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Candomble - Jeje
Candomble - Jeje
Jeje Brasil
Djedje (jeje) é uma palavra de origem yoruba que significa estrangeiro,
forasteiro e estranho; que recebeu uma conotação pejorativa como
“inimigo”, por parte dos povos conquistados pelos reis de Dahomey e
seu exército. Quando os conquistadores eram avistados pelos nativos de
uma aldeia, muitos gritavam dando o alarme “Pou okan, djedje hum
wa!” (olhem, os jejes estão chegando!). Quando os primeiros daomeanos
chegaram ao Brasil como escravos, aqueles que já estavam aqui
reconheceram o inimigo e gritaram “Pou okan, djedje hum wa!”; e assim
ficou conhecido o culto dos Voduns no Brasil “nação Jeje”. Dentre os
daomeanos escravizados, uma mulher chamada Ludovina Pessoa,
natural da cidade Mahi (marri), foi escolhida pelos Voduns para fundar
três templos na Bahia. Ela fundou: um templo para Dan; “Ceja Hundê”,
mais conhecido como o “terreiro do Ventura” ou “Axé Pó Zehen” (pó
zerrêm) em Cachoeira de São Felix; um templo para Hevioso “Zoogodo
Bogun Male Hundô” em Salvador e um templo para Ajunsun que não se
sabe porque não foi fundado. Esse é o segmento jeje-mahi do povo Fon.
O templo de Ajunsun/Sakpata foi fundado mais tarde pela africana
Gaiacu Satu, em Cachoeira de São Felix e recebeu o nome de Axé Pó
Egi, mais conhecido por Corcunda de Ayá. São os Jejes Savalu ou
Savaluno. Sakpata era rei da cidade Savalu/África, segundo alguns
historiadores, Sakpata foi o único rei que preferiu o exílio a se render
aos conquistadores de Dahomey. O dialeto dos savalus também é o Fon.
No Maranhão encontramos a Casa das Minas fundada por Maria Jesuína,
segundo informação de Sergio Ferreti. Creio que esta casa dispensa
comentários, pois é com certeza a mais conhecida casa de jeje do Brasil.
Esse é o segmento do povo Jeje-Mina.
Ainda no Maranhão encontramos a casa Fanti-Ashanti fundada por
Euclides Menezes Ferreira. Esse é o segmento jeje-Fanti-Ashanti do
povo Akan vindo de Ghana.
No Rio de Janeiro, foi fundado pela africana Gaiaku Rosena, natural de
Allada, o “Terreiro do Pó Dabá” no bairro da Saúde, que foi herdado por
sua filha Adelaide do Espírito Santo, mais conhecida como Mejitó que
transferiu a casa de santo para o bairro Coelho da Rocha. Depois veio
Antonio.Pinto de Oliveira. “Tata Fomutinho” que fundou o Ceja Nassó,
no bairro de Santo Cristo, depois mudou-se para Madureira na Estrada
do Portela, depois para São João de Meriti onde finalmente se
estabeleceu na Rua Paraíba. Dizem os mais velhos, que Mejitó, ajudou
muito Tata Fomutinho no começo de sua vida de santo aqui no Rio de
Janeiro. Tata Fomutinho deixou uma legião de filhos, netos e bisnetos.
Dentre esses, meu pai Jorge de Yemanja que fundou o Kwe Ceja Tessi,
Pai Zezinho da Boa Viagem que fundou o Terreiro de Nossa Senhora
dos Navegantes, Tia Belinha que fundou a Colina de Oxosse e Amaro de
Xangô que é aquele tio que está sempre disposto a nos atender e nos
ajudar com suas memórias e conhecimentos.
Vodum
Vodou – Vodoun – Vodum – Voodoo – Voudun – Vodu – Vudu –
Hoodoo - etc. A palavra vodou é de origem Ewe/Fon e significa força
divina, espírito, força espiritual. É usada pelo povo do oeste da África
para designar os deuses e ancestrais divinizados. No século XVIII o rei
Agajá consolidou as crenças de vários clãs e aldeias, formando um
“sistema espiritual dos Voduns”. Isso gerou uma enorme variação do
termo, devido a quantidade de dialetos usados por esses clãs e aldeias,
que somado a influência francesa, passaram a falar como entendiam.
Essa diversificação fonética dá-se também por conta dos idiomas de
pesquisadores que “invadiram” a África, em busca de conhecimento
sobre o Vodou. No Brasil, por exemplo, usamos o fonema Vodum. A
palavra Hoodoo não é uma variante de Vodou. O Hoodoo é uma
sociedade haitiana similar as que existem no Benin (Sociedade do Bo) e
Ghana (Sociedade Jou-Jou), onde pessoas são preparadas para ler
oráculos e fazer fórmulas mágicas usando elementos da flora, da fauna e
do mineral. Como sou brasileira usarei daqui por diante o termo
“Vodum”. Quando foi estabelecido o grande reino de Dahomey, lá não
existia o culto de Voduns. Nessa época, o atual rei sentia a necessidade
de uma assistência espiritual que o ajudasse a combater os problemas
que o atormentava. Mandou chamar um bokono (adivinho) e pediu que
esse consultasse os oráculos. A conselho dos oráculos mandou vir de
diversas regiões os Voduns e construiu seus templos. Com isso
Dahomey passou a sitiar diversos clãs e aldeias de Voduns. Anos mais
tarde, o rei Agajá fez a consolidação, como já foi dito. No período da
escravidão, muitos daomeanos foram levados para o novo mundo e com
eles a cultura e o culto dos Voduns. Os Voduns cultuados no Brasil são
originário da África, sua práticas e tradições se mantiveram intacta como
era no Dahomey (atual Benin) desde o começo dos tempos. A nação Jeje
sofreu por alguns anos uma queda em seus cultos, devido a falta de
informações. Os mais antigos preferiram levar para o túmulo seus
conhecimentos a passá-los aos que poderiam perpetuar os Voduns no
Brasil. Dos filhos de Jeje que ficaram perdidos, sem conhecimento sobre
Voduns, uns mudaram de nação e outros resolveram investigar, buscar,
pesquisar suas origens e levantar a bandeira da nação. Hoje, graças a
essas pessoas, a nação Jeje voltou a crescer e a seguir a cultura que foi
deixada pelos escravos. Hoje, encontramos kwes e pessoas que
realmente sabem o Culto dos Voduns, esses aprenderam na “própria
carne” a passar seus conhecimentos e não deixar que nossa nação venha
a sofrer novos abalos ou quedas. Com a proliferação de estudos e
pesquisas sobre os Voduns, alguns dos mais velhos que ainda estão
vivos resolveram colaborar e nos passar alguns conhecimentos. A
primeira coisa que os adeptos do Jeje devem aprender é a diferença entre
Voduns e Orixás, (esse assunto vocês encontram no tópico Jeje África).
Vodum é Vodum, Orixá é Orixá; Oya não é Vodum Jô. Aziri não é
Oxum, Naetê não é Yemanja, etc. Assim como na África, também
fazemos Orixás dentro dos templos de Vodum, mas isso não os
transforma em Voduns, eles são considerados deuses estrangeiros,
aceitos em nossos templos. Esses Orixás são tão respeitados e venerados
quanto os Voduns. Não existe discriminação nenhuma em relação aos
dois deuses (Voduns/Orixás). Em templos de Orixás, também
encontramos Voduns feitos, a única diferença é que no Jeje, não
mudamos os nomes dos Orixás. Para nós Oya, Yansã são conhecida
exatamente como Oya, Yansã. Já os Voduns em templos de Orixás
mudam de nome, por exemplo, Vodum Dan/Bessen recebe o nome de
Oxumarê, Sakpata recebe o nome de Omolu, etc. Esse diferença também
é registrada na Nigéria, então, não é “coisa de brasileiro”. Falar sobre os
Voduns é uma tarefa de muita responsabilidade. No meu caso é o
resultado de 30 anos vividos dentro do culto, somado as minhas
pesquisas e estudos. Os Voduns são agrupados por famílias; Savaluno,
Dambirá, Davice, Hevioso; que se subdividem em linhagens. A
sociedade daomeana é patrilinear e polígena, isto é, dá-se por linha
paterna; o homem é casado com diversas mulheres. A sociedade
organiza-se em sibs, grupos de irmãos que têm a mesma mãe e o mesmo
pai, sem base territorial própria e subdividem-se em famílias. No Brasil,
as casas de santo cultuam todas as famílias, porém, os Voduns são
interligados entre si com comportamentos, costumes, gostos e atitudes
sempre gerados pelo ancestre ou chefe de da casa. Em minhas pesquisas
encontrei mais de 450 Voduns; alguns cultuados no Brasil outros não.
Acredito que com esse resgate poderemos ampliar nossos cultos e voltar
a reverenciar Voduns, que tinham desaparecido devido a falta de
informações, assim como admitir em nossos templos esses Voduns
encontrados. O Brasil herdou vastos panteões de divindades que ficaram
regionalizados de maneira que somente alguns Voduns tiveram domínio
nacional A cultura dos Voduns é belíssima; penso que todos nós, filhos
da nação Jeje, devemos procurar aprender cada dia mais. Afirmo que, os
maiores fundamentos de Voduns estão embutidos nessa cultura.
Comprovem!...
DAN YEWA FA
NOHÊ
TOGUN TOHOSSOU
AIKUNGUMAN
VODUNS DA
TOBOSSI SAKPATA
RIQUEZA
HEVIOSO AVEJI DA NANÃ
NAES DAS AGUAS NAES DAS AGUAS
EKU E AVUN
OCEANICAS DOCES
VODUM DAN/BESSEN
Aido Wedo(aidô uêdô) e Dambala são para o povo Jeje os maiores
deuses.
Aido Wedo é o arco-íris e Dambala a sua imagem refletida nas águas
oceânicas.
O Dangbé é a serpente sagrada que representa o espírito de Vodum Dan.
Na África esse Vodum é conhecido como DA.
Dada - Termo pelo qual o Vodum Dan é louvado. A coroa de Dan é
chamada de Coroa de Dada.
Dan tanto pode ser um Vodum masculino quanto pode ser um Vodum
feminino, porém para tratá-lo, fazê-lo ou assentá-lo temos que cuidar
sempre do casal. Como dizem os antigos "cobra não anda sozinha, seu
parceiro esta sempre por perto".
Dambala também é conhecida como Daidah (daídar) – A "Cobra–Mãe".
Essa Vodum não pode ser feita em mais de duas pessoas num mesmo
país. Os velhos vodunos contam que ela é originária da Palestina. Em
uma outra versão, encontramos Daidah como Lilith, a primeira mulher
de Adão.
No Brasil encontramos cerca de 48 Voduns Dans, na África
encontramos muito mais que isso. Essa família é muito grande.
Dan é um Vodum muito exigente em seus preceitos, muito orgulhoso e
teimoso. Quando tratado corretamente, dá tudo aos seus filhos e a casa
de santo, mas se tratado de maneira errada ou se for esquecido castiga
severamente. Vodum Dan é muito fiel a casa e a mãe/pai de santo que o
fez.
Os símbolos de Dan, são: o arco-íris, a serpente pithon, o traken ou
draka, patokwe, o dahun , a ..takara. e o ason (assôm). Seu principal
atinsa (atinsá) dentro de uma casa de Santo é denominado Dan-gbi , que
é onde o arco-íris se encontra com a terra ("panela lendária do
tesouro!"). Dan usa muitos brajás feitos de búzios. As aighy (aigri), são
importantissimas em seus assetamentos e atinsas.
Para nós, Vodum Aido Wedo é o verdadeiro deus da vidência, é ele
junto com Vodum Fa, quem dá aos bakonos o poder do oráculo, assim
como deu a Yewa e a Legba.
Aido Wedo e Dambala são quem sustentam o mundo e quando eles se
agitam provocam catástrofes como os terremotos. Eles fazem parte da
criação do mundo, pois vieram ajudar Nana Buluku nessa tarefa.
Nos arcos-íris da lua e do sol também encontramos Voduns Dan.
Ao se iniciar um filho de Dan, preceitos são feitos para que esse Vodum
venha sempre em forma humana e nunca em forma de serpente, pois
entendemos que na forma humana ele é menos perigoso e entende
melhor os homens, podendo assim atender suas necessidades e suprí-las.
Na forma de serpente torna-se muito perigoso.
De modo geral os filhos de Dan são muito chegado a doenças,
principalmente de olhos. São pessoas vaidosas, ambiciosas, "perigosas",
espertas e inteligentes. São muito dedicados ao santo e dificilmente saem
da casa onde foram feitos.
Vestem branco em sua grande maioria. Alguns usam cores verde bem
clarinho, prateado, ou tecido liso com o arco-íris estampado. Seus fios
de conta variam de acordo com cada Vodum, não existe um modelo
padrão.
Sua louvação principal é: A Hho bo boy = "Salve o rei cobra" ( Hho =
rei, bo boy = Dans, serpentes, cobras).
Abaixo citarei alguns Voduns Dans.
Aido - (encontramos várias formas de escrever o nome dele) -
Wedo Deus do Arco-íris
Dambala - esposa de Aido-Wedo, seu reflexo nas águas.
Dan-Ko - muito ligada e, por vezes confundida, como Oxalá.
Conhecida no Brasil como Dan Inkó.
Ojiku - masculino, mora junto com Yewa na parte branca do
arco-íris e reina no arco-íris da lua, também junto com
Yewa.
Frekwen - feminina, guardiã do arco-íris em volta do sol. Também
conhecida como Frekenda.
Bosalabe - toqüeno, feminina, irmã gêmea de Bosuko, irmã de
Yewa. Muito alegre e faceira, mora nas águas doce.
Muito confundida com Oxum. também conhecida como
Vodum Bosa (bôssá).
Ijykun - feminina, mora nas enseadas. Muito confundida com
Yewa.
Bosuko - masculino, toqueno, gêmeo com Bosa
Akotokwe - masculino, considerado o pai de muitos Dans.
n
Afronotoy- masculino, mora no rio.
Vocabulário
traken ou - ferramenta pequena que Dan tras nas mãos
draka
dahun - conjunto de 3 tambores brancos paramentados com
rafia lilás
takara - arma que Dan tras nas mãos, parecendo um pequena
espada, com feitio próprio.
ason (assôm) - chocalho feito com uma cabaça e com as vertebras
de cobra
aigry (aigri) - pedras que representam o excremento de Dan e são
deixadas por ele no chão, à sua passagem; dizem que
elas valem peso de ouro. Um mito nos conta que os
excrementos de Dan transformam os grãos de milho
em búzios.
1 - Dan no Benin - Ouidah
O culto de Dangbé conheceu seu apogeu em Ouidah, onde está seu
templo até os dias de hoje. Os Dadas, seus adeptos, anualmente, faziam
sacrifícios de bois, cabritos e frangos para a python. Atualmente, devido
à escassez de animais para sacrifício, os adeptos arriscam-se caçando
roedores
Logo que um não adepto descobre uma Dangbé em sua casa, previne o
sacerdote Dangbénon ou a uma pessoa que conheça os costumes deste
réptil. Eles pegam a cobra como um fetiche em sua mãos ou ao redor do
pescoço e levam-na, silencioso e concentrado, até o templo. Eles
acreditam que a picada da python traz imunidade contra qualquer
veneno
Dan é, freqüentemente, representado por uma serprente (python) ou um
arco-íris.
A primeira vista, alguns historiadores comentam tratar-se de ofiolatria.
Mas a serpente de que se trata aqui é um espírito que habita o espaço e
cujo deslocação determina os ciclones. Dan apreende-se do princípio
vital do qual depende os seres humanos para manterem-se vivos e a terra
em equilíbrio.
Para escapar de Dan, basta friccionar o corpo com boldos de cebola ou
xingá-lo com palavras bem grosseiras. Ainda sob a forma humana, Dan
pode entrar em casas. Os que o acolhem são recompensados com
tesouros mas, quem o afasta, é amaldiçoado.
Dan é muito guloso, grande apreciador de bananas e óleo de palma.
Recebe estas oferendas na frente de um pequeno par de assentamentos
que representam Dan macho e Dan fêmea
-
Sua morada é o firmamento, onde se encontra sob a forma de arco-íris
(Aido Wedo). Não se mostra nunca sem sua fêmea. Conta-se que há dois
arco-íris, mesmo que só consigamos ver um, e que antes de sua
ascensão, teria vivido 41 anos no nosso mundo.
A configuração dos países, o lugar das cidades, os acidentes geográficos
(montes, vales), são os vestígios de sua estada prévia em nosso mundo e
o arco-íris, vestígios de sua estada remota.
Os homens (sobretudo os caçadores) que Dan quer enriquecer,
conduzem-no por uma força invisível ao local onde é chamado o rabo do
arco-íris e são induzidos a tocarem na terra. Os homens têm como efeito
desta força invisível, um desejo de fazerem uma profunda escavação no
que acham ouro, pérolas, toda sorte de tesouros.
Dan protege nomeadamente o Danson, o Dansi e o Dannou. A pessoa
consagrada ao Dangbé é um Dangbési.
2 - A Floresta Sagrada
A floresta foi consagrada pelo rei Kpassé, Ouidah, onde fizeram um
círculo mágico, silencioso, transparente ao ar. Os grandes deuses fixam
seus duros olhos. Heviosso, Dan, Sakpata. E também os Voduns reais
como Dâguessou, protetor do rei Ghézo, com seus poderes contidos em
pequenas cabaças, fetiches em forma de bracelete.
À entrada, o grande Legba figura numa expressão profana sob os irokos
centenários, Tokougagba conta com os irmãos e todo o panteão dos
Voduns.
E toda a rota dos escravos é demarcada por esculturas de pedra, limite de
uma memória fascinante e triste.
Meus comentários: (Yatemi Jurema de Yansã)
Alguns segmentos Jeje no Brasil, não concordam que se deva tratar do
casal de Dans. Outros usam esse procedimento somente para alguns
Dans.
Pelo que aprendi e pelo que lemos sobre o culto de Dan no Benin,
podemos constatar que o correto é tratar do casal realmente.
Hevioso
Yewa
Yewa é um vodum feminino da família Dambirá. Filha de Toy Azonze e
Dambala, irmã de Boçalabê nasceu para ser o símbolo da pureza e da
beleza dos deuses. Do nascimento a fase adulta Yewa viveu na família
de Dan onde representava a faixa branca do arco-íris onde também mora
Ojiku. Recebeu de Dan Wedo o poder da vidência, da riqueza, e todos os
corais que existiam no mar que ela pegava com seu arpão.
A beleza física de Yewa encantava a todos que olhassem em seus olhos,
mas essa nunca se encantava com ninguém pois era o símbolo da
virgindade e da pureza. Muitos homens se apaixonaram por ela e todos
foram punidos pelos deuses pois sabiam que era proibido amar a grande
Virgem.
Yewa adorava ver o por do sol e sempre saía a passear pelos campos
floridos acompanhada por dois bravos guardiões que não permitiam que
ninguém se aproximasse dela. Era um casal de gansos branco, lindos e
majestosos. Certo dia, estava Yewa a apreciar o por do sol, quando uma
galinha, se aproveitando da distração dos gansos, aproximou-se e ciscou
muita terra sobre as vestes brancas de Yewa, essa se enfureceu e
amaldiçoou a galinha e daí para frente nunca mais quis ver uma em sua
frente como também resolveu mudar suas roupas para as cores do por do
sol.
Certo dia, Yewa avistou um belo homem, um guerreiro e se encantou
por ele.
Yewa enfrentou e desafiou todos os deuses por amor a esse homem e
teve como castigo o exílio. Foi expulsa da família de Dan e considerada
a cobra má. Durante seu exílio, Yewa teve que fugir e esconder-se da
fúrias dos deuses.
Em sua primeira fuga, Yewa contou com a ajuda de um grande caçador
e guerreiro, Odé, que a escondeu nas profundeza das matas escuras, em
terras yorubanas.
Vendo-se em um lugar sombrio e sem recursos de sobrevivência a sua
disposição, Yewa aceitou um ofá que Odé ofereceu-lhe. Aprendeu a
caçar junto com ele e com os demais caçadores.
A beleza de Yewa encantava e perturbava Odé e aos demais que viviam
nas matas, pois eles sabiam que não podiam se apaixonar por ela,
temiam a fúrias dos deuses. Odé então, fez para Yewa uma coroa de
dans e folhas de palmeiras desfiadas. Mandou que ela a coloca-se, assim
ninguém se aproximaria dela com medo das dans e as folhas desfiadas
da palmeira esconderiam sua beleza contagiante. Yewa gostou do
presente pois viu nesse, a possibilidade de esconder-se dos deuses e
livrar-se de sua fúria.
Com o uso dessa coroa Yewa pode sair da escuridão das matas e ir
apreciar o que mais ela amava e representava ... o por do sol. Faltava-lhe
seus guardiões, pediu ajuda a Odé e esse caçou para ela um casal de
gansos negros, pois foram os únicos que encontrara. E assim, Yewa
passou a ver e a viver o por do sol novamente em seu exílio.
Passado um tempo, Toy Azonze foi aos deuses pedir por sua filha Yewa
que já tinha sido por demais castigada. Depois de muitos pedidos e
oferendas aos deuses, esses concederam a Azonze a guarda de Yewa que
deveria morar com ele. Azonze embrenhou-se nas matas a procura de
sua filha e a encontrou junto a Odé.
Como agradecimento por tudo que fez por Yewa, Toy Azonze deu a Odé
um par de chifres e o poder de chamá-lo e aos espíritos da caça quando
assim precisasse.
Yewa foi morar no reino dos mortos junto com Azonze e com esse
passou a exigir o cumprimento da moral e dos bons costumes. Em sua
nova morada Yewa recebeu o caracolo/aracolê onde guarda os segredos
dos ancestrais e os invoca quando é necessário, e o eruxim com o qual
espanta os egum para o caminho de Oya. Sempre que possível, Yewa
engana Eku e salva uma vida.
Yewa é um Vodum raríssimo de ser encontrado no TA (cabeça) de
alguém. A feitura de Yewa deve ser sempre em TA de virgens e nunca
em TA de homens.
Por ter o poder da vidência, Yewa tem o poder de nos livrar do "olho
grande" e das invejas. Quem sabe cuidar desse Vodum, se livra
facilmente dos invejosos.
Encontramos Yewa tanto nas águas quanto nas matas e mundos
subterrâneos (aquático e terrestre), mas seu local preferido é sempre o
horizonte, onde o por do sol faz o encontro dos dois mundos e o céu se
encontra com a terra, "Isso é Yewa" dizem os antigos.
Ojiku é um Vodum Dam que sempre é muito confundido com Yewa,
assim como Boçalabê que é sua irmã. Ojiku é considerado a Cobra
branca e Boçalabê é uma Vodum das água doces, muito confundida com
Oxum. Em muitas pesquisas e entrevistas que fizemos pudemos
constatar a confusão e controvérsias que as pessoas fazem em relação a
Yewa e esses dois Voduns.
Tohossou:
Vodum Protetor dos Deficientes Físicos e Mentais
AVEJI DA
Ligadas as tempestades, raios, furacões, redemoinhos, ciclones, tufões,
maremotos, erupções vulcânicas, aos ancestrais e a guerra, todas as
Voduns guerreiras são conhecidas como Aveji da. Até mesmo Oya dos
yorubanos, é assim denominada em território daometano.
Erroneamente, no Brasil, algumas pessoas feita de Oya se intitulam
filhas de Vodum Jò. Digo erroneamente porque Oya é um Orixá
yorubano e Vodum Jò é um ToVodum do panteão de Aveji-da, assim
como Jò Massahundo também.
Aveji-da é o Deus/Deusa das tempestades e dos ventos.
Podemos encontrar as Aveji-da tanto na família Dambirà quanto na
família Heviosso.
As Aveji-da, da família Dambirà estão ligadas diretamente ao cultos dos
akututos, sendo que cada uma tem sua função. Algumas reinam na
fronteira do djenukom com o aikungúmã, outras nos ekúchomê, outras
no hou, ôtan e tódôum., outras em humahuan, outras junto com Naê
Nana, outras junto aos kpame e "possuídos" - essas, "talvez", sejam as
que mais trabalham (opinião minha) - outras se encarregam, junto com
Exu, de levar os ebós e pedidos feitos pelo povo encarnado e
desencarnados, a quem de direito e tentam trazer as soluções para cada
um - normalmente conseguem. Enfim, é uma infinidade de atribuições
que essas Voduns têm, todas sempre em prol daqueles que pedem e
precisam do auxílio delas, sejam encarnados ou desencarnados.
Todas essas Voduns, são temidas e respeitadas por akututòs. Elas têm
todos os poderes sobre o reino dos mortos e junto com Sakpata e Nae
Nana, controlam a vida e a morte.
As Aveji-da da família Heviosso, estão mais ligadas aos fenômenos da
natureza, como o furacão, ciclone, maremotos, erupções vulcânicas, etc.
onde os eguns recém desencarnados nesses fenômeno são encaminhados
imediatamente por elas as Guerreiras dos cultos de akututòs, pois
Heviosso e demais Sobos não abrem suas portas para ekùs, dessa forma
o trabalho delas tem que ser rápido e eficiente, para não contrariar o
grande Heviosso.
Contam os velhos Vodunos e Bakonos que a fúria de Aveji-da e de
Heviosso contra as heresias humanas é que provocam esses fenômeno
onde muitos sucumbem. Nessas ocasiões é que devemos recorrer a
Velha Vodum Guerreira que com sua sabedoria e magia sabe aplacar a
fúria dos deuses e acalma-los.
Essa Velha Vodum Guerreira mora junto com as demais Yamis e todas
as Aveji-da prestam culto a mesma e tomam seus conselhos e usam sua
magia quando precisam. Ela é um velha Aveji-da que se esconde nas
sombras e adora a noite. Os pássaros são seu encanto. Junto com Ágüe
visita os kwes em sua rondam noturna e se encontrar demandas ela ai se
detem nos para ajudar ou cobrar. A fúria dessa Vodum destrói os
inimigos e fecha um kwe. Dificilmente um kwe fechado por ela
consegue se reerguer. Somente através de Baba Egum se consegue
chegar a ela para aplacar sua fúria. As Aveji-da são mulheres muito
vaidosas, gostam do belo, adoram a natureza, apreciam quando suas
filhas imitam suas vaidades. São todas muito vaidosas e autoritárias, não
gostam de receber ordem de ninguém principalmente dos homens, mas
quando fazem suas vontades e caprichos tornam-se dócies e carinhosas.
São muito maternais, perdoam com facilidade seus filhos e os defende
com toda a garra de guerreiras. Gostam de disputar com os Voduns
Guerreiros quem luta melhor e esses sempre acabam cedendo aos
encantos dessas mulheres que os encantam com sua magia e beleza. As
Aveji-da comem cabra ou cabrito, galinha, galo, d'angola, pombo e
outros bichos. Gostam de abara, acarajé, alapadá, quiabada, inhame,
peixe, acarajés recheado com quiabo - existe um infinidade de comidas
para elas - Seus apetrechos são o erugim, adaga, espada de lança curta
com a ponta em forma de meia lua, faca, chicote, chifre de búfalo e de
boi, fogareiro de ferro, abano de palha, abano confeccionado em tecidos
finos ou pena (leque), abanos confeccionados em madeira,
bonecas(fetiche), maruo... Usam todas as cores em suas vestimentas.
Seus colares ou fios de conta são das mais variadas cores e formato.
Gostam de todos os metais, sendo que o ferro, o cobre e a prata são seus
preferidos. Vale ressaltar que a confecção de apetrechos,vestimentas e
fios de contas são determinados pelas próprias Voduns, portanto não
existe uma "receita" para esses itens. As Oyas feitas dentro do culto de
Voduns aderem todas as características das nativas, porém recebem
também o que lhes são de direito dentro de suas origens.
Vocabulário:
djenukom - céu (orum)
aikungúmã - terra (aiye)
ekúchomê - cemitério
tódôum -rio
hou - mar
ôtan - lago, lagoa
ahuan - guerra, batalha
humahuan - campo de batalha (guerra)
kpame - doentes, enfermos
akututòs - ancestrais, egungum ekùs – eguns
Tobossis/Naês/Mami Wata
Tobossis, Naês ou Mami Wata, são todas as Voduns femininas das ezins
jeçuçu, jevivi e salobres. Aqui falaremos, especificamente ,das belas
Naês das ezins doces e salobres.
Em todas as famílias de Voduns encontramos Naês, sendo que, a maioria
delas, são da família Dambirá, panteão da terra.
No Brasil, convencionou-se chamar Oxum, dentro das casas Jeje, de
Tobossi. Tobossis são Voduns femininos, infantis e, como elas tem
muito a ver com as Naês, acredita-se que foi daí que o brasileiro passou
a chamar Oxum de Tobossi.
Como a maioria dos adeptos do Candomblé sabem, Oxum é um Orixá da
nação Ijexá, muito cultuada por todas as nações, inclusive o Jeje mas,
temos que entender que existem Oxum e Naês. Quando, dentro da nação
Jeje, uma pessoa é feita de Oxum, dizemos que ela é feita de Orixá,
quando a pessoa é feita de Naê, dizemos que ela é feita de Vodum.
As Naês vivem em plena harmonia com toda e qualquer entidade que
mora nas ezins. Nesse habitat não existe separação de nações.
As Naês ou Mami Watas, são mulheres vaidosas, exigentes, caridosas,
algumas são guerreiras, outras caçadoras. Gostam do brilho das pedras e
do ouro, adoram se enfeitar com colares, pequenas conchas e caramujos,
pulseiras, pequenas penas coloridas. Normalmente, seus adornos são
feitos por elas mesmas, caso alguém queira fazer para elas, essas exigem
que seja feito exatamente como elas fariam.
Algumas Naês gostam de ficar a beira dos tódôum, sentindo e recebendo
a energia do guhê, das atinçá, do djóom, da sum, etc.. Essas são muito
falantes, gostam de dançar, cantar, caçar junto com Otolu, pescar junto
com Ajaunsi, macerar folhas junto com Agué, comer amalá com Sobo,
Aveheketi e Ahevessul, etc. Gostam de caminhar pelas matas, praias e
lagoas, ondem residem outras Naês.
Outras Naes preferem as profundezas das ezins onde a paz reina com
toda a plenitude da natureza, essas não gostam de se expor aos olhos de
curiosos e são de falar muito pouco.
As Naês que moram nas ezim salobres, são as mais guerreiras, cultuam
os ancestrais, lidam com eguns e a magia é seu forte. Dizem os antigos,
que é nas lagoas que se escondem os grandes mistérios da magia das
Naês, pois ali se encontram as duas energias, a das ezins jeçuçu e a das
ezins jevivi. Fá sempre aconselha seus bakonos a irem à lagoa
conversarem com as Naês quando existe a necessidade da magia ser
usada.
As Naês usam roupas de várias cores sendo que, algumas delas, adoram
o dourado, daí confeccionar-se roupas com tecido amarelo, o que não
está totalmente correto. As roupas das Naês devem obedecer a uma série
de exigências das mesmas. Podemos até fazer uma roupa amarela ou
dourada, mas nunca podemos esquecer os detalhes que virão
complementar a simbologia da roupa a ser usada.
Seus assentamentos podem ser feitos em louças, em bustos de madeira,
argila ou cô, dependendo da Vodum que se está assentando.
Comem: bò, catraio, marreca, kôkôlo, uhui, caças, eché.
Dependendo da Naê, ela traz nas mãos: ezuzu (abebê), pena, ofá, lira,
eché (de preferência vivo), cobra, espada ou adaga.
Em todos os estudos que fizemos na África, encontramos a SEREIA
simbolizando as Mami Wata/Naês, tanto das água doces quanto das
águas salgadas e salobre. É comum encontrarmos, em qualquer
estabelecimento comercial e residencial, a figura de uma sereia cultuada
(podemos comparar com os santinhos católicos que os brasileiros
cultuam aqui em pequenos altares em seus estabelecimentos).
Vocabulário
kôkôlo - galinha
bò - cabra ou cabrito
có - barro
eché - pássaro
uhui - peixe
ezim - água
atinçá - árvores, folhas
sum - lua
djóom - vento
tódoum - rio
catraio - galinha da angola
guhê - sol
jevivi - salgada
jeçuçu - doce
Nohê Aikunguman
(Mãe terra)
Deuses da Riqueza
(Daometanos)
Na cultura daometana, encontramos como Deuses da Riqueza, um casal
de gêmeos que foram enviados à terra por Mavu e Lissa, para que
ajudassem a humanidade.
Os gêmeos Da Zodji e Nyohwe Ananu foram os primeiros Voduns a
nascerem e após chegarem a terra, deram origem a uma linhagem de
Voduns ricos e guerreiros.
Cabe a esses Voduns guerreiros, ajudarem a todas pessoas que
recorrerem a Da Zodje e a Nyohwe Ananu, a chegarem até eles, isso é,
caso algum caminho ou energia do solicitante estiver atrapalhando o
intercâmbio entre ele e os Deuses da Riqueza, esses Voduns mostram os
ebós que deverão ser feitos para que ele alcance os Deuses gêmeos.
Quando chegaram a Terra, Da Zodji e Nyohwe Ananu habitaram o mar,
onde acharam as maiores riquezas da Terra. Nyohwe Ananu, muito
feminina, encantou-se com as conchas e os caramujos que encontrou e
ficava extasiada ao ouvir o som do mar dentro dos caramujos. Seu irmão
mandou que trouxessem todos os caramujos e conchas para o palácio
deles para agradar Nyohwe Ananu.
De tanto Nyohwe insistir para que Da Zodji ouvisse o som dos
caramujos esse atendeu seu apelo e também se encantou. Daí por diante,
os dois passavam todo o tempo ouvindo esse som e não mais prestavam
atenção aos pedidos das pessoas. Incomodados com essas atitude dos
Deuses gêmeos, seus descendentes resolveram consultar um bakono.
O bakono consultou Fá e esse mandou que todos pegassem um caramujo
para si e que quando quisessem falar com os Deuses da riqueza,
falassem dentro do casco do caramujo, pois somente assim Da Zodji e
Nyohwe Ananu os ouviriam.
Os descendentes obedeceram a Fá e passaram a falar com os Deuses
dentro dos caramujos e, alguns deles, começaram a colecionar caramujos
por acreditarem que quanto mais caramujos tivessem, mais poderiam
conversar com eles.
Esse procedimento causou um pouco de confusão na vida dos Deuses da
Riqueza pois, quando as pessoas falavam com Da Zodji a irmã também
ouvia e vice-versa. Então, eles estabeleceram o seguinte: "Que cada um
tivesse em seu poder dois caramujos. Um deveria ficar deitado e nesse,
os pedidos à Nyohwe deveriam ser feitos e o outro caramujo deveria
ficar em pé e nesse, os pedidos à Da Zodji deveriam ser feitos".
Deram também a opção de usarem os caramujos de uma maneira só e se
comunicarem apenas com um dos Deuses.
NANÃ
Nanã é considera por todos os adeptos do Culto Vodum como a grande
Mãe Universal que criou o mundo e deu vida aos Voduns. É chamada
carinhosamente de vó Misan (missam).
Senhora da lama, matéria primordial e fecunda da qual o homem em
especial, foi tirado. Mistura de água e terra, a lama une o princípio
receptivo e matricial (a terra) ao princípio dinâmico da mutação e das
transformações. Sua ligação com a água e a lama, associa Nanã à
agricultura, a fertilidade e aos grãos (vide simbologia dos grãos e favas).
Nanã tem os mais variados nomes de acordo com o dialeto usado:
Bouclou, Buukun, Buruku, etc. Em Dahomey, na cidade de Domê onde
está localizado seu principal templo, Ela é conhecida como Nanã Buruku
(lê-se, buluku).
No Brasil, também existem variações de nomes para Nanã: Buruku, Naê
Naité, Yabainha, Naê, Anabiocô, etc.
Nanã representa a dogbê (vida) e a doku (morte). Ela recebe em seu seio
os ghedes (mortos) e os prepara para o leko (lêcô - retorno,
renascimento)
Quando uma mulher não consegue engravidar, recorre a Nanã que
ensina a "fórmula mágica", o remédio de ervas que deve tomar, os ebós
e oferendas que devem ser feitos.
Se um doente recorre a Nanã, imediatamente obtém o remédio curador.
Na África quando uma família ou alguém obtém um favor de Nanã, fica
com o compromisso de oferecer um membro da família ao culto de Nanã
e esse, após sua iniciação, receberá na frente de seu nome a palavra
Nanã; assim como a criança que nasce com a ajuda da Grande Mãe
também. Todos os sacerdotes e sacerdotisas de Nanã têm na frente de
seus nomes a palavra Nanã.
Nanã é a maior conhecedora do uso terapêutico das ervas. Alguns de
seus sacerdotes e sacerdotisas são preparados para serem curandeiros.
Em Ghana existe a Sociedade dos Jou-Jou, em Allada e Dahomey a
Sociedade do Bo, etc.. Nessas sociedades as pessoas escolhidas são
preparadas para a prática da medicina através das ervas. Nanã diz que
além do uso terapêutico das folhas e de alguns produtos animais, as
doenças devem que ser tratadas em sua origem espiritual, para que a
cura seja concretizada. É lastimável que no Brasil essa parte do culto a
Nanã não tenha sido trazida. Em outros países como Estados Unidos,
Canadá, Jamaica e Haiti encontramos essa prática.
O Culto de iniciação de uma filha ou filho de Nanã requer uma série de
cuidados especiais, tanto na África, como no Brasil. Para mim, esse é o
mais difícil culto de Vodum. Nanã Buruku não é feita na cabeça de
ninguém.
Existem vários Voduns da linhagem de Nanã Buruku, que são feitos nos
iniciados. Todos esses Voduns seguem a tradição de Nanã Buruku e são
tão exigentes quanto Ela.
Para iniciar um processo de feitura de uma Nanã, é exigido a abstinência
de sexo, bebidas alcoolicas e outros prazeres carnais, pelo menos dois
meses antes (na África são exigidos 3 meses), de todos que irão
participar do processo de renascimento do iniciado. Nesse período, são
feitos vários ebós no iniciado e alguns poucos nos participantes e na casa
de santo.
A bogami (bôgâmi - menstruação) é outro beko de Nanã. Se durante o
processo de iniciação a vodunsi ficar menstruada, deve ser afastada
imediatamente de Nanã e ficar reclusa em um lugar especial, fora do
templo, até que cesse esse período.
Na África as mulheres menstruada são proibidas de entrar no Templo de
Nanã ou de participar de qualquer preceito, seja de rituais ou
simplesmente fazer uma comida de santo. Nanã diz que a bogami é um
sangue impuro e aconselha as mulheres não cozinharem para seus
maridos nesse período.
Por ter muita ligação com egungum é necessário saber tratar muito bem
de Buku, entidade assistente de Nanã e Sakpata. Em uma feitura, não é
permitido a sua presença, mas, ele deve ficar aposto, sua função será
tomar conta de todos, para que nenhuma exigência da Grande Mãe seja
desobedecida, principalmente a abstinência de sexo.
Assim como Buku, Legba Aghamasa (agramassá) devem ser tratados
corretamente para garantir a paz, tranqüilidade e segurança nos rituais e
preceitos. Ebós e oferendas específicas devem ser feitos para essas duas
entidades.
Os ancestrais dos Voduns, do iniciado, dos participantes e da casa de
santo não podem ser esquecidos em hipótese alguma!
Antes, durante e depois da iniciação de uma Nanã devemos fazer muitos
ebós, oferendas e preceitos. Uma Nanã bem feita é caminho de
prosperidade e crescimento para a casa de santo, do iniciado e dos
participantes.
De acordo com a Vodum Nanã que está sento feita ou cultuada é que se
determina, se comerá bichos macho ou fêmea. Existem Voduns dessa
linhagem que não comem bicho de quatro pés, outros preferem comer
somente o Igby. Nanã Buruku, por exemplo, não gosta de muito kun
(sangue)
Vários textos têm sido publicados, citando o carneiro como o bicho
oferecido a Nanã, mas, se observarmos as fotos que acompanham esses
texto, veremos que se trata de cabra e cabritos. O sacrifício de carneiro é
o maior beko (kisila) de Nanã. Para essa Vodum, o carneiro é um bicho
sagrado e não deve ser sacrificado.
O não uso da faca e outros metais nos nahunos e preceitos de Nanã
devem-se ao fato de Ela ser muito mais velha que esses metais. Por seu
caráter conservador, quando o ferro e outros metais apareceram, ela
preferiu manter o que já conhecia em seus ritos.
Vejamos abaixo alguns dos Voduns da linhagem de Buruku. e algumas
curiosidade ligadas a Grande Mãe.
Nanã Densu ou apenas Densu – Segundo os Fons esse Vodum é um deus
andrógino e seria o lado macho ou marido de Buruku. É muito cultuado
nos rituais de Mami Wata onde é considerado o maior de todos os
deuses, os Fons o compara a Olokun. Muitos antropólogos têm atribuído
erronêamente Densu a um deus hindu, devido seus fetíches e
assentamentos apresentarem três cabeças. Esse Vodum é muito rico e
farto. Costuma presentear seus adeptos com suas riquezas. Não é feito na
cabeça de ninguém. Nanã Asuo Gyebi (assuô giêbi) – Vodum masculino
velho, que habita os rios. Muito popular em Ghana e tido como o
protetor das crianças africanas que foram escravizadas. Esse Vodum
pediu aos seus sacerdotes que o levasse para os países onde os africanos
foram escravizados afim de que pudesse resgatar suas crianças. Ele já foi
assentado em templos de Akonedi nos Estados Unidos e no Canadá.
Nanã Esi Ketewa (êssi quetêuá) – Vodum feminina muito velha,
cultuada em Ghana, Cotonou e Allada. Dizem os mais velhos que essa
Vodum morreu de parto e que por isso a missão dela é proteger e tratar
as mulheres grávidas assim como seus filhos
Nanã Adade Kofi (adadê côfi) – Vodum masculino, tem a função de
proteger e defender todos os templos de Nanã. É um Vodum guerreiro,
ligado ao ferro e outros metais. Cultuado em Ghana, Allada, Cotonou,
Porto Novo, etc. É o Vodum da força e perseverança. Sua espada é
usada pelos adeptos de Nanã, para prestarem juramentos de obediência,
submissão e devoção a Grande Mãe.
Nanã Tegahe (têgarê) – Vodum feminina jovem, cultuada em Ghana.
Tem o poder de tirar feitíços das pessoas e lugares. Tem grande
conhecimento no uso terapêuticos e ritualísticos das ervas. Muito alegre
e faceira, gosta de dançar e cantar, mas fica muito séria e aborrecida
quando encontra malfeitores e ladrões; ela os mata.
Nanã Obo Kwesi (obó cuêssi) – Vodum feminina guerreira, cultuada na
região Fanti em Ghana. Protege e ajuda os kuhatô (pobres) e os azon
(doentes). Detesta quem faz aze (azê - bruxarias) ou qualquer mau a um
ser humano.
Nanã Tongo ou Nanã Wango (tongô/uangô) – Vodum feminina,
cultuada em Togo. Grande curandeira, trata das pessoas com ervas, ebós
e gri-gris. É uma grande Azeto (azétó - feiticeira) e seu culto talvez seja
um dos mais complexo. Em seus nahunos, os sacerdotes prostam-se no
chão ao lado dos bichos mortos e fingem estarem mortos também, assim
permanecem até que Wango incorpore em um deles e os ressuscite.
Todos levantam, os bicho são suspensos e preparados. Nanã Tongo
dança com muita alegria, vestida em suas roupas confeccionadas com as
peles dos bichos sacrificados para ela. Seus adeptos costumam
presentear Wango com muitas jóias, enfeites, roupas e talismãs que a
agradam. Antes de começar os nahunos para Wango, corujas são atadas
às árvores. Nanã Akonedi Abena – Vodum feminina jovem, cultuada em
diversas partes da África. Seu principal templo fica em Later, cidade de
Ghana. Quando Akonedi chega ela percorre a vila, esconde-se em
arbustos e sobe em telhados à procura de feitíços, feiticeiros e
malfeitores. Atende os moradores locais, fazendo libações e curando os
doentes. Em Ghana é considerada a Deusa da Justiça Seu corpo é
coberto com um pó branco sagrado, usa saia de palha, seu rosto é
descoberto, na cabeça usa um torço, no corpo muitos brajás e nas mãos
trás um feixe de lenha. Sua dança é selvagem e desenvolve-se dentro de
um quadrado divino, dividido em outros quadrados menores feito com
riscos do mesmo pó que cobre seu corpo. Esse conjunto de quadrado
também é usado por suas sacerdotisas durante as danças. Seu
assentamento fica em um buraco dentro da terra, ficando somente a
tampa deste aparecendo. Os sacerdote e adeptos de Akonedi carregam-
na nos ombros numa espécie de desfile, para que todos possam admirar e
louvar a grande deusa da Justiça. Terça-feira é o dia consagrado a essa
Vodum. O Culto de Akonedi foi levado para alguns países, a pedido dos
governantes desses. Quem levou o culto de Akonedi para o novo mundo
foi a maior autoridade religiosa do culto, Nanã Oparebea Akua
Okomfohemma, falecida em 1995. Mmoetea – Aldeia de pigmeus que
vivem nas florestas de Ghana. Formam uma sociedade secreta
especializada no uso das ervas para diversos fins. Desenvolveram a
capacidade de curar qualquer doença física, mental e espiritual.
Trabalham com os espíritos da natureza e seu maior deus é Nanã. Os
espíritos da floresta deram aos Mmoeta o poder de ler a mente dos
homens e dos animais. São grandes curandeiros e poderosos feiticeiros.
Buku – Assistente de Nanã e Sakpata que mata os doentes infectados
pela varíola. “Toma conta e presta conta” do comportamento moral das
pessoas durante os cultos de Nanã e Sakpata.
Legba Aghamasa – Vodum Legba masculino, reina nos portais da morte
onde reside Nanã Buruku.
Odom – Bolsa feita com pele de cabra não curtida, enfeitada com
búzios, penas e sangue. Nessa bolsa são colocados os gris-gris venenoso
e não venenoso que decidem uma questão de justiça. Quando duas
pessoas brigam pela mesma “coisa” e recorrem a Nanã para saber quem
tem razão, sua sacerdotisa pede um galo a cada um dos queixosos,
quando esses animais chegam, esses gris-gris são oferecido aos animais.
O galo que comer o venenoso, o dono dele perde a causa. Além desses
gri-gris, outros segredos de Nanã são guardados na Odom. A Odom fica
sempre nos pés do assentamento de Nanã, nunca vai a público e não
pode jamais ser tocada por homens. Abuk (abuquê) – De acordo com a
cultura Fon, foi a primeira mulher a surgir. Patrona das mulheres e dos
jardins, seu fetíche é uma pequena serpente. (teria alguma coisa a ver
com Nanã?!!)
Asase (assassê) – Deusa da criação dos homens e receptadora dos
mesmos na morte. Cultura Ashanti. (Seria a mesma Buruku?!)
Atori (atôli) – Vara ou haste simbólica de Nanã, representa seus filhos
mortos e os ancestrais.
Todos esses Voduns usam muitos kpolis (quipôlis - búzios) e palha,
dificilmente cobrem seus rostos.
Falar ou escrever sobre Nanã é uma tarefa das mais difíceis, pois são
tantas as história a ser contadas, que somente um livro poderia caber.
Todos os adeptos do Culto Vodum, devem prestar muita reverência a
Nanã. Em seus cânticos e danças devemos nos alegrar e nos sentirmos
honrados em poder, aqui no Brasil, participar dessa parte que na África é
reservada somente aos seus sacerdotes e sacerdotisas.
Aho bo boy Naê!!
EKU E AVUN
No culto dos Voduns, Eku é visto como um Deus acompanhado sempre
de um avun. Essa é uma das razões que, dentro dos Templos de Voduns,
a entrada desse animal é proibida. Porém, os sacerdotes reservam uma
área fora dos templos, onde esses animais são criados para que sejam os
guardiões das almas, impedindo-as de entrarem nos Templos além de
encaminhá-las. Os Vodunos, Bokonos, Ahougans, Sofós, Vodunsis e
outros, acreditam que Vodum Ewa sempre espreita o temido Deus Eku
para que esse nunca pegue ninguém desprevenido, além de sempre tentar
desviá-lo de seu caminho. Os velhos Vodunos contam-nos várias
histórias para justificar a proibição de avuns em Templos Voduns.
Vejamos algumas delas: 1 - Um dia, Aveheketi estava pescando e
enchendo um balaio com muitos uhui, que levaria para sua aldeia, para
saciar a fome dos seus. Daí, enquanto ele estava distraído em sua
pescaria, os avuns vieram e sem que ele os visse, devoraram todos os
uhui. Quando Aveheketi terminou sua pescaria e voltou-se para o balaio,
o encontrou vazio e ainda pode avistar os avuns se afastando com seus
uhui. Desse dia em diante, Aveheketi proibiu a presença de avuns em
seus domínios, ato esse que foi seguido por toda a sua família que é a de
Heviosso. Nos kwes de Jeje, principalmente aqueles regidos por
Heviosso ou mesmo Xangô, é proibido a presença de avuns. Aveheketi
diz que em Kwes que tem avuns, nenhum membro da família Heviosso
comparece. 2 - Um avun roubou o fogo de Dan, de Dan Wedo, das
divindades celestes ou do Grande-Espírito para trazê-lo na ponta de sua
husi, e por isso, os Voduns têm pavor de avuns. 3 - A repulsa ao avun
nos Templos dos Voduns, é a interdição implacável sofrida por esse
animal, pelos muçulmanos, povo que muito influenciou a cultura
africana. Eles fazem do avun, a imagem daquilo que a criação comporta
de mais vil. O avun, devorador de oku é um animal impuro. Por essa
razão também, acreditam que os deuses jamais entram em um Templo
onde se encontra um avun. Não há, sem dúvida, mitologia alguma que
não tenha associado o avun à morte, aos infernos, ao mundo subterrâneo,
aos impérios invisíveis regidos pelas divindades ctonianas ou selênicas.
A primeira função mítica do avun universalmente atestada, é a de guia
do homem na noite da iku, após ter sido seu companheiro no dia da vida.
Vemos, em muitas culturas, o avun emprestar seu rosto a todos os
grandes guias de almas. Têm por missão aprisionar ou destruir os
inimigos da luz e guardar as Portas dos locais sagrados, reino dos okus,
país de gelo e de trevas. Algumas tradições chegam a criar avuns
especialmente destinados a acompanhar e a guiar os okus no Além.
Atribui-se também ao avun como intercessor entre este mundo e o outro,
atuando como intermediário quando os vivos querem interrogar os okus
e as divindades subterrâneas do país dos okus. Na África, o avun possui
a dom da clarividência e, além de sua familiaridade com iku e com as
forças invisíveis da noite, é considerado um grande feiticeiro. É um
costume africano, em seus banquetes funerários, oferecerem aos avuns a
parte que caberia ao oku, após ter pronunciado estas palavras: "A heaiye
hesóa iwo ho hebo Ébe ti eke oku sòa tiwo hoho ti bo" "Quando vivias,
eras tu mesmo quem comia. Mas agora que estás morto, é tua alma que
come!" Também na cultura africana, encontramos feiticeiros com trajes
feitos de peles curtidas de avun, o que mostra o poder divinatório
outorgado a esse animal. Em Porto Novo, Maupoil, num de seus relatos,
conta que um de seus informantes, confiou-lhe o seguinte: a fim de
reforçar o poder de seu oráculo divinatório, ele o deixaria enterrado
durante alguns dias dentro da barriga de um avun que imolara
especialmente com essa finalidade. Enfim, seu conhecimento do mundo
do Além, bem como do mundo em que vivem os seres humanos, faz do
avun senhor e conquistador do fogo, sempre ligado a iku, a
clarividência, a feitiçaria e as forças invisíveis.
Vocabulário:
Vodunos - sacerdotes
Bakonos - sacerdote de Fá
Ahougan - sacerdote feito de Vodum
Sofó - sacerdotisa feita de Vodum vodunsis - feitos de Voduns (yao)
Avun - cão
Eku - Deus da Morte Iku - morte Husi - cauda
Uhui - peixe
Dan Wedo - Deus do arco-íris, arco-íris
Oku - cadáver, morto
Itans
KLAMKLAMLE
(As Borboletas)
Contam-nos os velhos Vodunos que Aveji-da tem, em seu touboumé,
um exército de klamklamle que sobrevoam os mundos e voltam para
contar-lhes seus feitos ao mesmo tempo que trazem outras klamklamle
que nada mais são do que as almas que ali irão residir.
Dizem que a própria Aveji-da, quando está muito preocupada, se
transforma em uma linda klamklam e sai pelos mundos a voar para
observar melhor o djenukom e o aikungumã.
Fá disse a um bakono que sempre que uma Aveji-da recebe uma
oferenda, uma klamklam aparece para confirmar a presença dela.
A klamklam é como Aveji-da, ligeira e inconstante. Uma ligeireza sutil,
de espírito viajante.
A klamklam brincando entre as flores é a alma da deusa nos humahuan.
A deusa acompanha o guhê na primeira metade de seu curso visível, até
o guhemê. Em seguida, desce de volta à aikungumã sobe a forma de uma
klamklam.
Há uma associação analógica da klamklam e da chama, de suas cores e
do bater de suas asas tal qual a duwe de Aveji-da.
Aveji-da, assim como todas as deusas do fogo, associa-se a obsidiana,
uma kpe-izó, seu emblema.
Símbolo do fogo solar e diurno, e por essa razão da alma dos achólupêle,
a klamklam é também um símbolo do guhê-du, atravessando os mundos
subterrâneos durante o seu curso noturno. É assim, símbolo do fogo
ctoniano oculto, ligado a noção de sacrifício, de morte e de ressurreição.
É então a klamklam, atributo das divindades ctonianas, associadas à
morte. Ela ilustra, ao mesmo tempo, a analogia alma-borboleta e a
passagem do símbolo à imagem.
O homem segue, da vida à morte, o ciclo da klamklam. Ele é, na sua
infância, uma pequena lagarta, uma grande lagarta na sua maturidade;
ele se transforma em crisálida na sua velhice; seu túmulo é o casulo de
onde sai a sua alma que voa sob a forma de uma klamklam. A postura de
ovos dessa klamklam é a expressão de sua reencarnação.
Dizem os velhos Vodunos:
- Ekùs ete jo nhû oku do bochiô na klamklam!
(- A alma que deixa o corpo dos mortos tem a forma de uma borboleta)
Quando uma klamklam aparece no templo dos Voduns, todos saúdam a
bela Deusa do degi, dos johon, e das djizônukon num só grito
"Ahoboboi, mikan Aveji-da!!!".
Vocabulário
klamklam - borboleta (pronuncia-se kunlamkunlam)
Klamklamle - borboletas
Touboumé - reino
Djenukom - céu (orum)
aikungumã - terra (aiye)
Humahuane - guerra, campo de batalha
Guhê - sol
Guhemê - meio-dia
Duwe - dança
Guhê-du - sol negro
kpe-izó - pedra de fogo
achólupê - soldado, guerreiro
achólupêle - soldados, guerreiros
Oku - morto, cadáver
Ete - que
Ekùs - alma, egum
jo - deixar
Nhû - corpo físico
Bochiô - forma, escultura
Na - uma (artigo)
Degi - ar
Johon - vento
Mikan - salve!
djizônukon - tempestade
OS PRIMEIROS VODUNS
De acordo com os povos Fon de Abomey, Dahomey, Mawu é um deus
supremo e criador. Mawu representa a lua que traz a noite e a
temperatura fresca, no mundo africano. Reside no oeste e é descrita
como uma velha fria e indiferente o que é considerado pelos povos Fon,
sinônimo de sabedoria e idade.
Alguns itans contam que Mawu tem um irmão gêmeo chamado Lisá, em
outros, encontramos que se trata de um deus andrógino, que sua parte
feminina é Mawu e a parte masculina é Lisá. Lisá é tido, pelos povos
africanos, como feroz e áspero, residente no leste, representa o sol.
À Sobo, Mawu disse que devia permanecer no céu porque era homem e
mulher como seu pai.
Aos gemeos Agbe e Naete, disse-lhes para irem habitar o mar, comandar
as águas.
A Gu, Mawu disse-lhe que era sua força, e era assim porque não foi lhe
dado uma cabeça como aos outros. Por isso, a terra não permaneceria
para sempre só com arbustos selvagens. Era ele quem ensinaria os
homens a serem felizes.
À Djo, Mawu disse-lhe para viver no espaço, entre a terra e o céu. A ele
confiaria o livre arbítrio do homem. Seus irmãos seriam invisíveis e a ele
cabia vesti-los.
Depois que Mawu disse isso às crianças, ela deu aos gemeos de Sagbata
a língua que devia ser usada na terra, e removeu de sua memória a
linguagem do céu.
Deu a Hevioso a língua que ele falaria e tirou de sua memória a língua
falada pelo pai. O mesmo foi feito para Agbe e Naete, para o mais velho
e para Gu.
Agora, disse a Legba, você é a minha criança mais nova e como você é
levado e nunca soube o que é punição, não posso transformá-lo como a
seus irmãos. Ficarás sempre comigo. Seu trabalho será visitar todos os
reinos governados por seus irmãos e dar-me ciência do que acontece.
Assim, Legba sabe todas as línguas faladas por seus irmãos e a língua de
Mawu. Legba é lingüísta de Mawu. Se um dos irmãos desejar falar com
Mawu-Lisá, deve dar a mensagem a Legba, porque nenhum deles sabe
mais dirigir-se a Mawu-Lisa. Por isso que Legba está em toda parte.
O mundo foi criado por Nana Buluku, um deus que não é macho e nem
fêmea. Nana Buluku gerou dois gêmeos, Mawu e Lisa, quem modelou o
mundo com a ajuda de seus quatorze filhos, os Voduns, deuses menores.
Antes de Mawu ter dado vida à seus filhos, a Serpente do arco-íris já
existia, criada para servir a Nana-Buluku. Levava o criador por toda a
parte em sua boca. Rios, montanhas, entre os vales e curvas, exatamente
o movimento circular da Serpente. Onde eles paravam pela noite,
montanhas surgiam de esterco da Serpente. Por este motivo, quando
você escava profundamente as montanhas, acha riquezas. Quando Nana
acabou de criar o mundo, é óbvio que a terra não podia suportar o peso
de tudo, montanhas, árvores, seres humanos e animais. O criador
designou que Da envolvesse o mundo para mantê-lo, amortecê-lo.
Daí o costume africano do uso do torso quando estão levando uma carga
pesada.
Para que Da não permanecesse no calor, Mawu criou o oceano para ele.
E lá Da permanecem desde o início dos tempos, com sua cauda na boca.
Mesmo a água mantendo-a fresca, as vezes se desloca em torno de si
mesma tentando ficar confortável, o que causa os terremotos.
Da precisa manter-se alimentada, o que obriga a Nana e aos ferreiros
forjarem barras de ferro para mantê-la alimentada. Mais cedo ou mais
tarde o suprimento de ferro irá se esgotar e Da não vai ter nada o que
comer. Com fome, ela vai comer sua cauda, suas convulsões serão
terríveis, toda a Terra vai inclinar, pela sobrecarga de coisas e pessoas. A
terra vai ser engolida pelo mar.
A ÁRVORE DA VIDA
Naquele tempo - e faz tempo que ninguém sabe quando foi e nunca
soube - não havia floresta, apenas colinas e planaltos a perder de vista, e
um rio que atravessava estas terras desoladas. Perto do rio, onde a terra
era branca, vermelha e preta, erguia-se a casa de Khmvum, o Criador de
todas as coisas.
Foi lá que Mbere e Nkwa foram encontrá-lo um belo dia, para lhe
suplicar que criasse uma grande floresta...
- Khmvum Bali, tu que dás a vida, bem que podia nos dar uma floresta,
povoada por milhares de árvores... - pediuMbere, com o coração cheio
de esperança.
- Khmvum Kka, tu que és o mais forte entre os fortes, por favor, nos dê
uma floresta povoada por milhares de animais... - pediu Nkwa, com o
coração cheio de sonhos.
Khmvum ouviu em silêncio, e depois alisou a barba, olhando firme para
eles, com seus olhos escuros como a noite.
- E por que os meus filhos pigmeus estão querendo isso?
- Nós somos tão pequeninos... Os menores dos menores... - começou
Mbere. - Podíamos nos esconder na sombra das árvores...
- E colados aos troncos enormes - continuou Nkwa - podíamos escapar
dos nossos inimigos gigantes...
- Os gigantes receberam a força, na divisão, mas vou dar algo muito
melhor aos pigmeus...
E o Criador ergueu a mão.
- Dou a vocês a coisa vermelha, o fogo, para vocês não terem mais frio.
E dou os animais que caminham, que pulam, que voam, que nadam, para
que jamais a fome entre na barriga de vocês. E lhes dou todas as árvores,
como abrigo e como amigas. Vocês serão os senhores da floresta e, no
reino dela, os pigmeus estarão em casa, livres.
Mbere e Nkwa ouviam as palavras de Khmvum boquiabertos, com a
impressão de estarem vivendo um sonho. Eles, os menores entre os
homens, iam se tornar os reis da floresta!
Ardendo de impaciência e devorados pela curiosidade, viram o Criador
entrar em casa e voltar em seguida, trazendo uma árvore minúscula, que
acabara de se formar.
- Esta aqui é Tii, a ancestral da floresta. É a guardiã da coisa vermelha
que esquenta, que cozinha e que ilumina.
E Khvum lhes ensinou a fazer o fogo nascer, esfregando dois pedaços de
pau. Depois, plantou a arvorezinha na margem de três cores e foi se
sentar, com os braços cruzados.
- Só isso? - perguntou Mbere, pensando que uma única árvore, mesmo
se crescesse muito, não era uma floresta.
- Só isso? - repetiu Nkwa, pensando que os animais não nasciam em
árvores.
O Todo-Poderoso tinha fechado os olhos.
- Depois da noite, o dia. Depois de uma nuvem, outra nuvem. Depois de
uma árvore, outra árvore...
Os dois pigmeus não perguntaram mais nada. Curvados, com a testa
apoiada no chão, rezavam para Khmvum, quando um barulho estranho
estranho os fez levantar a cabeça.
Bem ali, diante de seus olhos, Tii começava a crescer com uma
velocidade prodigiosa.
Em pouco tempo, seu tronco estava tão grande que seis pigmeus não
bastariam para rodeá-lo com os braços. O sol do meio-dia desaparecera
por trás da folhagem espessa que já enchia de sombra as duas margens
do rio. E a árvore continuava crescendo.
Logo que a envergadura de seus galhos se estendeu pelo quatro cantos
do horizonte, Khmvum Vali, aquele que dá a vida, aproximou-se e tocou
a árvore com a palma da mão.
Tii tremeu com o choque e fez cair sobre a planície um dilúvio de grãos.
Mbere e Nkwa caíram de joelhos, maravilhados. Num instante, cada
grão dava vida a uma nova árvore. Onde antes não havia nada, nascia
agora um mundo ao redor deles, uma floresta profunda, que crescia a
olhos vistos!
Depois, Khmvum Kka, o mais forte entre os fortes, sacudiu com as mãos
o tronco da grande ancestral e as folhas começaram a cair de uma a uma.
Mbere e Nkwa assistiram então, fascinados, ao nascimento do mundo
animal: assim que uma folha tocava o solo, começava a se arrastar, a
saltar, a andar ... e ia crescendo e se transformando em serpente, em
macaco, em elefante... As que ficavam dando voltas no ar logo viravam
pássaros de todo tipo, e as que caíam no rio tornavam-se peixes,
tartarugas, crocodilos... E toda a vida da floresta nasceu da árvore Tii.
Texto de Franck Jouve
Tradução de Ana Maria Machado
A COLHEITA DE ESTRELAS
Já havia algum tempo que Bako, o Sol, dava sinais de cansaço...
No começo, os pigmeus não prestaram muita atenção. Talvez estivesse
um pouco menos claro, seguramente fazia menos calor que antes, mas,
afinal de contas, sempre houve dias menos bonitos que outros, não era
motivo para ninguém se apavorar.
Entretanto, depois de uma semana, mesmo os pigmeus mais otimistas
tinham que reconhecer que o fenômeno estava continuando de uma
forma anormal. Consultaram então o Nzorx, o advinho curandeiro, que
foi consultar seu espelho de vidência. O que leu nele não devia ser muito
animador, porque apertou as mãos sobre o seu talismã de chifre de
antílope, como se quisesse se proteger e proteger sua tribo de uma
grande desgraça.
- E então? O que foi que o espelho de vidência revelou? - perguntaram
seus irmãos, esperando o pior.
Com um sorriso forçado, o Nzorx quis tranquilizá-los: desde que existia
a memória dos homens, nunca o Sol deixara de brilhar. Bako era velho e
robusto como o mundo, não havia nenhuma razão para que de repente
adoecesse...
- Mas não dá para negar que Bako não anda com um aspecto muito bom
- insistiu um pigmeu, com a voz preocupada. - Está tão pálido...
- Só um pouco de cansaço, isso passa.
- E no fim do dia está vermelho, afogueado, como se estivesse sem
fôlego!
- Na certa é uma febrezinha, mas não deve ser nada grave.
No entanto, os sintomas preocupantes se multiplicavam: o calor era cada
vez menor... a luz enfraquecia a olhos vistos... Bako cada dia deitava-se
mais cedo, como se estivesse esmagado pelo peso de um trabalho que
ficara pesado demais para ele. Então o pressentimento virou certeza: o
estado do Sol piorava de maneira catastrófica.
- Hum... alguma coisa anormal está acontecendo... - murmurou um
pigmeu, e depois outro, e mais outro.
- Bako só é a sombra do que era - sussurraram outros.
- E se ele apagasse?
Mal foi formulada, essa idéia lançou o terror nos espíritos. A vida era
inconcebível sem Bako para iluminar e aquecer os humanos. Nessa
noite, os pigmeus ficaram esperando o alvorecer e tremendo: se o Sol
não comparecesse ao encontro, seria simplesmente o fim do mundo.
Como o dia demorava a aparecer! Com um atraso angustiante, o astro
levantou-se mais uma vez, mas em que estado! Irreconhecível, lívido,
gasto, subia penosamente pelo céu, mal conseguindo dardejar seus
grandes raios...
Horrorizados, os pigmeus finalmente o viram desaparecer numa luz
crepuscular de muito mau agouro. Desta vez, foi o pânico. O Sol morria
no horizonte! Jamais teria a força de subir novamente ao firmamento se
sua chama não fosse reavivada. Aliás, nem haveria amanhã, pois com
toda certeza o dia não nasceria nunca mais. Era absolutamente
indispensável que se tentasse alguma coisa logo, mas o que?
Intimado a encontrar uma solução, já que era o advinho e curandeiro, o
pobre Nzrox ergueu as mãos para o Céu, em sinal de impotência.
- Rezemos a Khmvoum... Só ele pode curar Bako.
Khmvoum... À simples evocação do Deus supremo, os pigmeus
readquiriram confiança, tão rapidamente quanto haviam se desesperado.
Isso mesmo, apenas o Grande Caçador celeste poderia impedir o
desastre. Bastava que ele ouvisse o pedido de socorro de seus filhos:
tudo voltaria à ordem e...
De repente, uma risada sinistra rasgou o silêncio da noite: era Tore, o
espírito da Floresta! Só ele poderia achar graça num momento
daqueles... Pouco lhe importava que a luz abandonasse o mundo, ele era
um pássaro noturno, um monstro da mata, que se alegrava com as trevas.
- Se a luz não voltar - balbuciou um pigmeu - o ogro Ngoogounogumbar
vai devorar nossos filhos...
- E o anão Ogrigwabibikwa vai se transformar em réptil para nos morder
no escuro!
Tremendo, os pigmeus dirigiram ao céu um olhar de súplica.
Entrecortada pelas risadas de Tore, sua prece subiu ao Céu:
Ó Sol... Ó Sol...
A morte vem, o fim já chega,
O astro cai e morre.
O fogo escurece, a mata fica negra,
A chama vai se apagar, é nossa desgraça!
É nossa desgraça... Oh! Khmvoum!
Do alto do céu, Khmvoum ouviu a voz de seus filhos e siu seu
desespero.
Sem perder um minuto, pôs-se a caminho em direção ao Sol. Em sua
mão direita, brilhava o Arco-íris. Na esquerda, tinha uma sacola enorme,
que lançou sobre os ombros: a colheita do Grande Semeador celeste ia
começar...
Khmvoum penetrou nas grandes florestas do Céu. Dirigiu-se para o
oriente, lá no fim do mundo, onde normalmente Bako deveria
reaparecer. Em sinal de aliança com seu povo, plantou lá o Arco-íris
que, de manhã, diria que os belos dias tinham voltado e que não havia
mais nada a temer. Depois, com passos decididos, enveredou pela Via
Láctea; o caminho todo pavimentado de estrelas.
Khmvoum deteve-se numa região celeste rica em milhões de astros,
todos muito brilhantes. Havia tantos, de todo lado, que era só esticar a
mão, colhê-los aos punhados e guardá-los na sacola. Bem que as
estrelas, assustadas, tentavam fugir, mas não era fácil escapar ao Grande
Semeador, e elas logo eram aprisionadas.
Khmvoum calculou o peso da sacola. Já era quase o suficiente, mais um
punhado de estrelas e pronto. Unindo o gesto ao pensamento, agarrou
um cometa que passava voando e mais duas ou três estrelas cadentes,
para completar!
Khmvoum prestou atenção. Por cima da tempestade que rugia lá
embaixo, distinguiu o coro de seus filhos desesperados, suplicando:
É nossa desgraça ... Oh! Khmvoum!
A morte já vem, o fim vai chegando,
A chama vai se apagar!
Para tranquilizá-los, encarrega o elefante Gor, o mensageiro celeste que
fala na tempestade, de explicar aos pigmeus que o fim do mundo não
viria nesse dia. Gor dirigiu a tromba para a Terra, para mandar a
mensagem de esperança... Na mesma hora, atingidos por uma chuva
diluviana, os pigmeus recitavam sua prece com fervor crescente. O
alvorecer já devia estar ali... não restava mais muito tempo para salvar
Bako. Então, quando o trovão estourou com sua força assustadora,
acreditaram que a hora de seu fim tinha chegado. Mas o Nzorx apontou
um dedo inspirado em direção ao céu.
- É a voz de Gor! - exultou, com o rosto encharcado de chuva. - E nos
diz que Khmvoum está à cabeceira de Bako.
Khmvoum atravessara o espaço com grandes passadas. Bem a leste do
mundo, tinha encontrado o astro moribundo, mais pálido que a Lua, e
lançado o conteúdo de sua sacola na fogueira quase extinta do Sol. As
estrelas crepitaram, explodiram em centelhas que se transformaram em
chamas gigantescas. Bako foi ficando cada vez mais vermelho, como
uma brasa incandescente. A chuva de estrelas, que não parava de cair
sobre ele, o regenerou. Ele embrasou-se, inflamou-se, reencontrou seu
esplendor original. E no oriente houve uma ebulição de calor, uma luz
ofuscante!
Lá embaixo na floresta, as risadas cruéis de Tore, o espírito da Floresta,
estrangularam-se em sua garganta. A longa noite acabava de ter fim, a
hora do grande declínio ainda não chegara.
Saudado pelos pigmeus entusiasmados, o Sol levantou-se no horizonte.
Mais brilhante do que nunca, rasgou o manto das trevas, furou as nuvens
negras, dissipou os medos, explodiu e resplandeceu no dia nascente.
- Arco-íris! O Arco-íris! - entoaram os pigmeus, encantados,
descobrindo o sinal de Khmvoum a leste do céu.
Tu que brilhas no alto bem alto,
Acima da floresta tão grande,
Arco poderoso do Grande Caçador celeste,
Diz a ele que agradecemos!
Não, Bako não se apagaria - não enquanto houvesse estrelas no céu e
enquanto Khmvoum velasse sobre seu povo.
Texto - Franck Jouve e Michael Welply
Tradução - Ana Maria Machado
O Céu não foi sempre alto assim, nem a floresta tão bonita e cheia de
vida.
No começo, o Céu ficava muito perto da Terra e pesava sobre ela como
se fosse uma grande tampa, de tal modo que as árvores só conseguiam
crescer para os lados. Então seus galhos ficavam uns por cima dos
outros, suas folhas varriam o chão tristemente, seus brotos se
amarrotavam e secavam...
Era assim desde o começo dos tempos - e seria até hoje se uma
sumaúma, cansada de viver apertada, não tivesse forçado seu destino.
"Quem sabe se não há mais espaço do outro lado do teto do mundo?",
sonhava ela.
Firmando bem sua copa, a árvore tentou furar um buraco e então - mas
que prodígio! - o Céu recuou alguns metros! Era o que bastava para que
a valente sumaúma se endireitasse em todo o seu tamanho e passasse lá
para cima, para aspirar o ar das alturas.
Espantadas ao verem que se afastava o tirano que as oprimia desde
sempre, as outras árvores aproveitaram para se sacudir e se esticar,
lançando seus galhos para o alto. Os troncos se firmaram, as raízes
ancoraram majestosamente no solo, os brotos atrofiados se desdobraram,
embriagados de felicidade, e deixaram assim nascer milhares de folhas.
Em volta da sumaúna, em pouco tempo a Terra era uma vasta floresta
virgem, que finalmente começava a respirar.
Enquanto isso, do outro lado do Céu, um jovem casal de órfãos
avançava cautelosamente pelas grandes pradarias celestes. Ao avistar o
que tanto procuravam, ficaram imóveis. Um lagarto grande , preguiçoso,
tomava sol estendido sobre uma nuvem. O caçador ergueu sua azagaia,
enquanto sua companheira punha uma flecha no arco. Consultaram-se
com um olhar e fizeram pontaria... O lagarto deu um salto e rolou sobre
si mesmo, no instante em que os dois projéteis fendiam o ar. Os órfãos
não acreditaram no que viam: não apenas tinham errado o alvo, mas seus
tiros haviam desaparecido num buraco! Esquecendo a presa,
aproximaram-se da abertura...
Debaixo do assoalho do Céu, um estranho mar verde ondulava a perder
de vista. Olhando mais de perto, descobriram a flecha e a lança fincadas
no meio daquele oceano esquisito. Não era um mar líquido. O que seria
então?
- E se nós descêssemos? - sugeriu a moça, fascinada.
Não precisou dizer duas vezes. Era isso mesmo o que ele queria. Pousou
o pé num galho da sumaúma, para testar se era firme, e depois estendeu
os braços para a companheira, a fim de ajudá-la. De galho em galho,
penetraram assim no coração daquele reino verde, até pisarem em terra
firme. Durante todo o dia, exploraram cada recanto da floresta,
maravilhados com sua beleza e com o frescor que nela reinava. A
mesma idéia lhes ocorreu, ao mesmo tempo: por que não se mudavam
para viver ali embaixo?
O entusiasmo deles diminuiu quando, depois de muitas horas de buscas
inúteis, tiveram de se render às evidências: não havia viv'alma naquele
lugar... Nem um animal nos ocos, nem ao menos um inseto! Um silêncio
mortal planava sobre a floresta desabitada.
Muito desapontados, os órfãos se sentaram num tronco de árvore para
pensar. Mesmo que eles se alimentassem apenas de frutas e bagas,
morreriam de tédio e solidão. E como começavam a ter fome, a moça de
repente se lembrou de que tinha no bolso uma espiga de migo celeste. Ia
dividi-la ao meio, mas mudou de idéia e a cortou em três pedaços. Deu
um ao companheiro, guardou o outro para si e plantou o último na
beirada do bosque. Talvez surgisse um campo de milho daquela terra
semeada, num sinal de que pudessem ficar lá embaixo.
Enquanto as primeiras folhinhas do pé de milho apontavam timidamente
em busca da luz, a sumaúna continuava a crescer, empurrando o Céu, lá
nas alturas. Até que chegou um momento em que o Céu se cansou e não
quis mais chegar para trás. Curvou-se todo para resistir ao ataque
daquela insolente... mas a árvore acabou conseguindo transpassá-lo e
sair do outro lado.
Foi assim que uma copa gloriosa e triunfante irrompeu bem no meio da
pradaria do céu - para grande alegria dos animais que lá viviam e que
vieram correndo se abrigar dentro dela. Até que enfim, aparecia um
lugar fresco e sombreado!
Porém, mal tinham se metido pelo meio da folhagem, quando o Céu
resolveu de uma só vez se afastar para bem longe da sumaúma, indo
parar no lugar onde está até hoje.
Abandonados, sentindo-se presos numa armadilha, os animais não
tiveram outro remédio: trataram de descer, de qualquer jeito, pelo troco
da sumaúma e foram viver na floresta. Os que não conseguiram, nem
sabiam voar, tiveram de esperar que os órfãos fossem buscá-los, um a
um.
Foi assim que o mudou o mundo todo, graças a uma árvore que não
tinha medo do Céu.
Texto de Franck Jouve
Tradução de Ana Maria Machado
INSTRUMENTOS
TATCHOOTA
tatchoota é uma espécie de gongo.
Este instrumento musical é usado, principalmente durantes os rituais
fúnebres e celebrações.
Ele difere dos outros gongos por seu tamanho e forma especiais. É
composto de duas peças independentes sendo a primeira sempre usada
no dedo indicador e a segunda, circular, no polegar.
O tatchoota é confeccionado em ferro e, usualmente, possui 8 cm de
diâmetro e 20 cm de comprimento. Os primeiros tatchootas a serem
confeccionados pelos antigos ferreiros reais, eram muito maiores.
É um instrumento misterioso e maravilhoso.
O tatchoota também é utilizado pelos betamaribes (caçadores), que
sinalizam um animal abatido aos outros betamaribes pedindo ajuda.
Na cerimônia de passagem da infância para a maturidade, o difoni, os
jovens Fon recebem um tatchoota para simbolizar esta nova etapa de
vida e saem em procissão, tocando o instrumento.
O ritmo produzido pelo tatchoota é chamado tipenti, muito apreciado e
dançado nas cerimônias em homenagem aos Voduns e também no fim
da estação das chuvas.
Outro momento importante onde o tatchoota é tocado é no sacrifício de
animais e na entrega das oferendas aos deuses.
GOTA
O gota, também conhecido como kago, que é a base do ritmo
tchinkoume.
Inicialmente foi chamado de zin e era uma peça redonda de cerâmica,
utilizado para fornecer o ritmo zinli, música tocada pelos antepassados
que vieram de Tado, uma aldeia Mahi, onde nasceu o gota. Depois foi
introduzido em Savalou onde era tocado quando haviam inimigos na
cidade. Daí nasceu o ritmo particular do zin.
O material principal utilizado para confeccionar o gota é produzido pelo
cabaceiro, chamado katin na língua Fon.
Uma pele animal seca é esticada cobrindo a abertura depois das
sementes terem sido removidas. E é aí que o som é produzido, com
batidas firmes.
Juntamente com este instrumento principal, outras duas cabaças
menores, emborcadas em recipientes cheios de água, proporcionam um
som diferente, o tohoun. Este ritmo é dançado por mulheres ágeis por ser
um ritmo muito rápido.
O gota é tocado principalmente nas cerimônias em homenagem aos
voduns, funerais e para acalmar os espíritos dos mortos.
Durante as cerimônias funerais toca o ritmo tchinkoume além do
yonoutcho e o ahidjekpe, que são o primeiro e segundo estágios,
respectivamente, do ritual dos mortos na tradição Mahi. Seu som oco e
fundo representa o outro mundo para os Mahis.
Normalmente é tocado apenas por mulheres.
KANKANGUI
É também chamado de kankank, kakasi, kakati, kakake.
O kankangui é um instrumento de sopro, confeccionado em latão com
aproximadamente 1,95 cm de comprimento, bem fino e brilhante. É uma
herança cultural do reino Nikki, no antigo Dahomey.
É um instrumento sagrado e só pode ser tocado por pessoas iniciadas.
O kankangui é especial, não só por sua forma mas também pelo seu
tamanho além de produzir um som completamente diferente dos
instrumentos de sopro conhecidos.
O iniciado que toca este instrumento é chamado de kiriku e usa um
bácom (espécie de chapéu) na cabeça.
Ele era tocado para agradar os reis e a aristocracia durante suas grandes
cerimônias e procissões religiosas.
Ainda hoje é tocado nas procissões, festivais e cerimônias em
homenagem aos Voduns.
Nas noites de quinta-feira, ele é tocado como um mensageiro sagrado,
levando aos deuses todos os pedidos dos adeptos ao culto dos Voduns.
ADJALIN
O adjalin é um instrumento muito antigo, criado pelo grupo étnico Goun.
Ainda hoje, este instrumento é tocado em quase todas as cerimônias e
rituais em homenagem aos Voduns. Normalmente, são os Gouns mais
velhos que o tocam.
É um instrumento que exemplifica a grande imaginação e genialidade de
um povo. Confeccionado apenas de hastes de bambu, ao olharmos o
adjalin temos a impressão de estarmos vendo uma pilha de lenha mas, o
adjalin é muito mais que isso. Tem uma forma retangular, quinze hastes
de bambu são dispostas horizontalmente. O adjalin tem em média 65 cm
de comprimento por 25 cm de largura, e as hastes de bambu são
amarradas por fibras de legumes.
O som deste instrumento é muito harmonioso, agradando à muitas
pessoas. Elas são atraídas pela melodia suave e fascinante, encantadora,
um verdadeiro som mágico.
Quando tocado junto com os tambores, não há quem resista a dançar. É,
sem dúvida, um dos melhores instrumentos oriundos do antigo
Dahomey.
ALOUNLOUN
O instrumento é chamado de alounloun e seu ritmo adjogan.
O alounloun é uma barra de ferro comprida, de um metro de
comprimento, com um alongamento, toda trabalhada, sua parte central é
de cobre e argolas deslizam para cima e para baixo para produzir a
harmonia de sua música. Tem um cabo na forma de um pássaro, símbolo
de Kokpon.
Para falar das origens deste instrumento devemos voltar na história.
No início, o alounloun era um cajado que simbolizava a força do rei de
Allada. Este cajado foi herdado por Te-Agdanlin de seu pai Kokpon
quando da disputa, entre os dois irmãos, formaram então os reinos de
Allada e Dahomey, respectivamente, no século dezessete.
Um descendente de Te-Agdanlin, De-Gbeyon, transformou o cajado em
um instrumento musical, durante seu reinado (1765-1775).
Naquele tempo, era usado para acompanhar canções que elogiavam o
rei. Era tocado unicamente por mulheres.
Ele pegou o alounloun durante a migração e veio para o sul do Benin
onde criou o reino de Hogbonou (atual Porto Novo).
Quando ele morreu, de uma geração para a outra, o alounloun sofreu
várias transformações contando com o gosto e aspirações de cada rei.
Foi realmente transformado em um instrumento musical pelo rei De-
Gbeyon para homenagear seus antepassados.
Naquela época ele não era tocado só para homenagear os reis mortos
mas também para os reis vivos, para as ahossis (rainhas) e na
consagração dos ministros do rei.
O alounloun foi tocado durante cinco dinastias de Porto Novo.
Hoje é tocado em muitas cerimônias em homenagem aos voduns, nos
ritos fúnebres, procissões e festivais.
BALAFON
O verdadeiro nome deste instrumento é balan, incorretamente chamado
de balafon, palavra francesa que indica quem toca o instrumento: balan é
o instrumento, fo o tocador.
Sua forma é trapezóide e seu som melódico, ativo e excitante.
Ele é confeccionado de barras de madeira que produzem notas quando
tocadas. As barras são dispostas paralelamente e sob ele coloca-se
cabaças de vários tamanhos para criar um sistema de amplificação do
som.
As barras são feitas de uma madeira dura chamada gouene-yori, na
língua bambara e koyehoun, em Fon.
Os fios que seguram as barras são feitos de pele de cabra ou cervo, que é
mais resistente.
O balafon é tocado em cerimônias festivas em homenagem aos deuses,
acompanhado de outros instrumentos.
Podemos encontrar o balafon em vários modelos.
DJEMBE
O djembe ou jeme, é um tambor com uma cabaça atada, tocado com a
mão e junto com o doudoumba, outro instrumento de percussão,
fornecendo o tom baixo. O topo do djembe é coberto com uma pele de
cabra curtida, segura por argolas de ferro anexadas por nós de corda.
Tem um som agradável e puro. Alguns dizem que seu nome vem do som
do instrumento quando vibra. É um instrumento muito expressivo.
O djembe deve estar sempre em um local seco e limpo.
É tocado em diversas cerimônias e rituais em homenagem aos voduns.
KPANOUHOUN
O kpanouhoun é uma espécie de tamborim tocado por vários grupos
étnicos: Fon, Mahi, Goun, Mina, Yoruba, etc.
É composto de uma parte semelhante a um prato fundo e uma margem
com buracos onde aparecem argolas de ferro. Uma parte da margem não
contém buracos e é aí que deve ser segurado com a mão direita. Com a
palma da mão esquerda é tocado.
Não se pode dizer com exatidão onde este instrumento se originou. Ele
emite um som muito agradável, falicitador de nossos sonhos.
É um dos raros instrumentos tocados exclusivamente por mulheres, em
cerimônias de casamentos, iniciações, funerais de idosos e festivais.
Pode ser acompanhado por um gongo de uma ou duas câmpulas.
SATO
O sato é um instrumento sagrado de percussão, feito de madeira e
coberto de couro. O tambor maior mede cerca de 1,75 cm de altura.
Ele possui duas formas: uma masculina e outra feminina sendo que,
ainda podemos encontrar uma forma hermafrodita, exibindo seus
atributos sexuais na maneira de se tocar.
Este tambor é tocado com pequenas varas curvas, e emite um ritmo do
mesmo nome, durante os festivais anuais em homenagem aos
antepassados. Nesta ocasião, todos dançam o ritmo sato, tocado pelo
tambor de mesmo nome acompanhado de outros instrumentos musicais:
gbehoun, ahlomidon, alangandan e o gongo.
O tambor sato participa da passagem do morto do mundo visível para o
invisível e é por isso que é tocado nos ritos funerais, para garantir a
separação da alma deste mundo e sua transição para o outro mundo.
A ninguém é permitido olhar dentro do sato pois lá estão os espíritos dos
mortos e é por isso que ele é guardado em posição ereta e só pode ser
transportado a noite.
Este instrumento é fantástico, desafia o tempo e é imutável.
YABARA
O yabara também é chamado de mayabara (a cabaça da humanidade).
É um instrumento de percussão, sua forma e tamanho são variáveis.
Ele é confeccionado de uma cabaça e revestido por uma rede de pérolas
ou sementes de frutas, envolvendo a cabaça até o pescoço.
Para se tocar o yabara, pega-se o pescoço da cabaça com uma das mãos
e com a outra a ponta da rede para permitir que o som das pérolas ou
sementes seja amplificado.
Este é outro instrumento bastante utilizado nas cerimônias e rituais dos
Voduns.
KPEZIN
O kpezin é um instrumento importante na vida cultural e religiosa do
Benin.
É um tambor em forma de pote, uma caixa de som com um longo
pescoço e uma base redonda. A base é revestida com vime trançado e o
instrumento é assentado em uma "almofada" de casca de bananeira seca
e enrolada, presa no instrumento por fios de fibra de folhas de bananeira.
O topo tem um diâmetro de 73 cm e é coberto por pele de antílope. Há
dois tipos de kpezin: o maior chamado de kpezinnon e o menor kpezinvi,
que podem ser tocados ao mesmo tempo.
A base do kpezin, coberta de pele, pode ser batida no centro ou nas
margens para produzir sons diferentes durante as cerimônias especiais,
exigindo muita habilidade de seus tocadores.
O kpezin é frequentemente colocado em uma peça de madeira quando é
tocado para que as forças dos deuses sejam "armazenadas" nos
assentamentos. Da mesma maneira, ele é tocado para os assentamentos
destes tambores que são guardados sob eles quando não estão sendo
tocados.
Ele também é tocado em cerimônias e rituais aos voduns e funerais. Nos
rituais fúnebres ele é tocado acompanhado pelo zinli, para afastar as
aflições, moléstias e ofensas.
A maior parte do tempo, os Ogans tocam o kpezin sob uma árvore.
Também é utilizado em rituais agrícolas e de purificação.
O kpezin é um instrumento muito antigo, já tocado pelos adjohoun (da
cidade de Adja), trazido de Allada pelo rei Dakodonou, primeiro rei do
Dahomey, morto em 1645.
No reinado de Glele, o kpezin também foi utilizado, inclusive para
consertos em frente ao palácio.
Tradicionalmente, o kpezin é um instrumento sagrado. Na cerimônia do
aziza honou (Aziza é o deus da canção, da música, dos caminhos
musicais), é tocado na madrugada. Esta cerimônia confere grande força
aos instrumentos.
GANKEKE
O gankeke é uma espécie de sino duplo sem nenhum pêndulo em seu
interior, feito em duas peças de ferro, redondas e finas ao longo, como
um funil, unidos no fim com um espaço entre elas, formando um cabo
onde o tocador segura o instrumento. O pescoço do instrumento é
encurvado e os tocadores dão batidinhas com uma peça de madeira.
Também encontramos gankeke com apenas uma câmpula.
Existem gankekes de 20, 30 ou 50 cm de comprimento. Este maior é
tocado especialmente nas cerimônias fúnebres.
Ele produz um som agradável, 'kay' 'kay' 'kay', de onde sai seu nome,
acrescido de gan, que quer dizer ferro.
Este instrumento é tocado principalmente por homens que, numa mão
têm o gankeke e na outra o zangbetohoun, que é um outro instrumento
musical, secreto, exclusivo da sociedade do Zangbeto. Seu propósito
está em garantir a segurança do reino.
Além de instrumento musical, o gankeke era utilizado para que as
ordens do rei fossem comunicadas por um músico chamado kpalingan,
uma espécie de repentista que vagueava pelo humpayme, cantando para
todo o reino as ordens e notícias do rei.
O kpalingan também era responsável por cantar sobre toda a genealogia
dos reis do Dahomey.
Assim, hoje, cada cantiga, cada reverência cantada tem um significado,
uma mensagem precisa que pode ser compreendida apenas pelos
iniciados.
O gankeke também toca o ritmo gangbo, quando os Zangbeto, vigias da
noite, saem em patrulha.
O instrumento gangbo, de onde vem o ritmo de mesmo nome, também é
uma espécie de gongo utilizado pelos Zangbeto.
Nas comunidades e cerimônias dos Voduns, o gankeke é um instrumento
tocado pelas sacerdotizas pela manhã e a noite, nos templos de Doudoua
e de Dan, para saúde ou culto de adoração à esses deuses, além de
procissões.
Era também com o gankeke que as sacerdotizas "espantavam" a má sorte
e os espíritos ruins dos palácio reais.
Artigos
As matérias apresentadas foram selecionadas por mim e tiveram
autorizações de seus respectivos autores. As pessoas que quiserem
colocar suas matérias neste site, poderão enviar-me a mesma para
uma previa seleção. Só serão aceitas matérias relacionadas a cultura
dos Voduns e seus seguidores.
Simbolismo
Espaço Sagrado
Escolha do Nome
Comidas de Santo
Ervas, História e Ritos
Vodou - Arte e Deuses
Dia Nacional dos Voduns
Simbolismo
A palavra "símbolo" origina-se do grego symbolon, um sinal de
reconhecimento onde observamos que sua etimologia mostra o símbolo
como algo composto. É um sinal visível de uma realidade invisível que
jamais se esgota em seus significados. O objeto e seu significado não
podem ser separados.
As imagens, os emblemas, os objetos, os símbolos, os mitos não são
meras criações de nossa alma, nosso espírito ou nossa mente, eles nos
falam de todas as nossas necessidades. São objetos de nosso cotidiano,
percebidos pelos sentidos, mas que apontam para algo encoberto,
enigmático, para um significado e para um excesso de significados, tudo
que não pode ser esgotado no primeiro momento. Algo externo revela
algo interno, algo corporal em algo espiritual, algo particular em algo
geral.
Geramos energias específicas ao visualizarmos, mentalizarmos,
canalizarmos ou sentirmos um símbolo, eles nos levam a entrar em
ressonância com o Cosmo, que é o grande objetivo.
Através dos símbolos desenvolvemos uma maior capacidade de
percepções, revelações e transformações. Eles fazem parte de toda a
nossa realidade, de nossa vida interior, mística e religiosa, nos orientam
no campo do conhecimento e no campo religioso. Somos conduzidos à
diversas dimensões à mundos distantes, à passados remotos e ao nosso
interior onde a "palavra ainda não se transformou em palavras".
Os inúmeros símbolos existentes (lingüísticos, musicais, religiosos,
mitológicos, matemáticos, etc), ocultam verdades iniciáticas e contam,
sozinhos e interligados, passagens de toda humanidade além de
formarem um único símbolo, o UNO.
Quando trabalhamos bem nossas energias, elas se transformam em
símbolos de vida, de pensamento, de sabedoria e o poder ativo dos
símbolos projetam seu significado no Cosmo que nos devolve em
energia do saber infinito.
Os símbolos são universais e difundidos em todo o mundo, em todas as
culturas. Não podem ser substituídos mediante um acordo. São suporte e
difusores de energias que nos revelam os segredos da matéria e do
espírito, do físico e do espiritual.
No universo tudo é vida e se manifesta simbolicamente. O homem,
desvendando a linguagem oculta dos símbolos, desperta seu inconsciente
para a unicidade, adquire esclarecimentos suplementares sobre a
natureza secreta de nossa identidade espiritual, nosso EU.
O africanos e seus descendentes transplantaram toda uma cultura em
símbolos que fazem parte de nossa sociedade cultural e religiosa.
Através de diversas etnias e de processos sociais e históricos, nosso país,
nosso povo, nossa formação é profundamente marcada por instituições
que transportam e recriam a riquíssima herança africana.
As casa de candomblé são os maiores difusores desta herança cultural
africana através de um farto e complexo sistema simbólico.
Todo grupo, toda etnia, associação ou comunidade, para se constituir
como tal, deve estabelecer modo de comunicação - gestos, sons,
exclamações, ritmos, cores, formas - e constitui-se numa linguagem.
Essa linguagem compreende um conjunto de signos cujo intercâmbios
ou relações simbólicas configuram as divindades. Desta forma, o grupo
expressa seus desejos. O consenso simbólico permite que o grupo fale
entre si.
No candomblé o simbolismo é realizado fundamentalmente pela prática
religiosa. A comunicação se dá por atividades individuais ou em grupo,
pelas cerimônias e ritos públicos e privados, pelos quartos sagrados,
objetos, trajes e emblemas rituais.
Dança, ritmos, cor, conta, gesto, folha, som, emblemas e objetos se
articulam para significar o sagrado. São instrumentos de comunicação
que, através de sua forma significante, manifestam e contribuem para
manifestar e transmitir a complexa trama simbólica que ultrapassa
gerações, transcendendo o tempo e a origem.
A caracterização sagrada de um símbolo é dada através de rituais
religiosos especiais que transmitem poderes místicos à esses símbolos.
Desta forma, não podem ser tratados como objetos-divindades ou meros
amuletos onipotentes que controlam os adeptos e sim como objetos
preparados e aceitos como símbolos de forças espirituais. Eles são mais
que meras representações materiais, são objetos essenciais em que o
sagrado está representado. O religioso reverencia não à matéria e sim à
essência mística que ele simboliza, que têm finalidades e funções. São
portadores de forças místicas, estimulam a memória grupal e o processo
de ligação às divindades.
Os símbolos são um "microcosmo" que, decodificados, falam de todo
um sistema religioso - estético de uma determinada nação.
Não é possível definir intelectualmente o processo de criação desses
símbolos assim como, não podemos compreender seu conteúdo sagrado
como uma equação matemática. Cada um deles possui conteúdos
aparentes, visíveis ou manifestos em níveis consciente, latentes, ocultos
ou reprimidos no nível inconsciente.
A religião, a mitologia e a arte são os veículos mais sensíveis através dos
quais uma cultura manifesta seus conteúdos e necessidades latentes. Eles
abrigam os mais ocultos conflitos de nosso mundo presente e passado,
um gigantesco arquivo onde parte de nossa história ancestral - o
inconsciente coletivo - se elabora e transmite. Símbolos de uma cultura
que emprestam sua matéria para que o místico se revele.
Para vivenciarmos os símbolos realmente como tais, devemos estar
prontos para nos deixarmos tocar emocionalmente por eles,
questionarmos nosso nível de vida concreto para depois nos ocuparmos
com o que está oculto. Quando estabelecemos relação com um símbolo,
tudo que está ligado a ele torna-se repentinamente vivo.
Ainda hoje, a grande maioria do povo candomblecista, desconhecem a
simbologia dos objetos de nossa religião, assumindo atitudes meramente
repetitivas de tradições passadas oralmente, sem serem decodificadas.
Acreditamos que a cada símbolo compreendido e apreendido, crescemos
em emanações de energias interior e exterior.
- Fontes de consulta: Dicionário de Símbolos - Jean Chevalier
Os Nagôs e a Morte - Juana Elbein
AS MÃOS
A mão exprime as idéias de atividade, ao mesmo tempo que as de poder
e de dominação.
Certos escritos taoístas dão à elas o sentindo do alquimista de
coagulação e de dissolução, correspondendo a primeira fase ao esforço
de concentração espiritual, a segunda à não intervenção ao livre
desenvolvimento da experiência interior dentro de um microcosmo que
escapa ao condicionamento espacial e temporal.
É preciso lembrar ainda que a palavra manifestação tem a mesma raiz
que mão: manifesta-se aquilo que pode ser seguro ou alcançado pela
mão.
A palavra em hebreu iad significa ao mesmo tempo mão e poder.
A mão esquerda é tradicionalmente associada com a justiça e a direita
com a misericórdia; a mão do rigor e a da maleabilidade, o equilíbrio
quando juntas.
A mão fechada é o símbolo do segredo.
A mão serve, enfim, à invocação. Por vezes ela é comparada com o
olho: ela vê. É uma interpretação que a psicánalise reteve, considerando
que a mão que aparece nos sonhos é equivalente ao olho. Daí o belo
título: "O cego com dedos de luz".
Segundo Gregorio de Nissa, as mãos do homem estão ligadas ao
conhecimento, à visão, pois elas têm como fim a linguagem.
As mãos têm uma "transferência" e também uma "troca" de energia.
A mão é como uma síntese, exclusivamente humana, do masculina e do
feminino, ela é passiva naquilo que contêm e ativa no que segura.
As mãos possuem milhares de pontos ocultos de canais sutis por onde
circula a energia vital. Esses centros de consciência, superpostos ao
longo da coluna vertebral até o topo da cabeça, podem ser qualificados
de "turbilhões de matéria etérea". Ao friccionar as mãos com os búzios
(jogo) dentro, estamos ativando esses pontos, liberando e trocando
energia, a concentração espiritual, a manifestação, o poder, o segredo, a
invocação, o conhecimento, a visão e o equilíbrio, para termos como fim
a "linguagem" da leitura dos búzios.
Se todos os pais/mães de santo procurassem entender mais sobre o
significado de tudo que fazem e manipulam, com certeza o "poder" que
têm em suas mãos seria muito melhor explorado e aplicado em beneficío
de seus filhos, de si próprio e da humanidade.
fonte de consulta: Símbolos - Jean Chevalier
O ESPAÇO SAGRADO
Ataliba Fernando Costa*
A sacralização do espaço remonta, é certo, aos primórdios do
aparecimento na Terra dos seres humanos modernos (Homo sapiens)
isso na era Cenozóica, período quaternário.O Homem é considerado
como uma das últimas espécies a surgir no planeta, e na sua curta
trajetória sobre a superfície deste planeta apenas ele possui as ideais
condições e capacidade para agir sobre o meio e manipular objetos,
Aguiar ao dissertar sobre as capacidades humanas afirma que o Homem
diferencia-se das demais espécies animais, visto que só o Homem é
dotado de imaginação e inteligência simbólicas.
Trataremos então a seguir de manipulações do Homem sobre o meio, e a
sacralização não só do espaço, mas também do momento, de um certo
momento que capturado e representado pode trazer presságios para um
ato ou uma vida. Comentaremos sobre as mais antigas representações
conhecidas, as gravadas nas paredes das cavernas, representações
conhecidas como arte rupestre; além de muito estudadas em nossos dias,
trazem algumas incógnitas que ainda não foram plenamente elucidadas.
Uma delas, refere-se à dificuldade de precisar a idade desses desenhos.
No entanto, alguns pesquisadores afirmam que desenhos como esses
datam de períodos anteriores ao Neolítico.
Relevando os problemas de exatidão da idade dessas representações, a
arte rupestre prima por nos fornecer, como salienta Brézillon,
"informações sobre a fauna e o gênero de vida das populações
representadas".
Estas formas primitivas de representação, feitas nas paredes das
cavernas, usando de pigmentos extraídos da natureza e entalhes feitos
com ferramentas de pedra, como muitos pesquisadores como Brézillon,
Hauser, Garcia, Motes e outros puderam observar, não tinham nenhuma
intenção ornamental estética, e sim um caráter místico, onde as imagens
ali presentes representavam, para o Homem pré-histórico, amuletos;
presságios positivos em suas empreitadas, uma vez que se encontram em
salas ocultas, de difícil acesso; nunca em lugares expostos à apreciação,
como mostra Hauser.
Sobre todo el hecho de que las pinturas estén a menudo completamente
escondidas en rincones inaccesibles y totalmente oscuros de las
cavernas, en los que hubieram podido de ninguna manera ser una
"decoración. Tambien habla contra semejante explicación el hecho de su
superposición a la manera de los palimpsestos, superposición que
destruye de antemano toda función decorativa; esta superposición no
era, sin embargo, necesaria, pues el pintor disponía de espacio
suficiente. El amontonamiento de una figura sobre outra indica
claramente que las pinturas no eran creadas com la inteción de
proporcionar a los ojos un goce estético, sino persiguiendo un propósito
en el que lo más importante era que as pinturas estuviesen situadas en
ciertas cavernas y en ciertas partes específicas de las cavernas,
indudablemente en determinados lugares considerados como
especialmente convenientes para la magia.
De posse destas afirmações exemplificadas podemos então, concluir que
poderiam ser estes ambientes os primeiros templos, lugares sacralizados,
que manipulados pelo homem estavam prenhes de magia e energia
possibilitadora de presságios positivos. Ainda buscando subsídios nas
informações de Hauser, podemos também dizer que se o templo, ou seja,
locais onde tais imagens eram impressas, o local representado também
continha a energia sagrada, um local
sacro santo.
Ainda citando Hauser, quando este disserta sobre os autores das tais
pinturas rupestres podemos apreender que os executores dessas obras
deveriam possuir além das posições de caçador e até mesmo de geógrafo
o título de sacerdote, aquele eu distinguia e prendia mentalmente todas
as particularidades de um lugar para assim pender no templo de seu clã
toda a mítica do lugar.
l pintor paleolítico era cazador y debia, como tal, ser um buen
observador; debía conocer los animales y sus características, sus
habituales paradas y sus emigraciones a través de las más leves huellas y
rastros; debía tener una vista aguda para distinguir semejanzas y
diferencias.
Com essas informações podemos concluir que as representações
primitivas são parte das conquistas do Homem, que lenta e
gradativamente foi se intelectualizando e criando condições de agir
sobre o meio, evoluindo, conseqüentemente, na forma de representar o
espaço à sua volta. Os desenhos impressos pelo Homem primitivo, são
representações do espaço no qual ele age, e, como não poderia deixar de
ser, está cheio de elementos emocionais, um espaço relacionado com as
necessidades e interesses do Homem pré-histórico.
Dizer que as câmaras das cavernas utilizadas pelo homem como templo,
seria o primeiro templo seria um pouco incoerente uma vez que o divino,
o sagrado estava, na realidade do outro lado daquelas paredes de pedra.
Concluímos sim, que tais câmaras eram na realidade a captura de
espaços especiais que deviam ser transformados e sacralizados.
Finalizando essa questão da sacralização do espaço podemos afirmar que
a categoria Espaço, Paisagem e até mesmo Lugar (unidade elementar)
servem como pano de fundo para as atividades humanas, portanto o
profano e o sagrado coexistem, e quem transforma e dá caráter profano
ou sagrado a um ambiente é o homem que o manipula ao se bel prazer.
Citando HARVEY, quando este fala das classificações do espaço, este
escreve:
COMIDA DE SANTO
Explorando o assunto Comida de Santo, pode-se encontrar na literatura
alguns textos. Fazendo-se agora um resumo e algumas colocações. Nina
Rodrigues, em seus estudos, ao abordar à arte da culinária africana,
achou difícil precisar, devido ao estado atual dos costumes, à quais
grupos pertenceriam determinadas comidas. Já Manuel Querino
assinalava que a contribuição dos grupos bantos, angolanos e jejes eram
maiores que as dos nagôs, contrariando a tese dos que insistiam na sua
predominância.
Nos terreiros, esta cozinha, marcada por uma série de preceitos e
interdições, vai aparecer relacionada diretamente aos deuses através das
chamadas comidas do santo. Assim, cada um deles irá receber em dias
especiais (ou não) pratos de sua preferência. Não se trata, porém só de
comer e sim o que se come, o que não se come, quando se come, com
quem, participam de um todo integrado que diz respeito a códigos
imprescindíveis dentro da culinária dos deuses. E mais ainda, esta
comida dentro da dinâmica dos terreiros é um dos veículos de vital
importância para a transmissão e distribuição de axé. Seja essa comida
reelaborada a partir de técnicas e maneiras predominantemente banto,
jeje ou yorubá, esse negros modificaram as refeições do reino como já
exposto. Outro fato que deve ser considerado é a falta de mantimentos
num país desde o começo assolado pela fome. Da nova terra, o
português ao lado das caças e muitos frutos, só pôde aproveitar a
mandioca e o milho que eram alimentos básicos para o sustento e o qual
era oferecido aos negros. Adotar os mantimentos da terra, ao lado de
importar tantos outros como, por exemplo, o gengibre, arroz, inhame,
banana, coco, dendê, foi à solução encontrada pelos portugueses para
suprir a falta de alimentos. Cascudo (1970) diz que ao fim do séc XVIII
os produtos americanos já estavam tão difundidos na África portuguesa
que participavam das refeições nos negros, escravos ou livres. Os
ingredientes africanos vindos da áfrica, como o quiabo, o inhame, erva-
doce, gengibre, gergelim, amendoim, melancia, dendê e outros foram
entrando aos poucos no Brasil de acordo com as exigências do tráfico ou
da população aqui estabelecida. Não é possível, no entanto, se pensar
nesta cozinha e nem em uma outra somente a partir de tais elementos.
Ela é mais do que um conjunto de matérias naturais que podem ser
adaptados e substituídos. Esse próprio fato obedece a uma certa ordem
inscrita nos mais remotos tempos, fazendo com que a comida não perca
seu sentido nem se afaste da visão do mundo que ela representa. O que
dá identidade à determinada comida não é a origem dos vários
ingredientes combinados, mas a maneira como estes elementos são
combinados. E estas maneiras obedecem a determinados ritos que lhe
dão sentido e, como tais, apresentam-se como algo criativo. Assim, é
completamente arbitrário buscar precisar datas para essa culinária,
entendendo esta como algo parado, fechado, se o próprio tempo se
incumbiu de dinamizá-la. As condições de possibilidade para se pensar
uma cozinha africana não podem ser pensadas em nível cronológico,
assim como não podem prescindir desse tempo. Elas vão acontecendo,
se dando, de acordo com o tipo de situação servil ou livre e o lugar em
que vivia o africano, variando, desde o primeiro momento em que
dividiu a cozinha com as africanas cozinheiras, até quando pôde, ante as
novas condições suscitadas pelo processo histórico, negociar um
tabuleiro. O processo de criação das comidas africanas também se deve
a importância dos jejuns e das festas regulados pelas igrejas ( outra
questão complexa que não cabe abrir aqui). Os africanos tiveram
também que adaptar às vezes sua alimentação, a hora e quantidade que
se podia comer impostas pela igreja. Todavia, quando puderam
providenciar seus próprios alimentos. é muito provável que tenham
lançado mão do conhecimento acumulado e das várias experiências
trazidas de suas terras, já somadas a tantas outras. Tudo isso que foi
colocado pelos autores não se trata de um retorno à África, mas fazer
com que comida se faça africana, ou seja, remonte a histórias e
passagens, visões de mundo associadas aos ancestrais, princípios
universais ou antepassados, aos primórdios dos tempos quando estes
fundaram a humanidade, constituíram as cidades e criaram os diferentes
grupos. Visões de mundo juntadas a inúmeras outras experiências
históricas constituídas no Novo Mundo. É este fazer que faz com que tal
comida seja comida de santo. A comida de santo diferencia-se, assim,
daquela do dia a dia. Uma coisa é cozinhar um inhame e dividi-lo em
pedaços e come-lo no café da manhã. Outra é preparar esse mesmo
inhame para Oxalá, quando variam desde o tamanho, a forma das raízes,
os procedimentos observados para sua feitura e por fim, as palavras ditas
para encantar a comida. Fazer um feijão no azeite não é o mesmo que
preparar um Omolocum. Neste nada pode se escapar, se escolhe bem os
grãos, pois Oxun liga-se à fecundidade. Os deuses comem comida mais
elaborada. Embora os ingredientes sejam os mesmos, mudam o
tratamento que estes recebem. E a forma como estes são tratados
expressa seu sentido através de um ritual onde nada é por acaso. Assim,
Exu pode comer de tudo com já dizia um de seus mitos. Ogun pode
receber feijoada, uma vez que as carnes gordas lhe pertencem. E Oxossi
por se ligar a terra, recebe todos os frutos dados pelo Novo Mundo.
Gonzegan Carla de Tobosi FONTE: Faces da Tradição Afro-Brasileira –
CNPq Santo Também Come - Raul Lody
ERVAS: HISTÓRIA E RITO
Wanda de Otolu
Vem dos tempos mais primórdios, a história da utilização das plantas,
tanto é que os próprios animais, quando apresentam alguma
enfermidade, buscam ervas para auto-tratamento. Também o ser humano
assim o fez, desde sempre. É certo que doenças sempre existiram, e que,
ao longo do tempo, foram sendo divididas em outras tantas.
O Humgebê
O humgebê é o fio de contas sagrado da nação Jeje. Ele representa o elo
entre o orum e o aiye. É o fio de conta da vida e da morte, símbolo do
próprio céu, do mundo espiritual, invisível e transcendente. O céu
cósmico particularmente em suas relações com a terra.
Somente vodunsis recebem o humgebê. Temos visto ogans e ekedis
usando erradamente o humgebê. Quando o inciado torna-se um vodunsi,
ele recebe o humgebê pois acaba de nascer no mundo do santo. Quando
o vodunsi morre, o humgebê o acompanha. Ele nos liga ao orum, nos
traz o orum e nos leva de volta ao orum.
Temos observado, no Rio de Janeiro, erroneamente, algumas casas de
Jeje darem o humgebê aos seus filhos somente na obrigação de sete
anos. Cabe aqui uma pergunta de uma velha Doné de Salvador ao
relatarmos esse fato: - "Oxente!!!! Vocês no Rio só nascem aos sete
anos?".
A preparação de um humgebê é igual ou maior que a feitura de um
Vodum, inclui obrigações, currans, zandros, etc. Há necessidade
também, de alguns preceitos de humdemê. O poder do humgebê
ultrapassa a mente humana. Ele sempre nos avisa quando vai acontece
algo de muito grave na vida daquele vodunsi ou no kwe. A voz do
humgebê está num grande segredo da nação Jeje.
Cada humgebe confeccionado pertence àquele vodunsi e, em hipótese
alguma, pode ser usado por outra pessoa ou tocado.
Quando um humgebê arrebenta, ele tem que passar por todo um
processo especial para ser reenfiado.
A confecção de um humgebê segue características rígidas. Deve ter a
quantidade certa de miçangas entre os corais e seu fechamento também é
um só. Não se fecha humgebê com contas na cor do santo do yao e sim
como um segui, como temos visto em alguns candomblés. Também
observamos humgebês enrolados no pescoço, atitude que quebra todo o
seu significado sagrado. A quantidade de corais que compõem um
humgebê, ao contrário que muitos pensam, não é fixa. O comprimento
de um humgebê varia de acordo com a altura da pessoa, devendo sempre
estar um pouco abaixo do umbigo.
Em alguns segmentos Jeje encontramos o humgebê composto por dois
seguis, um no fechamento e outro no meio, o que também é correto.
O humgebê é composto de contas, corais e segui. O coral é a "árvore das
águas", participa do simbolismo da árvore (eixo do mundo) e do
simbolismo das águas profundas (origem do mundo). Sua cor vermelha
aparenta com o sangue. Segundo uma lenda grega, o coral teria surgido
das gotas de sangue derramado pela Medusa. O simbolismo do coral tem
tando a ver com sua cor quanto com a rara particularidade que tem de
fazer coincidir, na sua natureza, os três reinos: animal, vegetal e mineral.
Devemos lembrar também, do simbolismo guerreiro da cor vermelha.
Como símbolo da árvore da vida e das águas profundas, faz o elo entre a
vida e a morte. Sua cor vermelha é o símbolo universal do princípio de
vida, com sua força, seu poder e seu brilho, cor do fogo e do sangue.
Representa não a expressão, mas o mistério da vida e da morte. Um lado
seduz, encoraja, provoca; o outro lado alerta, detém, incita à vigilância.
Este é, com efeito, a ambivalência do vermelho do sangue profundo:
escondido ele é a condição da vida; espalhado significa a morte.
O azul do segui, é a mais profunda das cores: nele, o olhar mergulha sem
encontrar qualquer obstáculo, perdendo até o infinito. É também a cor
mais imaterial e fria e, em seu valor absoluto, a mais pura, à exceção do
vazio total do branco neutro. O conjunto de suas aplicações simbólicas
depende dessas qualidades fundamentais.
Aplicada a um objeto, a cor azul suaviza as formas, abrindo-as e
desfazendo-as, desmaterializa tudo aquilo que dele se empregna. É o
caminho do infinito, onde o real se torna imaginário, um pouco como
passar para o outro lado do espelho.
O azul não é deste mundo, sugere uma idéia de eternidade tranquila e
altaneira que é sobre-humana.
É também a cor da verdade. A verdade, a morte e os deuses andam
sempre juntos e é por isso que, a cor azul também é o limiar que separa
os homens daqueles que o governam, do Além, seu destino. Há também
um simbolismo de castração, imposição e de um longo sacrifício, um
certo heroísmo, embutido no azul do segui.
Como podemos observar, há uma enorme simbologia religiosa e
cósmica no nosso Hungebê