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O EVANGELHO

SEGUNDO PEDRO
Paixão, Morte e Ascensão do Senhor

Sadas
1ª edição
2010
O Evangelho Segundo Pedro, Paixão, Morte e Ascensão do Senhor
Tradução, Transcrição, Estudos e Comentário por: Sadas

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Site: http://omnivagum.blogspot.com/

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2
Quod scriptum, scripsi
―O que escrevi, escrevi‖
Pilatos

3
Sumário

Índice de Abreviaturas ........................................................................................................ 5


Introdução ........................................................................................................................... 6
Tradução............................................................................................................................ 11
Comentário ........................................................................................................................ 15
Transcrição ........................................................................................................................ 31
Conclusão .......................................................................................................................... 36
Apêndice ........................................................................................................................... 37
Bibliografia ....................................................................................................................... 40

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Índice de Abreviaturas
Livros do Antigo Testamento:
Dt – Deuteronômio
Ex – Êxodo
Sl – Salmos

Livros do Novo Testamento:


Ap – Apocalipse
At – Atos dos Apóstolos
Jo – Evangelho de João
Lc – Evangelho de Lucas
Mc – Evangelho de Marcos
Mt – Evangelho de Mateus

Outros:
Pe – Evangelho de Pedro

Obs.: Quando um livro é citado pelo nome, entre parênteses não aparecerá a
abreviatura, mas somente a referência ao capítulo e verso. O nome do livro estará
destacado em negrito.
Ex: Lucas. ―E, repartindo as suas vestes, lançaram sortes‖ (23.34).

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Introdução

O século das descobertas


O século XIX foi marcado por grandes surpresas. A locomotiva a vapor, a
lâmpada incandescente, o telefone, o automóvel, a geladeira e tantas outras
inovações que até hoje nos beneficiam foram produto daquele século.
Foi descoberto o raio-X e a existência dos genes. O mundo viu nascerem
mentes que seriam lembradas, senão reverenciadas, por todas as gerações
posteriores: Darwin, Marx, Einstein, Freud, Nietzsche, Thomas Edison, Chaplin e
tantos outros.
Decifrou-se a Pedra de Roseta, base para nossa compreensão dos
hieróglifos egípcios; novos documentos da antiguidade começaram a vir à tona,
dentre eles um Códice esquecido em um cemitério, contendo a única cópia até
então conhecida do suposto Evangelho de Pedro.

A descoberta do Evangelho de Pedro


O Codex P.Cairo 10759, também conhecido como Panopolitanus ou
Cairensis 10759, foi descoberto por Urbain Bouriant e Adolf Lods, da Missão
Arqueológica Francesa, em julho de 1886, em um túmulo de um antigo cemitério
em Akhmim (Panópolis), no Alto Egito, e tem data estimada entre os séculos VI e
IX. Contém o Evangelho de Pedro, o Apocalipse de Pedro e os capítulos 1-27 do
Apocalipse de Enoque, todos em grego.
Foi publicado em 1892 por Bouriant no volume IX do Memoirs of the
French Archaeological Mission at Cairo, sendo o primeiro Evangelho não
canônico (ou seja, apócrifo) a ser encontrado no Egito.
Até a descoberta deste texto, só se conhecia a existência de um suposto
Evangelho de Pedro por meio das menções feitas pelos antigos pais da igreja.
Deve ter sido escrito por volta do século II, pois já é mencionado por Serapião (c.
191).
Apesar de seu único manuscrito ter sido encontrado no Egito, era
obviamente uma cópia de textos vindos da Síria, onde o original provavelmente
fora escrito. Embora atribua a própria autoria ao apóstolo Pedro, trata-se de um
pseudepígrafo (livro de falsa autoria).
Pseudepígrafos eram comuns na literatura antiga. Com o objetivo de dar
peso e reputação a uma obra, seu escritor poderia intitular a autoria de alguma
figura ilustre, um filósofo ou um apóstolo, por exemplo.
Eusébio (c.265) citou seis livros cuja autoria era atribuída ao apóstolo
Pedro: as duas epístolas presentes no Novo Testamento, um livro de Atos, um
Apocalipse, um Sermão e o Evangelho. Orígenes (253) no seu Comentário de
Mateus (X.17) diz: “Mas, seguindo a tradição registrada no Evangelho segundo
Pedro ou no Livro de Tiago, eles falam que há certos irmãos de Jesus, os filhos de
José por uma ex-mulher, que viveu com ele antes de Maria” 1. Jerônimo (c.347),

1
“tou<v de< ajdelfou<v /Ihsou~ fasi> tinev ei+nai, ejk parado>sewv oJpmw>menoi tou~
ejpigegramme>nou Kata< Pe>trov eujaggeli>ou, h} th~v bi>blou /Iakw>bou, uiJou<v /Iwsh<f ejk
prote>rav gunaiko<v sunw|khkui>a v aujtw|~ pro< th~v Mari>av”.

6
no De Viris Illustribus, mencionaria um sétimo livro chamado Julgamento2.
Teodoreto (455), na História Religiosa (II.2), diz, sobre a seita dos Nazarenos:
―Mas os Nazarenos são judeus, honrando a Cristo como um homem justo e usam
o evangelho chamado Segundo Pedro”3.
De todas as obras associadas a Pedro, Eusébio dava crédito apenas à
primeira Epístola como canônica. A segunda Epístola era mesmo alvo de
polêmica nos concílios e entre os pais da igreja, antes de ser definitivamente
incluída no cânon (a lista dos livros aceitos como parte da Bíblia). Quanto às
demais obras, sempre foram oficialmente consideradas apócrifas, o que não
impediu o seu uso e reconhecimento por parte de alguns grupos religiosos.
Diz Eusébio na História Eclesiástica (III.3): “De Pedro reconhecemos
uma única carta, a chamada I de Pedro. Os próprios presbíteros antigos
utilizaram-na como algo indiscutível em seus próprios escritos. Por outro lado,
sobre a chamada II carta, a tradição nos diz que não é testamentária; ainda
assim, por parecer proveitosa a muitos, é tomada em consideração junto com as
outras Escrituras. Quanto aos Atos que levam seu nome e o Evangelho dito como
seu, assim como a Pregação que se diz ser sua e o chamado Apocalipse, sabemos
que de modo algum foram transmitidos entre os escritos católicos, pois nenhum
autor eclesiástico, nem antigo nem moderno, utilizou testemunho tirado deles”.
Nenhum escritor religioso citou trechos do Evangelho de Pedro e as
menções que temos sobre a existência desta obra são as que alhures citamos. A
única menção anterior a Eusébio foi feita por Serapião, oitavo bispo de Antioquia
(c. 191). Serapião desconhecia totalmente este livro, que lhe seria apresentado
quando de sua estadia em Rhosus, uma região portuária na costa de onde hoje fica
a Turquia.
Em sua visita à igreja de Rhosus, foi indagado pelos paroquianos sobre o
Evangelho de Pedro. Ele folheou o livro e nada viu de reprovável, recomendando
sua leitura. Fazendo, posteriormente, uma análise mais detalhada, concluiu que o
texto ensinava a heresia de Marcião, por isto o bispo escreveu à igreja condenando
definitivamente o suposto Evangelho de Pedro.
Assim Eusébio cita Serapião (H.E. VI.12): “Quanto ao fruto do afã
literário de Serapion, é natural que se hajam conservado também outras obras
entre outras pessoas, mas a nós não chegaram mais do que estas: A Domno, um
que no tempo da perseguição havia caído da fé de Cristo para dar na superstição
judia; e a Poncio e Carico, varões eclesiásticos ambos, e outras cartas a outras
pessoas; e outro tratado que compôs Acerca do chamado Evangelho de Pedro;
escreveu-o refutando as falsidades que neste se dizem, por causa de alguns da
igreja de Rosos que, com o pretexto da dita Escritura, haviam-se desviado para
ensinamentos heterodoxos. Será bom oferecer deste livro algumas sentenças nas
quais apresenta sua opinião sobre aquele livro; escreve assim: „Porque também
nós, irmãos, aceitamos Pedro e os demais apóstolos como a Cristo, mas como
homens de experiência que somos, rechaçamos os falsos escritos que levam seus
nomes, pois sabemos que não nos transmitiram semelhantes escritos. Porque eu

2
―Simon Petrus... scripsit duas epistolas quae catholicae nominantur, quarum secunda a
plerisque eius negatur propter stili cum priore dissonantiam. sed et Euangelium iuxta Marcum,
qui auditor eius et interpres fuit, huius dicitur. libri autem e quibus unus Actorum eius inscribitur,
alius Euangelii, tertius Praedicationis, quartus /Apokalu>yewv, quintus ludicii, inter apocryphas
scripturas repudiantur‖.
3
―oiJ de< Nazwpai~oi> /Ioudai~oi> eijsi to<n Cristo<n timw~ntev wJv a]nqpwpon di>kaion kaij tw|~
kaloume>nw| Kata< Pe>tron eujaggeli>w| kecphme>noi‖.

7
mesmo, achando-me entre vós, supunha que todos vos ativésseis à fé reta, e sem
ter lido o Evangelho que eles me apresentavam com o nome de Pedro, disse: 'se é
apenas isto que parece preocupar-vos, que se leia'. Mas agora que me inteirei,
pelo que me disseram, de que seu pensamento se ocultava em certa heresia, terei
pressa para estar novamente entre vós; de maneira que, irmãos, esperai-me em
breve. Quanto a nós, irmãos, compreendemos a que heresia pertencia Marciano,
o qual se contradizia e não sabia o que falava (isto aprendereis pelo que vos
escrevi). Efetivamente, graças a outros que praticaram este mesmo Evangelho, ou
seja, graças aos sucessores dos que o iniciaram, aos quais chamaremos docetas
(porque a maior parte de seu pensamento pertence a este ensino), por terem-no
emprestado eles, pudemos lê-lo cuidadosamente, e achamos a maior parte
conforme a reta doutrina do Salvador, mas também algumas coisas que se
distinguem e que vos submetemos‟. Isto sobre Serapion”.
Após tal incidente, permaneceu esta obra no anonimato, não sendo
comentada pelos teólogos medievais nem modernos, até que, em 1886, Bouriant
encontrou um Códice em Akhmin. Este texto reivindica autoria petrina e tem
características do pensamento docético, o que assemelha esta narrativa à descrição
do Evangelho de Pedro feita pelos antigos.

Características do documento
O Codex P. Cairo 10759 é composto por 33 folios de pergaminho,
costurados em forma de livro com uma capa de couro, resultando em 66 páginas.
Contém o Evangelho de Pedro, o Apocalipse de Pedro e uma versão grega do
Livro de Enoque.
O método antigo de encadernação consistia em dobrar folhas de papiro ou
pergaminho, formando livretos que eram então costurados num só volume, o
Códice. Chama-se folio a cada dobra, sendo a página ímpar chamada de recto e a
página seguinte, que fica na parte de trás, chama-se verso.
O Evangelho de Pedro abrange as primeiras doze páginas. A primeira
página é a capa em branco; o texto começa na página seguinte e termina na
décima, sobrando as duas últimas em branco, danificadas com um grande buraco
no centro.
A folha muito fina deixa transparecer as letras do verso, de modo que sob
as letras de uma página transparece a ―sombra‖ do texto da página seguinte, como
uma marca d’água. Há umas poucas ilustrações de simples capricho (cruzes e um
ornamento).
As bordas superiores estão emboloradas, principalmente na parte inicial,
contendo o Evangelho de Pedro. A umidade do sepulcro danificou as primeiras
páginas do Códice, tornando algumas palavras de difícil leitura. Há alguns furos
produzidos por insetos, uma parte deles atingindo palavras, a outra em regiões
sem texto.
Há rasuras e muitos erros ortográficos, denunciando a inabilidade do
copista que talvez tivesse pouco conhecimento da língua grega. A rasura mais
intensa fica no verso 56, em que o copista esqueceu-se de escrever a última sílaba
de uma palavra, tendo de completá-la depois, amontoando a sílaba sobre a
palavra.
O estilo da caligrafia muda no Apocalipse de Enoque. Em Pedro é cursivo
(todo em letras minúsculas), em Enoque é uncial (todo em letras maiúsculas),
tornando-se mais legível e formal do que no Evangelho de Pedro. Neste, o copista
se mostra apressado, deformando as letras, principalmente nas palavras grandes,

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onde se mostra impaciente. O copista de Enoque tem estilo mais profissional,
comete menos erros e é mais legível.
A coleção não foi produzida por uma só lavra, pois a caligrafia diferente
em cada livro e as páginas em branco no final dos livros petrinos denunciam que
eram originalmente obras separadas que foram costuradas em um só volume
posteriormente.
Após a morte do escritor ou do ultimo dono do Códice, este foi deixado
junto com o dono em seu sepulcro, até ser encontrado por Bouriant que,
analisando o túmulo, concluiu que o último proprietário do manuscrito teria
vivido por volta do século oito ou nove.

Características da narrativa
O texto cobre o período que corresponde aos capítulos 27-28 de Mateus,
15-16 de Marcos, 23-24 de Lucas e 19-20 de João, ou seja, o clímax da história
que é a paixão, morte e ressurreição do Messias.
O início brusco da obra (―...mas nem os judeus...‖) bem como seu final
interrompido (―...filho de Alfeu, a quem o Senhor...‖) parecem indicar que este
manuscrito é a cópia de apenas uma parte do Evangelho petrino original. Também
não há menção aos irmãos de Jesus, conforme Orígenes dissera que haveria neste
livro. Destarte, temos hoje em mãos o trecho principal do Evangelho de Pedro.
A Paixão Segundo o Evangelho de Pedro acrescenta detalhes próprios que
não há nos Evangelhos canônicos. Herodes e os juízes judeus se negam a lavar as
mãos, após o exemplo de Pilatos. O povo põe Jesus sobre uma tribuna e zomba:
―Julga retamente, ó Rei de Israel‖. Na cruz, ele permanece calado e sem
demonstrar sofrimento. A participação dos judeus é mais intensa que a dos
soldados romanos. José de Arimatéia lava o corpo de Jesus antes de depositá-lo na
tumba, cujo local é nomeado como Jardim de José. O centurião que comanda os
guardas que põem uma pedra selando a tumba chama-se Petrônio, personagem
este que não está presente nos Evangelhos.
Por outro lado, não cita muitos dos eventos mencionados nos Evangelhos,
sendo, talvez, a omissão mais notável a das palavras de Jesus na cruz. Em Pedro,
Jesus mantém um contínuo silêncio enquanto está na cruz, falando apenas no
último momento: ―Meu Poder, meu Poder, por que me abandonaste‖. Dentre
outras omissões, não cita o episódio em que Simão Cireneu carrega o madeiro, ou
as mulheres que seguem o Messias chorando, ou Pilatos que se nega a mudar o
texto que escrevera na placa da cruz.
Na contagem de H. B. Swete, das vinte e duas vezes em que o Evangelho
de Pedro compartilha com os Evangelhos, quatro eventos são encontrados em
todos os Evangelhos, sete em três deles, três em Mateus e Marcos, três apenas em
Mateus e três apenas em Lucas. Swete também comparou diversas frases do texto
grego petrino com o evangélico, revelando uma semelhança que indica que o
autor do Evangelho de Pedro conhecia os quatro Evangelhos ou uma fonte em
comum e provavelmente os utilizou como fonte de pesquisa.
O teor do livro é antijudaico, tanto que já inicia apresentando os judeus
que se recusam a lavar as mãos, como que assumindo a responsabilidade pela
morte do Messias. Também evita citações das escrituras judaicas, o Antigo
Testamento, como é comum nos Evangelhos.
Pilatos tem uma interessante proeminência, tanto que seu nome é o
segundo em número de ocorrências, perdendo apenas para o nome ―Senhor‖, que

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se refere a Jesus. Quanto a este, é chamado apenas de ―Senhor‖, ―filho de Deus‖
ou ―rei de Israel‖ e por nenhum outro nome, nem mesmo ―Jesus‖ ou ―Cristo‖.

Evangelho de Pedro e o gnosticismo


Quem mais claramente associou o Evangelho petrino ao gnosticismo foi
Serapião, acusando-o de docético. Docetismo era uma vertente do cristianismo
gnóstico. Como o gnosticismo considerava a matéria impura, acreditavam os
docetas que Cristo não se havia encarnado em um corpo realmente humano, pois
isto significaria que ele estava assumindo a natureza impura da matéria. Logo, seu
corpo era feito de substância espiritual, ou ―corpo docético‖, e apenas se parecia
(daí o grego ―dokein‖) com um corpo humano.
Os gnósticos do segundo século costumavam produzir obras que levavam
os nomes dos apóstolos, como é o caso dos Evangelhos de Filipe, de Tomé e de
Matias. Se o gnosticismo tivesse alcançado êxito na igreja, provavelmente
teríamos um cânon de Evangelhos formado pelos autores que acabamos de citar.
Algumas de suas características gnósticas, em particular do ramo docético:
o Messias é apresentado como um ser mais sobrenatural que humano, tanto que
não sofre na cruz; no momento da morte, lamenta a perda de seu Poder; não se diz
que expirou, mas que foi levado ou assumido na glória; na ressurreição, também é
desenhado com uma aparência sobrenatural; é sempre chamado de kyrios (Senhor)
ou de uios tou theou (filho de Deus) e nunca recebe nomes humanos como ―filho
do homem‖ ou ―Jesus Nazareno‖.

Cronologia da narrativa
Robinson e James sistematizaram a seguinte cronologia para a narrativa:
1. sabbaton epifwskei...pro miav twn azumon.
[se aproxima o Sábado... para a véspera dos ázimos].
O corpo não pode permanecer insepulto após o por do sol.
2. hn de mesnmbria.
[ao meio-dia].
As trevas cobrem a Judéia.
3. eureqh wra enath.
[na hora nona].
A luz retorna.
4. nuktov kai hmerav ewv tou sabbatou.
[noite e dia, até o Sábado].
Os discípulos jejuam e lamentam.
5. epi treiv hmerav.
[por três dias].
Os judeus propõem a guarda do túmulo.
6. prwiav de epifwskontov tou sabbatou.
[pela manhã ao despontar do Sábado].
A multidão visita o túmulo.
7. th de nukti h epefwsken h kuriakh.
[na noite que precedeu o dia do Senhor].
A Voz e a Visão.
8. nuktov.
[de noite].
Eles correm para avisar Pilatos.
9. opqou de thv kuriakhv.
[ao amanhecer do dia do Senhor].
Maria Madalena vai ao túmulo com outras mulheres.
10. hn de teleutaia hmera twn azumon... thv eorthv pausamenhv.
[no último dia dos ázimos... acabara-se a festa].
Muitos voltam às suas casas. Os Discípulos vão para o mar.

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Tradução

Nota:
Os títulos e subtítulos foram inseridos para facilitar a leitura e estão destacados em
negrito. Também a numeração dos versos não está presente no texto original.
O texto é tradicionalmente dividido em 60 versos, contidos em 14 parágrafos, conforme
segue: I.1-2; II.3-5; III.6-9; IV.10-14; V.15-20; VI.21-24; VII.25-27; VIII.28-33; IX.34-37; X.38-
42; XI.43-49; XII.50-54; XIII.55-57; XIV.58-60. A título de simplificação, adoto apenas a
numeração em versos, a saber, de 1 a 60.

Parte I – A Morte
O veredicto
1. Mas nenhum dos judeus lavou as mãos, nem Herodes, nem qualquer dos seus
juízes. E, não querendo eles lavar-se, Pilatos se levantou. 2. E o rei Herodes
mandou que levassem o Senhor para fora, dizendo-lhes: ―O que vos ordenei que
fizésseis, fazei‖.

José de Arimatéia reivindica o corpo do Senhor


3. Ora estava ali José, amigo de Pilatos e do Senhor. E, sabendo que o haveriam
de crucificar, foi a Pilatos e lhe pediu o corpo do Senhor para sepultamento. 4. E
Pilatos o enviou a Herodes para que lhe pedisse o corpo. 5. E Herodes disse:
―Irmão Pilatos, ainda que ninguém o tivesse pedido, nós o teríamos sepultado,
uma vez que o sábado se aproxima e está escrito na lei que O sol não se ponha
sobre o condenado à morte‖. E o entregou ao povo para a véspera dos ázimos, a
festa deles.

Os judeus humilham o filho de Deus


6. Então eles, tomando o Senhor e o empurrando, diziam: ―Arrastemos o filho de
Deus, agora que nos apoderamos dele‖. 7. E o vestiram com púrpura e fizeram-no
sentar-se numa cátedra da tribuna, dizendo: ―Julga retamente, ó rei de Israel!‖ 8. E
um deles trouxe uma coroa de espinhos e a colocou sobre a cabeça do Senhor. 9.
E outros que ali estavam cuspiram-lhe nos olhos; aqueloutros lhe batiam nas
faces, outros o espancavam com uma vara e alguns o flagelavam, dizendo: ―Com
esta honra, honramos o filho de Deus‖.

Crucificado entre dois malfeitores


10. E trouxeram dois malfeitores e crucificaram o Senhor no meio deles. Ele,
todavia, se calava, como se não sentisse dor. 11. E, quando ergueram a cruz,
escreveram no alto: ―Este é o rei de Israel‖. 12. E, depositando as vestes diante
dele, dividiam-nas e lançavam sorte sobre elas. 13. Mas um daqueles malfeitores
o repreendeu, dizendo: ―Nós sofremos assim por causa dos maus atos que
praticamos. Este, porém, que se tornou salvador dos homens, que injustiça vos
fez?‖ 14. Indignados contra ele, ordenaram que não lhe fossem quebradas as
pernas de modo que morresse entre tormentos.

Escuridão desce à terra e o véu do templo se rasga


15. Ora, era meio-dia e as trevas cobriram toda a Judéia. Eles se agitavam e se
preocupavam, julgando o sol já posto, pois ele ainda estava vivo. E está escrito

11
para eles: ―Não se ponha o sol sobre o condenado à morte‖. 16. E um deles disse:
―Dai-lhe de beber fel com vinagre‖. E fizeram uma mistura dando-lhe de beber.
17. E consumaram tudo, e completaram sobre suas cabeças a medida de seus
pecados. 18. Assim muitos andavam com luzeiros, pensando que fosse noite,
alguns tropeçando. 19. E o Senhor bradou, dizendo: ―Minha força, ó força, tu me
abandonaste!‖ E assim falando, foi levado. 20. Na mesma hora o véu do templo
de Jerusalém se rasgou em duas partes.

O corpo do Senhor retirado da cruz


21. Tiraram os pregos das mãos do Senhor e o depuseram sobre o solo. E a terra
toda tremeu e houve grande medo. 22. Brilhou o sol e reconheceram que era a
nona hora. 23. Alegraram-se, destarte, os judeus e deram o corpo dele a José para
que o sepultasse, sendo ele testemunha de todo o bem que fizera. 24. Tomando,
então, o Senhor, lavou-o, e o envolveu em um lençol e o depositou em seu próprio
sepulcro, chamado jardim de José.

As lamentações de todos
25. Então os judeus, os anciãos e os sacerdotes, compreendendo o grande mal que
fizeram a si mesmos, lamentaram, batendo no peito e dizendo: ―Ai de nossos
pecados! É chegado o juízo e o fim de Jerusalém!‖ 26. Eu e meus amigos
estávamos tristes e, de ânimo abatido, nos escondíamos. Estávamos sendo
procurados por eles como malfeitores e como aqueles que queriam incendiar o
templo. 27. Por causa de tudo isto, jejuávamos e ficamos sentados, lamentando e
chorando noite e dia, até o sábado.

A guarda do sepulcro
28. Ora, reuniram-se os escribas, os fariseus e os anciãos, ouvindo que todo o
povo murmurava e lamentava, batendo no peito e dizendo: ―Se na sua morte se
realizaram sinais tão grandes, vede quanto ele era justo!‖ 29. Os anciãos tiveram
medo e foram a Pilatos, pedindo-lhe e falando: 30. ―Dá-nos soldados para que seu
túmulo seja vigiado por três dias. Que não aconteça que seus discípulos venham
roubá-lo e o povo acredite que ele tenha ressuscitado dos mortos e nos faça mal‖.
31. Então Pilatos deu-lhes o centurião Petrônio com soldados para vigiar o
sepulcro e com eles foram ao túmulo os anciãos e os escribas. 32. E todos os que
ali estavam com o centurião e os soldados rolaram uma grande pedra 33. e a
colocaram na entrada do túmulo. Nela imprimiram sete selos. E ergueram ali uma
tenda e montaram guarda.

Parte II – A Ressurreição

O túmulo aberto
34. Então pela manhã, aproximando-se o sábado, veio uma multidão de Jerusalém
e das vizinhanças para ver o túmulo selado. 35. E à noite, ao aproximar-se o dia
do Senhor, vigiando os soldados em turnos de dois em dois, uma grande voz se
fez no céu 36. e viram abrir-se os céus e dois homens desceram, tendo muito
esplendor, e aproximaram-se do túmulo. 37. Então aquela pedra que fora colocada
em frente à entrada rolou donde estava para o lado. E o sepulcro se abriu e ambos
os jovens entraram.

12
Jesus se manifesta aos guardas
38. Vendo isto, os soldados foram acordar o centurião e os anciãos, pois também
estes estavam a vigiar. 39. E enquanto lhes contavam o que viram, novamente
avistaram três homens saindo do sepulcro, e dois deles escoravam o outro e uma
cruz os estava seguindo. 40. E a cabeça dos dois homens alcançava o céu,
enquanto a daquele que conduziam pela mão superava os céus. 41. E uma voz se
ouviu no céu que disse: ―Pregaste aos que dormem?‖ 42. E uma resposta se ouviu
da cruz: ―Sim‖.

Uma segunda teofania


43. Eles, então, consideraram um com o outro partir e relatar essas coisas a
Pilatos. 44. Enquanto ainda conversavam, novamente abriram-se os céus e um
homem desceu, entrando no túmulo.

A reação de Pilatos
45. Vendo aquilo, o centurião e os que estavam com ele correram pela noite a
procurar Pilatos, deixando o sepulcro que tinham vigiado. E detalharam tudo o
que tinham visto, estando muito perturbados, e disseram: ―Realmente era filho de
Deus‖. 46. Pilatos replicou e disse: ―Eu sou puro do sangue do filho de Deus,
fostes vós que decidistes‖. 47. Depois se aproximaram todos, pedindo-lhe,
suplicando que ordenasse ao centurião e aos soldados não contar a ninguém o que
viram. 48. ―Pois para nós, diziam, é melhor sermos culpados de enorme pecado
diante de Deus, do que cairmos nas mãos do povo judeu e sermos apedrejados‖.
49. Então Pilatos ordenou ao centurião e aos soldados que nada dissessem.

Maria Madalena visita o sepulcro


50. Então, ao amanhecer do dia do Senhor, Maria Madalena, discípula do Senhor
(que, temendo os judeus ardentes de cólera, não havia feito no sepulcro do Senhor
o que costumavam fazer as mulheres pelos mortos que lhes eram queridos), 51.
tomou consigo as amigas e foi ao túmulo onde ele jazia. 52. E, temendo serem
vistas pelos judeus, diziam: ―Se, naquele dia em que foi crucificado, não pudemos
chorar e lamentar, batendo no peito, que agora, sobre seu túmulo, façamos isto.
53. Mas quem rolará para nós a pedra na entrada do sepulcro, a fim de que
possamos entrar, sentar-nos em volta dele fazer o que lhe é devido? 54. Pois é
grande a pedra e tememos que alguém nos veja. Se não o pudermos fazer,
lancemos na entrada o que trouxemos em sua memória. Choraremos e nos
lamentaremos, batendo no peito até voltarmos para casa‖.

Um anjo fala às mulheres


55. E elas foram e encontraram o sepulcro aberto. E aproximando-se, inclinaram-
se e viram ali um jovem sentado no meio do sepulcro, belo e vestido de um manto
luminescente. Perguntou-lhes e falou: 56. ―Por que viestes? A quem procurais?
Por acaso, aquele que foi crucificado? Ressuscitou e partiu. Se não o acreditais,
inclinai-vos e olhai o lugar onde jazia, pois não está. Ora, ressuscitou e voltou
para o lugar donde veio‖. 57. As mulheres fugiram atemorizadas.

O fim da festa
58. Era o último dia dos ázimos, e muitos partiam e voltavam para suas casas; a
festa acabou. 59. Nós, porém, os doze discípulos do Senhor, chorávamos e nos
entristecíamos. E cada um, angustiado por tudo o que tinha acontecido, voltou

13
para sua casa. 60. Quanto a mim, Simão Pedro e André meu irmão, tomamos
nossas redes e partimos para o mar; e esteve conosco Levi o filho de Alfeu, a
quem o Senhor…

--FIM--

Índice Remissivo
Não se trata de uma lista exaustiva, mas de palavras com maior relevância no
texto. Os números referem-se aos versos em que há ocorrência.

Anciãos: 25, 28, 29, 31, 38 Levi: 60


André: 60 Maria Madalena: 50
Ázimos: 5, 58 Morte, mortos: 28, 30, 50
Bater no peito: 25, 28, 52, 54 Multidão: 34
Centurião: 31, 32, 38, 45, 47, 49 Pecado: 25, 48
Coroa de espinhos: 8 Petrônio: 31
Corpo: 3, 4, 23 Pilatos: 1, 3, 3, 4, 5, 29, 31, 43, 45, 46, 49
Crucificar: 3, 10, 52, 56 Povo: 5, 28, 30, 48
Cruz: 11, 39, 42 Rei de Israel: 7, 11
Dia do Senhor: 35, 50 Ressuscitar: 30, 56, 56
Discípulos: 30, 50, 59 Sábado: 5, 27, 34
Escribas: 28, 31 Sacerdotes: 25
Está escrito: 5, 15 Salvador: 13
Fariseus: 28 Senhor: 2, 3, 3, 6, 8, 10, 19, 21, 24, 50, 50, 59, 60
Filho de Deus: 6, 9, 45, 46 Sepulcro: 24, 31, 37, 39, 45, 50, 53, 55, 55
Herodes: 1, 2, 4, 5 Sepultar: 3, 5
Jerusalém: 20, 25, 34 Simão Pedro: 60
José: 3, 23, 24 Soldados: 30, 31, 32, 35, 38, 47, 49
Judéia: 15 Templo: 20, 26
Judeus: 1, 23, 25, 48, 52 Túmulo: 30, 33, 34, 36, 44, 51, 52

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Comentário

Nota:
Apenas com o fim de distinção, referir-nos-emos aos quatro evangelhos canônicos com a
inicial maiúscula (Evangelho) e a Pedro, por não constar no cânon do Novo Testamento, com
letras minúsculas (evangelho). Com isto ficará fácil para o leitor identificar quando nos referimos
àqueles ou a Pedro.
O evangelho de Pedro foi escrito no segundo século da era cristã, de modo que seu autor
provavelmente não foi o apóstolo Pedro. Entenda-se, portanto, que, sempre que falarmos em
Pedro, queremos nos referir ao autor deste evangelho, seja ele quem for.

Parte I – A Morte
1-2: O veredicto
1. Mas nenhum dos judeus lavou as mãos, nem Herodes, nem qualquer dos seus juízes. E,
não querendo eles lavar-se, Pilatos se levantou. 2. E o rei Herodes mandou que levassem
o Senhor para fora, dizendo-lhes: ―O que vos ordenei que fizésseis, fazei‖.

Nos Evangelhos, somente Mateus registra que Pilatos, tendo interrogado


Jesus, não encontrou nele motivo de condenação, mas era pressionado pelos
judeus, de modo que a sua saída deste impasse foi lavar as mãos, um gesto
público com que se isentava da responsabilidade pela morte daquele homem. Este
antigo ritual de lavar as mãos como reivindicação de inocência já era praticado no
Antigo Testamento (Dt 21.6-8).
Mateus. ―Disse-lhes Pilatos: Que farei então de Jesus, chamado Cristo?
Disseram-lhe todos: Seja crucificado. O presidente, porém, disse: Mas que mal fez
ele? E eles mais clamavam, dizendo: Seja crucificado. Então Pilatos, vendo que
nada aproveitava, antes o tumulto crescia, tomando água, lavou as mãos diante da
multidão, dizendo: Estou inocente do sangue deste justo. Considerai isso. E,
respondendo todo o povo, disse: O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos
filhos‖ (27.22-25).
É interessante, neste trecho de Mateus, que o povo espontaneamente e até
temerariamente assume a responsabilidade pela morte de Jesus. Invocam uma
imprecação sobre si mesmos e seus filhos, tal é a certeza de que estão condenando
um culpado e não um inocente. Pedro acrescenta um detalhe que não há nos
Evangelhos: além de Pilatos ter lavado as mãos, fala que os judeus e Herodes se
negaram a fazê-lo. E Herodes, incontinenti, dá o veredicto final.

3-5, 23-24: José sepulta Jesus


3. Ora estava ali José, amigo de Pilatos e do Senhor. E, sabendo que o haveriam de
crucificar, foi a Pilatos e lhe pediu o corpo do Senhor para sepultamento. 4. E Pilatos o
enviou a Herodes para que lhe pedisse o corpo. 5. E Herodes disse: ―Irmão Pilatos, ainda
que ninguém o tivesse pedido, nós o teríamos sepultado, uma vez que o sábado se
aproxima e está escrito na lei que O sol não se ponha sobre o condenado à morte‖. E o
entregou ao povo para a véspera dos ázimos, a festa deles (...) 23. Alegraram-se, destarte,
os judeus e deram o corpo dele a José para que o sepultasse, sendo ele testemunha de todo
o bem que fizera. 24. Tomando, então, o Senhor, lavou-o, e o envolveu em um lençol e o
depositou em seu próprio sepulcro, chamado jardim de José.

Este evento é mencionado em todos os quatro Evangelhos, conforme


citaremos a seguir. Há algumas diferenças em cada narrativa: Mateus detalha que

15
o lençol que enrolou o corpo de Jesus era ―limpo‖ e que José era ―rico‖, mas é o
único que não se importa em falar que era o dia da preparação para o sábado;
Marcos enfatiza que José era ―honrado‖ e que falou com Pilatos ―ousadamente‖.
Também apenas Marcos relata que Pilatos se maravilhou de Jesus ter
morrido tão rápido e somente João afirma que Nicodemus acompanhou José no
sepultamento. Lucas, tendo escrito para gentios, foi o único que explicou que
Arimatéia era uma ―cidade dos judeus‖.
O evangelho de Pedro é o que oferece menos detalhes, mas acrescenta uma
informação que não há nos Evangelhos: que Pilatos enviou José a Herodes para
pedir o corpo e que José não era apenas amigo de Jesus, mas também de Pilatos.
Por fim, informa que o nome do sepulcro era ―Jardim de José‖. Na
sequência dos quatro Evangelhos, José pediu o corpo logo após a crucifixão e foi
ele mesmo quem desceu Jesus da cruz para sepultá-lo.
Em Pedro, José pede por antecipação o corpo e, no final do livro, os judeus
retiram o Senhor da cruz e o entregam a José. Uma última diferença está na pedra
rolada no sepulcro. Nos Evangelhos foi José quem ordenou que rolassem a pedra.
Em Pedro, foram os judeus, temendo que o corpo fosse saqueado.
A seguir, os respectivos trechos dos Evangelhos e, após, uma tabela
sinótica, unindo os detalhes de cada autor para formar uma síntese. Nesta tabela
poder-se-á observar onde cada autor concorda com os demais e onde acrescenta
detalhes únicos.
Mateus. ―E, vinda já a tarde, chegou um homem rico, de Arimatéia, por
nome José, que também era discípulo de Jesus. Este foi ter com Pilatos, e pediu-
lhe o corpo de Jesus. Então Pilatos mandou que o corpo lhe fosse dado. E José,
tomando o corpo, envolveu-o num fino e limpo lençol, e o pós no seu sepulcro
novo, que havia aberto em rocha, e, rodando uma grande pedra para a porta do
sepulcro, retirou-se‖ (27.57-58).
Marcos. ―E, chegada a tarde, porquanto era o dia da preparação, isto é, a
véspera do sábado, chegou José de Arimatéia, senador honrado, que também
esperava o reino de Deus, e ousadamente foi a Pilatos, e pediu o corpo de Jesus. E
Pilatos se maravilhou de que já estivesse morto. E, chamando o centurião,
perguntou-lhe se já havia muito que tinha morrido. E, tendo-se certificado pelo
centurião, deu o corpo a José; o qual comprara um lençol fino, e, tirando-o da
cruz, o envolveu nele, e o depositou num sepulcro lavrado numa rocha; e revolveu
uma pedra para a porta do sepulcro‖ (15.42-46).
Lucas. ―E eis que um homem por nome José, senador, homem de bem e
justo, que não tinha consentido no conselho e nos atos dos outros, de Arimatéia,
cidade dos judeus, e que também esperava o reino de Deus; esse, chegando a
Pilatos, pediu o corpo de Jesus. E, havendo-o tirado, envolveu-o num lençol, e pô-
lo num sepulcro escavado numa penha, onde ninguém ainda havia sido posto. E
era o dia da preparação, e amanhecia o sábado‖ (23.50-54).
João. ―Depois disto, José de Arimatéia (o que era discípulo de Jesus, mas
oculto, por medo dos judeus) rogou a Pilatos que lhe permitisse tirar o corpo de
Jesus. E Pilatos lho permitiu. Então foi e tirou o corpo de Jesus. E foi também
Nicodemos (aquele que anteriormente se dirigira de noite a Jesus), levando quase
cem arráteis de um composto de mirra e aloés. Tomaram, pois, o corpo de Jesus e
o envolveram em lençóis com as especiarias, como os judeus costumam fazer, na
preparação para o sepulcro. E havia um horto naquele lugar onde fora crucificado,
e no horto um sepulcro novo, em que ainda ninguém havia sido posto. Ali, pois

16
(por causa da preparação dos judeus, e por estar perto aquele sepulcro), puseram a
Jesus‖ (19.38-42).

TABELA SINÓTICA DAS CINCO NARRATIVAS DO SEPULTAMENTO


Mt Mc E vinda a tarde,
Mc Lc Jo Pe porquanto era o dia da preparação, a véspera do sábado,
Mt Lc chegou um homem
Mt rico
Mt Mc Lc Jo Pe chamado José
Mt Mc Lc Jo de Arimatéia,
Lc cidade dos judeus,
Mc Lc senador
Mc honrado,
Lc homem de bem e justo, que não tinha consentido no conselho e nos
atos dos outros,
Mt Jo que também era discípulo de Jesus,
Jo mas oculto, por medo dos judeus,
Mc Lc e que também esperava o reino de Deus.
Pe Ele era amigo de Pilatos e do Senhor. E, sabendo que o crucificariam,
Mt Lc Pe foi ter com Pilatos,
Mc ousadamente,
Mt Mc Lc Jo Pe e pediu-lhe o corpo de Jesus.
Pe E Pilatos o enviou a Herodes para que lhe pedisse o corpo. E Herodes
disse: ―Irmão Pilatos, ainda que ninguém o tivesse pedido, nós o
teríamos sepultado, uma vez que o sábado se aproxima e está escrito na
lei que O sol não se ponha sobre o condenado à morte‖.
Mc E Pilatos se maravilhou de que já estivesse morto. E, chamando o
centurião, perguntou-lhe se já havia muito que tinha morrido. E, tendo-
se certificado pelo centurião,
Mt Mc Jo Pilatos mandou que o corpo fosse dado a José.
Pe Alegraram-se, destarte, os judeus e deram o corpo dele a José para que
o sepultasse, sendo ele testemunha de todo o bem que fizera.
Jo E foi também Nicodemos (aquele que anteriormente se dirigira de noite
a Jesus), levando quase cem arráteis de um composto de mirra e aloés.
Mc Lc Jo E, tirando-o da cruz,
Mt Jo Pe e tomando o corpo,
Mt Mc Lc Jo Pe envolveu-o num lençol
Mt Mc fino
Mt e limpo
Mc que comprara,
Jo com as especiarias, como os judeus costumam fazer, na preparação
para o sepulcro,
Mt Mc Lc Jo Pe e o pôs no sepulcro
Mt Jo novo,
Mt Pe que era seu próprio,
Pe chamado Jardim de José,
Lc Jo onde ninguém ainda havia sido posto,
Mt Mc Lc Jo lavrado numa rocha.
Mt Mc E, rodando uma grande pedra para a porta do sepulcro,
Mt retirou-se.

5a: A amizade entre Pilatos e Herodes


5. E Herodes disse: ―Irmão Pilatos...‖

Segundo os evangelhos, a amizade de Pilatos com Herodes surgiu em meio


ao julgamento de Jesus. Sabendo que Jesus era Galileu, Pilatos, diplomaticamente,
enviou-o a Herodes, que era da jurisdição da Galiléia, e estava em Jerusalém

17
naqueles dias. Herodes ficou muito satisfeito com a atitude, pois tinha curiosidade
em conhecer o tal profeta e quem sabe ver algum milagre. Tendo interrogado
Jesus, Herodes devolveu o réu a Pilatos. Esta troca de diplomacias resolveu as
desavenças entre os dois governantes a ponto de se tratarem agora como irmãos.
Quem conta esta história é Lucas. ―Então Pilatos, ouvindo falar da
Galiléia perguntou se aquele homem era galileu. E, sabendo que era da jurisdição
de Herodes, remeteu-o a Herodes, que também naqueles dias estava em
Jerusalém. E Herodes, quando viu a Jesus, alegrou-se muito; porque havia muito
que desejava vê-lo, por ter ouvido dele muitas coisas; e esperava que lhe veria
fazer algum sinal. E interrogava-o com muitas palavras, mas ele nada lhe
respondia. E estavam os principais dos sacerdotes, e os escribas, acusando-o com
grande veemência. E Herodes, com os seus soldados, desprezou-o e, escarnecendo
dele, vestiu-o de uma roupa resplandecente e tornou a enviá-lo a Pilatos. E no
mesmo dia, Pilatos e Herodes entre si se fizeram amigos; pois dantes andavam em
inimizade um com o outro‖ (23.6-12).

5b: A lei da crucifixão


....está escrito na lei que ―O sol não se ponha sobre o condenado à morte‖.

Segundo Pedro, o próprio Herodes, um gentio, conhecia a lei judaica que


não permitia que um crucificado permanecesse insepulto na virada do dia,
principalmente a véspera do sábado, o dia sagrado. No Novo Testamento, são os
judeus quem reclamam o cumprimento desta lei, como se lê em João: ―Os judeus,
pois, para que no sábado não ficassem os corpos na cruz, visto como era a
preparação (pois era grande o dia de sábado), rogaram a Pilatos que se lhes
quebrassem as pernas, e fossem tirados‖ (19.31).
A lei a respeito está no Deuteronômio: ―O seu cadáver não permanecerá
no madeiro, mas certamente o enterrarás no mesmo dia; porquanto o pendurado é
maldito de Deus‖ (21.23). Quanto à citação de Herodes, ―O sol não se ponha
sobre o condenado à morte‖, pode ser uma paráfrase do texto de Josué que diz
que ―ao pôr do sol, deu Josué ordem que os tirassem dos madeiros‖ (10.27).

5c: A festa dos ázimos


E o entregou ao povo para a véspera dos ázimos, a festa deles.

Ázimos ou asmos (em grego: azumov) são pães preparados sem fermento e
dão nome à festa judaica que ocorre durante a páscoa (Mt 26.17; Mc 14.1,12; Lc
22.1,7). Foi instituída por Moisés para lembrar o dia em que os judeus saíram do
Egito às pressas, cozinhando, por isto, os pães sem fermento (Ex 12.15-20). Se a
páscoa para os cristãos representa a ressurreição de Cristo, para os judeus está
relacionada à sua libertação do Egito.

6-9: As humilhações do Messias


6. Então eles, tomando o Senhor e o empurrando, diziam: ―Arrastemos o filho de Deus,
agora que nos apoderamos dele‖. 7. E o vestiram com púrpura e fizeram-no sentar-se
numa cátedra da tribuna, dizendo: ―Julga retamente, ó rei de Israel!‖ 8. E um deles trouxe
uma coroa de espinhos e a colocou sobre a cabeça do Senhor. 9. E outros que ali estavam
cuspiram-lhe nos olhos; aqueloutros lhe batiam nas faces, outros o espancavam com uma
vara e alguns o flagelavam, dizendo: ―Com esta honra, honramos o filho de Deus‖.

Nos Evangelhos, apenas Mateus e Marcos contam que os soldados


romanos humilharam a Jesus antes de sua crucifixão. Vestem-no com púrpura,
18
como caricatura para uma veste real, dão-lhe um bastão representando o cetro e
enfiam-lhe uma coroa de espinhos. Então o espancam, cospem e zombam. As
duas versões são praticamente idênticas.
Quanto a Pedro, sua versão denuncia um tom antijudaico, pois, em vez dos
guardas romanos, são os judeus a maltratar o Messias e com uma temeridade
ainda maior, pois, enquanto os soldados zombavam do ―Rei dos judeus‖, os
judeus referem-se ao ―filho de Deus‖.
A seguir, os respectivos trechos de Mateus e Marcos para fins de
comparação.
Mateus. ―E logo os soldados do presidente, conduzindo Jesus à audiência,
reuniram junto dele toda a coorte. E, despindo-o, o cobriram com uma capa de
escarlate; E, tecendo uma coroa de espinhos, puseram-lha na cabeça, e em sua
mão direita uma cana; e, ajoelhando diante dele, o escarneciam, dizendo: Salve,
Rei dos judeus. E, cuspindo nele, tiraram-lhe a cana, e batiam-lhe com ela na
cabeça. E, depois de o haverem escarnecido, tiraram-lhe a capa, vestiram-lhe as
suas vestes e o levaram para ser crucificado‖ (27.27-31).
Marcos. ―E os soldados o levaram dentro à sala, que é a da audiência, e
convocaram toda a coorte. E vestiram-no de púrpura, e tecendo uma coroa de
espinhos, lha puseram na cabeça. E começaram a saudá-lo, dizendo: Salve, Rei
dos Judeus! E feriram-no na cabeça com uma cana, e cuspiram nele e, postos de
joelhos, o adoraram. E, havendo-o escarnecido, despiram-lhe a púrpura, e o
vestiram com as suas próprias vestes; e o levaram para fora a fim de o
crucificarem‖ (15.16-20).
No verso 9, o autor recorre a três palavras para se referir aos grupos de
pessoas que maltratavam Jesus: ―E outros (eteroi) que ali estavam cuspiram-lhe
nos olhos; aqueloutros (alloi) lhe batiam nas faces, outros (eteroi) o
espancavam com uma vara e alguns (tinev) o flagelavam‖. Evidente que ele fez
isto apenas com propósitos estilísticos, para evitar repetição enfadonha de um
mesmo termo. Procurei manter o mesmo estilo na tradução.

10: O silêncio de Jesus


10. E trouxeram dois malfeitores e crucificaram o Senhor no meio deles. Ele, todavia, se
calava, como se não sentisse dor.

Os evangelistas Mateus e João registraram o silêncio de Jesus diante dos


sacerdotes que o acusavam (Mt 26.63; 27.12,14; Jo 19.9). Por outro lado, mostram
o Messias a pronunciar-se diversas vezes, desde o interrogatório até o último
suspiro na cruz.
Segundo os Evangelhos, Jesus teria falado sete vezes na cruz, sendo que
Mateus e Marcos registram apenas uma fala; Lucas três e João três, conforme
segue:
1. Pede perdão ao Pai em favor de seus assassinos. ―Pai, perdoa-lhes,
porque não sabem o que fazem‖ (Lc 23.34).
2. Promete o paraíso ao ladrão da cruz. ―Em verdade te digo que hoje
estarás comigo no Paraíso‖ (Lc 23.43).
3. Deixa sua mãe Maria aos cuidados de João. ―Mulher, eis aí o teu filho...
Eis aí tua mãe‖ (Jo 19.26-27).
4. Solta um brado, clamando a Deus. ―Elí, Elí, lamá sabactáni?‖ (Mt
27.46; Mc 15.34).
5. Diz: ―Tenho sede‖ (Jo 19.28).

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6. Diz: ―Está consumado‖ (Jo 19.30).
7. No último suspiro: ―Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito‖ (Lc
23.46).
Convém observar que a primeira fala (―Pai, perdoa-lhes...‖) não está
presente nos Códices Sinaítico, Vaticano, Beza, Freeriano e Tiflis, mas consta no
Códice Alexandrino e na maioria dos demais manuscritos.
Pedro retrata um comportamento totalmente diferente, registrando um
Jesus que se mantém em silêncio até o fim. Não apenas um silêncio de palavras,
mas também de gemidos. Enquanto o Cristo dos Evangelhos sofre e grita de dor,
em Pedro ele é sereno ―como se não sentisse dor‖, pois o Cristo, segundo a visão
docética de Pedro, era imune aos sofrimentos físicos.

11: “Este é o rei de Israel”


11. E, quando ergueram a cruz, escreveram no alto: ―Este é o rei de Israel‖.

Para Mateus (―Este é Jesus, o Rei dos judeus‖, 27.37), Marcos (―O Rei
dos judeus‖, 15.26) e Lucas (―Este é o Rei dos judeus‖, 23.38), foram os soldados
romanos que afixaram a inscrição no topo da cruz.
João delonga-se em mais detalhes acerca disto. ―E Pilatos escreveu
também um título, e pô-lo em cima da cruz; e nele estava escrito: JESUS
NAZARENO, O REI DOS JUDEUS. E muitos dos judeus leram este título;
porque o lugar onde Jesus estava crucificado era próximo da cidade; e estava
escrito em hebraico, grego e latim. Diziam, pois, os principais sacerdotes dos
judeus a Pilatos: Não escrevas, O Rei dos Judeus, mas que ele disse: Sou o Rei
dos Judeus. Respondeu Pilatos: O que escrevi, escrevi‖ (19.19-22).
Para João, foi o próprio Pilatos quem fez a inscrição e ainda usando três
línguas, numa prova de erudição do governante. Os sacerdotes judeus discordaram
do teor da placa, pois não deixava claro que o título de Rei dos judeus era
reivindicado por Jesus sem o consentimento deles. Pedro mais uma vez apresenta
uma versão bem diferente, segundo a qual a inscrição fora posta pelos próprios
judeus e não pelos romanos. A participação dos romanos no evangelho de Pedro,
aliás, é anódina.

12: As vestes sorteadas


12. E, depositando as vestes diante dele, dividiam-nas e lançavam sorte sobre elas.

A roupa púrpura que foi usada para vestir Jesus de falso rei não deveria ser
de um tecido ordinário, pois serviu de despojo aos guardas. Todos os quatro
evangelistas registram o evento, que seria um cumprimento da profecia do Salmo
―Repartem entre si as minhas vestes, e lançam sortes sobre a minha roupa‖
(22.18). Robinson e James observam que a palavra lacmov, usada por Pedro para
―sortes‖ é rara na literatura grega. Os Evangelhos preferem klhrov.
Mateus e João comentam que isto seria o cumprimento de uma profecia;
Marcos e Lucas são mais concisos. Curiosamente, Marcos e Lucas, discípulos,
respectivamente, de Pedro e Paulo, não teriam mesmo muitos detalhes a registrar
uma vez que não foram testemunhas oculares da Paixão, antes escreveram aquilo
que ouviram de seus mestres. Mateus talvez não estivesse presente, pois muitos
discípulos de Jesus se refugiaram no momento.
João, por sua vez, era com razão o que tinha mais pormenores a relatar,
pois estava ao pé da cruz. Assim seu Evangelho nos dá o número de soldados

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presentes (quatro), pois dividiram as roupas em quatro partes, ―para cada soldado
uma parte‖; consegue distinguir as peças da vestimenta, roupa (imatia) e túnica
(citwna), e até revela o diálogo que tiveram a respeito.
Pedro substitui os guardas pelos judeus na cena e acrescenta um pequeno
detalhe: que as vestes foram postas diante do crucificado no momento do sorteio.
Por isto um dos malfeitores que estava na cruz repreendeu a zombaria.
Mateus. ―E, havendo-o crucificado, repartiram as suas vestes, lançando
sortes, para que se cumprisse o que foi dito pelo profeta: Repartiram entre si as
minhas vestes, e sobre a minha túnica lançaram sortes‖ (27.35).
Marcos. ―E, havendo-o crucificado, repartiram as suas vestes, lançando
sobre elas sortes, para saber o que cada um levaria‖ (15.24).
Lucas. ―E, repartindo as suas vestes, lançaram sortes‖ (23.34).
João. ―Tendo, pois, os soldados crucificado a Jesus, tomaram as suas
vestes, e fizeram quatro partes, para cada soldado uma parte; e também a túnica.
A túnica, porém, tecida toda de alto a baixo, não tinha costura. Disseram, pois,
uns aos outros: Não a rasguemos, mas lancemos sortes sobre ela, para ver de
quem será. Para que se cumprisse a Escritura que diz: Repartiram entre si as
minhas vestes, E sobre a minha vestidura lançaram sortes‖ (19.23-24).

10,13-14: Os dois malfeitores


10. E trouxeram dois malfeitores e crucificaram o Senhor no meio deles... 13. Mas um
daqueles malfeitores o repreendeu, dizendo: ―Nós sofremos assim por causa dos maus
atos que praticamos. Este, porém, que se tornou salvador dos homens, que injustiça vos
fez?‖ 14. Indignados contra ele, ordenaram que não lhe fossem quebradas as pernas de
modo que morresse entre tormentos.

O diálogo dos dois malfeitores que foram crucificados ao lado de Jesus é


descrito por Lucas. ―E um dos malfeitores que estavam pendurados blasfemava
dele, dizendo: Se tu és o Cristo, salva-te a ti mesmo, e a nós. Respondendo,
porém, o outro, repreendia-o, dizendo: Tu nem ainda temes a Deus, estando na
mesma condenação? E nós, na verdade, com justiça, porque recebemos o que os
nossos feitos mereciam; mas este nenhum mal fez. E disse a Jesus: Senhor,
lembra-te de mim, quando entrares no teu reino. E disse-lhe Jesus: Em verdade te
digo que hoje estarás comigo no Paraíso‖ (23.39-43).
Em Lucas, um dos malfeitores repreende o outro; em Pedro, repreende aos
judeus que repartiam as vestes de Jesus, o que é mais uma evidência de que a todo
momento o evangelho petrino pretende atacar os judeus. Para agravar a situação,
estes ainda demonstram certo sadismo ao se vingar do homem que os critica:
mandam que não se lhe quebrem as pernas para que a morte fosse mais demorada.
A prática de quebrar as pernas dos crucificados (chamada pelos romanos
de crurifragium) servia para apressar a morte, pois o corpo ficaria suspenso
apenas pelos braços, sem a sustentação das pernas, e este peso causaria o
sufocamento e consequente morte por asfixia.
Em João, contrariamente ao relato de Pedro, os judeus pediram que se
quebrassem as pernas dos três crucificados, pois o sábado estava quase
começando. ―Os judeus, pois, para que no sábado não ficassem os corpos na cruz,
visto como era a preparação (pois era grande o dia de sábado), rogaram a Pilatos
que se lhes quebrassem as pernas, e fossem tirados. Foram, pois, os soldados, e,
na verdade, quebraram as pernas ao primeiro, e ao outro que como ele fora
crucificado; Mas, vindo a Jesus, e vendo-o já morto, não lhe quebraram as
pernas‖ (19.31-33).

21
15,18,22: As trevas cobrem a Judéia
15. Ora, era meio-dia e as trevas cobriram toda a Judéia. Eles se agitavam e se
preocupavam, julgando o sol já posto, pois ele ainda estava vivo. E está escrito para eles:
―Não se ponha o sol sobre o condenado à morte‖... 18. Assim muitos andavam com
luzeiros, pensando que fosse noite, alguns tropeçando... 22. Brilhou o sol e reconheceram
que era a nona hora. 23. Alegraram-se, destarte, os judeus e deram o corpo dele a José
para que o sepultasse, sendo ele testemunha de todo o bem que fizera.

Diz Pedro que ao meio-dia (meshmbria) toda a Judéia se escureceu. Nos


Evangelhos, isto aconteceu na hora sexta, durando três horas (Mt 27.45; Mc
15.33; Lc 23.44. João nada diz a respeito). De fato, a hora sexta judaica equivale
ao meio-dia romano, de modo que não há diferença entre Pedro e os Evangelhos.
No verso 22, Pedro diz que a escuridão terminou na ―hora nona‖, em
conformidade com os Evangelhos, o que também deixa claro que, ao falar em
―meio-dia‖, quis ele referir-se à hora sexta.
Os Evangelhos não fazem caso da reação do povo diante deste
enegrecimento do dia. Pedro observa que os judeus ficaram preocupados em
terminar a crucificação, julgando que o dia estava no fim, e as pessoas, confusas,
usavam tochas ou andavam aos tropeços na escuridão.

16-17: Vinagre e fel


16. E um deles disse: ―Dai-lhe de beber fel com vinagre‖. E fizeram um mistura dando-
lhe de beber. 17. E consumaram tudo, e completaram sobre suas cabeças a medida de seus
pecados.

Mateus relata que primeiro foi oferecido vinho (oinon) com fel (colhv)
(27.34). Nos Códices Alexandrino e Freeriano, porém, está escrito ―vinagre‖
(oxov). Para Marcos, era uma mistura de vinho com mirra (esmurnismenon
oinon) (15.23). Esta primeira oferta, antes da crucificação, era um ―favor‖ que se
fazia aos condenados, pois a mistura tinha propriedades sedativas. Jesus, porém,
não quis beber esta primeira vez.
A segunda vez foi durante a maior agonia dos crucificados. Tendo Jesus
clamado por Eli (Deus), os romanos entenderam Elias (o profeta) e, julgando que
ele estava na última agonia, embeberam vinagre numa esponja e levaram à sua
boca, usando um bastão (Mt 27.49; Mc 15.36). Lucas diz que estes mesmos
guardas, ao aproximar-se do Messias para oferecer-lhe a bebida, também o
criticavam: ―Se tu és o Rei dos Judeus, salva-te a ti mesmo‖ (23.36).
João esclarece que esta cena é o cumprimento de uma profecia. ―Depois,
sabendo Jesus que já todas as coisas estavam terminadas, para que a Escritura se
cumprisse, disse: Tenho sede. Estava, pois, ali um vaso cheio de vinagre. E
encheram de vinagre uma esponja, e, pondo-a num hissope, lha chegaram à
boca. E, quando Jesus tomou o vinagre, disse: Está consumado. E, inclinando a
cabeça, entregou o espírito‖ (Jo 19.28-30). A profecia está nos Salmos: ―Deram-
me fel por mantimento, e na minha sede me deram a beber vinagre‖ (69.21).
Pedro também destaca que este foi um momento de cumprimento
profético, mas, na sua ordem dos eventos, a bebida foi dada a Jesus antes de seu
último brado e não depois, como afirmam os Evangelhos.

19a: O último brado


19. E o Senhor bradou, dizendo: ―Minha força, ó força, tu me abandonaste!‖

22
No caso do evangelho de Pedro, esta foi não somente a última declaração
de Cristo na cruz, como também a única. Até então se havia mantido em sereno
silêncio. Sobre as sete vezes em que Jesus falou, ver comentário no verso 10.
O dramático clamor nos Evangelhos, ―Deus meu, Deus meu, por que me
desamparaste?‖ (Mt 27.46; Mc 15.34, com base em Sl 22.1), é, em Pedro,
substituído por ―Minha força, ó força, tu me abandonaste!‖, pois o docetismo não
concordaria com a ideia de Cristo sendo abandonado por Deus.
Ainda outro pode ser o motivo pelo qual Pedro usa ―minha força‖ em vez
de ―meu Deus‖. Eusébio de Cesaréia, comentando o Salmo 22, onde pela primeira
vez apareceu este clamor, observa que Aquila, que fez uma tradução literal do
Salmo para o grego, usou as palavras ―minha força, minha força‖ (iscure mou,
iscure mou), pois o texto em hebraico trazia a palavra Eli (yla) e não Elohi
(yhla, Deus), o que poderia ser confundido com El (la), que significa força. Da
mesma forma, Pedro pode ter recorrido a uma versão grega do Salmo que
trouxesse tal tradução.

19b: A morte
E assim falando, foi levado.

Para Mateus, Jesus ―rendeu o espírito‖ (27.50). Marcos laconicamente diz


que ―expirou‖ (15.37), idem Lucas (23.46). João faz uma descrição mais
cuidadosa: ―E, inclinando a cabeça, entregou o espírito‖ (19.30). Pedro não se
satisfaz com este fim tão pouco divino do Cristo, de modo que usa os termos ―foi
levado‖.

20: O véu do templo se rasga


20. Na mesma hora o véu do templo de Jerusalém se rasgou em duas partes.

O fato de ele explicar que se trata do véu do templo ―de Jerusalém‖


evidencia que o autor escrevera para leitores de fora da Palestina, uma vez que
seria redundante dizer para um leitor palestino que o véu rasgado era do templo
em Jerusalém.
Três dos quatro evangelistas registram este fenômeno (Mt 27.51; Mc
15.38; Lc 23.45). Havia no templo de Jerusalém um compartimento chamado de
―santo dos santos‖, que era separado do resto do templo por uma cortina. Foi esta
cortina que se rasgou, como um sinal divino.
A carta aos Hebreus, no capítulo 10, interpreta o ocorrido como um
símbolo segundo o qual o véu representava a separação entre o homem e Deus e o
rasgar-se do véu significa que Cristo pôs fim a esta separação.

21a: Os pregos das mãos do Senhor


21. Tiraram os pregos das mãos do Senhor.

Um detalhe interessante é que também Pedro não registra que houvesse


pregos nos pés do crucificado, mas somente nas mãos. No Evangelho de João, a
única referência aos pregos está na cena em que Tomé duvida da ressurreição e
diz: ―Se eu não vir o sinal dos cravos em suas mãos, e não puser o dedo no lugar
dos cravos, e não puser a minha mão no seu lado, de maneira nenhuma o crerei‖
(20.24; cf. 20.27). Ou seja, os Evangelhos também não falam em pregos nos pés.

23
O fato de o crucificado perder o apoio quando se lhe quebram as pernas
também pode dar a entender que ele não tem os pés pregados, mas apoiados sobre
uma base anexa à cruz. Deveras, algumas ilustrações medievais apresentam os
crucificados com os pés sobre uma pequena base.

21b: A terra treme


E a terra toda tremeu e houve grande medo.

A natureza parece reagir à morte do Cristo. Primeiro o céu escureceu,


depois o véu do templo se rasgou, por fim, a terra treme quando o corpo do
Messias é deitado. Mateus é o único que descreve com detalhes esta sequência de
fenômenos, acrescentando uma incomum ressurreição de mortos: ―E eis que o véu
do templo se rasgou em dois, de alto a baixo; e tremeu a terra, e fenderam-se as
pedras; e abriram-se os sepulcros, e muitos corpos de santos que dormiam foram
ressuscitados; e, saindo dos sepulcros, depois da ressurreição dele, entraram na
cidade santa, e apareceram a muitos‖ (27.51-53).

25-27: As lamentações de todos


25. Então os judeus, os anciãos e os sacerdotes, compreendendo o grande mal que fizeram
a si mesmos, lamentaram, batendo no peito e dizendo: ―Ai de nossos pecados! É chegado
o juízo e o fim de Jerusalém!‖ 26. Eu e meus amigos estávamos tristes e, de ânimo
abatido, nos escondíamos. Estávamos sendo procurados por eles como malfeitores e como
aqueles que queriam incendiar o templo. 27. Por causa de tudo isto, jejuávamos e ficamos
sentados, lamentando e chorando noite e dia, até o sábado.

Nos Evangelhos, o primeiro a reconhecer que a crucificação de Cristo era


um erro foi o centurião, após os fenômenos da escuridão e do tremor. ―E o
centurião e os que com ele guardavam a Jesus, vendo o terremoto, e as coisas que
haviam sucedido, tiveram grande temor, e disseram: Verdadeiramente este era
Filho de Deus‖ (Mt 27.54; cf. Mc 15.39; Lc 23.47). Depois, o povo: ―E toda a
multidão que se ajuntara a este espetáculo, vendo o que havia acontecido, voltava
batendo nos peitos‖ (Lc 23.48; cf. Pe 28). Somente Pedro afirma que também os
líderes judeus se arrependeram e lamentaram.
Uma versão em latim do Evangelho, o Codex S. Germanensis, traz o
seguinte acréscimo ao texto de Lc 23.48: ―Vae nobis, quae facta sunt hodie
propter peccata nostra; apropinquauit enim desolatio Hierusalem‖ (Ai de nós, o
que fizemos hoje pelos nossos pecados! Aproxima-se a destruição de Jerusalém).
Desde quando Jesus fora preso, os discípulos se refugiaram, temendo os
guardas e os opositores de Cristo (Mt 26.56; Mc 14.50). Pedro ainda passaria por
um constrangimento maior, ao negar a Cristo três vezes (Mt 26.69-75; Mc 14.66-
72; Lc 22.54-62; Jo 18.25-27). O evangelho de Pedro se mostra condescendente
com esta covardia dos discípulos, explicando que se escondiam porque se
tornaram foras-da-lei e estavam abatidos de tristeza, jejuando e lamentando até o
dia da ressurreição.

28-33: A guarda do sepulcro


28. Ora, reuniram-se os escribas, os fariseus e os anciãos, ouvindo que todo o povo
murmurava e lamentava, batendo no peito e dizendo: ―Se na sua morte se realizaram
sinais tão grandes, vede quanto ele era justo!‖ 29. Os anciãos tiveram medo e foram a
Pilatos, pedindo-lhe e falando: 30. ―Dá-nos soldados para que seu túmulo seja vigiado por
três dias. Que não aconteça que seus discípulos venham roubá-lo e o povo acredite que
ele tenha ressuscitado dos mortos e nos faça mal‖. 31. Então Pilatos deu-lhes o centurião
Petrônio com soldados para vigiar o sepulcro e com eles foram ao túmulo os anciãos e os

24
escribas. 32. E todos os que ali estavam com o centurião e os soldados rolaram uma
grande pedra 33. e a colocaram na entrada do túmulo. Nela imprimiram sete selos. E
ergueram ali uma tenda e montaram guarda.

Apenas Mateus menciona esta precaução dos judeus, como segue: ―E no


dia seguinte, que é o dia depois da Preparação, reuniram-se os príncipes dos
sacerdotes e os fariseus em casa de Pilatos, Dizendo: Senhor, lembramo-nos de
que aquele enganador, vivendo ainda, disse: Depois de três dias
ressuscitarei. Manda, pois, que o sepulcro seja guardado com segurança até ao
terceiro dia, não se dê o caso que os seus discípulos vão de noite, e o furtem, e
digam ao povo: Ressuscitou dentre os mortos; e assim o último erro será pior do
que o primeiro. E disse-lhes Pilatos: Tendes a guarda; ide, guardai-o como
entenderdes. E, indo eles, seguraram o sepulcro com a guarda, selando a pedra‖
(27.62-66).
Pedro repete a história, acrescentando que os judeus pretendiam vigiar o
sepulcro não apenas por receio dos discípulos de Jesus, mas também do próprio
povo. Também acrescenta mais detalhes à cena: o nome do centurião encarregado
da missão, Petrônio; os sete selos com que marcaram a pedra sobre o sepulcro e a
tenda que os guardas montaram para permanecerem ali por três dias.
É a primeira vez que o evangelho petrino menciona os guardas que, até
então, não estiveram presentes nem na crucificação nem nas cenas de zombaria
que Pedro atribui exclusivamente aos judeus. Quanto ao nome do centurião,
Mateus nada diz. A igreja, por tradição, conhecia como Longinus o centurião que
perfurou Jesus com uma lança, popularmente conhecido no Brasil como São
Longuinho. Esse é mencionado nos Atos de Pilatos. Nos Atos de S. Hermione,
Petrônio é o nome de um discípulo de Pedro.
Em Mateus e Marcos, quem ordenou que se rolasse uma pedra na entrada
do sepulcro foi José de Arimatéia (ver comentário nos versos 3-5). Pedro atribui a
ação aos soldados romanos por ordem dos líderes judeus.

Parte II – A Ressurreição
A primeira metade do livro tratara da crucificação do Senhor. Agora toda a
metade restante desenvolve o tema da ressurreição. O espaço ocupado por cada
parte é praticamente igual, demonstrando um certo talento do escritor na
distribuição do assunto, pois este é o tema do evangelho de Pedro: a morte e
ressurreição do Senhor.
Outros evangelhos apócrifos, como o de Tomé, concentram-se nos
sermões de Cristo ou em revelar sua infância ou sua relação com os discípulos.
Pedro se concentrou simplesmente no clímax do tema cristão, o centro de toda a
história evangélica que é a semana da Páscoa.

34-37: O túmulo aberto


34. Então pela manhã, aproximando-se o sábado, veio uma multidão de Jerusalém e das
vizinhanças para ver o túmulo selado. 35. E à noite, ao aproximar-se o dia do Senhor,
vigiando os soldados em turnos de dois em dois, uma grande voz se fez no céu 36. e
viram abrir-se os céus e dois homens desceram, tendo muito esplendor, e aproximaram-se
do túmulo. 37. Então aquela pedra que fora colocada em frente à entrada rolou donde
estava para o lado. E o sepulcro se abriu e ambos os jovens entraram.

25
Uma espécie de romaria se formara no sábado de manhã para ir visitar o
túmulo de Jesus. À noite, os soldados presenciaram uma teofania envolvendo a
abertura do túmulo, o que somente Pedro e Mateus descrevem. Marcos, Lucas e
João falam apenas do momento em que chegam as Marias e encontram o túmulo
já aberto.
Mateus. ―E eis que houvera um grande terremoto, porque um anjo do
Senhor, descendo do céu, chegou, removendo a pedra da porta, e sentou-se sobre
ela. E o seu aspecto era como um relâmpago, e as suas vestes brancas como
neve. E os guardas, com medo dele, ficaram muito assombrados, e como mortos‖
(28.2-4).
Para Mateus apareceu apenas um anjo, para Pedro, dois. Lucas também
registra dois anjos, mas só no momento em que aparecem a Madalena (Lc 24.4).
Aqui é Mateus quem supera Pedro na riqueza de detalhes, descrevendo os anjos
como vestidos de roupas brancas e uma aparência reluzente como o relâmpago.
O termo ―dia do Senhor‖ (h kuriakh), obviamente, popularizou-se a
partir do segundo século, por relacionar o primeiro dia da semana à ressurreição
do Senhor. Daí o latim Dies Domenica (Dia do Senhor), donde o português
Domingo. Não era ainda comum na literatura do primeiro século, de modo que
não é usado nos Evangelhos. O Apocalipse, sendo um escrito tardio, já utiliza a
expressão (1.10). Pedro usa ―h kuriakh‖ duas vezes, nos versos 36 e 50.

38-42: Jesus se manifesta aos guardas


38. Vendo isto, os soldados foram acordar o centurião e os anciãos, pois também estes
estavam a vigiar. 39. E enquanto lhes contavam o que viram, novamente avistaram três
homens saindo do sepulcro, e dois deles escoravam o outro e uma cruz os estava
seguindo. 40. E a cabeça dos dois homens alcançava o céu, enquanto a daquele que
conduziam pela mão superava os céus. 41. E uma voz se ouviu no céu que disse:
―Pregaste aos que dormem?‖ 42. E uma resposta se ouviu da cruz: ―Sim‖.

Esta parte é exclusiva de Pedro, nada constando nos Evangelhos. Após o


susto inicial, que os deixou ―assombrados, e como mortos‖, os guardas foram
acordar o centurião Petrônio e os líderes judeus que também montavam guarda.
Os dois anjos que entraram no sepulcro agora saiam acompanhados de
uma terceira pessoa, que amparavam, ou seja, carregavam apoiando-a nos ombros,
pois levava uma cruz. Swete nota que o verbo usado aqui para ―escorar‖
(uporqountav) é de uso bem raro na literatura antiga, razão pela qual optei por
uma palavra de uso também escasso na língua portuguesa.
Como é comum em teofanias, as proporções saem dos limites humanos.
Os três homens aparentam aos guardas como gigantes, cujas cabeças atingem os
céus. A tradição da igreja, aliás, costuma representar o Cristo ressurreto ladeado
pelos dois principais arcanjos, Miguel e Gabriel.
A declaração ―Pregastes aos que dormem‖ naturalmente faz lembrar 1
Pedro: ―[Cristo] foi, e pregou aos espíritos em prisão‖ (3.19); ―foi pregado
também o evangelho aos mortos‖ (4.6). Em 1 Tessalonicenses, Paulo usa a
mesma palavra para se referir aos mortos como ―os que dormem‖ (koimwmenoiv)
(4.13).
Na interpretação docética, a morte de Cristo foi uma espécie de viagem
por meio da qual ele desceu ao mundo dos mortos com o fim de pregar-lhes o
evangelho. Viagem semelhante ocorreu uma primeira vez quando desceu do céu à
terra para pregar aos vivos. Cumprida esta dupla missão, agora ele retornava
―para o lugar donde veio‖ (Pe 56).

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43-44: Uma segunda teofania
43. Eles, então, consideraram um com o outro partir e relatar essas coisas a Pilatos. 44.
Enquanto ainda conversavam, novamente abriram-se os céus e um homem desceu,
entrando no túmulo.

Na sequência petrina, os guardas que estavam de vigília viram primeiro


dois anjos entrando no túmulo e saindo com uma terceira pessoa, que seria o
Cristo. Tendo acordado o centurião e os judeus, este grupo viu um anjo entrar no
túmulo. Com isto, Pedro parece harmonizar as aparições dos Evangelhos.
Mateus fala de apenas um ―anjo do Senhor‖ (28.2) e Marcos o descreve
como ―um jovem vestido de branco‖ (16.5). Já Lucas fala de ―dois homens com
vestes resplandecentes‖ (24.4) e João também mostra ―dois homens vestidos de
branco‖ (20.12). Pedro resolve esta aparente contradição com suas duas teofanias.
Na primeira, apareceram os dois anjos de Lucas e João, e, na segunda, o anjo
solitário de Mateus e Marcos. Todavia, para os quatro evangelistas, foi Maria
Madalena quem presenciou a teofania, de modo que permanece a questão se ela
viu dois anjos ou apenas um.

45-49: A reação de Pilatos


45. Vendo aquilo, o centurião e os que estavam com ele correram pela noite a procurar
Pilatos, deixando o sepulcro que tinham vigiado. E detalharam tudo o que tinham visto,
estando muito perturbados, e disseram: ―Realmente era filho de Deus‖. 46. Pilatos
replicou e disse: ―Eu sou puro do sangue do filho de Deus, fostes vós que decidistes‖. 47.
Depois se aproximaram todos, pedindo-lhe, suplicando que ordenasse ao centurião e aos
soldados não contar a ninguém o que viram. 48. ―Pois para nós, diziam, é melhor sermos
culpados de enorme pecado diante de Deus, do que cairmos nas mãos do povo judeu e
sermos apedrejados‖. 49. Então Pilatos ordenou ao centurião e aos soldados que nada
dissessem.

Na versão de Mateus, os guardas foram contar primeiro aos judeus,


recebendo destes um suborno para que acusassem os cristãos de haver roubado o
corpo. ―Eis que alguns da guarda, chegando à cidade, anunciaram aos príncipes
dos sacerdotes todas as coisas que haviam acontecido. E, congregados eles com os
anciãos, e tomando conselho entre si, deram muito dinheiro aos
soldados, Dizendo: Dizei: Vieram de noite os seus discípulos e, dormindo nós, o
furtaram. E, se isto chegar a ser ouvido pelo presidente, nós o persuadiremos, e
vos poremos em segurança. E eles, recebendo o dinheiro, fizeram como estavam
instruídos. E foi divulgado este dito entre os judeus, até ao dia de hoje (28.11-15).
Pedro nos conta exatamente o contrário. Como já havia líderes judeus
vigiando o sepulcro, os guardas, tendo acordado o centurião e os judeus, foram à
cidade prestar relatório a Pilatos. Pilatos, como de costume, lavou as mãos,
assumindo uma postura neutra. Aqui foram os soldados, e não os judeus, que
pediram sigilo no assunto, temendo que o povo os acusasse de negligência na
guarda do túmulo e fossem eles apedrejados.

50-54: Maria Madalena visita o sepulcro


50. Então, ao amanhecer do dia do Senhor, Maria Madalena, discípula do Senhor (que,
temendo os judeus ardentes de cólera, não havia feito no sepulcro do Senhor o que
costumavam fazer as mulheres pelos mortos que lhes eram queridos), 51. tomou consigo
as amigas e foi ao túmulo onde ele jazia. 52. E, temendo serem vistas pelos judeus,
diziam: ―Se, naquele dia em que foi crucificado, não pudemos chorar e lamentar, batendo
no peito, que agora, sobre seu túmulo, façamos isto‖. 53. Mas quem rolará para nós a

27
pedra na entrada do sepulcro, a fim de que possamos entrar, sentar-nos em volta dele
fazer o que lhe é devido? 54. Pois é grande a pedra e tememos que alguém nos veja. Se
não o pudermos fazer, lancemos na entrada o que trouxemos em sua memória.
Choraremos e nos lamentaremos, batendo no peito até voltarmos para casa‖.

Mateus. ―E, no fim do sábado, quando já despontava o primeiro dia da


semana, Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro‖ (28.1).
Marcos. ―E, passado o sábado, Maria Madalena, e Maria, mãe de Tiago, e
Salomé, compraram aromas para irem ungi-lo. E, no primeiro dia da semana,
foram ao sepulcro, de manhã cedo, ao nascer do sol. E diziam umas às outras:
Quem nos revolverá a pedra da porta do sepulcro?‖ (16.1-3).
Lucas. ―E no primeiro dia da semana, muito de madrugada, foram elas ao
sepulcro, levando as especiarias que tinham preparado, e algumas outras com
elas‖ (24.1).
João. ―E no primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao sepulcro de
madrugada, sendo ainda escuro‖ (20.1).
Os evangelistas foram concisos sobre a ida das mulheres ao sepulcro.
Lucas sequer fala seus nomes; João menciona apenas Madalena; Mateus conta
duas Marias e Marcos dá a lista completa: Madalena, Maria mãe de Tiago e
Salomé. Pedro se concentra apenas em Madalena, fazendo dela a personagem
principal desta cena que descreve com maior apuro. Nos Evangelhos, a única
preocupação das mulheres era sobre como tirariam a pedra do sepulcro. Em
Pedro, Maria demonstra medo dos judeus, o que a fez adiar a ida ao túmulo.
Sendo um nome hebraico transliterado para o grego, a grafia de Maria
varia nos Evangelhos: Maria, Mariav, Mariam. Pedro usa a última forma.

55-57: Um anjo fala às mulheres


55. E elas foram e encontraram o sepulcro aberto. E aproximando-se, inclinaram-se e
viram ali um jovem sentado no meio do sepulcro, belo e vestido de um manto
luminescente. Perguntou-lhes e falou: 56. ―Por que viestes? A quem procurais? Por acaso,
aquele que foi crucificado? Ressuscitou e partiu. Se não o acreditais, inclinai-vos e olhai o
lugar onde jazia, pois não está. Ora, ressuscitou e voltou para o lugar donde veio‖. 57. As
mulheres fugiram atemorizadas.

Nesta última parte, em que um anjo revela às mulheres que Jesus


ressuscitou, Pedro é breve e os Evangelhos se estendem em mais pormenores.
Para Pedro, as mulheres fugiram assustadas. Mateus, por outro lado, as descreve
como possuídas por um misto de medo e alegria; medo da ―assombração‖ do anjo
e alegria pela ressurreição de Cristo.
O que Mateus chama de ―temor e grande alegria‖ (fobou kai carav
megalhv), Marcos chama de ―temor e assombro‖ (tromov kai ekstasisv), o
que pode ser também traduzido por ―êxtase‖. Estavam extasiadas, fora de si
devido à grande surpresa. Lucas fala apenas do medo que sentiram ao ver os dois
anjos, tanto que conseguiam somente olhar para o chão.
Mateus. ―Mas o anjo, respondendo, disse às mulheres: Não tenhais medo;
pois eu sei que buscais a Jesus, que foi crucificado. Ele não está aqui, porque já
ressuscitou, como havia dito. Vinde, vede o lugar onde o Senhor jazia. Ide pois,
imediatamente, e dizei aos seus discípulos que já ressuscitou dentre os mortos. E
eis que ele vai adiante de vós para a Galiléia; ali o vereis. Eis que eu vo-lo tenho
dito. E, saindo elas pressurosamente do sepulcro, com temor e grande alegria,
correram a anunciá-lo aos seus discípulos‖ (28.5-8).

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Marcos. ―E, olhando, viram que já a pedra estava revolvida; e era ela
muito grande. E, entrando no sepulcro, viram um jovem assentado à direita,
vestido de uma roupa comprida, branca; e ficaram espantadas. Ele, porém, disse-
lhes: Não vos assusteis; buscais a Jesus Nazareno, que foi crucificado; já
ressuscitou, não está aqui; eis aqui o lugar onde o puseram. Mas ide, dizei a seus
discípulos, e a Pedro, que ele vai adiante de vós para a Galiléia; ali o vereis, como
ele vos disse. E, saindo elas apressadamente, fugiram do sepulcro, porque estavam
possuídas de temor e assombro; e nada diziam a ninguém porque temiam‖ (16.4-
8).
Lucas. ―E acharam a pedra revolvida do sepulcro. E, entrando, não
acharam o corpo do Senhor Jesus. E aconteceu que, estando elas muito perplexas
a esse respeito, eis que pararam junto delas dois homens, com vestes
resplandecentes. E, estando elas muito atemorizadas, e abaixando o rosto para o
chão, eles lhes disseram: Por que buscais o vivente entre os mortos? Não está
aqui, mas ressuscitou. Lembrai-vos como vos falou, estando ainda na
Galiléia, Dizendo: Convém que o Filho do homem seja entregue nas mãos de
homens pecadores, e seja crucificado, e ao terceiro dia ressuscite. E lembraram-se
das suas palavras. E, voltando do sepulcro, anunciaram todas estas coisas aos
onze e a todos os demais‖ (24.2-8).
João. ―E no primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao sepulcro de
madrugada, sendo ainda escuro, e viu a pedra tirada do sepulcro. Correu, pois, e
foi a Simão Pedro, e ao outro discípulo, a quem Jesus amava, e disse-lhes:
Levaram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o puseram. Então Pedro saiu
com o outro discípulo, e foram ao sepulcro. E os dois corriam juntos, mas o outro
discípulo correu mais apressadamente do que Pedro, e chegou primeiro ao
sepulcro. E, abaixando-se, viu no chão os lençóis; todavia não entrou. Chegou,
pois, Simão Pedro, que o seguia, e entrou no sepulcro, e viu no chão os lençóis, E
que o lenço, que tinha estado sobre a sua cabeça, não estava com os lençóis, mas
enrolado num lugar à parte. Então entrou também o outro discípulo, que chegara
primeiro ao sepulcro, e viu, e creu. Porque ainda não sabiam a Escritura, que era
necessário que ressuscitasse dentre os mortos. Tornaram, pois, os discípulos para
casa‖ (20.1-10).
A narração de João é bastante única em particularidades. Primeiro, Maria
não vê anjos, mas apenas o sepulcro aberto e suspeita que o corpo teria sido
furtado. Corre a chamar outros discípulos, sendo acompanhada de Pedro e João.
Há uma aura emocional implícita nestas linhas, pois o fato de João correr
mais rápido que Pedro não indica apenas que era mais jovem e veloz e sim que era
mais apegado ao Mestre, sendo ―o discípulo a quem Jesus amava‖, como
constantemente se diz no Evangelho de João. Pedro, mais racional, examina o
sepulcro, as mortalhas e, tendo confirmado o sumiço do corpo, apenas voltam
para casa. Somente após esta decepção inicial é que Jesus irá se revelar a Maria no
caminho, e depois aparecerá aos discípulos.

58: O fim da festa


58. Era o último dia dos ázimos, e muitos partiam e voltavam para suas casas; a festa
acabou.

Quando Pedro fala ―a festa acabou‖ (thv eorthv pausamenhv), parece-


nos justo associar isto à tristeza que tomou conta dos apóstolos. Viveram três anos
na presença de Jesus, sendo animados por sermões e impressionados por milagres.

29
Agora tudo acabou, Pedro e seu irmão voltam à vida de pescadores e só lhes resta
a nostalgia.

59: Os doze discípulos


59. Nós, porém, os doze discípulos do Senhor, chorávamos e nos entristecíamos. E cada
um, angustiado por tudo o que tinha acontecido, voltou para sua casa.

A expressão ―doze discípulos‖ ficou consagrada de modo que assim era


chamado o grupo, mesmo que se tratassem de onze após o suicídio de Judas.
Também o Apocalipse fala em doze, a despeito de Judas (Ap 21.14). O livro de
Atos conta que, dias após a ascensão de Cristo, Pedro organizou um sorteio em
que foi escolhido um certo Matias para completar o número dos apóstolos (At
1.21-26).

60: E Pedro volta ao mar


60. Quanto a mim, Simão Pedro e André meu irmão, tomamos nossas redes e partimos
para o mar; e esteve conosco Levi o filho de Alfeu, a quem o Senhor…

Aqui, finalmente, o autor se identifica como sendo o apóstolo Simão


Pedro. Esta cena em que ele volta à pescaria é retratada em grandes detalhes no
último capítulo de João, do qual transcreveremos os primeiros versos: ―Estavam
juntos Simão Pedro, e Tomé, chamado Dídimo, e Natanael, que era de Caná da
Galiléia, os filhos de Zebedeu, e outros dois dos seus discípulos. Disse-lhes Simão
Pedro: Vou pescar. Dizem-lhe eles: Também nós vamos contigo. Foram, e
subiram logo para o barco, e naquela noite nada apanharam. E, sendo já manhã,
Jesus se apresentou na praia, mas os discípulos não conheceram que era
Jesus. Disse-lhes, pois, Jesus: Filhos, tendes alguma coisa de comer?
Responderam-lhe: Não. E ele lhes disse: Lançai a rede para o lado direito do
barco, e achareis. Lançaram-na, pois, e já não a podiam tirar, pela multidão dos
peixes. Então aquele discípulo, a quem Jesus amava, disse a Pedro: É o Senhor‖
(21.2-7).
O texto é interrompido na sua última frase ―Levi, filho de Alfeu, a quem o
Senhor...‖. Não há danos nesta parte do documento, o que indica que o copista
apenas copiou como encontrara num manuscrito anterior que lhe servira de
matriz. De toda forma, o andamento do texto indica que aqui já se encontra o fim
do evangelho, talvez faltando apenas uma palavra ou frase (talvez: ―a quem o
Senhor chamou‖, pois os Evangelhos falam de Levi no momento em que Jesus o
chama, estando ele na coletoria). Quanto a este Levi, trata-se do apóstolo Mateus
(cf. Mt 9.9; Mc 2.14; Lc 5.27).
É interessante o autor terminar o evangelho deste jeito, diferente dos
Evangelhos, que apresentam o ―final feliz‖. Não significa, porém, um pessimismo
de Pedro, uma vez que, na cena anterior, Madalena fica sabendo da ressurreição
do Cristo e está indo anunciar esta nova àqueles que, na última cena, se mostram
abatidos. É um final simplesmente criativo.

30
Transcrição

Nota:
Nesta transcrição do texto acrescentei a pontuação usada por Swete, bem como a
numeração dos versos, marcada entre colchetes. O texto do manuscrito usa caligrafia cursiva, ou
seja, todas as letras em minúscula, e não há espaço entre as palavras, nem acentos ou pontuações.
Tais elementos nós acrescentamos para facilitar a leitura.
Mantenho as abreviações, que são usadas principalmente nos nomes divinos, como kyrios
e theos. No original, a abreviação é marcada com um traço sobrescrito; aqui utilizo o sublinhado.
Não é comum as transcrições preservarem a abreviação, mas faço isto para deixar claro este
recurso que era de uso tão comum entre os antigos copistas.
As abreviaturas tinham antes um motivo econômico do que religioso. Enquanto os
escribas judeus modificavam a escrita do nome divino por reverência, os copistas cristãos o faziam
por economia de espaço e tempo, pois os nomes divinos são dos que mais se repetem em textos
sagrados. Também a palavra antropos (homem, humano) era frequentemente abreviada.
Como resultado, estas abreviações se consolidaram. Em pinturas e mosaicos medievais é
frequente o uso de siglas como IX (Iesous Xristos) ou IXTUS (Iesous Xristos Theos Uios Soter –
Jesus Cristo Deus Filho Salvador). Curiosamente, ixtus também significa ―peixe‖ em grego, daí o
uso do peixe aliado a esta palavra em algumas ilustrações cristãs.
O texto é tradicionalmente dividido em 60 versos, contidos em 14 parágrafos, conforme
segue: I.1-2; II.3-5; III.6-9; IV.10-14; V.15-20; VI.21-24; VII.25-27; VIII.28-33; IX.34-37; X.38-
42; XI.43-49; XII.50-54; XIII.55-57; XIV.58-60. A título de simplificação, adoto apenas a
numeração em versos, a saber, de 1 a 60.
Há muitos erros na grafia das palavras, o que pode ser fruto da inabilidade do copista ou
ao fato do texto original ter sofrido poucas revisões. A grafia correta onde ocorre erro é sugerida
nas notas de rodapé.

Página 1, recto: Capa em branco

Página 2, verso: Pedro 1-8


Desenho de uma pequena cruz no topo da página.
Linha 1: [1] Twn4 de Ioudaiwn oudeiv eniyato tav ceirav, oude
Linha 2: Hrwdhv oude eiv5 twn6 kritwn autou? kai mh7 boulhqentwn
Linha 3: niyasqai anesth Peilathv8. [2] kai tote keleuei Hrwdhv
Linha 4: o basileuv paralhmfqhnai9 ton kn [kurion], eipwn autoiv oti
Linha 5: Osa ekeleusa umin poihsai autw, poihsate. [3] isthkei de
Linha 6: ekei Iwshf o filov Peilatou kai tou ku [kuriou], kai eidwv oti
Linha 7: stauriskein auton mellousin, hlqen prov ton Peilaton
Linha 8: kai hthse to swma tou ku [kuriou] prov tafhn. [4] kai o Peilatov pem-
Linha 9: -yav prov Hrwdhn hthsen autou to swma, [5] kai o Hrwdhv
Linha 10: efh, adelfe Peilate, ei kai mh tiv auton hthkei, hmeiv
Linha 11: auton eqaptomen, epei kai sabbaton epifwskei? gegra-
Linha 12: ptai gar en tw nomw hlion mh dunai epi pefoneumenw.
Linha 13: kai paredwken auton tw law pro miav twn azumwn,
Linha 14: thv eorthv autwn. [6] oi de labontev ton kn [kurion] wqoun auton
Linha 15: trecontev, kai elegon Surwmen ton uion tou qu [qeou], exousian

4
O texto começa apagado. Apenas a parte superior do teta é legível, de onde se deduz o twn, em
concordância com Ioudaiwn.
5
Esta parte é rasurada, deixando dúvida se está escrito eiv ou tiv.
6
Há um buraco no lugar do teta, sobrando um pequeno traço da parte superior da letra.
7
Há um rasgão que começa na última letra de autou e segue até o fim da linha, mas danificando
apenas a área não escrita e a parte superior de kai mh.
8
Peilathv = Peilatov.
9
Um buraco destruiu o alh de paralhmfqhnai.

31
Linha 16: autou eschkotev. [7] kai porfuran auton periebalon kai eka-
Linha 17: -qisan auton epi kaqedran krisewv, legontev Dikaiwv krine,
Linha 18: basileu tou Israhl. [8] kai tiv autwn enegkwn stefanon
Linha 19: akanqinon eqhken epi thv kefalhv tou kuriou?

Página 3, recto: Pedro 9-16a


Desenho de uma pequena cruz no topo da página.
Linha 110: [9] kai eteroi estwtev eneptuon autou taiv oyesi, kai
Linha 2: alloi tav siagonav11 autou erapisan? eteroi kalamw
Linha 3: enusson auton, kai tinev auton emastizon legontev
Linha 4: Tauth th timh timhswmen ton uion tou qu [qeou]. [10] Kai hnegkon12
Linha 5: duo kakourgouv kai estaurwsan ana meson autwn ton kurion? 13
Linha 6: autov de esiwpa, wv mhden ponon ecwn. [11] kai ote wrqw-
Linha 7: -san ton stauron epegrayan oti outov estin o basileuv
Linha 8: tou israhl. [12] kai teqeikotev ta endumata emprosqen
Linha 9: autou diemerisanto, kai lacmon ebalon ep autoiv.
Linha 10: [13] eiv de tiv twn kakourgwn ekeinwn wneidisen
Linha 11: autouv legwn Hmeiv dia ta kaka a epoihsamen outw
Linha 12: peponqamen? outov de swthr genomenov twn anqrwpwn14
Linha 13: ti hdikhsen umav; [14] kai aganakthsantev ep autw eke-
Linha 14: -leusan ina mh skelokophqh, opwv basanizomenov
Linha 15: apoqanoi. [15] Hn de meshmbria, kai skotov katesce
Linha 16: pasan thn Ioudaian. kai eqorubounto kai hgwniwn
Linha 17: mhpote o hliov edu, epeidh eti ezh? gegraptai autoiv
Linha 18: hlion mh dunai epi pefoneumenw. [16] kai tiv autwn

Página 4, verso: Pedro 16b-25a


Linha 1: eipen, Potisate auton colhn meta oxouv? kai kera-
Linha 2: -santev epotisan. [17] kai eplhrwsan panta, kai ete-
Linha 3: -leiwsan kata thv kefalhv autwn ta amarthma-
Linha 4: -ta. [18] perihrconto de polloi meta lucnwn, nomizon-
Linha 5: -tev oti nux estin? epesanto15. [19] kai o kv [kuriov] anebohse
Linha 6: legwn H dunamiv mou, h dunamiv, kateleiyav me?
Linha 7: kai eipwn anelhfqh. [20] kai autov16 wrav dieragh to
Linha 8: katapetasma tou naou thv Ierousalhm eiv duo.
Linha 9: [21] Kai tote apespasan touv hlouv apo twn ceirwn
Linha 10: tou ku [kuriou], kai eqhkan auton epi thv ghv? kai h gh pa-
Linha 11: -sa eseisqh kai fobov metav17 egeneto. [22] tote hliov
Linha 12: elamye kai eureqh wra enath. [23] ecarhsan de
Linha 13: oi Ioudaioi kai dedwkasi tw Iwshf to swma
Linha 14: autou ini auto18 qayh, epeidh qeasamenov hn os-
Linha 15: -a agaqa epoihsen. [24] labwn de ton kurion19 elouse
Linha 16: kai eilhse sindonin kai eishgagen eiv idion

10
Acima desta primeira linha há fragmentos de letras e palavras bastante apagados. Provavelmente
indicando que a folha seja um palimpsesto ou que o copista escreveu um colofão.
11
Há um furo em cima desta palavra. No verso, ele fica abaixo da palavra oxouv da linha 1, mas
não danificou o texto em nenhuma das páginas. Este furo atinge também a folha seguinte, mas
igualmente não danifica o texto.
12
A palavra hnegkon está bastante obscura devido à mancha de bolor da folha.
13
As palavras ton kurion estão bastante obscuras devido à mancha de bolor da folha.
14
O copista abreviou anqrwpwn para anwn, como de costume. Um traço sobre a palavra indica
que é abreviação. Idem no verso 44.
15
A palavra está rasurada. O copista parece ter escrito uma palavra e depois reescrito sobre.
16
autov (no mesmo) = authv (na mesma).
17
metav = megav (grande).
18
ini = ina (a fim de que).
19
Aqui o copista escreveu kurion mesmo, em vez de abreviar como seria de praxe.

32
Linha 17: tafon kaloumenon Khpon Iwshf. [25] Tote oi Ioudaioi
Linha 18: kai oi presbuteroi kai oi iereiv, gnontev oion

Página 5, recto: Pedro 25b-30a


Linha 1: kakon eautoiv epoihsan, hrxanto koptesqai
Linha 2: kai legein Ouai taiv amartiaiv hmwn? hggisen
Linha 3: h krisiv kai to telov Ierousalhm. [26] egw de meta twn
Linha 4: etairwn mou elupoumhn, kai tetrwmenoi kata dia-
Linha 5: -noian ekrubomeqa? ezhtoumeqa gar up autwn
Linha 6: wv kakourgoi kai wv ton naon qelontev emprhsai?
Linha 7: [27] epi de toutoiv pasin enhsteuomen, kai ekaqezomeqa
Linha 8: penqountev kai klaiontev nuktov kai hmerav
Linha 9: ewv tou sabbatou. [28] Sunacqentev de oi grammateiv
Linha 10: kai farisaioi kai presbuteroi prov allhlouv, akou-
Linha 11: -santev oti o laov apav gogguzei kai koptetai
Linha 12: ta sthqh legontev oti Ei tw qanatw autou tauta ta
Linha 13: megista shmeia gegonen, idete oti poson dikaiov
Linha 14: estin? [29] efobhqhsan oi presbuteroi, kai hlqon
Linha 15: prov Peilaton deomenoi autou kai legontev
Linha 16: [30] Paradov hmin stratiwtav, ina fulaxw20 to mnhma
Linha 17: autou epi treiv hmerav21, mhpote elqontev

Página 6, verso: Pedro 30b-36a


Linha 1: oi maqhtai autou kleywsin auton kai upolabh
Linha 2: o laov oti ek nekrwn anesth, kai poihswsin
Linha 3: hmin kaka. [31] o de Peilatov paradedwken autoiv
Linha 4: Petrwnion ton kenturiwna meta stratiwtwn
Linha 5: fulassein ton tafon. kai sun autoiv hlqon
Linha 6: presbuteroi kai grammateiv epi to mnhma, [32] kai
Linha 7: kulisantev liqon megan kata tou kenturiwnov
Linha 8: kai twn stratiwtwn omou pantev oi ontev ekei
Linha 9: eqhkan epi th qura tou mnhmatov, [33] kai epecrisan22
Linha 10: epta sfragidav, kai skhnhn ekei phxantev
Linha 11: efulaxan. [34] prwiav de, epifwskontov tou sab-
Linha 12: -batou, hlqen oclov apo Ierousalhm kai thv peri-
Linha 13: -cwrou ina idwsi to mnhmeion esfragismenon.
Linha 14: [35] Th de nukti h epefwsken h kuriakh, fulasson-
Linha 15: -twn twn stratiwtwn ana duo duo kata frouran,
Linha 16: megalh fwnh egeneto en tw ouranw [36] kai eidon
Linha 17: anoicqentav touv ouranouv kai duo andrav

Página 7, recto: Pedro 36b-43a


Linha 1: katelqontav ekeiqe23, polu feggov econtav,
Linha 2: kai eggisantav tw tafw. [37] o de leiqov24 ekeinov
Linha 3: o beblhmenov epi th qura af eautou kulisqeiv
Linha 4: epecwrhse25 para merov, kai o tafov enoigh26
Linha 5: kai amfoteroi oi neaniskoi eishlqon. [38] idontev
Linha 6: oun oi stratiwtai ekeinoi exupnisan ton kentu-
Linha 7: -riwna kai touv presbuterouv, parhsan gar kai autoi

20
fulaxw = fulaxwsi (seja vigiado) ou fulaxwmen (vigiemos).
21
Em hmerav há um rasgão que destruiu a segunda sílaba da palavra. Este mesmo rasgo atingiu a
palavra ouranouv na última linha da página seguinte, danificando apenas a letra nu.
22
epecrisan = epecreisan.
23
ekeiqe = ekeiqen.
24
leiqov = liqov (pedra).
25
epecwrhse = anecwrhse ou talvez upecwrhse.
26
enoigh = hnoigh.

33
Linha 8: fulassontev? [39] kai exhgoumenwn autwn a eidon,
Linha 9: palin orwsin27 exelqontav apo tou tafou treiv
Linha 10: andrev28, kai touv duo ton ena uporqountav, kai
Linha 11: stauron akolouqounta29 autoiv? [40] kai twn men duo
Linha 12: thn kefalhn cwrousan mecri tou ouranou,
Linha 13: tou de ceiragwgoumenou up' autwn uperbainou-
Linha 14: -san touv ouranouv. [41] kai fwnhv hkouon ek twn
Linha 15: ouranwn legoushv Ekhruxav toiv koinwmenoiv30?
Linha 16: [42] kai upakoh hkoueto apo tou staurou tinai31. [43] Sune-
Linha 17: -skeptonto oun allhloiv ekeinoi apelqein

Página 8, verso: Pedro 43b-50a


Linha 1: kai enfanisai tauta tw Peilatw. [44] kai eti dianooumen-
Linha 2: -wn autwn fainontai palin anoicqentev oi ouranoi
Linha 3: kai anov [anqrwpov] tiv katelqwn kai eiselqwn eiv to mnhma.
Linha 4: [45] tauta idontev oi peri ton kenturwna32 nuktov espeusan
Linha 5: prov Peilaton, afentev ton tafon on efulasson, kai
Linha 6: exhghsanto panta aper eidon, apaniwntev 33 megalwv
Linha 7: kai legontev Alhqwv uiov hn qu [qeou]. [46] apokriqeiv o Peilatov
Linha 8: efh Egw kaqareuw tou aimatov tou uiou tou qeou34, hmin35 de
Linha 9: touto edoxen. [47] eita proselqontev pantev edeonto autou
Linha 10: kaiper ekaloun36 keleusai tw kentwriwni37 kai toiv stratiw-
Linha 11: -taiv mhden eipein a eidon? [48] sumferei gar, fasin, hmin
Linha 12: oflhsai megisthn amartian emprosqen tou qeou,
Linha 13: kai mh empesein eiv ceirav tou laou twn Ioudaiwn
Linha 14: kai liqasqhnai. [49] ekeleusen oun o Peilatov twn ken-
Linha 15: -turiwn38 kai toiv stratiwtaiv mhden eipein. [50] Orqou39 de
Linha 16: thv kuriakhv Mariam h Magdalinh40, maqhtria tou ku [kuriou],
Linha 17: (foboumenh dia touv Ioudaiouv, epeidh eflegonto

Página 9, recto: Pedro 50b-55a


Linha 1: upo thv orghv, ouk epoihsen epi tw mnhmati tou ku [kuriou]
Linha 2: a eiwqesan poiein ai gunaikev epi toiv apoqnhskousi
Linha 3: kai toiv agapwmenoiv autaiv), [51] labousa meq eauthv tav filav
Linha 4: hlqe epi to mnhmeion opou hn teqeiv. [52] kai efobounto
Linha 5: mh idwsin autav oi Ioudaioi, kai elegon Ei kai mh en e-
Linha 6: -keinh th hmera h estaurwqh edunhqhmen klausai
Linha 7: kai koyesqai41, kai nun epi tou mnhmatov autou poihswmen
Linha 8: tauta. [53] tiv de apokulisei hmin kai ton liqon ton teqenta
Linha 9: epi thv qurav tou mnhmeiou, ina eiselqousai parakaqes-
Linha 10: -qwmen autw kai poihswmen ta ofilomena42; [54] megav gar

27
orwsin = orasin.
28
andrev = andrav (homens).
29
akolouqounta = akoloqounta.
30
koinwmenoiv = koimwmenoiv (aos que dormem).
31
tinai = oti nai ou talvez ti nai (sim).
32
kenturwna = kenturiwna.
33
apaniwntev = agwniwntev.
34
Aqui o copista escreveu qeou mesmo, em vez de abreviar. Idem na linha 12.
35
hmin (nós) = umin (vós).
36
kaiper ekaloun = kai parekaloun.
37
kentwriwni = kenturiwni.
38
twn kenturiwn = tw kenturiwni.
39
Orqou = tw Orqrou.
40
Magdalinh = tw Magdalhnh.
41
koyesqai = koyasqai.
42
ofilomena = ofeilomena.

34
Linha 11: hn o liqov, kai foboumeqa mh tiv hmav idh. kai ei mh Du-
Linha 12: -nameqa, kan epi thv qurav balwmen a feromen eiv
Linha 13: mnhmosunhn autou, klausomen kai koyomeqa ewv
Linha 14: elqwmen eiv ton oikon hmwn. [55] Kai apelqousai suron43
Linha 15: ton tafon hnewgmenon? kai proselqousai pareku-
Linha 16: -yan ekei, kai orwsin ekei tina neaniskon kaqezo-
Linha 17: -menon mesw tou tafou, wraion kai peribeblhmenon

Página 10, verso: Pedro 55b-60


Linha 1: stolhn lamprotathn, ostiv efh autaioti 44 [56] hlqa-
Linha 2: -te; tina zhteite; mh ton staurwqenta ekeinon;
Linha 3: anesth kai aphlqen? ei de mh pisteuetai45, paraku-
Linha 4: -yate kai idate ton topon enqa ekeito, oti 46 ouk estin?
Linha 5: anesth gar kai aphlqen ekei oqen apestalh?
Linha 6: [57] tote ai gunaikev fobhqeisefugon47 efugon. [58] Hn de teleutaia
Linha 7: hmera twn azumwn, kai polloi tinev exhrconto,
Linha 8: upostrefontev eiv touv oikouv autwn thv eorthv
Linha 9: pausaminhv48. [59] hmeiv de oi dwdeka maqhtai tou ku [kuriou]
Linha 10: eklaiomen kai elupoumeqa, kai ekastov lupoumenov
Linha 11: dia to sumban aphllagh eiv ton oikon autou. [60] egw de
Linha 12: Simwn Petrov kai Andreav o adelfov mou La-
Linha 13: -bontev hmwn ta lina aphlqamen eiv thn qal-
Linha 14: -lassan49? kai hn sun hmin Leueiv tou Alfaiou, on kv [kuriov]…
Desenho de três cruzes sobre um ornamento.

Página 11: Em branco.

Página 12: Em branco.

43
suron = euron.
44
autaioti = autaiv oti ou talvez autaiv ti.
45
pisteuetai = pisteuete.
46
Este trecho, além de começar borrado em enqa, evidencia que o copista escrevera enqa ekei
oti, percebendo posteriormente que havia errado, acrescentou o to final da palavra ekeito
sobrescrito, formando um amontoado de letras.
47
fobhqeisefugon = fobhqeisai.
48
pausaminhv = pausamenhv.
49
qallassan = qalassan. O copista na certa duplicou a letra lambda por haver quebrado a
palavra entre duas linhas.

35
Conclusão

Há leitores e leitores, de modo que a forma com que se há de encarar esta


recente descoberta da antiga literatura varia conforme certos pressupostos.
À luz de um ponto de vista estritamente cristão e ortodoxo, o Evangelho
Segundo Pedro não passará de mais uma obra apócrifa, fadada a integrar-se nas
coleções de livros que falharam em sua ―candidatura‖ à Bíblia. Esta se tornou a
opinião de Serapião, o primeiro homem, segundo temos notícia, que esboçou um
parecer sobre o livro. Para ele, este Pedro era uma obra dos gnósticos e, portanto,
uma heresia diante da doutrina católica. Os cristãos hodiernos mais rigorosos hão
de concordar com Serapião.
Arqueólogos, historiadores, linguistas e demais interessados nas ciências
das letras e da história antiga darão ao manuscrito seu devido valor histórico-
literário, como mais um representante da literatura greco-romana do século II e
mais uma versão do variegado relato sobre a vida de Jesus Nazareno.
Para os amantes do saber (e não me refiro apenas aos filósofos), bem como
para os que valorizam toda a experiência mística da humanidade, independente de
inclinações religiosas, o Evangelho Segundo Pedro é um patrimônio cultural e
espiritual. Sua descoberta, portanto, representou mais um contributo ao imenso rio
do saber humano.
Datado do século II, esta obra com certeza não é fruto do mesmo autor da
Epístola de Pedro, que viveu no século I, apesar de reivindicar a mesma autoria.
Todavia, também afirmam estudos recentes que os livros da Torá (ou, pelo menos,
sua redação final) não foram escritos por Moisés e, a despeito disto, contém eles
grandioso valor. Afinal, não é a autoria de um livro que o torna valoroso e sim seu
próprio conteúdo.
Há uma beleza poética no Evangelho de Pedro. De fato, suas críticas aos
judeus são insistentes demais, até enfadonhas, mas o ambiente melancólico que
envolve a história dá-lhe um tom intimista que agrada. Diferente dos Evangelhos
do Novo Testamento, no de Pedro o autor fala em primeira pessoa, ―Eu‖.
Não é apenas um relato da paixão de Cristo e sim um diário do
personagem Pedro e seus amigos. Eles sentem medo, tristeza, desilusão. Ao fim
de tudo, Pedro e dois discípulos tomam as redes e voltam ao mar, como se o
sonho tivesse acabado e tudo voltasse ao que era antes. Enquanto isto, Maria
Madalena, informada por anjos acerca da ressurreição, está correndo ao encontro
dos pescadores para dar-lhes a boa notícia.
E o livro termina sem que sequer a notícia lhes seja dada. Este final tácito
é que dá à narração uma beleza particular. Terminar uma narrativa sem um final
feliz, mas subentendendo que haverá um final feliz é um recurso elegante.
Admitamos, o autor do Evangelho Segundo Pedro escreve mal (ou o seu
copista que cometeu muitos erros). Sua pouca destreza com palavras gregas pode
indicar que o grego era sua segunda língua e que não a dominava perfeitamente ou
talvez a obra original fosse escrita em outro idioma e traduzida para o grego. A
despeito disto, fato é que ele sabe contar uma história.

36
Apêndice
Os fragmentos de Oxyrhynchus

Oxyrhynchus 2949 Oxyrhynchus 4009 recto Oxyrhynchus 4009 verso

O manuscrito Oxyrhynchus 2949 (séc II ou III d.C.) é formado por dois


pequenos fragmentos, contendo partes de um texto grego que se assemelha aos
versos 3-5 do Evangelho Segundo Pedro. Não é uma correspondência idêntica, de
modo que pode ser uma paráfrase ou citação e não necessariamente uma cópia.
Foi publicado pela primeira vez em 1972.

Fragmento 1
Linha 1: ...
Linha 2: ...
Linha 3: ...
Linha 4: ...
Linha 5: [...o] filov [Peilatou]50... ...o amigo de Pilatos...
Linha 6: ...iv oti eke[leu]sem... ...que ele ordenou...
Linha 7: [...elq]wn prov Peilat[on...] ...indo a Pilatos...
Linha 8: [...sw]ma eiv tafhn ... ...corpo para o sepulcro...
Linha 9: ...en hthsa[to...] ...pediu...
Linha 10: ...hnai eipw[n...] ...dizendo...
Linha 11: ...ithsa...
Linha 12: ...auton... ...dele...
Linha 13: ...oti a... ...que...

50
A palavra está quase totalmente apagada, restando apenas pequenos pedaços de três ou quatro
letras. Deduz-se que se trata do nome Peilatou com base no texto do Codex P. Cairo 10759.

37
Fragmento 2
Linha 14: ...ou...
Linha 15: Pei[lat...] ...Pilatos...
Linha 16: tiv... ...alguém...
Linha 17: m...
Linha 18: ...

O manuscrito Oxyrhynchus 4009 (séc II d.C.) é formado por um


fragmento escrito na frente e no verso. Foi publicado pela primeira vez em 1994.
O texto contém palavras comuns aos Evangelhos, como ―seara‖
(qerismov, cf. Mt 9.37,38; Lc 10.2), ―prudente‖ (fronimov, cf. Mt 7.24; 10.16;
Lc 12.42) e ―lobos‖ (lukwn, cf. Mt 7.15; 10.16; Lc 10.3).
Estas mesmas palavras aparecem juntas no discurso em que Jesus envia
seus discípulos em missão: ―Então, disse aos seus discípulos: A seara é realmente
grande, mas poucos os ceifeiros... Eis que vos envio como ovelhas ao meio de
lobos; portanto, sede prudentes como as serpentes e inofensivos como as pombas‖
(Mt 9.37; 10.16).
Há, portanto, características de uma narrativa evangélica, podendo ser uma
cópia de algum Evangelho, provavelmente Mateus, ou simples citação ou
paráfrase. O fato de aparecerem versos na primeira pessoa dá impressão que o
autor referia a si mesmo no texto como ―eu‖, o que não ocorre nos Evangelhos,
mas em Pedro. Todavia, dada a escassez de informação, associar este fragmento
ao evangelho petrino é mera conjectura.

Recto
Linha 1: ...
Linha 2: ...ei[v...] ...para...
Linha 3: ...ka[i...] ...e...
Linha 4: ...qerismo[v...] ...seara...
Linha 5: [...dik]aiov wv ai... ...justo como a...
Linha 6: [...k]ai fronim[ov...] ...e prudente...
Linha 7: ...esesqe w[v...] ...seja como...
Linha 8: ...on l[u]kw[n...] ...de lobos...
Linha 9: ...on ean ou... ...se não...
Linha 10: ...men. ...nós...
Linha 11: ...legei moi oi... ...disse para mim: os...
Linha 12: ...xantev to... ...tendo o...
Linha 13: [...ouk]eti au[tw] ou... ...para ele não...
Linha 14: ...poih[s...] ...fazer...
Linha 15: [...u]mein... o... ...a vós...
Linha 16: ...n[a]...
Linha 17: ...v ka[i]... ...e...
Linha 18: ...hke...
Linha 19: ...l...
Linha 20: ...c...
Linha 21: ...me...

Verso
Linha 1: ...t[e...]
Linha 2: ...u[v...]
Linha 3: oude[n...] ...nem...
Linha 4: paresc...

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Linha 5: qonti m..
Linha 6: kav dia... ...por meio de...
Linha 7: oti[a]fei... ...desde...
Linha 8: lai ama...
Linha 9: autw ek... ...para ele de...
Linha 10: menw... ...terminação da primeira pessoa...
Linha 11: nomat[i...] ...pelo nome...
Linha 12: ev ke [kurie...] ...ó Senhor...
Linha 13: ouq[en...] ...nada...
Linha 14: mai... ...terminação da primeira pessoa...
Linha 15: t... o...
Linha 16: ph...
Linha 17: n...
Linha 18: ai...

39
Bibliografia

Manuscrito P. Cairo 10759, Arquivo do Museu do Cairo, contendo o texto grego


do Evangelho Segundo Pedro.

Manuscrito Oxyrhynchus 2949, Papyrology Rooms, Sackler Library, Oxford.

Manuscrito Oxyrhynchus 4009, Papyrology Rooms, Sackler Library, Oxford.

BARNES, W. E. Canonical and Uncanonical Gospels. Longmans, Green, & Co.,


1893.

CESARÉIA, Eusébio. História Eclesiástica. Novo Século, 2002.

ROBINSON, J. Armitage, JAMES, Montague Rhodes. The Gospel Acording to


Peter, and the Revelation of Peter. C. J. Clay and Sons, 1892.

SWETE, Henry Barclay. The Akhmim Fragment of the Apocryphal Gospel of St.
Peter. Macmillan and Co., 1893.

Citações da Bíblia da Sociedade Bíblica Trinitariana do Brasil (ACF), © 1994


1995, 1996, 1997. Novo Testamento © 1979-1997.

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