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Capítulo 2

Funções Complexas

Seção 1
Conceitos e funções elementares
Nesta seção, vamos discutir as funções no contexto dos complexos. Para tal,
é importante lembrar-nos dos conceitos que aparecem de forma sistemática.
Inicialmente, é importante lembrar que o Conjunto dos Números Complexos contém
o conjunto dos números reais e, dessa forma, vários conceitos são exatamente iguais.

1.1 Conceitos básicos no campo dos complexos


A seguir, seguem as definições que vamos considerar fundamentais no decorrer
deste capítulo.

1.1.1 Vizinhança e ponto de acumulação


Uma vizinhança, que vamos denotar por (delta) de um ponto é o conjunto de
todos os pontos z tais que , sendo que é qualquer número positivo
dado. Caso a vizinhança não contenha o ponto , ou seja 0 < ,é
denotada por vizinhança perfurada.

O ponto é chamado de um ponto limite ou ponto de acumulação de um conjunto


S dado, observando que este ponto pode ou não pertencer ao conjunto S.

Um ponto é chamado um ponto interior de um conjunto S se determinarmos


uma vizinhança de inteiramente contida em S.

Se toda vizinhança de um ponto contém pontos pertencentes a S e também


pontos não pertencentes a S, é denotado como um ponto de fronteira.

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Capítulo 2

Dessa forma, diante de um conjunto S, podemos ter pontos interiores, pontos de


fronteira e pontos exteriores de S.

1.1.2 Conjuntos fechados e conjuntos abertos


Um conjunto S é dito fechado se todo ponto limite de S pertence a S, isto é, se S
contém todos os seus pontos de acumulação.

Exemplo: O conjunto é fechado, pois contém todos os seus pontos de


acumulação.

Um conjunto é aberto se tem apenas pontos interiores. Por exemplo, o conjunto


.

Um conjunto aberto S é dito conexo se quaisquer dois pontos dele podem ser
ligados por um caminho constituído de segmentos de reta, ou seja, um caminho
poligonal inteiramente contido em S.

1.2 Definição de funções e aplicações


Seja D um domínio do campo dos complexos, se cada ponto corresponde
um único número complexo , dizemos que define uma função a
valores complexos em D.

Chamamos D de domínio da função, e para cada , é denominada a


imagem de z. O conjunto de todas as imagens é denominado
imagem da função.

1.2.1 Exemplos
Observe que vamos trabalhar sempre com muita similaridade ao campo dos
reais. Para facilitar, vamos convencionar que z é a nossa variável complexa que
eventualmente pode ser real, mas sempre será representada por um par de
variáveis reais, ou seja, . Veja os exemplos que seguem.

(1) Estabelecer o domínio das seguintes funções:

(a) (b) (c)

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Números e Funções Complexas

As funções e têm como domínio todo o conjunto dos


números complexos, ou o conjunto C (estamos usando a letra C para denotar o
conjunto dos números complexos e R o conjunto dos números reais, ou seja, ).

A função já vai ter uma restrição no seu domínio, pois não podemos

ter o valor zero no denominador. Assim, o domínio pode ser representado como
.

Um fato interessante que podemos observar é que o conjunto imagem da função


contém apenas valores reais, pois , ou seja, a função

é uma função real de duas variáveis.

(2) Parte real e parte imaginária da função .

Podemos reescrever uma função complexa como , sendo


que é a parte real da função e é a parte imaginária. Portanto, são
funções reais de duas variáveis, podendo também ser de apenas uma variável.

Para a função , podemos escrever:

Assim, temos que a parte real é dada por e a parte imaginária é


.

1.2.2 Aplicações ou transformação de uma função complexa


No contexto das funções reais podemos fazer as representações gráficas que
são de grande importância para identificar características das funções não
visíveis algebricamente.

Para as funções complexas, agora não vamos conseguir fazer uma representação
gráfica da função, pois esta envolve duas funções de duas variáveis reais,
portanto, temos 4 dimensões.

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Capítulo 2

Para mostrar uma representação gráfica, necessitamos de dois planos complexos:

•• plano-z para a variável z;

•• plano-w para a variável w.

Para cada ponto (x, y) no plano-z, no domínio de definição de , existe um


ponto (u, v) no plano-w, sendo w = u + i v.

A correspondência entre os dois planos complexos é denotada como aplicação


ou transformação de uma função dada.

Na Figura 2.1 temos o exemplo da função .

Observe que cada círculo , com , produz pontos da reta . Para


termos a relação com todos os pontos do círculo dado, vamos ter que assumir que
v vai variar de –c até c.

Observe que na Figura 2.1, no domínio D, podemos completar todo o plano


complexo fazendo as infinitas escolhas para os raios c. No contra domínio R, já
vamos ter a delimitação, pois u deverá ser maior ou igual a zero e v vai variar no
intervalo

Figura 2.1 – Aplicação da função

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Números e Funções Complexas

1.2.3 Funções unívocas e plurívocas


Se cada z corresponde somente a um valor de w, dizemos que w é uma função
unívoca de z. Se cada valor de z corresponde a mais de um valor de w, dizemos
que w é uma função plurívoca de z.

Uma função plurívoca pode ser considerada como uma coleção de funções
unívocas e cada uma delas é chamada “ramo da função”. Dentre todos os ramos,
um deles é denominado de principal.

De um modo geral, vamos trabalhar mais com funções unívocas, como, por
exemplo, a função Entretanto, vamos discutir algumas funções plurívocas
como a função

1.3 Atividades de autoavaliação


(1) Seja . Desenvolva os seguintes itens:

(a) Qual é a imagem de ?


(b) Qual é o domínio da função?
(c) Qual é a parte real e a parte imaginária da função?

(2) Considere a função . Apresente uma aplicação ou transformação


considerando a situação em que e . Apresente graficamente
considerando pelo menos os valores e .

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Capítulo 2

Seção 2
Funções Elementares
De forma análoga ao que foi feito no conjunto dos reais, vamos discutir as
funções elementares no contexto do conjunto dos complexos.

2.1 Função Polinomial


As funções polinomiais são definidas por ,
sendo que e são constantes complexas e n é um inteiro positivo,
dito o grau do polinômio P(z).

Denotamos como transformação linear a função .

Como exemplo, temos as funções:

•• ;
•• .

2.2 Funções racionais algébricas


As funções racionais algébricas são definidas por sendo e
funções do tipo polinomial.

Como exemplo, temos as funções:

•• ;

•• .

2.3 Função exponencial


A função exponencial é definida em termos das funções reais , e
com a expressão .

É usual a notação .

A definição da função exponencial pode ser analisada com a forma polar de um


número complexo e neste caso representa o módulo e y o argumento; ou ainda,

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Números e Funções Complexas

e . Assim, para todo o valor de z e assim temos que

para qualquer número complexo z.

O contradomínio da função exponencial é todo o conjunto dos números


complexos exceto a origem.

Valem as propriedades:

(1) ;

(2) ;

(3) ;

(4) ;

(5)

(6) ;

(7) e ;

(8) é periódica de período igual a .

Observamos que devido à periodicidade da função exponencial no campo dos


complexos, todos os estão no intervalo . Graficamente, temos uma
região denominada de Região Fundamental de .

Veja, a seguir, um exemplo que vai surgir com o enunciado de demonstrar uma
relação como em um enunciado de resolver uma equação.

Podemos admitir a existência da relação .

Para analisar a afirmação destacada acima, vamos fazer algumas considerações


algébricas válidas no campo complexo.

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Capítulo 2

Observe que estamos diante de uma equivalência e, portanto, podemos igualar


as partes real e imaginária, formando um sistema para ser resolvido. Veja:

Vamos resolver o sistema, utilizando inicialmente a segunda equação:

Como , vamos ter que . Vamos então investigar quais os valores


de y reais tais que o seno se anula. Basta lembrar que a função seno no campo
dos reais e visualizar que o seno se anula para os valores iguais a com
.

Vamos levar agora esse resultado para a primeira equação . Vamos


observar que , portanto, o sinal negativo deverá estar no fator que envolve
a função cosseno.

No resultado inicial para o valor do y obtemos que este deve ser do tipo
com . Para este valor, o cosseno vai assumir valores
. Como vamos precisar que este assuma somente os
valores negativos, basta considerarmos apenas os valores pares do n. Neste caso,
fica mais “elegante” reescrever o valor y como sendo: .

Assim, o valor de y está bem definido. Para encontrar o valor de x, basta levar
este valor de y na primeira equação, veja:

Portanto, a resposta para o destaque dado é que a relação é válida para valores
de z iguais a .

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Números e Funções Complexas

2.4 Funções trigonométricas


Utilizando a fórmula de Euler podemos definir a função cosseno e seno respectivamente:

•• Função cosseno: ;

•• Função seno: .

As demais funções trigonométricas são definidas de maneira idêntica às funções reais.

Valem as seguintes propriedades:

(1) A função seno é ímpar: ;

(2) A função cosseno é par: ;

(3) As funções seno e cosseno são periódicas, de período :


e para (n=0,1,2,...);

(4) A função tangente e a função cotangente são periódicas, de


período : e ;

(5) As relações fundamentais da trigonometria são válidas no


campo dos complexos: , ,
.

Outras relações também podem ser validadas. Por exemplo:

•• ;
•• .

Sempre é bom lembrar!

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Capítulo 2

2.5 Funções Hiperbólicas


O cosseno e o seno hiperbólico de uma variável complexa z são definidos pelas
fórmulas:

•• ;

•• .

As demais funções hiperbólicas podem ser definidas de forma similar ao que


fazemos no contexto do real.

Valem as identidades:

(1) ;
(2) ;
(3) .

Valem as seguintes relações envolvendo as funções hiperbólicas e as funções


trigonométricas.

•• ;
•• ;
•• ;
•• .

As funções hiperbólicas e são periódicas, com período .

2.6 Função logarítmica


A função é definida como a função inversa de exponencial. Temos:
para cada .

Fique atento com a convenção que vamos usar para a representação do


logaritmo: vamos usar para os números complexos a notação log e mais
adiante vamos definir o significado de Log.

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Números e Funções Complexas

Para calcular , vamos fazer e . Assim:

Portanto, devemos ter:

Dessa forma, ou .

Como o argumento de z é determinado a menos de múltiplos de 2, o logaritmo


natural complexo é plurívoco, possuindo uma infinidade de valores.

O valor de que corresponde ao valor principal do , isto é, é


denominado Valor Principal de , denotado por .

Podemos formular a definição: para cada número complexo z,


, o valor principal do logaritmo de z é definido como sendo
.

Evidentemente os valores de são da forma: .

Se z for um número real positivo então seu logaritmo principal é o próprio


logaritmo no contexto dos reais, pois , ou seja, .

Se z for um número real negativo, e então .

Existe uma infinidade de funções logarítmicas semelhantes, assim, podemos


escrever a coleção infinita de ramos como:

O ramo correspondente a é denominado o ramo principal de , ou a


função logarítmica principal, denotada por .

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Capítulo 2

Parece um pouco estranho!


Mas cada ramo da coleção que define a função logarítmica é uma função
definida para todo .

Valem as propriedades:

•• ;

•• .

2.7 Função exponencial geral


A função exponencial geral é definida por .

Como possui uma infinidade de valores, a função é plurívoca.

2.8 Atividades de autoavaliação


(1) Analisar a representação geométrica das seguintes funções

(a) w = z + 2 (b) w = z

(2) Dada a função , calcular as imagens de:

(a) (b) (c) (d) - .

(3) Mostrar que .

(4) Mostrar que .

(5) Calcular .

(6) Verificar que .

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Números e Funções Complexas

(7) Mostrar a relação quando estamos usando a representação polar


do número complexo.

(8) Mostrar que .

(9) Determinar todos os valores de z tais que:

(a) (b)

(10) Resolver as equações:

(a) cos z = 4 (b) sen z = 2 i

(c) (d) cosz = 5

(11) Resolver as equações:

(a) (b) cosh z = 4

(12) Verificar as relações:

(a)

(b)

(13) Calcular:

(a) ln(-1) (b) ln i (c) ln(-i) (d) ln(-2-2i)

(14) Resolver as equações .

(15) Calcular:

(a) (b) Valor principal de (c)

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Capítulo 2

Seção 3
Limites e continuidades
Nesta seção, vamos discutir o limite de uma função no contexto do corpo dos
complexos.

3.1 Definição de limites


Uma função f(z) definida num domínio D possui um limite em , se existe um
número complexo L com a propriedade de que para todo número , existe
um número (dependendo de e de ), tal que sempre que
e .

Denominamos L o limite de f(z) quando , e escrevemos .

Considerando que a variável complexa z é um par de variáveis reais (x, y) e que


as funções complexas têm suas partes reais e imaginárias dependentes de (x, y)
podemos escrever:

se e somente se e

com L = A + B i.

3.2 Exemplos
(1) Mostrar que .

Dado um , existe um , tal que sempre que e

Vamos analisar a desigualdade:

Basta, portanto, fazer .

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Números e Funções Complexas

(2) Mostrar que .

A função dada não está definida para . Assim, podemos inicialmente considerar que:

Dado um , existe um , tal que sempre que e .

Observando a desigualdade:

ou

, basta considerar que .

(3) Mostrar que .

Dado um , existe um , tal que sempre que e

Vamos analisar a desigualdade:

Basta, portanto, fazer .

(4) Mostrar que .

Dado um , existe um , tal que sempre que e


.

Sabemos que vale a igualdade e podemos aplicar a desigualdade triangular

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Capítulo 2

Assim, , pois o módulo da unidade imaginária é


igual a 1.

Vamos agora analisar esse último resultado para encontrar um valor de ,


adequado que pode ser dependente de .

Usando que podemos escrever:

Desse resultado podemos considerar que , levando em consideração o


contexto do exemplo.

Partindo de ou , podemos fazer a

suposição que: ou . Assim, da relação podemos escrever

que , ou .

Partindo de , podemos escrever que , ou ainda,

, já que .

Assim, é válida para e com . Portanto,

o valor de , adequado e pode ser dado por:

Veja na Figura 2.2 a visualização desse resultado.

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Números e Funções Complexas

Figura 2.2 – Visualização do exemplo (4)

3.3 Teoremas
De forma similar ao contexto do estudo dos limites das funções de uma ou mais
variáveis, podemos estabelecer teoremas no contexto dos complexos.

3.3.1 Teorema
Seja , e , então
e .

Prova:

Estamos diante de um teorema que tem uma condição do tipo “se e somente”;
assim, vamos fazer a prova em duas partes.

Parte 1: e .

Inicialmente vamos supor que . Então, dado , existe um ,

tal que sempre que .

A frase acima pode ainda ser reescrita como dado , existe um tal que
sempre que .

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Capítulo 2

Como e , segue que


sempre que .

Assim, existe uma vizinhança do ponto , na qual ,


exceto possivelmente no próprio ponto. Uma região quadrada interior à vizinhança
também pode ser utilizada para a nossa prova. Estamos diante da definição de
limites de funções de duas variáveis, pois são funções de
variáveis reais.

Parte 2: e

Para provar a recíproca, vamos considerar que e

são satisfeitas para cada , existindo e tais que:

Supondo que seja o menor dos dois números e


ou seja, , vamos ter que vale , pois
.

Dessa forma, a demonstração do teorema está completa.

3.3.2 Teoremas Fundamentais


Sejam f e g funções cujos limites existem em : e .

Então:

(a) ;

(b) ;

(c) , desde que .

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Números e Funções Complexas

As demonstrações decorrem diretamente da definição de limites e usando o


teorema 3.3, é possível usar as demonstrações similares ao contexto dos limites
de funções reais de duas variáveis.

3.4 Cálculo de limites


O cálculo dos limites vai envolver a definição e também podemos usar as
técnicas já conhecidas do contexto dos reais, usando os teoremas. Dessa forma,
seguem exemplos.

3.4.1 Exemplo usando a definição

Mostre usando a definição que .

Dado , existe um número (dependendo de e de ), tal que


sempre que e .

Vamos reescrever Veja:

Assim, podemos escrever:

Vamos agora analisar o módulo de z:

Supondo que , e considerando podemos dizer que:

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Capítulo 2

Assim,

Portanto, o valor de a ser considerado deverá ser igual a:

3.4.2 Exemplos utilizando os teoremas


Calcular os seguintes limites usando os teoremas:

(2) .

3.5 Continuidade de funções no campo dos complexos

3.5.1 Definição
Seja f(z) definida num domínio D, e seja . Então f(z) é contínua em
se f(z) possui limite quando ; f(z) é contínua em D se for contínua em
todos os pontos de D.

Se considerarmos as partes real e imaginária da função, podemos dizer


que a função é contínua em se e somente se ambas as partes forem
contínuas no ponto dado.

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Números e Funções Complexas

3.5.2 Proposição
Sejam A e B abertos e , e funções complexas,
com . Supondo que são ambas contínuas em e que g é
contínua em . Então:

(1) As funções , ,e são funções complexas contínuas em ,


sendo que c é um número complexo.

(2) Se , então é contínua em .

(3) A função composta é contínua em .

Toda função complexa do tipo polinomial é sempre contínua.

3.5.3 Exemplos
Analisar a continuidade das seguintes funções:

(1) .

Estamos diante de uma função do tipo polinomial, portanto é sempre contínua em


todo o campo complexo.

(2) .

Estamos diante de um quociente de duas funções que são contínuas em todo


o campo complexo, entretanto, temos que considerar que não podemos ter a
continuidade no ponto , pois essa função não está definida neste ponto.

(3) .

Nesse caso, a função não está definida no ponto , portanto esta função
não é contínua neste ponto.

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Capítulo 2

(4) .

Analisando as raízes do polinômio do denominador, vamos obter os dois valores


em que a função não está definida, portanto não é contínua. Usando Bhaskara
temos que e são as raízes do denominador.

3.6 Atividades de autoavaliação

(1) Calcular os seguintes limites:

(a) . (b) .

(c) (d)

(e) (f)

(g) (h)

(2) Analisar a continuidade das seguintes funções:

(a) (b) .

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