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3 IMOBILIDADE RELATIVA E FRAGMENTAGAO DA METROPOLE. Os TRANSPORTES A PROBLEMATICA DOS TRANSPORTES m 1985, o sistema metropolitano de transporte piblico trans- portava diariamente quase 3,5 milhdes de passageiros na Grande Sao Paulo. Desse total, 79,3% cabiam aos dnibus, 12,1% ao metré € 8,6% aos trens. Como As VIAGENS SAO FEITASs. Considerando-se 0 nimero de viagens didrias, eram, em 1983, 20 milhdes, sendo que 12,5 milhdes eram feitas em veiculos coletivos ¢ 7,5 milhdes em carros individuais. Cabiam, pois, 37,5% a estes tiltimos ¢ 62,5% aos meios coletivos de transporte (10,39 milhdes aos dnibus, 1,26 milhao ao metré e 0,85 milhao aos trens). O metré de Sao Paulo era um dos que menos transportava passagei- Fos, tanto em numeros absolutos como em relagdo a populagdo, Veja se 05 ntimeros de pessoas transportadas em 1979 (em milhdes): 21040¥1aW VG OYSVLNAWOVUS F VALLVIEY AGVaLIIBONT 84 + METROPOLE CORPORATIVA FRAGMENTADA ae 197,7 México 660,0 Londres 5460 a 1050,1 an 1533,0 Montrea 14,6 Sao Francisco 32,9 Nova York 1040,0 Moscou 2 083.4 Fonte: Anuario Estatistico do Estado de Sao Paulo, 1981. im fins de 1988, eram ja cerca de 2 milhGes de passageitos didrios, distribuidos, quase equitativamente, entre a linha Norte-Sul, inau- gurada em 1974 e com 24 km de extenso (um milhao por dia), ea Leste-Oeste, iniciada em 1979 e que conduz mais de 900 mil pessoas nos seus 17 km. Dois fatos, desde logo, sobrelevam: em primeiro lugar, 0 transporte coletivo sobre pneus interessa 4 maioria dos usuarios de transportes piblicos. Em segundo lugar, a importancia do transporte individual € consideravel. O niimero de pessoas que se locomove a pé é muito grande. Em 1977, os pedestres (5,2 milhdes de deslocamentos didrios) formavam 24,9% do total de viagens, indice proximo aquele dos que utilizavam automéveis (26,1%). Em 1987, sao 9,5 milhdes as viagens a pé. Em 1985, 40,5% das pessoas, residindo em cortigos, se locomovem a pe gastando menos de 25 minutos entre a moradia e o trabalho'. Em 1975, parte das viagens feitas em 6nibus na Grande Sao Paulo ae fon do tral das viagens por meio coletvos de tanspo" relativo de viagens onank af Para 0 metrd. No entanto, 0 numero $9.1 a831% denny éni ns diminui entre 1977 e 1983, pasando de a em avor do metrd, que representava 5,6% da »€10,1%, em 1983, Em 1985, 0 metro ja aleangav® um indice respeitavel, a espeitavel, aliado ao fato de que 0s trens, que transportavam 117,7 milhées de pessoas em 1982, aumentam, depois, sua participa- gio. E um fato novo, sem dtivida relevante, mas a preferéncia (forcada) pelos dnibus é ainda notavel. Reparti¢Ao Monat (%) Regides Total de viagens metropolitanas por dia trnilber) Onibus Automéveis Taxi Outros Sao Paulo 18,5 56,0 32,0 see Rio de Janeiro 12,2 68,0 21,0 3,0 8,0 Recife 2.2 65,1 31,9 30 Belo Horizonte 3.0 69,8 25,2 30 2,0 Porto Alegre 28 68,1 275 24 2,0 Salvador 21 68,3 27,8 3,9 tiga — Fortaleza 13 65,8 26,0 0s 2) Curitiba 1,6 68,0 26,0 30 3,0 Belém 09 $7.0 29,2 98 40 Fonte: EBTU e Geipot, dados referentes a 1980. Em J. C. Mello, 1984, p. 30. PASSAGEIROS TRANSPORTADOS PELO SISTEMA METROPOLITANO DE TRANSPORTE PUBLICO (1985) Meios de transporte Niimeros absolutos % Metd 415 840 662 12,1 Trens metropolitanos 294 $15 978 86 Onibus urbanos (municipio de Sao Paulo) 1.954 696 932 57,0 Onibus urbanos (demais municipios) 300 000 000 8,7 Onibus suburbanos 464 607 477 13,5 _ Total 3.429 661 049 100,0 _ z z z Bs z Para o municipio de Sao Paulo, a distribuicdo modal, em 1983, era a seguinte: (%) : “Mes CB : ‘Trens 4,78 8 Onibus 50,72 = __Taxi-lotagio 2,30 . sg _ ‘%) Automével particular 32,30 Outras modalidades 1,08 Fonte: Secretaria Municipal de Transportes, 1985 (Shopping News, 31.5.1987). DEPENDENCIA DOS TRANSPORTES CoLETivos Somente para termos uma ideia do que & a dependéncia da popy. lagao trabalhadora em relacao aos transportes coletivos, podemos nes valer de um estudo muito esclarecedor, a pesquisa origem e destin, empreendida em fins dos anos de 1970. Por ai se vé como a cidade capitalista, gracas a respectiva distribuico dos usos do solo, com a localizagao anarquica das atividades e das residéncias, agrava a proble- matica das populagdes mais pobres. Essas cifras, embora limitadas agui ao setor fabril, indicam como s4o numerosos 0s movimentos didrios de pessoas na aglomeracio, ligados ao trabalho. Para um total de 1236814 empregos industriais na Regiio Metropolitana de a0 Paulo, 503 041 pessoas apenas trabalham e mo- ram nos mesmos setores. Vém de outros setores trabalhar 773773. E 740 880 pessoas moram nos respectivos setores, mas trabalham fora. Z Tomando o setor A, que corresponde grosso modo ao municipio de 2 Sao Paulo, para um total de 858088 empregos industriais, somente = 304761 operarios trabalham e moram nos mesmos setores, enquanto £ 553327 vém de outros setores trabalhar ¢ 553471 trabalham fora do © seu setor de residéncia, Se tomamos o setor B, que retine os municipios S de Guarulhos e Aruja, os empregos industriais Sao 32278 Z pessoas as que vivem e trabalham nesses dois municipios. Enquan'® © isso, 20977 operarios vém de outros setores trabalhar nesses 48 | 2 municipios da Regio Metropolitana de Sao Paulo e 12.404 al mora 2 mas trabalham fora (Pesquisa Origem e Destino, Emplasa, 1977). = Guarulhos, a mao de obra ocupada nas indiistrias locais vinh poe ‘ 60%, do municipio de Sao Paulo, e igual percentagem da mao de obra & industrial ali residente trabalha em Sao Paulo. a Acchamada Zona Leste 2, formada por Guaianases, Itaquera ¢ So Miguel Paulista, abrigava, em 1974, uma forga de trabalho de 236 710 pessoas, mas nessa area havia apenas 77 664 empregos. A LocoMogAo bos Posres Quanto mais pobre 0 individuo, mais dependente ele é dos trans- portes coletivos. Um estudo de Ian Thomson (1986, p. 65, tabela 4) permite-nos apreender 0 que se passa em Sao Paulo, onde a relagao é inequivoca entre nivel de renda e meios de transporte. InpICADORES DE RENDA FAMILIAR DOS UsuARios Dos DiFERENTES MEIOS DE TRANSPORTE EM SAO PAULO. Renda familiar mensal Meios de transporte aproximada em 1977 (em CrS) Onibus exclusivamente 7750 Automével exclusivamente 14 000 Taxi exclusivamente 12.750 Metré exclusivamente 12 500 Trem exclusivamente 5.500 Onibus/Onibus* 7000 Onibus/Metro* 8750 Onibus/Trem* 7.000 * Trata-se de viagens com transbordo entre os meios de transporte indicados. De acordo com estudos de inicios de 1985, da Secretaria de Trans- portes do Municipio de Sao Paulo, quase metade (49,2%) dos usua- rios de énibus rém renda entre um e trés salarios minimos (Folha de S.Paulo, 5.5.1985). Da forca de trabalho residente na Zona Leste 2, 92,4% tinham renda inferior a cinco salarios minimos, indice a comparar com os 75% do municipio de Sao Paulo tomado como um todo, O tercidtio era a principal atividade, interessando a 53,6% da populagio economica- mente ativa morando ali, enquanto 42,9% tinham empregos industriais, 41049 ¥LAW VO OYSVINAWOVS J VALLVIAN IaVarIGONL + Saiuoasnvus so 48 METROPOLE CORPORATIVA FRAGMENTADA 88+ cio civil, Na Zona Leste como um todo, 77.4% da 5%, na constru aa . ce ativa ganha até trés salirios minimos, micamente das inferiores da sociedade urbana esto suborg). locomogao frequentemente precarios e pelos quais nadas a meios de I devem pagar uma parcela cada vez maior dos seus ganhos. Essa vocagio é agravada por dois fatores concomitantes: a expansao territorial dg cidade e a diversificagao do consumo das familias. A participagao dos transportes nas despesas familiares sobe, em média, de 2,9%, em 1958, para 11,5%, em 1970 (Dieese, 1974). Os gastos em transporte pesam mals, de ano a ano, nos gastos familiares, Um estudo da Fipe (Pesquisa de Orgamentos Familiares, Sao Paulo, 1971-1972 € 1981-1982) mostra essa evolugao para diferentes estratos de renda, computados em saldrios minimos. populagao econo’ Assim, as cam: De0a2 4.2 77 De2a6 64 11,5 De6a12 10,0 18,6 De 12 a 33 12,3 19,8 Compravam-se em Sao Paulo 400 passagens de énibus com um saldrio minimo, em janeiro de 1986, e apenas 207, em junho de 1988 (Marcos Mendonga, 1988). ASCENSAO E PREDOM{NIO DO TRANSPORTE INDIVIDUAL O desenvolvimento econédmico do pais é acompanhado pelo incre- aa no uso do automével particular como meio de transporte urbano. Isso € particularmente visivel na cidade e na Regio Metropolitana de Sado Paulo, onde sao sensiveis as mudangas observadas nos modos de viagem, durante o “milagre econdmico”, Segundo dados da Compa hia do Metro, esta foi a evolugao no uso de carros particulares, taxis € Onibus entre 1968 e 1975: Taxi Onibus 8,28 60,06 11,58 46,70 1968 1975 A parte relativa aos transportes individuais pula de cerca de 37 para 50% entre 1968 e 1975, enquanto cai a parcela correspondente aos Gnibus. O transporte em automdveis cresce de 10,7% ao ano entre 1967 e 19777. Enquanto o nimero de viagens em carros particulares quase triplica entre 1967 e 1977, passando de 1,9 milhao para 5,4 milhées didrios, os ntimeros correspondentes as viagens em dnibus nao chegam a dobrar, evoluindo de 4,4 milhdes de viagens por dia para 8,4 milhées. Entre 1977 e 1983, a tendéncia conhece uma ligeira inversao. Isso, porém, é conjuntural, gracas a crise econémica, pois a importancia do transporte por meios individuais é ainda muito consideravel, perma- necendo elevada. 1968 19771983 Transporte coletivo —-63,9% — 60,6% — 62,5% Transporte individual 36,1% 39,4% — 37,5% A situagao é flagrantemente diversa nos paises desenvolvidos. Veja- mos alguns exemplos. Em Toquio, 48% das pessoas circulavam por estradas de ferro, 14% de metr6, 11% em dnibus e 17% por meios individuais € taxi (Maurice Moreau, 1976). Em Nova York, apenas 704 mil viagens num total de 3103000, faziam-se em automéveis. No Distrito Central de Nova York, a parte que cabia aos carros individuais era ainda menor: 111 mil num total de 1564000 viagens. Em Londres, apenas 35,5% das 5400000 viagens ligadas ao trabalho se faziam em automédveis particulares, enquanto 64,5% se faziam por meios coletivos, sendo que por dnibus contavam-se 38,5% e pelas estradas de ferro ¢ metrd 26%. Esses percentuais mudavam para 62,31 7% se se contavam os 5 800 000 deslocamentos por motivos diferentes do trabalho (J, Beau- a1040¥LaW Va OYSVLNAWOVMd a VALLVIAY 6g + satuousnvus so | ee ee ee ee jeu-Garnier, 1973, p. 669). Niimeros do Banco Mundial para divers : as cidades inglesas também mostram o predominio do transporte pi, ico como meio de deslocamento: Cidades (%, Birmingham 68 Liverpool 74 Londres 84 Manchester 73 Newcastle 71 Fonte: IBRD, Working Paper 162, Automobiles and Cities, p. $5, Em Paris, em cada dez deslocamentos entre o domicilio ¢ 0 trabalho ouentre o domicilio e a escola, cinco sao feitos pelo metré ou em énibus (53% para essas duas modalidades em conjunto), trés a pé (23%) ou em veiculos com duas rodas (5%), € os outros dois sao realizados em automoveis (19%) (Jean-Baptiste Vaquin, 1987). Uma comparacao, tomando por base o ano de 1966 para Ca- racas e uma média das principais cidades norte-americanas, mostra que entre sete e oito horas da manha na capital da Venezuela, 62% dos movimentos para o centro eram feitos em automéveis privados, enquanto, nos Estados Unidos, 71% dessas viagens eram feitas em veiculos coletivos. A tendéncia a ascensao do transporte individual nos paises subdesen- volvidos é mais forte em certas aglomeracGes que em outras, mas sempre se dé acompanhada da degradacdo da qualidade do transporte publico. No caso de Sao Paulo, ¢ limitando-nos ao periodo do “milagre econd- mico”, enquanto a demanda por transporte em énibus cresce 75% entre 1968 e 1974, o numero desses veiculos aumenta apenas 12% (Movimento, 14.6.1976). Em 1976, os cerca de 900 mil carros trafegando na cidade de Si0 Paulo transportavam uma média de 2,3 pessoas por dia (um total de 2 milhdes, aproximadamente), enquanto os 1080 énibus da Com- panhia Municipal de Transportes Coletivos conduziam uns 600 mil METROPOLE CORPORATIVA FRAGMENTADA go passageiros (Movimento, 14.6.1987). Porém, como a cidade é também servida por empresas particulares, a interpretagao dada pela Emplasa aos dados obtidos com a mencionada pesquisa origem e destino indica que os 6nibus em circulagao, cerca de 50 mil, representando um décimo do total de automéveis em circulagao, transportam mais passageiros que todos os veiculos particulares reunidos. Enquanto cada Gnibus, em média, transporta quarenta passagei- ros, cada veiculo particular leva apenas 1,56 pessoa. Liicio Kowarick (1980, p. 35) fala, porém, de uma média de 1,2 pessoa por veiculo, em carros privados. Se tomamos a Regiao Metropolitana de Sao Paulo entre 1970 € 1980, o ntimero de carros passa de 573 010 para 2 123 854. Havia 69,83 carros por mil habitantes em 1970. J em 1980, sao 142,36. Em outras palavras, o nimero de habitantes por auto diminuiu de 14,4 para 7,0 no mesmo decénio. Aumentou 0 ntimero de carros, em termos absolutos, diminuiu a relacdo entre o ntimero de habitantes e o numero de automéveis, o que contribuiu para agravar duplamente a carga do trafego indi Um automével ocupa um espago 150 vezes maior que um “homem idual sobre as vias urbanas existentes. confortavelmente de pé”, € um carro estacionado, 1500 vezes. Uma pessoa andando ocupa uma area cinquenta vezes menor que a de um automével em movimento (F. W. Boal, 1970, p. 79). Num estudo feito por Josef Barat para o Ipea, em 1975, vemos que, nos principais eixos de circulagao do Rio de Janeiro, a ocupagao pelos automéveis corres- pondia a 56% da superficie das vias, ficando para os taxis e 6nibus 35 © 9%, respectivamente, enquanto os primeiros transportavam 1,7 passageiro, em média, os taxis 1,1 e os 6nibus 29,8. A pressao dos automéveis sobre o sistema vidrio é bem maior que a dos énibus. O percentual do espaco viario principal consumido pe- los énibus pouco mais que duplica entre 1960 e 1970, enquanto que 0 indice de consumo pelos automéveis mais que triplica (Josef Barat, Ipea, Rio de Janeiro, 1975). “O automével é 0 maior consumidor de espaco publico e pessoal j4 criado pelo homem. Em Los Angeles, a cidade do automével por exceléncia, Barbara Ward descobriu que 60 a1040NLAW Va OYSVLNAWOVYA a VAILV IAN BavarT + salwoasnvus so 7 2.70% do espaco € dedicado aos carros (ruas, estacionamentos ¢ expressas) (Edward T, Hall, 1977, p. 15). Um estudo de Marshall F, Reed (1973) mostra 0 custo diferencial vias de alguns meios de transporte: ae —— Custos priblicos e privados — Centavos de délar pop (délares) passageirosimilha ‘arro € motorista 2,64 26,4 Trinsito ferrovidrio rapido 2,46 246 Onibus convencional 0,86 8,6 Carro com 2 ocupantes 1,32 13,2 arro com 3 ocupantes 0,88 8,8 Carro com 4 ocupantes 0,66 66 Enquanto os automéveis queimavam cerca de 30% do consumo brasileiro de gasolina em 1979, 0s énibus consumiam 6% do consumo nacional de dleo diesel. Entretanto, as viagens em automéveis eram 30% do total e as em dnibus representavam 60% do total. Quanto aos trens e metrés, com 5% das viagens, eram responsveis pelo dispéndio de 1% da energia elétrica produzida no pais. Em 1980, somente os automéveis que circulavam nas cidades fo- A ram responsaveis por 48% de todo 0 consumo nacional de gasolina, segundo o presidente do Geipot (Empresa Brasileira de Planejamento dos Transportes) durante 0 Congresso da Associagio Nacional de Transportes Pablicos (Diario de Pernambuco, 9.4.1981). Para cada passageiro, foram consumidos 0,96 litro de gasolina, enquanto no 6nibus 0 consumo por passageiro era de 0,06 litro, dezesseis vezes ORATIVA FRAGMENTA menos que 0 automével, considerando-se que cada 6nibus transporta quarenta passageiros em média. Esses dados revelam o peso da difusio do transporte individual sobre os recursos publicos, na medida em que os automéveis fazem pressao sobre o sistema viario, exigindo mais vias, e consomem mais combustivel que os Gnibus ou trens e metros, Isso resulta em maior + contribuigao da populacgdo como um todo para que uma parcela de % _ privilegiados possa circular: o combustivel € subsidiado (gasolina € EE Se ye een depois dlcool) pelos cofres piiblicos, por meio dos impostos. Em 1977, havia na Regiao Metropolitana de Sao Paulo 1382000 familias pos- suindo autos, mas 291 mil possuiam dois, enquanto as familias sem automdvel eram 1 352.000. Isso se da ao mesmo tempo em que, “com a entrada em cena do automével, muitos investimentos na infraestrutura | yidria urbana passaram a ter um carater acentuadamente regressivo, beneficiando um mimero reduzido de proprietérios de veiculos e agra- yando a limitacao de recursos locais para aplicagées alternativas em transporte puiblico” (J. Barat e M. $. Nogueira Batista, 1978, p. 173). Limitando-nos ao periodo de 1960-1978, é a seguinte a progressao 1978 __ 1200000 do niimero de automéveis em Sao Paulo: 2a] "1960 120000 e 1975 978000 5 Isso significa que o mimero de carros decuplicou, enquanto a po- pulacdo apenas dobrou. Os anos de 1970 merecem ser mencionados em primeiro lugar, por- que é nesse decénio que se afirma o fendmeno da metrépole corporativa. Entre 1950 ¢ 1960, o ntimero de automéveis na Grande Sao Paulo au- menta em 25%, pasando de 96 mil para 120660, com um acréscimo de quase 25 mil unidades. No decénio seguinte, o acréscimo é de 372 mil, um crescimento de 300%, pois o seu mimero sobe de 120660, em 1960, para 492 mil em 1970 (Alberto de Oliveira Filho, 1975). No entanto, a frota de veiculos na Grande Sa Paulo nao para de crescer. Ela aumenta de 55,6%, entre 1976 e 1985, passando de 1719506 para 2676 229, um acréscimo de 956723, ou seja, mais de 100 mil veiculos, em média, a cada ano. Em outras palavras, entre 4104944 aN Va OYSVLNAW 1970 € 1985, 0 nuimero de carros é multiplicado por mais de cinco vezes. O que isso representa em termos de investimento publico tem = de ser considerado quando se avalia o papel do modelo automovel no desenvolvimento da metropole’, FRA METROPOLE CORPORATIV. 94 IMOBILIDADE RELATIVA E FRAGMENTAGAO Da My - ETRO, Pou Segundo assinala Josef Barat (1979), “a fixagao de PoPulacio ny ou ampli Seia por fator, considerad prioritarias, Isso se traduz na perda de qualidade de vida de. lagdes, porquanto seu transporte para os locais de trabalho ¢ operado em condigées precérias” (Josef Barat, Os Tran, periferia nao tem sido acompanhada pel a implantagao de um sistema de transportes coletivos adequado, Gao 65 de ‘aS mais escassez de recursos, ou pela existéncia de obras s tS Pony. € onerosg Portes e.g io) documents apresentado ao semindrio “O Crescimento Urbano do Grande Re PUG, Rio de Janeiro, 1979). De um modo geral, quanto mais longe é a moradia, tanto mais em po € gasto em transporte, contabilizados o percurso dentro do veicule € 0 que é feito a pé para alcanca-lo. A tendéncia, alids, é a0 aumento do tempo gasto em viagem. Em seu artigo “Nordeste, Capital Sia Paulo”, publicado em Contraponto, ano II, 1977, n. 2, veja-se como Ana Valderez Amorim Batista descreve a situacao: Planejamento da Regiao Metropolitana do Rio de Janeiro, O distanciamento entre 0 trabalho e a residéncia tem aumentado a tal ponto que, nos tiltimos seis anos, elevou-se em 30% 0 tempo médio do deslocameat. Em 1974, havia na regiao 13,9 milhdes de deslocamentos dirios, realizados, em geral, pelos 7 mil 6nibus que carregam, nos momentos de rush, o dobro da lotagio maxima prevista [...], os trens suburbanos [...] 900 mil passageiros por dia [ | cerca de 700 passageiros por viagem, quando nao poderia ultrapassar 0 mime? de 300. [...] a perda de trés a quatro horas diarias dentro dos transportes coletves pressupde um “prolongamento” da jornada de trabalho (além dos muros da fabrical gaste fisico € ment pois reduz o tempo livre do trabalhador e aumenta o seu desgaste fis s horas horas das de . édia de tre Os moradores da Zona Leste despendem uma média de 5 = tec € 55 minutos diarios quando viajam de trem e cerca de qu " A orna guando utilizam conjuntamente o dnibus ¢ 0 trem. As 1OrBN as e dez minute trabalho mais elevadas podem tomar doze horas ¢ dez usd nutos para quel que circulam de trem e treze horas e cinquenta mit 0 trem e 0 énibus, Quanto menor a renda, de um modo geral, maior é 0 tempo gasto para se fazer transportar do domicilio ao trabalho. Entre os que ne- cessitam de apenas vinte minutos para o seu deslocamento esto 61% dos que circulam de automével, 56,6% dos que usam taxi e apenas 15,5% dos que tomam 6nibus. Para os que se utilizam de trem e metré, os percentuais so, respectivamente, de 1,2% e 6,6%. Ao contrario, os que precisam de mais de uma hora para se deslocar so 7,3% dos usuarios de automéveis, 7,9% dos que circulam de taxi, 81,6% dos que tomam 0 trem, 49,5% dos que usam 0 metré ¢ 39,7% dos usua- rios de 6nibus. A maior mobilidade é obtida pelos que andam de bicicleta ou motocicleta, em automéveis privados ou taxis. 42,1% das viagens em bicicleta e 35,9% daquelas em motocicleta se faziam em menos de dez minutos, enquanto eram 30,7% as realizadas no mesmo tempo em automéveis e 16,8% as em taxi. 35,7% das viagens em taxi tomavam quinze minutos. Quanto as viagens em 6nibus, 39,1% levavam até 35 minutos, 33,1% das viagens em metré levavam até 40 minutos e 30,5% das viagens em trem consumiam até uma hora. Percentuais proximos a 40% das viagens representavam assim quantidades de tempo extremas, segundo o meio de transporte utilizado. Tomando como referéncia um percentual proximo dos 90% das viagens, o tempo de viagem varia entre quarenta e 120 minutos: Meio principal de transporte, Temb0 peer (em minutos) viagens (%) ‘Trem 120 86,2 Metro 90 89,2 Onibus 78 80,9 Taxi 45 89,6 Automével 40 87,2 Motocicleta 35 86,8 Bicicl 40 88,6 1 VALLVIAM daVaIUIGONE AW Vd OYOVLNAWDVAA D404 96 + Quem mais ganha, mais viaja. Quem ganha pouco ‘ 7 quase ng Esse fato é, para Sao Paulo, ilustrado pelo grag, 8°58 locomove. afico estab ating, lecido por lan Morrison (“EI transporte urbano en Ameéries » Revista da ¢, 8 Ce n. 17, ago. 1982), a partir de estatisticas obtidas em fonte offi fae al, consideraciones acerca de su igualdad y eficiencia” Uma tese recente (1986) de dontoramento, de autotia de Avs p 1a Fanj le Cotia, total de ist0 6,05 operg. rios, € aqueles nao diretamente envolvidos no processo de fabric. Alessandri Carlos, que trata da industrializagdo do municipio d na Regio Metropolitana de Sao Paulo, permite distinguit, no empregados, aqueles diretamente ligados a producao, gio, vivendo 1 Cujos salarios so, para muitos, superiores aos dos simples operarios, o petcentual dos que residem em Sao Paulo € considerdvel (ver préxima tabela), O niimero de viagens é, na Regido Metropolitana de Sao Paulo, reduzido de 8% entre 1981 ¢ 1984, Entre 1984 e 1985, o incremento € de apenas 1%. © ntimero de pessoas “expulsas” do trafego pode ser 08 tercidrios industriais. So os primeiros os menos méveis, mais préximos do lugar de trabalho. Entre os “quadros” avaliado comparando-se de um ano a outro o ntimero total de pas- sageiros nos transportes coletivos ou individuais, sendo que o indice ainda € mais eloquente quanto aos transportes coletivos. Em 1981, 47% das familias de classe média (pesquisa da Ordem dos Economistas de Sao Paulo) utilizavam-se dos seus proprios veiculos para ir trabalhar; eram 42% em 1984. Em 1982, as pessoas atingidas por essa pesquisa iam, em média, 64 vezes ao ano ao cinema e quinze ao teatro, miimeros que baixam para 44 e nove vezes, respectivamente, em 1984, Quanto as refeiges fora de casa nos fins de semana, habito enraizado nas classes médias paulistanas, a frequéncia de 37 vezes e™ 1982 cai para 29 vezes em 1984. As visitas as manicures diminuem em 35%, e mesmo 46% dos fumantes teriam mudado de marcas ao cigarros, devido ao aumento dos pregos. Trinta por cento das ae qu bli- icos dessa faixa econémica (renda entre seis e 33 salirios minimos) colas pill frequentavam escolas particulares transferiram-se para escolas P' z ésti cas, numa busca de acomodagao aos novos orgamentos dome ., Ordem (entrevista do economista Miguel Colasuonno, presidente da eat dos Economistas de Sao Paulo, ao Jornal da Tarde, 20.11.1984, ¢ ao Diario do Comércio, 20.11.1984). Ativipabes INDUSTRIAIS NO Municfpto pe Cotta Local de re idéncia Dos empregados ligados Dos demais 4 produgao (%) empregados (%) Cotia Osasco 69,4 a * 56 23 Sio Paulo ; - ay 12,8 52,2 z Sio Roque Aa AG 5 Outros > ” 2 Nameros absolutos 1231 398 | Fonte: Ana Fani Alessandri Carlos, 1986, p. 166. | Além do mais, 0 custo dos transportes se elevou mais depressa que os salarios. Entre 1° de maio de 1979 e 1° de maio de 1981, 0 salario minimo cresce de 273%, e 0 preco de uma passagem de Gnibus, de 400%. O Jornal do Brasil (18.10.1981) aponta um estudo feito em Sao Paulo segundo o qual a participagao do custo do transporte nas despesas familiares era de 4%, em 1972, de 5%, em 1975, e de 12%, em 1978. Entre janeiro de 1979 e setembro de 1981, o custo das passagens sobe 733%, enquanto os salarios crescem apenas 590%. Em setembro de 1984 (O Estado de S. Paulo, 30.9.1984), o transporte consome 30% da renda dos usudrios. A tendéncia no longo prazo é o aumento relativo da parcela de gastos familiares com transporte, conforme mostra muito bem o grafico publicado no Sumario de Dados da Grande Sao Paulo, 1984, da Emplasa (p. 133). Essa tendéncia torna-se, porém, exponencial a partir da segunda metade da década de 1970, e frenética nos anos de 1980. Por um estudo oficial realizado em 1985 no Ministério dos Transportes, sabe-se que “em Sao Paulo, em 1965, era possivel adquirir com um salario minimo 609 bilhetes de Gnibus, em 1981 esse numero Passou para 437 e, em marco de 1985, para apenas 405” (Folha de S.Paulo, 9.3.1985). Segundo o diretor do Dieese, economista Walter YOVANAWOVWd a VALLVTaN aay 26 + saiuoasnvus so ‘s1040¥LaH METROPOLE CORPORATIVA FRAGMENTADA s de dnibus que um operario ganhandy ar em 1965 reduzem-se para 536 em 333 em fins de maio de 1984 (Folha de parelli, as seiscentas passagen jo, minimo podia compr salar mente 1970, enquanto eram sor S.Paulo, 5,5.1985)- ca repercute sobre o volume da circulagao na cidade, Acrise economi —_ 1979 1980 a 979 SO 14 900 846 15373852 15087830 eam 1264038229 1293528776 1266 231 386 Passageiros transportados Fonte: Anmdrio Estatistico do Estado de Sio Paulo, 1981 © ntimero de passageiros do sistema de transporte por 6nibus intermunicipais da Regido Metropolitana de Sao Paulo baixa a partir de 1981 até 1983 e conhece um novo incremento em 1984 e 1985, quando a economia recomega a crescer. O ntimero de quilémetros rodados deve aumentar em 1985 em relaco a 1984, segundo pre- visdes oficiais, mas ainda estara muito longe de recuperar os indices dos anos anteriores (Revista dos Transportes Publicos, n. 9, ano 7, set. 1985, p. 112). Tomando-se 0 indice 100 para 1981, assim evoluem o ntimero de viagens de 6nibus intermunicipais e a correspondente quilometragem dentro da Grande Sao Paulo: Niimero de viagens _ Quilometragem 1981 100 100 1982 98,29 Soe tee 98,08 95,27 1984 99,77 91:98 1585 105,50 ais indies indicam uma queda do movimento de passageiros mals acentuada ui i ; ‘ada que a do numero de viagens, queda acentuada até 0 ano 1984, corresponde 1984, “pondendo a cise econsmica, e recuperagio a partir juan geira quando uma ligeira retomada da economia se esboca. Pr essere 0 baixo poder aquisitivo da maioria das populacées periféricas é, esponsavel pela relativa imobilidade de uma grande parcela da pois, ¥ populagao. Esta seria ainda maior se nesse cémputo fossem incluidos Fr que apenas se deslocam para o trabalho. Uma pesquisa origem ¢ destino, realizada em 1977 (a iiltima que foi feita), para conhecer os habitos de viagem € as caracteristicas socioeconémicas da populagao, mostra que os Menores indices de mobilidade se encontram ou na rea da Sé, centro do municipio, onde a maioria das pessoas nao toma con- ducdo para ir ao trabalho, ou em bairros distantes, como So Miguel Paulista, Itaquera e Perus, gracas, nestes tiltimos casos, ao baixo poder wont aquisitivo dos moradores. O problema da imobilidade das pessoas nas cidades tem sido estu- dado, embora sem muita frequéncia, nos paises ocidentais ¢ em relacao apenas com as pessoas idosas. Robert F. Wiseman (Spatial Aspects of Aging, Ass. AM. Geographers, Washington, 1978, Resource Paper, n. 78-4) assim retrata a situacao: “E aparente que as pessoas mais velhas se defrontam com problemas associados com sua mobilidade espacial crescentemente limitada dentro de uma sociedade crescentemente mével. Eles so limitados em termos fisicos (em relagao a satide), eco- némicos (em relacdio aos custos) e sociais (poucos contatos)”. O autor se pergunta se tais condicées afetarao “a distribuigéo dos idosos aos niveis do Estado, da regiao ou da area de vizinhanca”. Em nosso caso, nao sao apenas os velhos que sao as vitimas da imobilidade, e esta, causada pela pobreza e baixos salarios, resulta, também, das condicdes do lugar de residéncia que, na cidade, cabem aos mais pobres. Como os pobres se tornam praticamente isolados ali onde vivem, podemos falar da existéncia de uma metropole verdadeiramente A10d0ULaW Va OYSVINAWOV¥A 4 VALLVIAY fragmentada. Sem diivida, muitas pessoas de outras areas vao traba- —& Ihar em certos setores da aglomeracao. Outras deixam o seu proprio 2 setor e vao trabalhar em outras areas, em ocupacées frequentemente = pequenas, acidentais e temporarias. Muitos, todavia, sao prisioneiros g do espago local, enquanto outros apenas se movem para trabalhar no & centro da cidade, fazer compras ou utilizar os servigos quando tema + Possibilidade ¢ os meios. 2 & 100 + de tio grande ntimero de pessoas leva a cigag ade 4 jade ‘A imobilida er * syetos e transforma sua frag) ; to de guetos agmentacig tm se tornar um conjunt “a0! desintegragao" Pode-se, também, ima subemprego € 4 pobreza, Jaga riférica seria um: populagao per da superficie urbana? Uma tese defendida em Paris, em 1972, aie nio Sarabia ¢e Manolo Velasco, intitulada Transport, Bien Final (ctadg por Ramon Fernandez Duran, Transporte, Espacio y Capital, 1980, p 2), far sapor que a diminuigéo da jornada de trabalho, associada 4 melhoria dos transportes € 4 diminuigao do seu tempo, conduziria ag aumento do tamanho da cidade, ja que restaria mais tempo livre a ser utilizado no percurso entre a casa € 0 trabalho. O modelo econémico eo modelo territorial brasileiros criam 0 fendmeno da imobilidade relativa, que atinge os mais pobres, de modo que, em muitas secies da cidade, os que nao encontram trabalho formal na prépria Area, ou nao tém ocupagées informais em outras, empreendem atividades ginar que, ligada como € a0 desempregy , a a relativa imobilidade de grande parte 4, re da a das causas do aumento Iconsiderad, lo informais as mais diversas perto de onde vivem ou ficam sem traba- Ihar e acabam por nao precisar regularmente de transporte. Pode-se pensar que, desse modo, levam ao paroxismo a situagao definida por Sarabia e Velasco, contribuindo para a extensao espacial da cidade. Fosse outra a sua situacao salarial e o problema da residéncia teria uma outra solugao, e a propria especulacdo imobilidria seria menos forte, conforme ja discutimos. A elevacao dos precos de transporte para a periferia tem um im Pacto sobre a elevacao dos precos de terrenos no centro, aumentando, ainda mais, os diferenciais de pregos relativos nao apenas entre cent"? € periferia, mas entre dreas mais proximas ou mais distantes do cent 1 a sso reforga a tendéncia para uma extensao territorial ainda maior 4° organismo urbano,

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