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ff Dimensies da Agéo Humana dos Valores 228 10. A dimenséo estetica - a criagéio artistica ea obra de arte 10.1 0 problema da definicéo da arte © problema da definic#o de arte ¢ uma das principais preocupagées dos filésofos da arte e pode ser formulado do sequinte modo: «O que é a arte?». Qualquer definigao de arte deve captar adequadamente os dois usos comuns da palavra «artes: 0 sentide classificative (descritivo) © 0 sentido valorativo (avaliativo). Ao passo que: Estes objetos sdo obras de arte! Este quadro € uma obra de arte! Muitos autores consideram que a resposta ao problema da definicao de arte implica encontrar uma definigao explicita de arte, ou seja, estabelecer as condicées necessérias @ suficientes para que algo possa ser considerado arte. Isto significa que estes tedricos da arte tam tentado encontrar um conjunto de caracteristicas que todas as obras de arte 56 as obras de arte tém em comum. Uma vez que se dedicam a encontrar a esséncia da arte, estas teorias foram classificadas como teorias essencialistas da arte. Contudo, nem todos os teéricos da arte consideram este tipo de abordagem muito promissor. Para estes autores, dada a natureza dindmica, ctiativa e inovadora do fenéme- no attistico, nunca conseguiremos estabelecer de forma segura um conjunto de proprie- dades intrinsecas que todas as obras de arte, e apenas elas, possuem em comum. Mas 1O.Adimensio estéties WwW isso nao implica necessariamente que néo se pode encontrar qualquer tipo de definicado de «obra de artes, apenas indica que em vez de nos focarmos nas propriedades intrinse- cas dos objetos attisticos devemos focar-nos nos seus aspetos relacionals, processuais © contextuais, isto é, nas relac6es que estes estabelecem, nos processos por que pas- sam € no contexto histérico € social que os envolve. Uma vez que sustentam que no existe uma espécie de esséncia comum a todas as obras de arte, as teorias que se dedi- cam a encontrar uma definicao de arte nestes moldes ficaram conheciclas como teorias nao essencialistas da arte. ‘Ao longo deste capitulo 10 iremos estudar trés teorias essencialistas da arte ~ a teo- ria representacionista, a teoria expressivista ¢ a teoria formalista — ¢ duas teorias nao essencialistas da arte — a teoria institucional ¢ a teoria historicista. Vejamos em sequida 0 que caracteriza cada uma destas perspetivas © quais os principais argumentos a favor e contra cada uma delas. 10.2 Teorias essencialistas: a arte como representacdo, a arte como expressio e a arte como forma Aarte como representacao Uma das mais antigas teorias da arte de que ha registo é a teoria da arte como re- presentacSo. Desde o século V a.C., que os filésofos, como Plato e Aristételes, se tem interragado acerca da natureza da arte. Estes autores debrucaram-se sobre as principais manifestac6es artisticas do seu tempo e concluiram que aquilo que havia de comum entre elas era 0 facto de todas corresponderem a uma forma de representagao da rea- lidade Por representaco entendemos o ato através do qual algo toma intencionalmente o lugar de outra coisa. Ou dito de outra form Existem, contudo, diferentes tipos de representacdo. Desde logo, uma representac3o pode ser imitativa ou no imitativa. Por exemplo, alguns sinais de transito representam algo através da imitaco da sua forma, mas outros no. O sinal de aproximacdo de um cruzamen- to representa a aproximagao de um cruzamento imitando a forma do mesmo, mas o sinal de sentido proibido limita-se a representar essa proibi¢do, sem imitar a sua forma. eres Pres 229 230 Dimensies da Agéo Humana dos Valores Platio ¢ Aristételes acreditavam que o tipo de representacSo envolido na producso artistica consistia simplesmente na imitagao. Vejamos de que forma Aristoteles apresenta esta idleia na sua obra intitulada Poétice: Notas * Estio literario caracteristico dos grandes poemas epicos, Homero. > A par da comédia, era um dos principais generos do texto dramatico da Antiguida de Classica. Caracterizava-se por retratar as acdes de deu Poesia declamada e cantada Poor atores e por um coro. * Arte de tocar flauta, * Arte de tocar citara ou ira, © Do grego «mimesiss, que significa imtacao. «A epopeia', a tragédia?, assim como a pocsia ditirimbica? ¢ a maior parte da aulética* ¢ da citaristica®, todas so, em geral, imitagbes. Diferem, porém, umas das outras, por tés aspetos: 1 porque imitam por meios diversos, ou porque imitam objetos diversos, ou porque imitam por modos diversos ¢ no da mesma Aritoteles Poetic fsbo, INCA 2016). p87. 7a Aquilo que esta aqui a ser defendido é que: Esta teoria ficou conhecida como teoria mimética’ da arte (ou teoria da arte como Imitagao). Note-se, contudo, que esta se limita a afirmar que todas as artes so imita Bes, mas ndo afirma que todas as imitag6es so arte. Ou seja, de acordo com a teoria mimética, a imitagao € uma condigao necessaria, mas ndo suficiente, para que algo seja considerado arte, Os contemporaneos de Plato e Aristételes elogiavam 0 talento do pintor grego Zeuxis pelo enorme realismo das suas obras. Diz-se que era capaz de pintar uvas tao real que os passaros tentavam comé-as, Ainda hoje hé quem diga que uma boa pintura deve assemelhar-se aos elementos retratados; ou que um filme é bom porque consegue captar a realidade tal como ela €. Além disso, ha quem considere que a pintura abstrata nio é arte, porque nao se parece com coisa alguma; ou que um filme no é arte, porque nao tem qualquer relacdo com a realidade. ‘A figura apresenta, lado a lado, um fotograma da gravacdo de um concerto 20 vivo da icénica banda Queen (a esquerda) e da fle Bohemian Rhapsody (2 direita) que retrata a vida e obra do vocalista da banda. Quem pensa que as semelhancas entre a cena retratada no filme e a realidade contribuem para o estatuto do filme enquanta obra de arte parece estar, em certa medida, 2 subscrever a teoris mimética da arte. A tearia mimética tem sido criticada por ser demasiade restrita, pois ex- clui do conceito de arte varias obras oriundas das artes nio imitativas, como 2 pintura abstrata, a arte decorativa, a arquitetura, a musica instrumental, a found art” e algumas formas de teatro, danca, cinema ¢ literatura, que nao tém qualquer intuito imitativo. Estas obras constitue! se como contraexem- plos dbvios & teoria mimética tal como esta foi defendida por Platao e Aris toteles Contudo, a tearia representacionista nao precisa de se cingir 4 represen- tacdo imitativa, pode adotar um sentido mais abrangente de representacéo, que inclui quer a representaco imitativa, quer a representacio nao imitativa. Uma tal teoria da arte pode ser genericamente formulada nos sequintes A teoria mimética exclui muitas obras de arte mas, visto que a nocdo de representagiio € mais ge- ral do que a nogSo de imitacao, talvez a teoria repre- sentacionista numa versio mais lata resista melhor a0s contraexemplos de que a teoria mimética Por exemplo, segundo a versio mais lata da teo. ria representacionista, tal como as cinco quinas da bandeira portuguesa nfo imitam Portugal, mas antes representam esse também a pintura abstrata de Mark Rothko nao imita a aparéncia das coisas. mas antes representa a sua esséncia Assim, embora nao possamos dizer que toda a arte implica imitagao, talvez possamos dizer que toda 10.Adimensio-catés Nota 7 Signifca literalmente «arte encontradar. Trata-se de um movimento atisico que con- siste essencialmente na apro- priaglo de objetos quotidianos (sem aterar as suas proprieda. des formais) ena'sua elevacio a categoria de obras de arte. a arte implica alguma forma de representagio. Serd a teoria representacionista numa verso mais lata verdadeira? (Qu sera que esta perspetiva também enfrenta sé- rias objecSes e contraexemplos? Vejamos em seguida igumas das principais obje- goes @ teoria representacionista Marcel Duchamp, Fonte (1917). Esta obra de Duchamp tomou-se, juntamente com outros dos seus ready-made, num dos expos! ‘maximos da found art, uma categoria atistica que consiste em expor como obras de arte objetos comuns do quotidian sem alterar a propriedades formais. 231 Dimensies da Agéo Humana dos Valores Criticas & teoria representacionista E demasiado restritiva Mesmo na sua verso mais lata, a teoria representacior isenta de obje- Bes, pols, uma vez que existem varias obras de arte que ndo so de todo representacées, ista nao est: pode consicierar-se que, ainda assim, esta teoria € demasiado restritiva. Apesar de pas sar a incluir algumas pinturas abstratas alegando que, embora no imitem a natureza das coisas, estas, de certa forma, podem representa-la, a teoria representacior a enfrentar alguns contraexemplos, pois continuam a existir obras de arte sem qualquer ista continua conteudo representative. Aarte como expressio Um dos grandes criticos da teoria representacionista da arte fol o fildsofo britanico R.G, Collingwood. No si ivro The Principles of Art (1938), Collingwood propbe-se responder de uma forma diferente @ questao: «O que € a arte?». A resposta de Collingwood ¢ uma das mais co- nhecidas versdes da chamada nos limitamos a dizer coisas sem sentido. G) Todas as obras de arte visual tam alguma propriedade comum. (De 1 e 2, por silogismo disjuntivo) (4) A propriedade comum a todas as obras de arte ¢ a forma significante, ou ¢ outra propriedade que no a forma significante, como a representaco ou a expressiio de emacbes. (5) A representacio e a expresso de emogfes so propriedades acidentais de algumas obras de arte e no propriedades essenciais comuns a todas elas. (6) Logo, a propriedade comum a todas as obras de arte é a forma significante. (De 4 © 5, por silogismo disjuntivo) 237 Dimensies da Agéo Humana dos Valores A premissa 1 coloca-nos perante um dilema: ha uma propriedade comum a todas as obras de arte — a esséncia da arte, ou essa propriedade comum nao existe e, portanto, 0 termo «artex no designa coisa alguma, é um termo vazio e sem sentido, A premissa 2 estabelece que 0 termo «arte» n3o € um termo vazio e sem sentido. Por exemplo, utilizamos corretamente esse termo para distinguir uma determinada classe de objetos: as obras de arte. De 1e 2 seque-se, por silogismo disjuntivo, que existe uma propriedacle comum a todas as obras de arte, uma esséncia da arte, ‘A premissa 4 procura elencar as principais alternativas a0 nosso dispor quando pre- tendemos encontrar uma propriedade comum a todas as obras de arte. Embora Bell nSo apresente claramente essas candidatas neste excerto, podemos inferir de outros pontos da sua obra que, além da forma significante, a representacao e a expresso s80 as tnicas alternativas que ele considera dignas de ser mencionadas. Na premissa 6 afirma-se que a representacdo e a expresso de emocées nao passam de propriedades acidentais de algumas obras de arte, no sendo, por isso, propriedades essenciais, comuns a todas elas, Por fim, na linha 6, conclui-se que a propriedade comum a todas as obras de arte 6 a forma significante, Mas por que raze nem a representacdo nem a expressiio de emocOes podem sercon- sideradas propriedades essenciais da arte? Ou seja, qual é a justificacdo da premissa 5? Bell descarta a representacilo e a expresso de emocdes como condicées suficientes para a arte, pois estas visam apenas descrever uma realidade factual e objetiva, ou uma realidade emocional e subjetiva. Contudo, na medida em que subjugam a forma a este tipo de propésito, estas obras revelam-se muitas vezes incapazes de desligar o espetador das emocées da vida e, por isso, ineapazes de provocar uma genuina emogao estética. As emobes da vida siio emogbes que sentimos perante acontecimentos, pessoas, objetos e situagSes do nosso quotidiano e ndo a emogde que sentimos perante a mera contempla- cdo de certas estruturas formals. Deste modo, Bell conclui que, apesar do seu conteudo representative ou expressivo, estas obras nae chegam, muitas vezes, a ter uma forma significante e, por conseguinte, nem sempre sao arte. Ora, se hé obras com conteddo representacional ou express vo que nao sao obras de arte, lento essas propriedades nao so condicées suficientes para aarte, Wiliam Powell Frith, A Estagd0 de Paddington (1866) De acardo com Bell. este tipo de pintura ndo ¢ arte, pois nela «linha @ cor server para relatar historietas, sugerirideias e mostrar os costumes de uma @poca — no sdo usadas para provocar emocSo estéticar. 1O.Adimensio estéties WwW Além disso, Bell defende que a representagio © a expresso de emocbes ndo so sequer eondi- Ses necessétias para a arte. Segundo Bell, quer © conteude representacional, quer © conteddo expressivo sao inteiramente Irrelevantes para 0 estatuto de uma pintura enquanto obra de arte As obras de arte primitiva s8o, na sua opiniso, bons exemplos dle obras de arte sem esse tipo de propriedades. Ora, se existem obras de arte sem contedido representative ou expressive, entSo es- sas propriedades nao sao condicées necessérias para a arte. Deste mado, exciuidas as principais alternativas _Bisonte, Gruta de Altamira, Espanha, Estima-se que esta peca de arte primitiva tenha sido pintada entre 14 500 e 12 000 ac. dignas de consideragao, Bell julga poder conch com seguranga que a Unica propriedade simutta- neamente necessaria e suficiente para a arte éa forma significante. Uma vez que abandona os requisites representacionistas e expressivistas das teorias anteriores, a teoria formalista resiste facilmente a alguns dos contraexemplos que essas perspetivas enfrentam. Além disso, niio exige que se tenha acesso as intengdes do seu criador para classificar um objeto enquanto obra de arte, tudo o que é preciso é estar desperto para as propriedades formais da obra e verificar por experiéncia prépria se estas provocam ou n3o uma emogao estética. Contudo, esta perspetiva também ni esta isenta de dificuldades. E delas que nos iremos ocupar em seguida. Criticas & teoria formalista ‘A argumentacdo de Bell assenta num falso dilema Um dos pressupostos centrais da argumentacio de Bell é o de que tem de haver uma propriedade comum a todas as obras de arte, ou quando falamos de arte no estamos a fazer sentido. Contudo, conforme vimos anteriormente (¢ veremos de forma mais detalha- da ja em seguida}, alguns filésofos da arte julgam que, embora nao seja possivel encontrar uma propriedade intrinseca comum a todas as obras de arte, isso nao significa que quan- do falamos de arte nio fazemos qualquer tipo de sentido, pois pode haver propriedades relacionais e contextuais as quais podemos apelar para distinguir as obras de arte de ou- tros tipos de objetos. Mas, assim sendo, parece que toda a argumentacao de Bell assenta num falso dilema. A definicdo de forma significante é viciosamente circular Bell define 2 nog3o de forma significante como uma configurac3e de linhas, cores, formas e espacos que tem a capacidade de provocar uma emogao estética no espets- dor, mas simultaneamente define emogae estética como 0 tipo de emogso que sentimos quando estamos perante certas configuragées de linhas, cores e formas, ou seja, quando ‘estamos perante uma forma significante. Ora, como se pode perceber esta definigae € viciosamente circular © pouco informativa. 239 Dimensies da Agéo Humana. dos Valores Hé obras de arte com formas indistinguiveis de objetos comuns Existem muitas obras de arte que tém exatamente as mesmas propriedades formais de certos objetos aos quais nao € reconhecide esse estatuto, come acontece, por exemplo, com os ready-made e outros exemplos da chamada found art, ou com uma obra genuina @ uma falsificacio muito bem executada. Se a unica coisa relevante para o estatuto de um objeto enquanto abra de arte fosse, efetivamente, as suas propriedades formais, enti no poderia haver obras de arte com as mesmas propriedades formais que certos objetos comuns, aos quais no é reconhecido esse estatuto © as falsificagbes muito bem executadas seriam igualmente obras de arte. Portanto, as propriedades formais de um objeto niio sio a tinica coisa relevante para o seu estatuto enquanto obra de arte. © contetido pode ser relevante para o estatuto de uma obra enquanto obra de arte ‘Ao contrario do que é defendido por Bell, ¢ muitas vezes impossivel apreciar o valor de uma obra de arte concentrando-nos apenas nas suas propriedades formais e ignoran- do inteiramente © seu conteudo representativo ou expressive. O que ha de apelativo em muitas formas é justamente 0 modo inteligente e cativante como do corpo a determina- dos contetidos. Nesses casos, forma e contetide tornam-se inseparaveis a ponto de ser impossivel sustentar que © contetido é irrelevante para a apreciagio da obra. E como se quando estamos a apreciar arte tivéssemos em mente a seguinte pergunta: «Ser que o artista escolheu uma forma apropriada para manifestar um determinado conteddo?». Por exemplo, se prestarmos aten¢So ac quadro Paisagem com Queda de fcaro, de Brueghel, © Velho, acabamos por reparar que retrata o modo como uma cena tranquila © pacifica do quotidiano coexiste, muitas vezes, com acontecimentos lendarios, sem que ninguém dé por isso. E que, no canto inferir direito (destacado com a circulo a amarelo na figura), vemos © corpo de Icaro, praticamente tode submerso (apenas a perna ainda nio submergiu). Na mitologia grega, icaro era um rapaz que tinha umas asas feitas de penas unidas com cera. O jovem ignorou as recomendagées do pai e voou demasiado perto do Sol. O calor fez com que a cera das asas derretesse e icaro acabasse por cair desam- parado € morrer, Segundo o formalismo, quadros como este so obras de arte, porque possuem forma significante, ¢ no em virtude do seu conteddo representacional. Mas a verdad € que a estrutura formal do quadro depende, em ultima andlise, do seu conted- do representacional. A forma e 0 conteido so, de certa maneira, inseparaveis. O qua. dro exibe forma significante, porque existe uma interessante tensiio estrutural entre dois centros narratives. E essa tens30 que da & obra um toque de ironia. Logo, 0 conteddo representacional nem sempre é irrelevante para a apreciacao artistica de uma obra Pieter Brueghel, o Velho, Paisagem com Queda de (caro (c. 1558) 10.3 Teorias nao essencialistas: teoria institucional e a teoria histérica A teoria institucional da arte Na década de 1950, num importante ensaio intitulado «O Papel da Teoria ha Estética», o filésofo da arte Morriz Weitz sustenta que o fracasso das teo- rias essencialistas da arte se deve ao facto de todas elas assumirem errada- mente que existe um conjunto de condicdes necessdrias e suficientes para a arte. Weitz considera que nao devemos procurar uma caracteristica que seja partithada por todos os objetos artisticos, pois no s6 isso ndo se verifica, como teria uma implicacao indesejavel caso se verificasse: estaria a impor —_Mortiz Weitz (1916-1981) limites a uma atividade que se caracteriza justamente pela sua abertura a mudanga, 2 expansao e a inovacao. Assim sendo, Weitz rejeita qualquer definicao essencialista, por considerar que, a0 indicar as propriedades que as criacdes deveriam possuir a fim de poderem ser conside radas obras de arte, este tipo de perspetiva tem um efeite castrador da criath artistas. A posi¢ao de Weitz ficou conhecida como . lade dos Contude, a0 contrario de que se possa super, do facto de no ser possivel fomecer uma definicdo essencialista da arte nio se segue necessariamente que nenhuma defi nigao de arte passa ser encontrada. As definig6es essencialistas caracterizam-se por apresentar condicées necessérias e suficientes para as obras de arte serem considera das como tal; trata-se de propriedades que todas as obras de arte e s6 as obras de arte exibem, ¢ nao poderiam deixar de exibir sem que, por esse motivo, deixassem de ser obras de arte. No entanto, apesar de nao ser facil encontrar propriedades que todos os objetos artisticos exibam, talvez seja possivel encontrar uma definicdo de arte que assente néio em propriedades intrinsecas e manifestas dos objetos, artisticos, mas sim em propriedades extrinsecas e relacionais, isto é. que nao sejam inerentes ao préprio objeto em si mesmo considerado, mas que dependam fundamentalmente do tipe de relacdes que este estabelece com outras realidades. E justamente este tipe de sugestdo que Arthur Dante apresenta no seu ar- tigo de 1961 intitulado «© Mundo da Arte». Nesse artigo, Danto analisa a obra Caixa de Brillo, de Andy Warhol, e conclui que aquilo que distingue a obra de tidiano nao sto as suas caracteristicas formais, nem quaisquer outras caracte- risticas que the sejam intrinsecas, mas sim 0 facto de esta se inserir no con- texto de uma pratica social instituida — 0 mundo da arte. Andy Warhol, Caixa de Brill (1964) Wathol dos seus semelhantes no quo- arthur Danto (1924-2013) 241 ff Dimensies da Agéo Humana. dos Valores 242 Com este artigo, Danto chamou a atencio para a natureza institucional da arte e, em 1974, 0 filésofo americano George Dickie formulou de modo articulado a primeira teoria institucional da arte. De acordo com esta teoria: Esta definicio estabelece duas condicées necessarias conjuntamente suficientes para que algo seja arte. O primeiro requisito € o da artefactualidade. Tradicionalmente, a pala- ra «artefacto» é utizada para designar um abjeto construlde ou transformado por mos humanas. Contudo, 0 sentido que Dickie atribui a nogSo de artefacto é bastante mais lato do que o tradicional, pois este considera que, para além dos objetos materiais concretos produzides ou transformados pelos setes humanos. também os movimentes de uma co- reografia, ou as notas musicais numa dada melodia, por exemplo, sdo artefactos; e mesmo objetos que nao foram manufaturados ou cujas propriedades formais nao foram altera- das pela intervengio direta de um ser humano podem, em determinados contextos, adqui- fir o estatuto de artefacto, por serem utilizados de certa maneita por alguém, Por exemplo: se poder fas de arte foram criados com a intenco séria de que fossem vistos como as obras de arte precedentes. Por exemplo, algumas estatuas de deménios, escu dos e capacetes de guerreiros destinavam-se a assustar e afastar os seus observadores, nao € reconhecidamente uma das formas de encarar corre Cor mente as obras de arte precedentes. A luz da teoria historia legitimamente considera br jeriam 0 de, ha obje' conhecid @ independentemente das intencdes seus criadores. Alem disso, também ha quem veja na condigae dos direitos de propriedade um fat de exclusSo excessiva. Vejamos por exemplo o graffiti. Os graffiters fazem as suas criag sticas em tdnels, carruagens de comboio e metro, casas e fachadas que nao Ihes pe néio podem ser considerad: se Picasso tivesse pintado ilegalmente a ral de uma carruagem de + considerad: ea ta deixaria de po ma ser exatame a? Estas m sugerir que a teoria exclui arbitrariamente do conceito de arte algumas obras simplesmente porque o artista nao é proprietario dos melos de produgao (nem tem qualquer outro tipo de direito sobre a uttizag3o dos mesmos)

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