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EXCELENTÍSSIMOS SENHORES JULGADORES

JUNTA ADMINISTRATIVA DE RECURSOS DE INFRAÇÕES


DEPARTAMENTO DE POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL - DPRF

Ref. Auto de Infração de Trânsito nº T567703819


Requerimento Administrativo

ELISON DOS SANTOS SILVA, CNH nº 07682819997,


CPF nº 141.359.627-42, endereço na Rua Brigadeiro
Eduardo Gomes, 493, sobrado, Visconde de Araújo -
Macaé/RJ, com telefone para contato nº +55 22 99938-
2316, por não concordar com o alegado pelo presente
órgão, dirige-se para apresentar suas razões, que espera
sejam suficientes para o deferimento da presente
requisição:

DA INFRAÇÃO

Alega o órgão autuador que foi praticado o ato de


ultrapassar outro veículo pelo acostamento, infração tipificada no artigo 202,
inciso I, do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), no dia 27/12/2021, às
14:23, no veículo de placa KUO-7823.
Contudo, a autuação não foi realizada nos moldes da
legalidade, além de narrar fatos incompletos, que distorcem e se distanciam da
realidade fática, conforme será demonstrado a seguir.
DOS FATOS

Partindo-se da premissa de que a presunção de


legitimidade de que goza o agente público é relativa e carece de prova, por ser
mera antecipação de uma realidade confirmável, impera que sejam esclarecidos
os fatos acerca do que realmente ocorreu.
No dia da suposta infração a parte Condutora trafegava
normalmente, adotando todas as medidas de segurança e prevenção
necessárias. Por óbvio, a parte jamais afrontaria as normas de trânsito,
realizando deliberadamente ultrapassagem pelo acostamento,
principalmente porque poderia acarretar risco a sua própria vida, com a
possibilidade de se envolver em acidente.
No ponto, cumpre registrar que, se tratando de infração
constatada por agente de trânsito, a qual se dá através do “olhômetro”, termo
que designa o fato de se utilizar o olho como um instrumento de medição, é
perfeitamente possível que o agente tenha se equivocado na interpretação da
situação concreta, gerando um auto de infração totalmente irregular e injusto.
Em virtude do narrado, sendo claro que é indevida a
autuação, espera-se que os argumentos abaixo expostos sejam considerados
procedentes e suficientes para o afastamento da pretensão estatal, por ser
medida de inteira justiça.

DA ATIPICIDADE DA CONDUTA. MERA VERIFICAÇÃO


DO QUE OCORRIA NA RODOVIA. TRÂNSITO PARADO ABRUPTAMENTE

Oportuno esclarecer que a parte Condutora em momento


algum realizou qualquer manobra ilegal deliberadamente, pois cumpre
rigidamente todas as regras e leis de trânsito.
Neste sentido, cabe ressaltar que a parte Condutora
trafegava normalmente pela rodovia, momento em que o trânsito parou
abruptamente.
Em ato de reflexo, a parte Requerente, apenas se
dirigiu ao acostamento para verificar o que estava ocorrendo da rodovia,
sendo que em momento algum realizou o ato de ultrapassagem.
Evidente que a parte, que conduzia seu veículo
normalmente, em momento algum, como já dito, teve a intenção de transgredir
ou desrespeitar qualquer regra ou a sinalização do local.
Ocorre que, no momento em que o motorista se depara
com uma situação em que a segurança da via, incluindo a sua, é ameaçada,
acaba sendo obrigado a decidir por respeitar a regra de trânsito ou zelar
pela segurança. Exatamente este o caso da parte Condutora, que foi
obrigada a optar e, por óbvio, optou por proteger sua integridade física e
material.
É inadmissível que se puna alguém que, em momento
algum, teve a intenção de desrespeitar o trânsito, sendo que só tomou a atitude
em virtude da necessidade de se proteger e manter a segurança da via. A parte,
aqui Requerente, não pode receber punição pela atitude de outro condutor que
desrespeitou as normas da via e, com isso, comprometeu a segurança de todos
que transitavam no local.
Ainda neste cenário, é nítida a necessidade de aplicarmos
a regra penal, pela analogia simples, de que uma penalidade, por mais que
administrativa, sempre tem caráter punitivo. Com relação, é imperativo
considerar que existem condições que excluem a ilicitude do fato, tal qual o caso
em comento. Neste sentido colaciona-se preceitos penais:

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:


I - em estado de necessidade; [...]

Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato


para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem
podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas
circunstâncias, não era razoável exigir-se.

Desta forma, tendo em conta que a parte Condutora


apenas realizou mera verificação do que ocorria na rodovia, com total
atenção ao fluxo e à segurança do trânsito, espera-se que o Nobre Julgador
compreenda a peculiaridade do caso e proceda ao cancelamento do AIT,
evitando-se que alguém que agiu em face da segurança receba uma punição
que, em virtude do exposto, seria completamente arbitrária.

DA OMISSÃO DO AGENTE. AUSÊNCIA DE


ABORDAGEM E DE PROVAS

Na presente notificação é possível verificar que não houve


abordagem por parte do agente de trânsito que realizou a autuação. Note-se
que, havendo ou não justificativa para a ausência de abordagem, nada
afasta a necessidade do ato, apenas se a parte tivesse se evadido do local
em fuga, o que não ocorreu.
Neste sentido, é necessário observar a letra da lei, onde,
segundo o artigo 280 do CTB, na forma de seu parágrafo terceiro, a abordagem
só é dispensada nos casos em que não é possível realizá-la. Vejamos:

§ 3º Não sendo possível a autuação em flagrante, o agente de


trânsito relatará o fato à autoridade no próprio auto de infração,
informando os dados a respeito do veículo, além dos constantes nos
incisos I, II e III, para o procedimento previsto no artigo seguinte. – Grifo
nosso.

É evidente que no caso em comento havia a possibilidade


de realizar a abordagem, sendo que a autoridade responsável pela autuação é
dotada de todas as prerrogativas necessárias, tendo inclusive a possibilidade de
forçar passagem entre veículos quando necessário.
A autuação realizada sem abordagem, principalmente
quando desacompanhada de informações detalhadas, é totalmente nula. A fim
de corroborar com tal alegação, coleciona-se o seguinte julgado:

RECURSO INOMINADO – Anulação de multa de trânsito – Alegação


de vício de formalidade por ausência de informações complementares
– Autuação realizada sem abordagem do veículo e notificação do
auto de infração enviada ao autor sem preenchimento do campo
"observações" – Descrição complementar obrigatória, nos termos da
Portaria 59 do DENATRAN – Cerceamento de defesa – Ocorrência –
Litigância de má fé não reconhecida – SENTENÇA DE
PROCEDÊNCIA MANTIDA – RECURSO DESPROVIDO. (TJ-SP - RI:
10029594820208260220 SP 1002959-48.2020.8.26.0220, Relator:
Lucas Campos de Souza, Data de Julgamento: 22/04/2021, 2ª Turma
Cível e Criminal, Data de Publicação: 22/04/2021) – Grifo nosso.
Ademais, se uma infração é cometida, toda a coletividade
é posta em risco, de modo que a autuação sem abordagem é completamente
desprovida de interesse em preservar a segurança do trânsito, uma vez que não
resulta em providências concretas.
Por esta razão, é cabível que se fale em omissão por parte
do agente que não realiza a abordagem, uma vez que sua atitude compromete
não somente a finalidade educativa das infrações de trânsito, mas, também, a
segurança e o bom funcionamento do trânsito como um todo.
Deste modo, por pressupor-se que os agentes públicos
não são omissos e que suas atitudes são sempre tomadas em virtude do
zelo pela segurança e bom funcionamento do trânsito, é evidente, Nobre
Julgador, que o agente não constatou qualquer infração, sendo a presente
autuação fruto, decerto, de engano cometido pela autoridade fiscalizadora,
devendo ser cancelada para que não se perpetue no tempo uma penalidade
completamente injusta para com a parte Requerente.

DA LEGITIMIDADE DA AUTUAÇÃO

O agente de trânsito que presenciar um fato que,


supostamente, justifique a lavratura do auto de infração, deve estar efetivamente
em serviço.
Mirando a questão de estar, ou não, o agente público
efetivamente em serviço para que se possa conferir validade à sua atuação,
assevera Paulo Euclides Marques, advogado e editor-chefe da Revista Transitar:

[...] o agente tem que estar devidamente designado, e isso inclui a


verificação de suas suspeições e impedimentos, segundo Celso
Antônio Bandeira de Mello, o que retira a competência de agentes
afastados da função, por qualquer motivo: folga, licença, férias, etc. A
função administrativa exige investidura plena, não sendo dever do
agente agir quando não estiver em exercício pleno de suas funções.

Com efeito, o item 4 do Manual Brasileiro de Fiscalização


de Trânsito, Volume I, é categórico ao preconizar que: “para que possa exercer
suas atribuições como agente da autoridade de trânsito, o servidor ou policial
militar deverá ser credenciado, estar devidamente uniformizado, conforme
padrão da instituição, e no regular exercício de suas funções”.
O parágrafo acima transcrito evidencia que, para que o
agente de trânsito se encontre legitimado para atuar nessa condição, não basta
ser credenciado pela autoridade competente, nem se encontrar devidamente
uniformizado, pois uma das condições impostas pelo mencionado regramento é
que ele esteja no regular exercício de suas funções. Em outras palavras, para
que o registro infracional seja considerado válido, no momento em que
presenciou o fato que justificaria a autuação, o agente de trânsito deve estar à
disposição da autoridade de trânsito para a qual atua, ou seja, deve,
impreterivelmente, estar em serviço.
Outrossim, o policial não pode esquecer que a finalidade
principal da autuação é educar o infrator e prevenir um novo cometimento de
infração de trânsito. Sem essa consciência, o policial movido por vingança,
rivalidade ou por interesses contrários à lei, poderá estar cometendo injustiças e
até mesmo crime militar de prevaricação previsto no artigo 319 do Código Penal
Militar, por desvio de finalidade.
Assim, considerando que o exercício de uma competência
administrativa não é uma faculdade do servidor público, mas sim um dever, se
abraçarmos a tese de que, independente de estar em serviço ou não, o agente
de trânsito tem competência para lavrar autuações, estaremos, na verdade,
impondo-lhe a obrigação de agir sempre que presenciasse uma infração
administrativa de trânsito, mesmo fora do seu expediente normal, o que, além de
contrariar a regulamentação vigente, provocaria reflexos na esfera penal e
trabalhista, por exemplo: prevaricação, como mencionado acima, horas extra,
etc.
A prévia designação para a atividade fiscalizatória é
condição para que possa o agente de trânsito lavrar autos de infração. Ao
estabelecer o horário de labor do seu agente, a autoridade de trânsito define a
condição temporal de validade para o exercício da função, pois fixa o período de
tempo em que o agente estará efetivamente atuando em seu nome.
Frente ao exposto, resta claro que, para que o auto de
infração seja considerado válido, no momento em que presenciou o fato que
justificaria sua lavratura, o agente de trânsito deve estar efetivamente em
serviço.
Dessa forma, com base no que prevê o inciso XXXIV,
letra “b” do artigo 5º da Constituição Federal, requer-se do órgão o envio
da escala de serviço do agente autuador, para que se confirme a
legitimidade da autuação ora atacada.

DA NECESSIDADE DA ANÁLISE DA SITUAÇÃO


ESPECÍFICA. PESSOA PETICIONÁRIA COM BOM HISTÓRICO DE
CONDUTOR

É sabido que as penalidades de trânsito possuem natureza


administrativa penal, tendo como finalidade pedagógica inibir os condutores a
cometerem infrações. Assim, surge um impasse como consequência lógica,
havendo a necessidade de que a Administração Pública encontre formas de
“ajustar” as sanções de modo a evitar incorrer em injustiças e
desproporcionalidades.
Para tanto, além de dosar a penalidade de acordo com o
grau de reprovação da conduta e por seu resultado prático, é necessário que se
leve em conta o histórico do suposto infrator, sendo que este é um dos requisitos
básicos para a individualização do julgamento.
Imperativo que a Administração Pública, para que não
recaia em ilegalidades, por inobservância da proporcionalidade e da isonomia,
observe quando da aplicação das sanções de trânsito o princípio da
individualização da pena, sob pena de mitigação da sua finalidade, o que não se
pode admitir. No presente caso, levando-se em conta o histórico da pessoa
Requerente, impossível admitir a necessidade de uma sanção, mesmo que
de cunho administrativo.
A Constituição Federal consagrou expressamente o
princípio da individualização, vejamos:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer


natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[…]
XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre
outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
e) suspensão ou interdição de direitos; - Grifo nosso.

Pelo exposto, mister que as penalidades administrativas


sejam individualizadas para cada suposto infrator, no intuito de respeitar a sua
natureza jurídica, bem como alcançar a finalidade do instituto.
No caso em comento, resta evidente que qualquer punição
seria desproporcional, uma vez que, como já dito, o histórico e a conduta da
pessoa Requerente ilustram sua forma de agir, sendo evidente o bom
comportamento enquanto pessoa cidadã e, especialmente, enquanto motorista.
Portanto, no caso em voga, tendo em vista o histórico da
parte, espera-se que o Nobre Julgador entenda por injusta qualquer tipo de
penalidade que restrinja direitos, especialmente por ser dispensável a função
mais importante da sanção de trânsito, qual seja, a de cunho pedagógico.

DA PRESUNÇÃO DE VERACIDADE E BOA-FÉ DO


AGENTE DE TRÂNSITO

Segundo os ensinamentos da Escritora e Doutora em


Direito Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a presunção de veracidade e boa-fé do
agente público consiste na “conformidade do ato à lei” e, em decorrência desta
prerrogativa, estes atos presumem-se, até prova em contrário, emitidos com
observância da lei.
Ocorre que, a presunção deve ser tratada como uma mera
antecipação daquilo que poderia ser comprovado. No caso em que estamos
analisando, nada mais restaria senão a palavra do agente contra a do
cidadão.
Em atenção a isso, deve ser lembrado que, de forma
alguma, a presunção pode ser absoluta. Isto seria o mesmo que admitir que o
Estado não seja suscetível de cometer erros, acarretando em um enorme
retrocesso em prejuízo à cidadania, além de gritante afronta ao devido processo
legal e à prova lícita, os quais estão todos elencados na Constituição Federal.
Dessa forma, a presunção relativa de legalidade e
veracidade vem sendo o entendimento pacífico de nossos Tribunais Brasileiros,
senão vejamos:

INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. PRESUNÇÃO RELATIVA DE


LEGALIDADE, VERACIDADE E LEGITIMIDADE. DESCOSTITUIÇÃO.
APARENTE VÍCIO. RECURSO NÃO PROVIDO. - Os atos
administrativos possuem presunção relativa de veracidade, que pode
ser desconstituída por aquele que os impugna a partir da
demonstração de eventuais vícios - Hipótese na qual há elementos que
demonstram aparente equívoco na imputação da infração de trânsito
ao recorrido, razão pela qual deve ser mantida a decisão agravada.
(TJ-MG – AI: 10607180001812001 MG, Relato: Alberto Vilas Boas,
Data de Julgamento: 20/11/2018, Data de Publicação: 27/11/2018) –
Grifo nosso.

Além disso, após toda a análise do auto de infração e do


caso específico da parte Requerente, não seria sensato admitir que a palavra do
agente público valha mais do que a palavra do cidadão, já que ausente
qualquer comprovação quanto ao alegado. A presunção da qual estamos
falando permite apenas a ação da Administração, mas não a isenção do dever
de provar a regularidade de sua anotação caso questionada.
O renomado Escritor Augustin Gordillo analisa o risco de
se atribuir tamanho poder a agentes públicos isolados, afirmando que:

[...] o ato administrativo pode ser, e frequentemente é, produto de uma


só vontade de um indivíduo isolado que por ocupar um cargo ou
desempenhar uma função adota por si uma determinada decisão;
reconhecer igual presunção que a da lei, como para exigir seu
cumprimento imediato, a qualquer ato de qualquer agente estatal que,
sem informação nem parecer jurídico, sem consulta, sem discussão
nem debate algum, sem fundamentação normativa nem fática, emita,
é consagrar o império da arbitrariedade. – Grifo nosso.

Para finalizar, entende-se que permitir a aplicação de uma


penalidade baseada em meras alegações de agentes estatais, quando estas são
corroboradas com elementos adequados e suficientes, seria dar poderes demais
ao Estado, abrindo-se caminho para o abuso. Por todo exposto, não há outra
medida a ser tomada, senão a anulação da presente infração, a qual se requer.
DA DEFESA

Importa destacar que se trata de imputação de infração de


demasiada seriedade, com penalidades onerosas e que correspondem e
condizem com a periculosidade dos atos supostamente praticados, não sendo
classificada como grave por mera ocasionalidade.
Nessa senda, a presente autuação causou extrema
perplexidade e espanto à pessoa Peticionária, uma vez que a parte é
conhecedora das normas de trânsito e do perigo que a conduta de
ultrapassar pelo acostamento da via pode gerar, em virtude disto, jamais
cogitaria tal prática.
Diante da gravidade dos atos imputados à parte
Requerente, não se pode deixar de exigir maior rigor na análise dos atos do
agente público. Neste sentido, inexistindo qualquer comprovação robusta e
precisa da ocorrência da infração, por parte da autoridade de trânsito, resta
inegável o descabimento da autuação, por flagrante afronta à legalidade e à
taxatividade.
Desta forma, não entendemos que seja coerente aplicar
penalidade contra a parte Peticionária que não reconhece a infração, não
identifica tê-la cometido e que não é esclarecida sobre qual seria a sua razão.
Tal situação cerceia toda possibilidade de defesa ou justificação da parte.
Ora, é vedado à Administração Pública lavrar auto de
infração ou cominar penas e multas com base em meras suposições ou
"desconfianças", circunstância agravada ainda pelo fato de ser de extrema
dificuldade ou até impossível, a produção de prova em contrário pela pessoa
Condutora. Devido a tal dificuldade o ônus da prova é invertido, como determina
a lei processual pátria, cabendo à autoridade autuadora a obrigação de provar o
cometimento indubitável da infração antes de cominar a pena.
No caso em tela, diante da inexistência de prova
inequívoca, não há razão para manter-se a referida autuação, eis que
desacompanhada de validade, razão pela qual se requer o seu
cancelamento.
DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA NO PROCESSO
ADMINISTRATIVO SANCIONADOR. AUSÊNCIA DE PROVAS

O Código de Trânsito Brasileiro prevê em seu corpo


normativo diversas espécies de reprimendas aos motoristas infratores, quais
sejam: advertência por escrito, sanção pecuniária, suspensão do direito de
dirigir, apreensão do veículo, cassação da CNH, cassação da Permissão para
Dirigir e a frequência obrigatória em curso de reciclagem.
É mister que se acentue que o chamado “ius puniendi” do
Estado é uno, ou seja, inobstante seja cediça a diferença existente entre as
sanções penais e as administrativas, também é evidente que ambas se tratam
de desdobramentos de uma mesma manifestação de Poder do Estado, o de
penalizar aqueles que agem de forma contrária ao ordenamento.
Com amparo nessa premissa, temos como positivado
o princípio da presunção de inocência no ordenamento jurídico brasileiro,
lembrando que as previsões principiológicas constitucionais ostentam
força normativa.
Nesse sentido, impera salientar as lições de Binenbojm:

Em uma palavra: a atuação administrativa só será válida, legítima e


justificável quando condizente, muito além da simples legalidade, com
o sistema de princípios e regras delineado na Constituição, de maneira
geral, e com os direitos fundamentais em particular.

Embora o texto Constitucional faça menção ao trânsito


em julgado de sentença penal, a sua hermenêutica é extensiva, abarcando
todo processo de cunho sancionador.
Outrossim, cabe trazer à baila que a garantia também está
prevista no Pacto de São José da Costa Rica, internalizado por meio do Decreto
nº 678/92, ao qual foi concedido pelo Supremo Tribunal Federal o status de
norma supra legal, que descreve que “toda pessoa acusada de um delito tem
direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente
comprovada sua culpa” - grifo nosso.
Vejamos o ensinamento de Paulo Tadeu Rodrigues Rosa:
Na dúvida, quando da realização de um julgamento administrativo
onde o conjunto probatório é deficiente, não se aplica o princípio
in dubio pro administração, mas o princípio in dubio pro reo,
previsto na Constituição Federal e na Convenção Americana de
Direitos Humanos, que foi subscrita pelo Brasil. A ausência de
provas seguras ou de elementos que possam demonstrar que o
acusado tenha violado o disposto no regulamento disciplinar leva
à sua absolvição com fundamento no princípio da inocência [...].
– Grifo nosso.

No caso em análise, o órgão que registrou a suposta


conduta ilícita deixou de produzir provas suficientes, capazes de demonstrar a
materialidade irrefutável do ato infracional de trânsito, bem como de oferecer um
juízo de certeza no tocante a sua autoria.
Diante do exposto, tendo em vista que um juízo de certeza
só se extrai de um acervo probatório contundente, ainda, não existindo nenhuma
previsão legal que autorize a tese da Administração de inversão do ônus da
prova por conjectural “estímulo a impunidade”, impõe-se seja afastada qualquer
penalidade, em atenção ao que estabelece nossa Carta Constitucional.

DA NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE CURSO


REALIZADO PELOS AGENTES. PORTARIA Nº 94/17 DO DENATRAN

Para garantir o cumprimento das normas de trânsito, o


agente fiscalizador deve, com obviedade, possuir o conhecimento mínimo
necessário da legislação, além de ter a capacidade de avaliar qual o melhor
procedimento adotado em cada situação, considerando as possibilidades mais
variantes do comportamento humano.
Diante disso, foi publicada no Diário Oficial da União, em
junho de 2017, a Portaria nº 94, de 31 de maio de 2017, do DENATRAN,
instituindo o Curso de Agente de Trânsito para profissionais que exercem as
atividades de fiscalização, operação, policiamento ostensivo de trânsito ou
patrulhamento nos órgãos integrantes do Sistema Nacional de Trânsito.
Assim, a Portaria supramencionada traz a seguinte
disposição em seu artigo 5º:
Art. 5º O profissional que exerce a atividade de agente da autoridade
de trânsito deverá realizar curso de atualização a cada 3 (três) anos, a
partir da data de entrada em vigor desta Portaria. – Grifo nosso.

Considerando que a legislação determina a


obrigatoriedade da realização do curso de capacitação dos agentes, imperativo
se faz a comprovação de que o agente identificado na notificação de
trânsito estava com o curso de formação em sua carga horária
devidamente cumprida.

DA NECESSIDADE DO VEÍCULO. PRESTAÇÃO DE


AUXÍLIO AO SEU FAMILIAR IDOSO

Cumpre informar que a parte Requerente é responsável


por sua mãe, já idosa, e que, em virtude disto, necessita de alguns cuidados
acentuados e recorrentes.
Outrossim, seu deslocamento precisa corriqueiramente ser
assistido pela pessoa Peticionária, diante das peculiaridades e dependência de
seu familiar, que precisa de constante auxílio para realização das tarefas mais
simples e rotineiras.
Deste modo, é indispensável para a manutenção do direito
preconizado no artigo 5º da Carta Magna, qual seja o direito à saúde, e em
respeito aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, que se mantenha
o direito de dirigir da parte Requerente, uma vez que sem poder transitar com o
veículo a parte estaria impossibilitada de prestar o auxílio a quem dela depende.
Neste sentido, cabe a transcrição de alguns dos artigos do
Estatuto do Idoso (Lei Federal nº 10741 de 1 de outubro de 2003), no qual são
estabelecidos os direitos dos idosos e são previstas punições a quem os
violarem, dando aos idosos uma maior qualidade de vida:

Art. 1º É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos


assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta)
anos.
Art. 2º O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à
pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta
Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as
oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e
mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em
condições de liberdade e dignidade.
Art. 3º É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do
Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a
efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à
cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à
dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária. – Grifo
nosso.

Além disso, não é proporcional que a presente pretensão


estatal atravanque a vida da pessoa Peticionária e de quem dela depende.
Destarte, ao permitir-se a aplicação desta medida desarrazoada, se
obstaculizaria, igualmente, o direito à liberdade, à saúde, à acessibilidade e, em
alguns casos, ao trabalho.
Por todo exposto, não há outra medida a ser tomada, senão
o arquivamento do presente, porquanto é a única opção viável no sentido de
evitar a ofensa aos direitos acima descritos.

DA NECESSIDADE DO VEÍCULO. FILHO

Cumpre informar que a parte Requerente é responsável


por seu filho, razão pela qual depende diariamente do veículo para que possa
transportá-lo e prestar-lhe toda sorte de assistência que seja necessária.
Por primeiro, diga-se que ninguém pode ser privado de seu
direito de locomoção. No caso em comento, ter a CNH restringida irá dificultar,
ou até mesmo impossibilitar, tarefas diárias da rotina da pessoa Requerente e
de sua família, porquanto consabidas as más condições do transporte
público em nosso país, trazendo prejuízos de difícil previsão e proporção. Este
fato feriria um dos mais relevantes princípios do direito brasileiro – o da
proporcionalidade.
Tal princípio sustenta que, quando existem dois ou mais
interesses conflitantes, deve a Administração, após a devida avaliação, decidir
qual dos interesses será sacrificado em detrimento do outro. No caso em
apreço, resta clara a desproporcionalidade da penalidade a ser imposta.
Nesse sentido, a norma basilar que regula a proteção das
crianças e adolescentes em nosso país está estampada no artigo 227 da
Constituição Federal Brasileira de 1988, que estipula que:
[...] é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança,
ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à
saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à
cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e
comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de negligência,
discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Sendo assim, acaso a pretensão do Estado seja exercida,


a pessoa Peticionária não só estaria sendo impedida de levar seu filho às suas
atividades diárias e atendê-lo em situações emergenciais, como também estaria
igualmente deixando de cumprir com seu dever enquanto família.
Ademais, cumpre apontar que o dever de assegurar os
direitos da criança e do adolescente deve, também, ser garantido pelo Estado.
Logo, a pretensão estatal no presente procedimento encontra barreira em suas
próprias missões constitucionais, uma vez que a procedência do processo
administrativo em apreço trará prejuízos diretos ao filho da parte Requerente.
À vista disso e em respeito aos princípios da razoabilidade
e proporcionalidade, é indispensável que se mantenha o direito de dirigir da
parte, garantindo-se a manutenção dos direitos preconizados no artigo 227 da
Carta Magna.
Por todo exposto, não há outra medida a ser tomada, senão
o arquivamento do presente procedimento.

DA PREJUDICIALIDADE DA SOMATÓRIA DOS


PONTOS NA HABILITAÇÃO. CARTEIRA PROVISÓRIA

Impera consignar o fato de a pessoa Peticionária possuir


CNH provisória. Durante todo este período vem dirigindo de forma exemplar,
cumprindo todas as normas de trânsito. Desta forma, é completamente
injusto e descabido que um erro do órgão possa acarretar na perda de sua CNH.
Ademais, a parte necessita da CNH para realizar
viagens a trabalho e a perda de sua CNH lhe trará danos inimagináveis. Ora,
no momento em que vivemos enquanto sociedade, para o indivíduo, a posse do
veículo oferece um salto para a liberdade e a oportunidade de locomoção a
qualquer tempo e para qualquer local. Restringir tal liberdade é afrontar de forma
objetiva a Constituição Federal, razão pela qual, a mera perspectiva de lesão
deve ser coibida veementemente.
Assim, tendo sido apontados os motivos pelos quais se
torna indispensável o uso do veículo pela parte, resta claro que a somatória
destes pontos na sua habilitação reveste-se de caráter meramente arbitrário e
desproporcional, fazendo com que esta penalidade ultrapasse o sentido
educativo das infrações de trânsito e torne-se unicamente um empecilho à
liberdade da pessoa Requerente.

DO EFEITO SUSPENSIVO DO RECURSO


ADMINISTRATIVO

Postula-se no presente procedimento administrativo pelo


efeito suspensivo do recurso a ser interposto, tendo em vista a fragilidade
jurídica que se aplica ao caso.
À luz do princípio do devido processo legal, protegido pela
Constituição Federal em seu artigo 5º, LIV: “ninguém será privado da liberdade
ou de seus bens sem o devido processo legal”. Portanto, justo que os condutores
não sejam punidos antes que a matéria seja apurada pelos Julgadores.
Não menos importante é o respeito ao que preconizam os
princípios do contraditório e da ampla defesa, conforme disposto no artigo 5º,
LV, CF: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e
recursos a ela inerentes”.
Outrossim, em mesmo sentido, a autoridade máxima do
trânsito no país, o CONTRAN, dispõe na Resolução nº 723 de 2018, em seu
artigo 25:

Art. 25. No curso do processo administrativo de que trata esta


Resolução não incidirá nenhuma restrição no prontuário do
infrator, inclusive para fins de mudança de categoria do documento de
habilitação, renovação e transferência para outra unidade da
Federação, até a efetiva aplicação da penalidade de suspensão ou
cassação do documento de habilitação. – Grifo nosso.
A legislação, a fim de assegurar um Estado Democrático
de Direito, resguarda à parte Requerente a premissa de contrapor o apresentado
pelo Estado, seja em infrações registradas por radares, seja em infrações
anotadas por agentes, impedindo, assim, que sejam aplicadas sanções injustas.
Nesta lógica, seria absurdo verificar penalidades sendo
impostas antes do fim de suas possibilidades de interposição de recurso,
uma vez que ainda não esgotadas as esferas de discussão da matéria e em total
desacordo com o princípio da legalidade.
De acordo com a legislação pátria, a presunção de culpa é
rechaçada. Assim, necessária a aplicação do efeito suspensivo à causa, até que
findos os limites da esfera administrativa, preservando o direito da pessoa
Peticionária de continuar dirigindo normalmente, a possibilidade de renovação
da Carteira Nacional de Habilitação, licenciamento e, até mesmo, transferência
do veículo.

DO PEDIDO

Diante do exposto, considerando que a rejeição de


qualquer ponderação feita por particular contra alegação da administração
pública deve ser corretamente motivada e justificada, requer-se sejam
conhecidas e recebidas as presentes razões, vez que tempestivamente
apresentadas na forma correta, com a posterior procedência, cancelando-se a
presente autuação, pelos motivos acima expostos, não gerando qualquer
penalidade financeira ou administrativa à parte Requerente.
Face às exigências da Lei nº 9.784/99, em seu artigo 50,
espera-se que o não acolhimento das razões apresentadas seja correta e
minuciosamente motivado, com sua publicidade feita na forma de notificação
dentro do prazo legal para o endereço da pessoa Peticionária.
Nesses termos, pede e espera deferimento.

29 de junho de 2022

____________________________________
ELISON DOS SANTOS SILVA

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