempenho inferior à média, e
os resultados relacionados ao Índice de Velocidade de
Processamento, que indicam a velocidade com a qual a criança pode
processar mentalmente uma informação, simples ou rotineira, sem
apresentar erros, à capacidade de resistência à distração e rapidez no
processamento das informações visuais apresentou desempenho
superior para sua faixa etária, como demonstra a figura 1.
83
mediais e no final das palavras. Na aritmética, apresenta dificuldade
em realizar contas de soma e subtração em números com mais de um
dígito (tabela 1). Corroborando com estudos que relacionam
transtornos de aprendizagem com problemas na aquisição e
desenvolvimento de funções cerebrais envolvidas no ato de
aprender, que exijam habilidades de leitura, matemática ou escrita
(SIQUEIRA & GIANNETTI, 2011).
84
do processamento fonológico são características do transtorno de
aprendizagem específico (dislexia) (MOUSINHO & NAVAS, 2016).
Apresenta adequada orientação pessoal (conhecimento e
percepção em relação a si mesma), orientação temporal (dia da
semana, mês e ano), e orientação espacial (localização, cidade e
estado em que vive).
Na avaliação da atenção e controle metal, os resultados quanto
à agilidade mental e ao processamento grafo motor, a paciente
apresentou desempenho superior para sua idade. Na prova que mede
a atenção seletiva, capacidade de manter o foco numa atividade e
inibir a tendência de fornecer respostas impulsivas, além da
velocidade no processamento de informações, apresentou
desempenho esperado.
Os resultados referentes à atenção sustentada, capacidade de
prestar atenção a um determinado estímulo, inibindo outros e
mantendo foco no estímulo-alvo, apresentou desempenho inferior,
assim como na atenção alternada, que se refere à capacidade do
indivíduo de ora manter o foco de atenção num estímulo, ora em outro.
Com relação às habilidades visuoconstrutivas, envolvendo cópia
de figuras, a paciente obteve classificação média inferior,
demonstrando capacidade de percepção visual e planejamento
adequados, assim como organização, sequenciamento e
administração de tempo para reprodução da figura apresentada.
Os resultados relacionados à memória apresentam desempenho
inferior à média, relacionado à Memória Operacional que avalia o
sistema de armazenamento temporário e que possibilita a
manipulação de itens enquanto outras tarefas cognitivas são
realizadas, desempenho inferior na avaliação da memória verbal e do
aprendizado, com relação ao índice de memória imediata,
demonstrando dificuldade em reter informações em curto prazo.
Contudo a evocação imediata (realizada após interferência) e a
evocação tardia demonstram resultados dentro da média.
A curva ascendente de aprendizagem demonstra retenção de
informação ao longo das tentativas, assim como, capacidade de
resistência ao efeito de distratores proativos, que indica interferência
de um conteúdo anteriormente aprendido sobre a aprendizagem de
um novo conteúdo, e capacidade em resistir à interferência
85
retroativa, ou seja, em manter uma informação anteriormente
aprendida, após aprender um novo conteúdo (figura 2).
86
Tabela 4. Demonstrativo das respostas dadas a Escala Multidimensional de
Ansiedade (MASC).
Sintomas Porcentagem Interpretação
Somáticos 51% Com risco
Comportamento Evitativo 16% Sem risco
Ansiedade Social 15% Sem risco
Ansiedade de Separação 18% Sem risco
Conclusão
87
Contudo, a paciente apresenta bom funcionamento executivo
e de planejamento, que também estariam rebaixadas em quadros
clínicos de dislexia. Com referência aos aspectos emocionais
cognitivos comportamentais, a paciente apresenta sintomas
sinalizados em entrevista pelos pais e pela escola, indícios de risco
para comportamentos e transtornos ansiosos em provas qualitativas
e preenche critérios diagnósticos do DSM-5 para transtorno de
ansiedade generalizada, o que pode prejudicar o seu desempenho
escolar.
Desta forma conclui-se que a hipótese diagnóstica é de
Transtorno de Ansiedade Generalizada, uma vez que foram
identificados déficits no comportamento, relacionados à ansiedade e
apesar de desempenhos rebaixados relacionados à linguagem a
paciente não preenche, no momento, os critérios para transtorno de
aprendizagem específico, dislexia.
Como implicações futuras, em face do exposto, sugere-se
acompanhamento psicológico a fim de controlar os sintomas
ansiosos; Tratamento pediátrico para diagnóstico e controle do
quadro de ansiedade; Acompanhamento psicopedagógico, para
melhoria das dificuldades escolares apresentadas relacionadas a
déficits nas habilidades fonológicas. Reavaliação em 12 meses,
condicionada a melhora dos sintomas de humor, para averiguação de
possíveis dificuldades específicas de aprendizagem, uma vez que
apresenta dificuldades escolares apresentadas relacionadas a déficits
nas habilidades fonológicas.
Referências
88
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89
90
Capítulo 05
Introdução
91
O desenvolvimento das funções executivas tem sido relacionado
a dificuldades acadêmicas, problemas mentais e sociais, existindo
correlação positiva a transtornos, tais como deficiência intelectual,
comportamentos disruptivos, transtorno de déficit de atenção e
hiperatividade e evasão escolar (Lezak, Howieson, Loring & Fischer,
2004; Hartman, Houwen, Scherder & Visscher, 2010).
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH),
segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM 5) – (APA, 2014), é um transtorno do neurodesenvolvimento,
ou seja, com início durante a primeira infância, que causa prejuízos
afetando relacionamentos sociais e o desempenho acadêmico. Seus
sintomas incluem desatenção, hiperatividade e impulsividade com
frequente ocorrência de comorbidades associadas, sendo a de maior
prevalência, o transtorno opositor desafiante (TOD) (Barkley, 2008).
O diagnóstico é fundamentalmente clínico, baseados em
critérios claros e bem definidos, como os que constam no DSM–V e
que podem contar com o auxílio ou não de exames neurológicos
(Araújo, 2002; Erthal, Coutinho, Miele e Mattos, 2016).
Os prejuízos referidos para os quadros de TDAH estão
relacionados ao desempenho das funções executivas, que para
Miyake, Friedman, Emerson, Witzki, Howerter & Wager (2000), são
formadas a partir de três habilidades principais: inibição, memória de
trabalho e flexibilidade cognitiva. Com a integração dessas três
funções executivas se constituem outras habilidades, como, por
exemplo, planejamento, tomada de decisão, resolução de problemas
e raciocínio, que são consideradas funções executivas complexas
(Diamond, 2013). O curso do desenvolvimento das funções executivas
é extenso, o que dificulta sua avaliação precisa, ele ocorre a partir dos
doze meses de vida e segue, tendo seu ápice de desenvolvimento dos
cinco aos sete anos, se ampliando e de fato concretizando-se quanto
à maturação na vida adulta (Best, Miller e Naglieri, 2010).
O funcionamento e desenvolvimento adequado das funções
executivas são de fundamental importância à aprendizagem, ao
ajustamento e funcionamento do indivíduo de maneira apropriada.
Para Dias & Seabra (2013), déficits nestas habilidades podem
acarretar inúmeras dificuldades, podendo o indivíduo tornar-se
desatento, impulsivo, ter dificuldade de planejamento ou conseguir
engajar-se em comportamentos complexos; pode experimentar,
92
ainda, dificuldade em regular suas emoções, não conseguindo
postergar gratificação.
O diagnóstico correto e o tratamento adequado do podem
minimizar os impactos do transtorno e suas possíveis comorbidades
na vida dos menores. Para tanto, a compreensão do perfil cognitivo,
contribui na precisão diagnóstica, que consiste em uma associação
feita entre os comportamentos observados ao longo do
desenvolvimento do sujeito e seu funcionamento cognitivo (Fedalto
& Hamdan, 2010). Neste contexto o uso da avaliação
neuropsicológica para o clareamento diagnóstico e planejamento de
intervenções é fundamental, uma vez que a aplicação de escalas e
instrumentos psicológicos e neuropsicológicos oferecer informações
importantes principalmente para o diagnóstico e prognóstico (Erthal
et al. 2016).
A avaliação neuropsicológica em crianças com idade pré-escolar
representa um desafio maior, já que existe uma limitação com relação
ao material disponível para testagem e de literatura (Graeff & Vaz,
2008). Além disso, casos de suspeitas de TDAH, nessa faixa etária faz
com que o profissional se depare com a situação modificações
naturais do desenvolvimento para essas habilidades (Graeff & Vaz,
2008; Diamond, 2013).
Desta forma, o presente estudo tem por objetivo descrever a
avaliação neuropsicológica realizada em uma criança em idade pré-
escolar com queixa de desatenção e agitação motora, e associar seus
resultados com os achados na literatura.
Método
Participante
Participou deste estudo uma criança do sexo feminino, com
cinco anos e oito meses de idade, estudante do segundo período do
ensino infantil em uma escola particular do um município de Minas
Gerais.
A participante mostrou problemas para atingir o
desenvolvimento acadêmico esperado, desde o início de sua
escolarização, com dificuldade para iniciar e terminar uma atividade,
pedindo para sair da sala com frequência, e com reações emocionais
como o choro quando solicitado que realizasse uma atividade. Sobre
93
seu desenvolvimento e saúde, nasceu com 38 semanas de gestação,
de parto cesária com 2.900 kg e 49 cm, sem intercorrências. Não
apresentou atrasos no desenvolvimento, sorriu aos dois meses,
sentou aos oito meses, falou primeiras palavras aos dez meses,
atualmente fala sem dificuldades e com fluência. Andou com um ano
e três meses, desfralde com dois anos, faz sua higiene de modo
satisfatório após ir ao banheiro, possuí controle dos esfíncteres,
maneja talheres e consegue vestir-se.
Sobre sua interação social, segundo a responsável, a criança tem
muitos amigos em ambiente escolar, a mãe não soube precisar
quantos, mas disse que é amiga de todos os colegas de sala. Nunca
criou amigo imaginário e a interação familiar é tranquila. A mãe conta
que a filha não tem contato com adultos fora do ambiente familiar e
escolar e que a menor não tem crianças próximas fora do ambiente
escolar.
Instrumentos
A fim de cumprir o objetivo proposto foram utilizados
instrumentos com específicos e relacionados à queixa.
Entrevista Clínica para coleta de informações úteis ao processo
de avaliação. A Escala de Maturidade Mental COLÚMBIA 3 – CMMS 3
(Burgemeister, Blum & Lorge, 2018), que fornece uma medida de
maturidade mental e estima o raciocínio geral de crianças de três a
doze anos. É composta por noventa e quatro itens que são aplicados
de acordo com a faixa ataria a qual pertence o participante, para
realizar a tarefa ele terá que fazer a escolha por uma figura que
responda à questão feita pelo examinador a resposta não é exigida
verbalmente, o menor pode apontar o item. O teste Matrizes
Progressivas Coloridas de Raven (Angelini, Alves, Custódio, Duarte &
Duarte, 1999) tendo como principal objetivo medir o fator g de
inteligência de crianças entre cinco e doze anos de idade. O Teste de
cópia e de reprodução de figuras geométricas complexas (Oliveira e
Rigoni, 2014), utilizado para observar através da cópia e reprodução
mnemônica de uma figura geométrica complexa, a percepção visual,
a memória imediata visual e habilidades visuoconstrutivas. A escala
SNAP-IV, baseada nos sintomas do Transtorno de Déficit de Atenção
e Hiperatividade e no Transtorno Opositor Desafiador (TOD)
descritos no DSM – V. (Mattos, Serra-Pinheiro, Rohde & Pinto, 2006).
94
A escala Teste de Atenção por Cancelamento (Montiel e Seabra, 2012)
que consiste em três tarefas para avaliação da Atenção concentrada:
capacidade da criança em focar na realização de uma tarefa
ignorando estímulos irrelevantes; Atenção dividida: capacidade da
criança dividir seu foco atencional entre duas atividades diferentes e;
Atenção alternada: habilidade de concomitantemente procurar
estímulos diferentes. O Teste Infantil de Nomeação (Seabra, Trevisan
e Capovilla, 2012) avalia a habilidade de nomear verbalmente figuras,
mensurando a linguagem expressiva e acesso à memória de longo
prazo e por fim a Hora do jogo diagnóstica (Aberastury, 1992)
proporcionando a criança o contato com uma caixa de brinquedos, na
qual ela os manipulará de forma livre, a fim de observar como a
mesma irá se expressar.
Procedimentos
Primeiramente foi realizada uma sessão de entrevista inicial com
a responsável, onde a mesma, leu, concordou e assinou o termo de
consentimento livre e esclarecido. Posteriormente foram realizadas
seis sessões com a menor para aplicações de provas clinicas e testes
padronizados, consulta ao relatório escolar, e uma sessão de
devolutiva com a responsável. O processo avaliativo foi
fundamentado com o referencial teórico da psicologia e
neuropsicologia.
Resultados
95
Em casa, a responsável conta que menina é agitada, não
consegue ficar muito tempo fazendo a mesma coisa, ao fazer o dever
de casa mostra dificuldade em identificar e reproduzir letras, colorir
além de distrair-se com facilidades, o que na percepção da mãe,
dificulta seu desempenho. Toda semana precisa que a mãe a auxilie a
completar o caderno, já que muitas atividades propostas em sala de
aula, a filha não consegue finalizar. Sua mãe acrescenta que ela
também apresenta dificuldades em seguir regras, solicita a mãe várias
vezes, mexe com as mãos e com os pés, fala em excesso, discute com
adultos e é facilmente irritável.
Em relatório escolar sua professora relata que suas maiores
dificuldades estão no seguimento de regras, focar atenção na
explicação e conseguir ficar em sala de aula, segundo ela estes
comportamentos têm frequência aumentada, e prejudicam o
aprendizado da menor.
A menor apresentou eficiência intelectual considerada média
para seu perfil etário (Per= 37, Classificação 103), mostrando
desempenho dentro do esperado em atividades realizadas para
raciocínio e conceituação. Em avaliação de maturidade mental seus
resultados indicaram que está dentro do esperado para sua idade
(Per = 32, Escore-Padrão - 93).
96
Tabela 2. Análise qualitativa e quantitativa das funções cognitivas analisadas
na Escala de Maturidade Mental COLÚMBIA 3 CMMS – 3.
Escala Colúmbia 3
Escore Bruto 31
Escore de capacidade 103(4)
Escore padrão 93
Percentil 32
Classificação Média
97
desenho família e construção de bonecos de massinha de modelar,
propostas durante a avaliação, a menor demonstrou suficiente
coordenação motora para manuseio de material gráfico e lúdico. A
partir da análise dos resultados obtidos na SNAP IV de avaliação de
sintomas de hiperatividade/desatenção e sintomas de transtorno
desafiador de oposição preenchida pelos responsáveis e escola, a
menor preencheu critérios para hiperatividade.
Discussão
98
A manifestação clínica do TDAH tende a variar de conforme o
estágio do desenvolvimento. Sendo mais frequentes sintomas
relacionados à hiperatividade/impulsividade em pré-escolares do que
sintomas de desatenção (APA, 2014).
A identificação de déficits funcionais no desenvolvimento das FE
abre o acesso para estimulações adequadas que possam facilitar o
desenvolvimento desta habilidade em uma fase em que o menor
estaria mais propenso a absorver e assimilar essas intervenções.
Conclusão
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102
Capítulo 06
103
interferindo pontualmente no quadro de ordem afetiva como
ansiedade, irritabilidade, inseguranças, acarretando prejuízos no seu
funcionamento acadêmico e social.
Palavra-chave: Avaliação Neuropsicológica, Dificuldade de Aprendizagem,
Transtorno de Aprendizagem Não- Verbal (TANV).
Introdução
104
correspondem a 10% da população em idade escolar e que ao menos
1% destas apresente o TANV (Rourke, 1987).
A saber, Hernadek e Rourke (1994), Pelletier, Ahmad e Rourke
(2001) publicaram uma série de “critérios de avaliação para indivíduos
que apresentam Transtorno de Aprendizagem Não Verbal – TANV”,
com WISC – Wechsler Intelligence scale for Children com QIV> 79.
O TANV (Transtorno de Aprendizagem Não-Verbal) é uma
alteração específica no funcionamento do sistema nervoso,
caracterizada por prejuízos marcantes no raciocínio matemático, na
cognição visuoespacial, coordenação motora, percepção sensorial e
nas habilidades sociais (Columé, & Sans, 2009).
Enquanto (Rourke, 2000) sugere que essas dificuldades sociais
são secundárias à dificuldade do desenvolvimento visuoespacial,
(Forrest, 2007; Semrud & Clikeman, 2007; Pennington, 2008),
defendem que há problemas significativos de percepção, e isso afeta
a capacidade de compreender expressões faciais e entonação de voz
e a intenção do falante.
É sugerido o envolvimento bilateral do cérebro com ambos os
lados das mãos, o que explica a dificuldade na coordenação motora,
porém o desempenho do lado direito é mais afetado que o esquerdo,
de acordo com provas específicas feitas sobre o déficit de
desenvolvimento motor, o que deu origem à outra forma de referir
ao TANV, “Distúrbio de Aprendizagem do Hemisfério Direito”
(Mesulam & Shields, 1991; Semrud & Clikeman, 2008).
As crianças com Transtorno de Aprendizagem Não-Verbal,
podem parecer desajeitadas e descoordenadas, apresentam
dificuldades para aprender a andar de bicicleta, para amarrar os
cadarços dos sapatos e com atividades esportivas. Apresentam
também dificuldades para decorar tabuada, bem como para realizar
operações aritméticas mais complexas, principalmente para dominar
os algoritmos da subtração, multiplicação e divisão de números
maiores do que a dezena. O pensamento é concreto, mas os
indivíduos com TANV não são intuitivos, apresentando muita
dificuldade para aprender com a experiência. A aprendizagem exige
instrução explicita e prática exaustiva (Rourke, 1988).
De acordo com Garcia-Nonell (2006), traçaram o perfil cognitivo
dos TANV’s, descrevendo as habilidades e dificuldades que os
caracterizam. Neste perfil se observam déficits primários que afetam a
105
percepção tátil e visual, as habilidades de coordenação psicomotora e a
destreza para lidar com materiais ou circunstâncias novas.
Consequentemente, surgem dificuldades secundárias (atenção tátil e
visual) e em funções executivas (formação de conceitos, resolução de
problemas, raciocínio abstrato e velocidade de processamento das
informações). O resultado final desta cadeia gera dificuldades em
habilidades acadêmicas específicas e dificuldades em habilidades sociais.
Os autores (Garcia-Nonell, Rigau-Ratera, & Artigas-Palhares,
2006), também destacaram as habilidades preservadas, relacionadas
ao bom desempenho em tarefas que dependem da memória
mecânica e boa estrutura de linguagem, como a fonologia,
morfologia e sintaxe.
Considerando o modelo neuropsicológico em crianças com
TANV, verifica-se a discrepância entre as habilidades verbais (que se
mostram significamente preservadas) e não-verbais (deficitárias),
com déficits de ordem primária, secundária e terciária, que levam as
dificuldades acadêmicas e psicossociais (Moura, Haase, Wajnsztejn, &
Malloy-Diniz, 2010).
As principais manifestações clínicas do TANV, corroboradas por
Moura e Haase (2010), foram relacionadas a:
1. Déficits bilaterais na percepção tátil, predominantemente
acentuados no lado esquerdo do corpo; a percepção tátil simples
pode normalize-se com a idade, mas a interpretação de estímulos
táteis mais complexos permanece alterada;
2. Déficits bilaterais na coordenação psicomotora, geralmente
mais acentuado do lado esquerdo do corpo; habilidades motoras
simples e repetitivas podem normalizar-se com a idade, porém as
mais complexas permanecem alteradas e discrepantes com relação a
norma;
3. Habilidades organizacionais visuoespacial estão
significativamente comprometidas; discriminações visuais simples
podem normalize-se com a idade, porém os déficits tendem a piorar
comparativamente aos pares normativos;
4. Dificuldades importantes para lidar com situações, informações
novas ou complexas. Forte tendência a confiar em estratégias rotineiras,
reações e respostas decoradas, frequentemente inapropriadas para a
situação, idade e humor. Dificuldades para adequar as respostas de
106
acordo com o feedback recebido. Essas tendências persistem ou tendem
a piorar com a idade;
5. Distorções na percepção e orientação temporal;
6. Habilidades verbais decoradas bem desenvolvidas
(vocabulário ou facilidade para decorar);
7. Extrema dificuldade em se adaptar a novas situações mais
complexas; apresenta excesso de confiança em comportamentos
prosaicos, por conseguinte, inadequados, nessas situações;
8. Déficits importantes na mecânica da aritmética e na
compreensão da leitura, comparativamente às habilidades adequadas
de leitura de palavras isoladas;
9. Alta verbosidade rotineira e repetitiva, com limitações
relacionadas ao conteúdo de linguagem, e dificuldades nos aspectos
pragmáticos-comunicacionais.
10. Déficits significativos na percepção, juízo e interação social,
com clara tendência para retraimento e/ou isolamento social, mesmo
com o aumento da idade. Frequentemente estressados em situações
de novidade social, com alta ansiedade, chegando a pânico em
determinadas situações.
Alta probabilidade de desenvolver psicopatologias
internalizantes, como depressão, a partir da pré-adolescência.
É importante considerar que o perfil neuropsicológico dos
TANV’s é muito heterogêneo, podendo até mesmo se manifestar em
níveis diferentes de comprometimento e não necessariamente com a
presença de todas as características, pois o que configure o
transtorno e viabiliza o seu diagnóstico é a discrepância entre as
habilidades verbais e não-verbais, do que apenas a manifestação das
características em si (Tabaquim & Fernandes, 2015; Rourke &
Drumont, 2005).
Sabe-se que a maioria dos transtornos de aprendizagem persiste
ao longo da vida do indivíduo. O diagnóstico diferencial envolve
distinguir o TANV de quadros de deficiência intelectual, TDAH forma
predominantemente desatenta, transtorno afetivo bipolar e
transtorno do espectro autista. A avaliação neuropsicológica deve
compreender os domínios da inteligência, desempenho escolar,
habilidades sensório-motoras, processamento visuoespacial,
aritmética e funcionamento psicossocial (A. C Wajnsztejn & R.
Wajnsztejn, 2017).
107
Esta avaliação tem esta importância, pois se utiliza de
instrumentos de uso exclusive do profissional voltados para a
avaliação das funções executivas, planejamento das intervenções e
progresso de tratamento. Podendo identificar possíveis
comorbidades com outros transtornos ou exclusão do diagnóstico,
investigando outras possibilidades que justifiquem os sintomas
(Effgem, Canal, Missawa & Rossetti, 2017).
Este estudo de caso tem como objetivo realizar um diagnóstico
diferencial, analisando o desempenho cognitivo de uma criança com
TANV, bem como sua associação a dificuldades de aprendizagem,
contribuindo assim com a intervenção e minimizando os impactos em
seu desenvolvimento.
Método
Participante
Neste estudo de caso, foi avaliado uma criança do sexo
feminino, com 9 anos, visando esclarecimentos sobre o
funcionamento cognitivo, tendo em vista um quadro de Transtorno
de Aprendizagem Não –Verbal (TANV).
Responsáveis procuraram pela avaliação neuropsicológica,
devido grau acentuado de ansiedade que a filha vinha enfrentando.
No decorrer da sessão, além da mãe mencionar sobre os impactos no
emocional da filha, comentou também déficits importantes nas
habilidades sociais, raciocínio aritmético, percepção sensorial e na
coordenação motora. Mencionou dificuldades da criança em lidar
com situações novas ou complexas, forte tendência a confiar em
estratégias rotineiras e declínios na percepção e compreensão de
expressão faciais, tom de voz e intenção do interlocutor. Mãe
afirmou que a criança apresenta dificuldades na interpretação de
gestos, expressões faciais, interação no contexto social, como
também se sente incomodada com ambientes barulhentos e quando
alguém conversa num tom de voz mais alto.
Déficits na mecânica da aritmética e na compreensão da leitura,
em comparação com as habilidades adequadas de leitura de palavras
isoladas. Boa capacidade de leitura e escrita, porém dificuldades nas
áreas de raciocínio inferencial e compreensão da escrita,
desencadeando prejuízos significativos no aprendizado da filha.
108
Descreveu também a criança como desajeitada e incoordenada,
alterações psicomotoras marcadas por dificuldades de distinção
entre direita e esquerda, de orientação visuoespacial, problemas de
equilíbrio. Afirmou que a filha apresentou dificuldades em
acompanhar aula de instrumentos musicais, aula funcional e
habilidades em atividades esportivas, principalmente em grupo. Mãe
também afirmou que já havia comentado com o esposo sobre o
comportamento diferenciado da filha e chegou a pensar na
possibilidade da filha se enquadrar na família do Transtorno Espectro
Autista.
Sabe-se que os pais possuem curso superior, sendo genitora
professora concursada e genitor tabelião.
109
Histórico Acadêmico e Queixas na Esfera Cognitiva: ingressou
na escola aos 3 anos de idade no maternal II. A genitora relatou que a
filha não apresentou dificuldades, gostava de ir à escola e
demonstrava autonomia nas tarefas e na organização, no entanto, no
Jardim I iniciaram-se as queixas da escola e demonstrou como
insegurança, principalmente na interação com pares. Em relação as
suas características físicas (sentia-se inferior e diferente frente à sua
altura e peso acima), levando-a muitas vezes a se fechar e isolar de
alguns colegas; inseguranças também com o tom de voz mais firme
da professora, fazendo com que a mãe tivesse que intervir na escola
frente a ansiedade que gerou na criança. A mãe tinha que buscá-la
assim que batesse o sinal para ir embora, sendo a primeira a ser
liberada, devido ao medo e estrema ansiedade em ficar mais tempo
dentro da sala de aula.
No Jardim II, continuou sem quaisquer queixas de aprendizado,
porém os impactos nas habilidades sociais permaneciam,
demonstrando instabilidade emocional. A referida paciente foi
descrita como mais pacata; lenta; preferencias por brincadeiras mais
calmas e principalmente sensibilidade extrema por barulhos
acentuados e entonação de vozes, com dificuldades de percepção e
compreensão de expressão faciais e intenção do locutor.
No 1° e 2° ano do fundamental, suas dificuldades aumentaram
frente as dificuldades na mecânica da aritmética e na compreensão
da leitura, em comparação com as habilidades adequadas de leitura
de palavras isoladas.
Sabe-se que neste período a família mudou-se de cidade, onde a
paciente foi inserida em uma nova escola e principalmente em novo
grupo social, trazendo dificuldades importantes em lidar com
situações, informações novas ou complexas. Apresenta até hoje,
forte tendência a confiar em estratégias rotineiras, reações e
respostas decoradas.
Mãe afirmou que no ano passado no 3° ano, os impactos no
aprendizado acentuaram, principalmente na memorização da
tabuada, cálculo aritmético com raciocínio e localização espacial
(operações), desempenho insuficiente em atividades de escrita. Além
das dificuldades acadêmicas, persistiu também os prejuízos nas
habilidades sociais, demonstrando instabilidade emocional,
dificuldades de aspectos implícitos da interação, dificuldades de se
110
expressar afetivamente e de se adaptar as situações novas, se
apegando a comportamentos estereotipados e já bem estabelecidos.
De acordo com o relato da escola, descreveu que no ano
passado, a criança foi uma aluna disciplinada e possuía bom
comportamento com os professores. Porém era vista como uma
aluna tímida e muito quieta. Durante as aulas apresentou dificuldades
na matéria de matemática, principalmente para entender o
enunciado, sendo necessário a intervenção da professora. Afirmou
que mesmo a aluna apresentando essa pequena dificuldade, no geral
terminou o ano escolar com bom desempenho. Não foi mencionado
nenhum prejuízo relacionado à área atencional.
Instrumentos
Para realização da avaliação forma utilizados o Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtorno Mentais DSM-5
(Artmed,2014); Escala de inteligência Wechsler para crianças WISC-IV
(Wechsler, 2013); Teste de Trilhas (Montiel & Seabra, 2012); Teste
Bateria Psicológica para avaliação da atenção- BPA (Rueda, 2013);
Teste de Funções Executivas Wisconsin - WCST (WCST, 2019); Teste
de Atenção Visual TAVIS-4 (Mattos, 2019); Teste do Cinco Dígitos –
FDT (Sedó, de Paula & Malloy-Diniz- 2015); Teste de Aprendizagem
111
Auditivo-Verbal de Rey RAVLT (Paula & Malloy- Diniz – 2018); Hooper
Visual Organization Test-VOT (Tosello, 2005; Técnicas Figuras
Complexas de Rey (Rey, 1999); Teste de Desempenho Escolar TDE II
(Fonseca & Stein, 2019); Teste Infantil de Nomeação (Seabra &
Capovilha, 2012); Fluência Verbal Semântica e Fonológica (Moura &
Simões,2013); Escalas e exercícios neuropsicológicos para
investigação das funções cognitivas; Escala de Transtornos
Relacionados a Ansiedade Infantil SCARED (Birmaher,1997) e MASC
(Nunes,2004), como também escalas relacionadas a Transtorno de
Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH); (SNAP-IV Associação
Brasileira de Déficit de Atenção- ABDA- (Mattos 2005) e CONNERS
(Keith Conners, 1997).
Procedimentos
Foram realizadas duas entrevistas iniciais de anamnese com os
pais e solicitados exames complementares de Oftalmologia,
Audiometria e Avaliação Neurológica. Os encontros para a avaliação
do paciente ocorreram no período de
De 13/01/20 a 24/02/20 totalizando 9 sessões com duração de 60
minutos a 1hora e meia. O referencial Teórico adotado foi a
Neuropsicologia.
Resultados
112
ansiedade e preocupação em relação as suas respostas,
principalmente nas atividades de habilidades acadêmicas, levando-a a
se negar em dar continuidade na avaliação. Foi necessário
intervenção para controle da ansiedade e da genitora para convencê-
la a realizar o atendimento. Apresentou dificuldades discretas na
compreensão dos exercícios propostos.
Os resultados detalhados da avalição podem ser vistos nas
tabelas abaixo, separados por funções cognitivas:
Construto Inteligência
113
índices de compreensão verbal (subtestes principais vocabulário e
compressão) maior que índice de organização perceptual (subtestes
principais cubos e conceitos figurativos). Diferença entre os índices
de compreensão verbal maior que índice de memória operacional
(subteste principal aritmética).
Diferença significativa entre índice de compreensão verbal maior
que índice de velocidade de processamento (subteste principal
procurar símbolos). E por última memória operacional maior do que
índice de velocidade e processamento (procurar símbolos).
Construto Atenção
114
Tabela 5. Desempenho das etapas do teste TAVIS - 4 (Teste de Atenção
Visual – quarta edição).
Tempo de
Escore Percentil Classificação
Reação
Tarefa 1 0,671 0a<2 Inferior
Tarefa 2 0,972 2a<9 Limítrofe
Tarefa 3 0,805 0a<2 Inferior
115
Tabela 7. Percentil e desempenho das etapas do teste de Funções
Executivas WCST- Wisconsin.
Wisconsin (WCST) Escore Bruto Percentil Classificação
Num. Categorias
6 > 16 Média
Completadas
Ensaios p. completar 1°
13 >16 Média
categoria
Fracasso em manter
0 >16 Média
contexto
Respostas Perseverativas 26 61 Média Sup.
Erros não Perseverativos 6 83 Média Sup.
116
atenção alternada, flexibilidade cognitiva, porém baixa velocidade de
processamento para desempenhar a tarefa de forma satisfatória.
Paciente não executou corretamente a ordem, demonstrando
déficits na habilidade perceptiva, atenção visual, rastreamento
visuomotor e sequenciação.
117
falhas na retenção e recuperação da imagem, desencadeando
prejuízos na organização e no planejamento.
Construto Linguagem
118
do esperado. A capacidade de síntese e de integração de
conhecimentos se mostrou preservada.
As habilidades de raciocínio verbal e formação de conceitos
mensurados pelo índice de compreensão verbal, encontrou-se dentro
da normalidade, comparado com crianças da mesma idade.
No plano da linguagem espontânea a recepção mostrou-se
normal para comandos simples. A expressão da linguagem
espontânea apresentou-se pouco satisfatória. O raciocínio lógico e o
raciocínio abstrato estiveram razoavelmente satisfatórios.
Habilidades Acadêmicas
119
Tabela 17. Escore Z e desempenho do resultado do subteste Cubos do WISC -IV.
WISC-IV Pontos P. Zscore Classificação
Cubos 6 -1,33 Média Inferior
Comportamento e Humor
120
No questionário SNAP- IV (Levantamentos de indicativos de
TDAH), respondido pelos pais, não reconheceu sintomas de
desatenção e hiperatividade de acordo com os critérios do DSM- 5.
Na Escala CONNERS (Versão para Pais), que avalia o
comportamento habitual em casa, resultado demonstrou
características normais e comuns para a idade).
Discussão
Os resultados obtidos neste trabalho, que teve como objetivo a
avaliação das funções cognitivas com Hipótese Diagnóstica de TANV,
possibilitou compreender melhor o quadro apresentado pela
paciente. O perfil sugeriu a preservação de habilidades verbais em
detrimento de problemas com as habilidades não verbais.
Foi possível observar resultados importantes, como: déficits no
desempenho em organização perceptual e velocidade de
processamento em relação a dados ideográficos e nomotéticos.
Estudos deste novo tipo de Distúrbio ou Transtorno de
Aprendizagem, deram início na década de 1970, onde Rourke (1971),
121
enfocou principalmente a discrepância entre os coeficientes de
inteligência verbal e não verbal (execução), controlados
respectivamente pelos hemisférios cerebrais esquerdo e direito. É
importante considerar que o perfil neuropsicológico dos TANVs é
muito heterogênico, podendo até mesmo se manifestar em níveis
diferentes de comprometimento e não necessariamente com a
presença de todas as características, pois o que configura o
transtorno e viabiliza o seu diagnóstico é a discrepância entre
habilidades verbais e não verbais, do que apenas a manifestação das
características em si (Tabaquim, 2015).
As dificuldades supracitadas podem ser justificadas pela
discrepância entre as habilidades verbais (que mostraram
significativamente preservadas) e não verbais (deficitárias), com
déficits de ordem primária, secundária e terciária, que levam a
dificuldades acadêmicas e psicossociais. Os déficits primários
acometem domínios mais da cognição, como o esquema corporal, o
processamento tátil- perceptual e as habilidades inferenciais, como a
capacidade de raciocinar indutivamente. Déficits secundários e
terciários envolvem prejuízos em processos cognitivos mais
genéricos, como a atenção e a memória tátil perceptual, o
comportamento exploratório, a resolução de problemas não verbais,
o raciocínio matemático, o controle emocional, e as funções
prosódicas e pragmáticas da linguagem (Moura e Haase, 2010).
Indo ao encontro dos autores, a paciente apresentou declínios
nas habilidades relacionadas a visuoconstrução, vinculadas as
habilidades mais executivas com diminuição do raciocínio
matemático; com déficits na coordenação motora; percepção
sensorial; competências sociais e com características de ansiedade.
Corroborando com o desempenho cognitivo da paciente no
WISC-IV, obteve classificação média inferior, com resultado mediano
em compreensão verbal. Estudos apontaram critérios de avaliação
para indivíduos que apresentam Transtorno de Aprendizagem Não-
Verbal – TANV, com QIV > 79 (Pelletier; Ahmad e Rourke, 2001).
Segundo Wajnsztejn (2017), o diagnóstico diferencial envolve
distinguir o TANV de quadros de deficiência intelectual, TDHA forma
predominantemente desatenta, transtorno afetivo bipolar e
transtorno do espectro autista. A referida paciente não pontou sinais
para tais hipóteses, no entanto apresentou queixas relacionadas a:
122
timidez; déficits de aprendizagem e comunicação; pensamento
ingênuo; dificuldades de socialização; desajustes e dificuldades
relacionadas ao raciocínio inferencial; a interpretação ao discurso
espontâneo ou direto; a receptividade e a prosódia, e déficits
motores finos.
Para Semrud e Clikeman (2007), o transtorno de aprendizagem
não-verbal (TANV) é atualmente caracterizado por três grandes áreas
de disfunção incluindo habilidades motoras e visuoespaciais,
competências organizacionais e habilidades sociais.
Quanto aos processos visuo-percepto-construtivos foi solicitado
que a paciente realizasse uma cópia de uma figura rica em detalhes,
obteve desempenho inferior, quando foi solicitado a realizar
raciocínio perceptual. Apresentou prejuízos significativos em
consequências de déficits visuoconstrutivos, devidas falhas na
percepção visual, desencadeando prejuízos na organização e no
planejamento. Demonstrou distorções de formas e omissão de
elementos, apontando declínio na percepção visual.
Em atividades de montagem em blocos (Cubos) o desempenho
encontrou-se inferior a normalidade, demonstrou dificuldades em
transpor uma figura bidimensional para tridimensional, impactos na
visuoconstrução.
Alterações psicomotoras também foram marcadas por
dificuldades de distinção entre direita e esquerda, de orientação
visuoespacial, problemas de equilíbrio.
Quanto as habilidades executivas, a paciente apresentou boa
capacidade de planejamento e execução de esquemas para alcançar
metas, demonstrando desempenho mediano na capacidade de
manter o foco, mantendo a linha de raciocínio ao longo da tarefa.
A flexibilidade cognitiva para operar esquemas alternados
esteve dentro do esperado comparados com sua faixa etária, e
quanto a memória de trabalho obteve uma pontuação dentro do
esperado, levando a afirmar que a paciente conseguiu armazenar
temporariamente as informações recebidas e poder manipulá-las por
um período.
Em contrapartida, o funcionamento executivo para essas
crianças em geral tende a ser problemático, pois muitas vezes têm
dificuldade em compreender as situações que envolvam causa-efeito,
123
raciocínio, soluções para os problemas e aprender o novo que é
complexo ou abstrato (Senrud-Clikeman, 2007).
Já Moura e Haase (2010), dizem que dentre as principais
manifestações clínicas do TANV, crianças ou adolescentes
apresentam forte tendência a confiar em estratégias rotineiras,
reações e respostas decoradas, frequentemente inapropriadas para a
situação, idade e humor e dificuldade para adequar a respostas de
acordo com o feedback recebido.
Na cognição social, a paciente apresentou déficits em relação a
comunicação não verbal (interpretação de gestos, expressões faciais,
mensagens implícitas, problemas de percepção e interação no
contexto social, com dificuldades significativas de adaptação a novos
ambientes. Frequentemente estressada em situação de novidade
social, com quadro de ansiedade.
Em concordância com este resultado, há autores que relatam
que além das dificuldades acadêmicas, crianças com TANV também
enfrentam prejuízos nas habilidades sociais, demonstrando
instabilidade emocional, dificuldades na compreensão de aspectos
implícitos da interação, e dificuldade de se expressarem
efetivamente, se apegando a comportamentos estereotipados e já
bem estabelecidos (Rourke, 2005).
Para Wajnsztejn (2017), o impacto psicossocial é complicado
pelas comorbidades com transtornos externalizantes na idade pré-
escolar e transtornos internalizantes a partir da pré-adolescência.
Apresentam risco para o desenvolvimento de perturbação
socioemocional, tendem a desenvolver tendência para retraimento
social e/ou isolamento social, como também transtornos psiquiátricos
como ansiedade e depressão, a partir da pré-adolescência (Moura &
Haase 2010).
A paciente pontuou sinais significativos para transtorno de
ansiedade infantil através dos critérios diagnósticos DSM-5, nas
escalas MASC e SCARED.
Na avaliação da linguagem e competências acadêmicas, a
paciente obteve resultados fracos, com prejuízos significativos nos
construtos que envolvem: prejuízos acadêmicos em leitura, escrita e
aritmética, como nos aspectos pragmáticos da comunicação.
Quanto a linguagem observou-se uma expressão verbal
mecânica, com conteúdo superficial e alterações de prosódia.
124
Problemas na resolução de tarefas não verbais e dificuldades no
entendimento de metáforas. As habilidades verbais automatizadas
estão preservadas.
No plano da linguagem espontânea a recepção mostrou-se normal
para comandos simples. A expressão da linguagem espontânea
apresentou-se pouco satisfatória, demonstrou mais interesse e esforço
nos subtestes que exigiam respostas verbais e conhecimento
cristalizado, e menos interesse nas tarefas com estímulos visuais. O
raciocínio lógico e o raciocínio abstrato estiveram razoavelmente
satisfatórios, justificando as dificuldades nos aspectos pragmáticos da
comunicação que a paciente vem enfrentando desde a infância.
Pacientes com TANVs tendem a apresentar habilidades verbais
decoradas bem desenvolvidas (vocabulário ou facilidade para
decorar); deficiência destacada na mecânica da aritmética e na
compreensão da leitura, em comparação com as habilidades
adequadas de leituras de palavras isoladas; alta verbosidade rotineira
e repetitiva, com limitações relacionadas ao conteúdo da linguagem,
e dificuldades nos aspectos pragmáticos da comunicação (Moura &
Haase, 2010).
Já para Forrest (2004), as funções verbais são caracterizadas por
habilidades primárias mais fundamentais, como a percepção verbal, e as
habilidades secundárias e terciárias, como a memória verbal, o
processamento fonológico, a associação e o volume de output verbal.
Essas habilidades linguísticas preservadas favorecem um
desempenho adequado em tarefas e situações como na leitura de
palavras isoladas, na memorização de palavras, no processo de
alfabetização, mesmo que possa ocorrer um pouco mais tardiamente
comparado aos pares. O mesmo pode ocorrer em determinadas
atividades de aritmética, especialmente aquelas baseadas em
habilidades verbais (Rodrigues, 2015).
Em relação aos resultados dos processos atencionais auditivos e
visuais estiveram dentro da média inferior, as atenções concentrada e
alternada estiveram preservadas, resultados afirmaram que a
paciente conseguiu manter a atenção por certo período de tempo e
apresentou capacidade de manter a vigília.
Apresentou, porém, erros por omissão na atenção dividida,
devido esta atividade apresentar grau de complexidade e habilidades
125
em discriminação visual mediante os diferentes estímulos
apresentados.
Em atividade computadorizada de medida de atenção visual,
evidenciou prejuízos significativos no tempo de reação nas três
tarefas atencionais e erros por omissão nas atenções (seletiva,
alternada e sustentada). Prejuízos leves foram observados na
atenção sustentada por erro de ação, demonstrando ansiedade na
realização do teste.
A paciente apresentou déficit atencional secundário a um prejuízo
na percepção visual, segundo dados de tarefas normativas. Isso significa
que habilidades organizacionais e visuoespaciais podem estar
comprometidas primariamente em crianças com TANV (Borges, 2020).
Na esfera mnéstica, o desempenho nas provas específicas
RAVLT foi média superior, demonstrando capacidade adequada para
memória de aprendizagem. De acordo com Garcia-Nonell [et al]
(2006), o perfil cognitivo dos TANVs, apresentam habilidades
preservadas relacionadas ao bom desempenho em tarefas que
dependem da memória auditiva e verbal.
No processo de reprodução visual a paciente apresentou em
Figuras Complexas de Rey, prejuízos significativos em consequências
de déficits visuoconstrutivos, devidas falhas na percepção visual que
necessariamente trouxe falhas na retenção e recuperação da
imagem, desencadeando prejuízos na organização e no
planejamento. Perfil sugeriu dificuldades em memória visual e tátil,
em consequências aos déficits primários que afetam a percepção tátil
e visual que consequentemente prejudicou a atenção visual.
Conclusão
126
Considerando perfil cognitivo, sugiro apoio de profissionais
especializados que envolvem: o psicólogo escolar, psicopedagogo ou
neuropsicológico para auxiliar no desenvolvimento intelectual,
processamento de informação e função executiva. Professores da
educação especial para assegurar o desempenho acadêmico;
fonoaudiológico para dificuldades semântico- pragmáticas e
terapeuta ocupacional para as dificuldades motoras.
É fundamental que os professores tenham conhecimentos sobre
o transtorno TANV, para que possam auxiliar no processo ensino-
aprendizagem, desenvolvendo técnicas, estratégias e mudanças de
atitude frente a aluna.
O treinamento em autoinstrução verbal a partir da estruturação
verbal de rotinas altamente praticadas é o método mais eficaz de
ensino para os indivíduos com TANV. A aprendizagem exige
instruções explícita e prática exaustiva (Nico & Ianhez, 2000).
Formas diferenciadas de avaliação escolar, pode levar ao
desenvolvimento de estratégias alternativas adequadas, uma vez que
pacientes com TANV parecem aprender mais por repetição do que
por intuição ou indução.
Pode-se recorrer ainda a coordenação escolar para intervenções
nas habilidades sociais e/ou encaminhamento para o psiquiatra
infantil em caso de comorbidades (Transtorno de Ansiedade) que
necessitem de medicação. O estudo do impacto do bullying na vida
de indivíduos que sofrem de transtorno de aprendizagem não verbal
é fundamental, pois esse tipo de sofrimento pode se traduzir em
ansiedade, depressão, fobias, isolamento social e queda de
desempenho escolar.
Ressalto a importância da reavaliação ao longo do tempo para
possíveis mudanças nas funções cognitivas.
Referências
127
Birmaher B, Khetarpal S, Brent D, Cully M, Balach L, Kaufman J, et al.
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130
Capítulo 07
Introdução
131
Phsyquiatric Association (APA), a prevalência do Transtorno é estimada
em 5% de crianças em idade escolar, a maioria do sexo masculino,
tendo uma proporção que varia de 2:1 a 9:1 (APA, 2014).
Alves et al (2017) afirma que apesar de não haver causa
claramente definida, a ocorrência do transtorno pode ser uma
combinação de fatores biológicos, genéticos e ambientais. O
funcionamento neuropsicológico e exames de neuroimagem indicam
comprometimento do funcionamento do córtex pré-frontal e áreas
de tamanho reduzido deste, do cerebelo e núcleos da base em
crianças com diagnóstico de TDAH, relacionando a disposição de
dopamina, noradrenalina, serotonina, glutamina e acetilcolina nestas
regiões, o que reforça o proposto de causa multifatorial (ALVES;
NEME; CARDIA, 2017).
O diagnóstico é clínico, baseado em critérios claros e bem
definidos do Diagnostic and Statistical Manual of Health Disorder
(APA, 2014) e/ou da Classificação Internacional de Doenças (CID-10).
Envolve a persistência dos sintomas de desatenção, hiperatividade
e/ou impulsividade em mais de um contexto e com duração mínima
de seis meses. Estes comportamentos devem ser somados às
alterações no funcionamento cognitivo, como a atenção, memória de
trabalho e funções executivas e não como resultado de Transtornos
de Aprendizagem ou Deficiência intelectual, bem como de
características da personalidade ou consequência exclusiva de
disfunções emocionais/psicológicas. Segundo o DSM-V (APA, 2014), o
TDAH é dividido em três subtipos de apresentação, sendo eles a
apresentação (1) combinada, quando sintomas desatentos e
hiperativos-impulsivos estão presentes nos últimos seis meses, a
apresentação (2) predominantemente desatenta, quando somente
sintomas de desatenção estão presentes nos últimos seis meses e por
fim, a apresentação (3) predominantemente hiperativa/impulsiva,
quando sintomas de hiperatividade-impulsividade estão presentes
nos seis últimos meses e a desatenção ausente.
A manifestação clínica dos sintomas do TDAH pode estar
presente entre os sintomas de outros transtornos, dentre eles, o
Transtorno de Ansiedade. A característica de desatenção é o principal
sintoma compartilhado entre os transtornos. A diferenciação ocorre
em sua causa, no Transtorno de Ansiedade advém de preocupação e
ruminação excessivas, podendo acarretar também agitação. A
132
preocupação excessiva consome energia, tempo, acarreta sintomas
de tensão, cansaço excessivo, dificuldade de concentração e
perturbação no sono, o que faz com que ocorra o prejuízo na
capacidade de realizar de modo satisfatório as atividades, seja na
área acadêmica ou do trabalho (APA, 2014).
A prevalência do Transtorno de Ansiedade Infantil é de 2,7 a 4,6,
maioria no sexo feminino (SANTOS, 2016). O diagnóstico mais comum
dentro do espectro de ansiedade é o de Transtorno de Ansiedade
Generalizada, que se caracteriza por ansiedade e preocupação
persistentes e excessivas acerca de vários domínios, incluindo
desempenho no trabalho e escolar, que o indivíduo encontra
dificuldade em controlar. Além disso, são experimentados sintomas
físicos, incluindo inquietação ou sensação de “nervos à flor da pele”;
fatigabilidade; dificuldade de concentração ou “ter brancos”;
irritabilidade; tensão muscular; e perturbação do sono (APA, 2014).
Em estudo recente, Dreyer e Kohn (2017) apontam para um
aumento significativo da prevalência do Transtorno de Ansiedade,
estimada em torno de 10% devido a modernização da sociedade, que
envolve muitas cobranças e expectativas por parte dos adultos com
relação ao desenvolvimento da criança, gerando sintomas
emocionais e psicológicos dos quais o self terá dificuldade de se
organizar e adaptar.
Diante disso, faz-se necessária a investigação cautelosa dos
sintomas, visando diagnóstico e terapêutica adequados. A avaliação
neuropsicológica tem sido essencial tanto em serviços médicos como
em ambientes de pesquisa clínica para realização de diagnóstico e
tratamento de Transtornos do Neurodesenvolvimento, bem como
diagnósticos diferenciais. A avaliação neuropsicológica investiga as
funções cognitivas através do olhar para o funcionamento singular e
da relação, destas que influenciam diretamente o comportamento do
indivíduo, considerando inclusive o nível sociocultural e
desenvolvimento. No caso de crianças, a avaliação visa verificar a
relação das funções cognitivas e sua influência nas habilidades,
principalmente as escolares, investigando a capacidade intelectiva,
atenção, funções executivas, habilidades específicas como leitura e
escrita, memória, linguagem, habilidades visuoespaciais, sensório-
motoras, comportamento, afetividade e habilidades sociais. Assim,
determina a integridade das funções, explicita déficits neurológicos
133
ou psicológicos e sugere diagnóstico e tratamento adequado
(ARGIMON; LOPES, 2017).
Diante do exposto, o presente estudo objetiva reportar um
estudo de caso de diagnóstico diferencial entre TDAH e Transtorno
de Ansiedade, proporcionando auxílio no diagnóstico assertivo e
encaminhamento para terapêutica adequada.
Método
Participante
Neste estudo de caso, foi avaliada uma criança do sexo
masculino, com nove anos visando esclarecimento sobre o
funcionamento cognitivo, tendo em vista um quadro de compulsão
alimentar, agitação e queixa escolar de desatenção.
O paciente é estudante regular da quarta série do ensino
fundamental, segundo filho, sendo o primogênito falecido, residente
com a mãe e o padrasto, pais divorciados. Mãe relatou que o mesmo
sempre foi nervoso, agitado e por vezes agressivo, que ao completar
dois anos iniciou acompanhamento com a neuropediatria devido
quadro citado e iniciado tratamento.
Mãe relatou nascimento a termo, parto cesárea, sem
intercorrências. Quanto ao desenvolvimento, relatou atraso no
desenvolvimento neuropsicomotor, com maior déficit na linguagem,
apresentando atraso na aquisição da fala, bem como troca de letras e
palavras; no aspecto motor, apresentou atraso na marcha e controle
de esfíncter tardio.
Com relação ao sono, relatou que o paciente tem dificuldade
para iniciar o sono, e a partir de então, dorme profundamente, negou
pesadelos freqüentes, atribui boa qualidade ao sono, exceto quando
adoecido. É resistente a levantar-se, acorda com olheiras e irritado.
No autocuidado, relatou independência modificada, realiza as tarefas
sozinho, desde que receba auxílio de lembretes e supervisão.
Quanto à vida acadêmica, não freqüentou creche, iniciou o
ensino regular aos seis anos, relatou dificuldades em português e
matemática, foi acompanhado por auxiliar pedagógico por um
período, não soube referir com exatidão, negou reprovas. Relatou
que as dificuldades se acentuaram após o falecimento do irmão e que
alguns comportamentos melhoraram após intervenção
134
medicamentosa com Cloridrato de metilfenidato e Topiramato
(ambos atualmente em desuso), porém as queixas de desatenção,
agitação e compulsão alimentar persistiram.
O relatório de sua professora informou defasagem na
aprendizagem, porém, com média satisfatória até o momento,
dificuldade em expor suas idéias com detalhes, utilizar de tom de voz
elevado para chamar a atenção, se distrair com facilidade, porém,
finalizar as atividades com autonomia e por vezes, ainda com
acompanhamento. Ter obtido melhora significativa nas operações e
jogos de raciocínio, ter se apropriado das informações para realização
de novas atividades, evidenciada ao se remeter ao aprendizado da
aula anterior na realização. Informou boa socialização com os demais
alunos, os conflitos serem esporádicos, sendo estes, em sua visão,
inerentes a faixa etária e parte do desenvolvimento social, autonomia
na higiene pessoal, seguir as regras de socialização, atender aos
comandos da professora, desde que dados individualmente.
O paciente está em acompanhamento neurológico há três anos,
realiza terapia fonoaudiológica há quatro anos, psicopedagogia há
quatro anos, terapia ocupacional há três anos e mantém consultas
psiquiátricas para renovação de receita. Realizou psicoterapia durante
quatro anos, recebeu alta do serviço há aproximadamente dois anos.
Possui antecedentes prévios de: Refluxo, Asma, Bronquite,
Sinusite, Gastrite, Obesidade Infantil e hipótese diagnóstica de TDAH
a ser investigada, este sem resposta ao Cloridrato de metilfenidato e
Topiramato, terapia medicamentosa proposta previamente.
Atualmente em uso de Risperidona e Imipramina.
Instrumentos
Inicialmente, foi realizada uma entrevista de anamnese com a
mãe, 42 anos, ensino fundamental incompleto (5ª) e em seguida a
avaliação do paciente, além de contato telefônico com a escola,
divididos em oito sessões.
Primeiramente foi avaliada a capacidade intelectual através da
escala Wechsler de inteligência, WISC IV, desenvolvida por David
Wechsler e revisada em 2003.
Para a avaliação da atenção, foram utilizados o Trail Making Test
(Trilhas), desenvolvido por Partington em (1944) e a Bateria Psicológica
da Atenção, desenvolvida por Fabián Javier Marín Rueda em 2013.
135
Para a avaliação da memória e aprendizagem, função de grande
relevância, foi utilizado o teste Figuras Complexas de Rey, desenvolvido
por André Rey em 1999 e Rey Auditory Verbal Learning Test (RAVLT)
traduzido, adaptado e normatizado por Malloy-Diniz et al (2000).
Para a avaliação das habilidades visuoespaciais/visuoconstrutivas
e planejamento foi utilizado o teste Figuras Complexas de Rey (1999).
As funções executivas, mais especificadamente flexibilidade
cognitiva e controle inibitório foram avaliadas a partir do Five Digit
Test (Teste dos 5 dígitos), desenvolvido por Manuel Sedó (2007) e
revisado e normatizado por Malloy-Diniz et al (2015).
Quanto aos aspectos comportamentais e sintomáticos de TDAH
foi utilizado o questionário para avaliação da presença de sintomas
sugestivos - SNAP-IV, construído a partir dos sintomas do Manual de
Diagnóstico e Estatística - (DSM-V) e traduzido pelo Grupo de Estudos
do Déficit de Atenção da UFRJ e pelo Serviço de Psiquiatria da
Infância e Adolescência da UFRGS (Matos, Serra-Pinheiro, Rohde &
Pinto, 2006).
Para a avaliação das funções afetivas foi utilizada a Escala
Multidimensional de Ansiedade para Crianças (MASC) validada por
Michelle Moreira Nunes, (2004) e o inventário de Depressão Infantil
(CDI) revisada e normatizada por Gouveia (1995), elaborado por
Kovács (1983) para depressão.
Resultados
136
cujo objetivo é medir o raciocínio verbal e a formação de conceitos;
Vocabulário, que avalia o conhecimento de palavras e a formação de
conceitos verbais; compreensão, que mensura o entendimento de
princípios gerais e vivência social; Informação, que mede a capacidade
de adquirir, reter e recuperar conhecimentos factuais e Raciocínio
com palavras, cujo objetivo é verificar o raciocínio verbal.
Manteve o desempenho dentro da média em atividades que
avaliam organização perceptual, que diz respeito aos subtestes:
Cubos, que mensura a habilidade de analisar e sintetizar estímulos
visuais abstratos; Conceitos Figurativos, cujo objetivo é medir o nível
de abstração e habilidade de raciocinar; Raciocínio Matricial, que
avalia a fluidez da inteligência e obtém uma estimativa realista da
habilidade intelectual do modo geral e Completar Figuras, cujo
objetivo é avaliar a percepção visual e a organização.
Apresentou resultado limítrofe em atividades que avaliam
memória operacional, verificado nos subtestes: Dígitos, que mede a
memória auditiva de curto prazo, seqüenciamento, atenção, memória
operacional e concentração; Seqüência de Números e Letras, que
mensura a capacidade de seqüenciamento, agilidade mental,
atenção, memória auditiva de curto prazo, imagens visuais e espaciais
e velocidade de processamento; e Aritmética, que avalia a memória
operacional e habilidade matemática.
Obteve resultado médio inferior em atividades que avaliam
velocidade de processamento, composta pelos subtestes: Código e
Procurando Símbolos, que mensuram a velocidade de processamento
abordando a memória de curto prazo, aprendizado, percepção visual,
coordenação visual e motora, amplitude visual, flexibilidade
conectiva, atenção e motivação; e Cancelamento, cujo objetivo é
medir a atenção visual seletiva, vigilância ou negligencia visual.
Apresentou Quociente de Inteligência (Q.I) total na classificação
médio inferior.
De acordo com os resultados, apresentou maior dificuldade em
habilidades de velocidade de processamento (códigos) e memória
operacional (seqüência de números e letras) e facilidade no que se
trata de organização perceptual (cubos). Pode-se concluir que os
resultados obtidos sugerem padrão cognitivo médio inferior.
137
Tabela 2. Desempenho nos testes avaliadores da Atenção.
Instrumento Pontos Média Percentil Z Classificação
Obtidos Esperada* escore
TrailMakingTest
Atenção 23 <26,8 - 0,42 Média
Sustentada
Atenção 48 <58 - 0,69 Média
Dividida
Bateria
Psicológica de
Atenção
Atenção 45 45,22 50 -0,01 Média
Concentrada
Atenção -18 35,48 20 -2,03 Inferior
Dividida
Atenção 76 44,34 90 1,89 Superior
Alternada
Atenção Geral 139 144,39 50 -0,06 Média
* Pontos esperados por faixa etária.
138
Tabela 3. Desempenho nos testes avaliadores da memória.
Pontos Média Z
Instrumento Percentil Resultado
Obtidos esperada* Escore
Figuras
Complexas de
Rey
Figura A – 16 - 60 - Média
Recuperação
Rey Auditory
Verbal Learning
Test
A1 4 5,69 - -1,14 Média
A2 5 8,43 - -2,0 Inferior
A3 6 10,12 - -1,90 Inferior
A4 8 10 - -0,84 Média
A5 7 10,61 - -1,76 Inferior
B 4 5,06 - -0,67 Média
A6 7 8,92 - -0,69 Média
A7 - - - - Não
realizado
Z soma 30 43,59 - -2,28 Inferior
Reconhecimento - - - - Não
realizado
* Pontos esperados por faixa etária.
139
Pode-se concluir que o resultado evidencia déficit na função
cognitiva da memória, que pode estar relacionada à desatenção, e
não ao sistema de memória em si.
140
Tabela 6. Desempenho nas escalas avaliadoras das Funções Afetivas.
Pontos Média
Instrumento Resultado
Obtidos esperada*
Escala Multidimensional de
Ansiedade infantil – MASC
Sintomas Físicos 30,50 >50 Negativo
Evitar Danos, pais e 77,70 >50 Positivo
professores
Ansiedade Social 62,96 >50 Positivo
Pânico de Separação 63,37 >50 Positivo
Ansiedade Total 53,33 >50 Positivo
Questionário Escolar e
Familiar – TDAH – SNAP
Mãe 4 >6 Negativo
Professora 8 >6 Positivo
* Pontos esperados por faixa etária.
141
Técnicas Projetivas
Discussão
142
em testes que avaliam a atenção dividida, ocorrência de erro por
omissão que indica desatenção e erro por sinalizar estímulo não
correspondente que indica impulsividade. Sendo assim, os resultados
apresentados corroboram o prejuízo apresentado em pacientes
ansiosos no estudo de (DREYER; KOHN, 2017).
Outra função bastante discutida quanto ao diagnóstico
diferencial das duas patologias é a velocidade de processamento, que
segundo Silva e Wagner (2017) tende a ser mais lenta e apresentar
resultados insatisfatórios em pacientes com diagnóstico de TDAH e
estar normalmente preservada ou com resultados superiores ao
esperado no transtorno de ansiedade. Corroborando a esses
achados, os resultados da avaliação neuropsicológica demonstraram
desempenho médio inferior em atividades que envolvem a
velocidade de processamento.
Na avaliação foi possível verificar desempenho inferior nos
testes que avaliam controle inibitório, porém, desempenho
satisfatório em testes que envolvem a função relacionada à
flexibilidade cognitiva, que diz respeito à capacidade de alterar a linha
de raciocínio e emitir respostas diferentes em uma mesma situação,
desempenho limítrofe quanto à memória operacional e desempenho
satisfatório em testes que avaliam planejamento. De acordo com
Silva e Wagner (2017) as funções mais prejudicadas em ambos os
diagnósticos são as que envolvem a relação do controle inibitório,
memória operacional, planejamento e fluência.
Diversos estudos são feitos relacionando o Q.I. de crianças com
TDAH e evidenciam um quociente de inteligência baixo, acarretando
num funcionamento cognitivo global baixo ou inferior e processo de
aprendizado bastante prejudicado (DESIDÉRIO; MIYAZAKI, 2009;
ALVES; NAKANO, 2015; ALVES; NEME; CARDIA, 2017). Quanto ao
Transtorno de Ansiedade, os estudos apontam que não há relação
direta entre o diagnóstico e a classificação inferior de Q.I. Os
resultados desta avaliação apontam um Q.I de 87, classificação Médio
Inferior, indicando padrão cognitivo global médio inferior, com
resultado médio inferior no índice de Velocidade de Processamento e
resultado limítrofe no índice de Memória Operacional.
Na atividade que avaliou a curva de aprendizagem através da
memória verbal, verificou-se ocorrência do benefício da repetição
para aprendizagem, pois, embora de forma lentificada e abaixo do
143
esperado, não houve perda de informação após interferência, sendo
contrário ao encontrado na literatura quando diagnóstico de TDAH.
As tarefas que exigem o registro temporário e o resgate de
informações são comumente associadas e relacionadas ao TDAH.
Estudos de Ramos (2015), Anacleto, Louzada e Pereira (2011) e Abreu
(2007) evidenciam que crianças diagnosticadas com TDAH
apresentam desempenho de memória imediata de conteúdo verbal
inferior aos demais sistemas de memória nos testes
neuropsicológicos, indicando a dificuldade na consolidação de
informações verbais, aprendizagem e na memória operacional.
Quanto ao Transtorno de Ansiedade, em estudo recente, Nunes
(2016) observou alteração da memória. Afirmou em seu estudo que
pacientes com ansiedade moderada, mesmo antes do diagnóstico de
Transtorno de Ansiedade apresentam alta queixa de memória, estas,
podendo estar relacionado às medicações utilizadas, humor,
qualidade do sono dentre outras causas, ocasionando
comprometimento no processo de aquisição ou evocação da
memória. Tal estudo ressalta que o déficit da memória não é tido
como questão central, mas sim, verificado quanto a sua relação com
as funções executivas, influenciadora direta do componente
atencional e aprendizagem.
No questionário escolar e familiar, que identifica sintomas
indicativos de TDAH, a criança apresentou desempenho abaixo da
nota de corte no ambiente familiar e acima no ambiente escolar.
Observou-se que ocorre alteração nos sintomas de desatenção de
acordo com o contexto. O resultado aponta discordância com o
proposto pelo DSM-V (APA, 2014) como critério diagnóstico para
TDAH, que cita ser necessário um padrão persistente de desatenção
e/ou hiperatividade-impulsividade que interfira no funcionamento do
indivíduo e caracterizado pela persistência do sintoma por no mínino
seis meses, sendo necessária a presença dos sintomas em dois ou
mais ambientes.
Na avaliação afetiva, a criança apresentou resultado positivo para
ocorrência de sintomas ansiosos e intensa busca por aprovação em
relação a figuras representativas e ocorrência de sintomas depressivos.
Além de ter apresentado traços de personalidade ansiosa, introversão,
insegurança e dependência na atividade projetiva.
144
Os Transtornos de Ansiedade Infantil envolvem ocorrência de
medo e ansiedade excessivos, ocasionando alterações
comportamentais acerca de vários domínios, principalmente quanto
ao domínio escolar e esportivo. Apresenta duração flexível e mais
curta do que os Transtornos de Ansiedade em adultos, na qual um
dos critérios diagnósticos é a duração mínima de seis meses. A
inquietação, fadiga, irritabilidade, dificuldade de concentração e
perturbação do sono são parte dos sintomas físicos experienciados
por crianças com Transtorno de Ansiedade, sendo suficiente para o
diagnóstico a ocorrência de um dos sintomas, enquanto nos adultos,
é necessária maior variedade dos sintomas citados. As crianças
tendem a ser inseguras, conformistas e perfeccionistas,
demonstrando zelo excessivo em busca de aprovação (APA, 2014).
Pode-se concluir que os resultados sugerem potencial ansioso
quando relacionado a figuras representativas, sintomas depressivos e
presença sintomas sugerem impulsividade no ambiente escolar,
resultados que corroboram com a literatura quanto à manifestação
da ansiedade infantil. A hipótese diagnóstica de Transtorno de Déficit
de Atenção e Hiperatividade não foi confirmada, pois, embora haja
desatenção e déficit no controle inibitório, os resultados não
satisfazem os critérios para diagnóstico de Transtorno de Déficit de
Atenção e Hiperatividade segundo o DSM-V (APA, 2014), sendo assim
indicativos de Transtorno de Ansiedade.
Apesar de comum a ocorrência do Transtorno de Ansiedade na
infância e sua manifestação ser observada facilmente no ambiente
escolar, os Transtornos de Ansiedade infantil encontram-se
subdiagnosticados e subtratados. É importante o olhar atento de pais e
professores para os sintomas apresentados pelas crianças. Santos (2016)
realizou um estudo para investigar a compreensão dos professores e
profissionais que trabalham nas escolas sobre a ansiedade e
comportamentos hiperativos e impulsivos, e apresentou resultado
positivo para conhecimento teórico quanto as temáticas, porém,
quando questionadas sobre o reconhecimento e diferenciação dos
sintomas, somado a prática educacional adequada, demonstrou
resultado negativo, mostrando que apesar de considerarem
teoricamente preparadas, quando colocado em prática o conhecimento
faz-se insatisfatório, demonstrando a necessidade de maiores ações
145
sobre a temática e orientação a pais e professores para que as crianças
possam ser melhor diagnosticadas e recebam terapêutica adequada.
Conclusão
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Sobre as autoras e os autores
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Laiss Bertola. Psicóloga e Neuropsicóloga. Mestre e Doutora pela
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Pós-Doutorado pela
Universidade de São Paulo.
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