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(Py tsy sn ———_ ATOS ADMINISTRATIVOS™ (cent Os atos administrativos sto espécie do género “ato juridico”, Fazendo uma répida digressto, na seara do direito privado, podemos afirmar que tudo aquilo que interessa 20 direito ~ isto é, todos os eventos, naturais ou humanos, a que o direito atribui significagdo, ¢ aos quais vineula consequéncias juridicas — integra os denominades fatos Juridicos em sentido amplo. Esses fatos juridicos em sentido amplo subdividem-se em: 8) fatos juridicas em sentido estrite: sto eventos ds natureze ~ ou sje, acontecimentas que nfo decorrem diretamente de manifestagéo de vontade Jhumana - dos quais resultam consequéncias juridicas. Exemplos sio a passage do tempo, 0 nascimento, = morte, uma inundago que ocasione destruigdo de bens etc; 1b) atos juridicos: sfo qualquer manifestario unilateral humana voluatéia que teoha a finalidade imediata (direts) de produzir determinada alteragda no ‘mundo juridico. Proferimos reservar a expresso “ato juridico” especificamente para as rmanifestapbes ou declaragbes unilaterais (oor exemplo, uma promessa de recompensa, uma oferta de ages de uma socicdade andnima, a assinatura de ‘uma nota promisséria). Urtilizamos 0 vocdbulo “contrato” para 0s vinculos jjuridicos que 6 se aperfeiyoam com mais de uma declaragio ow manifes- ‘agéo de vontade (por exemplo, o contrato de compra © venda © o contrato 508 __DREITOADNNIGTRATIVG DESCOMPLICADO- Harel Alanna & Vint Patio de doagao sto bilaterais na sua formagio; o contrato de constituigdo de uma sociedade com mais de dois sécios & plurilateral na sua formagio). ‘Nao obstante, reconhecemos que nenhum problema hé no emprego de ‘expresso “alo juridico bilateral” como sinénimo de contrato (especificamen- te, de contratos bilaterais na sua formagfo, que correspondem & esmagadora raioria dos contrtos). Conforme antes afirmado, 05 atos administratives enquadram-se na ca- tegoria dos atos juridicos. Logo, so manifestagoes humanas, © no meros fendmenos da natureza, Ademais, sio sempre manifestagdes unilaterais do vontade (as bilaterais comptem os chamados contratos administrativos). © que peculiariza os atos administrativos no ambito do género “atos Jjuridicos”, entretanto, é 0 fato de serem manifestaydes on declaragées da administraggo publica, agindo nesta qualidade, ou de porticulares que estejam. exercendo prerrogativas piblicas, por terem:sido investidos em fungOes pi- blicas (a exemplo dos que recebem delegago do poder piblico, como uma concessionéria ou uma permissiondria de servigos piiblicos) Por serem praticados no exercicio de atribuicdes piblicas, os atos administrativos estio sujcitos 20 regime de direito piblico. So eles mani- festagbes ou declarspies exaradas scmpre no ambito de relagées juridicas 4e direito pili. Segundo 0 conceito elaborado por Hely Lopes Meirelles, “ato adminis- trativo € toda manifestag0 unilateral de vontade da Administragdo Piiblica que, agindo nessa qualidade, teaba por fim imediato adquirs, resguardar, ‘ransferir, modificar, extinguir © declarar direitos, ou impor obrigagGes 03 administrados ou a si prépris™ Maria Syivia Di Pietro define ato administrative como “a declaragao do Estado ou de quem 0 represent, que produz efeitos juridicos imediatos, com obscrvncia da lei, sob regime juridico de dircito piblico ¢ sujcita a controle pelo Poder Judicisrio”. Merece referéncia, também, a formulagio proposta por Celso Antonio Bandeira de Mello, para quem ato administrativo ¢ uma “declaragto do Estado (ou de quem lhe faga as vezes — como, por exemplo, um concessionério de servigo piblico), no exercicio de prerrogativas pablicas, manifestada mediante providencias juridices complementares de Ieia titulo de the dar cumprimento, € sujeitas a controle de legitimidade por érgio jurisdicional”. De nossa parte, baseados nas ligdes dos grandes mestres, propomos a seguinte definigo de ato administrative: manifestagio ou declaragio da ATOS ADMINISTRATIVOS. administracio piblica, nesta qualidade, ou de particulares no exerci de prerrogativas pablicas, que tenha por fim imediato a produgao de efeitos juridicos determinados, em conformidade com o interesse piiblico € sob regime predominante de dircito pablico. s atos administrativos ndo se confundem com os assim chamados atos politicos ou de governo. Sao esses os atos da administragio publica em sentido amplo, praticados em obediéncia direta & Constittigdo, com base imediata no texto constitucional (exemplos: iniciativa de leis, sango on veto 1 projetos de lei, celebragio de tratados internacionais, decretagio do estado de sitio, dentze outros), Os atos politicos no estio cujeitos 4 teoria geral os atos administrativos. Por fim, deve-se ressaltar que, no exercicio geral da atividade pibtica, ‘és distintas categorias dc atos podem ser reconhecidas, cada qual sendo 0 ato tipico de um dos Poderes do Estado: ) tos legisletives (elaborago de uormas primérias), b) tos judiciais (exeroicio da jursdicso); & ©) stos administratives Embora os atos administrativos gejam os atos tipicos do Poder Executivo no exercicio de suas fungSes proprias, nfo se deve esquecer que os Poderes ‘Judiciario e Legislativo também editam atos administrativos, principalroen- te relacionados ao exercicio de suas atividades de gestio interna, como atos relatives & contratagdo de seu pessoal, & aquisigzo de material de consumo etc. Em diversas situagdes 2 administracto piblica age sem revestir a qua- lidade de poder piblico, ou seja, despida de suas prerogatives de direito piblico. Frequentemente isso ocorre quando drgos ou entidades administra- tivas atuam no dominio econdmice, exercendo atividades préprias do setor produtivo, Por exemplo, quando uma sociedade de economia mista vende, no mercado, bens de su produgio, ou um banco estatal celebra, com um particular, um contrato de abertura de conta corrente, ov, ainda, quando um agente piblico competente dos quadros de um érgio da administracto direta assina um cheque para pagar um fornecedor. ‘Nesses casos, submete-se a aduinistragdo as regras do direito privado que regulam taisatos juridicos. Tome-se o tltimo exemplo acima aduzida ~assinatu- ra de um cheque por um agente pablico com essa competéncia , afim de ilustrar ‘0 que se vem de afirmar: a emissfo de um cheque ¢ seus efeitos so regulados 510 __OIREITO ADMISTRATIVO DESCOUPLICADO - Marcle Asencio Vine Pao pelo direito privado; uma vez emitido o cheque, as consequéncias decorentes desse ato passam @ ser inteiramente regradas pelo direito comercial — € nfo pelo direito administrativo, Seria rematado absurdo, por exemplo, cogitar que 1 atministraco pudesse pretender valer-se de prerrogativas de dircito piblico a fim de, mediante ato unilateral, revogar 0 cheque por ela emitido, ‘A doutrina, por vezes, utiliza a expresso “atos da administrago” para se referir especificamente a esses atos que a administrago piiblica pratica quando estd desprovida de presrogativas piblicas, quando esté etuando em igualdade juridica com os particulares, sob regéncia predominante do direito privado. Cumpre alertar, entretanto, que € mais usual a expressdo “atos da admi- nistragio” ser empregada genericamente, ou de forma ample, pare aludir a qualquer ato praticado pela administracdo pablica, ‘Nessa acepeto ampla ow genérica, os “atos da administragdo” incluem: 2) 0s “los administrativos” propriamente ditos (manifestaglo de vontade cujo fim imediato seja a produgdo de efeitos juridicos, regida pelo direto piblico); 1b) 0s alos da administracio piiblica regidos pelo dieito privado; © ©) 05 chamados “atos materais™ praticedos pela administracto pbliea, que sto 0s atos de mera execuedo de determinaptes administrativas (portento, nfo tém como conteido uma manifestagio de vontade), a exemplo da varigio de uma praca, da dissolugdo de uma passeata, da pavimentagéo d= ume cestada, dz demoligio de um prédio que esteja ameacando roi. Esses “atos materiais” da administracto pablica correspondem a uma das definigtes de “ato administrative”, conforme adiante sera visto. ‘A nogéo de “fato administrativo” é algo problemtica, pois existe dis- crepancia entre 0s principais administrativistes, acarretando uma pluralidade de conceitos para a mesma expressio. [Numa acep¢lo tradicional, fatos administrativos sfo descritos como a ‘materializagao da funcdo administrativa; consubstanciam o exercicio material a atividade administrative, correspondem 20s denominados “atos materiais”. ‘do exemplos a apreensio de mercadorias, a construgo de uma escola publica pela administracdo, a limpeza de um logradouro piblico. Us fato administrativo, em regra, resulte de um ato administrativo (ou de mais de um), decorre de uma decisdo ou determinaga0 edministrativa, mas ‘com esta nfo se confunde. Uma vez expressa a vontade da administracio TOS ADMINISTRATIVOS si mediante a edigdo de um (ou mais) ato administrative {manifestaglo dotada de coatetide juridico), surge como consequéncia um fio administrative (@ implementagao do ato). Exemplificando, « demoliglo de um prédio (fato admi- nistrativo) pode ser resultante de uma ordem de servigo da administraglo (ato administrativo); a edigto de um decreto (ato administrative) pode ter como consequéncia a desapropriacio de um bem particular (fato administrativo). Os fatos administrativos ndo tém por fim a produsio de efeitos juridicas; nessa acepelo, eles consubstanciam, tio somente, a implementagéo material de atos administrativos, de decisses ou de determinagves administrative, Segundo outra definico — que pode coincidir parcicimente com a anteriomente exposta ~ fatos administrativos s8o quaisquer atuagSes da administragdo que produzam efeitos juridicos, mas que nfo tenham por fi- nalidade imediata a produco desses efeitos juridicos. Sao atuagées que nfo correspondem # uma manifestagio de vontade da administagao, mas que trazem consequéncias juridicas. Exemplo seria ¢ colisio entre um veiculo oficial da administragdo publica dirigido por um agente piblico, nesta qualidade, ¢ um veioulo particular. Nessa hipétese, « coliséo resuliou de uma atuaco administrativa e produziri efeitos juridicos, mas nao se trata de um ato administrativo, porque nao bouve uma manifestacio de vontade da administragio que tivesse a finalidade de produzir esses efeitos juridicos. Trata-se de um fato administrativo. Vale notar que nfo se pode dizer, no exemplo acima, que 0 fato adminis- trativo (colisao do veiculo oficial) tenba resultado de um ato administrtivo ou de uma decisdo administrative. Simplesmente, uma atuagao da administragao pablica trouxe, para ela, consequéncias juridicas, sem que tivesse existido, ‘em algum momento, a fnalidade de produzir esses resultados. Um terceiro conceito de fato administrativo ~ perfilhado pelo Prof. Celso Antonio Bandera de Mello — considera como tal o siléncio (ou a inércia, ‘ou a omissto) da administragdo que produza efeitos juridicos. Por exemplo, quando ocomre a decadéncia do direito de a administragdo anular um ato dministraivo que contenha vicio, a inércia (omissfo), da qual resultou a decadéncia (efeito juridico), é um fato administrativo, uma omissio da admi- nistragio (ado anular 0 ato dentro do prazo) que produziu efeitos juridicos. Observe-se que esse nfo fazer, essa omissao juridicamente relevante € con- ceituada como “fato administrativo” independentemente de « administracéo ter desejado a produgéo dos efeitos respectivos. Mesmo numa situacio em que administracdo permanega deliberadamente inerte, exatamente com a finalidade de obter os efeitos juridicos dessa inércia, nfo se pode falar que fenha sido praticado um “ato administrative”, pela razdo singela de que um “nko fazer” & 0 oposto de um ato: é um “nfo ato”. 512 _DWREHTOADNARISTRATIVO DESCOMPLIGADO - Marae Aokandan & Vien Pato Por fim, cabe registrar que 2 Prof* Maria Sylvia Di Pietro considera fatos administrativos eventos da natureza, no decorrentes de manifesta- Ho ou declarado humana, que produzam efeitos no ambito do direito administrativo, 2 exemplo da morte de um servidor piblico. Consoante se cconstata, segundo essa definisio, fatos administrativos seriam espécie do ‘género “fatos juridicos em sentido estrito”. A mesma autora alude, ainda, a fatos da administragio. Para ela, estes diferem dos fatos administrativos por néo produzirem efeitos juridicos no ambito do direito administrativo. ‘Transcrevemos a ligo da ilustre administrativista, na qual essas definigdes so expostas (grifos no original): Direito Civil far distingéo entre ato ¢ fato; 0 primetro é ‘mputével a0 homem; 0 segundo decorre de acontecimentos naturais, que independem do homem ou que dele dependem apenss indiretamente, Quando 0 fato corresponde & descrigfo contida na norma legal, cle & chamado fato juridico produz efeitos no mundo do Direite. Quando o fito deserito na nocmra legal produz efeitos, ‘0 camps da Dirt Aeminicrative, le é ue fata administra tivo, come ocorre com # morte de um funcionério, que produz 1 vaclacia de seu cargo; com © decurso do tempo, que produz 8 prescrigdo adminisirativa, Seo fato nfo produz qualquer efeito juridico no Direito Admi- nistrativo, ele € chamedo fato da Administracao. Seja qual for a definigao adotada, certo ¢ que 0s fatos administrativos ‘Go estio sujeitos & teoria geral dos atos administrativos. Em qualquer das acepsies antes expostas, pode-se afirmar a respeito dos fatos admi- aistrativos: (2) no t2m como finalidade a produgéo de efeitos juridicos (embora possam deles eventualmente decorrer efeitos juridicos); (b) no ha ‘manifestago ou declaragio de vontade, com contedido juridico, da admi aistragto piblice; (0) ndo faz sentido falar em “presungio de legitimidade de fatos administrativos; (d) nio se pode cogiter revogar0 ou anulagto de fatos administratives; (e) nfo faz sentido falar em fatos administrativos discricionérios ou vinculados. noes 5.1. Atos vinculados e discricionérios Atos vinculados so os que a administrago pratica sem margem al- guma de liberdade de decisdo, pois a lei previamente determinou 0 tinico Cap. 8 ATOS ADNINISTRATIVOS 513 ‘comportamento possivel a ser obrigatoriamente adotado sempre que se configure a situagdo objetiva descrita na lei. Nzo cabe ao agente piiblico apreciar oportunidade ou conveniéncia administrativas quanto ediglo do 10; uma vez atendidas as condiebes legais, o ato tem que ser praticado, invariavelmente, Consoante a definigfo de Celso Anténio Bandeira de Mello, atos vin- calados so “aqucles em que, por existir prévie ¢ objetiva tpificasio legal do tinico possivel comportamento da Administragao em fece de situsgao ‘igualmente prevista em termos de objetividade absoluta, a Administragdo, 20 expedi-los, nfo interfere com apreciagio subjetiva alguma’’ Dito de outta forma, temos um ato vinculado quando @ lei faz comres- ponder a um motivo objetivamente determinado uma tinica e obrigatéria amagio administrative. Para exemplificar, tomemos a concesstio da licengs-paternidade, regu- eda na Lei 8.112/1990. Atendidas as condicdes da lei (cuja base direta é Constituigéo), ou soja, nascido 0 filho de servidor piblico, nfo cabe 20 adiinisttador, sob nenhuma circunstancia, alegar que o servidor é essencial a0 servigo, que néo seria conveniente seu afastamento, ou qualquer outra tentativa de nfo editar o devido ato de concessio da licenga. Configurada a hipétese legal, somente uma atitude é admissivel: a edigto do ato concessi- vo, sem espago para juizo de oportunidade ou convenincia administrative Atos discricionarios so aqueles que a administraco pode praticar com certa liberdade de escolha, nos termos e limites da lei, quanto ao seu conteido, seu modo de realizacso, sua oportunidade © sua conveniacia administrativas. Enquanto o agente piiblico esti rigidamente adstrito & lei quanto a todos 0s elementos de um ato vinculado (competéncia, finalidede, forma, motivo ¢ objeto), ao praticar um ato discricionério possui ele certa liberdade (dentro dos limites da lef) quanto A valorago dos motivos ¢ escolha do objeto (conteiido), segundo os seus privativos critérios de oportunidade © conve- niéncia administrativas. Exemplificando, tome-se a licenes para tratar de interesses particulares, Gisciplinada na Lei 8.112/1990, De pronto, observamos que @ lei utiliza a expressdo “a critério da Administraglo”, ‘para referirse & concessio da licenga (art. 91). Resulta que, embora o ato esieja previsto na lei, fica a critério da administraro, sempre obedecidos, entre outros, os principios da moralidade © da impessoalidade, valorar a oportunidade © a convenitncia a pritica, ou no, do ato. ‘A definiglo de discricionariedade até aqui exposta é ha muito apresentada pelos autores tradicionais, os quais s6 costumam mencionar 2 possibilidade S14__REITO AOMINISTRATIVO OESCONPLCADO - Marae Alora & Vine Pau de atuagdo discriciondrie quando a lei explicitamente confere tal faculdade & administragdo. Todavia, a doutrina mais moderna — a nosso ver, hoje majori- téria — identifica a existéncia de discricionariedade nesses casos e, também, quando a lei usa conceitos juridicos indeterminados na descrigio do motivo que enseja a pritica do ato administrativo, Explicando, a maior parte de nossa doutrina edministrativista atual entende que também ha discricionariedade, ou possibilidade de atuagio discriciondria, do agente piblico, nz aplicaglo das leis que utilizam conceitos indctermi- nados — tais como “boa-fe", “conduta escandalosa”, “moralidade pablica” -, quando, no caso concreto, 0 agente se depera comm situagdes em que no existe possibilidade de afirmar, com certeza, a ocorréncia ou nfo do enque- dramento do fato no conteido da norma. Nesses situagies, a administaga0, dentre as possibilidades de atuacdo juridicamente legitimas, determinaré a mais oportuna e conveniente, tendo em vista o interesse piblico; o Poder Judiciério nfo pode substituie a administragto nesse juizo de valor (porque se trata de um juizo de mérito administrative). ‘Teoricamente, um conceito juridico indeterminado possui uma zova de certeza positiva ~ a qual abrange todas as situagGes féticas que, com certeza, se enquadram no conceito -, uma zona de certeza negative ~ @ qual abrange todas as situagdes fiticas que, com certeza, no se enquadram no canceito — 2 uma zona de indeterminagdo ~ na qual reside a discricionariedade, Quando uma situaglo concreta estiver enquadrada na zona de indeter- rminagdo (ou “éres de incerteza”, ou “zona de penumbra") de umn conceito juridieo indeterminado, nfo seri possivel estabelecer uma tinica atuagio jjuridicamente valida, Mais precisamente, quando 0 caso concreto escapa as freas de certeza positiva © negativa de um conceito juridico indeterminado, administragéo tem discricionariedade para decidir acercs do enquadramento, ou nio, da situago na nome legal, ‘Tal devisfo pertence ao Ambito do mérito administrative, isto é, caberé ‘0 agente piblico, conforme seus critérios exclusivos de conveniéncia e opor- tunidade administrativas, determinar se mais edequado ao interesse piblico & praticar o ato previsto na lei - caso em que enquadraré a situasa0 concrete ‘no conceito indeterminado empregado na descrigao do motivo legal ~, ou se mais bom atende ao interesse piblico deixar de praticar o ato — hipétese em que decidiré que 2 simagao concreta nfo se enquadra na lei, no corresponde 0 conceito indeterminado empregedo na descric#o do motivo legal Importante ¢ frisar que 0 Poder Judiciério nfo pode substituir a adminis- ‘rae quanto a esse juizo valorativo, isto 6, quando a administracio, diante 4ée um caso concrelo passivel de ser encaixado na area de incerteza de um conceito juridico indeterminado, efetua essc enquadramento ¢ pratica 0 ato que a lei faz a ele corresponder, é vedado ao Poder Judiciério decidir que 0 x70 ADMINISTRATIVOS sis ato no deveria ter sido praticado. Se 0 fizesse, o Judiciério esteria emitindo Juizo de oportunidade ¢ conveniéncia administrativas, estaria adentrando 2 eafera de veloracao legitima do mérito administrative para substituir a atuagko discriciondria administrativa pela sua propria, ‘Tomemos um exemplo dessa espécie de discricionariedade, a fim de fac cilitar @ compreensto de seu funcionamento, A Lei 8.112/1990 estabelece que 1 demissao “serd aplicada” nos casos de “conduta escandalosa” na repartiga. A estrutura da norma, portant, segue o esquems: quando ““X” (autece- dente = motivo), entdo sera “Y" (consequeate = objeto), Note-se que, pela estrutura da norma, poder-se-ia pensar tratar-se de um ato vinculado, em razio do comando imperative (a demissio “sera aplicada”). Entretanto, como 0 motivo descrito na lei configura um con- ceito juridico indeterminado, a verdade € que, no caso concreto, quando a situapfo estiver enquedrada na “zona de indeterminacio” do conceito de “couduta escandalosa”, a administragio poderd decidir, discricionariamente, se enguadra ou nfo 2 conduta do servidor na norma legal, valorando a tuagao da forma mais adequade ao interesse piiblico, conforme o seu juizo de meérito administrativo. Se enquadrar, demitwa o servidor, se decidir que ¢ inoportuno ou inconveniente enquadrar, néio demitiré (considerard que 4 norma nao incidiu, que nfo houve subsunso entre o fito concreto © 0 conceito juridico indeterminado descrito na norma como motivo determi- ante da demissio). E claro que essa decisio da administracto, assim como qualquer atuagdo administrative, deve ser pautada pela estrita fnalidade de bem atender 20 interesse piblico © ser orieatada, ademais, por todos os outros principios juridicos pertinentes (moralidade, impessoalidade, razoabilidade, proporcio- nalidade, entre outros); cas0 contrério, seré ilegal ou ilegitima, passivel de anulagio, inclusive pelo Poder Judicidrio, Em sintese, segundo a corrente hoje dominante em nossa doutrina, existe discricionariedade: a) quando a lei expressamente dé & administraglo liberdade para atuar dentro de limites bem definidos; sto as hipéteses em que a prépria norms legal explicit, por exemplo, que a administaglo “poderé" pronogar determi- nado prazo por “até quinze dias", ou que 6 facultado 4 administragzo, “a seu citério", coneeder ou nfo wine determinada autorizagdo, ou que, no exercicio do poder disciplinar ou de policia administrative, o alo a ser praticado “paderd” ter como objeto (contedde) “esta ou aquela” sangio, assim por diante; ) quando s lei emprega conceitos juridicos indeterminedos na descrigso do motivo determinante da prética de um ato administrativo ©, no 350 concreto, « administraio se depars com uma situago em que no existe 516__OAREITOADMNSTRATWO RESCONPLICAO - Marl Aleendna & Vue Faia possibilidade de afirmar, com certeza, se 0 fato esté ou no abrangido pelo conteidio da norma; nessas situagbes, a administeapfo, conforme 0 seu juizo privativo de oportmidsde © conveniéncia administativas, tendo fem conta o interesse pOblico, decidiri se considera, ow nfo, que o fiio esté enquadrada no contetdo do conceito indeterminado empregado no antecedente da norma ¢, conforme essa decisio, praticard, ov nto, o ato previsto no respective consequente.’ Por fim, deve-se distinguir discricionariedade de arbitrariedade. A pri- meira implica existéncia de lei e pratica do ato dentro dos limites por ela impostos, ou dela decorrentes; a segunda significa prética de ato contrario lei, ou ndo previsto em lei. 5.2. Atos gerais e individuais Os atos administrativos gerais ceracterizam-se por nko posswir desti- natirios determinados. Apresentam apenas hipéteses normativas eplicdveis, a todas as pessoas ¢ situagGes fiticas que se enquadrem nessas hipdteses abstratamente neles descritss. Diz-se que tais atos possuem “generalidade ¢ abstracdo”, ou, ainda, que eles tm “normatividade” ~ razo pela qual so também ehiamadas de atos normativos. No aspecto material — isto & quanto a serem um conjunto de dis- posigées gerais ¢ abstratas ~ isis atos ndo diferem das leis, A diferenga existente, fora o aspecto formal (a lei provém dos érgéos legislatives do Poder Legislative € 0 alo administrative geral emana de Srgdo ou enti- dade da administracio plibiica), ¢ a possibilidade de inaugurar 0 dircito, de inovar 0 ordenamento juridico: as leis podem inovar o direito, isto é, stiar direitos © obrigagées, ou modificar ou extinguir direitos © obrigagbes 7 "Sistortands @ mesma linha que perthamos nesta obra. o Prof, Celso Anno Bande de Iolo e a Prot" Maria Sylvia Di Pievo feconheeerm que o emprego de cancelios Jurideas Indelerminsdos na descr legal do motivo que enseje a pric de um ato adminisatvo pode recut em cesrionariacace canta da um daterminaco caso conerot, quae OF fates ndo lonham como ser enquadiados, nem na zone de cefeza postva, nem na de cores negative do concoto, esulando em mais Ge une possivel stuseSo igualmonte legitma. A aminenie autora, enolate, alta que & grande @ cantoveria na douvin, esta passage, cuja vanscipao vem a caPar (destaque no otal: ‘No que dz respallo acs concallos judas indetenninedce, anda hi muita polénica, podendo-se fla ce dus grandes coentes: a dos que entendem que eles no confer ‘lecreionaiedade 6 Adminevac, porque, ats dees, a Adminicragso tem que fazer um ‘bale do intorpretagio que eve # Oca soluesa vida poseWel ea doa que enfendom ‘que les podem confer Gerionaiocade 8 Adminisagso, desde que se Vale de concaioe

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