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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS

ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS


MESTRADO EXECUTIVO EM GESTÃO EMPRESARIAL

COSMÉTICOS NATURAIS SOB A ÓTICA DA


SOCIALIZAÇÃO DO CONSUMO: O CONSUMIDOR
DE BELEZA DIANTE DESTA TENDÊNCIA DE
MERCADO

DISSERTAÇÃO APRESENTADA À ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO


PÚBLICA E DE EMPRESAS PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE

JÚLIA VALENCIANO ACHILLES


Rio de Janeiro – 2019
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS
ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS

JÚLIA VALENCIANO ACHILLES

COSMÉTICOS NATURAIS SOB A ÓTICA DA SOCIALIZAÇÃO DO


CONSUMO: O CONSUMIDOR DE BELEZA DIANTE DESTA
TENDÊNCIA DE MERCADO

Dissertação de Mestrado apresentada à Escola de


Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio
Vargas do Rio de Janeiro como requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre em Gestão Empresarial.

Orientadora: Prof.ª Dra. Marisol Goia

Rio de Janeiro
2019
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Ficha catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas/FGV

Achilles, Júlia Valenciano

Cosméticos naturais sob a ótica da socialização do consumo : o consumidor


de beleza diante desta tendência de mercado / Júlia Valenciano Achilles. – 2019.

75 f.

Dissertação (mestrado) - Escola Brasileira de Administração Pública e de


Empresas, Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa.
Orientador: Marisol Rodriguez Goia
Inclui bibliografia.

1. Cosméticos - Indústria. 2. Consumo (Economia) - Aspectos sociais. 3.


Redes sociais. 4. Consumidoras. I. Goia, Marisol Rodriguez. II. Escola Brasileira

de Administração Pública e de Empresas. Centro de Formação Acadêmica e

Pesquisa. III. Título.

CDD – 668.55
AGRADECIMENTOS

Ao longo dessa trajetória, sinto-me grata às pessoas que conheci, às amizades que cultiveis, às
experiências e aprendizados que tive, pois todos me fizeram evoluir.

Agradeço especialmente aos meus pais, Mauro e Maristela, que sempre me proporcionaram o
privilégio de estudar.

Ao meu parceiro de todas as horas, Alejandro, meu maior incentivador e companheiro nesses
dois anos de mestrado, fazendo os finais de semana de estudo mais fáceis e mais leves.

A todos meus amigos e família, pelo apoio e pela compreensão nos momentos de ausência.

À minha orientadora, Marisol Goia, pela dedicação, incentivo e contribuições valiosas. Por ter
despertado meu interesse pelo tema da dissertação e por ser uma inspiração constante.

Ao escritório de Relações Internacionais da EBAPE, que me proporcionou a oportunidade de


fazer um semestre de intercâmbio na Alemanha durante o curso, tornando a trajetória ainda
mais desafiadora e interessante.

Aos grandes mestres que tive a sorte de ser aluna, Prof. José Mauro Nunes, Prof. Arthur
Irigaray e Prof. Joaquim Rubens.

Aos colegas do MEX, que partilharam essa trajetória.


RESUMO

Objetivo – Esta pesquisa tem por propósito contribuir com a discussão sobre o processo de
socialização e de aprendizagem ligados ao consumo, analisando as práticas e os significados
associados ao consumo de cosméticos naturais, com ênfase na relação entre a socialização
online e offline.
Metodologia – A natureza da metodologia selecionada para esta pesquisa é qualitativa,
descritiva e exploratória, e construída com base em netnografia, observação-participante e
entrevistas semiestruturadas.
Resultados – A pesquisa resultou na construção de uma trajetória de 4 fases da consumidora
de cosméticos naturais. (1) “Despertar”, constituída pelos eventos que dão início ao consumo,
tais como gravidez, problemas de saúde, empoderamento e consumo consciente; (2)
“Aprendizado”, mapeou os conhecimentos necessários e os múltiplos agentes socializadores
online e offline envolvidos no processo; (3) “Testes e Uso”, diz respeito aos resultados e
mostram que os mesmos irão depender do ciclo de vida da mulher; (4) “Compartilhamento”,
demonstra que a mulheres compartilham os conhecimentos adquiridos criando uma rede que
fortalece esse tipo de consumo.
Limitações – Por se tratar de estudo exploratório a pesquisa abriu um leque de discussões a
serem aprofundadas e ficam como sugestão para futuras pesquisas, como o significado de
beleza para essas consumidoras e os efeitos do greenwashing neste mercado.
Contribuições práticas – Apesar de o Brasil possuir o quarto maior mercado de cosméticos
do mundo, a temática específica dos cosméticos naturais ainda é incipiente nos estudos
acadêmicos. A pesquisa mostra que a tendência de consumo de cosméticos naturais não é um
movimento puramente estético, estando atrelado a questões mais amplas, envolvendo
posicionamentos éticos e políticos.
Originalidade – A pesquisa amplia o conhecimento sobre a temática de cosméticos naturais,
criando e propondo uma trajetória capaz de caracterizar a especificidade desse tipo de
consumidor. A pesquisa também aborda temas pouco explorados academicamente nos estudos
sobre cultura e consumo, como a categoria do “Sagrado Feminino”.

Palavras-chave: Cosméticos Naturais, Socialização do Consumo, Redes Sociais, Agentes


Socializadores.
Categoria do artigo: Dissertação de Mestrado
ABSTRACT

Purpose – This research project aims to understand the consumption of natural cosmetics, the
process of socialization and learning, the practices and meanings involved in this
consumption and the integration of online and offline socialization.
Methodology – The nature of the methodology chosen for this research is qualitative,
descriptive and exploratory, based on the netnography, participant observation technique and
semi-structured interviews.
Findings – The research resulted in the construction of a consumer trajectory of natural
cosmetics, consisting of 4 phases. (1) “Awakening”, listed the events that trigger this
consumption, such as pregnancy, health problems, empowerment and conscious consumption;
(2) “Learning”, listed the necessary knowledge and the multiple online and offline socializing
agents involved in the process; (3) “Testing and Use” refers to the results and shows that they
will depend on the woman's life cycle; (4) “Sharing” demonstrates that women share the
knowledge gained by creating a network that strengthens adherence to this type of
consumption.
Research limitations – As it is an exploratory study, the research opened a wide range of
new discussions to be deepened, such as the meaning of beauty for these consumers and the
effects of greenwashing in this market.
Practical implications – Natural cosmetics still is incipient in academic studies, although
Brazil has the fourth largest cosmetics market in the world. Research shows that this trend
towards consuming natural cosmetics is not a purely aesthetic movement and is linked to
more complex issues such as ideology, ethics and politics.
Originality – The research expands the knowledge on the theme of natural cosmetics,
creating the trajectory of the consumer. The research also addresses topics little explored
academically, such as the category of "Sacred Feminine".
Keywords - Natural Cosmetics, Socialization of Consumption, Social Networks, Agents of
Socialization
Paper category: Master Dissertation
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 - Trajetória da consumidora de cosméticos naturais ................................................ 38


Figura 2 - Buscas no Google por tipo de cabelo .................................................................... 44
Figura 3 - Perfil Lola Cosmetics ........................................................................................... 45
Figura 4 - Lola Cosmetics – definições de conceitos ............................................................ 46
Figura 5 - Curly Wurly - Abaixo a ditadura dos cachos ........................................................ 46
Figura 6 - Dia Internacional da Mulher Negra ...................................................................... 47
Figura 7 - Somos Feministas ................................................................................................ 47
Figura 8 - Canal Bonita de Pele sobre Beleza Natural........................................................... 52
Figura 9 - Perfil A Naturalíssima – Beleza Limpa ................................................................ 53
Figura 10 - Perfil Nyle Ferrari – Greenwashing Unilever – Simple ....................................... 55
Figura 11 - Perfil Nyle Ferrari – Greenwashing Unilever - LBP ........................................... 56

Tabela 1 - Fase 1 e 2 - Perfis selecionados do Instagram ...................................................... 31


Tabela 2 - Fase 1 e 2 - Canais selecionados do YouTube ...................................................... 32
Tabela 3 - Lista de Palestrantes Feira Naturaltech ................................................................ 34
Tabela 4– Lista de entrevistadas ........................................................................................... 36
SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 10

1.1 OBJETIVOS ............................................................................................................ 11

1.2 RELEVÂNCIA DO TEMA..................................................................................... 12

2. CONTEXTUALIZAÇÃO .............................................................................................. 14

2.1. O MERCADO DE COSMÉTICOS NATURAIS ....................................................... 14

2.2 CONSUMIDORES DE COSMÉTICOS NATURAIS ................................................ 17

3. REFERENCIAL TEÓRICO ......................................................................................... 18

3.1 SOCIALIZAÇÃO NO CAMPO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS ..................................... 18

3.2 SOCIALIZAÇÃO DO CONSUMO............................................................................. 19

3.3 SOCIALIZAÇÃO DO CONSUMO DE BELEZA ...................................................... 21

3.4 A INTERNET E AS TRANSFORMAÇÕES NAS PRÁTICAS DE CONSUMO ...... 23

3.5 COSMÉTICOS NATURAIS E PRÁTICAS VIRTUAIS............................................ 24

4. METODOLOGIA .......................................................................................................... 27

4.1 COLETA DE DADOS.................................................................................................. 27


4.1.1 Netnografia .............................................................................................................. 28
4.1.2 Estudo de observador-participante ........................................................................... 33
4.1.3. Entrevistas Semiestruturadas ................................................................................... 34

4.2 ANÁLISE DOS DADOS .............................................................................................. 37

5. ANÁLISE DOS RESULTADOS ................................................................................... 39

5.1 TRAJETÓRIA DA CONSUMIDORA DE COSMÉTICOS NATURAIS .................. 39


5.1.1 Fase 1: Despertar - Eventos de transição importantes na vida da consumidora ......... 39
5.1.2 Fase 2: Aprendizado – saberes específicos e agentes socializadores ......................... 51
5.1.3 Fase 3: Teste e Uso – Percepção dos Resultados ...................................................... 59
5.1.4 Fase : Compartilhamento de informações - criação de uma rede............................... 63

6. CONCLUSÃO ................................................................................................................ 67

APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA .............................................................. 75


10

1. INTRODUÇÃO

O mercado de cosméticos no Brasil vem crescendo exponencialmente nas últimas


décadas, chegando a um faturamento expressivo de 30 bilhões de dólares em 2018, colocando
o país na 4º colocação do ranking mundial de maiores consumidores de beleza no mundo
(EUROMONITOR, 2018).
Segundo relatório da Nielsen (2018) sobre o mercado de beleza, três grandes tendências
neste mercado irão impactar o consumo para as próximas décadas: (1) preferência por
produtos mais naturais em detrimento dos produtos convencionais, (2) consumidores que
demandam produtos mais personalizados e (3) consumidores cada vez mais conectados.
Deve-se dizer que o “consumo natural” e preocupado com a sustentabilidade tem sido
observado como uma tendência global para diversos segmentos – alimentos, produtos
domésticos e também para produtos de beleza. A denominação de “consumo verde” tem sido
usada para se referir às escolhas dos consumidores que evitam produtos prejudiciais à saúde e
ao meio-ambiente (SINGHAL; MALIK, 2018).
A perspectiva de cultura e consumo entende que os fenômenos de consumo devem ser
entendidos dentro de sua dimensão coletiva - não devendo ser pensados de maneira puramente
individual ou desligados de seu contexto histórico e social (ROCHA, 1995). Assim, a
mudança pessoal para um consumo mais natural não deve ser vista como resultado de uma
“tomada de consciência” repentina de certos consumidores sobre sua própria saúde e ou sobre
o meio ambiente. Ela resulta de processos de socialização e aprendizagem específicos,
tratando-se, portanto, de um fenômeno sociocultural (BECKER, 2008; MOREIRA,
CASOTTI E CAMPOS, 2018).
Parte-se da ideia de que consumidores não nascem sabendo consumir, mas aprendem a
fazê-lo. No caso dos produtos de beleza, as consumidoras aprendem com outras mulheres,
com profissionais de beleza e saúde, com os próprios produtos, com a propaganda e com os
meios de informação, através de um longo processo de tentativa e erro (CASOTTI; SUAREZ;
CAMPOS, 2008).
Um mecanismo fundamental para este aprendizado, observado em estudos mais
recentes sobre o tema, é a Internet. Percebe-se uma grande proliferação de conteúdo de beleza
nas mídias sociais. A Internet apresenta-se como uma importante ferramenta de comunicação
para compartilhamento de informação e conhecimento acerca do consumo de beleza. Através
de redes sociais, blogs, reviews ou outras formas de comunicação digital, os consumidores
11

buscam essas ferramentas como forma de aprendizado e posterior compartilhamento das


técnicas e informações de consumo aprendidas (CHEN; XIE, 2008; MORAIS; PEREIRA;
QUINTÃO, 2019).
Este processo revelaria uma das formas como ocorre a socialização de indivíduos
adultos na contemporaneidade. Esta modalidade de socialização envolve as atividades do
consumidor relacionadas ao aprendizado de novos papéis e comportamentos (EKSTRÖM,
2006; MOREIRA; CASOTTI; CAMPOS, 2018). Dentro da perspectiva da socialização do
consumidor na vida adulta, há eventos importantes que podem alterar o comportamento do
consumidor, suas preferências e seus hábitos de consumo. Nesse sentido, é pertinente
entender os eventos de transição diversos que acontecem na vida desse tipo de consumidor
(MOCHIS, 2007; MOREIRA; CASOTTI; CAMPOS, 2018).
Assim, inserindo a compreensão da temática dos cosméticos naturais ao debate sobre o
processo de socialização no consumo, este trabalho busca, através de pesquisa qualitativa,
avançar sobre a questão da socialização do consumo de cosméticos naturais, indagando:
Como ocorre o processo de socialização do consumo de cosméticos naturais? Quais são as
práticas e os significados envolvidos nesse processo?
A partir da articulação com a literatura existente sobre o assunto, propõe-se abrir novos
percursos para o melhor entendimento do consumo de cosméticos naturais. A pesquisa
buscará avançar na discussão sobre o peso e o papel que as socializações online e offline
cumprem nesse cenário. Assim, acredita-se que ainda há uma dimensão a ser compreendida
sobre como se dá a relação entre os dois “mundos” (online e offline) na escolha de produtos
de beleza naturais: como se dão as continuidades e/ou descontinuidades entre a socialização
online e offline no consumo de cosméticos naturais?
Compartilha-se com Kozinets (2010) o entendimento de que vivemos atualmente em
uma matriz inter-relacionada de comportamentos sociais online e offline, o que torna
pertinente observar os dois tipos de interação.

1.1 OBJETIVOS

Tendo em vista a tendência de um consumo cada vez mais voltado para o “natural”
(NILSEN, 2018; SINGHAL; MALIK, 2018), o objetivo principal deste trabalho é entender, a
partir da ideia de “socialização do consumo” (MOREIRA; CASOTTI; CAMPOS, 2018), o
consumo de beleza a base de produtos naturais. O conceito de socialização surge como
central, pois parte-se da premissa de que todo consumo envolve um processo de
12

aprendizagem – desde as práticas mais tradicionais, transmitidas no âmbito comunitário, até


as mais modernas, mediadas por dispositivos tecnológicos.
O objetivo principal do trabalho é revisitar o tema “socialização do consumo” no
contexto de consumo de cosméticos naturais, buscando entender como os consumidores de
cosméticos naturais aprendem a consumir e quais são os agentes socializadores envolvidos
nesse processo. O trabalho buscará também entender as práticas e os significados envolvidos
neste consumo.
Toma-se como objeto de reflexão a tendência crescente ao consumo de cosméticos
naturais para aprofundar a compreensão sobre como se dá a integração da socialização online
à socialização offline. Trata-se de entender as continuidades e descontinuidades entre esses
dois “mundos”.

1.2 RELEVÂNCIA DO TEMA

Desde 2003 o consumo mundial de cosméticos1 cresce em média 2% ao ano,


alcançando um expressivo faturamento de 473 bilhões de dólares em 2018. As projeções do
setor aprontam que este crescimento deve manter-se para os próximos anos, chegando a um
faturamento de 526 bilhões de dólares em 2022 (EUROMONITOR, 2018). Neste cenário,
China2, Brasil e Índia se destacam pelo crescimento exponencial nas últimas décadas.
A respeito da importância do Brasil neste mercado, o país ocupa a 4ª colocação 3 no
ranking dos maiores consumidores de produtos de beleza no mundo, perdendo apenas para
EUA, China e Japão. O faturamento total do mercado brasileiro em 2018 foi de 30 bilhões de
dólares, o que representou um aumento de 2% contra o ano de 2017, crescimento acima da
economia do país.
Segundo a ABIHPEC (Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal e
Perfumaria), o crescimento de mercado está relacionado principalmente à participação
crescente da mulher no mercado de trabalho, aumento de expectativa de vida, lançamentos
constantes de produtos, uma cultura cada vez mais voltada à saúde e bem-estar e a

1
Dentro desta categoria a Euromonitor considera: produtos para bebês, sabonetes, coloração, desodorantes,
produtos para cabelo, fragrâncias, produtos para pele, produtos para barbearia e depilação.
2
A China com um crescimento médio de 8% ao ano triplicou o faturamento no setor desde 2003, saindo de 19
bilhões de dólares naquele ano e fechando o ano de 2018 com um faturamento de 62 bilhões de dólares. A China
continuará puxando o crescimento deste mercado nos próximos anos, chegando a um faturamento expressivo e
semelhante ao do maior mercado mundial, os Estados Unidos, nos próximos anos.
3
Apesar de assumir a quarta colocação do Ranking mundial, com 6% do share total das vendas, em algumas
categorias o Brasil atinge a segunda colocação – perdendo apenas para os EUA – são elas: Desodorantes,
Perfumes, Produtos Masculinos e Proteção Solar.
13

intensificação da participação dos homens no consumo de beleza (ABIHPEC, Panorama do


Setor, 2018).
Para reforçar a importância que o setor assume para os brasileiros pode-se citar a
pesquisa feita pela SPC Brasil (2016) com 790 homens e mulheres. Do total de respondentes,
65,7% concorda com a ideia de que cuidar de beleza não é “luxo”, mas uma “necessidade”. A
pesquisa aponta também que, em uma situação de crise, os brasileiros preferem cortar gastos
com atividades de lazer do que cortar gastos com beleza.
De acordo com o Estudo de Mercado de Cosméticos à base de Produtos Naturais (green
beauty), realizado pela Euromonitor, a categoria de cosméticos a base de produtos naturais
vem crescendo a nível mundial, em uma velocidade maior do que a dos cosméticos sintéticos
(EUROMONITOR, 2018). Cabe dizer, porém que, apesar desse crescimento, o setor de
cosméticos naturais é ainda bem menos pesquisado no meio acadêmico do que o de
cosméticos convencionais (MATIC; PUH, 2015).
Tendo em vista o fato de o Brasil ser um dos líderes mundiais do consumo de produtos
de beleza, fica evidenciada a importância de se entender e estudar as principais tendências
deste mercado.
14

2. CONTEXTUALIZAÇÃO

Este capítulo tem como objetivo fazer uma contextualização sobre o mercado de
cosméticos naturais, onde são colocadas algumas definições e delimitações da categoria,
tendências de consumo e considerações a respeito de como a indústria de cosméticos parece
estar se organizando para atender esta crescente demanda. As informações baseiam-se em
relatórios de grandes empresas de pesquisa de mercado, como a Euromonitor e Nielsen, que
produzem relatórios específicos sobre o segmento de cosméticos.

2.1. O MERCADO DE COSMÉTICOS NATURAIS

Uma das tendências que definem a indústria de beleza global é o crescente interesse dos
consumidores por produtos naturais, orgânicos e éticos – definidos, em um amplo espectro, de
“beleza verde” (green beauty) (EUROMONITOR, 2018). No entanto, a falta de uma
definição padronizada e globalmente aceita de tal categoria de beleza cria desafios tanto para
os consumidores quanto para os fabricantes.
Podemos dizer que o tema de cosméticos naturais é um terreno construído, disputado e
negociado por diferentes stakeholders, atuando na construção dos contornos desse mercado,
tanto em nível nacional quanto global. Dessa arena, participam diferentes grupos, como as
empresas certificadoras, as grandes empresas de bens de consumo, pequenas empresas de
nicho, laboratórios, dermatologistas, ativistas e influenciadores, entre outros, que atuam no
segmento.
Segundo Lyrio et al (2011) os “cosméticos naturais” são produtos elaborados com
ingredientes vegetais, sem conservantes artificiais e sem substâncias de origem animal, que
além de serem mais delicados com a pele e cabelos, estimulam a sua capacidade natural de se
recuperar. Além disso, os cosméticos naturais devem seguir processos de produção que
atendam a determinados padrões de sustentabilidade, contudo não existe no Brasil um
consenso entre os diferentes grupos atuantes no setor, sobre estes padrões.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) não possui uma
diretriz ou certificação para cosméticos naturais. Segundo Fonseca-Santos et al (2015) não há
um padrão global advindo de agências reguladoras ainda, e as certificações e diretrizes são
dadas por institutos privados que possuam critérios de avaliação internacionais.
O Instituto Biodinâmico de Certificações (IBD), para citar um exemplo, promove
certificações desse tipo de produto no Brasil. O Instituto faz diferenciação entre produtos
15

orgânicos e naturais. Para ser considerado orgânico, o produto deve ter 95% da formulação
composta por matérias-primas orgânicas, com certificado de extração ou matérias-primas que
sigam padrões rigorosos de produção, extração, purificação e processamento. Uma matéria-
prima orgânica é sempre considerada natural. Já um cosmético natural pode ser classificado
como tal se a formulação for composta de matérias-primas vegetais e minerais naturais,
certificadas ou não. O Instituto ressalta que uma matéria-prima natural não é necessariamente
orgânica (IBD, 2010).
Já a certificadora francesa ECOCERT, que também atua no Brasil, é mais rigorosa em
relação aos cosméticos naturais. Para ser classificado como tal, o produto necessita ter em sua
composição 95% de ingredientes naturais e, no mínimo, 50% dos ingredientes orgânicos. Para
o grupo ECOCERT, cosmético ecológico é sinônimo de cosmético orgânico (ECOCERT,
2009).
Na Europa foi criada pelas agências certificadoras uma consolidação de um
procedimento padrão de cosméticos orgânicos e naturais, chamado COSMOS-STANDARD.
Segundo o regulamento (COSMOS-STANDARD, 2019), para um cosmético ser considerado
orgânico deve ter pelo menos 95% de ingredientes orgânicos; para cosméticos naturais não há
exigência para usar um nível mínimo de ingredientes orgânicos.
Para Fonseca-Santos et al (2015), para que os produtos sejam categorizados por natural
ou orgânico, essas diretrizes e padrões estabelecidos pelos órgãos reguladores devem ser
seguidos, mas não há uma harmonização entre eles. Esses padrões são projetados para
estabelecer os processos de embalagem permitidos e propor uma extração sustentável e
processos permitidos.
Porém, tal como acontece com muitos outros setores, a qualidade “natural” também diz
respeito ao que não está no produto. Segundo estudo da Nielsen, 53% dos consumidores de
cosméticos naturais dizem que a ausência de ingredientes indesejáveis é mais importante do
que a inclusão do que ingredientes benéficos (NIELSEN, 2018). O estudo mostrou que a
ausência de determinados produtos como parabenos 4, sulfatos5 e fragrâncias artificiais é
fundamental para a decisão de compra do consumidor de cosméticos naturais.

4
Segundo o Conselho Internacional de Dermatologistas DermaClub os parabenos são conservantes utilizados
para proteger as formulações dos produtos da proliferação de fungos, bactérias e prolongar sua vida útil. Muito
presentes, ainda, na indústria cosmética, em itens para rosto, corpo e cabelo, essas substâncias podem
desencadear alergias, irritações e sensibilidade cutânea devido à ação antibacteriana e antifúngica, que a
substância possui. O acúmulo de parabenos no organismo, segundo estudos, também pode gerar doenças como
câncer de mama e de pele, melanoma e afetar a fertilidade.
5
Segundo o Conselho Internacional de Dermatologistas DermaClub o sulfato é introduzido nas formulações de
shampoos para agir como um detergente, ou seja, promover espuma e limpar profundamente. Assim, a
substância se liga nas partículas de sujeira presentes nos fios, sendo eliminadas com o enxágue. No entanto,
16

Em relação ao mercado de cosméticos naturais, no ranking global de marcas de beleza


com posicionamento verde, a maioria é de atores regionais. Segundo o relatório
(EUROMONITOR, 2018), os consumidores de cosméticos naturais tendem a dar preferência
para indústrias locais. Assim, desde 2013, marcas como a brasileira Natura, a chinesa Pechoin
e a coreana Innisfree, expandiram sua participação no mercado de beleza, beneficiando-se da
forte preferência do consumidor pela beleza natural em seus principais mercados
(EUROMONITOR, 2018). O relatório também destaca que além do sucesso doméstico,
muitas marcas viram uma rápida expansão internacional, como Weleda e Burt’s Bees. Estas
empresas mostram preocupação com a qualidade dos ingredientes e com toda a cadeia de
produção, para que seja sustentável do início ao fim, além de serem cruelty-free, não
praticando testes em animais.
Devido à crescente demanda de mercado, as grandes empresas de cosméticos
tradicionais, enfrentam uma pressão intensificada para se reposicionar. Por exemplo, a Procter
& Gamble anunciou o lançamento da sua primeira garrafa de shampoo feita de plástico
reciclável, apelando para uma base de consumidores ambientalmente consciente
(EUROMONITOR, 2018). Assim, podemos dizer que há um mercado dividido entre
indústrias “puras”, que são especializadas em cosméticos naturais, e as indústrias “mistas”,
que continuam a produzir em alta escala produtos tradicionais – com adição de produtos
químicos e cadeia de produção não sustentável - mas tentam diversificar e criar linhas de
produtos naturais específicas aproveitando desta nova demanda de mercado.
O relatório da Euromonitor (2018) alerta sobre os perigos deste fenômeno. “Natural”
seria um termo que vem sendo usado indiscriminadamente, mesmo para produtos que contêm
petroquímicos. O Shampoo Mineral Natural do Mar Morto, exemplo dado pelo relatório, é
um produto verdadeiramente natural, contendo apenas óleos e sais naturais originais do Mar
Morto, enquanto o shampoo Natural da TRESemmé6, embora baixo em sulfatos e com óleos
naturais de aloe vera e abacate, ainda contém vinte e cinco ingredientes químicos.
Esse relatório aponta, ainda, que diversas marcas estão reformulando produtos,
adicionando extratos de plantas e vitaminas para fazer alegações de sustentabilidade, o que é
apontado como Greenwashing. O fenômeno não é recente; desde meados da década de 1980,
o termo ganhou amplo reconhecimento para descrever a prática de empresas que fazem

grandes quantidades de sulfato podem danificar o cabelo, pois alteram o pH da fibra, deixando-o ressecado e
frágil.
6
TRESemmé é uma marca do grupo UNILEVER – a terceira maior indústria de bens de consumo do mundo
segundo relatório da Euromonitor (2019)
17

afirmações falsas ou exageradas de sustentabilidade, numa tentativa de ganhar participação no


mercado (GREER, 1997).

2.2 CONSUMIDORES DE COSMÉTICOS NATURAIS

Ao mapear os consumidores de beleza natural, a Euromonitor (2018) indica que o


interesse por este tipo de produto está presente em todas as faixas etárias, porém mostra-se
mais significativo entre mulheres jovens de regiões urbanas. O relatório destaca que o nível de
escolaridade tem um grande impacto sobre as preferências dos consumidores, o que sugere
que uma maior educação do consumidor é necessária para ajudá-lo a entender as alegações
científicas e os benefícios para a saúde de certos ingredientes.
Além de educação é necessário também informação e conhecimentos específicos para
discernir os malefícios e benefícios de determinados produtos. A geração Millennials seria um
mercado promissor, visto que é fortemente influenciada digitalmente e tem acesso desde
muito cedo à informação. Trata-se, também de uma geração mais inclinada a ser defensora da
justiça social, do comércio justo e do bem-estar animal, com crenças e decisões políticas que
se refletem em suas decisões de compra, tendendo a um consumo mais sustentável
(EUROMONITOR, 2018).
Com base nos dados desses relatórios, podemos notar a complexidade envolvida no
mercado de cosméticos naturais, no que se refere ao conjunto de informações e
conhecimentos necessários para que consumidores aprendam a consumir esse tipo de produto.
O consumidor precisa aprender, tanto sobre os produtos quanto sobre as práticas que são
adotadas por empresas. Também deve ser capaz de diferenciar um produto natural de um
produto sintético, no que se refere a seus efeitos para a saúde, a estética e o meio ambiente.
Tais conhecimentos, informações e saberes dependem de experiências e processos de
socialização e aprendizado a serem compreendidos, constituindo o objeto da presente
pesquisa. É preciso esclarecer que, o trabalho em questão irá tratar o uso de cosméticos
naturais de maneira abrangente, sem fazer distinção entre naturais, orgânicos ou veganos. Ao
tratar de cosméticos naturais e consumidores de cosméticos naturais, iremos abranger todo o
consumo que se dê por uma motivação ligada à categoria “natural”, seja ele orgânico ou não,
vegano ou não.
18

3. REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 SOCIALIZAÇÃO NO CAMPO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS

O conceito de socialização tem uma longa história nas ciências humanas. Durkheim
(1978) foi um dos primeiros autores a abordar o conceito na Sociologia, o autor parte do
princípio de que o indivíduo se tornou sociável, pois foi capaz de aprender hábitos e costumes
característicos de seu grupo social para poder conviver no meio deste. Podemos entender que
este processo de aprendizagem, Durkheim chamou de Socialização.
Pierre Bourdieu (1979) e a Teoria do habitus agregam grande contribuição nos estudos
dos processos de socialização. O conceito de habitus, que traduz a palavra grega hexis,
utilizada por Aristóteles para designar então características do corpo e da alma adquiridas em
um processo de aprendizagem (SETTON, 2002). A Teoria do Habitus é sistematizada por
Bourdieu como "sistemas de disposições duradouras e transponíveis, estruturas estruturadas
predispostas a funcionar como estruturas estruturantes, isto é, como princípios geradores e
organizadores de práticas e de representações" (BOURDIEU, 2007, p. 191).
Mauss (1974) mostra como a socialização está ligada a uma aprendizagem que envolve
os usos do corpo. Técnicas do corpo referem-se então aos modos pelos quais as pessoas
sabem servir-se de seus corpos de maneira tradicional, o que varia de uma sociedade a outra.
Assim há mecanismos de aprendizagem que estão relacionados à sociedade em que o corpo
está inserido.
Essa ideia também é desenvolvida por Hertz (1990), em relação a esse
condicionamento do corpo de acordo com a sociedade. Hertz parte do pressuposto de que a
explicação fisiológica sobre a predominância do uso da mão direita é incompleta,
demonstrando que a relação entre o sagrado e o profano é que determina o uso preferencial de
uma das mãos. Assim como Mauss, Hertz (1990) considera que o movimento corporal
humano corresponde a uma marca específica de uma organização social.
Thomas Luckmann e Peter Berger (1983) retomam e aprofundam as análises e
acrescentam uma distinção entre socialização primária, e socialização secundária. A
socialização primária aconteceria na infância, os saberes básicos incorporados pelas crianças
dependeriam não somente das relações entre a família e o universo escolar, mas de sua
própria relação com os adultos responsáveis pela socialização. Já a socialização secundária
ocorreria na vida adulta, e englobaria “saberes especializados”.
19

O avanço teórico das reflexões de Berger e Luckmann está no fato dos autores
atribuírem uma participação ativa do indivíduo nas instâncias socializadoras, conferindo a ele
maior autonomia e liberdade reflexiva. Neste cenário, o indivíduo é concebido como tendo
capacidade de dialogar, questionar e escolher um universo de relações, bem como os valores
que constituem esse universo diferente dos demais (SETTON, 2005).

3.2 SOCIALIZAÇÃO DO CONSUMO

Ward (1974) inaugurou os estudos de socialização do consumo, definindo a teoria de


socialização do consumidor como “processos pelos quais os jovens adquirirem as habilidades,
conhecimentos e atitudes relevantes para o seu funcionamento como consumidores no
mercado” (WARD, 1974, p. 2).
O artigo de Ward busca encontrar padrões de comportamento, estudando como as
crianças aprendem a consumir. O estudo sugere que a socialização é um processo de vida
permanente, sendo a juventude um período fundamental para que a aprendizagem ocorra e
sejam desenvolvidas importantes características de consumo que orientam a relação da pessoa
com o mercado até os estágios mais maduros da vida.
A temática desenvolvida por Ward (1974) tende a ser mais recorrente nas pesquisas na
área de socialização do consumo, porém, Ekström (2006) destaca que a ampliação do foco de
pesquisas que abordem outras fases de vida dos consumidores poderia estender o
entendimento da temática, uma vez que não caracteriza a socialização como um processo
finalizado na juventude, mas sim como um processo contínuo ao longo da vida. Nesse
sentido, a autora coloca a importância de se estudar a socialização de indivíduos adultos. Essa
modalidade de socialização foca nas atividades do consumidor relacionadas ao aprendizado
de novas competências, novos papéis e novos comportamentos após a fase adulta.
Um estudo interessante sobre o tema de aprendizagem é feito por Howard Becker na
década de 1960. No estudo Outsiders, o autor faz um estudo qualitativo sobre o consumo da
maconha por prazer. Após entrevistas com cinquenta usuários da droga o autor pontua que o
indivíduo só é capaz de usar maconha por prazer quando passa por um processo de
aprendizagem para concebê-la como um objeto que pode ser usado dessa maneira. Ninguém
se torna usuário sem (1) aprender a fumar a droga de uma maneira que produza efeitos reais,
(2) aprender a reconhecer os efeitos e associá-los ao uso da droga e (3) aprender a gostar das
sensações que percebe. Ao concluir esse processo, ele está desejoso e é capaz de usar
maconha por prazer. (BECKER, 2008).
20

Becker (2008) pontua também sobre a importância dos agentes socializadores, para
aprender a usar a droga da maneira correta, o indivíduo precisaria estar envolvido em grupos
no qual a maconha é utilizada. Ele pode aprender através do ensinamento direto ou por meios
mais indiretos de observação ou imitação. À medida que os usuários adquirem esse conjunto
de competências, eles se tornam connaisseurs, e assim se tornam consumidores que
participam ativamente de um determinado grupo.
Assim, a questão do aprendizado surge como central ao tema de socialização. Porém,
vale ressaltar que este fato encontra respaldo na constatação de que os estágios maduros do
ciclo de vida não estão apenas associados com as diferentes variáveis relacionadas aos
processos de aprendizagem, mas também com mudanças nos padrões de comportamento já
existentes.
Nesse sentido, a Perspectiva do Curso de Vida de Moschis (2007) parte da ideia que um
evento-gatilho de mudança pode desencadear no consumidor demandas físicas, sociais e
emocionais que geram processos de adaptação. Este modelo oferece uma lente teórica
multidisciplinar que nos ajuda a compreender como eventos de transição abruptos ou graduais
geram mudanças no comportamento do objeto de análise, seja ele um indivíduo, uma família
ou uma organização.
Os eventos de transição podem ter significados socioculturais positivos, relacionados a
conquistas, por exemplo, ou, ainda, negativos e estigmatizantes. Eventos como ingresso em
uma universidade, iniciação no mercado de trabalho, mudança de profissão, casamento ou
divórcio, filhos, doenças, dentre outros, são exemplos do contexto dinâmico no qual estamos
inseridos que podem desencadear demandas físicas, sociais e emocionais e também podem
criar e modificar a ideia de consumo, caracterizando a noção de aprendizado e ajuste
constante, seja consciente e intencional ou não.

O evento de transição pode ser influenciado pelas características, contextos e


experiências vividas pelo consumidor, pela ação dos agentes socializadores e pela
oferta de produtos e serviços acessados no mercado. O evento poderá provocar
também mudanças na estrutura do sistema de agentes socializadores e na oferta
acessível (MOREIRA; CASOTTI; CAMPOS, 2018, p.10).

A ideia de eventos de transição ou eventos gatilho parece relevante para estudar


mudanças no comportamento do consumidor. Ao buscar novas alternativas teóricas e
metodológicas para a socialização do consumidor na vida adulta, Moreira, Casotti e Campos
21

(2018) seguem a lente teórica da Consumer Culture Theory (CCT)7e buscam integrar
conceitos da Perspectiva de Curso de Vida e da ontologia social da Assemblage8 para
investigar a socialização do consumidor adulto.
Moreira, Casotti e Campos (2018), ao refletirem sobre a noção de socialização do
consumidor, dão destaque aos agentes socializadores (família, escola e trabalho), encontrando
trabalhos sobre as influências de outros agentes socializadores. As autoras propõem um
quadro teórico que reproduz uma teia constituída pelos seguintes agentes socializadores:
família, religião, pares, cultura de massa, propagandas, redes sociais, comunidades de marca e
mercado.
A grande contribuição da pesquisa seria a de ampliar nosso olhar para os múltiplos
agentes socializadores que formam uma rede de influência na vida de um consumidor. Além
disso, eventos de transição podem desencadear processos de revisão dos agentes
socializadores, alguns podem perder relevância para o consumidor, enquanto outros se
fortalecem.

3.3 SOCIALIZAÇÃO DO CONSUMO DE BELEZA

Casotti, Suarez e Campos (2008) evidenciam a afirmação de que o consumo de


cosméticos é um processo de aprendizado. As autoras, após uma intensa investigação in loco
da beleza feminina no ambiente doméstico, indicam como importante a questão da
observação, da aprendizagem com outras mulheres, com profissionais da beleza, propagandas
e diversos meios de comunicação, além das próprias tentativas e erros. Outro ponto ressaltado
é que o processo de aprendizagem do consumidor está em constante transformação devido às
mudanças no contexto social dos próprios consumidores, o que produz novas dinâmicas de
aprendizado e consumo.
Neste cenário o grande segmentador é o tempo – não somente idade, mas a percepção
das mulheres sobre a dimensão de tempo. Tempo que age sobre o corpo, deixando suas
marcas e tempo para cumprir suas tarefas do dia-a-dia. É a gestão das coisas a fazer, orientada

7
A lente teórica da CCT, proposta por Arnould e Thompson (2005), busca explicar a dinâmica do
relacionamento entre as ações dos consumidores, o mercado e os significados cultural, abordando aspectos
socioculturais, experienciais, simbólicos e ideológicos do consumo. Esses estudos, que privilegiam a
metodologia de pesquisa qualitativa, têm se dedicado à compreensão do consumo, das escolhas comportamentais
e das práticas sociais, todos enxergados como um fenômeno cultural, em oposição, à visão predominantemente
positivista (MORAIS E QUINTÃO, 2016).
8
Moreira, Casotti e Campos ideia básica da Assemblage de Delanda (2006), a qual reside em uma associação
entre elementos heterogêneos, incluindo humanos e não humanos, que interagem entre si e podem se acoplar ou
desacoplar.
22

pelos diversos papéis sociais que a mulher equilibra em cada uma das etapas de seu ciclo de
vida (CASOTTI; SUAREZ; CAMPOS, 2008).
As autoras sugerem quatro momentos de vida das consumidoras de beleza pesquisadas:

 O momento é agora: composto por jovens, financeiramente dependentes de seus pais.


O foco das jovens deste grupo está no presente e na aparência natural. Elas estão ainda
conhecendo suas necessidades e dedicam menos tempo com cuidados com a beleza
pela não percepção dos efeitos do tempo sob seu corpo. O pensamento é imediatista e
consumo é tutelado pelas mães;
 O tempo existe: composto por mulheres com responsabilidades sociais, mas sem
filhos. Começam a sentir os efeitos do tempo sobre seu corpo. Caracterizam-se por
intensa experimentação, vivem um processo importante de aprendizado;
 O tempo não para: composto por mulheres que praticam múltiplos papéis: mãe,
esposa, profissional, dona de casa. Elas lutam contra o envelhecimento. Consumo
consciente e objetivo. Influenciadas por especialistas.
 Cada coisa em seu tempo: composto por mulheres com filhos criados e com rotinas
de trabalho menos intensas. Prevenção como palavra de ordem. Sofisticação e
diversificação dos gestos de cuidados pessoais e de beleza.

Através do estudo de Casotti, Suarez e Campos (2008), percebe-se que há uma


intensificação dos cuidados de acordo com o ciclo de vida e que tratar da beleza é lidar com o
envelhecimento. Cada consumidora, em seu ciclo de vida, vai adquirindo habilidades e
conhecimentos em relação ao uso dos produtos, aprendendo a reconhecer o que lhe faz bem
ou o que é mais apropriado, refinando e sofisticando o seu uso através do tempo.
Neste sentido, o tempo-cronológico sugere acúmulo de conhecimento de acordo com a
idade da mulher. Consumidoras mais experientes são comparadas as profissionais do
segmento, evidenciando que as etapas de vida estão intimamente ligadas a novas etapas de
aprendizagem e conhecimento. Assim, o ciclo de vida se manifesta no consumo de cosméticos
conforme sugerido sobre a socialização na vida adulta por Moreira, Casotti e Campos (2018).
Tal como o consumo de cosméticos convencionais, a tendência em direção a produtos
mais naturais precisa ser pensada à luz da dimensão sociocultural, já que envolve
aprendizagem, socialização e varia segundo demandas de ciclos de vida. A esse respeito, uma
consideração sobre a relação das mulheres com o tempo segue sendo pertinente para entender
23

o recurso aos cosméticos naturais. Entretanto, a pesquisa não contemplou o que hoje vem
representando um importante agente socializador dessas práticas, a Internet.

3.4 A INTERNET E AS TRANSFORMAÇÕES NAS PRÁTICAS DE CONSUMO

De acordo com a SPC Brasil (2016), as três principais fontes em que as pessoas mais
pesquisam e buscam informações sobre produtos e serviços relacionados à beleza são amigos
e familiares (46,8%), seguidos por sites especializados (42,7%) e redes sociais (22,1%). Ou
seja, mais de 60% das pesquisas e buscas realizadas são provenientes do ambiente digital 9.
Nesse contexto, tendências digitais, principalmente mídias sociais, tendem a amplificar
a demanda por produtos naturais. A tecnologia capacita os consumidores a acessar as
informações dos ingredientes instantaneamente no momento da compra, o que pressiona o
segmento a ser transparente com relação a seus ingredientes e processos ecológicos
(EUROMONITOR, 2016).
De acordo com Belk (1998), os indivíduos têm vivido uma mudança forte de
paradigma na forma de se comunicarem, saindo do mundo offline em direção ao online, onde
as mensagens realizadas via internet se tornam cada vez mais acessíveis a todas as pessoas,
em todos os lugares e num intervalo de tempo cada vez mais reduzido.
Neste cenário é válido entender a comunicação utilizando o Eletronic Word of Mouth
(E- WoM) que tem sido cada vez mais difundida através das redes sociais e tem atraído a
atenção dos pesquisadores de marketing. O conceito pode ser definido como uma
comunicação informal de pessoa a pessoa, envolvendo um comunicador não comercial, sendo
recebida por um receptor em relação a uma marca, produto, empresa ou serviço
(HARRISON-WALKER, 2001).
No caso de beleza, essa comunicação E-WoM torna-se importante de ser entendida,
visto que é um fenômeno crescente. Segundo Kulmala (2011), as redes sociais tornaram-se
fontes credíveis de informação sobre produtos e tendências no campo da moda e beleza, sendo
que cada vez mais as mulheres recorrem a eles para se inspirarem e conhecerem novos
produtos e tendências.
Além disso, Chen e Xie (2008) colocam que as informações de produtos online criadas
pelos consumidores são consideradas um novo canal de comunicação E-WoM de extrema

9
Precisamos considerar que estes dados podem se relacionar, ex: as pessoas contatam amigos e familiares pelas
redes sociais para pesquisar e procurar informações sobre beleza .
24

importância. Estas informações assumem cada vez mais importância nas decisões de compra,
tendo por isso influência na venda de produtos. Os consumidores consultam as reviews de
outros consumidores para obterem mais informação sobre os produtos nos quais têm interesse
e assim decidir sobre a compra.

3.5 COSMÉTICOS NATURAIS E PRÁTICAS VIRTUAIS

Sobre cosméticos naturais percebe-se no Brasil uma tendência de estudos voltados


para as práticas do-it-yourself. No DIY consumidores transformam matéria-prima em produto
final - no caso de cosméticos são usados óleos vegetais, argila, vinagre entre outros para a
criação de cosméticos para pele ou cabelo. Na prática de DIY o consumidor se torna também
produtor. Um termo cunhado para explicar este movimento é o Prossumerismo (Prosumption
- Productive Consumption), o qual pode ser definido como a atividade de consumo de criação
de valor que envolve as entradas de dinheiro, tempo, esforço e habilidades dos consumidores
para produzir o que consomem (XIE; BAGOZZI; TROYE, 2008).
Morais, Pereira e Quintão (2019), colocam que para consumidores produtores, a
Internet é uma plataforma importante para obter informações, desenvolver, fazer,
compartilhar e divulgar seus produtos e práticas, levantando um caminho interessante para o
pensamento de consumos de cosméticos, no qual o conhecimento está intimamente conectado
a mecanismos digitais.
Assim, o Prossumerismo com a ajuda de tecnologia e mídias sociais permite a
divulgação dos produtos e práticas. Nesta estrutura paralela, sem regulamentação
governamental ou apoio institucional padrão, os consumidores de cosméticos caseiros DIY
desenvolvem diferentes tipos de produtos e divulgam entre os usuários e seguidores de
determinado grupo os produtos (MORAIS; PEREIRA; QUINTÃO, 2019).
Os autores se referem ao papel participativo dos consumidores na transformação do
mercado de beleza, analisando um fenômeno emergente em que os consumidores fabricam
produtos cosméticos naturais através da técnica DIY compartilhando conhecimentos pela
Internet. Podemos fazer uma correlação com as ideias de Vargo e Lusch (2004), que apontam
a emergência de uma nova lógica, cuja ênfase está no serviço, a dizer, aspectos intangíveis,
como habilidades, informação e conhecimento e na interatividade e conectividade dos
relacionamentos envolvidos no processo de compra. Esta nova lógica baseada em serviço
poderia vir a substituir o modelo tradicional, no qual o foco está no produto.
25

Dentre as Premissas Fundacionais da Lógica Dominante do Serviço está a premissa


que o conhecimento é a fonte fundamental da vantagem competitiva. O saber (conhecimento)
configura um recurso intangível. Nesse contexto, os produtos cosméticos naturais apresentam
embutido um valor intangível acerca do seu uso, representando valores associados a um
determinado estilo de vida, voltado para o sustentável e saudável. Os consumidores são
responsáveis e ativos na transformação do mercado (MORAIS; PEREIRA; QUINTÃO,
2019). O conhecimento acerca do uso destes cosméticos torna-se um recurso fundamental no
consumo. Assim, a aprendizagem há também de configurar-se como tal, e o processo torna-se
ainda mais difundido a partir de um novo agente socializador, a Internet.
Pode-se dizer que Morais, Pereira e Quintão (2019) avançam ao posicionar o papel
que hoje cumpre a Internet na produção e compartilhamento de informação sobre o consumo
de cosméticos naturais. Embora o artigo não se volte para a temática teórica da socialização
do consumidor, é possível enunciar a articulação entre essas discussões indicando o quanto a
Internet constitui, hoje, um importante agente socializador para o consumo de cosméticos
naturais. Isto porque a Internet não apenas reestrutura os moldes tradicionais de aprendizagem
e de troca de saberes, como também propicia a formação de novos “detentores dos
conhecimentos” sobre essas práticas, com impacto no comportamento de seus “seguidores”.
Levanta-se um pressuposto de que haveria uma vontade de “voltar ao natural”.
Percebe-se, nos discursos coletados pelos autores, a presença de falas como “voltar a utilizar
ingredientes básicos”, “confiar em práticas antigas” e “usar alquimia de ancestrais”,
acreditando que estas práticas teriam um benefício maior para a saúde e também para o meio-
ambiente, provocando um bem-estar em seu uso (MORAIS; PEREIRA; QUINTÃO, 2019).
Ainda sobre cosméticos DYI, Duarte, Casotti e Moreira (2019) reconstroem a
trajetória de Carolina Cronemberger, consumidora-produtora, desde seu início nas práticas de
do-it-yourself. A pesquisa também coloca a Internet como um facilitador para que o
consumidor possa adquirir conhecimentos específicos para o engajamento da produção de
cosméticos, constituindo- se uma pré-condição na construção de competências para as
práticas de DIY.
Além disso, a pesquisa de Duarte, Casotti e Moreira (2019) amplia o conhecimento
sobre as motivações desta prática, incluindo que ideologia e ativismo social pode ser uma
forte motivação para o DIY. O ativismo demonstrado por Carolina Cronemberger não se
restringe às críticas às indústrias de cosméticos e seus produtos, tem grande preocupação
também com sustentabilidade e uma prática anticonsumista.
26

A pesquisa inclui também os dilemas de Carolina Cronemberger - de Prossumidora


ativista a Empreendedora Integrada, a empresária defende uma política menos consumista e
ao mesmo tempo precisar vender seus produtos. Porém, a consumidora-produtora continua
seu trabalho não só focada em produzir, mas também semear conhecimento sobre o assunto e
difundi-lo para amigos, clientes e pessoas com menos acesso a informação. Um exemplo
disso é o trabalho voluntário que a empresária realiza com mulheres de baixa renda
(DUARTE; CASOTTI; MOREIRA, 2019).
Assim, conhecimento e informação aparecem nas pesquisas como o principal ativo
presente neste consumo colaborativo, sendo que a Internet seria o principal meio de
propagação deste conhecimento neste segmento emergente no consumo de beleza natural.
Além disso, surgem questões importantes como o desejo de voltar a praticar técnicas
milenares, além do ativismo e anticonsumismo envolvido, que tem relação com a negação aos
lucros projetados por grandes corporações de cosméticos.
Apesar da pesquisa em curso tratar de cosméticos naturais como um todo, não
especificamente DIY, os resultados de estudos de DYI nos mostram possíveis caminhos para
o entendimento do tema. No seguinte capítulo será abordada a metodologia utilizada para a
condução da pesquisa.
27

4. METODOLOGIA

Este capítulo irá apresentar o método de pesquisa adotado e a seleção dos instrumentos
de coleta de dados utilizados por essa pesquisa.
A abordagem metodológica partiu da análise bibliográfica e propôs o uso de
metodologia de pesquisa qualitativa. Tal modalidade de pesquisa caracteriza-se por não ser
estruturada e ter um caráter exploratório (MALHOTRA, 2012). Na pesquisa qualitativa a
preocupação do pesquisador não é com a representatividade numérica do grupo pesquisado,
mas com o aprofundamento da compreensão de um grupo social (GOLDENBERG, 2001).
O objetivo da pesquisa é compreender o consumo de cosméticos naturais, sob a ótica da
socialização do consumo, entendendo os processos de aprendizagem envolvidos, os agentes
socializadores presentes neste contexto, os significados envolvidos neste consumo e as
continuidades e descontinuidades dos mundos online e offline que permeiam esta
socialização. Assim, entende-se que um estudo qualitativo poderá alcançar um mapeamento
dessa trajetória de maneira mais satisfatória, visto que o estudo qualitativo visa capturar o
significado dos eventos na vida dos indivíduos, apresentando suas visões e perspectivas,
abrangendo as condições contextuais (CRESWELL, 2007; YIN, 2010;).
Quanto à epistemologia, a pesquisa tem caráter interpretativista. Pesquisadores
interpretativistas sup em que a realidade só pode ser apreciada através de construções sociais,
tais como símbolos e significados compartilhados. Assim, a pesquisa interpretativa concentra-
se na complexidade do ser humano e dos fenômenos sociais na busca do entendimento dentro
de um determinado contexto (TAKAHASHI, 2013).
Sobre cosméticos naturais, os dados encontrados na pesquisa irão mostrar que o
consumidor possui uma história a ser contada. O consumo não é racional, ou puramente
estético, há diversos fatores sociais, ideológicos e até mesmo políticos envolvidos no
consumo de cosméticos naturais, exigindo que a pesquisa tenha este caráter interpretativista.
A pesquisa tem ainda um caráter descritivo, pois pretende descrever as características de
uma população ou fenômeno (ROMERO; NASCIMENTO, 2002). No caso, descrever o
processo de socialização e aprendizado no uso de cosméticos naturais, bem como seus
significados.

4.1 COLETA DE DADOS

A pesquisa contou com técnicas múltiplas de coletas de dados. Segundo Yin (2010) a
pesquisa qualitativa procura coletar, integrar e apresentar dados de diversas fontes de
28

evidências como parte do estudo. A variedade é uma consequência de se estudar eventos da


vida real e seus participantes. A complexidade do ambiente de campo e a diversidade de seus
participantes justificam que as conclusões da pesquisa tendem a se basear na triangulação dos
dados de diversas fontes. Essa convergência dá credibilidade e confiança ao estudo.
Nesse sentido, os dados foram coletas por meio de netnografia, observação participante
e entrevistas em profundida, tendo-se feito uma triangulação do material obtido nessas três
frentes de trabalho durante a realização das análises.
As etapas da coleta de dados foram as seguintes:

Fase 1 – Seleção e definição dos perfis de Instagram e canais do YouTube a serem


monitorados durante o estudo (janeiro 2019)
Fase 2 - Observação do ambiente virtual sem participação ativa do pesquisador (Janeiro a
Junho/2019)
Fase 3 – Ida a Feira Naturaltech que ocorre em São Paulo, um evento importante do
segmento de cosméticos naturais, divulgado pelas comunidades seguidas (junho/2019)
Fase 4 - Participação ativa da pesquisadora nas comunidades virtuais, com inserção de
perguntas nas caixas de diálogo e estabelecimento de relações virtuais (junho/2019)
Fase 5 – Entrevistas semiestruturadas na casa das entrevistadas (junho e julho/2019) e
entrevistas conduzidas por Skype (agosto a outubro/2019)

4.1.1 Netnografia

Com relação à primeira forma de coleta, devido à grande disseminação de conteúdo de


beleza e cosméticos naturais nas redes sociais digitais, o uso da netnografia, ou etnografia10
online pareceu adequado à busca de um entendimento deste consumidor. Investigações
anteriores sobre cosméticos naturais consideraram a netnografia adequada devido ao fato de
que consumidores de beleza, especialmente mulheres, estão muito presentes no ambiente
virtual e são muito ativas nas comunidades online das quais fazem parte (MORAIS;
PEREIRA; QUINTÃO, 2019).
O ambiente virtual deve ser compreendido como um ambiente de pesquisa empírica
adequado para acessar as representações do mundo real conforme ele é experimentado pelos

10
A etnografia, herdada da tradição antropológica, consiste na observação e análise de grupos humanos
considerados em sua particularidade e visando a reconstituição, tão fiel quanto possível, da vida de cada um
deles, (YIN,2010). Envolve um estudo de campo suficientemente extenso para revelar normas, rituais e rotinas
cotidianas em profundidade.
29

sujeitos da pesquisa. A netnografia se preocupa com as relações construídas de forma natural


nas comunidades online, através de postagens que podem variar com comentários,
publicações ou simplesmente símbolos (ROSS; CASTRONOVA; WAGNER, 2012).
Segundo Kozinets (2014), na netnografia, interações online são consideradas reflexos
culturais que proveem profundo entendimento sobre a humanidade. Assim como a etnografia
presencial, a netnografia é naturalista, imersiva, descritiva, multi-métodos, adaptável e focada
no contexto. A pesquisa netnográfica engloba as seguintes etapas: (1) planejamento de
pesquisa, (2) entrada cultural, (3) coleta de dados, (4) interpretação, (5) asseguramento de
padrões éticos e (6) apresentação da pesquisa.
De acordo com Relatório do Google (2018) 11, 80% das consumidoras são influenciadas
a partir do ambiente digital12, se informando sobre o produto que pretendem consumir online.
Os canais mais importantes para as consumidoras que pesquisam informações de cosméticos
são YouTube e Instagram. De acordo com a pesquisa, 6 a cada 10 clientes utilizam essas
plataformas para buscar conteúdo relacionados à beleza. Segundo este mesmo relatório, o
Facebook tem perdido importância e tem sido menos procurado que o Instagram.
Devido a estes dados a pesquisa netnográfica concentrou-se no YouTube e Instagram.
Foram selecionados 4 canais do YouTube e 12 perfis do Instagram, conforme apresentado
abaixo. Foram escolhidos perfis que divulgam conteúdo sobre cosméticos naturais e também
sobre rotina de beleza. O critério de escolha desses grupos foi o número de membros ou
seguidores – foram considerados canais com mais de 10 mil seguidores para o Instagram e
mais de 1 mil seguidores para o YouTube.
Importante pontuar que a pesquisa focou em canais e perfis de digital influencers,
pois o interesse da pesquisa, centrado no processo de aprendizagem e socialização, é observar
as interações entre consumidores e influenciadores digitais através do E-WoW. Porém,
algumas exceções foram consideradas, marcas de cosméticos naturais com muitas interações
positivas sem ser puramente marketing de produtos e com conteúdo explicativo foram
também pesquisadas, como por exemplo, o perfil da “Lola Cosmetics”, uma marca que foca
em cabelos cacheados, crespos e ondulados e tem ganhado bastante relevância de mercado
pelo posicionamento da marca que foca em campanhas de marketing sobre empoderamento
feminino.

11
Relatório especial Google Beauty Trends - 2018
12
Google Consumer Survey -Você acredita que as informações que você recebe pela internet (Busca no Google,
YouTube, Facebook, Instagram, site de notícias e de marcas) influenciam a sua compra de produtos de beleza?
30

Outra exceção foi o canal “Bonita de Pele”, o qual não é exclusivo de cosméticos
naturais, porém é um dos canais mais relevantes do segmento de beleza e é totalmente
dedicado a ensinar o público sobre cosméticos para a pele, sendo divulgado conteúdo de
beleza, incluindo alguns posts e vídeos exclusivos de cosméticos naturais, com a criação de
conteúdo colaborativo feito em parceria com digitais influencers especialistas do assunto, o
que pareceu válido para a pesquisa. Foram escolhidos apenas perfis de brasileiros.
No primeiro momento, conforme sugerido por Kozinets (2002) realizou-se um
acompanhamento das postagens dos grupos para a familiarização com o tema de cosméticos
naturais e para a entrada cultural. Nessa fase, foi feita a observação das postagens e observado
qual tipo gerava mais comentários e interações.
Em seguida foram analisadas as postagens que se dedicam a falar sobre o processo de
aprendizagem acerca do uso de produtos naturais, e também significados de consumo dos
mesmos. Observou-se que postagens que falavam de maneira geral sobre o uso de cosméticos
naturais, bem como os malefícios de determinados produtos químicos tendiam a ter mais
interações com o público do que postagens muito específicas sobre um produto ou outro.
A netnografia revelou-se fundamental para a pesquisa, pois foi possível acompanhar e
conhecer, por meio das interações geradas pelas postagens, quais são as principais questões
que motivam e inquietam o consumidor de cosméticos naturais, assim como acessar as
informaç es e os conhecimentos fundamentais para o aprendizado desta “nova” forma de
consumo.
Ademais, essa fase foi crucial dentro do processo exploratório da pesquisa,
interferindo no curso dela. No ambiente virtual foi possível obter informações relevantes
acerca de eventos relacionados a cosméticos naturais, como a feira Naturaltech, maior feira de
produtos naturais da América Latina, à qual a pesquisadora teve a oportunidade de
comparecer. A feira, além de se mostrar um campo valioso para a pesquisa permitiu a
interação com pessoas do meio, que em um momento posterior foram convidadas a
participarem da última fase de entrevistas.
As tabelas a seguir irão mostrar os perfis selecionados para a pesquisas nas redes
sociais Instagram e YouTube.
31

Tabela 1 - Fase 1 e 2 - perfis selecionados do Instagram

Perfil @ Descrição Seguidores


carioca dagema, vegana, cruelty
free; manja dos paranauê de cabelo,
Lola Cosmetics lolacosmetics 822 mil
corpo and make; toda natural bonita
para caramba
aprendendo, investigando e
Bonita de pele bonitadepele compartilhando diferentes rotinas 205 mil
de beleza
Andre Ferraz
andreferrariaromaterapia Serviço de aromaterapia 71,2 mil
aromaterapia
wellness curator, cuidados e rituais,
Marcela
anaturalissima slow beauty, consumo consciente, 38 mil
Rodrigues
holistic living
YouTuber, GreenBlogger,
Karina Viega karinaviega Aromaterapeuta, Consultoria & 32 mil
Curadoria de beleza natural
Care Natural Skincare First, Clean Beauty,
carenaturalbeauty 30,1 mil
Beauty Natural, Organic, Cruelty Free

veganismo, beleza natural,


Nyle Ferrari nyleferrari autocuidado, autora do Livro Beleza 25 mil
Natuarl por dentro e por fora

Dermagreen dermagreen Dermatologia Natural 23 mil


O cosmético para você que não tem
Le Fruit tempo a perder! Natural, vegana,
lefruitcosmetic 19,4 mil
Cosmetics cruelty-free, prática e rituais de
beleza
O cuidado da pele de maneira
Dr. Anna peleeaura 18 mil
interativa, Dermatologia Natural
Carol Cosmoetica, Consiciência, DIY,
carol.cronemberger 12 mil
Cronemberger Ativismo, Sustentabilidade

Eco Beauty by Sua pele naturalmente linda.


ecobeautybyflaviaprado 11,5 mil
Flavia Prado Maquiagem aqui é opcional

Fonte: elaborado pelo autor


32

Tabela 2 - Fase 1 e 2 - canais selecionados do YouTube

Canal Administrador Descrição Seguidores


Canal do blog Acorda, Bonita! por
Karina Viega. Slow Beauty,
Cosméticos Naturais, Lifestyle, 65.775
Karina Viega Karina Viega
Cabelos, Maquiagem, Moda, inscritos
Cultura e afins: Para quem quer
conteúdo!

92 mil
Bonita de pele Jana Rosa Sem informações
inscritos

Canal do blog -
www.anaturalíssima.com.br - sobre
beleza natural, autocuidado e estilo
de vida consciente. 1.5 mil
Marcela Rodrigues
A Naturalíssima Quem faz // Marcela Rodrigues é inscritos
jornalista, curadora de bem-estar,
herbalista e aromaterapeuta em
formação.

No Canal da Bela, você encontra


dicas sobre alimentação, receitas
deliciosas e saudáveis e conteúdos
sobre um estilo de vida sustentável.
Canal da Bela Bela Gil 386 mil
O objetivo é ensinar sobre uma
rotina mais saudável, através de
informações, conselhos e
questionamentos.

Fonte: elaborado pelo autor

Durante esse primeiro momento, a pesquisadora observou todas as postagens e como a


própria ferramenta permite, foi salvando e “favoritando” as postagens que geravam o maior
número de interações entre os seguidores dentro da própria plataforma.
Após a feira, a interação nas redes sociais começou de forma ativa. Não só através de
comentários públicos, mas também através de direct, ferramenta do Instagram em que é
possível enviar mensagens privadas. O Instagram também apresentou uma ferramenta
bastante útil, o IGVT, que permite a exibição de vídeos mais longos na rede.
33

A pesquisadora passou a interagir com as influencers e também com alguns de seus


seguidores. Para as influencers foram enviadas mensagens privadas dizendo que
acompanhava seu trabalho e a intenção foi esclarecer dúvidas em relação a determinado tema
da pesquisa e manter contato para posteriores fases. A receptividade das influencers foi baixa,
pouco índice de retorno, com respostas padrão, principalmente das que têm maior número de
seguidores.
Em relação aos seguidores, observaram-se aqueles que mantinham altas interações e
que mantinham seus perfis abertos. Assim, ao avaliar um perfil relevante era mantido contato,
devido à alta receptividade, alguns dos contatos evoluíram para entrevistas.

4.1.2 Estudo de observador-participante

A Feira Naturaltech, é a maior feira de produtos naturais realizada na América Latina.


A feira aconteceu de 5 a 8 de Junho de 2019 no Anhembi, em São Paulo, contou com 672
empresas expositoras e 44.140 visitantes, entre lojistas, compradores, profissionais de saúde,
profissionais do setor e consumidor final, nos quatro dias. A pesquisadora compareceu ao
evento durante 3 dias – 6,7 e 8 de Junho, permanecendo no local durante todo o período do
evento das 10h as 20h. Totalizando 30 horas de observação-participante.
Na feira pôde-se encontrar exposição em stands variados os seguintes produtos:
alimentos funcionais, probióticos e integrais, alimentos vegetarianos, produtos veganos,
fitoterápicos, suplementos, linhas diet e light, mel e derivados, cosméticos naturais, óleos
essenciais e velas, nutrição esportiva e estética, tratamentos complementares e equipamentos.
A feira destina-se a quem deseja conhecer os lançamentos do setor, fazer contatos e
também é para iniciantes do segmento que desejam aprender e conhecer melhor este universo.
Neste sentido, a feira conta com palestras de profissionais e entusiastas da área. Os
especialistas escolhidos para falar na feira revelam quem o campo considera que tem
influência nesse setor. Muitos dos influenciadores digitais presentes na feira já estavam sendo
previamente observados na pesquisa netnográfica, o que indica certo nicho social específico
no Brasil, um nicho que inclui pessoas e marcas específicas em relação aos detentores de
saberes de cosméticos naturais,
Foi possível observar, durante três dias, as palestras de cosméticos naturais com
criadores de conteúdo online, empreendedoras do segmento e profissionais da área; foi
possível observar não só o conteúdo, mas também a interação entre plateia e palestrantes. A
34

feira permitiu também a observação in loco das usuárias de cosméticos naturais nos stands
das marcas e a interação com consumidores, produtores e entusiastas no assunto. Além de
estabelecer contato com algumas palestrantes e consumidoras presentes, me apresentando
como pesquisadora do tema. Durante a feira foi feito um diário de campo.
Abaixo uma breve descrição das mulheres que participaram das palestras na qual a
pesquisadora esteve presente. Seus depoimentos e insights serão utilizados na análise de
resultados através da indicação de Palestrante pelo número identificado.

Tabela 3 - Lista de Palestrantes Feira Naturaltech

Palestrante Palestrante Profissão

Palestrante 1 Maria Cláudia Ponte CEO Weleda do Brasil

Palestrante 2 Marcela Rodrigues digital influencer @anaturalissima


digital influencer Blog Acorda, Bonita
Palestrante 3 Karina Viega - @karinaviega

Palestrante 4 Soraia Zonta Empresária - Bioart Biocosmectics

Palestrante 5 Luciana Navarro Vieira Empresária - CARE Natural Beauty

Palestrante 6 Nyle Ferrari Digital Influencer @nyleferrari

Palestrante 7 Dr. Patricia Silveira Dermatologista - Dermagreen


Fonte: elaborado pelo autor

Vale ressaltar que todas as palestrantes de conteúdos de cosméticos eram mulheres. A


plateia também era composta majoritariamente de mulheres, no salão das palestras, podia ser
encontrado um número relativamente baixo de homens, evidenciando que o interesse pelo
assunto de cosméticos naturais é predominantemente feminino.

4.1.3. Entrevistas Semiestruturadas

Segundo May (2004), as entrevistas geram compreensões ricas das biografias,


experiências, opiniões, valores, atitudes e sentimentos das pessoas. As entrevistas
semiestruturadas permitem que as pessoas respondam usando mais os seus próprios termos do
que as entrevistas padronizadas, mas ainda forneçam uma estrutura maior de comparabilidade
do que nas entrevistas focalizadas (MAY, 2004).
35

As entrevistas foram conduzidas com 8 mulheres, consumidores heavy users da


categoria de cosméticos naturais. Utilizou-se como critério para considerar heavy user que a
rotina de cuidados de beleza envolvesse, em sua maior parte, cosméticos naturais nas
diferentes categorias, como cabelo, pele e corpo, e por um tempo de utilização maior do que
seis meses. Consumidoras que alegaram consumir apenas uma categoria de produto foram
desconsideradas, assim como aquelas que estavam iniciando o uso de cosméticos naturais ou
que apenas tinham interesse pelo tema sem ser efetivamente serem usuárias.
A duas primeiras entrevistadas foram resultado de interações durante a feira
Naturaltech. Como já relatado, durante a feira a pesquisadora se apresentou a algumas das
palestrantes e consumidoras, e foi assim criada uma ponte para futuro contato. O contato foi
estabelecido por Instagram, através da ferramenta do Direct, perguntando sobre a
possibilidade de entrevista. As respostas positivas evoluíram para conversas de Whatsapp e
resultaram no agendamento das entrevistas.
A partir dessas primeiras entrevistas, foi utilizada a técnica da bola de neve, na qual os
primeiros entrevistados indicam pessoas a serem entrevistados a seguir (MAY, 2004). O
processo continuou até a pesquisadora estar convencida de que os dados eram suficientes para
o propósito do estudo.
Embora não tenha sido estabelecido um critério prévio diferenciando homens e
mulheres consumidores de cosméticos naturais, foram indicadas, em sua maioria, mulheres
para as entrevistas. A pesquisadora teve a indicação de apenas um homem, o qual não
demonstrou interesse em participar da pesquisa, alegando que ele não se considerava usuário
de cosméticos naturais, apenas não usava mais cosméticos convencionais, e alegando não ter
rotina ou preocupações específica, utilizando apenas água em alguns casos para sua higiene
pessoal.
Essa fase também mostrou como o assunto mostra uma prevalência do gênero feminino
em relação à temática de cosméticos. As análises dos resultados irão mostrar que a questão da
feminilidade é central ao assunto. Assim, na análise dos resultados o consumidor será
definido com do gênero feminino, sendo referenciados como consumidora.
Durante a condução das entrevistas, foi utilizado um gravador com consentimento das
entrevistadas. A princípio entendeu-se que o melhor local para realização das entrevistas seja
na casa das consumidoras, visto que neste ambiente haverá acesso aos seus itens de beleza e
será possível mostrá-los caso haja necessidade ou queiram fazê-lo, similar à técnica utilizada
por Casotti, Suarez e Campos (2008) que fazem a uma intensa investigação in loco da beleza
feminina no ambiente doméstico. As entrevistas pessoais duraram em média 45 minutos.
36

As quatro primeiras foram realizadas pessoalmente, porém, devido a questões


logísticas, as quatro seguintes foram realizadas por Skype. A pesquisadora percebeu que o
processo de agendar as entrevistas por Skype foi mais simples e a receptividade a entrevista
for maior à aquelas que era proposto a entrevista em suas casas. As entrevistas por Skype
duraram em média 35 minutos. Todas as entrevistas foram transcritas.
Abaixo, encontra-se o perfil das entrevistadas, com seus nomes preservados e indicados
por números.

Tabela 4– Lista de entrevistadas

Entrevistada Idade Estado civil Profissão Onde mora


Solteira, sem Publicitária, gerente de projetos
Entrevistada 1 22 anos Copacabana, RJ
filhos na empresa Rastro
Casada, sem Digital Influencer - viagens e
Entrevistada 2 32 anos Santiago, Chile
filhos food styling
Solteira, sem Estudante engenharia química
Entrevistada 3 24 anos Grajaú, RJ
filhos na UFRJ
Solteira, sem
Entrevistada 4 25 anos Freelancer de moda Laranjeiras, RJ
filhos
Solteira, sem
Entrevistada 5 31 anos Fotógrafa Tijuca, RJ
filhos
Solteira, sem
Entrevistada 6 41 anos Empresária Botafogo, RJ
filhos
Solteira, sem
Entrevistada 7 37 anos Terapeuta holística Laranjeiras, RJ
filhos
solteira,
Vila Olímpia,
Entrevistada 8 34 anos grávida de seu Gerente de Marketing
SP
primeiro filho
Fonte: elaborado pelo autor

O roteiro das entrevistas encontra-se nos apêndices. Como será possível notar, as
perguntas que nortearam as entrevistas buscam entender os seguintes aspectos, relacionados
aos objetivos e discutidos no referencial teórico:

 Aprendizado: Entender onde e como os consumidores de cosméticos naturais


aprendem a consumir. O processo de socialização do consumo, as competências
necessárias - “o quê” é aprendido, o que as consumidoras precisam saber para
37

tornarem-se usuárias frequentes de cosméticos naturais, quais são as informações que


precisam deter - e os papéis sociais envolvidos.

 Agentes socializadores: verificar quais são os principais agentes influenciadores


responsáveis pelo processo de socialização do consumo de cosméticos naturais
(família, amigos, médicos, Internet, redes sociais entre outras). Este ponto também
será importante para entender as continuidades e descontinuidades entre os universos
online e offline. Entender se as interações no âmbito da rede mais próxima de
socialização, como as que se estabelecem com mães, irmãs, amigas e profissionais
deixam de ter relevância frente ao mundo digital.

 Eventos de transição: Verificar se há eventos abruptos ou graduais que ocorrem ao


longo da vida que possam ser significativos para que tenha havido uma mudança no
padrão de comportamento do consumidor de cosméticos tradicionais para cosméticos
naturais.

 Motivações e significados: entender as principais motivações do consumo de


cosméticos naturais e os significados envolvidos neste consumo.

4.2 ANÁLISE DOS DADOS

Após a coleta dos dados, foi realizada a análise dos mesmos, utilizando-se a técnica de
análise de conteúdo.
Na análise de conteúdo, o pesquisador busca compreender as características, estruturas
ou modelos que estão por trás dos fragmentos do material levado em consideração. O esforço
do pesquisador é, então, duplo: entender o sentido da comunicação e, principalmente, buscar
ou propor um eixo mais abrangente capaz de unir o sentido das mensagens coletadas
(CRESWELL, 2003, GODOY, 2015).
Bardin (2006) destaca que os procedimentos de codificação e categorização dos
resultados possibilitam interpretações e as inferências. Através desses procedimentos, o
pesquisador organiza suas análises, obtendo também, maior clareza sobre os seus achados
(KOZINETS, 2002).
A análise de conteúdo aqui realizada, baseada nos materiais coletados na netnografia,
observação-participante e entrevistas consistiu na criação de 4 categorias de análises,
38

referentes à trajetória da consumidora de cosméticos naturais, as quais são: 1) O Despertar,


que consiste nos eventos de transição importantes pelos quais a consumidora passa e que
ressignificam seu consumo; 2) O Aprendizado – fase na qual buscam informações; 3)Teste e
Uso – período de adaptação e que irá revelar se a consumidora se manterá neste nicho 4)
Compartilhamento de Informações – após bons resultados, as informações são
compartilhadas.

Figura 1- Trajetória da consumidora de cosméticos naturais

Fonte: elaborado pelo autor


39

5. ANÁLISE DOS RESULTADOS

5.1 TRAJETÓRIA DA CONSUMIDORA DE COSMÉTICOS NATURAIS

Após os dados coletados mostrarem-se bastante vastos, a pesquisadora buscou criar


uma forma de entender e apresentar esse rico material na análise dos resultados. Assim,
norteada por perguntas sobre socialização, aprendizagem, motivações foi construída uma
trajetória em 4 passos da consumidora de cosméticos naturais.
Importante ressaltar que essa trajetória não é uma síntese descrita pelas informantes
dos passos de seu consumo ou de como elas se tornaram consumidoras de cosméticos
naturais, esta trajetória consiste em uma forma criativa de apresentação dos resultados, de
forma que cada fase possa responder as questões de pesquisa apresentadas.
A trajetória seria então uma maneira de mostrar os resultados em conjunto, além de
mostrar uma sequência de eventos que dependem do tempo e que transcorrem nele. Cada fase
da trajetória criada está enumerada abaixo e serão explicadas ao longo do capítulo.

Fase 1 - Despertar – evento de transição


Fase 2 - Aprendizado – saberes específicos e agentes socializadores
Fase 3 - Teste e uso – percepção de resultados
Fase 4 - Compartilhamento – criação de uma rede

5.1.1 Fase 1: Despertar - Eventos de transição importantes na vida da consumidora

A primeira fase identificada nesta pesquisa foi chamada de “Despertar”. Foi utilizada a
palavra “despertar” devido à utilização da mesma por algumas consumidoras ao relatar uma
fase inicial de “revelação” do universo dos cosméticos naturais. Trata-se de um momento de
vida em que a mulher, diante de uma determinada situação, esperada ou não, reconstrói suas
práticas de consumo.
Assim como indicam os estudos sobre a socialização do consumidor na idade adulta
(MOREIRA, CASOTTI E CAMPOS, 2018) a pesquisa identificou a existência de eventos de
transição importantes - abruptos ou graduais - que afetam a consumidora e desencadeiam
mudanças e adaptações em seu modo de vida e em seus papéis sociais.
40

Notou-se que os eventos do ciclo de vida que comp em a fase do “Despertar” - tais
como gravidez, doenças, empoderamento e ressignificação do feminino e consumo consciente
- têm efeitos importantes para a construção da trajetória da consumidora de cosméticos
naturais.

 Gravidez

O que foi observado neste estudo em relação à gravidez diz respeito à preocupação
com cosméticos que possam prejudicar o bebê durante a gestação e o período de
amamentação. Algumas das mulheres pesquisadas teriam passado a ter uma preocupação mais
latente em relação a sua própria saúde, por estar em jogo a saúde também do filho. Essas
mulheres entendem que cosméticos são produtos que entram na corrente sanguínea e,
portanto, entram em contato com o bebê. Da mesma forma como se preocupam com aquilo
que ingerem, essas mulheres evitam determinados produtos químicos presentes em
cosméticos, tais como chumbo, parabenos, petrolatos entre outros.
Há uma constante alegação das gestantes de que é difícil encontrar informações
específicas sobre ingredientes maléficos presentes em cosméticos. Durante a Feira
Naturaltech a palestra sobre Cosméticos e Gravidez, uma das mais procuradas pelo público,
foi proferida por Maria Cláudia Pontes, CEO da Marca Weleda, especialista em cosméticos
naturais e com linha própria para gestantes, e por Soraia Zonta, empresária da BioArt
Cosméticos.
A primeira a falar, narrou sua gravidez aos 40 anos, quando foi mãe do primeiro filho.

Eu nunca fui uma pessoa muito saudável, eu era workaholic total, comia mal, estava
sempre estressada. Até descobrir uma gravidez aos 40 anos. Isso mudou tudo!
Parece que acendeu uma luz! Comecei a pensar no que eu podia fazer para fazer
daquela gestação a mais tranquila possível. Então primeiro pensei na alimentação e
depois em tudo aquilo que podia me prejudicar. E a nossa pele é o maior órgão do
corpo. Então o que eu passo nela deveria mudar também. Fui mudando aos poucos.
Parei de pintar e alisar o cabelo, de usar esmaltes. Acho que esse é o jeito mais fácil,
ir substituindo, tem que ser algo progressivo. Você aos poucos vai se conectando
consigo mesma e entendo quais concessões é capaz de fazer. Palestrante 1 – Feira
Naturaltech

O relato mostra que para ela o início ao universo dos cosméticos naturais aconteceu
durante a gravidez, e começou de maneira progressiva, a princípio ela deixou de usar alguns
produtos de que fazia uso e considerava quimicamente pesados, como esmaltes, tinturas,
41

alisamentos, e aos poucos, foi entrando neste universo, passando a trocar seus cosméticos
sintéticos por cosméticos naturais.
Os seguintes relatos abaixo evidenciam que a gravidez mostra-se para a mulher como
um período de ressignificação do consumo. Mesmo mulheres que já adotavam um estilo de
vida mais saudável, ou já consumiam produtos naturais, dizem ter ficado mais “radicais”
durante a gravidez.
“Eu já era bem cuidadosa com a minha alimentação, mas quando descobri que
estava grávida tudo se intensificou, não tirava da cabeça a ideia de um bebê
orgânico. Então fui bem radical durante a gravidez. Não só com a alimentação, com
tudo o que eu usava! A gravidez trouxe novas necessidades de cuidados com o
corpo. Daí eu fui procurar alternativas 100% naturais. Depois disso nunca mais
parei. Hoje ainda uso a maioria dos produtos que usava na gravidez”. Palestrante 4
– Feira Naturaltech

Minha gravidez está apenas no comecinho, mas já digo que vou ser bem radical.
Quero uma gravidez limpa! E depois que nascer eu quero que minha filha desde
pequena tenha essa consciência que eu só fui ter depois de velha. Será maravilhoso
poder ensiná-la Entrevistada 8

Segundo Andreasen (1984), o período da gravidez constitui um dos momentos do


ciclo de vida familiar em que ocorrem mudanças mais significativas nos padrões de consumo.
Os estudos relacionados às mudanças de consumo desencadeadas por esse ciclo de vida levam
em consideração o novo comportamento da mulher como consumidora, assumindo o papel
social de mãe.
Um estudo conduzido por Faria et al (2012) com 72 mulheres grávidas de seus
primeiros filho, sustentou que a prioridade da mulher nesta fase são as necessidades do bebê,
que passam a ser mais importantes do que as necessidades da mãe. Além disso, as mulheres
tendem, nesta fase, a se preocupar mais com questões relacionadas à saúde e à
sustentabilidade.

 Problemas de Saúde

Problemas de saúde também se apresentaram como um evento de transição


importante. Desde alergias de pele até problemas mais graves, como o câncer, foram eventos
encontrados durante a coleta de dados, como motivadores de uma mudança nas práticas de
cuidados pessoais.
Os problemas de saúde configuram-se como um evento negativo/stress que
desbalanceiam a vida do individuo, fazendo com que seja preciso criar estratégias para lidar
com a situação, o que pode alterar seus padrões de consumo (MOCHIS, 2007).
42

A Palestrante C emocionou-se ao contar sobre o seu problema de saúde, um câncer,


que a deixou bastante sensível durante o processo de quimioterapia. Afirmou ter encontrado
nos cosméticos naturais uma alternativa para conseguir sentir-se bonita e bem cuidada durante
o tratamento. Mesmo após a cura, ela teria continuado o uso dos cosméticos naturais, e devido
ao bom resultado e à escassez de produtos no mercado naquele momento, decidiu abrir uma
marca de cosméticos naturais.

Durante a quimioterapia minha pele ficou super sensível, eu não podia usar nada que
me fazia mal. Tive que abrir mão de tudo que gostava. Aí busquei alternativas e
encontrei os cosméticos naturais e tive tudo de volta. Foi por isso que decidi abrir a
marca, para compartilhar com o mundo algo tão bom”. Palestrante C – Feira
Naturaltech

Importante frisar que durante as entrevistas, as mulheres tinham dificuldades para falar
dos problemas de saúde, já que apenas depois de se sentirem confortáveis, aprofundavam
sobre o que anteriormente mencionavam como “problemas pessoais” que as levaram a
repensar seu consumo.
A Entrevistada 7 nunca havia se interessado por nenhuma forma de consumo natural,
até ter um problema psicológico que a afetou. Os cosméticos teriam se apresentado como uma
forma de tratamento alternativo.

Tive Síndrome do Pânico e tive que me cuidar, me entender, como me


socorrer...descobri nas terapias holísticas uma forma de manter o equilíbrio. E uma
das minhas frentes foi a cosmetologia. Fiz um curso de equilíbrio dos chacras, e
nesse curso eu descobri que uma forma de você controlar o seu corpo, sua energia e
seu emocional é através dos óleos essenciais, que também podem ser usados na
forma de cosméticos. Entrevistada 7

A Entrevistada 8 também nunca havia consumido nenhum produto natural, até que
tivesse um problema de acne na idade adulta que a deixou deprimida. Os produtos naturais
teriam surgido como tratamento alternativo aos consolidados pela medicina tradicional.

Nunca tinha tido uma espinha na minha vida toda, nunca tive que me preocupar com
a minha pele. Depois de velha comecei a ter a tal acne da mulher adulta, devido a
um descontrole hormonal, e é a pior forma de acne que você pode imaginar! O meu
dermatologista recomendava mil pomadas, nada adiantava! Estava deprimida, não
conseguia me olhar no espelho, cheguei a deixar de ir trabalhar alguns dias,
inventava um desculpa, não queria sair. Aí comecei a ver vários vídeos na Internet
de meninas que trataram a acne com produtos naturais. Comprei tudo, fiquei
alucinada. Minha pele foi melhorando gradualmente. Depois disso me converti aos
cosméticos naturais. Entrevistada 8
43

 Empoderamento e feminilidade

Alguns eventos de transição identificados, dizem respeito ao despertar da mulher para


uma quebra de paradigmas no que diz respeito a seus corpos e à sua liberdade de se
desassociar de padrões estéticos. A questão do empoderamento e da feminilidade apareceu ao
se falar sobre dois assuntos principais que serão aqui denominados de “transição capilar” e
“sagrado feminino”.

Transição capilar

A chamada “transição capilar” consiste no processo de transformação da forma dos


cabelos, em deixar de alisar ou pintar os fios por meio de processos químicos para deixá-los
retomar a sua forma natural, comumente crespo, cacheado ou ondulado, e de cor castanha ou
preta. A transição capilar remete não apenas a uma questão estética, mas também a uma
reconstrução ou aceitação da identidade feminina.
Sabino (2010) em seu estudo em academias de ginástica no Rio de Janeiro observou o
comportamento dos homens e mulheres e suas percepções em relação aos cabelos. O autor
coloca que é “o cabelo é utilizado publicamente para comunicar uma variedade de sentidos
sociais e pode estar diretamente relacionado às demarcações e às internas delimitações
hierárquicas das sociedades complexas” (SABINO, 2010, p. 116).
Os cabelos representariam um reflexo na dimensão da cultura de uma lógica de poder
colonizadora. O autor discute como cabelo loiro e preferencialmente longo e liso
historicamente no Brasil significou status, sedução, civilidade, refinamento, poder, ou seja, é
uma referência de sucesso e influência em alguns contextos (SABINO, 2010).
Assim, ter os cabelos longos, lisos e loiros representaria uma superioridade hierárquica
em relação a outros determinados tipos de cabelo, refletindo como relações de poder se
materializam em uma hierarquia social do cabelo. Porém, nos últimos anos, o fortalecimento
do empoderamento feminino tem se tornado cada vez mais evidente e isso tem se refletido no
comportamento das mulheres em relação a aceitar os seus cabelos “naturais”.
A transição capilar tem sido alvo de estudos, principalmente com mulheres negras, que
percebem a mudança de cabelo como um ato político de assumir uma identidade e uma
representatividade subjugada historicamente (ROCHA;SCHOTT;CASOTTI, 2016). Os
estudos sugerem que, para essas mulheres, voltar a ter cabelo “natural” é um sinônimo de
empoderamento e liberdade de escolha.
44

Cabe dizer que, em 2017, a busca por “cabelos cacheados” no Google cresceu 232%
em relação a 2016 e superou a busca por “cabelos lisos”. Juntamente com isso, “transição
capilar” tem sido um tema cada vez mais buscado no Brasil (Relatório Google, 2017). A
questão não é só voltar ao natural, mas principalmente afirmar a identidade negra e
afrodescendente, livre de padrões impostos pela sociedade, com a força de símbolo do amor
próprio.

Figura 2 - Gráfico de buscas por tipo de cabelo

Fonte: Relatório Google - A Revolução dos Cachos

Podemos dizer que estaríamos diante de um fenômeno em que a mulher afirma sua
identidade através do cabelo, retornando aos cabelos naturais, sem alisamento e descolorações
agressivas. Assumir os cabelos naturais seria um movimento que exige força, cumplicidade e
muita troca, pois “quando a natureza das pessoas é transformada em motivo de vergonha e
preconceito, abraçá-la se torna um ato político” (RELATÓRIO GOOGLE, 2017, p 3).
Podemos notar que a transição capilar para algumas mulheres está intimamente ligada
ao uso de cosméticos naturais. Há evidências que mostram que durante o processo de
transição, as mulheres que antes estavam dependentes do uso de substâncias químicas fortes
para alisar os cabelos, demandam por alternativas mais naturais possíveis.
Uma das alternativas mais citadas é a técnica No- Poo ou Low Poo, técnica na qual se
utiliza pouco ou nenhum produto para lavagem dos cabelos. Os shampoos, se utilizados, são
substituídos por produtos com pouca química, especialmente sem sulfatos e parabenos.
Abaixo o depoimento da Entrevistada 2 sobre como a transição capilar trouxe para sua vida a
aderência aos cosméticos naturais.
45

Em 2017 fiz transição capilar e parei de usar shampoo e condicionador. Meu cabelo
era grande, loiro, alisado, descolorido, aí cortei curtinho. Eu gostava muito do meu
cabelo comprido, mas não era um cabelo saudável. Quando eu cortei já ficou
melhor, e finalmente percebi como era meu cabelo natural. E desde então, parece
que todo dia me apaixono cada vez mais pelo cabelo. Aí eu falo que bom que eu fiz
isso tudo, que bom que eu entrei nessa. Eventualmente faço essas receitas naturais.
Eu tenho meu pé de babosa, aí faço um shampoo para lavar às vezes.. Entrevistada
2

Há outro grupo de mulheres que optam pelo uso de cosméticos naturais durante essa
fase. O perfil da marca Lola Cosmetics no Instagram foi observado com essa finalidade.
Desde 2011 no mercado, a marca carioca se especializou em atender os anseios e
necessidades deste público que está em processo de transição capilar ou que já cuida de seus
cabelos naturais, sejam eles cacheados, ondulados ou crespos. Exemplos significativos de
produtos que a marca oferece para este público são a linha “Creoula”, “Meu Cacho Minha
Vida”, “Curly Wurly - Abaixo a ditadura dos lisos”, “Milagre Diet” (linha específica para
quem está em transição capilar) e “Eu sei o que você fez na química passada”, para cabelos
danificados por processos químicos.
A marca Lola Cosmetics orgulha-se de ser natural, cruelty free e vegana. Essas
informações são exibidas nas redes sociais da marca, assim como conteúdo informativo a
respeito de cosméticos a base de produtos naturais, mantendo uma forte relação com as
consumidoras da marca, que são chamadas pela empresa de “Loletes”.

Figura 3 - Perfil Lola Cosmetics

Fonte: Instagram
46

Figura 4 - Lola Cosmetics – definições de conceitos

Fonte: Instagram

Algumas das seguidoras e consumidoras da marca afirmam que conheceram os


produtos no momento da transição capilar e, desde então, se sentiram ainda mais
empoderadas.

Figura 5 - Curly Wurly - Abaixo a ditadura dos cachos

Fonte: Instagram

Testei todos já que sou apaixonada por cada produtinho que vocês fazem. Eu uso
Lola desde que resolvi fazer a transição usei milagre Diet, Creoula (a linha toda), a
linha meu cacho minha vida,e só tenho a agradecer por todos esses produtos
maravilindos que vcs lançam pra nos empoderar mais! @annyinacio comentário
Instagram

A comunicação de empoderamento está fortemente presente no conteúdo da marca, os


post abaixo ilustram esse ponto.
47

Figura 6 - Dia Internacional da Mulher Negra

Fonte: Instagram

Figura 7 - Somos Feministas

Fonte: Instagram

Além disso, a marca preocupa-se com representatividade e também aborda


frequentemente o feminismo e a quebra de padrões estéticos impostos socialmente, o que gera
interaç es positivas com as seguidoras e um número de “curtidas” ainda mais expressivo do
que quando trata de posts apenas sobre produtos. Evidencia-se que empoderamento é um tema
de interesse conectado ao setor de cosméticos naturais.
Vale dizer que apesar de muito se falar sobre os formatos do cabelo, a transição capilar
também diz respeito à cor natural dos fios. Em alguns casos, os cabelos brancos podem
aparecer como forma de manifestação desta identidade capilar. Na feira Naturaltech foi
possível notar algumas mulheres de cabelos naturais, brancos, platinados e bem cuidados. A
48

questão do cabelo branco parece surgir em alguns fóruns ainda mais seletivos, como algo
recente. Essa tendência não seria só para mulheres mais velhas, mas também para mulheres
jovens que começaram a ter cabelos brancos prematuramente e passaram a depender de
tinturas para esconder os fios brancos. Apesar de o cabelo branco significar liberdade em
relação a tinturas, cabe dizer que os cabelos brancos também são vistos como merecedores de
cuidados específicos.
Esta questão apareceu na feira sob a observação da pesquisadora, porém teve pouca
incidência nas redes sociais seguidas e também nas entrevistas. Ademais, parece ser ainda um
tema pouco desbravado pela indústria de cosméticos e pela academia.

O Sagrado Feminino

Os demais relatos em relação ao empoderamento feminino estão ligados ao que


podemos caracterizar como Sagrado Feminino, que remete à maior consideração ou mesmo
“respeito” das mulheres pelos aspectos naturais da fisiologia feminina, especialmente os
ciclos de menstruação e gestação.
O Sagrado Feminino vem sendo apresentado como uma filosofia mística que promove
ensinamentos sobre aspectos físicos e mentais da figura feminina (CORDOVIL, 2015). Busca
entender os ciclos naturais femininos como o da menstruação, da gestação e a própria força
da mulher. Para se reconectar com o seu sagrado e dividir experiências, as mulheres
participam de um círculo de mulheres praticando rituais e danças, estudam o calendário lunar
e buscam nas Deusas, momentos para pedir e agradecer. O foco principal de quem participa
desses grupos é buscar entender que “as mulheres são muito mais do que foram doutrinadas a
ser” (CORDOVIL, 2015).
Pode-se pensar no Sagrado Feminino como uma categoria criada na
contemporaneidade, realizando uma espécie de bricolagem (LÉVI-STRAUSSS, 1970) de
misturas de “pensamentos mágicos”, como forma de dar ordem a uma dada visão de mundo
Essa “colcha de retalhos”, é tecida com aspectos retirados de diferentes tradiç es espirituais,
tempos e culturas, como cultura camponesa da Europa medieval, orientalismos diversos
(cosmologia hindu, medicina ayurvédica, yoga), civilizações antigas (Roma, Grécia), noção
de inconsciente coletivo da psicanálise junguiana, culturas indígenas e religiões, entre outros.
Em todo caso, esta percepção sobre o Sagrado Feminino foi um insight que apareceu
ao longo das entrevistas. Abaixo o depoimento da Entrevistada 4 ilustra a situação:
49

Depois de certa idade comecei a pensar em tantas regras que a sociedade coloca para
nosso corpo. Eu sempre vi a menstruação como algo ruim. Depois de ler muito sobre
o assunto, decidi respeitar o meu ciclo, me entender como mulher. Decidi trocar de
absorventes normais para o coletor, comecei a fazer a mandala lunar. E foi muito
bom. Depois disso comecei a me interessar por cosméticos naturais, procurar coisas
que não fossem ruins para mim. Entrevistada 5

Nota-se que a utilização de cosméticos naturais se insere em um contexto mais amplo


de práticas “alternativas” ou “holísticas”, tais como a “mandala lunar”, que ensina as
mulheres a relacionarem o seu ciclo menstrual com o ciclo lunar. As praticantes colocam que
a mandala é uma jornada de autoconhecimento, pois a mulher passa a aprender que o caráter
cíclico de seu próprio corpo está vinculado aos ciclos naturais, e começa a se conectar com
eles. Nesse processo ocorreria um “despertar” para uma vida mais natural. Esta alegação está
presente também no depoimento da Entrevistada 6.

Precisamos entender que somos cíclicas, ninguém ensina isso para a gente, mas
depois que a gente aprende é maravilhoso se conhecer. E isso tem a ver com o que a
gente usa, não adianta esperar milagre... nossa pele obedece nossos ciclos, quando
estamos de TPM nossa pele envelhece, é a fase Anciã. Depois da menstruação ela
fica linda, é a fase Menina. Depois que entendi isso minha relação com os
cosméticos também mudou. Entrevista 6

A Entrevistada 6 continua seu depoimento, ainda, falando sobre o despertar do seu


lado feminino, e cita o livro “Mulheres que correm com os Lobos”, de Clarissa Pinkola Estés
(1999), como uma referência importante para este despertar. Nesse livro, que parece uma
referência para as adeptas do Sagrado Feminino, a autora afirma que, as mulheres têm anseios
por recuperar o seu lado “selvagem”, em meio a uma cultura que as aprisiona e domestica.

Cosméticos naturais têm a ver com empoderamento feminino. Para mim isso veio
com o despertar do meu lado feminino. O nome do meu Instagram [Nina e os
Lobos] tem a ver como o livro que eu estava lendo “Mulheres que correm com os
Lobos”. Eu acho que é maravilhoso a gente ter essa autonomia de criar nossos
próprios cosméticos, de ser independente das grandes empresas, descobrir nosso
lado criativo, nosso lado bruxinha, que vai lá mistura ervas, faz extratos...acho isso
maravilhoso. Entrevista 6

A ideia trazida pela Entrevistada 6 de “ descobrir nosso lado criativo, descobrir nosso
lado bruxinha, que vai lá mistura ervas, faz extratos” está associada aos cosméticos DIY. A
entrevistada, no caso, produz seus próprios cosméticos e criou um Instagram para divulgar
suas criações. A motivação principal para a criação do mesmo é o empoderamento feminino,
que a entrevistada teve acesso ao ler o livro já citado “Mulheres que correm com Lobos”.
50

Ainda sobre o livro, ele foi lançado em 1992 e foi um best-seller. A autora é
psicanalista junguiana americana, poeta e contadora de histórias. O livro mistura histórias
folclóricas com uma profunda análise psicológica para resgatar a natureza feminina selvagem.
Da teoria jungiana, trabalha-se a ideia de inconsciente coletivo. Á luz destas teorias, a autora
constrói o arquétipo da mulher selvagem, colocando que todas as mulheres têm um instinto
selvagem que, independentemente de estar domesticado, desaparece e aparece, pois é cíclico.
Segundo a autora “o espectro da Mulher Selvagem ainda nos espreita de dia e de noite. Não
importa onde estejamos a sombra que corre atrás de nós tem decididamente quatro patas."
(ESTÉS, 1999, p.6)
Assim, a questão do Sagrado Feminino mostra-se um elemento importante acerca de
quest es de empoderamento que estão intimamente ligadas a questão do “Despertar” para um
grupo de mulheres.

 Consumo consciente

Outro tipo de “despertar” foi encontrado na forma de consumo consciente. Esta seria
uma transição mais gradual na vida da mulher. Esse tipo de discurso esteve presente nas
mulheres pesquisadas mais jovens, que abordam o consumo de cosméticos naturais como
resultado de seu acesso mais fácil à informação, permitindo-lhes que desde muito cedo
aprendessem a fazer escolhas mais conscientes.
Abaixo o depoimento da Entrevistada de 4, de 25 anos, que não soube identificar um
momento de transição específico em sua vida para que começasse a usar cosméticos naturais.
Segundo ela, desde sempre aprendeu em casa sobre espiritualidade com a avó, aos 6 anos já
fazia meditação e optava sempre por se cercar de coisas saudáveis. Porém o uso de
cosméticos naturais veio na fase adulta, em consequência de seu consumo consciente e
sustentável para todos os tipos de produto.

Esse universo dos cosméticos naturais foi uma consequência. Sempre busquei minha
evolução pessoal, sempre busquei opções mais saudáveis, seja de comida, seja
daquilo que eu fosse usar, por exemplo, desde muito nova eu sempre gostei muito de
comprar em brechó, essa questão da moda mais consciente de manter a roupa em
circulação. A minha rotina com cosméticos naturais, e hoje tudo que uso é natural,
foi vindo aos poucos. Entrevistada 4

O interesse por cosméticos naturais também advém de uma escolha na fase adulta por
produtos que sejam livres de crueldade animal. Esta fala pode ser observada no depoimento
51

das entrevistadas mais jovens. A entrevistada 1, de 22 anos coloca a questão da seguinte


forma:

Minha mudança começou na alimentação há dois anos eu parei de comer carne,


muito influenciada pela minha irmã [...] Venho num processo de ressignificação da
minha alimentação, do meu consumo como um todo...meu consumo tem tudo a ver
com o estilo de vida. O consumo é uma forma de dar dinheiro para alguém que você
acredita, é com a carteira que você está votando em alguém na hora da compra.
Consumo são escolhas, e as minhas são baseadas no que eu acredito e tenho como
valor. Cosméticos eu tenho vontade de comprar mais coisas, mas tenho consciência,
não vou consumir mais do que preciso. Não vou acumular, hoje não faço mais isso.
Entrevistada 1

Aos 20 anos ela deixou de comer carne e passou a se preocupar em escolher o que
consumir de maneira consciente, a entrevistada mostrou preocupação com o meio ambiente e
afirmou a todo instante que seu consumo está atrelado aos seus valores. Podemos dizer que
esse comportamento está atrelado a uma lógica de “menos é mais”, e rejeição do consumismo
e do materialismo. Essa tendência tem sido denominada como consumo ético ou consumo
consciente (SCHOR, 2007). Trata-se de fazer escolhas de consumo com base em crenças
pessoais e morais, acreditando que essa filosofia possa trazer resultados positivos na vida do
ser humano.
Essa questão do consumo consciente em cosméticos naturais foi também abordada no
estudo de cosméticos DYI, sobre Carolina Cronemberger, pioneira no mercado de cosméticos
naturais. A empresária mostra preocupação com o consumo consciente e se considera uma
empreendedora crítica e ativista (DUARTE; CASOTTI; MOREIRA, 2019).

5.1.2 Fase 2: Aprendizado – saberes específicos e agentes socializadores

A segunda fase na trajetória da consumidora, após o Despertar, é o Aprendizado. Esta


fase é crucial para a pesquisa, pois é nela que conseguiremos entender onde os consumidores
buscam as informações, quem são os agentes socializadores envolvidos no processo e quais
são os saberes específicos necessários para que a mulher seja uma consumidora de cosméticos
naturais.
Essa fase está intimamente conectada com o processo de socialização já discutido no
referencial teórico. Retoma-se a ideia de que todo consumo é aprendido. Precisa-se de
informações específicas e conhecimentos específicos para se tornar um consumidor de
cosméticos naturais. Inspira-se no mapeamento de Becker (1963) do processo de aprendizado
52

do uso de maconha por prazer, para mapear os conhecimentos necessários para o consumo de
cosméticos naturais.
Percebe-se que as pessoas que iniciam no universo dos cosméticos naturais,
em primeiro lugar, precisam entender as diferenças entre as diferentes categorias e
nomenclaturas de produtos: cosméticos orgânicos, veganos, naturais ou cruelty-free.
Além disso, precisam entender as certificações de produtos e quais são os órgãos
reguladores que garantem a qualidade daquele produto.

Figura 8 - Canal Bonita de Pele sobre Beleza Natural

Fonte: YouTube

Aprender sobre a composição de produtos. O aprendizado que se mostrou mais


importante é o de entender a composição dos produtos, o que é benéfico, mas principalmente
o que é maléfico para a saúde e também para o meio ambiente. Suspender o uso de
determinadas substâncias químicas presentes em determinados produtos passa a ser a
principal preocupação. Assim, seriam necessários conhecimentos e habilidades especificam
para conseguir ler rótulos e saber evitar determinados produtos.
53

Usar cosméticos naturais demanda muito conhecimento, muita informação...você


precisa saber o que faz bem o que faz mal, as substâncias químicas, tem que estudar
um pouco sobre isso! Aí tem a parte da certificação que também é confusa. Eu gosto
tanto do tema que fiz meu TCC sobre isso...”Entrevistada 4

Como dermatologista posso dizer que é muito difícil encontrar informações sobre o
que faz bem ou faz mal, talvez não seja interesse das grandes indústrias. Por isso me
dedico à cosmetologia natural, tem que estudar, tem que pesquisar para entender
esse universo. Palestrante 7

No perfil da @naturalissima, em parceria com a dermatologista @dermagreen foi feita


uma série de posts informativos sobre produtos a serem evitados. Isto gerou uma interação
bastante positiva com suas seguidoras. Quando alguma seguidora tem dúvidas, ela pode
digitar na busca do aplicativo uma hashtag (#listatoxicadabeleza) que o conteúdo aparece em
sua no Instagram.
Abaixo seguem alguns exemplos de exibição do conteúdo citado.

Figura 9 - Perfil A Naturalíssima – Beleza Limpa

Fonte: Instagram

Importante ressaltar que além do uso de cosméticos naturais, muito se diz também
sobre o que não se deve usar mais.

Deixei de usar muuuitas coisas – Desodorante não uso mais, uso Leite de Magnésia.
Esmalte, não uso mais, antes fazia a unha toda semana, voltaria a usar raramente se
fosse um esmalte natureba. Sabonete íntimo, água thermal, demaquilante,
basicamente 90% da maquiagem que usava foi para o lixo! Nossa, tanta coisa, que
nem lembro! Entrevistada 2
54

No caso das consumidoras que fazem seus próprios produtos em casa, é necessário um
aprendizado ainda mais profundo, de como misturar os ingredientes, como combiná-los para
que cheguem ao produto ideal. Além disso, é preciso aprender os rituais e a ver o momento
como agradável e gerador de prazer (MORAIS, PEREIRA E QUINTÃO, 2019).
Aprender sobre a cadeia de produção (saber diferenciar o que é greenwashing).
Não basta entender sobre o produto é preciso aprender sobre sustentabilidade, entender o que
está por trás de um produto. O discurso da Palestrante C coloca que há uma ideologia por trás
do uso de cosméticos naturais, uma “aderência a um estilo de vida”, e se mostra incomodada
com a palavra “consumo”.

Cosméticos naturais não têm a ver só com produtos, têm a ver com sustentabilidade,
está ligado a toda a cadeia, do momento que sai da natureza até o momento que
volta para ela! Não gosto de falar em consumo de cosméticos naturais, não é só
consumo, é aderência a um determinado estilo de vida. Palestrante C.

Para ela é preciso ser condizente com o estilo de vida adotado, não basta comprar um
cosmético natural é preciso entender sobre toda a cadeia de produção da empresa, saber se ela
é sustentável ou não, se a empresa responsável por aquele produto se preocupa com o meio
ambiente, com os funcionários, com os clientes.
Assim seria uma competência fundamental para as usuárias dos produtos saber
diferenciar um produto verdadeiramente natural e sustentável de um produto que pode ser
apenas “greenwashing” - prática de empresas ao fazer afirmações falsas ou exageradas de
sustentabilidade sobre determinado produto, numa tentativa de ganhar participação no
mercado (GREER, 1997).
Nas redes sociais há um grande alerta para este tipo de problema. O perfil abaixo no
Instagram conduz de maneira explicativa o problema. Nyle Ferrari faz um post bastante
detalhado expondo a marca de cosméticos Simple, da Unilever. Segundo a jornalista e digital
influencer a marca utiliza-se de embalagens verdes para fazer falsas alegações de ser natural
sustentável e ecológica, quando na realidade o produto possui químicas pesadas em sua
composição além de pertencer a uma grande corporação que o post indica ser suspeita de
realizar testes em animas na China.
A jornalista indica a seus seguidores como reconhecer um produto suspeito de ser
greenwahing, indicado principalmente às certificações necessárias para que um cosmético
seja classificado como natural e ecológico.
55

Figura 10 - Perfil Nyle Ferrari – Greenwashing Unilever – Simple

Fonte: Instagram

Vale dizer que recorrentemente levantam-se suspeitas às grandes indústrias de bens de


consumo que introduzem no mercado marcas ditas naturais e ecológicas, como é o caso do
lançamento da Unilever “Love, Beauty and Planet”, que consiste em uma marca de produtos
de cabelo, que se alegam ser feitos com ingredientes naturais, veganos, além de dizer
contribuir com “o planeta”, utilizando-se de embalagens feitas de plástico reciclado.
Durante a Feira Naturaltech o assunto foi alvo de intensas discussões durante uma das
palestras. Acusam-se grandes empresas de consumo de se aproveitar da oportunidade de uma
grande demanda de mercado para gerar mais lucros. Por outro lado, também houve quem
sustentou a ideia de que tais marcas contribuem para tornar este tipo de consumo mais
difundido, disseminando valores que não estão no alcance de toda sociedade.
56

Figura 11 - Perfil Nyle Ferrari – Greenwashing Unilever - LBP

Fonte: Instagram

Em síntese, notou-se que o processo de se tornar uma consumidora heavy user de


cosméticos naturais está ligado a um conjunto de saberes, aprendizagens e competências
específicas que incluem entender as classificações e certificações de produtos, entender a
composição de produtos presentes nos rótulos e a cadeia de produção envolvida em sua
fabricação, além de saber diferenciar o que é greenwashing.
Nesse processo de aprendizado os agentes socializadores envolvidos mostram-se
fundamentais e a observação indica que tão importante para as consumidoras quanto o quê
elas precisam aprender é com quem irão aprender e onde irão buscar as informações
necessárias. Este assunto permite entender as relações que se estabelecem entre os
“universos” online e offline.

Agentes socializadores
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As entrevistas foram as principais fontes para entender os agentes socializadores


envolvidos, pois na netnografia há um viés explicito de que as pessoas já estão ativas nas
redes sociais e sua fonte de busca de conhecimentos estaria ali. Já nas entrevistas foi possível
entender os agentes socializadores de forma mais plural.
No depoimento da entrevistada 1 podemos perceber que as fontes a que recorre são
múltiplas.

Como eu disse minha irmã é minha principal influenciadora. Tenho muitas amigas e
que também conversamos muito. Ah e tem a minha médica, mas é difícil eu ir lá é
muito caro! Ela trabalha na mesma clínica que minha nutricionista, as duas tem um
espaço chamado “nutrindo ideias” para falar sobre veganismo. Elas têm um
instagram e divulgam muita informação legal lá! Tem também algumas meninas que
eu sigo no Instagram, veganas, elas postam coisas sobre tudo, eu adoro testar,
algumas coisas não dão muito certo, antes eu seguia mais gente. Mas fica um pouco
confuso as vezes. Tem a Carol Cronemberger que você deveria seguir, ela é uma
referência do assunto aqui no Rio de Janeiro. Entrevistada 1

Ao longo da entrevista ela coloca que sua irmã mais velha é a sua principal
influenciadora. Graças à irmã, se tornou vegetariana e começou a adotar práticas mais
naturais. Porém, depois que a irmã foi morar no exterior a entrevistada passa a recorrer a
outras pessoas, como amigas, com as quais diz trocar muito, visto que têm interesses
semelhantes. Ela também cita também sua médica dermatologista, a qual adota práticas
naturais e diz se sentir mais segura com os conselhos da médica do que com as receitas que vê
na Internet, apesar de também recorrer a elas eventualmente. A entrevistada 1 citou a Carolina
Cronemberger como uma de suas inspirações.
Já a entrevistada 8 coloca que sua única fonte de informação é a Internet, se refere às
digital influencers que segue como suas “gurus”. A entrevistada coloca que não sente
confiança na medicina tradicional e diz que conseguiu curar um problema de pele graças ao
que aprendeu sobre cosmética natural na Internet.

Sempre busco informação na Internet! Obvio! Quando disse para meu dermato que
estava usando cosméticos naturais para tratar a minha acne adulta, ele riu. Ai não
voltei mais. Procuro minhas gurus na Internet. Entrevistada 8

A entrevistada 6 diz possuir agentes socializadores híbridos, apesar de sempre ter


buscado informações nas redes sociais, a partir do momento em que viu seu interesse se tornar
mais crescente passou a recorrer a cursos e apostilas sobre o assunto. Essa entrevistada está se
58

profissionalizando e já faz algumas vendas de produtos para algumas amigas no Rio de


Janeiro.

A principio eu buscava informações no Instagram e no Facebook. Depois comecei a


fazer cursos. Saboaria, quente e fria. Comprei varias apostilas do santo Sabão na
Internet. Participei de encontros, e hoje faço mentoria com pessoas que fazem
cosméticos. Entrevistada 6

O relato da entrevistada 4 evidencia que hoje é muito mais fácil encontrar informações
na Internet, porém, quando ela começou a se interessar pelo assunto, há 6 anos, a informação
não era tão abundante. Ela recorre a um livro chamado “Guia Completo da Beleza”, ao qual
se refere como sua “bíblia”, revelando a importância de ordem quase religiosa, que o livro
possui na sua vida.

Eu comecei a buscar informações, na época já tinha Instagram e redes sociais, mas


não era como hoje... Eu tenho um livro, que é minha bíblia, chama Guia Completo
da Beleza feita em casa, que fala sobre cosméticos veganos, naturais, orgânicos, é
um livro super didático, tem receitas, mas fala também da importância de se optar
por cosméticos naturais e o porquê deixar cosméticos que testam em animais.
Lembro que a primeira receita que eu vi de cosméticos naturais foi com a Bela Gil,
de misturar bicarbonato de sódio com óleo de coco e um óleo essencial, aprendi com
ela. Eu era viciada no programa da Bela Gil, depois comecei a acompanhar pelas
redes sociais. As dicas dela foram fundamentais e um grande ponto de partida para
eu aprender um pouco mais, e aprender a fazer, e aí depois foi deslanchando.
Entrevistada 4

Ademais outra fonte de informação evidenciada é a televisão, a entrevistada coloca


que foi no programa da Bela Gil o primeiro lugar em que viu uma receita de cosmético
natural. Bela Gil é filha do filha do renomado cantor baiano de MPB Gilberto Gil. Bela Gil é
apresentadora, formada em nutrição, chef, e escritora é reconhecida por ser uma ativista a
favor de uma alimentação mais saudável e a um consumo mais sustentável. Vale dizer que. A
apresentadora possui um programa de culinária no canal GNT chamado “Bela Cozinha”,
sobre nutrição saudável, além do programa “Bela Raízes”, do canal Futura, na qual visita
comunidades tradicionais brasileiras, em busca de conhecimentos ancestrais.
Os grupos de whatsapp também surgiram como elementos inesperados dos resultados
coletados. A princípio, ao pensar em meio online a pesquisa havia considerado redes sociais
como os principais meios de comunicação, mas na coleta percebeu-se que a interação em
grupos de whatsapp é um elemento importante. Algumas entrevistadas chegaram a dizer que
ter contato pelo Whatsapp significa que “você realmente conhece a pessoa”, remetendo a um
sentimento de aproximação maior do que o proporcionado pelas redes sociais.
59

Sempre busco informações primeiro com a minha professora do curso de


cosmetologia, mas ela não é muito acessível. Então através do facebook descobri um
grupo de whatsapp e que tem uma senhora que é referência para cosmetologia
natural. Ela passa diversas receitas de cremes, shampoo...essa pessoa tem
experiência e muita ética, então eu confio na informação dela”. Entrevistada 7

Quando comecei a lavar o cabelo só com água entrei num grupo do Facebook que
agora chama Natural Care Brasil, de adeptos da técnica “water only”, aí a gente fez
um grupo de whatsapp. Aí sempre que eu quero alguma receita ou dica eu pergunto
no grupo, tudo mesmo, para pele cabelo, pra gripe, indisposição, qualquer solução
natural que eu preciso eu pergunto no grupo! (...)Eu faço parte do grupo há 2 anos,
algumas meninas já até conheci pessoalmente, a gente sempre se manda foto, confio
muito no que elas falam, é uma troca bem legal. Entrevistada 3

Nos dois casos relatados as entrevistadas descobriram pelo Facebook grupos de


Whatsapp formados devido ao interesse no assunto de cosméticos naturais. O grupo é ativo e
as pessoas, mesmo que não se conheçam pessoalmente, sentem uma relação de proximidade e
confiança nas informações trocadas no grupo.
Dessa forma, percebe-se que as consumidoras têm múltiplos agentes socializadores,
não sendo exclusivamente online ou offline. Os dados coletados indicam que as usuárias
buscam fontes de confiança, sejam pessoas de seu convívio, familiares, amigos, médicas,
professoras, mentoras, influenciadores digitais, blogs, redes sociais ou grupos de whatsapp e
programas de televisão. Figuras femininas do universo offline mostram-se relevantes neste
contexto, como avós, irmãs e amigas, médicas, porém parecem mais escassas e inacessíveis.
Já as do universo online, apresentam-se de forma mais abundantes e estão mais acessíveis.
Importante ressaltar que de um modo geral, as influências são predominantemente
femininas. As informantes relatam buscar informações em páginas de mulheres, livros
escritos por mulheres, cursos ministrados por mulheres, programas televisivos apresentados
por mulheres. Ou seja, quem produz e consome esse conhecimento são mulheres, seja online
seja offline.

5.1.3 Fase 3: Teste e Uso – Percepção dos Resultados

Essa terceira fase diz respeito ao momento em que a consumidora depois da fase do
despertar e da busca de conhecimento passa de fato a usar os cosméticos naturais e a sentir os
resultados dos mesmos e seus benefícios, tanto em termos estéticos, quanto em termos mais
plurais, como o prazer dos rituais proporcionados e a prática de um consumo mais consciente.
Nesta fase os dados retirados das entrevistas também se mostraram mais detalhados para a
análise.
60

Os relatos das entrevistas abaixo demonstram os resultados estéticos dos produtos. Os


benefícios são vistos ao longo prazo e são sempre comparados aos de cosméticos tradicionais.
Os cosméticos naturais são vistos como produtos que tratam a pele e cabelos, sem danificá-
los.

Minha pele está muito melhor desde que comecei a usar os ativos naturais...antes
quando usava ácido ficava horrível, ressecado, puxado. Agora não, a pele fica suave,
e a acne sumiu! Também estou hidratando o corpo e o cabelo, estou me sentindo
muito bem com os resultados. Tem algumas coisas que parei de usar. Por exemplo
esmalte, tem 6 meses que não uso e minha unha está muito mais forte. Entrevistada
1
Os resultados dos cosméticos naturais são maravilhosos à longo prazo, comparando
no mesmo dia a um natural e um cheio das tecnologias e petroleiros e afins; o
segundo terá resultado imediato melhor; mas a longo prazo, não tem comparação
com o natural. Basta ter paciência! Entrevistada 3

Outro ponto que traz um sentimento de bem-estar para as consumidoras diz respeito ao
fato de elas entenderem que na cosmética natural, um único produto pode ter finalidades
diversas, diminuindo o número de embalagens e também de consumo. Foi observada em
muitos depoimentos uma sensação de satisfação com a “bancada limpa”, “pia com menos
embalagens”. Um exemplo está no depoimento da Entrevista 6.

Os cosméticos naturais mudaram minha vida. Antes minha pia era cheia de coisas,
cheio de potes, cheia de mil possibilidades. Como eu investia em coisas caras, eu
tentava usar o que eu comprava até o fim, independente do resultado. Meu banheiro
era atolado em embalagens! Com a cosmética natural isso mudou, eu tenho poucas
coisas que servem para muitas finalidades diferentes e fazem o mesmo efeito do que
pagava caríssimo para ter. Entrevistada 6

Esse sentimento de bem-estar em relação a consumir menos coisas foi comum entre as
mulheres, independente de sua idade. Porém, dentro dessa fase vale ressaltar que há
percepções que não são tão genéricas. Podemos dizer que há percepções que de resultados que
irão depender do estágio de vida da mulher, se ela é jovem ou madura, as necessidades
mostram-se diferentes. De maneira semelhante ao estudo de CASOTTI, SUAREZ, CAMPOS
(2008), o tempo mostra-se como um grande agente segmentador.
Um exemplo está no depoimento da jovem Entrevistada 4, de 25 anos, que demonstra
uma falta de preocupação maior com algum problema específico. Assim, os resultados com
cosméticos naturais mostram-se extremamente satisfatórios.
61

Como eu falei, eu não vejo necessidade de ter cuidados mais radicais. Minha pele é
normal, meu cabelo fica um pouco ressecado, mas nada que um óleo de coco não
resolva. Posso dizer que estou muito satisfeita e não preciso de mais nada.
Entrevistada 4

No depoimento da entrevistada 1 podemos ver que, a principio ela diz não se


preocupar muito por ser jovem, mas acredita que quando ficar mais velha suas necessidades
irão mudar e, até lá, espera que já existam alternativas naturais para problemas de
envelhecimento.

Eu não sou uma pessoa que me cuido super, não sei se é porque sou jovem ou algo
do tipo [...] Talvez quando eu ficar mais velhas minhas necessidades vão mudar.
Mas sou positiva pois as marcas estão buscando ressignificar, L’Oréal, Unilever, por
aí. Acredito que quando eu ficar mais velha já tenham mais alternativas do que hoje.
Não sou xiita, sabe? Mas se existem alternativas, posso optar por elas. Entrevistada
1

Já entrevistada 6, mais madura, com 41 anos, foi bem clara quanto a sua preocupação
específica com a idade. Ela diz que os cosméticos naturais não atendem totalmente sua
demanda em relação a cuidados com a idade, por isso ela continua ainda utilizando alguns
produtos tradicionais.

Eu tenho 41 anos, minha preocupação é tentar parar o tempo. Eu tento usar coisas
que façam meu rosto ficar mais jovem, melhorar o aspecto da minha pele. Eu tive
acne a minha vida inteira, eu tenho muita oleosidade na pele além de tudo, então
preciso estar sempre cuidando. Nos últimos 6 meses eu tenho feito meus próprios
cosméticos. Basicamente estou trocando todos os cosméticos para naturais. Eu uso
um shampoo sólido, por exemplo, que eu mesma faço. Tem alguns que ainda uso os
tradicionais. Por exemplo, eu uso um sprayzinho de vitamina C, que este não troco
por nada, acho maravilhoso. E um creme para área dos olhos, de vitamina C
também. Entrevistada 6

A entrevistada 6 continua dizendo que além dos tratamentos que faz, ainda pratica 30
minutos de face yoga todos os dias em sessões com a profissional japonesa Fumiko Takatsu,
através de métodos online.

Eu gasto 30 minutos por dia na parte da manhã fazendo meus exercícios de yoga
face massage com a Fumiko, uma japonesa que mora nos EUA e é maravilhoso,
sempre que eu faço meu rosto muda, fica muito mais vivo, super tonificado. Eu
adoro coisas naturebas que a Fumiko mesma ensinou, eu uso aquela proteína que
fica na casca do ovo na área dos olhos. Eu faço meu próprio iogurte, aí eu uso ele no
rosto pois é super hidradante. Entrevistada 6
62

Assim, nos depoimentos de mulheres mais maduras, também nota-se além de uma
preocupação maior com o tempo que está causando envelhecimento, há também uma grande
disposição para empregar seu tempo em rotinas de beleza. Outro ponto relevante, é que há
também uma grande disposição financeira. Em consulta ao site supracitado de face Yoga
[go.faceyogamethod.com] vê-se que os cursos oferecidos podem chegar a custar U$ 149
dólares por mês, com aulas online com a própria Fumiko Takatsu. O mesmo tipo de
disposição financeira se vê no caso da entrevistada 8 de 34 anos.

Eu gasto muito dinheiro com meus produtos. Cosméticos naturais não são nada
baratos aqui no Brasil. Agora comecei a usar produtos para rugas, com 30 anos não
tem jeito, está começando a marcar, na linha dos olhos, na boca, fico apavorada.
Comecei a usar a linha importada de ativos naturais, paguei uma fortuna, mas já
estou vendo os resultados, não fica repuxado, realmente dá uma suavizada nas linhas
de expressão. Entrevistada 8

Essa mesma disposição de empregar tempo e dinheiro com a beleza para mulheres
mais jovens parece não ser algo tão importante. Elas colocam que sua rotina é simples,
prática, fácil e que muitas vezes sequer há rotina. Entre as mais jovens é possível notar que há
uma tentativa de mostrar certo “descompromisso” com a beleza. Porém, durante a descrição
de sua rotina de beleza, percebe-se que há também emprego de tempo considerável em seus
cuidados pessoais.
A Entrevistada 4, de 25 anos, no começo da entrevista diz não ser uma pessoa vaidosa,
afirma só cuidar do básico, porém ao descrever sua rotina de beleza, percebe-se que há um
grande emprego de tempo para as atividades descritas.

Eu não sou uma pessoa muito vaidosa, sabe? Eu cuido do básico, eu lavo meu rosto,
é o maior cuidado que eu tenho, o rosto e o cabelo, eu gosto de lavar meu rosto com
um tônico que eu mesma faço, com chá verde, vinagre de maçã e óleo essencial de
lavanda, pra mim limpa bastante meu rosto, então eu lavo ele e passo esse tônico
umas 2 vezes por dia, quando eu acordo e na hora de dormir e 2 ou 3x por semana
eu faço minha hidratação no cabelo, com óleo de coco ou então azeite ou máscara de
abacate ou óleo de semente de uva. E com meu corpo eu sempre passo óleo de
amêndoa. E basicamente esse são meus cuidados maiores dentro da minha rotina de
beleza. Minha rotina costuma ser rápida, não gasto muito tempo. Lavo o rosto e
passo 5 minutos esfregando ele, faço uma massagem facial enquanto eu passo ele no
meu rosto, depois lavo com água gelada. O meu cabelo eu deixo para fazer a noite a
noite quando eu tô em casa, deixo de uma a duas hora ele hidratando, aí eu faço,
lavo, seco, então basicamente juntando tudo umas 2 horas e meia. Entrevistada 4

Entre as praticantes de DIY podemos dizer que esse empego de tempo é intrínseco ao
conceito. DIY exige que os praticantes tenham tempo disponível (WOLF E MCQUITTY,
63

2011). De modo similar, a entrevistada 3 de 24 anos, que diz não ter rotina de beleza, porém
seus cuidados com formulações de receitas mostram-se presentes.

Eu não considero que tenho uma rotina de beleza, uma vez por semana eu faço
alguma coisa, pego uma borra de café, faço uma esfoliação. Não uso nada
industrializado, não uso shampoo, nem condicionador e nem desodorante. Mas me
cuido, quando dá tempo, hoje por exemplo vou fazer uma hidratação no cabelo com
abacate, babosa e limão. Entrevistada 3

Assim, podemos entender que a fase 3 envolve percepções genéricas de resultados –


como resultados a longo prazo e bem estar ao consumir menos produtos – mas também
apresenta resultados específicos de acordo com o “tempo” cronológico da mulher. As
mulheres mais maduras mostram preocupações mais específicas com os sinais do tempo,
enquanto mulheres mais jovens têm preocupações não tão específicas, em relação à hidratação
da pele e cabelo. Assim, o resultado para elas parece sem mais convincente, enquanto as
mulheres mais maduras são mais exigentes em relação aos produtos e técnicas empregadas.
Já o tempo e disposição empregados parecem ser similares, apesar das mulheres mais
jovens acreditarem que seu emprego de tempo não seja alto.

5.1.4 Fase 4: Compartilhamento de informações - criação de uma rede

A última fase encontrada na pesquisa refere-se ao compartilhamento de informações e


acontece depois de resultados positivos com o uso dos produtos. Assim como na fase do
“Aprendizado”, nota-se que os caminhos de compartilhamento de informação são múltiplos,
podendo ser online ou offline. Porém nessa fase as redes sociais mostraram-se ainda mais
presentes. Mesmo consumidoras que não são digital influencers usam suas redes sociais para
divulgar os produtos, demonstrando uma paixão pelo assunto.

Não que eu seja influencer, mas eu gosto de compartilhar. Acho que dicas boas,
conscientes e que façam bem pra nossa alma, vai além de cosméticos, não é reparar
um dano da pele, do cabelo, vai além... é se sentir bem, se cuidar com o que a
natureza te oferece, vale a pena compartilhar, é uma questão de nutrir a alma. Acho
que dica boa tem que ser compartilhada, aí compartilho no meu Instagram mesmo. E
com a minha família, minha mãe, minha vó eles são uns poucos céticos, meu
padrasto é dermatologista ele é um pouco cético quanto a isso. Mas eu forço eles a
usar. Apresentei o óleo de coco lá em casa e agora minha mãe usa e adora.
Entrevistada 4

As entrevistadas, independente da idade, demonstraram que utilizam as redes sociais


com esse propósito de divulgar informações.
64

Com as pessoas mais intimas, minha irmã, minhas amigas, eu falo pelo whatsapp ou
quando a gente se encontra eu falo que testei algo e deu certo e falo para testarem
também. Eu sinto que compartilho muito mais com elas do que elas comigo. Para as
pessoas que não estão no meu convívio diário eu compartilho nas redes sociais. Meu
Instagram é basicamente para isso, compartilho muito conteúdo sobre menstruação,
feminismo e receita de cosméticos, quase não posto fotos minhas. Entrevistada 5

Apesar das redes sociais mostram-se protagonistas nesse momento, alguns formas de
compartilhamento tradicionais também se mostram em evidência, como aquele de mãe para
filha. O depoimento da Entrevistada 8 que estava no começo da gestação durante a pesquisa,
explicita que ela quer repassar para sua filha o conhecimento que ela não teve acesso quando
mais nova, que só teve depois de adulta. Ela afirma que vai ensinar a filha sobre consumo
consciente além de ensiná-la desde pequena a cuidar de seus cabelos cacheados:

Eu quero que minha filha tenha uma educação muito diferente da que eu tive em
relação a consumo. O mundo está tão doido, cheio de problemas, doenças, muito é
por conta do nosso padrão de consumo, comemos mal, nós entupimos de veneno e
estamos destruindo o mundo. Quero uma gravidez limpa e quero que minha filha
desde pequena tenha essa consciência que eu só fui ter depois de velha. Será
maravilhoso poder ensiná-la. [...]Na minha época de adolescente a gente alisava
cabelo com formol, passava kilos de formol no cabelo. Mas também a gente comia
Mc Donalds todo fim de semana e isso era OK. Essa geração mais nova é diferente,
tem mais informação. Minha filha, eu quero ensiná-la desde pequena...se ela nascer
de cabelo cacheado como o meu, vou ensinar ela a cuidar e amar ele desde pequena!
Minha mãe não fez isso comigo, não me ensinou como cuidar do meu cabelo
cacheado, mas coitada...naquela época não tinha informação! Todo mundo queria o
cabelo liso... Hoje as mulheres tem informação, ainda bem. Entrevistada 8

Morais, Pereira e Quintão (2019) colocam que o compartilhamento é importante para


continuar alimentando o processo. Os autores colocam que é um processo interminável de
descobertas e desenvolvimento de conhecimento que se espalha em livros, mídias sociais e
workshops.
Algo a pontuar sobre as características de compartilhamento é que algumas mulheres
no fim deste processo acabam se tornando empreendedoras no segmento de cosméticos
naturais. A trajetória de Carolina Cronemberger, de Prossumidora a Empreendedora Integrada
(DUARTE, CASOTTI; MOREIRA, 2019) seria um exemplo dessa situação. Uma
consumidora produtora de cosméticos naturais que de maneira orgânica expandiu sua
produção para um negócio coerente com seus valores e com seu ativismo, visando
profissionalizar o ativismo combinando atividades relacionadas a aprendizagem deste
universo, como cursos e consultas.
Na pesquisa tivemos depoimentos de entrevistadas que seguiram no mesmo caminho.
A terapeuta holística de 37 anos (Entrevistada 7) que descobriu nos cosméticos naturais além
65

de uma cura para seus problemas pessoais uma fonte de renda. A entrevistada após verificar
os resultados positivos dos cosméticos naturais aposta na profissionalização e passa a oferecer
seus cosméticos através das redes sociais.
De maneira similar, a empresária do setor de eventos (Entrevistada 6) também iniciou
no setor de cosméticos naturais como consumidora produtora e hoje já vende os produtos para
pessoas conhecidas e os divulga através de seu Instagram.
Na feira Naturaltech também foi possível conhecer as palestrantes proprietárias de
marcas de cosméticos naturais que decidiram empreender como uma forma de fortalecer o
segmento e principalmente compartilhar de informações, valores e suas crenças,
principalmente com o propósito de mudar o mercado.
Porém vale destacar que o compartilhamento não se trata apenas de divulgar produtos
ou fórmulas de cosméticos. O compartilhamento envolve também a relação e os significados
que a beleza natural tem para as usuárias. Os perfis de redes sociais Instagram e YouTube
seguidos nas redes sociais, sem exceção, tratam sobre temas de consumo ético, sobre
responsabilidade e também envolvem temas de autocuidado e rituais de bem-estar.

A beleza natural não é um modismo, é a manifestação de uma necessidade


consciente de se cuidar. Fórmulas orgânicas e veganas são bem-vindas. Mas tudo é
sobre você. .Mas calma, não comece a massagear o ego ainda: não é sobre seu
próprio umbigo. É sobre como você se manifesta no mundo através da beleza. E isso
inclui o outro. E pensar o outro sempre inclui ética.
Beleza natural, então, é sobre não-violência; seja com você mesma pra entrar em um
padrão; seja com um animal de teste...É sobre o conforto de habitar a sua matéria;
esse templo chamado corpo. É sobre as escolhas que te nutrem. Sobre rituais que te
aterram. É sobre prazer. Sobre ausência de culpa. . Sobre seguir o ritmo - o seu, só o
seu. . É sobre você porque é sobre autonomia. É totalmente sobre autonomia (e
liberdade de consumo). auto-gentileza. auto-conhecimento. Auto cuidado auto-
responsabilidade. Como eu sempre digo (nas palestras, nos workshops,
mentorias...em cansar!): beleza natural não é (somente) sobre fórmulas naturais. É
sobre você. @anaturalissima post instagram

Por fim, um ponto que chamou a atenção liga-se a alguns dilemas frente à exposição
nas redes sociais. A entrevistada 1, coloca que sempre faz posts sobre sustentabilidade,
vegetarianismo, cosméticos naturais, mas que fica receosa de aparentar estar impondo uma
opinião, ou criticando as escolhas alheias, o que iria de encontro com sua ética de respeitar o
próximo.

Minha relação com redes sociais tem estado um pouco estranha. Antes eu
compartilhava tudo sobre sustentabilidade, o tempo todo, achava que estava fazendo
um grande bem. Mas as vezes fica parecendo que eu quero impor. (...)Vou fazer um
sérum hoje e um produto para casa, se ficar bom talvez eu compartilhe, ainda não
sei...Vou em um evento no final de semana de imersão chamado Lixo Zero, é um
final de semana inteiro em um sítio, uns amigos meus que organizam, mas não sei se
66

vou postar sobre isso, eu quero, mas não sei ainda, vamos ver, ando muito reflexiva
sobre isso. Entrevistada 1

O dilema da entrevistada 1 não parece ser algo exclusivo. Durante as entrevistas


quando questionadas sobre redes sociais, a questão de “excesso de exposição” pareceu ser um
problema para algumas das mulheres pesquisadas, que acabam compartilhando suas vidas de
maneira mais abrangente, saindo da esfera pessoal, de parentes e amigos próximos.
Assim, na esfera do compartilhamento fica evidente que se estabelece uma rede, uma
consumidora que uma vez teve de buscar informações retorna com novas informações,
compartilha suas experiências com o objetivo de fortalecer o consumo de cosméticos naturais
e ampliar os conhecimentos acerca deste universo.
67

6. CONCLUSÃO

O consumo de cosméticos naturais precisa ser pensado à luz da dimensão sociocultural


já que envolve aprendizagem, socialização e varia segundo demandas de ciclos de vida.
Através deste estudo exploratório buscou-se compreender o fenômeno e propor caminhos para
entender as questões levantadas acerca do processo de socialização do consumo de
cosméticos naturais, os significados envolvidos nesse processo e as continuidades e/ou
descontinuidades entre a socialização online e offline.
Os achados deste trabalho avançam sobre um debate já iniciado na perspectiva de
cultura e consumo a respeito das transformações nas práticas de consumo de produtos de
beleza no Brasil (MORAIS; PEREIRA; QUINTÃO, 2019), especificamente, a tendência
crescente em direção aos chamados “cosméticos naturais”.
Com base nos materiais coletados na netnografia, observação-participante e entrevistas
construiu-se uma trajetória de 4 fases da consumidora de cosméticos naturais: (1) “Despertar”,
eventos de transição importantes que ocorrem na vida da mulher e que ressignificam seu
consumo; (2) “Aprendizado”, fase na qual buscam informaç es; (3) “Teste e Uso”, período de
adaptação e que irá revelar se a consumidora se manterá neste nicho devido aos resultados
alcançados (4) “Compartilhamento”, após bons resultados as informaç es são compartilhadas
estabelecendo-se uma rede que visa fortalecer este tipo de consumo.
A pesquisa sugere que o uso de cosméticos naturais tem sinergia com a temática da
socialização do consumidor na fase adulta (EKSTRÖM, 2006; MOCHIS, 2007, MOREIRA,
CASOTTI, CAMPOS, 2018). Dentro desta perspectiva, sabe-se que há eventos importantes
que podem alterar o comportamento do consumidor, suas preferências e seus hábitos de
consumo. Nesse sentido, a pesquisa avança mapeando os eventos de transição que acontecem
na vida do consumidor e que comp e a fase do “Despertar”. As situaç es encontradas foram
diversas, tais como a gravidez, doenças, empoderamento, feminilidade e consumo consciente.
Estas situações alteraram a percepção anterior que as mulheres tinham sobre cosméticos
tradicionais e as fazem repensar sobre seu consumo, resultando em um movimento de
mudança para um novo tipo de consumo, o de cosméticos naturais.
A gravidez traz consigo novas preocupações, a mulher assume o novo papel social de
mãe; as doenças trazem uma situação de fragilidade que as mulheres recorrem às alternativas
de adaptação. Em ambos os casos, a preocupação com a saúde, desencadeia mudanças de
comportamentos de consumo, podendo resultar da aderência aos cosméticos naturais.
68

O empoderamento que também afeta os hábitos de consumo da consumidora, foi


evidenciado através de relatos da transição capilar, caracterizada por padrões estéticos que as
mulheres deixam de seguir, para encontrarem sua identidade na sua própria natureza, no seu
cabelo original e a cuidar dos mesmos com produtos naturais.
A questão de encontrar a própria natureza também leva a caminhos de correlações
estabelecidas entre consumidoras e suas inferências ao “Sagrado Feminino”, uma “colcha de
retalhos”, tecida com diferentes tradiç es espirituais, tempos e culturas, ligada a reconhecer
práticas antigas, conhecimento do próprio corpo e respeito à natureza da mulher. Esse
florescimento da feminilidade de sua conexão com seus elementos naturais também levaria a
uma mudança de comportamento de consumo, levando aos cosméticos naturais.
Após essa percepção de ressignificação do consumo as consumidoras iniciam a busca
por conhecimento deste novo universo. Aponta-se o avanço feito em Morais, Pereira e
Quintão (2019) ao posicionar o papel da Internet na produção e compartilhamento de
informação sobre o consumo de cosméticos naturais, a pesquisa adiciona novos elementos
referentes a este consumo, mostrando que as usuárias têm múltiplos agentes socializadores,
não sendo exclusivamente online ou offline. Ao procurar informações, as novas usuárias,
buscam fontes de confiança, sejam pessoas de seu convívio, familiares, amigas, médicas,
professoras, mentoras, influenciadoras digitais, blogs, redes sociais ou grupos de whatsapp e
programas de televisão. A pesquisa revela que de um modo geral, as influências são
predominantemente femininas, quem produz e consome esse conhecimento são mulheres, seja
no ambiente online ou offline, evidenciando a questão do gênero feminino intimamente
conectado a este consumo.
Vale dizer que além de onde aprender, um ponto importante é também o que aprender.
O uso de cosméticos naturais demanda uma série de saberes e competências específicas, tais
como, classificação de produtos e certificações, ler rótulos para entender composição de
produtos, conhecer a cadeia de produção e distinguir o greenwashing, confeccionar seus
próprios cosméticos e apreciar o ritual.
A terceira fase, “Teste e Uso”, aponta que o uso de cosméticos naturais, varia segundo
demandas de ciclos de vida. Dialogando com as pesquisas de Casotti, Suarez e Campos
(2008) sobre o consumo de cosméticos tradicionais, o presente trabalho traz algumas questões
específicas sobre este universo. As mulheres mais maduras mostram preocupações mais
específicas com os sinais do tempo, enquanto mulheres mais jovens têm preocupações mais
genéricas em relação à beleza e tentam mostrar certa “despreocupação” com quest es
relacionadas ao tema. Assim, o resultado para elas parece mais eficiente e suas práticas não
69

são tão complexas, enquanto as mulheres mais maduras são mais exigentes em relação aos
resultados dos produtos e às técnicas empregadas.
Na esfera do compartilhamento nota-se que é estabelecida uma rede, uma consumidora
que uma vez teve de buscar informações retorna com novas informações, compartilha suas
experiências com o objetivo de fortalecer o consumo de cosméticos naturais e amplia os
conhecimentos acerca deste universo. A Internet aparece como principal campo para
divulgação e compartilhamento de informação,
No que tange aos significados do consumo de cosméticos naturais, podemos dizer que
há relação com a estética, uma preocupação com a beleza, uma preocupação em se cuidar,
porém o cuidado e a beleza se apresentam de maneira mais holística, o bem-estar físico e
psicológico também são importantes para essa consumidora. O mais relevante dos achados da
pesquisa é a compreensão de que a tendência de consumo de cosméticos naturais vai além de
um movimento estético, é um movimento ético e político, que reflete os valores e ideais das
mulheres pesquisadas.
Por se tratar de estudo exploratório a pesquisa abriu um amplo leque de novas
discussões e novos fenômenos a serem estudados, que não puderam ser contemplados e ficam
como sugestão de para futuras pesquisas. O Sagrado Feminino é uma temática pouco
explorada pelo universo acadêmico e pode apresentar-se como um fenômeno interessante a
ser explorado. Estudos sobre o fenômeno do greenwashing também poderiam ser
aprofundados. E por fim um novo estudo que contemplasse o significado da beleza nesse
universo de cosméticos naturais parece ser bastante válido.
70

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APÊNDICE A – ROTEIRO DE ENTREVISTA

1. Você poderia se apresentar um pouco, o que faz, onde estado civil, atividade,
profissional, bairro onde mora, com que mora;
2. Como é sua rotina de Beleza?
3. Quais são suas principais preocupações com o seu corpo e com a sua beleza?
4. Qual tempo gasto de tempo diário com esses cuidados?
5. Como os cosméticos naturais entraram na sua vida?
6. Como aprendeu a consumir, onde buscou informações?
7. Quem você considera seus principais influenciadores?
8. Como você escolhe os produtos que usa?
9. Qual seu gasto com produtos de beleza?
10. Como você avalia os resultados dos cosméticos naturais até agora?
11. Você compartilha as informações com outras pessoas?
12. Onde compartilha essas informações?
13. Qual a relação dos cosméticos naturais com seus valores e seu estilo de vida?
14. O que é para você se sentir bonita?
15. Gostaria de acrescentar algo mais sobre o assunto?
16. Teria outras pessoas para indicar para a entrevista?

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