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Capitulo 3 INDUSTRIALIZAGAO E FORMAGAO DA CLASSE TRABALHADORA IW|A“DUPLA REVOLUCAO” ENTRE AS décadas de 1780 ¢ 1840 ~ a industraliza- Gri-Bretanha e a agitagio politica na Franca -, classe passou a ser © nome de divisdes sociais. Assim como ““indiistria” ou “democracia”, “classe” pas- ‘uma palavra-chave moderna. Os termos “socialismo”, “classe trabathadora” & ado” apareceram na Gra-Bretanha ¢ na Franga no inicio dos anos 1830-e, nia i, uma deada mais tarde. A terminologia entdo se polarizou em “opertio” & durante o terceiro quartel do século XIX na esteira das revolugdes fracassa- 148, quando o capitalismo iniciou seu primeiro boom mundial’. O aperfeigoa- 1a maquinaria, © vapor come forga mottiz, as fabricas ¢ ferrovias tornaram-se ais os sinais do progresso na Europa, e, como a primeira sociedade a se ializar, « Gri-Bretanha apontava um futuro assustador, ainda que excitante © jo. Ademais, as novas concentragées industriais pressagiavam uma presenga Poigosa na sociedade, problemética e resistente ao controle social ¢ politico. Industria trouxe o “problema social”. Novas formas de regulamentagao se fa- jossirias para Sreas como saide pyiblica, moradia, educagdo, assisténcia aos 5 foorvagio e criminalidade. Pior, a industrializacdo continha uma ameaga poli- Inudstria gerou o surgimento de uma ctasse trabalhadora que nao tinha partici NW nova ordem emergente nem nas suas leis. Para a sociedad cults, a ago ty massas trabalhadoras se tornou uma ansiedade constante e, para enfrentar 4, tragaram-se distingdes entre os trabalhaudores “respeitveis” e 0s outros, forma de pensar, o rabalhador qualificado se desmoralizava num ambiente Invalubro,senido corrompido pela indigéncia criminosa e seduzido para o radi- pelos socialistas e outros agitadores. No entanto, os agitadores, por sua ver, 1 conclusies contrris. Os advogados socialistas do protetariado dotado de nica de classe viam nas comunidades trabalhadoras wind unidade essencial de FORIANDO A DEMOCRACIA, objetivos, sustentada pela légica do crescimento capitalista. Este capitulo, a0 teagarum csbogo da classe trabalhadora que sungia para a hist6ria social, fornece uma estrutura para avaliar essas afirmagies. Como se justificavam as esperangas socialistas’? UM MUNDO NOVO DA INDUSTRIA [A desigualdade er essncil para a industrilizago euopéin anterior a 1914. © capi- talsmo aramente modificava por completo as velhas paisagens, ransformandodrvo- resem chamings e campos em fbricas. ritmo de desenvolvimento era muito varado, tanto entre sociedades como em se interior, zerando combinagées complexas de pro- dlugio avangada, trasadae hibrida em regis coniguas, em ger mutuamente depen- dentes das respectivas formas de especializago. O dinamismo, na verdade, impunha 0 atrasoa ess daltca de dependénca, gerando mereados de tabalho novos e trbulen- tos. mgragdesem massa do campo e uni nova topografa urbana, nas também gerava interigagdes muito mais rics entre indistrae agriculur, ene proxi “moderna” € produgio“radiciona” centre empress grandes e pquenas do gue imaginaram as previsBes mais agressivas Ess desiguldade de indusraizagdo ene pales reid ¢ as varigSes resul- tants nas populasdes oper criarum enormes problemas etatégicos para aesquer- da. Os patidos socialists se apresentavam como partidos da classe trabalhadora que, em rao da industializago,deveriasupostamente estar se ransformand na maioria tesmagadora da sociedade. Ainda assim, po toda parte na Europa, esses partidos en- frentavam populagSes mists, em que miles ainda estavam empregados na agrculi- rae emoutas ocupages“tadicionas”. © operariado no tinha se tomado a esmaga- dora maioria da sociedad, embora uma grande quantidade de proleérios xe eoncen- trassemem determinadoshigares emi om egies nteiras, Mesmo na Gr Bretana, nde a proletarzagao havia avangado mais, 0 pico fot stngido na Primelea Guerra Mundial: depois del, o nimero de trabilhadores mans se reduiu, passando de ts quartos para menos de um tergo da populagio empregads em 1990. Essa fia tendén- cia perl das economias industria, No momento mesmo em que movde-obrachess- ‘a 20 seu maximo, a restrturagdo de longo prazo transferia os empregos para as profissbes de colarnho brancoe otras atvidades em seis ssa fendéneias dsafavam as premissas da esquerda, Se a 1giea da formagio de classes desohedecesse As provides de Mar, quai seriam as conseqUncias para pol tien opera? Se a imagem pics do proletaido 0 tabahador manual nas fabrics fundigdes e minas, no estaleros, doca eferrovias ~ ficava cada vee mais diferente da populaso realmente empregada durante o século Xx, como era enkio a las trabalha dora nos periods pionirs anteriores? Como se poderi defini classe tabalhadora? De acordo com a mas simples das definigdes de Marx, clase trabalhdora era quela que no detnha a propriedade nem o controle dos meios ov condi de pro INDUSTRIALIZAGAO E FORMAGAO DA CLASSE TRABALHADORA | Os trabalhadores eram uma classe de produtores dretos que ~ a0 contro dos meses agricultores ou artesios qualificados ~ nfo tinham mais meios indepen- de subsisténcia, nem mesmo seus préprios instrumentos. Tudo o que tint era dade de trabalho que vendiam ao empregador, um capitalista, em troca do | Para eriar esses operirios, era necessiria a protetarizagdo acelerada. Era neces- oubar a indepencéncia dos pequenos produtores nas cidades e no campo ~ fosse jeultura do camponés livre, no trabalho servil nas grandes propriedades, nas inagées de subsisténcia familiar de agricultura,criagio ¢ indtstria doméstica, no alo rural, fosse nas pequenas oficinas urbanas. A forga de trabalho precisava se de todas as tradicionais restrigdes legais, sociais e culturais, converter-se numa ia livremente negociada no mereado capitalista. Os produtores diretos tinham ‘sepirados dos meios de produgio e forgados ao trabalho dependent. O acesso Jos de subsisténcia $6 seria assegurado pelo sario, num processo de trabalho lado pelo capitalista, © trabalhador tinha de ser duplamente “tibertado”: das Dbrigagbes feudais e de todas as bases da subsisténcia independente ligadas & jd. rx dew a isso o nome de “acumulagao primitiva”. Ela eriow as precondigbes da izagio capitaista na Gri-Bretanha de 1500 a 1800. Os camponeses foram ex- a terrae convertidos em trabalhadores sem terra: ou trabathavam para o fazen- upitalsta ou migravam para as cidades em busea de trabalho. Simultaneamente, as is oficinas dos artesos cafram na manufatura centralizada, contolada financert- pelos mereadores ou concentradafisicamente sob um tinicoteto nas fabrics. Essa 0 do homem do campo de sua subsisténcia também criow novos metcados de 5 estimulando a agricultura comercial ¢ o cresciment da indistria, ‘ansformago do campo deu impeto a industrializagdo capitalista, Se a manufa- Athy H0s capitalistas 0 controle dos meios de produgao por meio das novas rela He propriedade, « mecanizago trouxe 6 controle do processe de trabalho a0 com- 1 suibordinagiio do operirio as suas necessidades tScnicas. Substiuir uma divi- rabalho baseada no trabalho manual por outra baseada em maquinas foi o paso se revoluciondrio do progresso do capital, tomando a produc menos depen- ‘ys habitidades manuais do trabahador ¢ atumentando-a enormemente®. Acele- 00 a concentracio nas fabrieas, pela reorganizagio do local de trabalho ‘eouvocig8o das reservas de milo-de-obra liberada pela perda da propriedade ru- tho possivel desdobrar a I6gica de longo prazo da industrializago capitalis- ‘implacdivel polarizagao da estrutura de classes entre uma minoria de capta- ‘una categoria em expansio de trabalhadores até a proletarizagao continua dos Jntermedidrios, como a dos pequenos proprietérios de terra, artesios € peque- resirios, ea crescente homogeneizago da classe trabalhadora. Na esfera poli- is yerou a base dos movimentos operirios, com 0 erescimento daconsciéncia de 1 Lorno dos interesses coletives dos trabalhandores FORJANDO A DEMOCRACIA Contido, rata como descrgGo univers, eno como esturra conceit e- sada no caso brtinico, esse modelo presenta dois grandes problems. Primero, sm plifica excessivamente o processo, Miquinas e fabvieas foram menos importantes do {que se supunha, A revoluyo industria fo eta em madangas curative, ao fi wm bie-bang. As ecnologias manuais, en80 a mecanizueio, bem como a produgio inten Sivado trabalho no campo disperse em poquenn esata © o a produgdo em massa as cidades, foram a norm. No ineio, capitalism explora fontes mais baraas de mio-de-obra que havia no campo, onde se poi usar as ecnologs mais simples € ‘onde a conribuigao das fanlias ras para a pepria subsiséneia mantinhabaixos os Salis. Talvez no houvese incentivo suficiene para daro salto para as fbicas. E estas nao eram resquicios “pn-indusrts” que deveriam desaparecer com a marcha do progress Em 1914, a indistria inglesa ainda usava mais trabalho manual que o das ‘iguinas, mantendo-se pelo esfrgo isco de seus trabulhadores. proxdugo de ear ‘vo mal chegou a dabrar entre 1875 ¢ 1914, e mesmo assim dobrando a mio-de-obra om avangos de pouca importania nos mets, A india inglesaevitou a meee 22¢80, preferindo usar macigamente a mio-de-obrae refinando o uso de instrumentos Inanusis, © process de trabalho dependia “ds frga, eabiidad, rapide certera ie toque do empregado individual, eno das operagées simultineas ¢reptitivas da mi auina” Dai seguemse vrasconclusdes, im primeiro lugar, como hava diversos cami nos para a industializago, as relagdes de cass entre capitalists e operiros pdiam ssumir diversas formas. Em segundo gir, no se pode identifica ocaptalismo in dstal apenas com fabricase mquinas. Nao s6 persstram velhos padres de raba tho manual e pequenas unidades, como tanibéno capitalism inventou continuamente novas formas de pequenaescal, entre as quaiso trabalho “precarizado” ou caseiro ea rmanofatra qualfcada c especializads. Por fim, sa india simplemente nfo ex pin-a mecaizasio, a reunite wb vécsora ou um mefeado em expansio. tanto mais importante era entfoa mudanga nas relages nos locas de trabalho. Noe apenas uma questio de propriedade ou no dos meios de produgo, mas de todas as formas em que s realizavaotabaho em si "sso levanta um segundo problema da abordagem marssta cisica. Modelos li neaes de industrslizaio so simplificagtes exagcradat da formagio da classe operi- fia, pois implicam um ajuste muito préxim ene o progresso do capitalismo eo cres- cimento da consciencia de classe. A medida que um proletariado crescent se concen trava cadaver mais nos novos entros uranoindustras, 8 maquina eliminavam as Gsingdes entre tips de trabalho eo sistema de slits niformizava as condighes de vida dos tabalhadores, pensiva Mars, a classe opera ria adgurindo conscigncia unificada, Nesse modelo, a exploragao forgaria os trabathadores a solidariedade, « principio defensiva, nos clubes locais ou daquela base industrial, em busca de ajuda ‘mvitua, depois com maior confianga, nos sindicatos nacionalmente organizados, e, por INDUSTRIALIZAGAO F FORMACAO DA CLASSE TRABALHADORA jcamente, num partido revolucionétio, Ao longo de todo o processo, a dial se ¢ de conscigncia de classe estaria ligada as mudangas na base econémica: as governavam o moclo de procugio capitalista tinham efeitos sociais que deter sm 0 surgimento do movimento da classe trabalhadora. Os marxistas expressa- 0 com a famosa frase que distinguia a classe “em si” da classe “para si”, Dessa ra, acreditavam eles, as formas de organizagao coletiva da classe trabalhadora (e i final do socialismo) estavam inscritas nos provessos mesmos de produgao lista. Com a expanso do capital, criavam-se também as condigdes para que a ‘abalhadora se organizasse* {quia para orientar 0 comportamento da classe trabalhadora nas sociedacles ‘ssi andlise sempre foi enganosa. A classe trabalhadora se identifieava muito facil- ‘com a relagdo de sakirio em forma pura: 0 trabalhador auténtico, 0 verdadeiro i, ra © operirio de Fabrica, De acordo com esse argumento, a desigualdade a llizago e seus diversos ambientes certamente eram importantes, mats, em ima 4inda mais importante era a produgdo em massa nas fbricas (€ nas minas, nos de obras, nos sistemas de transporte, nas docas). Daf, os movimentos operirios Jovies seidentificaram facilmente com a “incistria realmente modem”. De acordo visio, as formas de produgio em pequena escala,principalmente a indkstria, ul em pequenas oficinas, ainda que mais duradouras do que Se supunha, ram las eestavam condenadas a desaparecer. A medida que a indstria eresca, mais ean mdquinas e mais concentrada, a formagao de classe tomnava-se mais “avanga- ‘0 movimento operitio, mais “maduro”. O conjunto da classe trabalhadora munca se i 8 relagdo proleréria “pura entre 0 trabalhador sem qualificagio e posses € 0 isla, Sempre haveria formas de predugae auxiar. Nao obstante, os operrios na seriam a vanguarda, ¢ os outros trabalhadores os sepuitiam. histéria provou que essa visto estava errada. Os trabalhadores eran recrutados ios meios diferentes ~ acurnulagio primitiva ¢ expulsio dos eamponeses da ‘unm apenas dois desses meios. Os trabalhtadores foram levados & dependéncia lirios por muitos outros caminhos — agricultura comercial, indistria doméstica, jos urbanos, densa economia de servigos da intra-estrutura urbana, trivializaglo afissbes e do trabalho precarizado, bem com fabric ‘otipica, Por toda a Europa, diferentes regimes de trabalho se misturavam. A i Oriental usava, em suas fazendas comereiais, © peqneno campesinato depen- om como grandes massas de trbalhadores migrantes. As do Vale do P6 usavam J tubatho assalariado como o sistema de meias. A industria doméstica e a peque- rede rural exam por definigio interligadas, Ademais, alguns ambientes pro- Yan mais que outros, Os grandes sistemas agropecuios, a indstria doméstica Je produto industrial implicavam necessariamente a eriagao de profetariades, “9 gyricultura especializada, « agricultura campesina € o artesanato urbano” nem FORIANDO A DEMOCRACIA asses processos variavam muito conforme a regio. Na Saxdnia, bem como em imuitas outras regides, o proletariado era recrutado especialmente no campo entre pes- soas que jd recebiam salirios, e nfio entre pessoas recém-safdas de outras classes. Até 1820, grande parte da indkistria inglesa se desenvolveu assim, inclusive as primeiras indistrias téxteis. Noutros casos, 0 deslocamento social era repentino ¢ agudo, tanto ‘mais drstico quanto mais tardia e répida fosse a industrializago. A enorme expansio das minas de carvio, no final do sSculo XIX, no Rub, na Silésia, no sul do Pafs de Gales ‘eem partes da Franca se valeu, em grande parte, do recrutamento de populagdes rurais, ‘em migragio, como também o fizeram as novas industrias na Itlia © na Réssia, Esses diferentes caminhos para a proletarizagdo tiveram sem diivida enormes implicagoes ‘para as espectiicas sociedades operirias que dai resultariam. GENERO, QUALIFICAGAO E SOCIALISMO Na verdade, a “unidade” da classe trabalhadora era uma projego ideal, uma abstragio 4 partir das histérias de industrializagao no século XIX que se desenvolviam de mosio desordenado e desigual, ¢ cuja concentragio visivel de operirios pobres certamente impressionou os contemporaneos, mas ainda demandaria ago sustentada antes de ca- racterizar um padrao, A partir da d&cada de 1830, novas coortes de intéxpretes, arma- dos com as novas linguagens de “classe”, comecaram a organizar este mundo social Classe” passou a ser ima forma de racionalizar os fats divisGrios da industrializagio — 08 miltiplos regimes de acumulagio do capitalismo, os mercados de trabalho, as .5es do trabalho, as tecnologias de especializaedo, as relagdes no local de trabalho, 60s sistemas de salérios e todas as formas de dividir e unir os trabalhadores. Também deserevia os novos cenérios sociais, tanto os padres emergentes de residéneia e segre- gacdo urbana como as desigualdades que estruturavam as oportunidades de vida dos Giferentes grupos. Quando priticas organizadas também se formaram em tama dessas novas interpretagies, ais como ago governamental, trabalho religioso e de caridade, clubes politicos e, finalmente, partidos socialistas e sindicatos, as linguagens de classe ‘ganharam um peso maior, Desse modo, “classe” oferecia um poderoso arsenal de defi- nies, adaptando experiéntas spares & forma de uma identidade sovialunificada. A medida que os movimentos operérios comegarain a se formar na Franga, na Bélgica, na Alemanha e na Gri-Bretanha, passaram a atrair um tipo particular de ope: ‘érios: trabalhadores qualificados em oficinas pequenas ou médias, fortemente identi ficados com seu oficio, Esses trabalhadores do sexo masculino eram artesaos, com un ‘senso proprietitio da especialidade das regras do oficio, autonomia no trabalho & Listingiio da massa de pobres sem qualificacao. Contudo, essa condigo era ameagacls ‘em muitas frentes — perda de controle sobre os mercados locais: introdugiio de maqui: is € métodos de poupar mo-de-obra; separago empresarial entre mestres edema trabalhadores; produgio em massa a baixo custo fora dos limites dos regulamentos dos INDUSTRIALIZACAO F FORMACAO DA CLASSE TRABALHADORA 8 €centralizago em fabrics. Essas mudangas poderiam langar os mestres con- us trabalhadores, ou langar os dois contra os comerciantes ¢ industriais, Uma vez ‘economias eram afetadas pelas vicissitudes do ciclo de negscios, todos 0s ofc iam a incerteza nos salérios € empregos. Produtores especializados, como os ‘do Norte da Inglaterra com seus teares manuais ou os tecelbes de seda de |, podiam ser fortemente atingidos pelas mudancas técnicas ou organizacionais. Os is de condigio inferior, como sapateiras ¢ alfaates, ficaram por toda parte pres- 35, € logo foram acompanhiados de outros oficos vulneriveis & répida expansio ado, © “artesio” estava se transformando no “operirio” que ainda podia ter qualifieagdo mas que mal eontrolava sua eapacidade de trabalhar. tradicional ndéncia existente nas complexas hierarquias de qualificagao foi substtuida pela enite subordinago numa divisio capitaista do trabalho. ‘Aodefender sua independéncia diante da transformago em proletariado, os artesios nizaram as agitagdes radicais das décadas de 1830 e 1840, ajudaram a eclosio evolugbes de 1848 e deram forma ao socialismo inicial. Essas agitagdes foram mente atraidas para a cooperagdo entre produtores em busca de alternativas 30 lismo, adotando idias de “mutualismo” ou da “eomunidade cooperativa”. Até IM, 0s movimentos de trabalhadores franceses recorreram ao ideal do “socialismo foderagdes de trabalhadores”, que imaginou a propriedade coletiva organizada atra- \leuma federagio democritica de oficios qualificados autogovernados ¢ de comunas Fsse “socialismo de trabalhadores qualificados” se inserevew num “idioma de Jago” mais amplo, propagado em dois impulsos de radicalizagio. Em 1830-34, 0 i9"associag20” foi ampliado de seu significado original de corporagSes de traba- (sociedades de ajuda mitua adaptadas da tradigao corporativa do ancien ) para a idgia de cooperativas de produtores,¢ daf para o projeto socialista de {oeragio maltiproissional de todos s trabahadores”. Entio, em 1848-51, ele se ‘politica revalucionsria de um movimento populas. Esse idioma de associagio sn efletia padres de soctabil “0 masculino inventaram uma esfera pblica baseada néo s6 no oficio nas ligas jd miitua, mas no mundo cultural de sociedades coras e lubes socais e na vida tle oficinas, hospedarias, tavernas e cafés Na primeira sociedad industralizada, a Gri-Bretanka, artestios qualificados do Aijsculino também propuseram a idgia do imeresse geral da classe trabalhadora inirutor de navios John Gast, para os trabalhadores qualifieadas de Londres, 1 Henson, para. que trabalhavam fora, nos distritos manufaturciros do Norte, Doherty, para os fiandeitos (um tipo novo de trabalhador qualificado semi- wal), representaram o elimax do sindicalismo pioneiro em 1829-34°. O radicalis- idade popular, por meio dos quais os trabalhadores lose inseria em movimentos populares amplos que, além da recuperago s0- inOmmica, buscavam em especial uma reforma democritica entre a década de 1810 Ji do Reforma de 1832, as vezes em escala revolucionatia, Depois de derrotas FORIANDO A DEMOCRACIA, amargas em 1832-34, quando a uma reforma parlamentar antidemocritica seguiu-se © policiamento social da Lei dos Pobres de 1834, 0s radicais se reagruparam sob a ban: deira do eartismo, englobando em sua extraordinéria unidade as virias diferengas da classe operiria ~ artesios e novos operitios de fabrica; qualificados, semiqualificados € sem qualificagdo: organizados e desorganizados; homens e mulheres: nativos rigrantes; de diferentes regides, incistrias e credos religiosos Entretanto, a cultura bisica inglesa dos anos 1820 dependiar muito dos artesios do sexo masculino nas “yelhas profissbes manuais especiais e nile revolucionadas”, inva- ‘iavelmente 08 mais abastados “mecénicos”, como eram chamados por seus contempo- ‘neos!". A expansio capitalista forgou os artesdos de Londres, em especial alfaiates, sapateiros, moveleiros e carpinteiros, a uma solidariedade entre profissdes para exigir renovagio dos regulamentos tradicionais e reforma democritica, por meio de litigios, reves e press2o parlamentar com relago a tarifas, salrios, maquindrio e horas de trabalho. Légica semelhante forcou as soviedades de oficios de Birmingham a “redefinir suas relagGes ndo s6 com seus empregadores, mas também com outros oficios que passavam pela mesma experincia de mudangas no local de trabalho". Mas grande massa de operirios assalariados proletarizados ndo se ajustava bem a essa cultura artesanal, Os artesios “aristocratas” tratavam com desatengio, quando nao com des- prezo, 0s empregados no campo, operérios de fabricas ¢ tarefeiros, emigrantes inlande~ ses, 08 sem qualificagio, o% mendigos, biscateiros e vagabundos, levando a conflitos graves. Essas fensGes foram mais bem resolvidas no eartismo, mas os ideais de uma democracia de produtores 86 comecaram a desaparecer gradualmente diante das dou- trinas mais abrangentes do socialismo. Com excegio dos seguidores de Robert Owen, Charles Fourier e de outros socia- listas ut6picos, a democracia dos primeiros movimentos radicais era também uma prer rogativa masculina. Os Seis Pontos do cartismo para a democratizago da Constituigio yslesa em 1837-38 exclaim exprescamente 0 voto para as mutheres!® Es di nnago enfatizava repetidamente o lugar da mulher no tare o ordenamento correto da diferenga sexual. Sem diivida, as mulheres eam ativas no cartismo e em outeas agita- Bes radieais, mas, quando falavam, s6 o faziam no interior da prépria comunidade popular em luta. Acs homens eaba falar ao mundo externo “na primeira pessoa para 0 cconjunto da comunidade”. O discurso pablico em si—inchisive sobre males socioeco- :nbmicos, eampanhas pela liberdades civis, las polo direitoe exigéncias de voto~ era fechado as mulheres" Para os operitiosradieais ~ modestos mestres artesos, rabalhadores domésticos deslocados, artesios e meetnicos, e trabalhadores quaificados das Fabricas, os quis compunham a espinha dorsal do cartismo e de movimentos contempo dade do lar era bésiea para a identidade politica, Fossem qu so de trabalho no no privilégio cidades entre homens ¢ mulheres na divi de autoridade doméstica, e wasculino, Assim, ao lutar INDUSTRIALIZAGAO E FORMACAO DA CLASSE TRABALHADORA 4 indstria capitalista, que minava suas competéncias ¢ colocava suas mulheres {ilhos nas faboricas, os artesfos radicais estavam também defendenlo seu proprio sexual e econdmico no fimbito da familia, “Seu status como pais e chefes de ‘estava indelevelmente associadlo com sua independéncia através do trabalho lo’ eda sua qualifieagio, que Ihes era dada pela identificagao com um oficio.” ulheres nao tinham acesso Aquela independéncia. Eram excluidas da maioria dos ls, 6 podendo praticar uma profiss40 em virtude de parentesco com um homem, jalificagio” da mulher estava no lar, sua “propriedade, na virtude de sua pessoa” Jo, "separada do lar, da familia ¢ das ocupagbes domésticas, ot fora dos lagos do indnio, uma mulher ndo tinha garantia de nenhumta das duas"™". A identidade po- {da mulher estava subordinada a do homem. Os raros defensores do sufragio femi- umbém limitavam seus argumentos as “solteiras ¢ vitivas”, porque mulheres & ‘eram simplesmente considerados um sé". Higsa maneira de pensar se ajustou facilmente a industrializagdo. Exigéncias de slago “protetora” tornaram-se clamorosas durante a década de 1830. Proteger heres criangas contra os efeitos degradantes do trabalho nas nova Fabricas signi- Wa defender uma nogio idealizada de familia e lar, na qual um patriarcado benevo- ‘uma saudével autoridade patemna ondenavam a evonomia do lar por “diferengas ypcidades naturais” de mulheres e homens, Quando mulheres ¢ fihos eram forga- ‘vir para as fabricas em virtude do desemprego ¢ da pena de poder aquisitivo do jp, essa ordem natural se alterava'®. A essa dissolugo dos papéis morais — a ualizagao do homem”, nas palavras de Engels acrescentavam-se os efeitos do ho barato da mulher, cujaatragdo para os capitalistas representava pera de em- 1 de status e de qualificago para os homens!” , Bssa fusio de ansiedades — resis- lh reorganizagao capitaista da indkistria, desejo de preservar 0 regime moral da li ~ motivou poderosamente os trabalhadores qualificados, que tinham uma pos lp barganha bastante forte, Depois de 1850, com a nova prosperidade ¢ a maior ilidade politica da Gri-Bretanha, esses grupos se fortaleceram, O trabalho das mulheres era crucial para esse sistema de distingdies, As mulheres Wortamente uma presenea forte ~ cerca de um tereo dos empregados na Gri lanha, na Alemanha, na Franga e a Itéia por volta de 1914, um quinto na Suécia — 6 apareciam em alpumas indkistras, principalmente téxteis e confecydes. Ao ba- seus ideais de classe trabalhadora nfo s6 nas solidariedades no local de trabalho © o0ppraglo entre profissGes, mas também em nogdes de respeitabitidade fortemente o € que fixavam a mulher em easa, os movimentos demoeriticos do fcaylo da masculinidade que condenavam as heros b dependéncia, Esses modelos positivos de domesticidade da classe operiria gi também una tesposta direta aos ataques da burguesia 2 desordem e a degrada- nora dos pobves. Os radicais da classe opersria responderam com a celebrago de Hop (os ideais de masculinidade responsvel ¢ virtude feminina, Mas essa polt FORIANDO A DEMOCRACIA ca de respeitabilidade militava contra a igualdade de gneros ea panicipagdo ptbiea das mulheres, dficultando outros modelos de mobilizagio efviea que afrmassem os Jitetos femininos. Ao adotareertas estratégias de defesa da comunidade de preferén- cia a outras, os radicais da classe operria deram forma a uma duradoura ideologia de dlomesticidade, limitando aos homens o dieito a uma efetiva cidadiani O resultado foi 0 reerudescimento do privilégio masculino, corporificado nagueles homens qualificados cujo poder de negociagao Ihes permitia sustentar mulher ¢ flhos. Mercados de trabalho sazonaise irregulares significavam, invariavelmente, que 08g nos dos homens teriam de ser suplementados por toda rend que o resto da familia conseguisse levanta, geralmente em trabalhos temporirios, cansatives ou que pues- sem ser Feitos em easa out na economia informal local. Contudo, se as artesdos qualifi- ccados, eapazes de manter a mulher no desemprego domesticado, eram, nesse sentido, ‘uma minoria privilegiada, o sindicalismo inicial era bascado no sistema de exclusio da ‘mulher, ¢ 0 novo ideal de um “salério familiar” era um des principals mecanismos que separavam dos denis essa pequens elite de artes sindicalizados. Ndo 56 ele forta- Jeceu as vantagens materiais daquela elite, mas também marginalizou normativamente ‘© emprego feminino como algo excepcional e indesejivel,limitando-o seas mal pagas, sem qualificagdo e amide ocultas do trabalho assalariado'. Portanto, também sob esse aspecto, a classe trahalhadora era uma formasio social complexa. Apesar de baseada nas estruturas Soci eomuns produzidas pela instr ‘capitalita e pela urbanizago, como identidade social ela se estruturava em torno de

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