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Overlord - Volume 05 - Os Homens Do Reino - Parte 1
Overlord - Volume 05 - Os Homens Do Reino - Parte 1
do Reino | 1
オーバーロード Ilustrado por so-bin
Aviso Legal:
A tradução de OVERLORD — para inglês e português — é feita e revisada de fã para fã,
não monetizem em cima da obra e não compactuem com quem o faz. Se quiserem e pu-
derem contribuir com o autor, comprem o livro ou ebook (japonês, inglês ou português)
em sua livraria de preferência.
Sobre:
A obra faz uso de muitos anglicismos, ainda mais por se basear em RPGS, então há mui-
tos termos em inglês e tentei preservar vários desses aspectos em alguns termos, nomes
de armas, itens, raças e coisas do tipo.
Claro, algumas coisas precisam de adaptação, outras é preciso generalizar. Dito isso,
pode não agradar aos adeptos do Dia do Saci em vez do Halloween. Estejam avisados.
Créditos:
CRÉDITOS PT-BR:
ainzooalgown-br.blogspot.com
CRÉDITOS EN-US:
skythewood.blogspot.com
REFERÊNCIA DE NOMES:
overlordmaruyama.wikia.com
Atenção: Se baixou este arquivo de outro link que não o oficial do blog. Ou se tem muito
tempo que baixou e deixou guardado, que tal dar uma conferida no blog? Talvez esta seja
uma versão desatualizada :)
Autor:
Maruyama Kugane
Ilustrador:
so-bin
Prólogo
1º Dia do mês Baixo Fogo (9º mês) – 14:15
uando ele olhou para cima, uma leve garoa começou a cair das nuvens es-
Q curas que cobriam o céu desde a manhã de hoje, como se não pudessem
mais conter toda a precipitação.
Ele olhou para cima novamente e viu que as nuvens enchiam o céu acima de Re-Estize,
a capital real do Reino. A chuva começou a cair e dificilmente pararia por agora.
Portanto, ele decidiu não ficar no Palácio Real. Depois de vestir o capuz de sua capa, ele
saiu para a chuva.
Os guardas do portão abriram caminho quando o viram e ele entrou na estrada princi-
pal da Capital Real.
Normalmente estaria bem movimentada, mas agora não havia quase ninguém, apenas
alguns pedestres andando na estrada encharcada, tomando cuidado para não escorre-
garem.
Não havia quase ninguém por perto e a chuva já caía há algum tempo.
Bem, acho que realmente não teria adiantado... Se eu tivesse saído mais cedo, a chuva me
pegaria no meio do caminho.
A chuva intensa encharcava o exterior de sua capa fazendo com que ficasse pesada. Ele
caminhou silenciosamente através da chuva, passando por vários outros que estavam
igualmente vestidos com roupas de chuva. Mesmo que seu manto lhe desse uma certa
de proteção contra a chuva, a sensação pegajosa do pano úmido contra a pele era des-
confortável. Gazef apressou os passos e foi para casa.
Gazef soltou um suspiro de alívio quando se aproximou de casa e se livrou da capa en-
charcada. Só então, algo chamou sua atenção. Um homem imundo estava sentado em um
beco, sem se importar com a chuva que envolvia o mundo como um véu, estava atrofiado
em um canto que ficava a uma curta distância da estrada principal.
O cabelo do homem parecia ter sido tingido a esmo, e podia-se ver a cor original nas
raízes. Seu cabelo estava grudado na testa pela chuva e coberto de gotas de água. Sua
cabeça estava baixa e seu rosto não podia ser visto.
A atenção de Gazef foi atraída para ele, Gazef estava intrigado com a forma como o ho-
mem não estava usando qualquer capa de chuva e parecia totalmente alheio com o fato
Prólogo
6
de estar completamente encharcado. Algo parecia se destacar em sua imagem — parti-
cularmente sua mão direita, que mais chamava atenção.
A mão direita apertava com força uma arma, como uma criança agarrada à mão da mãe.
Parecia bastante incongruente com a aparência desgrenhada do homem. Era uma arma
que vinha dos distantes desertos do sul, um tesouro raro e precioso conhecido como
Katana.
Ele está segurando uma espada... é um bandido? Não... não é isso que sinto. Ele não é nada
disso. Parece quase quê... nostálgico?
Um sentimento bizarro cresceu no coração de Gazef. Algo estava errado aqui, como se
ele tivesse abotoado a camisa com os botões na ordem errada.
Gazef prestou atenção no perfil do homem. Quando se deu conta de quem era, as lem-
branças tomaram conta dele como o quebrar de uma grande onda.
A imagem do homem que lutou tão ferozmente e tão intimamente com ele ainda estava
marcada na mente de Gazef. Ele tinha sido o guerreiro mais forte que Gazef já havia en-
frentado desde que passara a lutar. Talvez fosse apenas um pensamento desejoso da
parte de Gazef, mas ele considerava que Brain era um adversário digno e não conseguia
esquecer o rosto do homem.
Sim, o perfil emaciado do homem diante dele era mais ou menos semelhante ao de seu
rival.
Suas características faciais eram muito semelhantes. Os anos poderiam tê-lo mudado,
mas Gazef ainda se lembrava da maneira como ele parecia naquela época. No entanto, o
homem na memória de Gazef não tinha uma expressão tão patética no rosto. Aquele ho-
mem estava absolutamente confiante em sua esgrima e seu espírito de luta queimava
latente como um inferno. Ele não parecia em nada com esse homem patético.
Com a água caindo ao redor dele, Gazef caminhou em direção ao homem em questão.
No entanto, o Brain diante dele havia perdido o brilho de outrora, agora não passava de
um pedinte, um cachorro de rua.
Sua forma foi se desvanecendo na chuva. Gazef teve a sensação de que, se deixasse Brain
ir agora, nunca mais o veria, por isso gritou apressadamente:
Se o homem tivesse dito: “Me confundiu com outro”, Gazef teria dito a si mesmo que
tinha visto apenas alguém parecido com ele. Porém, uma voz fraca e trêmula, como o
zumbido de um mosquito, penetrou nos ouvidos de Gazef.
“...Stronoff?”
A voz foi totalmente sem vida. Completamente diferente da voz do Brain que apontou
a espada para ele.
Qualquer homem poderia sucumbir, não importando quem fosse. Gazef tinha visto mui-
tas pessoas assim. Aqueles que queriam fugir das coisas e buscar refúgio na mediocri-
dade muitas vezes perdiam tudo cometendo um único erro.
No entanto, ele não conseguia conectar pessoas assim a Brain Unglaus, afinal ele era o
espadachim gênio. Talvez ele não quisesse admitir que seu rival mais forte poderia ter
se degenerado a este ponto.
Suas bochechas estavam vazias e havia olheiras sob seus olhos. Os ditos olhos estavam
sem vida e seu rosto estava pálido. Ele parecia um cadáver.
Prólogo
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Não, até um cadáver seria melhor que isso... Unglaus, parece que você morreu e esquece-
ram de te enterrar...
“O quê?”
A primeira coisa que Gazef fez quando ouviu isso foi olhar para a espada na mão de
Brain. E então, Gazef percebeu que estava enganado. Não foi sua espada que foi quebrada.
Ele pensou no incidente do Vilarejo Carne. Naquela época, ele teria morrido com seus
homens se o poderoso magic caster chamado Ainz Ooal Gown não viesse salvá-los. O
homem conhecido como o Mais Forte do Reino só pensava nisso. Ele não se atrevia a falar
com orgulho de sua força.
Gazef não sabia como Brain havia interpretado seu silêncio, mas o outro homem conti-
nuou:
“Fracos! Somos tão fracos... No fim, somos apenas humanos. Nossas habilidades de es-
pada não passam de lixo. Humanos pertencem— a uma raça inferior.”
Isso era óbvio quando eles eram comparados aos Dragões, a raça mais poderosa. Os
humanos não tinham escamas robustas, garras afiadas ou asas para levá-los através dos
céus. Nem poderiam expelir uma respiração destrutiva. Como os humanos poderiam
competir com coisas assim?
Foi por isso que os guerreiros frequentemente desafiavam os Dragões para provar sua
força. Confiar na experiência, companheiros e as armas para derrotar um inimigo com
uma enorme vantagem nas habilidades físicas era glorioso, uma realização da qual ape-
nas alguns guerreiros excepcionais poderiam se orgulhar.
Será que ele alcançou um pico muito grande, porém tropeçou e assim caiu?
“...Não sei bem. Qualquer guerreiro deveria saber disso, não? Os humanos sempre fo-
ram fracos.”
De fato, ele não entendeu. Todos estavam familiarizados com o conceito de um pico
inacessível.
Por exemplo, poderia haver um guerreiro que fosse mais forte que Gazef, escondido na
Teocracia. Além disso, demi-humanos como Ogros e espécies gigantoides tinham melho-
res habilidades físicas do que Gazef, um humano. Portanto, se essas raças conseguissem
avançar suas habilidades para igualar as de Gazef — ou até mesmo se suas habilidades
fossem um pouco inferiores às deles — ele não seria capaz de vencê-las.
Gazef sabia que tais picos existiam mesmo que não pudessem ser vistos. Será que Brain
não entendeu isso? Parecia senso comum para qualquer guerreiro.
“Bem, existem raças mais fortes que nós. É por isso que treinamos para derrotá-las,
não?”
E então, Brain sacudiu a cabeça com força. A água do cabelo encharcado de chuva es-
pirrou em todas as direções.
“Stronoff! Não dá pra vencer o verdadeiro poder mesmo que treine até desmaiar! Hu-
manos são fracos diante do verdadeiro poder. Nossa força é piada, é brincadeira de cri-
ança pra eles. A gente não passa de garotinhos brincando de guerreiros!”
“...Me escute aqui, Gazef. Você é confiante nas suas habilidades de espada, né? Pois é...
mas não passa de lixo. E você acha mesmo que esse lixo protege alguém!?”
“Eu vi sim. Senti na pele. Um pico tão alto que nenhum humano pode subir. Ou melhor...”
Prólogo
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“Eu só tive um gostinho. Nem mesmo fui capaz de ver onde o pico terminava. Ela brin-
cou comigo. Não passei de piada.”
“Então você deve treinar com mais afinco, na esperança de um dia poder—”
“Você tá surdo!? Humanos jamais poderão sequer chegar perto daquele monstro! Pode
treinar pela eternidade, e mesmo assim não vai adiantar! ...É inútil. Eu perdi tanto tempo
treinando pra quê?”
Ele tinha visto pessoas com cicatrizes na alma antes. Essas pessoas perderam toda a
esperança na vida porque seus amigos morreram diante deles.
Ninguém poderia salvá-los. Ninguém mais poderia ajudá-los. Eles teriam de superar
isso e se recompor novamente. Caso contrário, não havia sentido em estender uma mão
amiga a eles.
“...Unglaus.”
“...Stronoff. A força da espada não é nada. Diante do verdadeiro poder, não é nada além
de lixo.”
Gazef não viu nenhum sinal do rosto heroico que outrora fôra Brain.
Depois de ver os restos patéticos e totalmente quebrados do homem que um dia ele
considerara seu rival mais forte, Gazef não conseguiu mais chamar sua atenção. Contudo,
ele disse uma coisa antes de sair; uma coisa que Gazef não podia fingir que não ouvira.
O andar vacilante de Brain não era nada parecido com quem ele tinha sido no passado.
Mesmo assim, quando Gazef puxou seu ombro com toda a força, ele perdeu o equilíbrio,
Isso deixou Gazef um pouco à vontade. Seus instintos lhe disseram que a força de seu
rival não havia diminuído.
Ainda havia esperança. Ele não podia ver um homem morrer assim.
“Não. Não quero sua ajuda. Eu só quero morrer... cansei de viver com medo. Não
aguento mais me esconder nas sombras vendo vultos atrás de mim. Tô de saco cheio da
realidade. Me machuca lembrar que um dia bradei esse lixo e achei que era alguém.”
Mesmo dizendo a Brain para segui-lo, na verdade, Gazef estava apenas arrastando Brain
pelo braço. Os passos de Brain eram instáveis, mas ele não resistiu e seguiu obediente-
mente. Depois de ver Brain assim, um sentimento de desagrado cresceu em Gazef que
ele não conseguia articular.
“Não fique assim, quando chegar lá você vai comer algo e dormir um pouco.”
A capital dessa nação de nove milhões de pessoas poderia ser melhor descrita como
uma cidade envelhecida. Isso não apenas descrevia sua longa história, mas sugeria que
a vida aqui era simples, imutável e estagnada como sempre foi — entre outras coisas.
As casas ao redor eram velhas e simples para a maioria dos cantos que alguém olhasse.
Quase nenhuma era nova ou chique. No entanto, havia muitas maneiras de ver esse ce-
nário. Alguns considerariam que seria rico em sabor histórico, enquanto outros o consi-
derariam entediante e obsoleto.
A Capital Real parecia ser a mesma de sempre, perdurando estação após estação ao
longo dos séculos.
Prólogo
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♦♦♦
Muitas estradas na Capital Real não eram pavimentadas, e toda vez que a chuva caia,
elas se transformavam em lamaçal, criando assim uma visão que não pertencia a uma
cidade. Claro, isso não significa que os padrões do Reino fossem baixos. Pelo contrário,
os padrões do Império e da Teocracia eram altos demais, de modo que nem sequer po-
deriam ser comparados.
As ruas também não podiam ser consideradas largas. Logicamente, ninguém andava no
meio da estrada — onde as carruagens passavam. Em vez disso, os cidadãos se esfrega-
ram em procissões confusas nos lados das ruas. Os cidadãos da Capital Real estavam
acostumados a isso e podiam atravessar a massa humana como a lançadeira de um tear
através da trama de fios. Mesmo quando duas pessoas estavam prestes a colidir umas
com as outras, elas esquivavam momentos antes do impacto.
No entanto, a rua onde Sebas estava andando era bem diferente das outras. A superfície
era pavimentada — uma raridade na capital — e a estrada em si era larga.
A razão para isso ficou imediatamente aparente quando observava os dois lados da rua.
As casas ao longo desta rua eram régias e bem mobiliadas, irradiando uma atmosfera de
riqueza e prosperidade.
Algumas senhoras se viraram para observar enquanto Sebas passeava em grande estilo,
atraídas por seus traços bonitos e seu distinto porte cavalheiresco. Algumas até lança-
ram piscadelas com seus longos cílios para ele, mas Sebas não lhes deu atenção. Ele con-
tinuou em frente com as costas retas, olhos fixos e passos ordenados sem muita pressa.
Seu passo inexorável — que não aparentava sinais de parar antes de chegar ao seu des-
tino — de repente parou. Então, ele olhou para os dois lados, examinando as carruagens
que se aproximavam de ambas as direções, e então atravessou a rua principal.
Ele caminhou em direção a uma velha senhora. Havia uma bolsa cheia de mercadorias
no chão, e a velha senhora estava massageando os tornozelos.
“É algo sério?”
A velha senhora foi surpreendida quando alguém subitamente a abordou. Ela levantou
a cabeça, um olhar cauteloso em seu rosto. No entanto, o olhar de Sebas e seu estilo opu-
lento de vestir fizeram essa cautela desaparecer.
“Por favor, não se incomode. Afinal, ajudar os que estão com problemas é bom senso.”
Sebas sorriu de maneira uniforme e a senhora corou. Aquele sorriso encantador, vindo
de um distinto cavalheiro como ele, rompeu as barreiras finais de seu coração.
A senhora tinha vindo com pressa, estava a caminho de casa depois de um longo dia de
trabalho. No entanto, ela torceu o tornozelo no meio do caminho, o que a irritou muito.
As ruas principais eram comparativamente seguras, mas isso não implicava que todas
as pessoas que a percorriam fossem de boa índole. Se ela pedisse ajuda à pessoa errada,
poderia acabar perdendo tudo o que tinha. A senhora tinha ouvido falar de tais roubos
antes, razão pela qual ela estava desconfiada de pedir a alguém.
“Claro. Tendo encontrado alguém que precisa de ajuda, fico contente em ajudar.”
“Mas... mas...”
Contudo—
O que importava se suas roupas ficassem sujas? Não havia necessidade de se preocupar
com essas ninharias ao ajudar alguém em necessidade.
Prólogo
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Ajudar os outros era a coisa certa a fazer.
Depois de persuadir a senhora, ele a carregou de costas e levantou a bolsa com uma das
mãos.
Prólogo
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Parte 1
homem acendeu a lanterna que pendia de sua cintura. Usava um óleo es-
O pecial como combustível, produzia uma chama verde e emitia uma luz de
aparência assustadora que iluminava o ambiente.
“Se viesse uma chuvinha seria bom. Daria um chega pra lá nesse calor.”
Ele olhou para o céu quando disse isso. O céu estava limpo; não havia nuvens e muito
menos sinais de nuvens de chuva. As constelações pareciam anormalmente grandes, mas
era simplesmente o céu noturno habitual.
“Sim, até mesmo chuvisco já ia ajudar... fazer o quê, né? Hora de trabalhar.”
Não seria correto descrever esses homens como aldeões comuns. Para começar, eles
estavam armados. Usavam armaduras de couro e tinham espadas longas na cintura; mi-
litarizado demais para os guardas comuns de aldeias. Além disso, seus rostos e corpos
não se pareciam com os dos agricultores, mas insinuavam uma familiaridade com a vio-
lência.
Envolto na noite, o vilarejo ficou em silêncio, exceto por seus passos. Eles avançaram
firmemente em meio a essa atmosfera sinistra, como se fosse um local abandonado. Suas
atitudes calmas sugeriam que patrulhas como essas eram rotina para eles.
O vilarejo em que entraram estava cercado por um muro alto e havia seis torres de vigia
à vista. Elas pareciam robustas e bem construídas; vilarejos fronteiriços que eram fre-
quentemente atacados por monstros não ostentavam torres de vigia tão formidáveis.
Mesmo assim, um terceiro pode considerar apenas que se tratasse de um vilarejo bem
fortificado. No entanto, olhando mais atentamente mostrava algo digno de levantar as
sobrancelhas.
Os homens que caminhavam por esse estranho vilarejo sentiram alguém olhando para
eles de uma torre de vigia. Havia arqueiros nas torres. Tudo que precisavam fazer era
levantar a lanterna para o alto em caso de emergência, e seus amigos iriam a seu auxílio.
Dito isso, quando se pensava sobre as habilidades de seus colegas, não havia como ficar
empolgado em relação ao fogo de cobertura dos disparos de flechas. No entanto, ele se
tranquilizava pelo fato de que seus amigos poderiam acordar seus companheiros ao to-
car o alarme.
Seus colegas — que dormiam entre os turnos — lhe dariam uma bronca se ele erguesse
a lanterna por engano. Claro, o homem estava determinado a acenar ao menor sinal de
que algo estava errado.
Ele não queria morrer por ter cometido algum deslize, por menor que fosse.
Dito isso, ele na verdade não achava que algo ruim aconteceria. Eles estavam realizando
as mesmas patrulhas por vários meses, e ele imaginou que essas patrulhas continuariam
para sempre.
Enquanto considerava o seu futuro com desgosto, ambos continuaram a lenta cami-
nhada através da rota habitual.
Na metade de sua patrulha, algo como uma serpente de repente se enrolou no pescoço
do homem. Não— não era uma cobra. O objeto que envolveu sua boca e não soltou era
quase que um tentáculo de polvo.
Logo depois que levantou o queixo do homem, uma dor lancinante floresceu sobre a
garganta exposta. Essa sequência de ações levou menos de um segundo.
♦♦♦
A mão segurando sua boca o soltou, apoiando-o por trás para que ele não caísse no chão.
Depois de verificar que o homem havia sido completamente exsanguinado, seu agressor
[ L â m i n a V am pir a ]
retirou a Vampire Blade, a arma que o matou.
O ser segurando o homem na posição vertical era uma figura de preto. Seu corpo inteiro
estava obscurecido em vestes pretas, exceto seus olhos. A referida roupa era feita de
tecido, com manoplas e outras peças de armadura para melhorar a capacidade defensiva.
Uma placa de metal cobria seu peito, mas se projetava visivelmente, dando a forma de
um par de seios femininos.
Outra figura similarmente vestida surgiu das costas do outro homem. Bem semelhante
a seu par, também usava um peitoral de metal. A primeira olhou para a segunda e assen-
tiu.
Ela examinou seus arredores depois de verificar a morte silenciosa de sua vítima. Apa-
rentemente ninguém havia notado.
Ela não prestou atenção ao punhal, cuja tonalidade vermelha brilhante se tornara ainda
mais vibrante após a drenagem do sangue, e segurava o corpo do homem antes que ele
desmoronasse.
Algo tinha que ser feito imediatamente. Mas esse não era o trabalho delas.
De repente, a mulher sentiu o corpo flácido do homem deslizar sob suas mãos, como se
alguém tivesse colocado uma estaca nele. No momento seguinte, ela sabia que não estava
enganada; o homem balançou em movimentos truncados.
O homem ainda estava se movendo apesar de estar claramente morto, mas a mulher
não ficou alarmada. Tudo estava acontecendo como planejado.
Para um simples observador, havia apenas dois homens aqui. Mesmo se visse através
da camuflagem das mulheres, haveria apenas quatro pessoas aqui. No entanto, havia
uma quinta pessoa presente. Esta quinta pessoa foi a responsável por criar este Zombie.
As mulheres não a enxergavam, mas uma das habilidades ninja que aprenderam per-
mitiu-lhes detectar a presença daqueles que estavam escondidos por magia ou outras
habilidades, e uma dessas entidades estava diante delas.
“Perfeito.”
“Unhum, eu sei, estava de olho em vocês. Vou para o próximo local. Precisamos pegar
todos os peixes grandes daqui.”
Outra voz feminina falou. Essa, porém, mais aguda. Tinha um ar de imaturidade, como
uma criança.
“Duvido muito. Na verdade, se esconderam perto do vilarejo, estão à espera lá. Se surgir
alguma emergência, elas lançarão um ataque frontal coordenado com vocês para um ata-
que de pinça. Enfim, estou indo em direção a Prioridade Um. Atenham-se ao plano.”
A presença se afastou ainda mais, até que ela desapareceu na construção que designara
como Prioridade Um. Esta era uma das estruturas dentro do vilarejo e um ponto chave
que tinha que ser tomado.
Na verdade, outros edifícios deveriam ter prioridade mais alta, mas este lugar tomou
precedência sobre os outros uma vez que o problema da magia 「Message」 entrava em
jogo.
Muitas pessoas consideravam essa forma de comunicação mágica como não confiável
e, portanto, raramente era usada. Ainda assim, havia outros que não partilhavam dessa
opinião. Por exemplo, havia o Império e seu quadro de magic casters treinados nacional-
mente, um certo número de operadores importantes que valorizavam a recepção rápida
de informações e, em seguida, os inimigos que controlavam esse vilarejo. Portanto, sua
principal prioridade era apreender o pessoal das comunicações dentro daquela constru-
ção.
Já que sua colega já estava a caminho, elas precisavam se esconder perto do objetivo o
mais rápido possível. Isso porque elas tiveram que agir simultaneamente e lançar seu
ataque antes que o inimigo descobrisse sua presença.
Pessoas normais não conseguiriam notá-las pulando entre as sombras. Além disso,
quando usavam os itens mágicos que carregavam consigo, até mesmo aventureiros de
alto nível teriam dificuldade em identificá-las. Em outras palavras, ninguém no vilarejo
poderia detectá-las.
Uma delas mostrou uma série de sinais manuais para a outra enquanto corria. Embora
fosse apenas uma série de movimentos de flexão de dedos, o significado ficou imediata-
mente claro.
Se os patrulheiros trouxessem cães consigo, os assassinatos não teriam sido tão fáceis.
Elas tinham maneiras de lidar com cães, mas era melhor não ter que lidar com mais pro-
blemas.
Com isso ela ficou sozinha enquanto avançava. Os campos estavam em sua visão peri-
férica, ela deu uma olhadela neles.
Esses campos não cultivavam trigo, grãos ou hortaliças. As plantas lá eram o ingredi-
ente básico para uma droga proibida, cuja propagação estava em ascensão em todo o
Reino, chamada “Pó Preto”. Havia muitos desses campos dentro destes muros, e todos
cultivavam a mesma colheita. Isso provou que este vilarejo era um centro de cultivo de
drogas.
♦♦♦
A droga conhecida como Pó Preto também era chamada de Pó de Lailah. Era uma subs-
tância preta e pulverulenta que era dissolvida em água ou drinks.
Era uma droga fácil de produzir em massa, barata e dava aos seus usuários acessibili-
dade a uma grande sensação de intoxicação. Assim, tornou-se uma das drogas mais fa-
mosas do Reino. Embora fosse tóxica além dos efeitos acima mencionados, seus usuários
frequentemente acreditavam que não tinha efeitos colaterais, e isso os levou a abusar de
seu consumo sem se acanhar.
Todas as drogas tinham efeitos colaterais. “Eu posso parar de usar quando quiser” era o
material dos delírios de um louco. Depois de dissecar os cadáveres dos viciados em Pó
Preto, descobriram que seus cérebros tinham encolhido para ⅘ do tamanho esperado
em uma pessoa saudável.
Já o Pó Preto onipresente nas ruas era mais um narcótico feito a partir do cultivo de
uma planta, sua potência era reduzida.
A parte mais problemática sobre drogas como essas eram seus sutis sinais de depen-
dência. Mesmo os usuários em uma badtrip não mostravam sinais de violência física e
nem mesmo prejudicavam os outros. Assim, o alto escalão do Reino não entendia o pe-
rigo do Pó Preto e praticamente devem um aval silencioso de seu uso indiscriminado.
Não era de admirar que o Império tivesse apresentado queixas formais sobre o assunto,
sob a suspeita de que o Reino estava apoiando uma indústria clandestina de drogas.
Nos tempos que agia como assassina, ela usou Pó Preto em algumas ocasiões, e sua or-
ganização cultivava as plantas necessárias para fazê-lo. Como resultado, ela não se opu-
nha pessoalmente à substância. Drogas como essa podem ser usadas de maneira eficaz
se aplicadas adequadamente. Simplesmente uma erva medicinal perigosa.
No entanto, ela havia sido contratada para esse trabalho e sua opinião pessoal em nada
influenciaria. Ainda assim—
...Solicitações que não passam pela Guilda dos Aventureiros são um pouco perigosas.
Ela franziu a testa sob o pano cobrindo o rosto. A solicitante desse trabalho era amiga
da líder de sua equipe. Ela tinha absoluta certeza que seria remunerada por isso, mas
não passar pela guilda poderia causar problemas. Ainda mais que faziam parte de uma
das duas equipes de aventureiros adamantite do Reino.
Enquanto pensava sobre a mais nova equipe de aventureiros adamantite, ela chegou ao
edifício designado “Nº Dois”.
Sua tarefa era recuperar toda a inteligência dentro desse prédio e, depois, incendiar os
campos.
A fumaça espessa emitida pelas drogas queimadas era venenosa, mas tinha que ser feito
para completar a missão.
Era bem possível que o vento pudesse levar a fumaça em uma direção que prejudicasse
os aldeões, mas elas não tinham tempo nem capacidade de evacuar as redondezas.
Dizendo isso para si, ela descartou todos os pensamentos sobre a segurança dos aldeões.
Ela foi treinada como assassina desde a infância, e a morte raramente incomodava seu
coração. Em particular, ela não se importava com os tristes destinos de estranhos, inde-
pendentemente das tragédias que os atingissem. A única coisa que ela não gostava era o
olhar no rosto de sua líder sempre que alguém tinha que ser sacrificado. No entanto, ela
havia obtido a aprovação de sua líder durante a elaboração deste plano, então a idéia de
salvar os outros nem sequer passou pela sua cabeça.
Mais importante, depois que o ataque fosse completado, elas precisariam usar magia
de teletransporte para irem queimar outros vilarejos. Ela só pensava no plano, era pre-
ciso guardar seu físico para cumprir tudo com maestria.
Este não era o único local que cultivava matéria-prima para a droga. De acordo com
suas pesquisas, havia no mínimo dez plantações em grande escala dentro do Reino, sem
contar outras em menor escala. Caso contrário, os cartéis não seriam capazes de susten-
tar as enormes quantidades de drogas sendo traficadas por todo o Reino.
Enquanto não cortamos o mal pela raiz, temos que continuar com isso... pode ser em vão,
mas é tudo que podemos fazer...
No melhor cenário possível, elas encontrariam documentos com ordens dentro do vila-
rejo, mas isso era bem improvável. Tudo o que podiam fazer era esperar que o supervi-
sor do vilarejo, ou equivalente, tivesse informações de importância semelhante.
A organização criminosa que cultivava essas drogas era conhecida como Oito Dedos. O
nome veio do Deus dos Ladrões, e seus oito dedos, que era um vassalo do Deus da Terra.
Era um vasto sindicato criminoso que dominava o submundo do Reino.
Esta organização estava dividida em oito divisões, tráfico de escravos, assassinato, con-
trabando, roubo, tráfico de drogas, segurança, finanças e jogos de azar. As oito divisões
trabalhavam juntas no Reino, como os chefes coletivos do crime. Devido ao tamanho de
sua organização, toda a extensão de seu poder estava velada em sigilo.
Contudo, havia um sinal claro da extensão da influência dentro do Reino. E esse era o
vilarejo diante de seus olhos.
Eles estavam cultivando abertamente plantas de contrabando nos vilarejos. Só isso era
prova de que os lordes destas terras estavam em conluio com eles. Entretanto, mesmo
um inquérito oficial não daria frutos.
Havia limites para as ações legais que poderiam ser tomadas e, mesmo se alguém qui-
sesse interromper o fluxo de drogas, o processo seria impedido por nobres corruptos
alinhados à organização. A situação havia se deteriorado ao ponto de que, aqueles que
estavam do lado certo da lei, ficavam de mãos atadas.
Portanto, quando a leis não os levara a lugar algum, só restou recorrer à violência. E, no
fim, foram contratadas para queimar os campos.
Em sua singela opinião, queimar as drogas só trataria os sintomas, não a doença. A or-
ganização ilegal que corroía o coração do Reino era poderosa demais e seu apoio político
era demasiadamente influente.
“Só estamos ganhando tempo... se não der para mudar as coisas, tudo isso será em vão...”
Parte 2
A chuva caía.
As ruas da Capital Real não foram projetadas tendo em mente a drenagem, particular-
mente as pequenas vielas. Como resultado, o beco inteiro tornou-se um lago em minia-
tura.
Gotículas de água respigavam quando gotas de chuva caíam sobre a superfície da água.
O vento soprava através dos respingos e o cheiro de chuva se fazia presente. A Capital
Real parecia submersa.
Neste mundo dessaturado, havia um menino tingido de cinza pelos salpicos de água.
Ele morava em um casebre degradado. Não, usar a palavra casebre estaria dando louvor
a um local tão desprovido. Era pouco mais que um amontoado de coisas sustentado por
pedaços de madeirites, tão largos quanto o antebraço de um homem. Um pedaço de pano
fazia a função de telhado, e as bordas que pendiam serviam de paredes.
Um menino de seis anos vivia nessas condições, talvez tal descrição pudesse dar a en-
tender que era como um restaurante ao ar livre, mas não havia nada disso em qualquer
Quando se pensava sobre isso, os suportes de madeira e o tecido manchado que servia
de telhado e paredes eram provavelmente o fruto do trabalho desse garoto — como uma
criança construindo uma base secreta.
O único mérito desta casa indigna do nome foi que ele não ficou diretamente enchar-
cado pela chuva. O dilúvio interminável fez a temperatura afundar como uma pedra no
lago, envolvendo o garoto com um frio indutor de tremores. A condensação de suas res-
pirações curtas e infrequentes era o único sinal de que ele estava vivo, o clima roubava
seu calor e o fazia desaparecer no ar.
O menino havia sido encharcado pela chuva gelada muito antes de entrar em sua casa
e estava perdendo rapidamente o calor corporal.
Contudo, este mesmo frio amenizou a dor das contusões que cobriam seu corpo. Esse
era o único consolo para ele em meio à condições desumanas.
As únicas coisas que ele podia ouvir eram o som da chuva e sua própria respiração. Não
havia mais nada na ausência desses sons, o que o fez pensar ser a única pessoa restante
no mundo.
Mas ele não tinha medo, era demasiadamente jovem para entender completamente o
conceito de morte. Além disso, ele não achava que houvesse algum motivo específico
para continuar vivendo. Apenas se agarrou à vida todo esse tempo porque estava com
medo de sentir ainda mais dor.
Se ele pudesse morrer, ali mesmo, sem sentir qualquer dor — apenas o frio do vento e
a fome roendo em seu estômago — então a morte dificilmente seria uma coisa ruim.
Ele lentamente perdeu a sensação do seu corpo encharcado de chuva, e sua mente co-
meçou a desvanecer-se em um borrão.
Ele deveria ter encontrado um lugar para se esconder da chuva antes que começasse a
cair, mas ele havia se deparado com vários baderneiros e recebido uma surra violenta.
Já foi sorte o bastante de ter conseguido voltar para cá.
Era muito comum ele passar dois dias sem comer, de modo que até se acostumara. Ele
não tinha pais nem ninguém para cuidar dele, a solidão fazia parte do cotidiano, então
não o trazia qualquer tristeza. Suas roupas esfarrapadas e seu fedor repulsivo eram um
fato da vida, em nada o perturbava. Comer comida estragada e beber água suja para en-
cher a barriga era o único modo de vida que ele conhecia, não fazia sentido contar isso
como sofrimento.
Infelizmente, às vezes seu chiqueirinho era tomado por outros, ou destruído por aque-
les que tinham prazer em tal, ele também era espancado por bêbados até perder os sen-
tidos. Então seria isso seu sofrimento?
A triste verdade era que o menino nem sequer entendia o conceito de sofrer, pois nunca
sentira nada a não ser isso.
♦♦♦
A força para mantê-los abertos esvaia-se, seu corpo há muito havia parado de sentir o
frio.
Ele podia ouvir seu próprio batimento cardíaco fraco na escuridão. O som da chuva se
misturou com isso, mas então ele ouviu algo estranho intervir nesse mundo.
Uma voz abafou o som da chuva. Em meio aos resquícios fugazes de sua consciência, o
menino forçou-se a abrir os olhos, atraído pela curiosidade única das crianças.
Era bela.
A melhor descrição para isso seria “como uma joia” ou “brilhante como ouro”. É claro
que alguém como ele, que comia restos de comida estragada para sobreviver aos dias,
não conseguia pensar em tais coisas.
Não.
—É como o sol.
Essa era a coisa mais distante e inatingível que ele poderia imaginar. Essa palavra apa-
receu em sua mente.
A chuva tingiu o mundo de cinza. O céu estava cheio de espessas nuvens negras. Mesmo
que o sol aparecesse, ninguém notaria. Mas mesmo assim, o sol veio passear na minha
porta.
♦♦♦
Capital Real do Reino Re-Estize. O Castelo Ro-Lente estava em seu coração, seus terre-
nos cercados por 400 metros de muralhas com 20 enormes torres espaçadas ao longo
de sua extensão.
As lanternas estavam apagadas no cômodo não muito espaçoso e havia uma cama. Um
rapaz, em algum lugar entre a infância e a adolescência, estava deitado lá.
Seu cabelo loiro era cortado curto e sua pele estava bronzeada, parecia saudável.
Climb.
Quando percebeu que sua consciência havia emergido de um mundo distante de escu-
ridão, sua mente se esclareceu imediatamente, e seu corpo estava quase totalmente ope-
racional. Climb se orgulhava de sua capacidade de dormir e acordar rapidamente.
Ele abriu bem os olhos e uma determinação inabalável queimava dentro deles.
Ele afastou o grosso cobertor que cobria seu corpo — era verão, mas as noites eram
frias quando dormia cercado por paredes de pedras — e Climb sentou-se em sua cama.
Ele tocou as pontas dos dedos no canto dos olhos. Estava úmido.
A chuva pesada de dois ou três dias atrás deve tê-lo lembrado de sua juventude.
Quantas pessoas poderiam levar uma vida que merecia respeito? Quantos mestres dig-
nos alguém poderia servir? O tipo pelo qual alguém alegremente daria sua vida se fosse
para protegê-lo?
Naquele dia, quando Climb teve a boa sorte de encontrar uma certa dama, ele decidiu
dar a vida por ela a qualquer momento.
As lágrimas que derramou vieram de alegria. Ele chorou de gratidão pelo milagre que
o encontro havia trazido.
O rosto jovem de Climb estava cheio de uma determinação constante quando ele se le-
vantou.
Não havia iluminação aqui. Neste mundo sem luz, Climb falou com uma voz rouca de
excesso de treinamento:
“Acender.”
Torres de pedra como estas tinham pouca ventilação, portanto lamparinas a óleo não
eram seguras. Quase todos os cômodos aqui eram mobiliados com iluminação mágica,
mesmo sendo um alto investimento a princípio.
A luz branca revelou que o chão e as paredes também eram de pedra. Vários tapetes
finos foram colocados no chão para diminuir a rispidez fria da pedra. Além disso, havia
uma cama de madeira ao estilo rústico, e um armário de roupa ligeiramente maior que
parecia grande o suficiente para guardar sua panóplia. Havia uma escrivaninha com ga-
vetas e uma cadeira de madeira com uma almofada fina no assento.
Um estranho poderia considerar isso austero, mas era mais do que ele merecia, isso
segundo ele.
Soldados regulares não receberiam quartos individuais. Eles dividiriam beliches e vi-
veriam em grupos. Os únicos outros móveis que lhes eram atribuídos, além das camas,
era um baú de madeira com fechadura, utilizado para guardar objetos pessoais.
Ele então olhou para o conjunto de armadura de placas branca que estava no canto da
sala. Era tão reluzente que parecia brilhar por conta própria. Um soldado padrão nunca
receberia uma armadura tão requintada.
Naturalmente, Climb não mereceu tal tratamento especial por seus próprios méritos.
Este foi um presente da soberana a quem Climb devia sua lealdade. Assim, era inevitável
que outros se ressentissem dele.
Ele abriu o armário de roupas e pegou suas vestes. Então se vestiu enquanto observava
sua imagem no espelho do gabinete.
Primeiro, ele colocou um conjunto de roupas velhas. Elas cheiravam a metal, não im-
portava quantas vezes as lavasse. Então colocou uma camiseta por cima. Normalmente,
ele teria colocado sua armadura em cima disso, mas não havia necessidade de ser tão
formal agora. Em seu lugar, ele usava um colete com muitos bolsos e um par de calças, e
com isso ele estava vestido. Ele segurava um balde com um pano.
Depois disso, ele se observou no espelho mais uma vez, inspecionando a si mesmo por
qualquer coisa fora do lugar ou qualquer esquisitice em seu porte pessoal.
Qualquer erro que Climb fizesse seria motivo para ataques lançados contra a princesa
“Dourada” a quem ele servia.
Como esperado de sua linhagem de nascimento, ela estava cercada por uma aura sa-
crossanta, como uma deusa descendo sobre a terra. Ela parecia brilhar de compaixão e
sua mente elaborava muitos planos e políticas cheio de sabedoria.
Ela era a nobre entre as nobres, a princesa entre as princesas. Ela era a mulher perfeita.
Seu brilho dourado — como uma gema preciosa e imaculada — não poderia ser desfi-
gurado de forma alguma.
Se alguém fosse usar um anel para comparação, Renner seria como um enorme dia-
mante lapidado e brilhante. Quanto a Climb, ele seria a moldura que mantinha a pedra
no lugar. Qualquer falha na moldura diminuiria o valor do anel, então ele não podia fazer
nada que pudesse desvalorizá-la.
Mesmo os suplicantes mais ferrenhos aos deuses não podiam se comparar à devoção
de Climb.
Ele se examinou por mais algum tempo. Depois de ter certeza de que não iria desgraçar
a honra de sua Mestra, Climb assentiu em satisfação e saiu de seu quarto.
Parte 3
Seu destino era um hall de treinamento que ocupava um andar inteiro da torre.
Normalmente, este lugar estaria cheio de calor e atividade dos soldados. No entanto,
era cedo, então não havia ninguém. O hall vazio estava em silêncio. Os arredores eram
feitos de pedra, o que fazia os passos de Climb ecoarem excepcionalmente altos.
O treinamento deveria ter sido conduzido do lado de fora, mas havia uma razão pela
qual isso era feito em ambientes fechados.
O Palácio de Valência situa-se dentro do Castelo Ro-Lente. Portanto, ter soldados trei-
nando do lado de fora, onde embaixadores e partidos diplomáticos pudessem vê-los, se-
ria rude. Assim, vários halls de treinamento internos foram construídos dentro das tor-
res.
É verdade que ter soldados fortes e orgulhosos treinando em público poderia ser usado
para impressionar durante as negociações diplomáticas, mas o Rei não gostava desse
tipo de coisa. Para ele, o Reino era uma nação que deveria mostrar seu lado gracioso,
elegante e nobre aos convidados estrangeiros.
Dito isso, alguns treinamentos ainda precisavam ser realizados ao ar livre. Em tempos
como esses, os soldados tinham que fazê-lo secretamente em esquinas, ou em campos
fora do Castelo ou mesmo inteiramente fora da Capital.
Climb enxugou o suor e se aproximou do cavalete com armas. Ele pegou uma espada de
treino pesada e sem fio com sua mão recém empolada e calejada. Então ele sentiu seu
peso, certificando-se de que se encaixava bem em suas mãos.
Depois disso, ele encheu os bolsos com placas de metal e as prendeu no lugar, garan-
tindo que não caíssem.
Depois de prendê-las, suas roupas agora pesavam tanto quanto uma armadura com-
pleta de placas. Armaduras completas de placas não-encantadas eram resistentes, mas
muito pesadas, e as articulações também restringiam a amplitude de movimento. Por-
tanto, Climb deveria ter usado um conjunto de placas para praticar, pelo realismo.
No entanto, Climb não queria usar uma armadura de placas cheias apenas para treinos
regulares. Além disso, ele sabia que a armadura branca que recebera não era adequada
para treinamento. E, no fim, optou pelas placas de metal como um substituto.
Ele agarrou com força a espada, que era maior que uma espada longa, e adotou uma
posição alta. Então começou a balançar para baixo, expelindo sua respiração quando o
O rosto de Climb parecia não ficar mais vermelho, e gotas de suor escorriam por suas
bochechas. Sua respiração estava quente, como se para retirar o calor acumulado dentro
de seu corpo.
Climb tinha passado por um árduo treinamento como soldado, mas o porte desta es-
pada ainda era pesado para ele. Controlar a velocidade da espada para evitar que ela
batesse no chão exigia considerável força do braço.
Após a 500ª repetição, os braços de Climb começaram a dar câimbra, parecia que esta-
vam gritando de dor. O suor escorria pelo seu rosto em um dilúvio.
Climb percebeu que estava no limite. Mesmo assim, ele não pretendia parar por aqui.
E então—
—Um terceiro o chamou. Climb se virou rapidamente, lá ele viu uma figura masculina
entrar em seu campo de visão.
Não havia melhor palavra para descrevê-lo do que “poderoso”. De fato, ele era um ho-
mem que parecia um pedaço de aço forjado. Seu rosto firme como uma rocha enrugou,
e as linhas de expressão assim produzidas o fizeram parecer mais velho do que sua idade
real. Seus músculos firmes provavam que ele não era uma pessoa comum.
“—Stronoff-sama.”
Era o Capitão Guerreiro do Reino, Gazef Stronoff. Ele foi saudado como o homem mais
poderoso do Reino e um guerreiro que ninguém nas nações vizinhas poderia rivalizar.
“Seu treinamento será em vão caso não descance. Não faz sentido se esforçar demais.”
Este vai e vem repetiu-se entre eles inúmeras vezes. Em circunstâncias normais, os dois
deixariam as coisas e se concentrariam em seu próprio treinamento. No entanto, hoje foi
diferente.
A expressão normalmente vazia de Climb foi jogada em desordem quando ele ouviu
Gazef dizer essas palavras.
Eles haviam se encontrado aqui no passado, mas nunca haviam cruzado as lâminas.
Essa foi uma regra tácita entre eles.
Isso porque não lhes fazia bem praticar juntos. Ou melhor; havia méritos em fazê-lo,
mas eles eram superados em muito pelos deméritos.
Atualmente, o Reino estava dividido em Facção Real e Facção Nobre, a última era com-
posta por uma coalizão de três dos Seis Grandes Nobres da nação. A luta pelo poder entre
elas deixou a situação do Reino precária. Alguns até sentiram que a única razão pela qual
o país ainda não havia desmoronado era por causa de suas guerras anuais com o Império.
Sob essas circunstâncias, o braço direito do Rei — o Capitão Guerreiro, Gazef Stronoff
— não poderia ser derrotado. Por exemplo, se ele fosse derrotado, isso daria à Facção
Nobre um amplo material para criticá-lo.
Quanto a Climb, sofrer uma derrota grave faria com que os nobres não permitissem que
ele defendesse o corpo da Princesa Renner. Muitos nobres repugnavam o fato de um
soldado de origem nebulosa como Climb foi autorizado a ficar ao lado da Princesa, ainda
mais sendo descomprometida e tida como a portadora de uma beleza ímpar.
Mais do que isso, eles não podiam permitir que os outros vissem suas fraquezas e des-
sem a seus inimigos uma abertura para explorar. Ambos eram de nascimento comum, e
por isso tinham que ter muito cuidado em tudo o que faziam para não causar problemas
aos seus mestres.
Sendo esse o caso, por que Gazef decidiu quebrar essa regra tácita?
Dificilmente seria por não ter mais ninguém por perto. O Castelo era uma área densa-
mente povoada. Certamente alguém estaria observando de longe ou espionando-os das
sombras, mas ele não conseguia pensar em nenhum outro motivo.
Climb não tinha idéia se era por uma boa ou má razão. Ele estava confuso e chocado,
mas não expressou em seu rosto.
No entanto, a pessoa diante de Climb era o guerreiro mais poderoso do Reino. Embora
a consternação momentânea de Climb pudesse ter passado despercebida por uma pes-
soa comum, a pessoa à sua frente percebeu e respondeu:
O que exatamente aconteceu para fazer Gazef, o melhor guerreiro do Reino, duvidar de
suas próprias habilidades? Só então, Climb lembrou que a unidade que Gazef liderava
tinha poucas pessoas.
Climb não tinha família e, portanto, só ouvira os rumores quando passava pelo hall.
Aparentemente, a unidade se envolveu em um incidente e havia perdido várias pessoas.
“Acho sim. Se não fosse por um magic caster bondoso que me ajudou uns tempos atrás,
eu nem poderia estar aqui hoje—”
Quando ouviu isso, Climb não pôde mais manter-se incrédulo aos motivos de Gazef. De
fato, não havia ninguém que não se surpreendesse ao ouvir essas palavras. Incapaz de
conter sua curiosidade, ele perguntou:
“...Ele se chamava Ainz Ooal Gown. Pelos meus cálculos, ele deve estar a par com aquele
monstro, o mago do Império.”
Climb adorava heróis, ele tinha uma paixão secreta por sagas heroicas. Seu interesse
até cruzava as fronteiras raciais. Além disso, ele decorava avidamente todas as histórias
de aventureiros que soube acontecer nos países vizinhos. Mas mesmo assim, ele não se
lembrava do nome que Gazef havia mencionado.
Não tenho o direito de perguntar uma coisa dessas, ele perdeu muitos homens no inci-
dente... Isso seria terrivelmente rude.
“De hoje em diante vou guardar esse nome... Mas, está realmente bem se eu treinar com
o senhor?”
“Claro, não será um treinamento sério, só vamos trocar uns golpes de espada, uma ou
duas vezes no máximo. Se vai aprender algo com isso, aí tudo depende de você. Afinal,
você é um guerreiro de primeira classe entre os soldados do Reino. Isso me motiva a
treinar com você.”
Isso foi um grande elogio, mas Climb só pôde aceitá-lo como cortesia padrão.
Não era que Climb fosse muito forte, mas que os padrões pelos quais ele era julgado
eram muito baixos. A média dos soldados do Exército Real era pouco mais forte que um
homem comum, obviamente muito mais fracos que os Cavaleiros profissionais do Exér-
cito Imperial. Praticamente nenhum deles era famoso nas nações vizinhas, como Gazef
era. Os subordinados diretos de Gazef eram excelentes soldados, mas ainda estavam um
pouco abaixo de Climb.
Entre os ranques de aventureiros — cobre, ferro, prata, ouro, platina, mythril, orichal-
cum e adamantite —, Climb se classificaria na melhor das hipóteses como ouro. Ele não
era fraco, mas havia muitos outros que eram mais fortes que ele.
Poderia uma brincadeira como essa realmente motivar Gazef — quem era classificado
como adamantite em termos de aventureiro?
Ter o homem mais forte do Reino treinando com ele era uma oportunidade rara. Ele
não se arrependeria, mesmo se Gazef acabasse ficando desapontado no final da sessão.
Os dois foram para o armário escolheram armas adequadas para a prática. Gazef sele-
cionou uma espada bastarda, enquanto Climb selecionou um pequeno escudo e uma es-
pada larga.
Seu inimigo era o mais poderoso guerreiro do Reino. Ele tinha que concentrar todas as
suas energias e experimentar o poder desta poderosa muralha diante dele com toda a
sua força.
“Não mais, estão bem sim. Sinto que ainda ardem um pouco, mas isso não afeta minha
pegada nem nada assim.”
Climb acenou com os braços. Gazef viu seus movimentos e assentiu, havia ficado claro
que não estava mentindo.
“Que bom... se bem que, de certa forma, é até uma pena. Em combate real, é muito raro
enfrentar alguém estando na melhor condição possível. Se a força que mantém sua pe-
gada no punho for afetada, vai precisar pensar em um modo de compensar isso. Já apren-
deu algo do tipo?”
“Ah, não precisa ir tão longe. É só uma dica, pois precisa proteger Sua Alteza a todos os
momentos. Você deve praticar estilos de luta que podem ser usados quando estiver em
desvantagem, digo, quando espadas não sejam a opção, ou talvez praticar usando várias
formas de armas alternativas. Conhecimento não faz mal a ninguém.”
“Sim!”
“...Espadas, escudos, lanças, machados, punhais, manoplas, arcos, clavas e armas de ar-
remesso. O uso dessas armas é conhecido como as Nove Artes, elas são a base de todos
os combates armados. Acontece quê... se tentar aprender tudo, acabará sem saber nada.
Eu sugiro escolher duas ou três e ir treinando com elas. Enfim, já falei demais.”
“Não diga uma coisa dessas, Stronoff-sama. Estou profundamente grato pela palestra!”
“Vamos começar assim que estiver pronto. Comece por me dar o seu melhor movimento
em sua condição atual. Depois disso, dependendo do tempo... Bem, eu posso não ser ca-
paz de ajudar tanto, mas vou encontrar uma chance de explicar as Nove Artes e os se-
gredos de lutar com outras armas.”
“Muito bem. Mas fique sabendo que não estou tratando isso como treino de verdade.
Quero que venha com tudo, como se fosse uma batalha real.”
Climb lentamente baixou a espada para uma posição baixa, obliquando seu corpo para
que seu lado esquerdo ficasse de frente para Gazef e atrás de seu escudo. O olhar nos
olhos de Climb era afiado, indicando que não mais tratava isso como treinamento. Da
mesma forma, a postura de Gazef já deixou claro sua prontidão de combate.
Os dois travaram os olhos um no outro, mas Climb não conseguiu fazer o primeiro mo-
vimento.
Era muito mais fácil mover-se agora que ele havia removido as placas de metal, mas
ainda assim, ele não achava que poderia derrotar Gazef. O outro homem era muito supe-
rior a ele em termos de habilidade física e experiência.
A única resposta para isso era: ele precisava atacar as fraquezas na postura de Gazef.
Gazef pegou uma espada bastarda. Em comparação, Climb estava com uma espada larga
e um pequeno escudo. Se seu equipamento estivesse encantado, talvez ele pudesse ter
alguma chance, mas eram apenas armas de treino, praticamente iguais.
No entanto, Gazef tinha apenas uma arma, enquanto Climb tinha duas — afinal, um es-
cudo poderia ser usado como arma. Por um lado, era mais fraco, mas por outro, lhe dava
mais opções.
—Ele defletiria um golpe com seu escudo e depois golpearia com sua espada. Ou isso,
ou usaria a espada para criar uma abertura e depois golpear com escudo.
Climb decidiu sobre sua estratégia, que era aproveitar as oportunidades para se contra-
atacar. Então, ele estudou cuidadosamente os movimentos de Gazef.
Gazef ergueu a espada de maneira casual. Ele abaixou sua postura, reunindo forças
como uma mola espiralada. Climb também começou a inundar seu corpo com força,
pronto para desviar de qualquer ataque que pudesse acontecer.
—Que rápido!
Climb imediatamente abandonou a idéia de desviar esse golpe. Ele concentrou todas as
suas energias para a defesa, a fim de suportar o golpe.
Tão poderoso foi o golpe que Climb se indagou se o escudo havia se partido. Tinha sido
tão forte que a mão segurando o escudo ficou dormente. Não havia como evitá-lo sem
usar toda a força de seu corpo.
Onde eu tava com a cabeça!? Que tipo de sincronia é preciso para explorar uma fraqueza
nessa técnica? Preciso suportar esse golpe, pelo menos isso!
Climb grunhiu em sua ingenuidade e, em seguida, outro impacto floresceu em seu in-
testino.
“Guwaargh!”
O corpo de Climb voou pelo ar. Suas costas bateram pesadamente no chão de pedra, o
deixando sem fôlego. Quando ele olhou para Gazef, imediatamente percebeu o que tinha
acontecido.
Gazef estava apoiando a perna no chão, Climb foi acertado por um chute poderoso e foi
jogado longe.
“...Não se concentre demais nas mãos só porque brandem a espada. Não é assim que se
faz, garoto. Você pode acabar recebendo um chute desses. Eu mirei na barriga, mas eu
poderia ter mirado em algum lugar com menos proteção, como tentar quebrar suas ró-
tulas ou algo assim. Por exemplo... mesmo se tiver com proteção acolchoada na virilha,
certas coisas podem estourar, entendeu? É preciso ficar de olho no corpo inteiro do seu
oponente e estudar cada movimento.”
“...Sim, senhor.”
Climb lentamente se levantou, rangendo os dentes contra a dor latejante vinda de sua
barriga.
Enquanto agradecia mentalmente por ser pessoalmente disciplinado pelo maior guer-
reiro do Reino, Climb ergueu sua espada novamente, seu coração transbordava de gra-
tidão.
Este tempo treinando juntos era inestimável. Ele tinha que ter cuidado para não deixar
que isso acabasse cedo demais.
Climb se cobriu com o escudo novamente. Ele avançou em direção a Gazef, que anali-
sava Climb em silêncio. Se isso continuasse, ele só faria os mesmos erros antigos nova-
mente. Quando Climb se aproximou, ele foi forçado a reconsiderar suas táticas.
Gazef aguardava placidamente seu inimigo que se aproximava, com uma expressão as-
sustadoramente calma no rosto. Aparentemente, Climb não poderia forçar Gazef a usar
táticas de resposta às suas habilidades.
Climb estava chegando ao limite. Embora acordasse cedo para praticar todos os dias,
sua taxa de crescimento era mais lenta do que uma vaca que pastasse pela rua. Ele fez
pouco progresso desde que começou a aprender a arte da espada. Mesmo ele podendo
ser capaz de melhorar sua velocidade e força treinando seu corpo, ele pode não ser capaz
de dominar habilidades especiais como Artes Marciais e afins.
Seria terrivelmente rude para alguém como Climb resmungar sobre não ser capaz de
forçar um indivíduo talentoso a usar suas verdadeiras habilidades. Em vez disso, ele de-
veria culpar sua própria falta de talento por não ser capaz de fazer com que seu oponente
desse o máximo de si.
Com toda certeza, quando Gazef disse a ele para tratar isso como uma batalha verda-
deira em vez de um treinamento simples, ele estava dizendo a Climb “Lute como se qui-
sesse tirar minha vida, ou não será digno de ser meu oponente”.
Ele desprezava a própria fraqueza. Se fosse mais forte, ele poderia ser mais útil. Ele
poderia se tornar a espada da Princesa e confrontar diretamente os vilões que assolam
o povo do Reino.
No entanto, Climb imediatamente afastou a culpa. Ele não deveria estar chafurdando na
lama da autopiedade agora, mas usando todas as suas forças para lutar com o poderoso
adversário diante dele, na esperança de evoluir, mesmo que apenas um pouco.
♦♦♦
“Hoh...”
Isso porque o jovem diante dele tinha um olhar diferente do habitual. Até agora ele só
havia mostrado feição de chocado, ansioso e nervoso. Mas daquele chute, essas feições
irritantes se foram, agora deram lugar as de um guerreiro.
Ele considerava Climb melhor do que o próprio rapaz se considerava. O que ele mais
apreciava era a sede de força de Climb, bem como a lealdade que beirava à devoção. E
por fim, suas habilidades com a espada.
Climb não aprendera com um mestre, mas observava os outros e modificava suas ob-
servações em um estilo autodidata. Sua técnica não era elegante e tinha muitos movi-
mentos inúteis. No entanto, era diferente de estilos aprendidos através de lições rotinei-
ras. Ele considerava cuidadosamente cada golpe, criando um estilo que era ideal para o
combate prático, ou para ser mais direto, o estilo de um assassino.
Afinal, espadas foram criadas justamente para matar. As habilidades de espada apren-
didas como uma forma de recreação não eram úteis no campo de batalha. Seus usuários
não poderiam defender aqueles que queriam proteger, não podiam salvar aqueles que
queriam resgatar. Para esses, a única coisa que podiam fazer era esperar pela morte.
Mas Climb era diferente. Gazef tinha certeza de que ele poderia matar seus inimigos e
salvaguardar as pessoas que eram importantes para ele.
Ainda assim—
Para ser honesto, Climb não tinha talento. Por mais que desse tudo de si, por mais que
treinasse seu corpo, nunca conseguiria atingir o apogeu da esgrima sem talento. Ele era
como pó se comparado a pessoas como Gazef ou Brain Unglaus.
O desejo de Climb de se tornar mais forte do que qualquer outra pessoa não era nada
mais que um sonho ou fantasia.
Mesmo assim, por que Gazef queria ajudar Climb? Não seria mais benéfico gastar seu
tempo com alguém melhor?
A resposta era bem simples; Gazef não podia ignorar a perseverança inabalável de
Climb, por mais inútil que fosse. Se cada homem se refreasse diante de seus limites pes-
soais, então poder-se-ia dizer que Gazef tinha pena do fato de que Climb tentava subir a
íngreme muralha ignorando os próprios limites.
Ele sentia que havia um limite para as habilidades de uma pessoa, mas não limitava à
experiência.
Além disso, havia mais um motivo. Sentiu uma profunda pena pelo trágico estado de
seu grande rival.
Quer dizer que, estou usando ele como um substituto, huh... que desserviço... mas, duvido
que este confronto cause algum mal a ele.
“Sim, senhor!”
♦♦♦
Enquanto respondia, Climb apoiou o pé com firmeza no chão e avançou para a frente.
Ao contrário de antes, a expressão de Gazef estava severa quando ele ergueu a espada
em uma posição alta.
Se Climb o bloqueasse com seu escudo, ele pararia no meio do caminho. Se ele o blo-
queasse com sua espada, sua arma seria derrubada. Esse ataque essencialmente fez sua
Tudo o que ele podia fazer era correr para o alcance da espada de Gazef. Gazef sabia
disso e se endireitou para executar o bote.
Era como correr para a boca de um tigre, mas Climb apenas hesitou por um momento.
Gazef estava esperando por ele, e assim que desceu seu braço, Climb o bloqueou com o
escudo. O impacto impressionante foi maior do que o de antes. Climb fez uma carranca
quando a dor percorreu seu braço.
Houve uma certa decepção no rosto de Gazef quando ele apontou o pé para a barriga
de Climb e então—
“《Fortaleza》!”
—O olhar no rosto de Gazef mudou para um de choque quando ele ouviu Climb gritar.
A Arte Marcial 《Fortaleza》 não exigia um escudo ou espada para ser usada. Se dese-
jado, poderia ser ativada em uma armadura ou até com as mãos nuas. É claro que a mai-
oria das pessoas usaria isso quando bloqueasse com uma arma ou escudo, porque a sin-
cronia precisava ser perfeita. Ao usá-la com armadura, um erro de cálculo resultaria em
um ser deixado indefeso diante dos inimigos. Portanto, a maioria das pessoas preferia
usá-la em escudos ou espadas. Era o senso comum.
Contudo, Climb sabia que Gazef iria dar um chute, então ele não precisava se preocupar
com isso.
“Sim, senhor!”
A força do chute de Gazef pareceu desaparecer, como se absorvida por algo macio. Gazef
não pôde colocar força em sua perna estendida e, assim, foi forçado a recuperar seu equi-
líbrio. Vendo o estado desiquilibrado de Gazef, Climb se aproximou dele.
“《Corte》!”
Depois de obedecer ao conselho de um certo guerreiro, Climb e sua falta de talento co-
meçou a treinar com afinco, trabalhando de corpo e alma para produzir esse movimento,
um golpe que cortava de cima para baixo.
O corpo de Climb não estava embainhado nos músculos. Ele nascera com um físico nor-
mal e construir músculos era difícil. Ele também não era dotado de destreza, permitindo
que ele se movesse como queria, mesmo com um corpo musculoso.
Por causa disso, ele havia aperfeiçoado uma estrutura muscular apropriada ao seu es-
tilo de treinamento árduo.
O fruto disso foi esse golpe. Era um ataque cortante de alta velocidade que havia sido
refinado a níveis extraordinários, um lampejo de aço seguido por um poderoso vento.
Seria fatal se estivesse conectado, mas Climb não estava pensando nisso. Sua confiança
em Gazef era absoluta. Ele só usara esse movimento porque tinha certeza de que o po-
deroso Gazef não seria atingido por um ataque daquele nível.
Houve um zumbido de metal, e a espada larga colidiu com a espada bastarda levantada.
Era difícil manter o equilíbrio em um pé, mas Gazef havia bloqueado facilmente o ata-
que feito com a força total de Climb. Era como se ele estivesse enraizado na própria terra.
Climb atacou com seu golpe mais forte, usando toda a força que conseguiu reunir. Po-
rém, mesmo a combinação desses dois fatores não foi páreo abalar Gazef firme em seus
pés. Este fato chocou Climb em seu âmago, e seus olhos foram para sua barriga.
Ele teve que se aproximar para atacar usando a espada larga. Ou seja, Gazef poderia ser
capaz de chutar sua barriga mais uma vez.
Quando Climb saltou para longe, tal chute atingiu seu corpo novamente.
Houve uma dor fraca e latejante. Depois disso, os dois cambalearam vários passos se-
parados.
Um sorriso, mas não aquele que causava descontentamento. Ele mostrou claramente
seu bom humor. Climb ficou um pouco desconfortável diante do sorriso, que era como
um pai vendo seu filho amadurecer.
Uma emoção de terror percorreu o corpo de Climb. Isso porque seus instintos lhe di-
ziam que o lutador mais forte do Reino agora estava diante dele.
“Relaxa, eu tenho uma poção comigo. Deve ser capaz de consertar ossos quebrados, en-
tão não se preocupe.”
“...Muito obrigado.”
O coração de Climb balançou quando ele ouviu seu oponente dizer que ele possivel-
mente sofreria uma fratura. Ele estava acostumado a ser ferido, mas isso não significava
que gostava.
Gazef deu um passo à frente, duas vezes mais rápido do que Climb.
A ponta da espada bastarda apontou para o chão, traçando um caminho baixo que veio
nas pernas de Climb. A velocidade do ataque trouxe pânico a Climb, e ele fincou a espada
no chão, preparando-se para proteger as pernas.
Houve um impacto feroz. Assim que Climb percebeu, a espada de Gazef saltou para cima.
A espada bastarda viajou ao longo do corpo da espada de Climb em uma trajetória as-
cendente.
“Oog!”
Climb jogou o rosto — e o resto do corpo — para trás, e a espada bastarda passou por
seu corpo. Vários fios de cabelo foram cortados e seguiram o deslocamento do ar.
Cheio de medo de como Gazef o havia dominado em um instante, Climb olhou a ponta
da espada. Então, para seu horror, ele viu a espada bastarda parar de repente, e então
virar.
Seu corpo estava se movendo antes que sua mente pudesse pensar.
Como se impulsionado por um instinto básico de sobrevivência, ele estendeu seu pe-
queno escudo, que colidiu com a espada bastarda e produziu um som de metal.
“—Ahg!”
Houve uma onda de dor, Climb foi arremessado pelo impacto. Ele bateu no chão rolando,
e com o impacto perdeu seu controle no punho da espada.
Parece que a espada bastarda tinha mudado de direção imediatamente para uma var-
redura horizontal depois de saltar do escudo, e isso atingiu a lateral de Climb, que estava
exposta.
“Siga o fluxo entre seus movimentos. Não pense, Primeiro atacar, depois defender. Todo
movimento deve ser feito para lançar o próximo ataque. Pense em como usar sua defesa
para emendar um ataque.”
Climb pegou sua espada caída e apertou a mão na dor em sua cintura enquanto lutava
para ficar de pé.
“Dei um golpe mais fraco, sei que fraturar ossos é um saco. Ainda é capaz de lutar, né?
Como está se sentindo?”
Ele só estava desperdiçando o tempo de Gazef se não conseguisse nem suportar alguns
golpes. Dito isso, Climb ainda queria se tornar o mais forte possível.
“Sim, senhor!”
♦♦♦
Ele foi atingido, ele foi derrubado, ele foi até mesmo espancado. Climb foi amarrotado
no chão de pedra várias vezes. As lajes frias drenavam o calor de seu corpo através de
suas roupas e cota de malha, na verdade parecia muito confortável.
Ele não enxugou o suor. Mais precisamente, ele não tinha forças para fazê-lo.
“Se saiu muito bem. Eu tentei evitar quebrar ou trincar seus ossos enquanto o golpeava.
Como está se sentindo?”
“...”
Ainda no chão, Climb moveu as mãos para sentir os lugares que doíam.
As ondas de dor eram bastante leves. Não afetariam seus deveres de proteger a Princesa.
“Isso aí, fornecer uma cura rápida por magia reverte o músculo ao seu estado original.
Deixe que sarem naturalmente. É assim que é. Então, vai proteger a Princesa depois
disso, correto?”
“Sim.”
“Muito obrigado.”
Climb sentou-se, olhando para Gazef. Ele olhou para o homem cujo esgrima ele não po-
dia sonhar em competir.
“Que foi?”
A testa de Gazef estava sem suor. Sua respiração estava calma e regular. Essa era a di-
ferença entre Climb, exausto no chão, e o homem mais forte do reino?
“Como—”
“—Se pretende perguntar como eu fiquei tão forte, eu realmente não sei. Basicamente,
eu nasci assim. Aliás, aprendi a lutar como mercenário. Os nobres chamavam meu hábito
de chutar as pessoas de rude, mas foi nessa época que eu aprendi. Não descobri algum
segredo para me tornar forte.”
Concluiu Gazef. Climb pensara que repetindo a mesma prática repetidamente acabaria
por torná-lo um pouco mais forte, mas isso foi rejeitado em um instante.
“Nesse sentido, você é bastante adequado para o meu estilo de luta— chutes e socos
combinam com seu porte, Climb.”
“Oh, sim. Você não foi treinado como espadachim ou soldado, mas leva jeito. Quando
alguém pega uma espada, é natural se focar apenas nela... mas eu não curto isso. Eu sinto
que a espada deve ser apenas um método de ataque, assim como socos, chutes e assim
por diante. É um modo de lutar bem prático; é dito como sujo... mas combina com aven-
tureiros.”
O rosto de Climb não era mais uma máscara de seriedade. Havia um sorriso. E pensar
que o homem mais poderoso do Reino realmente elogiaria suas habilidades aleatórias e
desleixadas de espada.
Ele ficou encantado com o fato de que sua esgrima — que os aristocratas desprezavam
— recebera tais elogios.
“E é isso, chega de treinar por hoje. O dever me chama. Preciso encontrar o Rei a tempo
do café da manhã. E você, não precisa se apressar e ir para o lado da Princesa?”
“Sim, Aindra-sama.”
Gazef estava supondo que Renner havia impedido Climb de estar ao lado porque tinha
recebido a visita de uma amiga, mas a verdade era que Climb gentilmente recusou o con-
vite.
Climb conheceu Aindra através de Renner, e Aindra o considerava muito bem. Certa-
mente, ela não o rejeitaria como os outros nobres caso ele se juntasse a elas em um jantar.
No entanto, Climb considerou que sua mestra (Renner) não tinha quase nenhuma
amiga, e sentiu que se ele, como homem, não estivesse por perto, as duas senhoritas se-
riam capazes de falar sobre coisas pessoais que não falavam normalmente.
“...Se não for incomodo, posso pedir sua orientação novamente, como hoje?”
Gazef não pôde responder por um momento. Climb viu sua reação e começou a se des-
culpar, mas Gazef falou primeiro.
“Claro, tudo bem. Contanto que não haja mais ninguém por perto.”
Climb entendeu profundamente a relutância de Gazef e, por isso, não falou mais. Ele
forçou seu dolorido corpo a ficar de pé e falou seus sentimentos sinceros.
“Muito obrigado!”
“Ah, melhor dar um jeito nessa bagunça bem rápido. Não quero me atrasar e perder o
café da manhã com o Rei... Hey, aquele seu golpe descendente foi muito bom. Mas precisa
pensar sobre o que virá depois. Pense no que faria se fosse evitado ou bloqueado.”
“Sim, senhor!”
Depois de se despedir de Gazef, Climb limpou o suor com uma toalha úmida e foi para
um lugar drasticamente diferente do hall de treinamento.
Esta sala tinha o mesmo tamanho do hall de treinamento. Estava cheia de muitas mesas
e bancos compridos, repletos de pessoas conversando alegremente. Uma fragrância de-
liciosa se destacava em meio ao ambiente.
Depois de entrar, Climb passou pelo burburinho dos soldados e se juntou ao final da fila.
Muito parecido com as pessoas na frente dele, Climb estava com vários vasilhames em-
pilhados. Havia uma bandeja, um prato, colher e copo, todos feitos de madeira.
Uma batata cozida no vapor, um pouco maior do que o habitual, pão integral, ensopado
branco bem encorpado e cheio de ingredientes, repolho em conserva e uma salsicha.
Para Climb, essa era uma refeição sumptuosa.
O aroma das porções em sua bandeja dava água na boca. Climb olhou ao redor do refei-
tório enquanto o aroma estimulava seu estômago.
Vários soldados estavam comendo. Eles se sentaram com amigos e, enquanto comiam,
conversavam sobre o que fariam na próxima folga, sobre a comida, famílias e em outros
tópicos leves. Nada fora do comum.
Ele passou por cima do banco e sentou-se. Havia soldados de ambos os lados, conver-
sando cordialmente com seus amigos. Quando Climb sentou-se, eles se viraram para
olhá-lo, mas logo perderam o interesse e voltaram os olhos para outro lugar.
Embora houvesse uma alegre conversa ao redor dele, ninguém deu atenção a Climb.
Mesmo que fosse verdade que ninguém conversaria com um estranho, todos aqui eram
soldados, servindo no mesmo local e talvez precisassem depender um do outro em tem-
pos de guerra. Desse ponto de vista, a atitude deles foi bem estranha.
De sua parte, Climb não planejava falar com mais ninguém, afinal, ele entendia clara-
mente sua posição.
Soldados do Exército Real incluíam recrutas armados e equipados pelos lordes de vá-
rios domínios, mercenários contratados pelas cidades, guardas encarregados de patru-
lhar as cidades e assim por diante. Porém, a única coisa que tinham em comum era que
todos vieram de berço simples.
É claro que permitir que plebeus de proveniência incerta se aproximem da Casa Real e
do Palácio, com seus muitos segredos, causaria muitos problemas.
Portanto, os guardas do Castelo Ro-Lente eram aqueles que eram recomendados por
um nobre. Se os guardas causassem algum problema, seus nobres patrocinadores seriam
culpados em seu lugar. Com isso, todos os candidatos eram cidadãos justos e honestos.
Isso é, “faccionalização”.
Todos os nobres patrocinadores pertenciam a uma das duas facções. As tropas que eles
recomendaram naturalmente se juntariam às facções dos seus mestres. Já que qualquer
um que se opusesse aos nobres não tinha chance de ser escolhido, não era um exagero
dizer que todos os soldados aqui eram afiliados a alguma facção.
Claro, Climb era muito mais habilidoso do que eles, mas os nobres tinham conseguido
encontrar falhas até nisso. Afinal, ele era mais forte que as tropas que os nobres propu-
seram.
Era possível, embora raro, ser patrocinado por um nobre neutro. Mas na situação atual,
com disputas e atritos acontecendo entre a Facção Nobre e a Facção Real, apenas um
nobre era habilidoso o bastante para transitar entre as duas facções, como um morcego.
Originalmente, alguém como Climb não poderia ficar do lado de Renner. Por ser de nas-
cimento comum, ele nunca seria confiado com a pesada tarefa de defender a realeza. A
história até tinha trazido nobres a encargo da proteção da Casa Real.
Renner em pessoa que providenciou. Mas, ao mesmo tempo, isso o deixou isolado dos
outros. Afinal de contas, Climb não era afiliado a nenhuma facção e estava desconfortável
em ambos os campos, ele era como uma batata quente passando de mão em mão.
Dada à situação e aos antecedentes de Climb, ele deveria ter sido um membro da Facção
Real. Porém, a Facção Real era um grupo de nobres que havia jurado sua lealdade ao Rei,
e eles não aprovavam a presença de Climb, cujas origens eram desconhecidas.
As facções eram feitas de muitos nobres e nem todos pensavam igual. As facções eram,
em última análise, organizações formadas para o lucro. Sendo esse o caso, enquanto al-
guns membros da Facção Real o olhavam com desprezo — afinal, ele era um mero plebeu
que tinha sido autorizado a ser a pessoa mais próxima da Princesa Dourada —, outros o
queriam para interesses próprios.
Só que no fim das contas, ninguém era bobo o bastante para arriscar dividir sua facção
por Climb.
Em conclusão, ambos consideraram Climb um ativo que ninguém queria, mas que tam-
bém ninguém queria ceder a seus rivais.
Foi por isso que ninguém falava com ele, foi por isso que comia sozinho.
Da parte dele, também não conversava com ninguém e não prestava atenção em seus
assuntos. Ele simplesmente terminou seu café da manhã em menos de 10 minutos.
O rosto de Climb estava impassível quando um cotovelo atingiu o local onde ele havia
se machucado em seu duelo com Gazef, mesmo doendo, ele não fez nada.
O soldado que bateu nele não disse nada, apenas continuou. Os soldados ao redor tam-
bém ficaram em silêncio. Alguns franziram as sobrancelhas quando viram, mas ninguém
se intrometeu.
Foi incômodo, mas nem tanto. Ele ficou até aliviado por não haver cozido quente na
tigela naquele momento.
Tendo quase tropeçado por conta de um pé no meio do caminho, ele seguiu. Pessoas
esbarravam de propósito contra ele sob o pretexto de ser sem querer. Ele estava acos-
tumado a essas coisas. Contudo—
—E daí?
Climb continuou em frente. Eles não podiam fazer mais nada com ele— não em um lu-
gar público como o refeitório.
Climb manteve a cabeça erguida. Seus olhos estavam fixos para frente e ele não titube-
aria por nada.
rajado com sua armadura branca de placas e com sua espada embainhada,
T
Climb agora totalmente equipado entrou no Palácio de Valência.
Ao contrário das locações de antes, o Palácio estava muito bem iluminado, coletando
luz do lado de fora de amplas janelas, dando a impressão de terem luz própria.
Por sinal, a posição de Gazef como Capitão Guerreiro foi porque muitos se opuseram à
sua condição de cavaleiro, assim, o Rei criou um novo título para ele. Desde então, o
grupo de soldados de elite que ele havia escolhido e treinado pessoalmente ficaram co-
nhecidos como Bando Guerreiro.
Climb assentiu levemente para eles. Quase todos retornaram o gesto, alguns o fizeram
com relutância; a maioria foi sincera na cortesia. Eles podiam ser nobres, mas também
eram homens de espírito guerreiro que juraram lealdade ao Rei. Excelentes guerreiros
que devotaram suas vidas ao Rei eram dignos de seu respeito.
Em contraste, Climb passou por outro grupo de pessoas no corredor que o via com hos-
tilidade.
Isso é, as empregadas. Quase todas franziam as sobrancelhas sempre que viam Climb.
Era verdade que Climb veio de berço pobre, por isso não era difícil entender o porquê
elas o olhavam com desprezo quando Renner não estava presente. Climb entendeu isso
e nunca ficou zangado por agirem deste modo.
No entanto, essa mentalidade, combinada com a própria expressão séria de Climb, fez
as empregadas pensarem que ele estava esnobando-as e isso só aprofundou sua raiva
por ele. Porém, Climb não deu atenção a este ciclo vicioso. Ou melhor, seria melhor dizer
que, se ele fosse realmente tão cuidadoso com este assunto, ele deveria ser capaz de
amarrar as pontas soltas de uma maneira melhor.
Mesmo assim, Climb sentia-se mentalmente fatigado depois de caminhar por estes cor-
redores do Palácio.
Havia outros membros da família real no Palácio além de Renner e o Rei Ranpossa III.
—Ggh!?
Quando Climb viu um desses membros da realeza aproximar-se, ele imediatamente foi
até a parede, posicionou as costas retas e pressionou a mão contra o peito em uma sau-
dação.
Duas pessoas se aproximaram dele. O que estava por trás era um homem alto e magro,
de cabelo loiro penteado para trás.
O problema era o homem rechonchudo andando na frente dele. Era Zanac Valleon Igana
Ryle Vaiself. O segundo filho do Rei e o segundo na linha de sucessão ao trono.
Havia apenas uma pessoa a quem Príncipe Zanac se referia como monstro. Climb sabia
que estava prestes a ofender um superior hierárquico, mas simplesmente não podia ficar
em silêncio.
“Vossa Alteza. Perdoe minha insolência, mas a Renner-sama não é um monstro. É a pes-
soa mais gentil, compassiva e bela, é digna de ser saudada como um tesouro do Reino.”
Essa mulher gentil chorava diante de Climb sempre que suas políticas populistas eram
negadas. Que direito um sujeitinho tão pífio (Zanac) teria ao insultá-la assim?
A raiva explodiu no coração de Climb e ele desejou dar um bom soco em Zanac.
Poderiam ser irmãos de sangue, mesmo que apenas por parte de pai, mas Zanac não
deveria estar dizendo tais coisas. No entanto, Climb não permitiu que sua raiva assu-
misse a forma física.
Renner disse uma vez: “Meu irmão quer provocar você, instigar a caluniá-lo. Tenho cer-
teza de que ele está tentando encontrar uma desculpa para afastar você de mim. Climb,
você não deve demonstrar nenhuma fraqueza para o meu irmão.”
Climb pensou no dia em que jurou solenemente que nunca trairia aquele olhar desam-
parado no rosto de sua mestra, que fôra abandonada até pela família.
“Mas eu nunca disse que a Renner era o monstro em questão. Você mesmo que pensa
isso, em seu coração... É o que eu diria, mas não sou clichê a este ponto. Curioso... e pensar
que você realmente a considera um tesouro. Quando ela inventa de fazer aquelas pro-
postas, será mesmo que ela acha que aceitarão de peito aberto? Não posso deixar de
pensar que ela sugere mesmo quando sabe que serão rejeitadas.”
Nada a ver. Impossível. Esse Zanac não passa de um invejoso, sempre fazendo acusações
sem sentido.
“Hehehehe... Então não considera ela um monstro, huh? Eu não sei se você é inocente
assim mesmo, ou se a atuação dela que é demasiadamente boa... mas sugiro que abra os
olhos com ela.”
Tudo o que ela fez foi justo. Climb chegou a essa conclusão porque assistira tudo do lado
dela.
“Ora, ora. Sua fé é bem interessante. Mas então, você poderia enviar uma mensagem
àquela monstrinha? ...Diga a ela que; embora eu, como irmão mais velho, a considere
“...Sinto que Vossa Alteza gosta de brincar com as palavras. Peço perdão pela petulância,
mas não acredito que Vossa Alteza realmente me diria uma coisa dessas, então fingirei
que nunca ouvi isso.”
Climb não entendia muito bem o Marquês Raeven. Ele parecia distinguir muito bem a
situação de Climb, mas não olhava para Climb da mesma forma que os outros nobres.
Renner também não deu nenhuma instrução especial para Climb sobre as atitudes de
Raeven.
“Ah sim. Marquês Raeven, sei que concorda comigo que ela é um monstro. Quero dizer,
é mais como se tivéssemos a mesma opinião, daí a nossa aliança.”
“—Meu Príncipe.”
“Estou sendo sincero com ele, Marquês Raeven. Preste atenção às minhas palavras,
Climb. Se você fosse cegamente devoto a ela, eu jamais contaria isso. Mas... eu sinto que
você foi enganado por ela. É por isso que eu estou alertando-o, de boa-fé, sobre a natu-
reza monstruosa da minha irmãzinha.”
“Meu Príncipe, perdoe minha grosseria, mas poderia me dizer de que maneira a Ren-
ner-sama é um monstro? Ela é a que mais se importa com o país e as pessoas.”
“...Isso é porque praticamente tudo que ela faz é destinado a falhar. Ela faz muitas joga-
das que não levam a lugar nenhum. No começo, eu simplesmente achava que ela não
sabia preparar terreno para nada. Mas, enquanto discutia o assunto com o Marquês Ra-
even, me indaguei: E se tudo for parte de um grande plano? Tudo foi se encaixando depois
disso. Pois se ela é astuta como suspeito, então ela é alguém que, mesmo trancada no
Palácio, pode manipular os nobres como quiser. O que é isso, se não um monstro?”
“Certamente deve estar enganado, Vossa Alteza. Renner-sama não é esse tipo de pessoa.”
—Insistiu Climb.
Suas lágrimas eram definitivamente genuínas. Renner era uma mulher compassiva.
Climb sabia disso melhor do que qualquer outra pessoa, já que ela o resgatou.
“Renner-sama é a pessoa mais gentil do Reino. Minha existência é prova disso. E se...”
Se a Renner-sama governasse o Reino, certamente se tornaria uma grande nação que co-
loca o povo em primeiro lugar.
Claro, esse era um sonho impossível, dada a realidade da sucessão. Mesmo assim, Climb
não conseguiu abandonar esse pensamento.
Pouco depois, Climb chegou ao cômodo que mais visitava neste palácio.
Depois de verificar várias vezes para ter certeza de que ninguém estava por perto, ele
estendeu a mão e girou a maçaneta.
Entrar sem bater era um ato extremamente indelicado. Contudo, a dona desta sala pe-
diu-lhe que o fizesse. Sua mestra se recusou a ouvir seus protestos, não importando o
que ele dissesse.
No fim, Climb desistiu. Não havia como um argumento vencer as lagrimas de uma mu-
lher. Ainda assim, sua mestra o concedeu várias exceções a isso. Por exemplo, não havia
como ele conseguir entrar sem ser anunciado se o Rei estivesse presente.
Claro, entrar sem bater era uma atitude muito estressante para Climb. Qualquer um que
fizesse isso merecia ser punido. Era natural que se sentisse estressado quando pensava
nisso e abria a porta.
Assim que Climb estava prestes a abri-la, ele ouviu os sons de uma discussão acalorada
pela porta entreaberta.
Havia duas vozes, ambas femininas. Uma delas pertencia à sua mestra.
Climb ainda estava do lado de fora da porta, mas ela não o havia notado. Isso foi prova-
velmente porque ela estava muito animada com a conversa. Sendo esse o caso, Climb
não queria arrefecer sua animosidade. Ele decidiu ficar parado, ouvindo a discussão
vinda de dentro da sala. Claro que se sentia culpado por espionar, mas se sentiria pior
se interrompesse a conversa.
“...O plano da rotação de culturas que estava falando, Renner... Até agora não sei como
isso vai aumentar os rendimentos... mas quanto tempo levará para mostrar os resulta-
dos?”
“E quanto dinheiro será perdido no plantio de outras culturas durante esses seis anos?”
“Isso dependeria das culturas em questão. Veja assim, supondo que um rendimento
normal seja um, acho que o rendimento cairia para zero vírgula oito... em outras palavras,
é uma perda de receita de vinte por cento. Mas após o sexto ano, o rendimento subirá
em zero vírgula três para sempre. Tenho certeza de que o número será maior se adicio-
narmos pastos para o gado na soma.”
“...Isso soa bastante tentador, mas os agricultores podem realmente perder vinte por
cento de sua renda durante seis anos inteiros?”
“...Eu acho que poderíamos providenciar empréstimos sem juros para compensar a
perda de vinte por cento, depois o país pegaria o reembolso quando os rendimentos vol-
tassem ao normal... Se os rendimentos não subissem, então não seria preciso pagar, po-
deria haver alguns outros meios também. O importante é que, uma vez que os rendimen-
tos subam, os empréstimos poderiam ser pagos com prazos de quatro anos.”
“Por quê?”
“Talvez o experimento tenha corrido bem, mas nada garante que vai se repetir em con-
dições e solos diferentes.”
“...Bem, é verdade que não previmos todas as condições possíveis durante a realização
do experimento, realmente não posso dar certeza absoluta dos resultados. Se tivéssemos
que considerar a qualidade do solo e o clima também, o experimento teria se tornado
muito grande...”
“Que tal subsidiar o déficit de vinte por cento para o período de seis anos?”
“Mas, se pudermos garantir um grande retorno depois de seis anos, o Reino também
ficará mais forte, não acha?”
“O que também significa que a Facção Nobre ficará muito mais forte. Os nobres da Fac-
ção Real não vão permitir.”
“Se refere aos ricos? Eles têm uma política própria entre si. Se derem uma colher de chá
à Realeza, isso pode arruinar o relacionamento deles com os nobres.”
“...Seus planos sempre falham porque não prepara bem o terreno. Quero dizer... eu en-
tendo que é difícil conseguir uma proposta aprovada quando o país é dividido por dois
grandes blocos... Que tal implementá-la apenas no território da Coroa?”
“Ah, aqueles retard— aqueles cavalheiros que deixaram a sabedoria na barriga de suas
mães por sua causa.”
“Ahhhh, então deixaram no Rei! Enfim, é muito ruim quando até mesmo a Família Real
fica desunida...”
“Hm?”
O coração de Climb tremeu quando ele ouviu aquelas palavras. Ele ficou surpreso por
ela ter percebido sua presença, e ao mesmo tempo, fazia total sentido.
A sala era luxuosa, mas não brega, havia duas donzelas de cabelos loiros sentadas a uma
mesa redonda próxima à janela.
A outra se sentava de frente para ela. Tinha olhos verdes e lábios rosados, seus traços
radiavam saúde. Talvez não fosse justo comparar sua aparência a de Renner, ela exalava
um encanto próprio. Se Renner fosse uma joia brilhante, então essa mulher seria uma
joia cheia de vitalidade.
Era difícil dizer, dado o vestido cor-de-rosa que usava, mas essa mulher era a líder de
uma das duas equipes de aventureiros adamantite do Reino, e a melhor amiga de Renner.
“Bom dia.”
Climb achou isso muito estranho. Havia cinco cadeiras dispostas ao redor da mesa cir-
cular. Isso era normal. No entanto, três xícaras de chá estavam postas.
Uma em frente à Renner, outra diante de Lakyus, e mais uma em frente ao assento ao
lado de Lakyus — não o que Renner havia indicado. Climb olhou em volta, mas não con-
seguiu encontrar nenhum vestígio da terceira pessoa.
As ordens de Renner para Climb causaram um grande esforço para ele, seja por ser
plebeu compartilhando uma mesa com sua mestra — um membro da realeza — ou por
entrar sem ser convidado.
“Mas...”
Climb olhou suplicante para a outra mulher em busca de ajuda. Ele esperava contra
toda a esperança que ela rejeitasse o pedido, mas essa esperança foi prontamente ne-
gada a ele.
“Ma-mas... Aindra-sama...”
“...Malvada.”
Lakyus acrescentou o que parecia um coração ao final de sua frase em tons de doçura
treloso, Renner a respondeu constrangida, sorrindo suavemente.
Isso é, se a curvatura em seus lábios realmente contasse como sorriso, pois seus olhos
davam a entender outros sentimentos.
“Tá, tá, tudo bem, Sr. Tapado. Vou ensinar-lhe uma coisinha ou duas a como não se ater
demais aos detalhes.”
“Eh? Gracejos?”
“Mas é claro. Bem, o Climb é especial, mas isso é porque ele é seu.”
O rosto de Renner ficou rosado e ela bateu as mãos nas bochechas. Climb não tinha idéia
do que fazer e desviou o olhar de Renner, e então seus olhos se arregalaram.
“Quê—!”
Chocado, Climb agarrou a espada em sua cintura e abaixou sua postura, preparado para
proteger Renner.
Lakyus suspirou.
Não havia cautela ou consciência do perigo na voz fria de Lakyus. Climb percebeu o que
isso significava e deixou a força drenar de seus ombros.
“Entendido, chefe.”
“Ah, você provavelmente não a conhece, Climb. Ela é um membro da minha equipe—”
“—É a Tina-san.”
Pelo que Climb sabia, a equipe adamantite “Rosa Azul” era composta por cinco mulhe-
res: a líder e magic caster divina, Lakyus; a guerreira, Gagaran; a magic caster arcana,
Evileye; por fim as ladinas, Tia e Tina.
Climb tinha visto as três primeiras antes, mas não as duas últimas.
Dado seu corpo magro coberto por vestes negras, ela parecia de fato versada em técni-
cas ladinas.
Ela acenou casualmente para Climb, e então silenciosamente seguiu em direção à mesa
com a fluidez de uma fera selvagem. Ela se sentou na cadeira ao lado de Lakyus. Aparen-
temente a terceira xícara de chá era para ela.
“A Tia não está aqui. Gagaran e Evileye não gostam de roupas abafadas... mas não é tão
abafado, é? Eu mesma estou usando um vestido apropriado, e olha que nem insisti para
que elas fizessem o mesmo.”
Mesmo Lakyus dizendo isso, o fato era que a etiqueta exigia que se usasse um vestido
formal diante de uma princesa. Claro, Climb não tinha intenção de dizer isso na cara de
uma amiga de Renner — particularmente uma dama que era membro da nobreza.
“Entendi. Ainda assim, é uma honra conhecer a famosa Tina-sama. Espero ter a chance
de me beneficiar de sua orientação no futuro.”
A Warm Bottle podia manter a temperatura e harmonização de seu conteúdo por uma
hora, e era um dos itens mágicos favoritos de Renner. Seu uso era frequente ao entreter
convidados importantes, embora não em outros momentos.
Climb sabia que não havia protestos e se resignou. Assim, ele sentou-se e bebeu seu chá.
“É delicioso, Renner-sama.”
Renner sorriu, mas se Climb fosse honesto, ele diria que não sabia se era gostoso ou não.
Entretanto, como Renner havia feito, ele automaticamente o considerou como algo bom.
“—A garota que procura deve estar reunindo inteligência hoje. Nós três deveríamos ter
vindo juntas, mas no final nossa líder entregou trabalho no último minuto. É tudo culpa
da nossa líder Diabólica.”
Escusado dizer que a voz veio de Tina. Um sorriso assustador apareceu no rosto de
Lakyus quando ela ouviu as palavras “Diabólica”. Climb desviou os olhos e disse:
“Climb, Tina-san e Tia-san são gêmeas. Até os penteados são quase idênticos.”
Climb não achou que era simples assim, mas assentiu em compreensão.
Curiosamente, Tina encarava Climb sem o menor pudor, fazendo-o se sentir desconfor-
tável. Seu plano original era apenas suportar, mas então percebeu que ela poderia ter
notado algo e decidiu perguntar:
“Aconteceu algo?”
“...Huh?”
Ele ouviu, mas não entendeu. Depois de ver os pontos de interrogação surgindo na ca-
beça de Climb, Lakyus interrompeu e pediu desculpas:
“Não é nada, Climb. É coisa que ela inventa. Não pense demais nisso, tudo bem? Pode
relaxar.”
“Tá...”
Climb disse a si mesmo para não ser um intrometido, mas Renner não parecia aceitar e
interrompeu. Lakyus tinha uma expressão amarga no rosto enquanto olhava para Ren-
ner.
“Ah, é que—”
“—Calada. Eu já não trouxe a Tia justamente porque ela encheria a cabeça da Renner
de bobagens. Então vê se entende meu lado e segura essa língua, entendeu?”
O rosto de Lakyus começou a se contrair assim que Renner começou a perguntar, e sua
expressão ficou deprimida.
Ela mudou sua linha de visão para Climb quando ele estava prestes a se intrometer.
Esta foi uma mudança de assunto um tanto inusitada, mas Climb não queria envergo-
nhar uma convidada.
A Rosa Azul havia fornecido o mythril para sua feitura sem nenhum custo. Climb não
pôde agradecer-lhes o suficiente por isso, por mais baixo que ele se curvasse.
“Não se preocupe com isso. Apenas doamos as sobras dos materiais das nossas arma-
duras de mythril.”
Ela chamava de sobras, mas mesmo as sobras de mythril eram caríssimas. Talvez os
aventureiros ranques mythril possuam uma arma de mythril, enquanto aventureiros
orichalcum possam ter condições de arcar com a manufatura de uma armadura de
mythril. Mas apenas aventureiros de posição adamantite poderiam presentear alguém
com um material tão caro.
“...Não é certo que uma princesa gaste sua mesada, você não acha?”
“Mas vem de parte da renda do meu domínio. Eu só queria usar o meu próprio dinheiro
para fazer a armadura do Climb.”
“Eu imaginei que queria usar o seu próprio dinheiro para presentear ele...”
“...Se já sabia, então por que me deu de graça? Lakyus, sua idiota.”
Mostrar sua gratidão era uma coisa, mas por trás dessa gratidão havia um sentimento
poderoso que nunca poderia ser exibido.
Climb forçosamente esmagou esse sentimento e escondeu dentro de si. Em seu lugar,
ele proferiu as palavras que repetira várias vezes:
Quando ela notou a maneira em que ele claramente demarcou a separação entre os dois
— aceitando que mestra e servo estavam em suas respectivas hierarquias —, Renner
sorriu.
Apenas Climb — que a observara mais do que qualquer outra pessoa, que a vigiava to-
dos os dias — podia dizer que o sorriso dela escondia a solidão.
“Enfim, acho que saímos demais do assunto. Melhor voltar à discussão anterior.”
“Da Oito dedos? Estávamos falando sobre como atacamos três de seus vilarejos produ-
tores de drogas e queimamos seus campos até as cinzas. Eu duvido que eles possam se
recuperar disso.”
Oito Dedos era o nome da organização criminosa que se rastejava na escuridão do Reino.
Sua amada mestra havia tomado medidas para reprimi-los.
Não era difícil imaginar o destino miserável de um vilarejo, que dependia das drogas
para sobreviver, quando seus campos fossem queimados. Porém, eram sacrifícios neces-
sários para eliminar as drogas que assolavam o Reino.
Se Renner possuísse o poder supremo, talvez ela pudesse fazer outra coisa. No entanto,
Renner não tinha patrocinadores, apesar de ser uma princesa. Tudo o que ela podia fazer
era realizar o cálculo frio de salvar aqueles que poderiam ser salvos e abandonar todos
os outros.
Por outro lado, Renner poderia implorar uma benção de seu pai para atacá-los com au-
toridade ou força militar. Contudo, a Oito Dedos estava profundamente atrelada com os
nobres, e se a notícia vazasse, eles poderiam queimar a evidência de seus erros.
Considerando esses pontos, Renner decidiu empregar diretamente sua amiga, Lakyus.
Ele também se lembrava de que a Guilda não podia punir os aventureiros mais bem
classificados (ranque adamantite), nem poderia expulsá-los. Mesmo assim, ainda man-
charia sua reputação dentro Guilda e certamente levaria a repercussões no futuro. No
entanto, a equipe Rosa Azul aceitou a tarefa sem se importarem, porque elas amavam
muito seu país, e porque Renner era amiga delas.
A gratidão de Climb em relação à Lakyus cresceu quando percebeu que ela estava dis-
posta a fazer sacrifícios pelo bem maior.
♦♦♦
Lakyus decidiu que elas não deveriam mais falar mais sobre isso. Ela abriu a bolsa que
Tina lhe apresentou e tirou um pergaminho.
Era um documento que ninguém na Rosa Azul poderia decifrar. No entanto, Lakyus sen-
tiu que a pessoa mais inteligente que ela conhecia — Renner — poderia ser capaz de
fazer alguma coisa.
Elas abriram o pergaminho e viram uma extensão de símbolos. Eles não se pareciam
com letras do idioma de qualquer país. Renner olhou para eles e casualmente respon-
deu:
As cifras de substituição eram uma forma de código feita substituindo uma letra ou vá-
rias letras por outra letra ou símbolo. Por exemplo, “a” pode se tornar “△” e “b” pode se
tornar “▢”. Assim, os símbolos “△△▢▢△” significam “aabba”.
“Pensei em algo assim. Até tentei trocar símbolos por horas, mas não deu em nada. Pe-
gamos um deles como prisioneiro, ele parecia estar no comando, suspeitamos que pu-
desse ter memorizado a chave cifrada. Planejamos usar magia de charme para fazê-lo
decodificar a mensagem para nós. Mas... você deve saber que quando o mesmo conjura-
dor usa a mesma magia no mesmo sujeito várias vezes, os resultados obtidos ficam mais
fracos. Então eu queria fazer bom uso logo na primeira conjuração. E é por isso que vim
discutir com você antes de usar a magia.”
As palavras de Renner deixaram os olhos de Lakyus arregalados. Ela não pôde deixar
de trocar olhares com Tina, que estava sentada ao lado dela.
Inacreditável. Mas, ao mesmo tempo, elas pensaram: “Eu sabia que ela poderia resolver
isso”.
Enquanto ela murmurava para si mesma, Renner se levantou com o pergaminho e foi
buscar papel e caneta.
“Esta é uma simples cifra de substituição de um caractere para um símbolo, por isso é
fácil quebrá-la. E felizmente, eles estavam usando o idioma do Reino. Se tivessem usado
o do Império ou algo assim como uma cifra, seria quase inquebrável. Mas isso... bem,
uma vez que você saiba o que uma das palavras significa, pode supor as outras. Qualquer
um pode quebrar isso se estiver disposto.”
“Não, não... bem, você faz parecer fácil. Mas isso não significa que é preciso saber deze-
nas de milhares de palavras para quebrar o código?”
“Bem, usam referências literárias de codificação. Geralmente não são muito rebuscadas
e eles não podem usar palavras que são muito complexas também. Pois precisam sim-
plificar para que um capanga possa entender. Isso diminui muito as possibilidades.”
Sua amiga fez parecer muito simples, mas não era tão simples quanto ela dizia ser.
Minha nossa, ela realmente conseguiu... É difícil acreditar que um gênio assim realmente
exista.
Renner havia desconsiderado elogios assim toda vez que elas se encontravam e conver-
savam, mas Lakyus nunca havia conhecido alguém como Renner que merecesse ser cha-
mado de gênio.
Enquanto Lakyus tremia internamente, Renner disse com ânimos leves: “Está feito. É
apenas um monte de referências de livros.”, antes de entregar o papel para ela.
“Eu duvido que colocariam um documento tão importante em uma vila de narcóticos...
provavelmente uma isca, não acha?”
“Hm... não é bem assim. Siga meu raciocínio: Oito Dedos é uma organização, mas na
verdade estão mais para oito grupos distintos que trabalham juntos, concorda?”
Lakyus assentiu.
“Então, isso deve ser informação sobre os outros sete grupos... ou melhor dizendo, di-
visões? De todo modo, essa é uma forma de vazar deliberadamente informações sobre
todos, muito além da divisão de drogas, para possíveis inimigos, a fim de tirar o foco de
si mesmos.”
“Em outras palavras, eles jogam informações sobre as outras divisões para situações
assim... Eu não esperava que eles fossem totalmente unidos, mas isso é simplesmente
ridículo...”
“Já estávamos nos preparando para fazer isso, mas é melhor pensar bem antes de agir,
ou vamos acabar nos dando mal.”
“Então, o que devemos fazer sobre aquele bordel? Eu ouvi dizer que é um lugar nojento,
onde se pode experimentar qualquer coisa que desejar.”
Desgraçados. Aquela escória que só consegue pensar com a luxúria deve ser morta!
Quando se lembrou das coisas que aconteciam no bordel em questão, ela não mais tinha
a postura de uma herdeira nobre, mas sim assumiu uma aventureira audaz, e os amaldi-
çoamentos brotaram de dentro de seu coração.
O significado da frase “qualquer coisa que desejar” não era exagero. Era certo que algu-
mas pessoas — homens e mulheres — haviam sido assassinados em prol do entreteni-
mento.
Por esse motivo, eles não o fechariam facilmente. Poderiam até imaginar que tipo de
resistência determinada os aguardava. Afinal de contas, era um paraíso contaminado
para aquelas pessoas com desejos crus e indescritíveis.
“Diga, Renner. Como não podemos lidar com eles por meio da lei, por que não os força-
mos a dar às caras e assim expomos seus crimes? Claro, contanto que encontremos pro-
vas, não é mesmo? Se a Divisão de Escravatura estiver realmente administrando o bordel,
quebrá-los será um grande golpe. Além disso, dependendo de onde as evidências apon-
tam, poderemos ensinar uma lição dolorosa aos nobres que estão em aliança com eles.”
“Você pode ter razão, Lakyus. Mas se fizer isso, não vai incomodar sua família... a família
Alvein? Eu acho muito difícil agir por causa disso. A mesma coisa vale para os outros
membros da Rosa Azul... e ter o Climb lá, no meio disso, parece quase impossível...”
Quando ela viu Climb se desculpar, Renner estendeu a mão para que Climb pegasse e
sorriu.
“Perdoe-me, Climb. Isso não foi o que eu quis dizer. Aquele é o único bordel do sub-
mundo na Capital Real, então ninguém pode derrubá-lo sozinho. Preste atenção, Climb,
eu confio em você mais do que tudo. Eu sei o quanto você dá o seu melhor por mim. No
entanto, não faça nada que possa envolver-lhe nisso. Este não é um pedido, mas uma
ordem, entendeu? Se alguma coisa acontecesse com você, eu...”
Até mesmo Lakyus, apenas os observando, ficou comovida pelas lágrimas da beleza ar-
rebatadora diante de seus olhos. E quanto a Climb?
Ele tentou ao máximo ficar com o rosto sem emoção, mas não conseguiu. Aquelas bo-
chechas ruborizadas disseram sentimentos além das palavras.
Se fosse um bardo a dar um título a esta cena em movimento, tal bardo certamente a
chamaria de “A Princesa e Seu Cavaleiro”. Contudo, Lakyus sentiu uma pontada de medo.
Ela pensou que deveria ser impossível, mas se Renner estivesse fazendo isso de propó-
sito, então ela seria uma megera de proporções verdadeiramente inimagináveis—
Mas o que estou pensando? Por que estou duvidando da minha melhor amiga? E tudo o
que aconteceu até agora provou que ela não tem nada de megera. Se nem mesmo ela for
de confiança — a Princesa Dourada, que faria uma cruzada em nome da justiça —, então
em quem posso confiar?
Renner e Climb reagiram a um nome particular entre a lista que Lakyus recitou.
“Hm? Bem, não vou afirmar que ela foi enviada só para espionar você... mas, também
não sinto que ela veio até aqui só para se promover na vida.”
“Realmente. Parece que precisamos ter cautela com o que é dito no castelo. Climb, você
também tem que manter isso em mente.”
“Concordo. Vamos discutir o que fazer com os locais que descobrimos no registro codi-
ficado. Renner, se importaria de me emprestar o Climb? Eu gostaria que ele dissesse à
Gagaran e as outras que elas precisam se preparar para uma possível emergência.”
Parte 2
Climb caminhou ao longo da rua principal da Capital Real. Ele se mesclava perfeita-
mente com a massa de pessoas, dado que tinha poucas características distintivas.
Ele não usava seu traje distinto, armadura branca. Embora pudesse usar certos itens
alquímicos para mudar sua cor caso necessário. Mas acontece que, na atual situação, não
havia necessidade de andar armadurado enquanto caminhava pelas ruas.
Como resultado, ele se vestiu casualmente, apenas com cota de malha sob as roupas.
Apenas a espada longa em sua cintura o marcava como visivelmente diferente de um
cidadão comum.
Qualquer um em tal panóplia deveria ser um aventureiro. Não era incomum precisarem
mais de publicidade do que proteção.
Logo, ele viu uma estalagem de aventureiro ao longo da estrada. Tal estalagem tinha
um estábulo e um grande pátio para a prática de espada. Seu belo exterior prometia um
interior igualmente requintado. Todas as janelas dos quartos de hóspedes estavam equi-
padas com vidro transparente.
Essa era a estalagem mais cara da Capital Real. Era um local de encontro para aventu-
reiros que estavam confiantes em suas habilidades e capazes de pagar as contas onero-
sas.
Climb abriu a porta da estalagem, sem prestar atenção aos guardas que a flanqueavam.
O barzinho ocupava um andar inteiro, mas era pouco povoado de aventureiros, consi-
derando seu tamanho. Isso ilustrava claramente a raridade de aventureiros bem remu-
nerados.
A maior parte consistia de aventureiros de aparência poderosa. Quase todos aqui po-
deriam derrotar Climb com facilidade. A cada visita que fazia aqui, Climb percebia o quão
insignificante era.
À sua frente — no interior mais profundo da estalagem — havia uma mesa redonda. Ele
olhou para as duas pessoas lá sentadas.
Uma delas era minúscula, vestindo um longo manto escuro que cobria todo o corpo.
Seu rosto não podia ser visto. Não era porque tinha pouca iluminação, mas porque ela
usava uma estranha máscara facial com uma joia carmesim. Havia uma fenda estreita
que corria ao longo do nível dos olhos, mas era impossível ver os olhos sob a máscara.
O tórax dessa pessoa era visível sob seu traje, como se ela estivesse exibindo-o orgu-
lhosamente. Dito tórax parecia nada mais do que músculos peitorais extremamente de-
finidos. Colocando mais claramente, não se parecia em nada com a maciez feminina.
Uma era a magic caster arcana, Evileye, enquanto a outra era a guerreira Gagaran.
♦♦♦
Climb se aproximou delas. Uma das pessoas que ele procurava assentiu e depois gritou
com voz rouca:
“Yo, virgenzinho!”
Os olhares que estavam dispersos se concentraram em Climb mais uma vez, mas nin-
guém zombou dele. Em vez disso, desviaram o olhar mais uma vez, como se simpatizas-
sem por ele.
Eles fizeram isso porque sabiam que mesmo para os aventureiros mythril ou orichal-
cum, mostrar o menor desrespeito à Gagaran não era um ato de bravura, mas sim im-
prudência.
Climb implorou mais vezes que se lembrava, mas Gagaran se recusou a chamar Climb
por seu nome próprio. Sendo esse o caso, o melhor curso de ação que ele poderia tomar
era desistir e fingir que não se importava.
Gagaran dizia a mesma coisa todas as vezes, a ponto de se tornar algo como uma sau-
dação. No entanto, ela não estava brincando. Se Climb respondesse “sim”, mesmo em
tom de brincadeira, ela o arrastaria imediatamente para um quarto de solteiro no se-
gundo andar.
Gagaran, que se orgulhava de ser uma “papa-virgem”, era uma dessas pessoas.
Em contraste com Gagaran, Evileye o encarou estoicamente de frente, com seu rosto
imóvel. Talvez ela estivesse contemplando Climb sob a máscara, mas ele não podia ter
certeza disso.
“Sim. Eu trago uma mensagem. “Vocês podem precisar sair a qualquer momento. Eu ex-
plicarei os detalhes quando voltarem”. Mas a Aindra-sama deseja que se preparem e es-
tejam prontas para agir a qualquer momento.”
“Pode deixar. Mas é uma pena que veio até aqui só pra me dizer isso.”
O rosto de Gagaran se iluminou com um largo sorriso, e Climb se lembrou de que tinha
outra coisa para dizer.
Gagaran lhe ensinara aquele golpe no pátio de prática atrás da pousada. Seu rosto se
abriu com um sorriso, como se ela tivesse sido a pessoa que havia sido elogiada.
“Oh, aquele golpe? Hehe~, nada mal, garoto. Mas você sabe...”
“Sim. Eu não ficarei satisfeito apenas com isso. Vou continuar a praticar e buscar a per-
feição.”
“Assim que se fala, precisa continuar treinando. Mas pense no que fazer se não der certo.
Pense em como emendar outro movimento.”
“E também, tem que usar esse movimento de corte como uma finalização, entendeu?
Senão é perda de tempo.”
“Na verdade, é preciso saber vários golpes diferentes e escolher o mais adequado na
hora. Cada movimento serve para uma ocasião. Mas acho que não pode fazer isso.”
“Presta atenção, você precisa criar uma jogada que seja pelo menos uns três golpes
emendados. Deve ser algo que evite que seu oponente contra-ataque, mesmo que con-
siga se defender.”
Climb assentiu.
“Claro, isso não vai funcionar quando lutar contra monstros de muitos braços. Mas con-
tra os humanos, aí deve ser moleza. Se estiver na pior e seu oponente decifrar seus pa-
drões de ataque, isso pode salvar sua vida se for a primeira vez que usar num inimigo.
Pratique, pratique e continue praticando.”
Esta manhã, ele só conseguiu um sucesso contra Gazef. Em todas as outras ocasiões,
Gazef tinha visto através das intenções imediatamente e, por sua vez, havia contra-ata-
cado.
Então, ele poderia perder a confiança por causa disso? Claro que não.
Ele poderia se permitir cair em desespero por causa disso? Claro que não.
Era o oposto.
Precisamente o oposto.
Pois em tenra idade um mero plebeu como ele próprio já conseguira chegar tão perto
do mais forte guerreiro do Reino — não, dos países vizinhos. Climb sabia que Gazef não
havia mostrado nem mesmo uma fração de seu verdadeiro poder, mas para Climb — que
andava em um vale de sombras sem esperanças de ver alguma luz — isso foi uma tre-
menda dose de encorajamento.
Enquanto pensava nisso, ele entendeu completamente o que Gagaran estava tentando
dizer.
Ele não estava confiante de que poderia desenvolver um bom ataque combinado, mas
estava disposto a tentar. Uma chama foi acesa nas profundezas do seu coração. Ele es-
tava determinado a se tornar mais forte, para que pudesse fazer com que Gazef mos-
trasse mais de sua força na próxima vez que se enfrentassem.
“...Ah sim, acho que você perguntou à Evileye sobre algo antes, não é? Algo sobre apren-
der magia?”
“Isso mesmo.”
Climb olhou para Evileye. Naquela época, ela apenas rira dele por baixo da máscara e o
assunto havia morrido ali. Perguntando-lhe a mesma coisa agora, sendo que a situação
era praticamente a mesma, só resultaria na mesma resposta.
Contudo—
“Pirralho.”
Sua voz era bastante surpreendente, mesmo sem remover a máscara que usava. A más-
cara que ela usava não era particularmente grossa, então deveria ter sido fácil distinguir
as qualidades de sua voz. No entanto, não havia como dizer a idade de Evileye ou quais-
quer inflexões emocionais. No máximo, ele poderia concluir que era mulher. Era uma
voz sem emoção e uniforme que soava velha e jovem ao mesmo tempo.
Isso provavelmente foi porque a máscara de Evileye era mágica. Mas por que ela escon-
dia sua voz?
Ela não permitiu que ele tivesse espaço para responder, como se não houvesse mais
nada a ser dito.
Ele não tinha dom para magia. Não, isso não foi tudo.
Não importava quanto praticasse sua esgrima, quantas vezes sangrasse e empunhasse
até ficar com as mãos calejadas, ele não conseguia alcançar o nível que desejava. Os picos
No entanto, ele não poderia desistir de se esforçar para superar esse limite inacessível.
Como ele não tinha talento, ele precisava ter esperança que seu esforço implacável o
ajudasse a melhorar de alguma forma.
Tendo percebido as emoções sob a faceta sem emoções de Climb, Evileye continuou:
“Ter o dom para algo vem desde a nascença... Algumas pessoas dizem que todos são
como botões antes de florescerem, que todo mundo leva jeito para algo... Hmph. Ao meu
ver é palhaçada, isso é apenas um desejo, algo que os idiotas usam para se consolar. Po-
rém, o Líder dos Treze Heróis já foi um desses.”
O líder dos Treze Heróis. Segundo a lenda, ele era apenas uma pessoa comum, até mais
fraca que a média. Mas ele nunca parou de lutar, continuou balançando a espada mesmo
quando ferido e, no fim, acabou se tornando um herói entre os heróis mais forte que
qualquer outro. Ele acabara por ser alguém sem limites de crescimento.
“Ele levava jeito, só não tinha florescido. É diferente do seu caso. Você já treinou até
demais, e até hoje está só nisso... Nem todo mundo tem talento, e é óbvia a diferença
entre os que têm e os que não têm. Ainda assim, Climb, não vou dizer para desistir, mas
nunca se esqueça dos seus limites.”
O severo sermão de Evileye foi seguido por um breve silêncio. No final, Evileye decidiu
falar.
“Gazef Stronoff... ele é um bom exemplo. Pessoas como ele seriam consideradas talen-
tosas. Climb... você acha que pode compensar a diferença entre vocês dois com esforço?”
Ele não pôde responder. Seu treinamento hoje o fez perceber que ele não estava nem
perto.
“Tá, talvez ele não seja um bom exemplo... Mas acontece que ele é a única pessoa em
quem consigo pensar que se aproxime da esgrima de um dos Treze Heróis. A nossa Ga-
garan aqui é boa, mas ela não pode derrotar o Gazef.”
“...Hey, nem é justo me comparar. Gazef é um homem com um pé no reino dos heróis,
sacou?”
“Hmph. Você é uma mulher heroica se assim posso dizer... mesmo que a parte mulher
seja difícil de acreditar.”
“...Basicamente isso.”
“Pois é, eu sou apenas uma humana. Apenas uma pessoa comum que não pode alcançar
o reino dos heróis.”
“Mesmo assim, você leva jeito. Você não é uma pessoa inapta como o Climb. Escute aqui
Climb, nada de ficar sonhando em alcançar as estrelas... não se prenda nisso.”
Climb sabia — melhor que ninguém — que ele não tinha talento. Mesmo assim, ouvi-la
repetir que “você não tem talento, você não leva jeito” era muito deprimente. Dito isso,
Climb não tinha intenção de mudar o objetivo de sua vida.
Talvez ela tenha sentido a determinação de um mártir em Climb, mas no final, Evileye
zombou de trás de sua máscara.
“...Então você não vai mesmo desistir, mesmo depois de tudo que eu disse?”
“Não vou.”
“Seguir em frente se apegando a sonhos impossíveis vai acabar levando você para um
precipício. Sabe disso, não sabe? Não me faça ficar repetindo — você precisa conhecer
seus limites.”
“Eu entendo.”
“Você entende, mas não aceita, não é? A palavra tolo nem sequer é o bastante para des-
crever gente como você. Você é do tipo que morre cedo... alguém vai acabar chorando
sobre seu túmulo graças à sua tolice, vai dizer é mentira?”
“Que isso, Evileye? Essa falação toda com o Climb é porque se importa com ele, né?”
Evileye rodeou seus ombros quando ouviu Gagaran falar. Então, ela se virou para Gaga-
ran e agarrou-a pelas lapelas enquanto gritava:
Gagaran ficou contente em deixar Evileye constrangida, enquanto a respondia com in-
diferença. Evileye ficou sem fala por um momento e afundou de volta em sua cadeira.
“Comece estudando sobre magia. Quando absorver isso, você poderá entender como os
inimigos que usam magia pensam. Aí poderá escolher um curso de ação mais correto
dessa maneira.”
“Aprender sobre todas as magias que existem não é um pouco demais pra ele?”
“Claro que não. O fato é que a maioria dos magic caster não usam a maior parte das
magias existentes. Apenas se concentre nas mais utilizadas. Se nem isso puder fazer, en-
tão desista de uma vez.”
Evileye murmurou.
“Além disso, ele só precisará estudar até o terceiro nível. Isso não deve ser um pro-
blema.”
“...Por falar nisso, Evileye~. A gente sabe que magias podem ir até o décimo nível, mas
é coisa de lendas, porque ninguém nunca conseguiu isso. E mesmo assim você sabe disso.
Como?”
“Hm...”
Evileye tinha um “olhar” professoral no rosto enquanto fazia algo sob o manto. No ins-
tante seguinte, Climb percebeu que os sons ao redor deles pareciam mais distantes agora.
Era difícil descrever, mas parecia que havia um tecido que os separava dos demais.
Climb não sabia que a ativação daquele item era um sinal de como ela estava preocu-
pada em ser ouvida. Tudo o que ele sabia era que Evileye pretendia responder à per-
gunta de Gagaran com muita seriedade. Agora que ela tinha chegado a esse ponto, Climb
alinhou sua posição na cadeira.
“Nos mitos antigos — mais como nas lendas — havia menção de seres conhecidos como
os Oito Reis da Ganância. Eram conhecidos como aqueles que roubaram o poder dos
deuses, e os contos falam de como governaram este mundo com esse poder absoluto.”
Climb ouvira a história dos Oito Reis da Ganância. No entanto, não eram contos muito
populares, dado que eram tidos como contos infantis, mas qualquer um com um pouco
de vivência já tinha ouvido falar.
Esta história não era popular por razões óbvias, mas debatia-se sobre se era ou não
apenas um conto de fadas infantil. Na opinião de Climb, havia sido muito floreada e ador-
nada. Porém, um pequeno grupo de pessoas entre os aventureiros acreditava que os Oito
Reis da Ganância existiram — e que eles comandaram poderes além do imaginável, além
do que estas terras viram até então.
A prova disso era uma cidade bem ao sul do deserto. Rumores diziam que era a capital
construída quando os Oito Reis da Ganância conquistaram o continente.
“Exato. Na lenda diz que os Oito Reis da Ganância deixaram para trás esse item mágico
inimaginavelmente poderoso, um grimório que registra todas as magias existentes.
Além disso, diz que, devido a algum tipo de encantamento, até magias recém-desenvol-
vidas aparecem em suas páginas também.”
Climb sabia dos Oito Reis da Ganância, mas não desse tomo. Ele tinha uma idéia apro-
ximada de como esse item realmente era valioso, mas ele permaneceu em silêncio e es-
cutou.
“Sabemos da existência de magias de décimo nível por causa deste item. Claro, não há
muitas pessoas que conheçam o Nameless Spellbook em si...”
Climb só fez essa pergunta porque sabia que estava diante de aventureiras de primeira
classe.
“Ouvi falar que sua líder empunha uma das armas pertencentes a um membro dos
Treze Heróis... ela pensa da mesma maneira?”
“...Isso é algo completamente diferente. Mas enfim... isso são informações que ouvi de
outra pessoa, então não sei bem dos detalhes. Acho que saímos demais do assunto, mas
é isso. Entendeu agora, Gagaran?”
Depois disso, Evileye pareceu um pouco intrigada, o que era bastante raro para ela, e
então disse:
“É verdade, mas em partes... mas depois que se torna um undead, sua moral sempre vai
pender para um lado. Quando faz tudo para realizar um sonho impossível... as mudanças
no corpo ecoam na alma, e coisas horríveis nascem disso.”
A voz abaixo daquela máscara era tipicamente desprovida de inflexão emocional, mas
agora estava tingida de uma ponta de arrependimento. Gagaran notou como Evileye es-
tava olhando para a distância e deliberadamente falou em uma voz alegre.
“Bem, é quase certo que a Princesa desmaiaria se acordasse um dia e visse que o Climb
se tornou um Ogro.”
Evileye provavelmente sentiu as boas intenções por trás das palavras de Gagaran. Sua
voz retornou ao seu usual tom de emoção.
“...Aposto que sim. Magias do tipo Transmutação podem permitir que mude breve-
mente para outra espécie. Serei franca com você — são opções válidas para melhorar
seus atributos físicos.”
Isso era óbvio. Entre dois oponentes habilidosos, aquele com os melhores atributos fí-
sicos teria a vantagem.
“E além do mais, muito dos Treze Heróis não eram humanos. A propósito, eles são cha-
mados os Treze Heróis, mas houveram mais de treze. Mas apenas treze deles entraram
para as canções e histórias... a batalha contra os Deuses Demônios cruzou todas as fron-
teiras raciais, mas o humanocentrismo cegou muitos e não quiseram deixar as outras
espécies brilharem demais nas sagas heroicas.”
Evileye parecia estar criticando certos povos. Então, sua atitude mudou e ela continuou
num tom nostálgico.
[Gigantes d o A r ] [Ciclone M a c h a d o ]
“Havia o Chefe Guerreiro dos A i r Giants e seu Axe Cyclone; a família real élfica que
tinha as características especiais dos Elfos ancestrais; o Cavaleiro Negro que manejava
as Quatro Espadas das Trevas — o dono original da Kilineiram da nossa líder. Inclusive,
ele era um humano com sangue de demônio.”
Um dos Treze Heróis, o Cavaleiro Negro, tinha quatro espadas: Hyumilis, a espada do
mal. Kilineiram, a espada amaldiçoada. Crocdabal, a espada corrompida e Sfeiz, a espada
da morte. A líder da Rosa Azul, Lakyus, possuía uma delas.
“Uma vez eu ouvi a líder murmurar quando tava sozinha. Ela segurou o braço direito e
disse: Apenas eu, uma mulher que serve aos deuses, sou capaz de suprimir seu poder de-
moníaco usando apenas minha vontade, ou algo assim.”
“Ela usa a espada há um bom tempo, então ela tem propriedade para dizer isso... pode
ser verdade.”
“Como assim?”
“Tipo, não faz muito tempo que ouvi ela resmungando outras coisas, sabe? Acho que ela
não me notou, eu fiquei ouvindo tudo bem quietinha, só sei que no final ela disse: Se eu
não tomar cuidado, essa criatura das trevas nascida da escuridão eterna tomará conta do
meu corpo e liberará o Poder da Espada Amaldiçoada”, ou algo assim. Pareceu bem ma-
ligno.”
“Eu senti que ela queria isso em segredo, mas é algo importante, né? Aí depois eu per-
guntei a respeito, ela corou na hora e disse que não era nada de mais, que era pra esque-
cer.”
“Hm. Deve ser muito embaraçoso para uma sacerdotisa — que deveria ser aquela que
remove maldições — acabar sendo vítima de uma maldição. Talvez ela não queira que
nos preocupemos? Ela realmente pretende suportar esse fardo sozinha?”
“Depois dessa vez, eu não a vi agindo assim de novo... Mas pense comigo... Ela começou
a usar aqueles anéis de armadura articulados, tralha sem sentido, logo depois que rece-
beu a espada, não foi?”
“Eu pensei que era alguma moda... então quer dizer que são itens mágicos que selam
algo, ou mesmo algum tipo de joia de proteção?”
Climb não podia mais fingir ser indiferente, e ele franziu a testa.
Pelo que ele tinha visto e ouvido, Lakyus poderia estar sob o controle de um item má-
gico maligno. Ele ficou ainda mais preocupado quando pensou de onde acabara de vir.
“Não se preocupe. Eu duvido que a situação se deteriore. Ela não vai ser pega de sur-
presa, mesmo que o poder das trevas ameace tomar o controle. Temos que aceitar o fato
de que ela não nos contou como um sinal da confiança dela em controlar isso sozinha.
Tenho certeza de que ela tem força mental para este tipo de coisa. Mas por essa eu não
esperava... a espada é mesmo amaldiçoada. Até eu nunca ouvi falar disso antes.”
“Hm, já não era pra ter feito isso há tempos? Só falta saber onde ele se meteu dessa vez.”
“—Hm? Ahhh! Me lembrou de algo, Gagaran. Ouvi dizer que uma terceira equipe de
aventureiros adamantite foi formada em E-Rantel.”
“Quê? É sério? Não sabia disso... descobriu isso quando foi para a Guilda dos Aventurei-
ros hoje de manhã?”
“Bem... er, sim. Sinto muito. Eu esqueci de te contar. A equipe deles parece ser relacio-
nada ao preto.”
“Bem, o preto é uma das cores da fé dos Seis Grandes Deuses. Nada de estranho nisso.
Quem sabe, a próxima pode ser branca?”
“Eu não sou fã da Teocracia Slane. Teve aquela vez que tivemos uma briga e tanto com
uma de suas unidades especiais, esqueceu?”
Climb percebeu que ouvira um assunto muito delicado, mas nenhuma delas prestou
atenção nele enquanto continuavam conversando.
“Gagaran, você os odeia? ...Bem, eles tentaram me matar uma vez, mas eu até entendo
como eles pensam. Ou melhor, seu credo e juramento é defender toda a humanidade.
Mas da perspectiva da humanidade como espécie, isso não seria o mais correto?”
“Hah? Então quer dizer que pra você tá tudo certo massacrar demi-humanos inocentes
e Elfos pra isso?”
“Existem várias nações humanas por aqui, como o Reino, o Reino Sacro, o Império e
assim por diante. Mas e quanto às outras, Gagaran? Quanto mais longe estiver daqui,
menos nações lideradas por humanos serão vistas. A maioria serão de países compostos
por demi-humanos ou espécies que são superiores à humanidade. Você sabia que alguns
até traficam humanos como escravos? A razão pela qual não há nenhum desses países
por aqui é porque a Teocracia Slane exterminou qualquer demi-humano nas vizinhan-
ças.”
“Sério?”
“Quem sabe? Não há como dizer se é verdade ou não, mas é bem capaz. Afinal de contas,
a Guilda dos Aventureiros foi fundada após a batalha com os Deuses Demônios, quando
a força da humanidade estava mais fraca do que geralmente é. Minha suposição é que
estavam preservando seu poder e ao mesmo tempo ajudando as várias nações sem cau-
sar atrito e, assim, estabeleceram uma Guilda.”
O silêncio encheu a mesa depois que a discussão terminou. Incapaz de suportar, Climb
falou:
“Perdoe minha interrupção, Evileye-sama. A senhora disse que novos aventureiros ada-
mantite surgiram; como eles se chamam?”
“Hm? Ah, bem, pensei que tinha dito. Eu acho que um deles se chama... Momon. Ele é o
líder deles, é um guerreiro com o apelido de Herói Negro. Ainda não escolheram um
nome para a equipe deles, mas todo mundo os chama de ‘Escuridão’.”
“Ouvi dizer uma mulher o acompanha, a chamam de Nabe, é uma magic caster arcana
conhecida como a Bela Princesa.”
“Hã? Apenas os dois? Tem certeza que ouviu isso direito? Não devem passar de dois
idiotas confiantes demais quê... ou não, talvez seja justamente porque são realmente
muito bons ao ponto de só precisar de dois. Será que escondem algum tipo de arma se-
creta? Hm? O que eles fizeram de mais?”
Climb se inclinou para ouvir também. Como se tratava de uma equipe de aventureiros
que obtivera a classificação de adamantite, devem ter embarcado em todos os tipos de
aventuras que deixariam os corações das pessoas palpitando em excitação. Climb já es-
tava ardendo de antecipação mesmo antes de ouvir uma única palavra.
Era um monstro enorme com quase dez metros de comprimento, parecia um cruza-
mento entre lagarto e serpente. Costumava atacar com olhar petrificante, seus fluidos
corporais poderiam causar morte instantânea de tão venenosos e sua pele era dura e
grossa capaz de rivalizar com mythril em tenacidade. Era um ser aterrorizante, então
alguém capaz de derrotar um monstro como esse — que poderia destruir uma cidade —
tinha méritos mais que justos para ser promovido a adamantite.
“Isso é... incrível. É sério mesmo que são apenas dois? Com toda a minha experiência,
digo que apenas um guerreiro e uma magic caster arcana não dariam conta de um Basi-
lisco Gigante... Quero dizer, nem eu conseguiria algo assim.”
—De fato. Era quase impossível que apenas duas pessoas o fizessem, especialmente se
fossem um guerreiro e uma magic caster arcana. Como eles se curariam? Como eles po-
deriam resistir ao seu olhar petrificante, seus fluidos corporais tóxicos e outros ataques
especiais?
“Ah! Sinto muito, mas é tudo que sei é que foram dois. Ouvi dizer que eles subjugaram
o Sábio Rei da Floresta na base da força e fizeram dele seu servo.”
“Não sei os detalhes, mas aparentemente era uma fera mágica que habitava a Grande
Floresta de Tob desde tempos remotos. Possui poder incomparável. Conheci alguém que
foi lá há muito tempo... Hmm, cerca de uns duzentos anos atrás, mas não viu nada assim,
enfim....”
Tal número não seria nada fora do comum para os Elfos da Floresta, mas dada a atitude
dela, Climb só podia concluir que era uma brincadeira de algum tipo.
Geralmente era assim. Quem conta um conto aumenta um ponto, às vezes exageravam
sem querer no relato, ou os cadáveres eram tão desmembrados que não se podia obter
uma contagem exata do corpo e às vezes os aventureiros só queriam se gabar pela fama.
Assim, essas histórias muitas vezes acabaram embelezadas.
“Parecem bem verdadeiras. O incidente de E-Rantel em particular, onde esse tal guer-
reiro arremessou sua enorme espada e matou um undead gigantesco, então abriu seu
caminho através de uma horda de milhares de undeads comuns. Esses relatórios vieram
dos guardas sobreviventes, todos os fios das histórias se conectam. Assim, duvido muito
que exista algum exagero de suas façanhas. Eles eliminaram os mentores por trás da
horda de monstros e os cadáveres foram verificados e, antes disso, eles destruíram um
par de Skeletal Dragons.”
“Mesmo você teria problemas com eles também, não é mesmo, Gagaran-san?”
“Se fossem apenas vários milhares de Zombies ou Skeletons, tudo bem. Eu abriria ca-
[ D r a g õ e s Es q u e l ét i c o s ]
minho com tudo. Dois Skeletal Dragons seriam problema, mas ainda daria pra vencer.
Agora, não posso dizer o mesmo dos mentores disso tudo. Eu não tenho confiança de
poder lidar com este tipo de gente sem saber do que são capazes.”
“Tá falando sério, Evileye? Caramba... se fossem discípulos deles, seria o dia que acordei
com o pé esquerdo. Seria muito difícil vencer depois de ter lutado com tantos monstros.
Qualquer erro significa morte nesse caso, ainda mais se estiver envenenado ou parali-
sado. Como os dois se curaram? Poções, talvez? Quem sabe, um guerreiro como esse Mo-
mon talvez possa usar a magia divina como a nossa líder. Ou talvez essa Bela Princesa,
sei lá.”
“É possível...”
“Mas um Basilisco Gigante... seria impossível. Inimigos assim são o terror de qualquer
guerreiro... pra qualquer combatente de perto, na verdade. Eu tenho o poder da Gaze
Bane do meu lado, mas seria muito arriscado sem apoio.”
“Ah, seria fácil se ela fosse tão forte quanto você, Evileye. Você pode cuidar de si mesmo
em combates de longa distância, mesmo sem levar a sério. É, ou não é?”
“Até parece que sou tão boa assim. Só se eu libertasse meu verdadeiro poder.”
“Bem, com você por perto, a única coisa que eu teria que lidar seria os Skeletal Dragons...
não, não posso jogar tudo nas suas costas. Se eu fosse com uma magic caster de ranque
orichalcum e separassem a gente... mesmo assim não teria saída.”
Climb estranhou e não pôde deixar de se perguntar: A Evileye-sama é uma magic caster
tão poderosa assim?
“Eu duvido que seja o caso. Eu conheço sua força muito bem, Gagaran-san. Tenho cer-
teza de que você não perderia para essas pessoas.”
“É por isso que você é um virgenzinho. A vida não é assim não, sabia? É como um fa-
minto negar comer algo bem quentinho por frescura. Não vai ganhar nada assim, enten-
deu? E quando chegar nos finalmente com a mulher que ama? Por acaso quer que a única
coisa que ela fale no seu ouvido é que ela tá com sono? É isso mesmo que quer? Você é
masoquista ou algo assim?”
Gagaran não esperou que Climb respondesse. Depois disso, ela suspirou em volume
exagerado.
“Tudo bem, até te entendo... não vou forçar a barra. Mas fique sabendo quê... sempre
que quiser uma rapidinha comigo, é só me avisar, viu...? Mudando de assunto, esse ape-
lido de Bela Princesa é muito vergonha alheia. Ela realmente gosta deste tipo de coisa?”
Aqui Climb pensou ter percebido que Evileye olhava para ele; um palpite que provou
ser verdade momentos depois.
“A beleza está nos olhos de quem vê. Para mim, não há mulher mais bela que a Renner-
sama.”
“Ah, entendi.”
“Hm, acho que perdemos muito tempo com conversa fiada. Desculpe por fazer você ou-
vir essa conversa chata. Faremos o que a Lakyus diz, vamos nos preparar.”
“Desculpe aí, Climb. Queria fazer muitas coisas com você hoje, mas agora não tenho
tempo.”
“Por favor, não se preocupe com isso, Gagaran-san. E obrigado por suas palavras de
sabedoria, Evileye-sama.”
“Mm, tudo bem. Trate de voltar agora mesmo, vamos deixar a nossa líder aos seus cui-
dados. Te vejo por aí, virgenzinho... oh, quase me esqueci. Precisa prestar mais atenção
no seu equipamento. Essa coisa no seu cinto não é a sua arma habitual, né?”
“As coisas acontecem do nada. Até entendo não usar armadura, mas é melhor sempre
andar com uma espada boa. É um princípio básico de autodefesa para aventureiros, es-
pecialmente guerreiros. Ainda tem os itens que eu te dei?”
“Isso mesmo, assim que eu gosto. Não se esqueça, somos guerreiros; nossa essência é
manejar espadas. Mas às vezes, ocorrem situações que não dá pra usar espadas. E nessa
hora que os itens mágicos vêm a calhar. Você precisa obter uma grande variedade deles,
entendeu? Além disso, sempre tenha no mínimo três poções de cura. Já me salvei de vá-
rias situações cabeludas assim.”
Climb possuía três desses frascos, mas só tinha dois com ele agora. Ele indicou que en-
tendeu.
“Que isso, dá um tempo, Evileye... desculpe por te travar aqui ainda mais. Eu só queria
dizer que, não seja descuidado nos preparativos e fique atento.”
Parte 3
Os chefes das oito divisões da Oito Dedos estavam lá, mas não se olhavam. Nem estuda-
ram os documentos em suas mãos ou falaram com os lacaios que esperavam ordens
atrás deles.
Não parecia que eram da mesma organização. O humor ainda não estava explosivo, mas
a cautela deles contra inimigos em potencial era bastante óbvia. Todavia, isso era o es-
tado normal das coisas. Embora compartilhassem relações simbólicas, muitas vezes se
atritavam quando surgia conflito de interesses, nunca realmente cooperando plena-
mente com seus colegas.
A Divisão de Drogas era o principal exemplo, lidando com todos os aspectos da produ-
ção, processamento e tráfico por conta própria. A Divisão de Contrabando, assim como
as demais, não levantaria um dedo para ajudá-los. Mesmo não se opondo abertamente,
era comum que tentassem atrapalhar os outros nos bastidores.
Essas nesgas — que não faziam bem à organização — se originaram do fato de que no
passado haviam sido de facções criminosas rivais.
E o único motivo para esses vice-reis do tráfico se reuniram em dias específicos para as
reuniões de chefes foi porque não o fazer seria desvantajoso.
Em outras palavras, não participar dessas reuniões poderia ser interpretado como um
sinal de traição, e as partes ausentes seriam marcadas para a eliminação. Portanto,
mesmo aquelas pessoas que não costumavam vir à Capital Real fariam isso apenas para
essas reuniões.
Mesmo aquelas pessoas que normalmente passavam seus dias se escondendo viriam
dar às caras aqui. Mesmo aqueles que tinham tanto medo de assassinato que se cerca-
vam de guardas o fariam. Havia um número limitado de pessoas permitidas em cada
Enquanto a voz masculina falava, as pessoas reunidas voltaram para seus lugares e suas
cadeiras rangeram.
O palestrante foi o anfitrião deste evento, o coordenador da Oito Dedos. Este homem —
que parecia estar em seus 50 anos — usava um símbolo sagrado do Deus da Água em
um colar e tinha um rosto compassivo. Ele não parecia nada como um habitante do sub-
mundo.
“Oi.”
A pele era tão pálida que quase parecia doentia e suas roupas também eram brancas.
Ela segurava um kiseru emitindo fumaça roxa em uma das mãos. Uma tatuagem de ví-
bora serpenteava a mão em direção ao ombro. Seu batom era o mesmo roxo que a fu-
maça. Em sua roupa diáfana, ela era a própria imagem de uma prostituta de alta classe,
a atmosfera que a rodeava completava sua imagem.
“Huwah~”
“...Ouvi dizer que suas plantações de drogas foram atacadas por alguém, é verídico?”
“Sim, foi um vilarejo que estávamos usando para produção. Me custou uma boa quantia.
Podemos precisar limitar o fornecimento de drogas.”
“Não. Mas devido ao modo como foi feito, não é difícil adivinhar o responsável.”
“Qual cor?”
“Faz sentido. Atenção a todos, quem souber de algo, por favor, levante a mão.”
Não houve resposta. Ninguém sabia, ou ninguém queria compartilhar o que sabiam.
“Então, a seguir—”
“—Ei.”
Uma voz baixa foi ouvida. Era uma voz masculina e escondia um poder incrível em suas
profundezas.
Todos os olhos se voltaram para a fonte dessa voz. O orador era um homem careca cujo
rosto estava parcialmente coberto por uma tatuagem de animal. No entanto, cada parte
de seu corpo era imensa. Sua estrutura muscular era evidente até mesmo através de suas
roupas, e seus olhos frios esculpiam a imagem de um guerreiro.
Todos os outros chefes de divisão tinham trazido guardas, mas só ele não tinha ninguém.
Isso foi apenas sensato. Que sentido tinha em trazer um grupo de pessoas inúteis?
O homem olhou para Hilma, chefe da Divisão de Drogas. Não, ele provavelmente não
estava olhando; só que suas pupilas finas pareciam estar fazendo isso.
O guarda atrás dela perdeu a calma por um momento e sua respiração se tornou caótica.
Foi uma reação nascida de saber exatamente o quão forte tal homem era.
Afinal, esse homem era um monstro. Ele não teria problema algum em abater todos
nesta sala.
“Por que não me contratar? Acha mesmo que essas maricas na sua folha de pagamento
podem te proteger de alguma coisa?”
Seu nome era Zero. Ele era o gerente da Divisão de Segurança, que lidava com tudo,
desde simples guarda-costas até escoltar nobres. Ele era famoso por sua proeza de ba-
talha, que excedia em muito a de qualquer outro membro da Oito Dedos. E a resposta à
sua proposta foi—
“Não há necessidade. Além do mais, não posso revelar a localização das minhas bases
para os outros.”
O orador era um homem esguio. Ele parecia flácido e fraco, em contraste com Zero.
“Mas é claro, Zero. E, se possível, gostaria de contratar alguém no nível do Seis Braços,
o melhor dos melhores.”
“Oh...”
Ele não foi o único que ficou surpreso. Quase todos os presentes estavam com o mesmo
pensamento.
O nome do Seis Braços veio do irmão do Deus dos Ladrões, que tinha seis braços. Esse
nome se referia aos lutadores mais fortes da Divisão de Segurança.
Claro, o seu melhor homem era Zero, mas os outros cinco tinham destreza que rivali-
zava com a dele. Havia rumores de que um deles poderia cortar o tecido do espaço, outro
[ L i c h Ancião]
poderia controlar ilusões e que um deles era até mesmo um poderoso Elder Lich.
“Se meteu em grandes problemas, acertei? Pode relaxar. Meus subordinados mais for-
tes protegerão seus ativos.”
“Perdoe o inconveniente. Houve problemas com uma mulher que deveria ser eliminada.
Talvez isso possa ser uma reação exagerada, mas se aquele lugar cair, minha vida será
um inferno. Ah, sim, discutiremos as taxas mais tarde.”
“Claro.”
Ele colocou dez moedas de prata ou ouro em cada pilha e depois as contou.
Depois de totalizar as pilhas de moedas várias vezes, Ainz olhou dentro da algibeira.
Estava vazio, como esperado. Depois de verificar esse fato, Ainz a deixou de lado e, em
seguida, agarrou a sua própria cabeça.
Seu rosto humano ilusório ficou depressivo. Claro, o dinheiro diante dele era uma quan-
tia considerável. Um cidadão comum poderia trabalhar por décadas e não acumular esse
valor. No entanto, para o mestre da Grande Tumba de Nazarick e sua única fonte de
renda, era pouco mais do que um trocado, este fato o deixou terrivelmente desconfortá-
vel.
O estado mental de Ainz seria forçado a estabilizar uma vez que atingisse um certo li-
mite. Portanto, ele deveria ter sido automaticamente acalmado quando o choque de não
ter dinheiro suficiente fez um assalto relâmpago à tranquilidade de sua psique. No en-
tanto, a soma das moedas antigas que ele possuía deu-lhe uma margem de manobra
emocional e, portanto, o corte emocional não foi acionado. Em vez disso, ele queimava
no fogo brando da ansiedade.
Ainz balançou a cabeça e dividiu as moedas de ouro diante dele em várias pilhas.
“Então há essa pilha... fundos para a reconstrução e auxílio financeiro para a Aldeia Li-
zardman, de acordo com os desejos do Cocytus, e então...”
Foi menos do que antes, mas a pilha de dinheiro foi movida, deixando apenas algumas
peças de ouro para trás.
Interlúdio
100
Depois de contar e recontar as moedas restantes, Ainz murmurou baixinho para si
mesmo:
Isso porque Ainz queria evitar dar aos mercadores e aventureiros a impressão de que
sua persona, Momon, era um homem ganancioso, ou talvez de alguém que faria qualquer
coisa por dinheiro.
Ainz pretendia construir uma imagem pública de um aventureiro amado por todos e
depois transferir essa glória si, Ainz Ooal Gown. Assim, ele tinha que estar atento ao que
outras pessoas pensavam dele.
“Ainda assim... eu estou sem dinheiro. Por que fui inventar de ficar em uma pousada tão
cara...”
Esta era a melhor pousada de toda E-Rantel, e este era seu melhor quarto. Naturalmente,
os preços para a acomodação eram igualmente surpreendentes. Porém, esse quarto não
significava nada para Ainz, que não precisava dormir. Dado a este fato, ele queria gastar
o dinheiro em outro lugar.
O mesmo valia para as suas refeições. Por mais esplêndidos que fossem os pratos que a
pousada preparara para Ainz, que não podia comê-los, tais pratos acabavam por serem
insignificantes. Seria mais sensato cancelar as refeições e economizar o dinheiro.
Ainz... ou melhor dizendo, Momon era o único aventureiro classificado como adaman-
tite nesta cidade. Um grande nome como ele não poderia morar em um albergue sem
conforto onde era preciso fazer tudo sozinho.
“Se eles acham que sou realmente tão valioso, então a Guilda deveria reservar um
quarto para mim... hahh... Se bem que é até provável que fariam isso se eu pedisse...”
Dito isso, ele não queria dever favores às pessoas. Até o momento, sempre que a Guilda
fazia pedidos urgentes, ele entrava imediatamente em ação para fazê-los sentirem-se em
dívida com ele. Uma vez que tivesse acumulado influência suficiente, ele então começa-
ria a usar de sua vantagem. Se ele permitisse que as pessoas pagassem suas dívidas com
coisas tão pequenas, seu plano estaria arruinado.
“Ah... não há dinheiro. Preciso fazer alguma coisa... talvez, mais pedidos? Mas não houve
tarefas bem remuneradas recentemente. E se eu pegar muitos de uma vez, os outros
aventureiros me odiarão...”
Ele queria que Ainz Ooal Gown se tornasse uma lenda eterna, mas obviamente ele não
queria que esse nome se tornasse infame. Ainz fez um semblante de suspiro, então me-
morizou a quantia de dinheiro que seria retirado da pilha.
Os Guardiões insistiram em não receber um salário, dizendo que sua maior alegria na
vida era servir os Seres Supremos, e que era para Ainz não ousar pensar que receberiam
pagamento por isso.
No entanto, Ainz sentiu que não deveria confiar demais nessa boa vontade. É preciso
recompensar o bom trabalho de maneira apropriada.
Embora os Guardiões tivessem indicado que a lealdade aos Seres Supremos era a me-
lhor recompensa, Ainz não aceitou essa declaração com facilidade.
Por tudo que sabia, instituir um sistema salarial poderia levar à decadência e corrupção
para essas crianças puras e ingênuas. Mesmo assim, ele achava que isso merecia um ex-
perimento.
Os olhos de Ainz foram do teto para a diminuta pilha de moedas de ouro na mesa.
Interlúdio
102
“Se considerarmos que o salário dos Guardiões é equivalente ao de um chefe de depar-
tamento em uma empresa de alto nível, então eles arrecadariam quinze milhões de ienes
por ano... Shalltear, Cocytus, Aura, Mare, Demiurge e Albedo deveriam estar recebendo
mais, certo? O que significa que vou ter que multiplicar isso por seis. Ah, não vai dar. É
impossível ganhar isso tudo.”
“Já sei! Só é preciso pagá-los com outra coisa! Talvez eu possa emitir cédulas apenas
para Nazarick — como dinheiro de mentirinha — e depois fixar seu valor em cem mil
cada. Isso pode funcionar!”
Todas as instalações da Grande Tumba de Nazarick eram gratuitas. Mesmo que impri-
misse essas notas, ele não sabia onde seriam utilizadas.
Depois de comparar os bens deste mundo com os de Nazarick, ele não pôde deixar de
imaginar quem iria querer comprar coisas do mundo exterior.
“Essas instalações foram gratuitas até agora, mas se eu começar a cobrar por elas, eu
colocaria a carroça na frente dos cavalos... o que devo fazer?”
Depois de refletir por mais um tempo, Ainz teve outra idéia brilhante.
“Já sei! Vou pedir aos Guardiões para pensar em algo. Tudo o que preciso fazer é per-
guntar onde gastariam o dinheiro. Isso deve bastar!”
Assim que Ainz estava murmurando: “Que ótima idéia!” para si mesmo, seu rosto com
uma expressão amarga novamente.
“Ainda assim...”
Pensou Ainz.
Quando estava no jogo, ele sabia que estava falando muito consigo porque não havia
mais ninguém por perto. No entanto, agora que os NPCs haviam ganhado sapiência, von-
tade e orientação própria, Ainz ainda continuava falando sozinho. Qual o motivo para
isso?
Claro, ele estava cercado por NPCs sapientes, então era quase ilógico dizer que estava
realmente sozinho. No entanto, ele ainda se sentia assim. Talvez estivesse ocupado apa-
gando a personalidade de Suzuki Satoru, a fim de melhor desempenhar o papel de Ainz
Ooal Gown, o grande líder dos 41 Seres Supremos que os Guardiões o acusavam de ser.
Ainz suspirou e, quando ele olhou de volta para as moedas em sua mesa, ele ouviu uma
batida na porta.
Depois de pouco tempo, a porta se abriu. Após verificar que era a pessoa que esperava
— Narberal Gamma — Ainz franziu o cenho.
Agora, o canto da boca de Ainz estava enrolado, como se ele estivesse desaprovando-a.
A ilusão de baixo nível que Ainz estava usando refletia seus pensamentos, de modo que
ocasionalmente podia exibir uma expressão que não se encaixava no Governante da
Grande Tumba de Nazarick. Portanto, sempre que havia alguém por perto, e particular-
mente na frente de Narberal, ele tipicamente colocava uma expressão que o fazia parecer
um governante severo e digno. Ele havia praticado isso diante do espelho muitas vezes,
aperfeiçoando essa expressão com perfeição.
Sua voz era a mesma voz forçada que ele sempre fazia.
“Hah, esse seu hábito nunca morre. Sempre que eu chamo sua atenção, você para de
fazer por um tempo, já estou quase desistindo disso, huh. Ahhh, não precisa se curvar.
Eu não estou com raiva, sei que está mostrando seu respeito por mim... bem, que seja. O
Chefe da Guilda e os outros parecem ter ficado com a impressão errada disso, mas tudo
bem. Então, o que a traz aqui?”
“Sim, senhor. Diz respeito ao minério que o senhor ordenou aos mercadores para en-
contrar, Momon-san.”
Ainz resmungou dentro de seu coração. Dito isso, a expressão severa em seu rosto per-
maneceu impassível.
Interlúdio
104
“Perfeito... de qual local estamos falando? Eles coletaram amostras de todos os oito lu-
gares?”
“...Tudo bem, não se preocupe. Nós temos dinheiro. Mesmo que não saibamos de onde
vieram, poderemos comprar todos.”
Ainz moveu as moedas na mesa para uma algibeira em um grande movimento e a jogou
para Narberal. Ela decorosamente pegou a algibeira de dinheiro.
A Exchange Box não deveria ser afetada por tais coisas. Por exemplo, até mesmo uma
estátua primorosamente esculpida contaria apenas o mesmo que um pedaço bruto do
mesmo material quando colocado na Exchange Box. Sendo esse o caso, e se a composição
— a qualidade intrínseca do material variasse? Foi por isso que ele comprou todos esses
minérios.
Eu tive que jogar uma pilha de grãos até sair uma única moedinha....
Se fosse esse o caso, tudo o que ele tinha que fazer era começar a produção em massa.
Assim, ele considerou a abertura de terras para fazendas de grãos fora de Nazarick, ma-
nejada por undeads ou Golems, tal mão de obra daria conta de grandes fazendas. Natu-
ralmente, a execução desse plano apresentava uma montanha de problemas por si só.
“Mm. Lembre-se, tenha cuidado. Não podemos garantir que não haverá charlatões. Se
alguma coisa acontecer... Sabe o que fazer, certo?”
[Demônio Sombra]
“Vou usar o Shadow Demon como um escudo de carne. Não pensarei em obter informa-
ções e priorizarei a segurança ao recuar o mais rápido possível. Eu então me teletrans-
portarei para a falsa Nazarick de Aura-sama para enganar o inimigo.”
Uma vez que ele viu Narberal indicar que entendia, Ainz sentiu que não havia mais nada
para lembrá-la e assentiu.
Ainda segurando a algibeira, Narberal fez uma reverência antes de sair do quarto. Ao
assisti-la sair, Ainz suspirou profundamente, apesar de sua falta de pulmões.
“...E pensar que eu tenho que gastar ainda mais mesmo sem verba... Que droga.”
Interlúdio
106
Capítulo 03: Aqueles Que Pegam, Aqueles Que São Pegos
epois de escoltar a velha senhora para casa, Sebas continuou seu destino
D
original.
Três torres — cada uma com cinco andares de altura — erguiam-se de dentro daqueles
muros. A altura delas se tornava ainda mais imponente pelo fato de serem as constru-
ções mais altas das redondezas.
As torres estavam cercadas por vários edifícios longos e estreitos de dois andares.
Essa era a sede da Guilda dos Magistas do Reino. Eles precisavam de amplo espaço para
o desenvolvimento de novas magias e o treinamento de magias arcanas. A razão pela
qual eles poderiam arcar com toda essa terra apesar de praticamente não ter apoio na-
cional provavelmente se devia à fabricação e venda de itens mágicos.
Depois de caminhar um pouco mais, ele viu um portão robusto. O portão de treliça se
abriu, e de cada lado havia vários guardas armados, posicionados perto dos edifícios de
dois andares.
Os guardas não impediram Sebas — embora o observasse passar — e ele passou pelo
portão.
Havia uma escadaria levemente inclinada diante dele e um conjunto de portas que se
abriam para uma casa de aparência distinta. Naturalmente, essas portas estavam aber-
tas para receber os visitantes.
Ao entrar, ele se viu em um pequeno hall de entrada, com o saguão do prédio à sua
frente. Uma série de candelabros mágicos pendia do alto teto do hall.
À direita, um lounge de hóspedes que continha um sofá e várias outras peças de mobília.
Mais ao fundo havia vários magic casters palestrando. À esquerda havia um quadro de
avisos. Várias pessoas estudavam seriamente; algumas usavam túnicas e pareciam arca-
nistas, enquanto outras pareciam ser aventureiros.
Havia um balcão nos recantos mais profundos do hall, lá havia vários homens e mulhe-
res jovens sentados por detrás. Todos usavam túnicas e tinham emblemas no peito
iguais ao símbolo que ele havia visto ao entrar no edifício.
Em cada lado do balcão havia um par de bonecos de madeira esguios, do tipo usado
como referência para poses. Eram do tamanho de humanos reais, mas não tinham traços
“Certamente.”
Em um instante o jovem trouxe um grande tomo para o balcão. Ele deve ter ficado de
prontidão quando notou Sebas se aproximando.
As páginas do livro eram feitas de papel de alta qualidade, fina e branca como a neve, já
a capa era feita de couro. O artigo geral foi de construção requintada. As letras na capa
estavam impressas em ouro, e só o custo deste livro provavelmente estava além do des-
critível em poucas palavras.
Lamentavelmente, Sebas não entendia as palavras escritas nele. Ou melhor, seria mais
preciso dizer que criaturas de YGGDRASIL não conseguiam compreendê-las. Apesar do
princípio bizarro que traduzia a linguagem falada neste mundo, o texto escrito não era
traduzido automaticamente.
No entanto, o mestre de Sebas havia lhe dado um item mágico que poderia resolver esse
problema.
Um par de óculos estava dentro. Sua ponte era feita de um metal parecido com platina,
e em um olhar mais atento, parecia ter sido inscrito com caracteres minúsculos, ou al-
gum tipo de padrão texturizado. As próprias lentes haviam sido polidas a partir de um
cristal que lembrava gelo azul.
Ao colocar esses óculos, ele conseguia entender o texto escrito através do poder da ma-
gia.
“Muito obrigado.”
Sebas, o cavalheiro grisalho, era uma pessoa que podia hipnotizar à primeira vista. Era
naturalmente belo, mas o modo como se comportava o deixa muito mais impressionante.
Quando ele andava nas ruas, nove em cada dez mulheres — independentemente da
idade — se viravam para dar uma segunda olhada nele. Não era de se admirar que as
garotas do balcão se sentissem extasiadas por ele, afinal era uma ocorrência comum.
Sebas aceitou de bom grado, então voltou seus olhos para o tomo. Ele parou em uma
determinada página e perguntou ao jovem:
“Poderia me falar sobre essa magia... 「Floating Board」, é assim que se pronuncia?”
“Certamente.”
“「Floating Board」 é uma magia de primeiro nível que cria uma plataforma flutuante
translúcida. O tamanho e a capacidade de carga da plataforma variam com o poder do
conjurador. No entanto, quando lançado a partir de um pergaminho, é limitado a uma
superfície de um metro quadrado e pode transportar um máximo de cinquenta quilos. A
plataforma move-se atrás de quem a conjurar e pode estar a uma distância máxima de
cinco metros de quem a lançar. Como a 「Floating Board」 só pode seguir atrás do con-
jurador, ela não pode ser movida para frente. Se o conjurador se virar, a plataforma irá
se mover lentamente até que fique alinhada com as costas. É principalmente uma magia
de transporte e pode ser comumente vista durante os trabalhos de terraplanagem.”
“Entendo...”
O jovem não ficou surpreso pelo fato de Sebas ter escolhido uma magia de baixa de-
manda como essa. Mas no fim, quase todos os pergaminhos que Sebas havia comprado
eram de magias impopulares como esta. Além disso, ser capaz de esvaziar os estoques
excedentes era uma dádiva de Deus para a Guilda dos Magistas.
Após cerca de cinco minutos, o homem que saíra voltou. Nas mãos dele havia um rolo
de pergaminho.
Sebas olhou para o pergaminho no balcão. Foi feito de forma primorosa e parecia dis-
tintamente diferente do papel que se poderia comprar nos comércios. O nome da magia
foi escrito em tinta preta no lado de fora do pergaminho, e depois de verificar que era
mesmo a magia que ele queria, ele tirou os óculos.
“Agradecemos a preferência.”
“Como se trata de um pergaminho de primeiro nível, será uma moeda ouro e dez de
prata.”
Uma poção com encantamentos de nível similar custaria duas moedas de ouro, então
esse pergaminho era comparativamente mais barato. Isso porque, em circunstâncias
normais, pergaminhos de magia só podiam ser usados por magic casters com conheci-
mento da magia usada. Assim, só fazia sentido que as poções fossem mais caras, dado
que poderiam ser usadas por qualquer pessoa.
Dito isso, “comparativamente” foi a palavra-chave aqui. Um ouro e dez moedas de prata
eram muito caro para uma pessoa comum; equivalente à cerca de meio mês de salário.
No entanto, para Sebas — ou melhor, o mestre de Sebas — era uma despesa trivial.
O jovem não testou a autenticidade do dinheiro na frente de Sebas. Suas transações, até
então, haviam garantido a Sebas tal confiança.
♦♦♦
“Uhum!”
Debate surgiu entre o pessoal do balcão — especialmente as senhoritas — uma vez que
Sebas havia deixado a Guilda dos Magistas.
Tinha deixado de ser mulheres sábias, agora não passavam de garotinhas apaixonadas
que tinham acabado de conhecer seu príncipe encantado. Um dos homens sentados no
balcão franziu a testa e seu rosto ficou com expressão azeda, mas até ele sentiu o porte
culto de Sebas e então ficou quieto.
“Ele deve ter tido experiência em servir algum nobre de alto escalão. Eu não ficaria sur-
presa se fosse um nobre, o terceiro filho de algum lorde menor ou algo assim.”
Era uma coisa comum para as crianças nobres que não podiam herdar a propriedade
se tornarem mordomos ou empregadas. Famílias nobres de posição mais alta tenderiam
a contratar pessoas de tais origens. Depois de testemunhar o porte nobre de Sebas, eles
puderam aceitar o fato de que Sebas era de berço rico.
“Cada pequeno gesto que ele faz é elegante, do jeito que ele fica em pé à maneira como
se move.”
“Né!? Nossa, eu também! Juro por tudo que existe! Com certeza eu aceitaria!”
As senhoritas gritaram e se arrulharam uma após a outra. Elas conversaram sobre onde
estavam os bons cafés e, em seguida, sobre como ele seria perfeito como acompanhante.
Os homens olharam para elas e começaram a falar também.
“Ele realmente parece alguém com grande conhecimento. Vocês acham que ele é um
magic caster também?”
As magias que Sebas comprou foram todas desenvolvidas recentemente. Isso implicava
uma ampla familiaridade com a magia. Se ele tivesse sido obrigado a comprar um per-
gaminho, ele poderia simplesmente ter perguntado diretamente ao pessoal do balcão,
sem precisar navegar pelo catálogo. O fato de Sebas ter folheado o livro era um sinal de
que ele estava tomando as decisões sobre quais gostaria de comprar.
Isso não era algo que qualquer homem comum pudesse fazer. Em outras palavras, eles
poderiam supor que ele tinha recebido uma educação especializada em magia — ou que
ele próprio fosse magic caster.
“Duvido, mas realmente é muito requintada. Eu acho que até pode ter sido feita pelos
Dwarfs.”
“Só queria poder ver a bela dama que o acompanhava daquela vez...”
Um dos homens murmurou. A resposta do lado dele foi uma onda de desaprovação.
“Eh, aquela mulherzinha só tem aparência, nem chega aos pés dele.”
“Pois é, me senti tão triste pelo Sebas-san. Ela tentava ofuscar a presença dele de toda
forma.”
“Ela é até bonitinha, mas tenho certeza que tem uma personalidade horrível. Você viu a
maneira repugnante que ela olhava para nós? Tadinho do Sebas-san, ter que servir uma
pessoa assim.”
Nenhum dos homens era estúpido o bastante para fazer isso. Assim sendo—
♦♦♦
Escoltar a senhora até em casa o fizera atrasar um pouco, o céu lentamente ficava mais
vermelho. Depois de olhar para o relógio que havia tirado do bolso do bolso do peito, ele
sabe que era hora de voltar para casa. No entanto, os negócios do dia ainda não haviam
terminado. Mas já que esses assuntos poderiam ser adiados até amanhã, então não de-
veria adiá-lo? Ou deveria manter o plano e terminar sua agenda de hoje, mesmo que isso
o leve a fazer horas extras?
A questão da velha senhora foi sua própria decisão. Assim, ele deveria cumprir suas
tarefas.
“—Shadow Demon.”
“Ótimo.”
Ele não tinha destino em mente. Sebas desejava se familiarizar totalmente com o layout
da Capital Real. Seu mestre não ordenou que ele fizesse isso — ele simplesmente esco-
lhera se mover de forma independente como parte de seus deveres de coleta de infor-
mações.
Depois de resmungar para si mesmo e ajeitar a barba, Sebas girou o pergaminho que
segurava na mão. Ele parecia uma criança se entretendo ao fazê-lo.
Ele se dirigiu para a frente, afastando-se do distrito central da Capital Real, onde ainda
estava seguro.
De repente, ele parou e examinou seus arredores. Parece que tinha entrado em um beco
muito recôndito, tão apertado que as pessoas teriam que se espremer umas nas outras
para avançar.
Era difícil atravessar esses becos estreitos, onde a luz do sol poente era bloqueada pelas
construções altas ao redor, já o chão era atroz. Mas isso não representava obstáculo para
Sebas. Ele caminhou em silêncio ocultando sua presença, como se tivesse se fundido nas
sombras.
Sebas virou mais algumas esquinas enquanto se dirigia para uma região ainda mais es-
cassamente povoada, e então seu passo confiante sem hesitação de repente parou.
Suas viagens sem objetivo o trouxeram até aqui e ele percebeu que havia percorrido
um longo caminho desde sua morada. Os instintos de Sebas, em grande parte, já o ha-
viam deixado ciente de sua localização, e ele traçou mentalmente a rota de sua casa até
esse lugar.
Dado os atributos físicos de Sebas, ele poderia ter coberto a distância em uma linha reta.
Se mover normalmente em meios a tantas vielas consumia muito mais tempo do que o
comum. Agora que a noite estava se aproximando, provavelmente era hora de voltar.
Ele não estava preocupado com a segurança de Solution, com quem compartilhava a
mesma casa.
Mesmo que um poderoso inimigo aparecesse, Solution ainda tinha um monstro em sua
sombra, muito parecido com o de Sebas. Ela deveria ser capaz de ganhar tempo para
recuar usando-o como um escudo. Dito isto—
Com toda a honestidade, ele queria continuar andando, mas perder tempo em uma ati-
vidade que fosse algo como lazer não seria permitido. Ainda assim, mesmo que voltasse
para casa, ele podia pelo menos ver o que estava à sua frente. Ele continuou andando
pelas vielas estreitas.
Enquanto Sebas avançava silenciosamente na escuridão, ele viu uma pesada porta de
aço logo à frente — a cerca de 15 metros de distância — que de repente veio a se abrir,
uma luz vinha de dentro. Sebas parou e observou silenciosamente.
Houve um baque quando um grande saco atingiu o chão do lado de fora. Iluminado pela
luz de dentro, Sebas pôde ver que havia um objeto macio no interior, que havia mudado
de forma com a queda.
A porta ainda estava aberta, mas a pessoa que jogava o saco como se fosse lixo parecia
ter entrado de novo, não houve movimentos por um tempo.
Sebas franziu a testa, debatendo se deveria seguir em frente ou seguir em outra direção.
Intrometer-se em coisas que não eram da sua conta provavelmente levaria a problemas.
Depois de hesitar brevemente, ele continuou seu avanço silencioso ao longo do beco
escuro e estreito.
“—Melhor continuar.”
Sebas sentiu que algo havia agarrado sua calça. Olhando para baixo, Sebas viu o que
esperava.
Um braço esguio, como um galho seco, se estendeu de dentro do saco, agarrando a bai-
nha de sua calça. O corpo seminu de uma mulher surgiu de dentro.
Foi quando o saco abriu completamente, expondo a parte superior do corpo da mulher.
Seus olhos azuis estavam opacos, nebulosos e sem vida. Seu cabelo na altura dos om-
bros estava bagunçado, com pontas duplas e quebradiços. Seu rosto estava inchado
como se fosse um saco de pancadas, havia numerosas manchas vermelhas pálidas por
toda a pele ressecada e ferida.
Parecia um animal desnutrido se apegando à sua vida moribunda, não havia pratica-
mente nenhuma vitalidade nela.
Certamente isso deveria ser um cadáver. Não— ela ainda respirava. A mão segurando
a bainha da calça de Sebas era o melhor sinal disso. No entanto, se tudo o que ela podia
fazer era respirar, isso realmente se qualificava como um ser vivo?
Tudo o que Sebas teria que fazer era mover a perna e ele seria capaz de se livrar daque-
les dedos, tão finos que mesmo compará-los a galhos secos não seria acurado. No entanto,
ele não o fez. Em vez disso, continuou perguntando:
Um homem apareceu atrás da porta. Seus braços e peito eram arqueados pelos múscu-
los. Seu rosto com cicatrizes mostrava claramente sua hostilidade, e ele olhou com ódio
para Sebas. A lanterna que estava segurando emitia uma luz vermelha.
O homem estalou a língua em exagerada deliberação e depois ergueu o queixo para Se-
bas.
Vendo que Sebas permaneceu imóvel, o homem deu um passo à frente. A porta se fe-
chou atrás dele com um baque pesado. O homem lentamente colocou a lanterna a seus
pés com uma arrogância intimidadora.
Ele rodeou os ombros e estalou o pescoço. Então lentamente levantou a mão direita e
apertou-a em um punho. Ele claramente não tinha medo de usar violência.
“Hm...”
Sebas sorriu. Vindo de um cavalheiro idoso como Sebas, aquele sorriso digno mostrava
claramente uma calma e compaixão incomparáveis. No entanto, por alguma razão, o ho-
mem recuou como se um carnívoro feroz tivesse aparecido diante dele.
Abalado pelo sorriso de Sebas, o homem não conseguiu terminar as palavras que estava
tentando formar. Ele cambaleou para trás, sem perceber o quanto estava ofegante.
Esse pareceu ser o sinal para Sebas agarrar o homem pelo colarinho — ele facilmente
levantou seu corpo do chão.
Qualquer um vendo isso certamente se perguntaria se era algum tipo de ato circense.
Apenas considerando as aparências, não havia chance de que Sebas pudesse estar em
igualdade com este homem em uma briga. Seja em termos de idade, musculatura, altura,
massa e a aura de violência ao seu redor, o homem mais jovem tinha a vantagem.
E, no entanto, este distinto senhor estava levantando um peso pesado com uma mão.
—Não, não apenas isso. Talvez uma testemunha ocular fosse capaz de sentir a diferença
entre os dois. Os humanos tinham instintos limitados, mas eles ainda podiam sentir uma
diferença suficientemente díspar entre as duas partes.
O outro homem — que havia sido suspenso do chão — agitava as pernas e torcia o corpo.
Então, quando ele pensou em pegar a mão de Sebas em suas próprias mãos, seus olhos
se encheram de medo quando percebeu algo.
Ele finalmente percebeu que o homem diante dele não era nada parecido com o que sua
aparência sugeria. Ele também percebeu que a resistência inútil só serviria para irritar
o monstro diante dele.
Quando o homem começou a enrijecer de medo, aquela voz fria penetrou em seus ou-
vidos.
Aquela voz foi tão nítida e suave quanto o fluir de um riacho. O contraste absoluto com
a mão que o levantava facilmente só aumentava o medo do homem.
O homem se perguntou se havia dito a coisa errada. Porém, foi a resposta mais correta
que ele poderia ter dado nas circunstâncias atuais. Os olhos do homem estavam arrega-
lados de medo, tremendo como os de um animalzinho assustado.
“Que seja. É só que alguns dos meus colegas veem os humanos como objetos, então eu
acreditava que você também via as pessoas como objetos. Se mantivesse esse ponto de
vista, creio que não haveria problema. Contudo, você respondeu que ela trabalha aqui.
Em outras palavras, a considera um ser humano. Estou correto? Então, permita-me ou-
tra pergunta. O que pretende fazer com ela?”
“—Uggghhh!”
Sebas apertou ainda mais o colarinho, tornando mais difícil para ele respirar, e o ho-
mem soltou um grunhido estranho. Sebas estava dando uma mensagem clara: “Eu não
vou dar-lhe tempo para pensar — responda agora.”
“Hiiiiegr!”
O aperto de Sebas ficou ainda mais forte, e o rosto do homem ficou vermelho quando
um grito estrangulado vazou de sua garganta. Por mais generoso que ele pudesse ter
sido, descontando o fato de ter colocado alguém em um saco para transporte, as ações
do homem ao despejar um ser humano em um saco já deixara entendido que não tinha
a intenção de levar a pessoa doente ao templo. Foi apenas como se livrar de lixo.
O homem estava com dificuldade para respirar. Ele se debatia selvagemente quando
percebeu o perigo mortal em que estava.
Sebas casualmente bloqueou o punho em direção ao seu rosto com uma mão. As pernas
agitadas bateram no corpo de Sebas e sujaram suas roupas, mas Sebas estava tão estóico
quanto as montanhas.
—Mas é claro.
“Gahhhh—”
O homem não conseguiu respirar e Sebas estreitou os olhos para o rosto vermelho do
homem. Então o soltou pouco antes de desmaiar.
“G-guwaaargh!”
Sebas pensou que o homem superou facilmente o medo de perder a vida. No entanto,
mesmo o homem tendo aparentado medo, ele não parecia disposto a falar tudo que sabia.
Em outras palavras, o perigo de deixar vazar essa informação estava no mesmo nível da
intimidação de Sebas.
Sebas pensou se deveria mudar seu plano de abordagem. Este era o território inimigo.
O fato de o homem não ter gritado para quem estava atrás da porta pedindo ajuda indi-
cou que ele não esperava que alguém o resgatasse imediatamente. Dito isto, ficar aqui
por muito tempo só levaria a mais problemas.
Seu mestre não ordenou que ele causasse problemas. Suas ordens eram se misturar à
sociedade e secretamente reunir inteligência.
“Se pretendia levá-la ao templo, permita-me fazê-lo. Garantirei que vá e volte com se-
gurança.”
“Tô ocupado agora, não dá. Pode deixar que eu levo mais tarde.”
“Ela é nossa por lei! Se ficar metendo o nariz, vai violar as leis do país! E se ousar levar
ela embora, será sequestro!”
Seu mestre dissera que ele poderia agir quando a situação exigisse, mas apenas quando
estava fazendo o papel de um mordomo cuidando de sua mestra.
Quebrar a lei levaria a uma investigação, e possivelmente até levaria o seu disfarce a
ser descoberto. Em outras palavras, isso poderia levar a grandes e óbvias repercussões,
sobre as quais seu mestre não ficaria feliz.
Sebas não achava que esse homem bruto fosse muito instruído, mas sua voz estava
cheia de confiança. Em outras palavras, alguém deve ter-lhe ensinado um pouco sobre a
lei. Sendo esse o caso, pode haver alguma base factual para sua declaração.
Como não havia testemunhas, a resposta para isso foi simples; violência. Ele simples-
mente se tornaria outro cadáver, um com o pescoço quebrado.
Contudo, esse era um último recurso; algo que ele só poderia fazer em serviço direto
aos objetivos de seu mestre. Ele não podia atacar por uma garota que ele havia encon-
trado por acaso.
“Oh, mordomo-sama, seu mestre num vai gostar nada disso, quer causar problemas?”
“Eu não sei qual nobre serve, mas causar problemas pro seu mestre pode dar ruim, não
é? Vai saber, seu mestre pode ter laços com o nosso estabelecimento. Não tem medo dele
te repreender?”
“...Você realmente acha que meu mestre não conseguiria resolver uma questão dessa
magnitude? As regras existem para serem quebradas pelos fortes, não?”
Isso pareceu ter jogado um balde de água fria no homem, e o medo atravessou seu rosto
por um momento. No entanto, ele recuperou sua confiança quase que imediatamente.
“...Hmph.”
O blefe de Sebas não funcionou no homem. Ele deve ter algum tipo de apoiador influ-
ente. Julgando que essa abordagem não foi eficaz, Sebas decidiu mudar de rumo.
“...Entendo. De fato, seria bastante problemático no sentido legal. Mas, há também uma
lei que afirma que, se alguém pedir ajuda, é permitido prestar ajuda sem medo de con-
sequências legais. Eu estava apenas agindo de acordo com essa lei. Para começar, ela
está inconsciente, então deve ser levada ao templo para tratamento. Estou errado?”
Sebas soltou um suspiro de alívio diante das más habilidades de atuação do homem e
de suas reações lentas. Sebas acabara de contar uma mentira. Já que que sua oposição
tentou usar a lei contra ele, Sebas por sua vez disse um monte de bobagens de cunho
legal.
Se o homem continuasse a argumentar usando a lei — mesmo que ele estivesse apenas
mentindo —, Sebas e sua compreensão limitada das leis do Reino não teriam uma res-
posta lógica para tudo. No entanto, o homem não entendia a lei e estava apenas repe-
tindo o que tinha ouvido, então ele não podia ver através das mentiras de Sebas.
Além disso, sua falta de conhecimento legal significava que ele não tinha resposta
quando alguém usava a lei para argumentar contra ele. Além disso, esse homem prova-
velmente era o lacaio de alguém, então não tinha autoridade para tomar decisões por
conta própria.
Sebas perguntou, antes de trazer sua orelha perto dos lábios ressecados da mulher.
Tudo o que ele pôde ouvir foi o som de respiração fraca. Não, era mais como o último
suspiro de um balão vazio. Um som assim contava como respirar?
Salvar essa garota era completamente diferente de ajudar aquela velha senhora. Sebas
queria ajudar o máximo de pessoas que o rodeavam, mas salvar essa garota poderia re-
sultar em sérios problemas. O Supremo entenderia o porquê ele fazia essas coisas? Não
era isso uma violação da vontade de seu mestre? Uma rajada fria atormentava seu cora-
ção enquanto contemplava esse ponto.
Dado que ele sabia que tipo de inferno que ela tinha passado, era óbvio o motivo de seu
sorriso de zombaria. Caso contrário, por que ele a teria jogado fora, pronta para ser des-
cartada?
Boa sorte não se repetia, afinal, fenômenos que ocorrem regularmente não podem ser
considerados boa sorte.
De fato, se alguém considerasse seu ato de segurar a bainha da calça de Sebas como
sorte, seria como ela ter gastado todo o resto de sorte que tinha.
—No caso dela, sua única boa sorte foi o fato de Sebas ter entrado nesse beco e apenas
isso. Tudo o resto dependia de quanto ela queria sobreviver.
Até que—
Sim. Os lábios da garota se moveram levemente. Não foi o movimento natural da respi-
ração. Foi uma ação voluntária e consciente.
“—”
“Eu não acredito em ajudar aqueles que só podem orar para serem salvos. Mas no seu
caso... você ainda luta pela sua vida...”
“Não tenha medo. Descanse. Você está sob minha proteção agora.”
A garota fechou os olhos nublados, como se envolvida em uma quente mortalha de com-
paixão.
O homem não podia acreditar no que acabara de ver e, assim, deixou escapar a primeira
coisa que lhe veio à mente.
—Eu não ouvi nada, o homem queria dizer, mas ele estava paralisado no lugar.
Ele não percebeu Sebas levantar, mas agora seu olhar afiado deixava o homem parali-
sado.
O homem resmungou e depois engoliu em seco. Seus olhos se moveram, fixando nos
braços de Sebas. Ele deve ter se lembrado das consequências de extrapolar seu lugar.
O homem gritou. Sebas olhou para ele pelo canto dos olhos.
“Não, não é isso. Se levar ela, vai dar problema. O senhor vai levar problemas pro senhor
e seu mestre! Nunca ouviu falar da Oito Dedos?”
“Tem que me ajudar, por favor. É só fingir que não viu nada aqui. Se levar ela embora,
eu tô ferrado.”
Vendo que o homem estava tentando convencê-lo, agora que o uso da força havia fa-
lhado, Sebas olhou friamente para ele e falou em tons igualmente frígidos:
Pensou Sebas. O homem ainda estava implorando enquanto Sebas pesava os prós e con-
tras de acabar com a vida do homem.
Sebas tinha pensado originalmente que o homem estava apenas tentando ganhar
tempo até a ajuda chegar, mas isso não deveria ser o caso, dada à sua atitude. Entretanto,
ele não conseguia pensar em uma razão diferente.
Essencialmente, se Sebas escapasse enquanto ele pedia ajuda, seria o mesmo que rela-
tar a seus compatriotas que cometeu um erro crítico. E ele não achava que seria capaz
de vencer pela força, mesmo se os chamasse ajuda. Era por isso que ele estava tentando
persuadir Sebas a mudar de idéia.
Mesmo Sebas não conseguiu reunir sua motivação diante daquela atitude patética e sua
intenção de matá-lo desapareceu. Dito isso, ele ainda não pretendia entregar a garota ao
homem. Assim sendo—
“Por favor, olhe minha situação. Onde eu vou arrumar dinheiro pra fugir?”
“Eu não considero o dinheiro mais importante que a vida. Se este é o problema... eu
providenciarei se assim precisar.”
Mais especificamente, matá-lo aqui poderia levar outros a procurá-la, já que estaria de-
saparecida.
Além disso, poderia causar problemas para as pessoas próximas a ela, uma vez que ele
não conhecia as circunstâncias que levaram ao seu estado atual.
Nesse momento, Sebas começou a se perguntar o porquê ele havia seguido um curso
perigoso de ação.
No fundo, ele não entendia suas motivações, nem o porquê resgatara essa mulher. Qual-
quer outro habitante de Nazarick teria ignorado ela para evitar se envolver em assuntos
problemáticos. Eles teriam seguido em frente fingido não ser nada de mais.
Sebas decidiu ignorar a frase que inexplicavelmente surgira em seu coração e disse:
Sebas jogou uma bolsa carteira. O homem olhou desconfiado, duvidando de seus olhos.
O conteúdo de uma bolsa tão pequena dificilmente poderia resolver seus problemas.
“Fuja com todas as suas forças, entendeu? Mas antes disso, tenho algumas perguntas.
Você tem tempo para respondê-las?”
“Ah, claro. Eu já disse pra eles que ia sair e levar ela no templo. Tenho um tempinho
ainda.”
Com isso, Sebas levantou o queixo para indicar que o homem deveria segui-lo. Então
ele pegou a menina em seus braços e caminhou para frente.
Parte 2
Essa moradia em particular era menor que as mansões que a ladeavam, como se fosse
uma casa para os servos das famílias que habitavam os prédios vizinhos. No entanto,
ainda era muito grande para apenas Sebas e Solution.
E claro, havia um motivo para eles alugarem um local tão grande; já que estavam agindo
como membros de uma família rica de terras longínquas, eles não poderiam morar em
uma casa velha e decadente. Por essa razão — juntamente com o fato de não terem cre-
denciais para apresentar ou fazer conexões — eles tiveram que pagar muito mais caro
que o valor cobrado pela União dos Construtores ao alugar a casa. Além disso, eles tive-
ram que pagar total à vista, o que representou uma despesa bastante grande.
Sebas recebeu uma pronta recepção quando chegou à casa e entrou pela porta da frente.
Esse alguém estava vestido de branco; era uma das subordinadas de Sebas, Solution Ep-
silon das Empregadas de Batalha, Pleiades. Os outros moradores da casa incluíam Sha-
dow Demons e Gargoyles, mas eles eram designados para tarefas de sentinela e não vie-
ram dar-lhe boas-vindas.
“Bem-vindo, Sebas—”
Solution parou suas palavras no meio da fala, e até parou o meio de sua reverência. Ela
olhou para o objeto que Sebas estava carregando com os olhos mais frios do que o nor-
mal.
“Eu a encontrei.”
Solution não respondeu à resposta concisa. Todavia, o clima parecia ficar mais pesado
ao redor deles.
“...Entendi. Não creio que seja um presente para mim, então posso perguntar como o
senhor pretende se desfazer disso?”
“Curar...”
Solution olhou para a garota que Sebas estava segurando. Uma vez que entendeu, ela
balançou a cabeça e olhou para Sebas.
Vendo que Sebas estava completamente indiferente, Solution o encarou friamente. Seus
olhos se encontraram por um segundo e, no final, foi Solution quem piscou primeiro.
“Não. Eu já a trouxe aqui. Devemos pensar sobre a melhor forma de lidar com ela.”
“...Sim, senhor.”
Solution era do tipo que não tinha expressão própria, mas seu rosto atual estava como
uma máscara. Mesmo Sebas não conseguia ler as emoções que estavam em seus olhos.
Tudo o que ele podia dizer, era que Solution estava completamente descontente com as
circunstâncias presentes.
“Não aqui...”
A garota não significava nada para Solution, mas mesmo assim, avaliar sua condição de
saúde na porta da frente poderia chamar atenção indesejada.
“Creio que há um quarto de hóspedes lá dentro. Você poderia fazer o exame lá?”
Nenhum dos dois conversou enquanto levavam a garota para o quarto de hóspedes.
Com certeza, Sebas e Solution nunca tinham sido do tipo que conversavam muito, mas
isso não explicava o constrangimento entre eles.
Solution abriu a porta para Sebas, que segurava a menina em seus braços. As pesadas
cortinas estavam fechadas e por isso o quarto estava escuro, mas não parecia abafado. A
porta havia sido aberta muitas vezes antes, por isso o ar lá dentro estava fresco e o inte-
rior estava impecavelmente limpo.
O quarto em si estava iluminado pela luz do luar que atravessava entre as estreitas
aberturas das cortinas. Depois de entrar, Sebas deitou a menina nos lençóis limpos da
cama.
Ele havia infundido a garota com seu ki e realizado alguma cura básica. No entanto, ela
permaneceu tão imóvel quanto um cadáver.
“Então...”
Com isso, Sebas saiu do quarto. Solution não aparentava que o chamaria de volta e as-
sim começou seu diagnóstico.
Agora que ele estava no corredor, provavelmente não poderia ouvir Solution sussurrar:
“Quanta tolice.”
Sebas acariciou a barba sem dar muita atenção. Por que ele salvou aquela garota?
Mesmo ele não conseguia explicar o motivo.
Foi pena?
Sebas era um mordomo e também estava encarregado dos servos de Nazarick. Sua le-
aldade pertencia a cada um dos 41 Seres Supremos. Ele devia seu serviço fiel ao Chefe
de Guilda que levara o nome de Ainz Ooal Gown.
Sua lealdade era genuína. Ele poderia dizer com confiança que de bom grado entregaria
sua vida a serviço do Supremo.
No entanto... se, hipoteticamente falando, ele tivesse que escolher apenas um dos 41
Seres Supremos para obedecer, Sebas escolheria sem hesitação alguma o homem cha-
mado Touch Me.
♦♦♦
Ele era o ser mais poderoso da Ainz Ooal Gown e era aquele que tinha projetado Sebas.
Ele era um Campeão Mundial e uma figura incomparável de fama.
A guilda florescera principalmente por PKing. Mas quem ousaria acreditar que Touch
Me, um dos Nove Originais, havia fundado o clã que antecedeu a guilda para proteger os
fracos? Uma grande divergência de seu propósito original.
♦♦♦
Essas palavras foram terrivelmente rudes. Se algum dos outros seres que serviam Ainz
Ooal Gown — aqueles que haviam sido criados pelos 41 Seres Supremos — estivessem
presentes e ouvissem essas palavras, eles poderiam tê-lo atacado bem no local por sua
falta de respeito.
“É errado mostrar pena e oferecer ajuda àqueles que não pertencem à Ainz Ooal
Gown...?”
Todos os membros de Nazarick — salvo aqueles que haviam sido programados de outra
forma pelos 41 Seres Supremos, como a Chefe das Empregadas, Pestonya S. Wanko —
acreditavam firmemente que abandonar aqueles que não pertenciam à Ainz Ooal Gown
era o curso correto de ação.
Por exemplo, ele havia ouvido de Solution que uma de suas companheiras (Pleiades) —
Lupusregina — se dava muito bem com uma garota do Vilarejo Carne. Contudo, Sebas
estava plenamente consciente de que, se surgisse algo, Lupusregina abandonaria essa
garota sem hesitação.
Se os Seres Supremos ordenassem que eles deveriam morrer, eles se matariam sem
hesitar. Se os Seres Supremos ordenassem que alguém precisava morrer, eles os mata-
riam, mesmo que o alvo fosse um amigo. Por outro lado, quem não entendesse isso re-
ceberia olhares de pena de seus camaradas.
Mas sobre o ponto de vista dele? Ele tinha tomado o curso correto de ação?
“Como foi?”
“...Ela está sofrendo de sífilis e outras duas doenças sexualmente transmissíveis. Várias
de suas costelas e dedos estão quebrados. Os tendões do braço direito e da perna es-
querda foram cortados. Seus incisivos superiores e inferiores foram retirados. Seus ór-
gãos funcionam precariamente e ela tem o ânus fissurado. Há sinais de dependência quí-
mica. Além disso, há inúmeros traços de contusões e lacerações. Isso conclui o resumo
básico de sua condição. O senhor deseja uma explicação mais detalhada?”
“Facilmente.”
Habilidades de cura podem até ajudar alguém que teve todos os seus membros decepa-
dos. Na verdade, Sebas poderia usar o ki para curar qualquer tipo de lesão física. A ver-
dade era que, se ele não estivesse preocupado com emergências ou com a verdade vindo
à tona, ele poderia curar o tornozelo torcido da velha senhora no local.
Obviamente, seu ki poderia curar ferimentos físicos, mas não poderia ajudar em casos
de envenenamento ou doenças, Sebas não havia aprendido essas habilidades. Portanto,
ele teve que pedir à Solution para ajudar nesse aspecto.
“Se a magia de cura precisa ser usada, talvez seja melhor procurar a Pestonya-sama.”
“Use-o.”
“...Sebas-sama. Esse pergaminho nos foi dado pelo Supremo. Não deve ser usado em
uma mera humana.”
De fato. Ele deveria ter pensado em outra maneira. Seria melhor curar suas feridas e
estabilizá-la primeiro, antes de curar seu vício e doenças. Entretanto, ele não sabia se
tinha tempo para isso. Se ela estivesse morrendo por causa de seu vício ou doenças, curá-
la seria um exercício de futilidade a menos que a cura fosse constantemente reaplicada.
“Não questione.”
“...Como desejar. Devo restaurar essa mulher a uma condição intocada — em outras
palavras, vou reverter seu corpo ao estado em que estava antes de se engajar nessas
atividades. É isso que o senhor deseja?”
“Então, posso incomodá-la para ferver um pouco de água e limpá-la depois do trata-
mento? Vou comprar algo para comer.”
“...Sebas-sama. Curar o corpo é uma tarefa simples, mas... eu não possuo a capacidade
de curar traumas mentais.”
Solution parou aqui e depois olhou diretamente para Sebas antes de continuar:
“Se houver a necessidade de curar tais traumas, eu sinto que seria melhor pedir ajuda
ao Ainz-sama. O senhor vai informá-lo disso?”
A melhor maneira era esperar até que ela fosse tratada — enquanto o rufião estava
fugindo — e depois levá-la para onde ela desejasse ir e, assim, libertá-la. Ele precisava
escolher um local que estivesse suficientemente longe da Capital Real. Dizê-la para sair
daqui não só seria muito perigoso, mas também bastante cruel. Isso jogaria sua ajuda no
lixo.
“Quão tolo eu fui. E pensar que eu, Sebas, chegaria a este ponto por uma humana...”
Mas não importava o quanto pensasse, ele não conseguia chegar a uma conclusão. As-
sim, Sebas decidiu parar de procurar uma resposta. Agora, ele deveria começar resol-
vendo os problemas simples. Isso apenas atrasaria o inevitável, mas isso foi o melhor
que Sebas pôde inventar no momento.
♦♦♦
Solution mudou a forma de seus dedos. O dedo fino se alongou, tornando-se uma estru-
tura semelhante a um fórceps, com vários milímetros de espessura. Por ser uma Shog-
goth, Solution sempre foi capaz de fazer grandes alterações em sua forma, então alterar
a espessura de seus dedos era brincadeira de criança.
Ela olhou para a porta e, quando percebeu que ele não estava mais lá fora, aproximou-
se da mulher na cama.
“Já que o Sebas-sama aprovou, eu também posso cuidar dessa coisinha desagradável
bem rápido. Você preferiria assim, não? Até porque, não é como se estivesse ciente dessa
coisa dentro de você, ou está?”
Solution alcançou dentro de seu corpo com a mão não transformada e retirou um per-
gaminho armazenado dentro de si.
Aquele pergaminho não era o único item que Solution escondia dentro de si. Além de
pergaminhos e outros itens mágicos descartáveis, ela também continha um grande nú-
mero de armas, proteções e outros equipamentos de guerra. Isso não era nada fora do
comum, considerando que seu corpo poderia armazenar vários seres humanos.
Ela não estava interessada em sua aparência. Apenas um pensamento passou por sua
mente.
“Eu poderia entender as intenções de Sebas-sama se ele pretendesse fazer dela o meu
brinquedo depois que se recuperasse, mas isso é...”
Ela estava familiarizada com a personalidade de Sebas, já que ele era o líder das Em-
pregadas de Batalha, Pleiades. Ele nunca permitiria tal coisa. Afinal, ele não permitira
que ela capturasse e comesse humanos durante sua jornada, exceto aqueles que tenta-
ram emboscá-los.
“Se o Sebas-sama a resgatou sob ordens do Supremo, então eu ficaria feliz em obedecer...
mas realmente vale a pena gastar um ativo valioso dos Seres Supremos em uma mera
humana?”
Como assassina, Solution tinha níveis em várias profissões ladinas. Assim, ela foi capaz
de usar este pergaminho de 「Heal」, ela não seria capaz de usar se não fosse por isso.
Solution usou uma habilidade para sintetizar um veneno adormecedor com relaxante
muscular, e então injetou na menina.
♦♦♦
Sebas voltou com a refeição assim que Solution saiu do quarto. Ela tinha um balde de
água morna em cada mão, cada um com vários panos dentro.
“Obrigado por ter feito. Posso concluir que não houve problemas com o processo de
cura...?”
“Sim. Tudo foi resolvido e não houve imprevistos. Mas não havia roupas para ela usar,
então selecionei uma roupa para ela ao acaso. O senhor aprova?”
“Entendo... A toxina de relaxamento já deve ter dissipado... se o senhor não tiver mais
diretrizes, aqui me despeço.”
Depois de vê-la sair, Sebas bateu na porta. Não houve resposta, mas ele sentiu alguém
se movendo no interior, e assim, silenciosamente abriu a porta.
A menina que dormia na cama tinha acabado de recuperar a consciência. Ela sentou-se
ainda sonolenta.
Seus cabelos loiros imundos agora reluziam com um lindo brilho. Suas feições emacia-
das haviam recuperado sua plenitude. Seus lábios rachados agora eram de um rosa sau-
dável.
No geral, ela era linda, embora sua aparência pudesse ser melhor descrita como uma
beleza tenra ao invés de sexy.
Sua idade agora estava mais fácil de perceber. Ela parecia estar no final da adolescência,
entre 15 e 19 anos, embora a escuridão em seu rosto devido aos anos inferno que passou
a fizesse parecer mais velha do que realmente era.
Solution lhe dera uma camisola branca para vestir, mas era simples e sem adornos, sem
babados, rendas ou outras decorações atraentes.
Não houve resposta. Seus olhos vazios não pareciam confiantes o suficiente para olhar
para Sebas. No entanto, ele não se importou, mas continuou falando.
O mingau salgado na tigela de madeira tinha um caldo espesso. Havia sido preparado
com um pouco de óleo de gergelim para aprimorar o sabor e, no geral, irradiava um
aroma de dar água na boca.
Vendo que a garota ainda não havia saído completamente de seu próprio mundo, Sebas
colocou a tigela de madeira e sua colher diante da garota.
Ela não se mexeu, mas Sebas não insistiu que ela comesse.
As feridas do lado de fora tinham sido completamente curadas, mas a dor que havia
sido marcada em suas memórias ainda permanecia.
Ela pegou a colher de madeira, mergulhou-a no mingau, depois levou-a à boca e comeu
tudo.
O mingau salgado normal geralmente era saboroso, porém grosso demais. Sebas pediu
ao lojista que 14 ingredientes diferentes fossem cortados em fatias finas e também para
que fossem cozidos em fogo lento, assim a refeição poderia ser ingerida sem a necessi-
dade de mastigar.
Os olhos da garota tremeram um pouco. Foi um singelo movimento, mas foi suficiente
para convertê-la de uma boneca sem alma em um ser humano real. Sua outra mão tremia
enquanto se movia para pegar a tigela de Sebas.
Sebas apoiou a tigela, deslocando-a para um lugar que era mais fácil para ela alcançar.
A menina agarrou a tigela para si mesma, em seguida, enchia colher após colher do min-
gau enquanto o devorava a grandes bocadas.
Depois de terminar a tigela com uma velocidade que era completamente diferente de
seu eu anterior, a garota segurou a tigela e expirou profundamente.
A combinação de uma barriga cheia, roupas frescas e um corpo limpo pareciam acalmar
seu espírito, e ela começou a sentir fadiga.
Porém, assim que seus olhos se estreitaram, ela os forçou a abrir novamente e abraçou
a si mesma como um animal amedrontado.
Ela estava com medo de fechar os olhos, ou estava com medo de que tudo que estava
experimentando desapareceria como uma bolha de sabão estourada? Seria algo mais?
Sebas a observava, mas nem mesmo ele sabia.
“Você precisa dormir. Não se esforce e tenha um bom descanso. Você não sofrerá ne-
nhum mal enquanto permanecer aqui. Eu garanto isso — quando você acordar, ainda
estará nesta cama.”
Os olhos da garota se moveram pela primeira vez e olharam diretamente para Sebas.
Suas pupilas azuis eram estólidas e careciam de vitalidade. No entanto, esses não eram
os olhos de um cadáver, mas uma pessoa viva.
Sua pequena boca se abriu— mas fechou. Então se abriu e— fechou novamente. Isso se
repetiu várias vezes. Sebas a observou ternamente. Ele não pediu que ela fizesse nada;
simplesmente a observou em silêncio.
“Ah...”
Por fim, abriu a boca e ruídos quase inaudíveis surgiram. Então, ela acrescentou rapi-
damente:
As primeiras palavras que ela falou não foram para perguntar sobre suas circunstâncias
presentes, mas para agradecer-lhe. Tendo compreendido parte de seu caráter, Sebas lhe
deu um sorriso genuíno; não o falso habitual que usava no cotidiano.
Ela amaldiçoou seu destino. Ela se ressentia do fato de existir. Ela estava cheia de ódio
por ninguém a ter ajudado até agora. Sua ira foi dirigida a Sebas também.
Depois de receber a gentileza de Sebas — depois de ser tratada como um ser humano,
era como se uma parte dela tivesse quebrado sob a tensão de tudo o que ela suportara
até agora. Não, talvez fosse melhor dizer que depois de ter sua humanidade restaurada,
ela não poderia mais suportar suas memórias dolorosas.
Ela puxou os cabelos e os fios se quebraram quando o fez. Inúmeras fibras douradas
estavam emaranhadas ao redor de seus dedos delgados. A tigela de mingau e a colher
rolaram da cama.
Seu ódio e amaldiçoamentos foram direcionados para a pessoa errada. Ela estava cla-
ramente procurando um bode expiatório. Talvez a dita pessoa estivesse infeliz ao pre-
senciar isso, talvez até furioso. No entanto, não havia raiva em seu rosto. Suas marcas de
expressão estavam cheias de bondade.
Era como um pai abraçando sua filha. Não havia malícia neste gesto, apenas uma bon-
dade sem fim.
Seu corpo enrijeceu por um momento. Então, quando percebeu que esse abraço era di-
ferente dos homens que procuravam apenas violar sua carne, seu corpo lentamente re-
laxou.
Sebas repetiu essas palavras como um mantra, gentilmente acariciando-a nas costas,
como se estivesse consolando uma criança chorando.
♦♦♦
Depois de algum, ela finalmente conseguiu parar de chorar, a roupa de Sebas tinha sido
encharcada pelas lágrimas. Ela lentamente se soltou dos braços de Sebas e abaixou a
cabeça para esconder seu rosto corado.
“Por favor, não se preocupe com isso. Ser capaz de oferecer um ombro amigo quando
uma dama precisa é um símbolo de orgulho para um homem.”
A garota questionou cheia de nervosismo. Sebas estendeu a mão para segurar o queixo
dela, depois gentilmente levantou o rosto. Ela não tinha idéia do que tinha acontecido,
mas estava com medo, então o lenço tocou suavemente sobre os olhos — absorvendo os
rastros de suas lágrimas.
Isso me lembra da última conversa via 「Message」 que a Solution teve com a Shalltear...
Shalltear estava aparentemente muito orgulhosa do fato de que o Ainz-sama havia aju-
dado a enxugar suas lágrimas.
Que circunstâncias teriam feito com que seu mestre enxugasse as lágrimas de Shalltear?
Ele não podia imaginar Shalltear chorando. Enquanto sua mente se ocupava com supo-
sições inúteis, suas mãos se moviam suavemente para limpar o rosto da garota.
“Ah...”
Disse Sebas quando colocou o lenço um pouco úmido em suas mãos, e finalizou:
“É muito triste quando um lenço não é usado. Especialmente quando não consegue nem
secar as lágrimas.”
Não havia nada que a magia não pudesse fazer. Seu corpo havia sido restaurado através
da cura mágica de Solution, e seu cansaço mental havia sido apagado. Assim, ela pode
ser restaurada ao seu eu quase que imediatamente. No entanto, ela esteve vivendo um
inferno até algumas horas atrás. Suas feridas emocionais poderiam se romper nova-
mente depois de uma longa conversa.
A verdade era que sua mente não estava completamente estável, daí a agonia vinda do
choro de momentos atrás. A magia poderia brevemente aliviar o sofrimento espiritual,
mas só poderia tratar os sintomas e não a causa. Ao contrário do corpo físico, as feridas
invisíveis do espírito não poderiam ser tão facilmente curadas.
Até onde Sebas sabia, as únicas pessoas que poderiam remover completamente seu
dano mental eram seu Mestre ou possivelmente Pestonya S. Wanko.
“O futuro...?”
Sebas não sabia se deveria continuar a conversa. Ainda assim, já que ela tinha sido a
única a iniciar a conversa, ele decidiu responder enquanto a olhava discretamente.
“Continuar na Capital Real não lhe trará segurança alguma. Tem amigos ou parentes
para quem recorrer?”
“Entendo...”
Você não tem nenhum? Mas é claro que ele não disse isso.
Pensou Sebas. Porém, não havia necessidade de ser apressado. Aquele homem prova-
velmente não seria capturado tão cedo, e chegar até Sebas levaria algum tempo. Ele sabia
que estava sendo otimista, dizia a si mesmo para não se preocupar, esperando fosse re-
almente o caso. No mínimo, ele esperava que a garota fosse capaz de recuperar seu es-
pírito primeiro.
Solution normalmente usava seu vestido branco em vez de seu traje de empregada,
para o caso de serem surpreendidos pelos convidados. No entanto, ele teria que lembrá-
la de permanecer no personagem como a senhora desta casa agora que Tsuare estava
em casa.
“Sim, Solution Epsilon-sama. Embora duvide que você tenha muita chance de conhecê-
la.”
“...?”
Sebas ficou em silêncio, como se quisesse indicar que era tudo o que ele dizia sobre o
assunto. Depois de um breve silêncio, ele falou mais uma vez.
“Tá... bem...”
Depois de verificar que Tsuare estava de volta na cama, Sebas pegou a tigela de mingau
e saiu do quarto.
Quando ele abriu a porta, não ficou surpreso ao encontrar Solution parada ali. Ela pro-
vavelmente estava bisbilhotando, mas Sebas não a culpava. Solution não sentiu que Se-
bas a repreenderia por fazê-lo, então tudo o que ela fez foi mascarar sua presença e ficar
à espreita do lado de fora. Como tinha níveis em profissões relacionadas a assassinos,
ela poderia ter feito um trabalho melhor de se esconder se quisesse.
“Qual o problema?”
A atenção de Sebas foi para a porta atrás dele. Era bem grossa, mas não completamente
à prova de som. Se eles falassem aqui, ela provavelmente seria capaz de escutar um
pouco da conversa.
“Esse nome...”
“Talvez eu tenha me excedido, mas sinto que aquela criatura tem uma grande chance
de atrapalhar às nossas atividades. Devemos lidar com isso o mais rápido possível.”
Depois de ouvir as palavras frias de Solution, Sebas pensou: Como eu esperava. Esta era
a opinião que uma serva leal de Nazarick, de pensamento correto — alinhado com os 41
Seres Supremos — teria sobre uma entidade não-Nazarickiana. Foi a atitude de Sebas
em relação à Tsuare que era anormal.
“Tem toda razão. Se ela interferir com as ordens que o Ainz-sama nos deu, eu mesmo
lidarei com ela sem demora.”
Solution pareceu surpresa, como se dissesse: “Se está ciente disso, então por que o senhor
o fez?”
“Ela pode ter seus usos. E já que nós a acolhemos, seria uma pena descartá-la. Precisa-
mos pensar em uma maneira de utilizá-la adequadamente.”
“...Sebas-sama. Eu não sei onde ou o porquê o senhor a pegou, mas os ferimentos dela
indicam muito bem um histórico conturbado. O senhor não acha que a pessoa que infli-
giu os ferimentos naquela humana ficaria infeliz em saber que ainda estava viva?”
“Não. Não é isso. Mas se surgir algum problema, eu mesmo o resolverei. Assim sendo,
espero que você seja capaz de ficar na sua e apenas observar até minha segunda ordem.
Entendeu, Solution?”
“...Sim, senhor.”
Dito isto—
Toda a riqueza e recursos de Nazarick pertenciam à Ainz Ooal Gown — em outras pa-
lavras, pertenciam ao Supremo. Era realmente correto gastá-los sem permissão?
Ela não conseguia chegar a uma resposta, não importava o quanto pensasse.
♦♦♦
Sebas abriu a porta principal. Como de costume, ele foi à Guilda dos Aventureiros de
manhã e registrou todos os pedidos no quadro de avisos em seu caderno antes que os
aventureiros pudessem levá-los.
Sebas havia transcrito toda a informação que obtivera na Capital Real — até mesmo as
fofocas de rua — em papel e depois a enviara para Nazarick. A análise de dados era um
processo difícil, por isso foi deixado inteiramente para os intelectuais de Nazarick lida-
rem.
Ele passou pela porta e entrou na casa. Alguns dias atrás, Solution teria vindo cumpri-
mentá-lo. Mas hoje—
Esta tarefa estava a cargo da garota de fala suave, agora ela estava com roupa de em-
pregada cuja saia longa cobria suas pernas.
No dia seguinte à recepção de Tsuare, houve uma discussão e decidiram que ela traba-
lharia nessa casa.
Ela disse que se sentia desconfortável por ser tratada como hóspede, pois foi resgatada
por Sebas. Embora não se qualificasse como recompensa por sua gentileza, ela esperava
poder fazer algo para ajudar em casa.
Depois de ver quais eram suas verdadeiras intenções, ele começou a se sentir descon-
fortável também.
É claro que Sebas dissera à Tsuare que ele não a abandonaria. Se ele fosse do tipo que
poderia descartar alguém com ninguém a quem recorrer, então não haveria motivo para
tê-la resgatado. No entanto, ele não tinha o poder de persuasão para curar as feridas no
coração de Tsuare.
Tsuare assentiu.
Ao contrário de como ela tinha sido quando se conheceram, seu cabelo estava bem apa-
rado e ela usava um pequeno laço com babados brancos.
“Fiz... bem.”
Ela parecia tão sombria como sempre e sua expressão dificilmente mudava, mas ser
capaz de viver como um ser humano gradualmente aliviou o medo que a dominava, sua
fala estava muito mais clara agora.
Tecnicamente falando, seria uma violação de etiqueta uma empregada como ela andar
ao lado de Sebas — seu superior. No entanto, Tsuare nunca havia sido treinada como
empregada e não entendia tais formalidades, e Sebas não queria educá-la nesses assun-
tos.
“Muito bom. Não vejo a hora para provar. Sua comida é deliciosa, Tsuare.”
Ela corou e baixou o rosto quando Sebas a elogiou com um sorriso. Suas mãos nervosa-
mente seguraram o avental de uniforme de empregada.
Tsuare andava normalmente dentro da casa e na frente de Sebas, mas ela ainda tinha
uma aversão ao mundo exterior. Como ela não podia trabalhar ao ar livre, Sebas assumiu
a tarefa de comprar ingredientes e assim por diante.
Os pratos de Tsuare dificilmente tinham algum diferencial gastronômico. Ela fazia pra-
tos simples e cotidianos.
Como esses pratos não exigiam ingredientes caros, eram facilmente obtidos nos mer-
cados. Sebas também havia aprendido sobre os ingredientes no mercado e os alimentos
e bebidas deste mundo, ele considerava estar matando dois coelhos com uma cajadada
só.
Um olhar de choque apareceu no rosto de Tsuare, e então ela sacudiu a cabeça timida-
mente. Seu rosto ficou pálido por um momento e ela começou a suar frio.
Desde que ela começou a trabalhar, Tsuare se recusava a fazer qualquer coisa que pu-
desse envolver sair de casa.
A fim de suprimir o medo profundamente marcado dentro de si, ela pensava nessa casa
como sua fortaleza absoluta. Em outras palavras, ela traçara um limite para dizer a si
mesma que esse lugar era diferente do mundo exterior, do mundo que a machucara. Essa
era a única maneira que ela encontrou para conseguir ter forças para fazer algo.
No entanto, se isso continuasse, Tsuare nunca seria capaz de sair de casa, e Sebas não
poderia mantê-la aqui por toda a vida.
Sebas sabia que era muito cruel esperar que Tsuare caminhasse entre as massas, dada
sua condição mental. Ele deveria ter passado mais tempo para ajudá-la a se acostumar a
estar perto dos outros novamente, mas isso, naturalmente, exigia tempo.
Sebas parou no meio do caminho e olhou diretamente para Tsuare. Ela corou e abaixou
a cabeça timidamente, mas Sebas pegou suas bochechas com as duas mãos e levantou o
rosto.
“Tsuare, eu entendo seus medos. Mas espero que se acalme. Eu — Sebas — a protegerei.
Esmagarei todo e qualquer perigo que se aproximar, eu garanto que não será ferida.”
“......”
“Tsuare, por favor, saia comigo. Quando tiver medo, pode fechar os olhos.”
“.........”
Quando Tsuare hesitou, Sebas segurou suas mãos delicadas. O que ele disse em seguida
foi terrivelmente injusto para ela.
O silêncio encheu o corredor, por um momento, o passar do tempo estava mais lento
entre eles. No final, os olhos de Tsuare ficaram úmidos e seus lábios macios se separaram
revelando seus dentes brancos perolados.
“Apenas relaxe. Apesar da minha aparência, sou muito forte... Deixe-me colocar desta
forma. Em todo o mundo existem apenas Quarenta & Um que são mais fortes do que eu...
bem, e mais alguns.”
Dado o modo como foi dito, Tsuare chegou a pensar que Sebas estava apenas contando
uma piada para tranquilizá-la, então ela sorriu em resposta. Sebas viu isso e sorriu de
volta sem dizer nada.
Sebas começou a andar novamente. Ele sabia que Tsuare estava espiando seu rosto dis-
cretamente, mas ele não deu atenção.
Além disso, Sebas tinha a aparência de um idoso e talvez Tsuare tivesse confundido seu
acalento afetuoso com o amor romântico.
Mesmo que Tsuare sentisse amor genuíno por Sebas, ele não achava que poderia de-
volvê-lo adequadamente. Afinal, ele estava escondendo várias coisas dela, e suas respec-
tivas circunstâncias estavam muito distantes uma da outra.
“Solu... sam...”
O humor de Tsuare ficou sombrio. Sebas sabia o porquê, mas se manteve em silêncio.
Solution mal havia se encontrado com Tsuare. No máximo trocaram alguns olhares an-
tes de Solution sair sem dizer uma palavra. Qualquer um se sentiria desconfortável por
ser ignorado assim e, no caso de Tsuare, ela provavelmente ficaria aterrorizada.
“Não se preocupe. A Milady é assim com todos. Não é como se ela fosse assim apenas
com você... mas sendo honesto, às vezes ela é um pouco obstinada. Mas mantenha isso
ente nós, sabe o porquê—?”
De fato, Tsuare era bela, mas nada que se comparasse à Solution. Todavia, os dizeres do
ditado “a beleza estava nos olhos de quem vê” entrou em vigor.
O rosto de Tsuare ficou vermelho enquanto ela o abaixava. Sebas olhou gentilmente
para ela, então viu sua expressão mudar e suas sobrancelhas franzirem.
“Certamente, é assim que as joias são. As sem manchas ou trincas valem mais e são con-
sideradas mais puras.”
O rosto de Tsuare ficou ainda mais triste quando ela ouviu essas palavras.
“Tsuare, você parece se considerar suja. Mas quem pode julgar a pureza de um ser hu-
mano? Existem padrões para pedras preciosas... mas quem estabelecera os padrões para
as virtudes de um ser humano? Existe algum valor comum a ser superado? Alguma opi-
nião pública que deve ser respeitada? Isso significa que todos os pensamentos e opiniões
de outras pessoas podem ser descartados?”
“Cada um tem sua definição diferente de beleza. Se a beleza não pode ser determinada
pela aparência de alguém, então, em minha opinião, não podemos determinar a beleza
baseando-se apenas no que as pessoas viveram, mas sim pela forma como elas são por
dentro... Eu não sei o que você passou e estamos convivendo aqui há poucos dias, mas o
que eu sei, é que a pessoa dentro de você está muito distante do conceito de imundo,
muito mais do que possa imaginar.”
Sebas se calou e seus passos ecoaram pelo corredor. Tsuare parecia ter se decidido e
ela disse:
Sebas prontamente a abraçou antes que ela pudesse terminar suas palavras.
“Tu-tudo bem...”
Sebas deixou Tsuare, agora de olhos vermelhos se curvando atrás dele, e bateu na porta.
Ele a abriu sem esperar por uma resposta. Ao fechá-la, sorriu para Tsuare, que o espio-
nara o tempo todo.
“...Obrigada, Sebas.”
Solution, a falsa mestra da mansão, tinha uma expressão airada no rosto enquanto des-
cansava no sofá no centro da sala. Porém, isso era apenas uma encenação. Isso porque
Tsuare, a intrusa, também estava na casa, então ela teve que colocar a máscara de uma
herdeira orgulhosa.
“...Ela já foi?”
Solution sempre fazia a mesma pergunta sempre que se encontravam, e Sebas sempre
dava a mesma resposta.
“...O senhor poderia me dar uma indicação clara de quando será a hora? Pelo que sabe-
mos, esconder essa humana pode nos trazer problemas. Isso não viola as ordens de Ainz-
sama?”
“Não houve problemas até agora... Temer humanos e os problemas que eles podem fa-
zer, dificilmente é a atitude que um servo de Ainz-sama deveria ter.”
Solution não tinha feito qualquer movimento para prejudicar Tsuare até agora devido
a ser impedida forçadamente por Sebas. No entanto, se as coisas permanecessem assim,
talvez esse impedimento se tornasse ineficaz.
“...Sebas-sama. Uma vez que aquela humana violar as ordens que o Ainz-sama estabele-
ceu—”
Sebas terminou a frase sem dar chance para Solution de continuar. Por sua vez, ela o
olhou sem emoção, então assentiu indicando que entendia.
“Então eu não direi mais nada. Sebas-sama, mas por favor, não esqueça as palavras que
acabou de dizer.”
“...Ainda assim.”
O tom silencioso de Solution escondia emoções tão poderosas que fizeram Sebas parar.
“...Ainda assim, Sebas-sama. Não deveríamos reportar a presença dessa Tsuare ao Ainz-
sama?”
“Creio que não será problema. Seria um incômodo desperdiçar o tempo de Ainz-sama
com uma humana insignificante.”
“O que está insinuando? Eu não tenho tais pensamentos. Nem em meus pesadelos eu—”
“Posso afirmar quê... tudo que o senhor fez não foi para seu próprio ganho pessoal...
estou certa?”
Cada habitante de Nazarick tinha lealdade absoluta à Ainz Ooal Gown — para cada um
dos Seres Supremos. Era certo que todos se sentiam assim, especialmente os Guardiões.
Até mesmo o Mordomo Assistente, Eclair, que planejava tomar Nazarick para si, sentia
sincera lealdade e respeito pelos 41 Seres Supremos.
Dito isso, ele ainda achava que era errado abandonar um ser miserável apenas por
medo do perigo. Contudo, ele também entendia que a maioria daqueles em Nazarick não
aprovaria esse curso de ação.
Não, ele só achava que entendia. A atitude de Solution de alguns segundos atrás clara-
mente o informara da extensão de sua ingenuidade.
Solution foi séria. Ela poderia muito bem enfrentar Sebas — que era um dos mais gra-
duados e um dos mais fortes combatentes corpo a corpo de Nazarick — dependendo de
sua resposta. Ele não esperava que Solution fosse tão longe para remover um problema.
—Sebas sorriu.
“...Claro. Não foi por ganho pessoal que eu não relatei isso ao Ainz-sama.”
“Sim. Além disso, não seria suspeito se apenas duas pessoas vivessem em uma casa tão
grande?”
“...Possivelmente.”
Solution não teve escolha a não ser concordar com essa inquirição. Qualquer um acha-
ria estranho que uma casa tão grande fosse pouco ocupada, ainda mais com todo o di-
nheiro gasto ao alugá-la.
“Precisamente.”
“Estou interessado na Tsuare. Eu sinto que mesmo que ela tenha suas dúvidas sobre
nós, ela nunca as tornaria públicas. Faz sentido para você?”
“Certamente.”
“...Sim.”
Sebas parou no meio do caminho porque ouviu algo parecido com dois objetos duros
colidindo.
Foi um som muito suave; provavelmente ninguém além de Sebas teria ouvido.
Aquele barulho desordenado se repetiu novamente, e ele estava certo de que tinha sido
deliberadamente feito.
Eles congelaram quando perceberam que o som vinha da aldrava da porta principal.
Ninguém jamais havia batido naquela porta desde que haviam chegado à Capital Real.
Eles haviam conduzido seus negócios pessoalmente e nunca pediram a ninguém para ir
à casa. Isso porque estavam preocupados que os outros se perguntariam o porquê uma
casa tão grande só era ocupada por duas pessoas.
Mas agora, alguém veio visitá-los. Certamente algum tipo de problema estava a se de-
senrolar.
Ele podia ver um homem gordo do lado de fora, e soldados do Exército Real o ladeando
por trás, esperando por ordens.
O homem rechonchudo estava bem vestido e usava roupas de boa qualidade. Ele tinha
um distintivo pesado no peito que refletia uma luz acobreada. Seu rosto vermelho e su-
ado também era bem rechonchudo e tinha um brilho oleoso, provavelmente devido às
muitas refeições fartas.
Sua pele pálida parecia nunca ter visto o sol antes. Seus olhos estavam aguçados e seu
rosto magro parecia com algum predador — um coletor de cadáveres, na verdade. Suas
roupas escuras pendiam frouxamente sobre ele, certamente portava algum tipo de arma.
Ele irradiava um cheiro de sangue e malícia, isso alertou o sexto sentido de Sebas.
Sebas não tinha idéia de quem era esse grupo de desajustados ou o que eles queriam.
Relatou o homem gordo à frente do grupo. Sua voz era estridente e um pouco desafi-
nada.
Inspetores eram funcionários públicos que mantinham a ordem na Capital Real. Poder-
se-ia dizer que eles eram os comandantes dos guardas que patrulhavam a Capital e ti-
nham grande autoridade. Sebas não tinha idéia do porquê esse homem chamado Staffan
tinha vindo, e isso o preocupava.
“Eu confio que está ciente que as leis do Reino proíbem o tráfico de escravos... Essa lei
foi proposta pela própria Princesa Renner e colocada em vigor após ser revisada pelo
Parlamento. O relatório que recebi indica que os habitantes deste domicílio violaram
essa lei. Assim, desejo investigar o assunto.”
Não havia garantia de que Staffan era realmente quem ele disse que era. Todos os ser-
vidores públicos do Reino tinham que usar distintivos como Staffan, mas não havia como
dizer se ele era ou não um funcionário legítimo do Estado. Até onde sabia, podia ser falso
— embora a penalidade por isso fosse muito severa.
Dito isso, que mal faria permitir que vários humanos entrassem? Se pretendessem re-
correr à violência, Sebas poderia facilmente lidar com eles. De fato, serem impostores só
serviriam aos propósitos de Sebas.
Não havia como dizer o que Staffan pensava do silêncio contemplativo de Sebas. Mais
uma vez, ele perguntou:
“Se possível, posso ter uma audiência com o dono da casa? Embora nada possa ser feito
se o dono não estiver, mas estamos aqui para conduzir uma investigação. Será proble-
mático se voltarmos sem nada.”
Staffan sorriu. Não havia sinal de humildade em seu sorriso. Ele ocultava tons de inti-
midação através do abuso de poder.
Depois de ver o sorriso falso de Succulent, Sebas sentiu uma sensação de derrota raste-
jando em sua direção.
Seu sorriso era como o de um caçador impiedoso zombando de sua presa ao observá-
la entrar em sua armadilha. Ele certamente deve ter feito todos os arranjos apropriados
com todas as partes apropriadas antes de se aproximar dele, um misto de coragem e
ousadia. Sendo esse o caso, Staffan provavelmente se encaixava como um oficial ade-
quado. Eles certamente estariam preparados para qualquer recusa da parte dele. Sendo
esse o caso, seria melhor aguardar e ver o que prepararam.
Sebas abaixou a tampa do ilhó e virou-se para Solution. Antes disso, porém, ele preci-
sava dizer à Tsuare para se esconder no interior da casa—
♦♦♦
Ele pediu que soldados esperassem do lado de fora, e assim trouxe Staffan e Succulent
para dentro. Ambos ficaram visivelmente chocados quando viram Solution.
Seus rostos ficaram estampados com surpresa, talvez não esperassem ver uma mulher
tão bonita. A expressão de Staffan lentamente ficou lasciva, seus olhos vagando entre o
rosto e os fartos seios. Havia um olhar sombrio de luxúria em seus olhos. Em contraste,
o rosto de Succulent gradualmente se contraiu, sem intenção de relaxar.
Ficou claro qual deles era mais digno de cautela. Sebas pediu que se sentassem no sofá,
ficando de frente para Solution.
“Um certo estabelecimento relatou que alguém havia levado uma de suas funcionárias.
Ao mesmo tempo, ouvi dizer que a pessoa responsável pagou uma grande quantia de
dinheiro sujo a outro trabalhador. Nosso país proíbe o tráfico de escravos... isso não soa
como infringir a lei para a senhora?”
A voz de Staffan ficou cada vez mais animada e áspera, mas a resposta de Solution foi
completamente desinteressada:
“Oh, jura?”
Seu tom quase fez os dois revirarem os olhos. Eles estavam claramente tentando inti-
midá-la, mas não esperavam uma resposta dessa.
“Meu criado lidará com todas essas coisas problemáticas. Sebas, cuide disso por mim.”
“Tem, tem certeza? Se as coisas correrem mal, a senhora pode se tornar uma criminosa.”
“Divirtam-se.”
Ninguém pôde detê-la quando saiu. Naquele instante, eles perceberam exatamente o
quão poderoso o sorriso de uma mulher bonita poderia ser.
Antes que o trancar da porta pudesse escoar pela casa, eles ouviram suspiros de sur-
presa quando os soldados do lado de fora testemunharam a boa aparência de Solution.
Sorrindo, Sebas sentou-se diante deles. Staffan recuou quando viu seu sorriso, mas Suc-
culent decidiu falar em seu nome para ajudar a manter o controle da situação.
“Bem, se diz. Assumirei a conversa aqui, Sebas-san. Como o Havish-san disse na porta,
uma das pessoas no nosso... estabelecimento desapareceu. Nós questionamos um ho-
mem, e ele disse que a entregou por dinheiro. Eu pensei; isso é tráfico de escravos, o
mesmo que é proibido no Reino? Eu não estava disposto a acreditar que um dos nossos
funcionários pudesse realmente fazer uma coisa dessas, mas eu não tive escolha senão
relatar isso.”
“De fato. Não podemos perdoar a degeneração que o tráfico de escravos traz!”
“Por essa razão, meu caro Succulent aqui relatou este caso, mesmo correndo o risco de
manchar a reputação de seu negócio! Um exemplo de cidadão modelo!”
“Obrigado, Havish-sama.”
Sebas pensou. Sua mente estava analisando as possibilidades. Os dois estavam clara-
mente em conluio. Sendo esse o caso, era quase certo que eles tinham tomado precau-
ções amplas antes de fazerem esse movimento. Sendo esse o caso, sua derrota seria certa.
Ainda assim, ele precisava minimizar suas perdas, mas como?
Ignorando isso por um momento, quais eram as condições para a vitória de Sebas?
Contudo—
“Acredito que o homem que afirma ter recebido o dinheiro pode ter dado falso teste-
munho. Onde ele está agora?”
“Ele foi preso por suspeita de tráfico de escravos e está sob custódia agora. Depois de
interrogá-lo, descobrimos—”
“—A identidade da pessoa que comprou a nossa funcionária, ou seja, o senhor, Sebas-
san.”
O homem prontamente abriu o bico, como um canário cantando. Ele provavelmente ti-
nha sido forçado a dizer informações úteis.
Sebas ponderou se deveria agir como um idiota, mentir ou dar uma réplica firme e cor-
reta.
E se ele dissesse que ela não estava na casa? E se ele dissesse que ela estava morta?
Numerosas frases apareceram em sua cabeça, mas nenhuma delas parecia funcionar e
a oposição provavelmente não desistiria facilmente. Seria melhor que ele perguntasse o
que precisava saber.
Era isso que perturbava Sebas. Ele não deixou nenhum traço de seu nome ou identidade.
Eles não deveriam ter encontrado nenhuma evidência apontando para ele. Contudo, os
dois estavam aqui. Como eles o encontraram? Ele sempre foi muito cuidadoso durante
suas excursões e sempre desconfiado de possíveis perseguidores. E não achava que al-
guém nesta cidade pudesse segui-lo sem ser visto.
“Graças a um pergaminho.”
A qualidade daquele pergaminho sublime certamente não era achada em qualquer lu-
gar. Qualquer um que pudesse reconhecer um pergaminho como aquele seria capaz de
dizer que foi comprado da Guilda dos Magistas. Depois de perguntar aqui e ali, eles cer-
tamente encontrariam pistas, e um homem em um uniforme de mordomo carregando
um pergaminho seria bastante proeminente.
Todavia, ele estaria em problemas maiores se insistissem em revistar a casa. Pois além
de descobrirem Tsuare, notariam que apenas três pessoas a habitavam, isso incluindo
Tsuare.
Sendo esse o caso tudo o que ele podia fazer era deixar as coisas em pratos limpos.
Sebas decidiu deixar seu destino para os deuses.
“...Eu a levei embora. Isso é um fato. No entanto, ela estava gravemente ferida na ocasião
e eu fui forçado a fazê-lo, pois temia que sua vida estivesse em perigo.”
“Infelizmente, não podemos permitir isso. As coisas seriam ruins se tivessem permissão
para combinar suas histórias.”
“Então poderia—”
Estar presente e ouvir nossa conversa. Sebas queria dizer isso, mas preferiu se calar.
Afinal, eles planejaram a coisa toda. Mesmo que se encontrassem, não era provável que
a situação pudesse favorecer Sebas. Continuar com essa abordagem era simplesmente
uma perda de tempo.
“...Antes de entrarmos nisso, os senhores não acham que permitir que ela trabalhasse
com ferimentos tão graves é bastante problemático aos olhos da nação? Não existem leis
contra isso também?”
“As condições em nosso estabelecimento são mais duras que a maioria. É inevitável so-
frer lesões. Considere que o trabalho em minas e afins também inclui os riscos ocupaci-
onais. É a mesma coisa.”
“...Só um pouco?”
Staffan suspirou. Sua atitude era típica de quando alguém lidava com tolos.
“...Então, poderia me dizer quem são os responsáveis que lidam com problemas deste
tipo?”
“...Hm, eu poderia dizer, mas há alguns problemazinhos nisso. Infelizmente, enfiar o na-
riz nos negócios dos outros só vai render-lhe ressentimento.”
“...Bem, poderia me fazer o favor de esperar até que eu mesmo encontre os responsá-
veis?”
Staffan sorriu maldosamente, como se dissesse: “Eu estava esperando que dissesse isso.”
“...Ah, se dependesse apenas de mim, não teria problema, mas o negócio já entrou com
processo, tecnicamente eu já deveria prendê-lo e começar as investigações. Estou de
mãos atadas quanto a isso.”
“...Isso é uma soma e tanto. Como chegou a este valor? Quanto ela faz um dia e como
exatamente é calculado?”
“Espere um pouco—”
“Ah é, quase me esqueci. Como eu já fiz um relatório, será preciso pagar para destruí-lo
também, mesmo que o problema seja resolvido debaixo dos panos.”
“...Assim sendo?”
“Hm?”
“Como poderia? Ouça, meu caro. Se chegar em acordo com a outra parte, significará que
não comprou uma escrava. Em outras palavras, as despesas de comprá-la como escrava
são anuladas. Imagine que foi vítima de um golpe e perdeu dinheiro.”
E pensar que eles realmente esperariam que Sebas assumisse que havia perdido 100
moedas de ouro. Com toda a probabilidade, a maior parte do dinheiro já havia cami-
nhado de mansinho para seus bolsos.
Quando notou isso, Sebas percebeu a profundidade de seu erro. Ele permitiu que per-
cebessem o quanto Tsuare significava para ele.
“Claro, faz sentido. Se ela morrer, terá que nos ressarcir pelo valor dela como nossa
funcionária. Mas enquanto ela se recupera, o que me diz de nos emprestar a dama da
casa?”
Havia visível luxúria no largo sorriso do rosto gordo de Staffan. Ele estava certamente
imaginando o ato de despir Solution dos pés à cabeça.
Era provável que Succulent não falasse sério, mas era certo que ele pressionaria o ata-
que se mostrasse alguma fraqueza. Para o infortúnio de Sebas ao expor seu apego à Tsu-
are, ainda existia a possibilidade de que a situação se deteriorasse ainda mais.
“...Por acaso não tem medo desses seus desejos te colocarem em problemas?”
Sebas pensou. Ele olhou para Staffan sem dizer uma única palavra.
“O que insinuando? Eu apenas sigo a lei, mais do que tudo, prezo para manter a lei apro-
vada pela gloriosa Princesa Renner! Como se atreve a chamar isso de desejo!? Mostre
algum respeito, homem!”
Quando Succulent disse, Staffan se acalmou imediatamente. Sua raiva havia desapare-
cido como se nunca estivesse de fato estado ali, um claro sinal de que foi apenas uma
tática de intimidação, não uma raiva genuína.
“Perfeitamente bem.”
Com isso, Sebas os levou para a porta principal. Ao despachá-los, Succulent — que ficara
até o final — sorriu para Sebas e deixou escapar algumas palavras:
“Ainda assim, tenho que agradecer àquela vagabunda. Pensar que um pedaço de lixo
poderia realmente se transformar em uma galinha dos ovos de ouro.”
Sebas olhou para eles, como se a porta fosse transparente. Não havia expressão parti-
cular no rosto de Sebas. Ele parecia tão calmo como sempre. No entanto, havia uma emo-
ção distinta em seus olhos.
A raiva.
—Não, a palavra “raiva” era muito branda para descrever como ele se sentia.
A mensagem de despedida de Succulent foi honesta, porque ele tinha certeza de que
Sebas estava no seu limite e não tinha para onde ir — sua vitória estava garantida.
Solution saiu das sombras em resposta à voz de Sebas. Ela tinha se fundido nas sombras
com habilidades vindas de sua profissão de assassino.
Sebas não pôde responder à pergunta de imediato. Ao ver isso, Solution olhou friamente
para ele.
“Se eu expor uma fraqueza, eles tentarão capitalizar até tirarem cada moeda. Eles são
tipinhos assim. Creio que entregar a Tsuare não irá resolver o problema. Mais ao ponto,
o problema real é o quanto eles descobriram enquanto nos investigavam. Nós entramos
na Capital Real como comerciantes, mas se eles investigarem mais a fundo, perceberão
a verdade— descobrirão nosso disfarce.”
♦♦♦
Solution assistiu em silêncio, olhando para as costas de Sebas quando este se distanciou.
Nada disso teria acontecido se ele não tivesse resgatado aquela humana. Dito isto, era
tarde demais para lamúrias. A questão era o que fariam agora.
Como subordinada de Sebas, ela não podia simplesmente ignorar suas instruções, mas
sentia que deixar as coisas fluírem só levaria a um resultado pior.
Se nossa irmãzinha pudesse sair... se eu pudesse agir como uma Pleiade, não teríamos esse
problema agora.
Ela estava desconcertada. Ela nunca tinha sido tão hesitante em sua vida.
Algo se projetava dela, como se estivesse flutuando na água. Era um pergaminho que
havia armazenado dentro de seu corpo. Originalmente havia sido dado a ela para comu-
nicação em caso de emergência — embora, graças aos esforços de Demiurge, agora havia
uma maneira de fabricar pergaminhos de baixo nível. Ainda assim, Solution não foi in-
formada disso e então acreditava que esse pergaminho deveria ser usado apenas em
uma situação terrível — e Solution acreditava tal situação se qualificava como tal.
Ela abriu o pergaminho e ativou a magia dentro dele. Uma vez usado, o pergaminho
desintegrava-se e os resto caiam no chão como pó, momentos depois, até mesmo o pó
desaparecia.
“É o senhor, Ainz-sama?”
『Solution— hm? O que aconteceu? Para estar me contatando, isso significa que houve
uma emergência?』
“Sim.”
Solution ficou em silêncio por um momento. Ela havia parado por causa de sua lealdade
a Sebas e porque havia considerado a possibilidade de estar errada. No entanto, sua le-
aldade a Ainz estava acima de tudo.
Além disso, eles deveriam considerar beneficiar os 41 Seres Supremos em cada movi-
mento que fizessem. Contudo, tudo o que Sebas tinha feito até agora poderia ter violado
esse preceito. Assim, ela decidiu deixar a decisão nas mãos de seu mestre e disse:
『Quê!? ...Ah? ...Não, como isso... Grhum... Não faça estes tipos de brincadeiras, Solution.
Está proibida de acusar os outros sem provas... ou tem alguma prova?』
fadiga acumulada de Brain o atingiu toda de uma vez, assim, ele dormiu
A
por quase um dia inteiro ao entrar na casa de Gazef. Ele acordou para co-
mer um pouco e depois voltou para a cama.
Ele não queria admitir, mas a casa de Gazef era um lugar que ele podia se
sentir seguro. Ele sabia que mesmo seu rival Gazef não poderia suportar um único golpe
daquela Vampira chamada Shalltear, mas a casa de seu antigo inimigo era agora o lugar
mais seguro do mundo. Sua tensão agora estava aliviada, o que permitia que dormisse
profundamente.
Ele abriu os olhos, mas os raios penetrantes fizeram com que ele fechasse os olhos no-
vamente. Ele estendeu a mão para bloquear a luz do sol.
“Este é o quarto que o Capitão Guerreiro do Reino usa pra receber convidados?”
Enquanto Brain olhava ao redor, ele deixou algumas palavras sem som saírem de seus
lábios, a falta de pessoas o deixava à vontade. Então, ele se esticou e suas articulações
emitiram ruídos, agora o corpo rígido relaxava e o sangue circulava mais uma vez.
“...Será que o pessoal dele passava as noites aqui? Devem ter ficado desapontados.”
A razão pela qual a realeza e a nobreza levaram vidas tão luxuosas não era simples-
mente porque gostavam disso. Mas também pela vaidade; para proteger sua imagem.
Da mesma forma, quando os homens vissem o estilo de vida opulento de seu líder, isso
estimularia seu desejo de fazer um nome para si e lhes dar motivação.
Murmurou Brain. Então ele bufou; mas foi dirigido a si mesmo e não a Gazef.
Enquanto Brain pensava naquele poderoso monstro, ele percebeu que não conseguia
parar os tremores em sua mão.
“Como eu pensava...”
O terror abissal que se agarrava ao seu coração ainda não havia sido removido.
Shalltear Bloodfallen.
Um ser de poder absoluto, alguém que até mesmo Brain — que havia abandonado tudo
em prol de aprimorar suas habilidades com espadas — não poderia se equiparar. Ela era
um monstro entre monstros; ainda assim, alguém cuja aparência era a soma total de toda
a beleza do mundo. Ela era alguém que exercia o poder verdadeiro.
Uma emoção de medo perfurava seu coração com a mera lembrança de seu semblante.
Ele havia vivido em constante terror da perseguição daquele monstro e, assim que che-
gou à estrada para a Capital Real, não havia dormido nem descansado, apenas ficou fu-
gindo para salvar sua vida. O espectro de seu algoz, Shalltear, aparecia diante dele
quando dormia, e a noite pareceu desnorteá-lo enquanto corria pelas estradas. Esma-
gado sob essa inquietação, ele não conseguira ter uma boa noite de sono. Tudo o que ele
podia fazer era correr como se não houvesse mais nada no mundo para ele.
Ele havia escolhido fugir para a Capital Real porque acreditava que poderia se mesclar
entre as massas de pessoas e despistá-la de seu rastro. No entanto, ele não pensava no
pesado custo que sua exaustiva fuga lhe causaria, ou a falta de autopreservação que se
desenvolvera como resultado.
“Melhor eu ir arar alguma terra... acho que só restou isso pra mim.”
Quando estava prestes a zombar de si mesmo, Brain sentiu alguém do lado de fora.
A porta se abriu e Gazef entrou no quarto. Ele estava totalmente equipado em sua pa-
nóplia.
“Você dormiu bastante. Fiquei até assustado de como o seu sono estava pesado.”
“Não se preocupe com isso. Agora eu preciso ir ao Palácio. Mas quando eu voltar, vamos
conversar sobre o que aconteceu.”
“Mesmo assim, tenho que ouvir. Eu acho que será melhor beber um pouco nessa con-
versa, vai aliviar o clima... Sinta-se em casa, fique à vontade. Se ficar com fome é só pedir
a criadagem, eles cozinharão alguma coisa. E se quiser sair... tem algum dinheiro?”
“...Não. Mas... se eu precisar de alguma coisa, posso vender meus itens mágicos.”
Ele havia comprado esses itens para derrotar Gazef. Agora que sabia que não havia sen-
tido em fazê-lo, que significado havia para valorizar essas bugigangas?
“Esses itens custam caro, é difícil achar um comprador. Dificil até achar alguém com
tanto dinheiro passeando por aí. Aqui, use isso.”
Parte 2
Sebas passeava sem pressa enquanto ponderava sobre como lidar com as cinco pessoas
que o seguiam desde que saíra de casa. Ele acreditava que exercitar seu corpo aumenta-
ria seu humor e o ajudaria a pensar em uma boa idéia.
Logo, ele viu uma multidão de pessoas ocupando a estrada frente a ele.
O som que vinha deles era algo entre o praguejar maldoso e o riso zombeteiro, acom-
panhado pelo som de algo batendo em alguma coisa. Gritos ao longo das palavras de “Ele
vai morrer” e “Melhor chamar os guardas” era ouvido.
A multidão bloqueava sua linha de visão, mas ele estava certo de que algum tipo de
violência estava em andamento.
Sebas pensou que talvez devesse mudar de direção e seguir por outro caminho. Ele he-
sitou por um momento — e então continuou em frente.
“Com licença.”
Sebas passou pelos espectadores com essas palavras e alcançou o centro da multidão.
A visão de um homem idoso movendo-se com uma elegância bizarra e fluída chocou e
enervou os espectadores, uma das pessoas que vira Sebas passando ficara bastante sur-
presa.
Parecia haver alguém tentando chegar ao coração da multidão, além de Sebas. A dita
pessoa disse: “Com licença”, mas não conseguiu avançar e ficou presa, incapaz de avançar
ou recuar.
Sebas entrou no centro da congregação sem dificuldade, e lá ele viu o que estava acon-
tecendo com seus próprios olhos.
“Este lugar parecia um pouco barulhento, então vim dar uma olhada.”
Os homens rapidamente cercaram Sebas. Quando eles deixaram suas posições originais,
revelaram o objeto que estavam chutando todo esse tempo. Parecia um menino. Ele es-
tava em posição fetal no chão, seu rosto estava sangrando. Não ficou claro se o sangue
vinha de sua boca ou nariz.
Aparentemente, o menino desmaiou depois de ser brutalizado por tanto tempo, mas
ainda parecia estar respirando.
Sebas olhou para os homens. O cheiro de álcool emanava de suas bocas e corpos. Seus
rostos estavam vermelhos, mas não do esforço da atividade física.
Teriam eles perdido o controle de seus impulsos violentos por estarem bêbados?
“Eu não sei o porquê estão fazendo isso, mas não acham que é hora de parar?”
“Hah!? Este pivete sujou minha camisa de comida! Por que eu ia deixar ele se safar?”
Um dos homens apontou para um ponto em sua camisa. Parecia uma mancha. No en-
tanto, as roupas do homem estavam muito mais sujas do que a extensão da mancha.
Sendo esse o caso, a mancha dificilmente era notada.
Sebas olhou para aquele que parecia ser o chefe dos cinco baderneiros. A diferença
pode ter sido muito sutil para um ser humano comum detectar, mas Sebas — que tinha
as percepções sensoriais aguçadas de um guerreiro — foi capaz de selecioná-lo.
“Como é!?”
Sebas falou como se tivesse acabado de confirmar algo que observara de longe. Os ho-
mens pensaram que ele os banalizou e fez ruídos de desagrado.
“...Sumam daqui.”
O chefe deles ficou vermelho de raiva e cerrou o punho e— caiu desmaiado no chão.
Sons de choque vieram de todos ao seu redor, incluindo os quatro homens restantes.
O que Sebas fizera foi bastante simples. Ele puramente havia fechado a mão e golpeado
o queixo do homem — embora a uma velocidade que meros humanos não eram capazes
de notar. Isso deu ao homem uma concussão cerebral em alta velocidade. Ele também
poderia ter enviado o homem aos céus com sua velocidade inimaginável, mas isso não
serviria para assustar os outros. Assim, ele havia retido o poder de seu golpe.
Sua calma e força cortaram a intoxicação pasma dos homens. Eles deram vários passos
e fizeram um pedido de desculpas.
Sebas pensou, vocês estão se desculpando com a pessoa errada, mas não disse.
Na situação que estava, ele deveria estar lidando com outro problema. Só um idiota pe-
garia mais problemas para si mesmo em um momento como esse. Se ele não agisse sem
pensar, ainda assim ele teria acabado nesse estado precário?
Esse pensamento cruzou a mente de Sebas, mas ele ainda se dirigiu para o menino. Ele
tocou as costas do garoto imóvel e infundiu um pouco de ki nele. Canalizar seu ki com
mais potência provavelmente curaria todas as suas feridas imediatamente, mas isso cha-
maria muita atenção.
Assim, Sebas fez o mínimo necessário, e então apontou para alguém que encontrou seus
olhos.
O homem que Sebas ordenou assentiu, e então Sebas se aproximou. Ele não precisou
empurrar a multidão, porque eles se afastaram quando ele deu um passo à frente.
Sebas continuou em frente mais uma vez. Em pouco tempo, ele sentiu que o número de
presenças que o seguiam aumentara.
Eles pareciam ser homens crescidos pelo som de seus passos e seu ritmo, mas ele não
tinha idéia de quem eram.
“Não consigo pensar em uma resposta. Mesmo assim... será melhor se eu aprender algo
sobre isso primeiro.”
Sebas virou uma esquina em uma região pouco iluminada. Seus seguidores permanece-
ram em seu rastro.
Eles não haviam escondido os sons de seus passos. Eles não tinham a capacidade de
fazê-lo, ou havia algum outro motivo? Ele decidiu não pensar muito a respeito. Afinal,
ele poderia verificar a verdade depois de capturá-los. Sebas decidiu fazer sua jogada uma
vez que não podia mais sentir a presença de outras pessoas ao seu redor.
Só então, uma voz rouca — mas jovem — veio de uma das pessoas que o seguiam.
“—Desculpe incomodar.”
Parte 3
Ele pensava no treino que havia feito com Gazef naquela manhã, repassando a luta em
sua mente várias vezes e considerando como lutar mais habilmente. Quais táticas vou
tentar se tiver outra chance, ele pensava.
Os sons de uma discussão vinham do centro do grupo, e não soava como uma briga
comum.
O guarda saltou de susto, dado que alguém o chamou por trás, e ele se virou e deu de
cara com Climb.
O homem usava cota de malha e carregava uma lança. Ele usava uma túnica estampada
com o brasão do Reino em cima da cota. Este era o uniforme padrão da guarda comum
no Reino, mas Climb podia sentir que nenhuma das pessoas à sua frente era bem trei-
nada.
Para começar, nenhum deles havia aperfeiçoado o físico. Na verdade, nem mesmo fize-
ram a barba e suas cotas de malha não tinham sido polidas. Um leve ar de sujeira pairava
sobre eles e pareciam bastante desleixados na aparência geral.
“E você é...?”
Climb era mais jovem do que ele, então o guarda respondeu a ele com um tom que era
uma mistura de perplexidade e aborrecimento.
A confusão se espalhou pelo rosto do guarda quando ele ouviu a voz firme e insistente
de Climb. Talvez fosse porque ele irradiava uma aura de superioridade apesar de ser
mais jovem que eles.
Os guardas pareciam ter concluído que não podiam errar, assumindo uma postura sub-
missa, e se endireitaram.
Climb resistiu à vontade de puni-los dizendo que já sabia disso. Ao contrário dos guar-
das do Palácio, os guardas que patrulhavam a cidade eram retirados da população civil
e não eram bem treinados. Na verdade, eram meros civis que sabiam usar armas.
Climb moveu os olhos dos guardas nervosos para a multidão. Seria mais rápido resolver
o assunto pessoalmente do que esperar que eles fizessem alguma coisa.
Sem esperar por sua resposta, Climb firmou sua determinação e foi para a multidão,
forçando seu corpo em meios as massas. Havia espaços entre cada pessoa, mas ele foi
incapaz de passar pelo meio. Não, na verdade o normal seria não ser capaz de fazê-lo.
Ele quase foi jogado para trás, mas ele lutou para abrir seu caminho para frente. Foi
quando ele ouviu uma voz do centro da multidão.
“...Sumam daqui.”
Esses baderneiros não ficaram satisfeitos com espancar seja lá quem fosse; agora que-
riam atacar um homem velho também.
Um dos homens — aquele que parecia mais musculoso — cerrou o punho. Comparado
a ele, o velho parecia muito inferior, seja na resistência de seus corpos, na protuberância
de seus músculos ou em sua brutalidade sanguinária. Certamente o homem mais jovem
poderia facilmente nocautear o velho com apenas um soco. As pessoas ao redor deles
perceberam isso e ofegaram horrorizados com a tragédia que estava prestes a acontecer
com o velho.
Em meio a tudo isso, apenas Climb sentiu que algo estava fora de lugar.
De fato, o homem mais jovem parecia mais forte. No entanto, Climb podia sentir uma
aura de poder absoluto vindo do velho.
Parece que o velho deu um soco e atingiu o outro homem no queixo, a uma velocidade
incrível. Mesmo a visão aguçada de Climb mal conseguiu acompanhar a rapidez do golpe.
A combinação de seu exterior inescrutável e seu tom calmo rompeu a embriaguez dos
homens. Não — até mesmo as pessoas ao redor tinham se assustado com sua presença.
Os homens perderam toda a vontade de lutar.
Ele parecia uma lâmina magistral. Era uma visão que encheria qualquer guerreiro que
a visse com reverência. Não é de admirar que ele ficasse imóvel.
O velho tateou as costas do menino caído, como se estivesse examinando suas feridas,
e então ordenou a um transeunte que levasse o menino ao tratamento antes de se afastar.
A multidão abriu um caminho para o velho homem. Os olhos de todos estavam fixos nas
costas dele, tal era o fascínio por sua presença.
Climb correu até o garoto caído e tirou a poção que Gazef lhe dera depois da sessão de
treinamento.
Climb abriu a garrafa e despejou o líquido no corpo do menino. Muitas pessoas acredi-
tavam que as poções tinham que ser bebidas, mas o fato era que funcionaria mesmo
quando derramadas na pele. A praticidade da magia era sem igual.
A pele do menino pareceu absorver o líquido e a cor retornou ao rosto até então pálido.
Quando a multidão percebeu que Climb acabara de usar um item caro como aquela po-
ção, eles ficaram tão impressionados com ele quanto com a habilidade sobrenatural do
velho.
Climb não se arrependeu de usá-la. Tendo tomado os impostos do povo, era natural que
ele — como alguém que vivia dos impostos — os protegesse e mantivesse a ordem pú-
blica. Ele sentiu que deveria ser capaz de fazer algo assim, mesmo que não pudesse de-
fender o povo.
O menino deveria estar bem agora que Climb lhe dera a poção, mas seria melhor que
ele fosse ao templo apenas por segurança. Ele olhou para os guardas e notou que a dupla
se tornara um trio. Aparentemente alguém chegou atrasado.
“Alguém o agrediu. Eu já usei uma poção de cura nele, mas espero que você o leve ao
templo, por precaução.”
“Sim. Entendido!”
Depois de deixar a bagunça para os guardas limparem, Climb concluiu que não havia
mais nada que pudesse fazer aqui. Como soldado designado para o Palácio, seria melhor
não interferir nos assuntos de outros lugares.
“Posso deixar em suas mãos o dever de questionar qualquer testemunha ocular sobre
os detalhes do que aconteceu aqui?”
“Entendido.”
Climb observou que os guardas pareciam ter ganhado confiança, eles moveram rapida-
mente ao receber suas ordens. Então Climb avançou em silêncio.
Ele queria chamá-lo, mas estava sem coragem para fazê-lo. Isso porque sentia uma pa-
rede invisível entre eles; uma sensação de um poder incrível que parecia esmagá-lo.
O velho virou uma esquina e se dirigiu para uma região mais escura. Climb continuou
seguindo. Ele estava andando atrás do velho, mas não ousou falar nem se dirigir a sua
pessoa.
Climb começou a se sentir incomodado com o que estava fazendo. Mesmo que ele não
soubesse como abordar o velho, ele não poderia continuar seguindo-o assim. Em um es-
forço para mudar a situação, Climb continuou seguindo em silêncio.
Uma vez que entraram em um beco vazio, Climb respirou fundo várias vezes, como se
ele fosse um menino se preparando para confessar seu amor. Então convocou sua cora-
gem e disse:
“—Desculpe incomodar.”
Seu cabelo era branco, assim como a barba. No entanto, suas costas estavam retas, como
uma obra-prima, uma lâmina forjada de aço. Seu rosto bonito estava enrugado, dando
uma expressão gentil às suas feições, mas seus olhos estavam aguçados e fixos em sua
presa, como os de uma águia.
A voz parecia um pouco envelhecida, mas transbordava com uma vitalidade inegável.
Climb sentiu uma pressão invisível rolando em sua direção e engoliu em seco.
“Ah, ah—”
Climb não conseguia falar, tal era a aura de opressão que a presença do velho homem
emitia. Ao ver isso, o velho pareceu relaxar e a tensão de seu corpo dissipou.
“...Me chamo Climb, sou um humilde soldado desta nação. Obrigado por sua ação cora-
josa em completar uma tarefa que deveria ser minha por dever.”
“Por favor, espere. Na verdade... bem, isso é um pouco embaraçoso, mas eu tenho se-
guido o senhor por um tempo porque tenho um pedido. Eu sei que pode parecer que
estou cobiçando mais do que posso ter, e o senhor tem todo o direito de rir de mim, mas
se não se importar, o senhor poderia me ensinar a técnica que usou agora a pouco?”
“...Como assim?”
“Ah. Tenho estudado as Artes Marciais há muito tempo e gostaria de melhorar ainda
mais minhas habilidades. Depois que eu vi aquele seu movimento impecável, eu estava
esperando que o senhor pudesse me ensinar um pouco da sua técnica, se não for incô-
modo.”
Climb estendeu as mãos e o velho examinou cuidadosamente suas palmas. Isso fez
Climb se sentir um pouco desajeitado. O velho virou as mãos, olhou para as unhas e as-
sentiu em satisfação.
O peito de Climb esquentou quando ele ouviu o elogio. A alegria em seu coração era
muito parecida com a que ele sentiu quando Gazef em pessoa o elogiou.
“Eu não acho que precise ser tão humilde... Posso ver sua espada?”
O velho aceitou a espada e inspecionou o cabo. Então ele voltou seu olhar afiado para a
lâmina da espada.
Climb olhou para onde o velho estava apontando. Com certeza, parte da lâmina havia
sido danificada; provavelmente por causa de cortes errados feitos durante o treino.
Climb sabia que suas habilidades precisavam de mais refinamento, de modo que ele era
quase um neurótico para cuidar de suas armas, a fim de melhorar suas chances de vitória.
Ou pelo menos, achava que tinha sido... até agora.
“Não se preocupe. Eu acho que tenho uma noção da pessoa que é. Para um guerreiro, a
arma é como um espelho que reflete sua personalidade. Você é um homem muito admi-
rável.”
As pontas das orelhas de Climb ainda estavam quentes quando ele levantou a cabeça
para olhar o velho.
Assim que Climb estava prestes a oferecer seus agradecimentos, o velho o interrompeu
e continuou falando.
“Tenho um assunto sobre o qual gostaria de sua opinião. Você disse que era um soldado,
correto? Bem, há vários dias, eu salvei uma garota—”
Ele não podia esconder seu descontentamento com o fato de que as leis de manumissão
de escravos de Renner haviam sido mal utilizadas de tal maneira, e que as coisas não
haviam mudado até agora.
As leis do Reino proibiam o comércio de escravos. Dito isto, era comum que as pessoas
fossem forçadas a trabalhar em condições precárias para pagar suas dívidas. Lacunas
As leis da Renner-sama foram inúteis. Esse pensamento arrepiante percorreu sua mente
por um momento, no entanto, ele logo o afugentou. Agora, ele tinha que pensar sobre a
situação de Sebas.
Sebas estava em uma posição muito ruim. Talvez se pudessem investigar o contrato da
garota, eles poderiam virar a maré a seu favor, mas Climb não achava que a oposição não
teria se preparado para essa eventualidade.
Se este assunto fosse para os tribunais, uma coisa era certa, Sebas perderia.
Seus adversários provavelmente não haviam entrado com um processo porque sentiam
que poderiam extorquir mais dinheiro dessa maneira.
Climb só conhecia uma dessas pessoas — sua mestra. Ele podia dizer com toda confi-
ança que nenhum nobre era mais correto e digno de confiança do que ela.
Dado que essas pessoas poderiam ir tão longe, elas certamente devem ter conexões de
longo alcance com aqueles no poder. Qualquer nobre envolvido com eles era certo de
ser influente. Se a Princesa — que era afiliada à Facção Real — tentasse investigar ou
enviar ajuda e assim danificasse um membro da Facção Nobre, poderia desencadear
uma guerra total entre os dois lados.
Ele não podia pedir que Renner fizesse algo que separasse o país.
Essa foi a conclusão que ele havia chegado enquanto conversava com Lakyus e as outras.
Foi por isso que Climb não disse nada — ou melhor, ele não podia dizer nada.
Não havia como saber como ele conseguira captar o tumulto interno de Climb, mas es-
sas palavras tiveram um impacto palpável em Climb.
“Sua suserana pode fazê-lo? ...Isso significa que ela poderia se abrigar lá também?”
“...Peço perdão, Sebas-sama. Preciso esclarecer isso também com minha suserana. Mas
saiba que ela possui um grande coração. Eu não acho que vai haver problemas!”
“Oh... Sua suserana deve ser uma pessoa incrível já que a considera com tanto respeito.”
Climb assentiu profundamente em resposta a Sebas. De fato, não havia mestra mais
aclamada do que Renner.
“Vamos para outro tópico. O que aconteceria se houvesse evidência de que esse bordel
violou a lei? Por exemplo, se estivessem comprovadamente envolvidos no tráfico de es-
cravos. Essa evidência seria destruída também?”
“A possibilidade existe, mas uma vez que a informação relevante seja levada às autori-
dades competentes... bem, espero que o Reino ainda não tenha se deteriorado até esse
ponto.”
“...Compreendo. Então, peço que me responda só mais essa pergunta. Por que quer se
tornar mais forte?”
“Eh?”
Climb grunhiu. Isso era de se esperar, dado que essa mudança de tópico foi mais drás-
tica do que a anterior.
“Bem, acabou de dizer que queria que eu o treinasse. Eu acredito em seus motivos, mas
também gostaria de saber o porquê deseja se tornar mais forte.”
Climb já foi uma criança abandonada. Ele nem mesmo tinha visto os rostos de seus pais.
Essa não era uma ocorrência incomum no Reino. Órfãos morrendo na sarjeta faziam
parte do cotidiano.
Quando criança, ele só sentia admiração. Mas à medida que envelhecia, um sentimento
dentro dele tornou-se cada vez mais inabalável.
—Amor.
Era um milagre, dos tipos que os bardos cantavam nas sagas heroicas. E pensar que algo
assim poderia acontecer na vida real. Assim como nenhum homem poderia tocar o sol,
Climb não seria capaz de alcançá-la. Aliás, mesmo se pudesse, ele não deveria.
A mulher que Climb amava com cada fibra de seu ser estava destinada a ser a noiva de
outro. Como princesa, ela não poderia pertencer a alguém como Climb, cujas origens in-
certas o faziam ser menos influente que um plebeu.
Se o Rei falecesse, o Primeiro Príncipe herdaria o trono e Renner se casaria com um dos
Grandes Nobres. Com toda a probabilidade, o Príncipe já havia organizado algo do tipo.
Ela até mesmo poderia ser enviada a outro país como parte de um casamento político.
O fato de que Renner — que estava em idade de casar — ainda era solteira e não tinha
nenhum noivo era um tanto surpreendente.
O tempo que passavam juntos se tornara tão precioso que ele pagaria qualquer preço
para deter a marcha do tempo, só para que ele pudesse preservar esses momentos dou-
rados para sempre. Se ele não gastasse seu tempo treinando, ele poderia aproveitar mais.
Mas Climb não tinha talento. Ele era apenas um homem. Através do treino repetidas
vezes, ele se tornou bastante forte para um mero soldado. Então, ele não deveria se con-
tentar com isso? Ele não deveria parar de treinar, ficar do lado de Renner e não perder
seu breve tempo juntos?
Climb admirava aquele brilho dourado como o sol. Isso não era mentira, ou algo que
dizia para se enganar. Era o desejo sincero de Climb.
Contudo—
Climb sorriu.
Este era o desejo fraco de um jovem, mas ao mesmo tempo era um desejo que se encai-
xava perfeitamente a um jovem.
Ele queria se tornar um homem digno de ficar perto da mulher que admirava, mesmo
que sua união nunca pudesse ser concretizada.
Ele podia suportar sua vida sem amigos, seu treinamento intenso e trabalho tiravam
seu sono, pois eram alimentados por seu desejo.
Afinal, eles não conseguiam entender como se sentia, a menos que realmente amassem
alguém.
♦♦♦
Sebas estreitou os olhos enquanto estudava Climb. Havia um olhar severo em seu rosto,
como se ele estivesse tentando decifrar as sutilezas ocultas da resposta simples de Climb.
Assim que Climb estava prestes a oferecer seus agradecimentos, a mão estendida de
Sebas o deteve.
“Entretanto, espero que perdoe minha franqueza, mas você não tem talento. O treina-
mento adequado levará muito tempo. Entretanto, não tenho esse tempo. Eu gostaria de
treiná-lo de uma forma que mostrará resultados rapidamente, mas será um processo
hercúleo.”
Os instintos de Climb disseram isso a ele. Climb não temia a morte, mas se fosse para
morrer, ele queria que fosse por Renner. Não queria jogar sua vida fora por uma razão
egoísta.
Ele não era um covarde— não, talvez tivesse uma parte muito covarde.
Climb engoliu mais uma vez e ficou imóvel. O silêncio encheu o ambiente por um tempo,
e ele podia até ouvir o clamor ao longe.
“Se vai morrer ou não, dependerá da sua atitude... se há algo importante para você, algo
que lhe faz querer viver, mesmo que seja apenas para dar-lhe um chão a qual pisar, então
ficará bem.”
Essa pergunta surgiu na mente de Climb, mas essa não era a questão agora. Ele ponde-
rou o significado das palavras de Sebas, certificou-se de que ele entendeu e então deu
sua resposta.
Isso porque Climb sempre teria sua razão, uma que o manteria agarrado à vida, mesmo
que tivesse que fazê-lo rastejando como um verme.
Sebas olhou nos olhos de Climb, como se adivinhasse suas intenções. Então assentiu
com entusiasmo.
“Bem aqui?”
“Sim. Será rápido. Alguns minutos bastam. Por favor, saque sua espada.”
Climb sacou a espada como solicitado. Seu coração era uma mistura de inquietação e
confusão sobre o desconhecido, com débeis fundamentos de curiosidade e expectativa.
Climb segurou sua arma em uma posição intermediária, os olhos de Sebas estavam fixos
nele.
E no momento seguinte—
Essa sede de sangue era forte o bastante para esmagar o coração de Climb em um ins-
tante, parecia quase tangível quando o banhou como um tsunami. Em algum lugar dis-
tante, ele podia ouvir o grito de uma alma sendo pulverizada. Estava perto e longe ao
mesmo tempo, e talvez o clamor pudesse ser de sua própria alma.
Quando o fluxo obsidiana da intenção assassina o tomou, Climb sentiu sua consciência
lentamente desvanecer-se no branco infinito. Este terror esmagador fez seu corpo que-
rer abandonar as amarras da mente, ele foi levado pela onda que o inundava.
“...É só isso que ser um homem significa para você? Foi apenas um aquecimento.”
O significado dessas palavras perfurara Climb mais fundo que qualquer lâmina. Até o
fez esquecer o medo diante dele por um momento.
Ele estava apavorado. Ele queria correr. Mas lutou contra o desejo de fazê-lo, mesmo
quando as lágrimas escorriam por suas bochechas. Suas mãos tremiam quando segura-
ram sua espada, e a ponta de sua espada movia como uma abelha confusa intoxicada de
fumaça. Sua camisa cota de malha fazia ruídos de seus tremores de corpo inteiro.
Mesmo assim, Climb cerrou os dentes e tentou resistir ao terror mortal que vinha de
Sebas.
Ele então puxou o punho para trás, como se estivesse fazendo um arco.
Climb entendeu o que ia acontecer e balançou a cabeça. Claro, Sebas não deu atenção à
sua resposta.
O punho de Sebas rasgou o ar com um whoosh, como uma flecha disparada com toda a
força.
A marcha do tempo pareceu desacelerar, pelo menos assim os instintos de Climb en-
tenderam. A imagem de sua morte certa dominou sua mente, como uma enorme bola de
demolição que várias ordens de grandeza maior do que ele, aproximando-se a velocida-
des incríveis. Mesmo que levantasse a espada para bloquear, aquele punho certamente
a esmagaria facilmente.
Se ele não pudesse morrer por Renner, então por que não havia morrido naquele dia
álgido? Ele deveria ter congelado até a morte durante aquela chuva e desapegado do seu
corpo mortal na solidão.
Dizia-se que à beira da morte, as pessoas veriam suas vidas passarem diante de seus
olhos como as animações de um zootropo. A opinião comum era que o intelecto do indi-
víduo procuraria desesperadamente pelos eventos passados de sua vida tentando achar
uma maneira de escapar de sua situação atual. No entanto, foi um tanto risível que a
última coisa que Climb se deparou foi com o sorriso de sua amada princesa.
Quando ela o salvou, a jovem Renner não sorriu. Quando ela começou a sorrir para ele?
Ele não conseguia lembrar. Contudo, ele se lembrava vividamente do sorriso singelo de
Renner naquela época.
Ela a recolheu de sua vida descartada na sarjeta. Isso significava que sua vida não era
mais sua. Ele vivia para Renner... para conceder alegria a ela, por mais minúsculo que
fosse—
A paixão explosiva dentro dele estraçalhou as correntes de medo que o mantinham pri-
sioneiro.
Seus sentidos foram levados ao seu limite, até o ponto em que ele podia sentir os leves
movimentos das partículas no ar.
A marcha do tempo acelerava rapidamente, mas Climb percebeu que seus próprios mo-
vimentos eram tão lentos quanto o escorrer do melaço. Mesmo preso às amarras de sua
lentidão, ele se virou, tentando se mover.
E então—
“—”
Climb — respirando pesadamente — olhou para Sebas, como se sua alma tivesse sido
roubada. Não havia hostilidade em torno de Sebas, como se tivesse sido nada mais que
uma mentira. Ele relaxou quando começou a perceber a intenção de Sebas.
Climb desabou como uma marionete cujos cordéis foram cortados, como se não mais
suportasse a intenção assassina de instantes atrás.
Ele caiu de quatro no beco, era como um faminto, ofegando ar fresco em seus pulmões.
“...Felizmente você não morreu de choque. Essas coisas acontecem quando alguém está
tão certo da sua morte que desiste da vontade de viver.”
Havia um gosto amargo nas profundezas da garganta de Climb. Ele estava certo de que
era o gosto da morte.
“Se você repetir isso mais algumas vezes, tenho certeza de que será capaz de superar o
medo comum aos vivos. No entanto, não se esqueça que o medo desencadeia o instinto
de sobrevivência. Se ficar entorpecido a essa sensação, então será incapaz de sentir um
perigo mesmo se estiver na sua frente. Você precisa ser capaz de dizer claramente
quando uma verdadeira ameaça se aproxima.”
“Sou simplesmente um homem velho que confia nas habilidades que tem. Por ora é isso.”
Ele era provavelmente um ser maior do que Gazef, o mais poderoso guerreiro das na-
ções vizinhas.
—Climb quis que sua curiosidade fosse saciada. Ele achava que seria melhor não conti-
nuar investigando esse mistério.
Mesmo assim, de onde esse cavalheiro, Sebas, veio? Essa era a única questão que ardia
em seu coração. Ele até se perguntou:
“—E-espere! Por favor, espere! Eu, eu tenho algo para perguntar a vocês dois.”
Parte 4
Ele olhou para trás e pensou no retorno, e assim memorizou a aparência externa da
casa. Sua memória estava confusa dado a quase o estado hipotérmico quando Gazef o
trouxe para cá, de modo que suas lembranças de dias atrás estavam nebulosas.
Ele conhecia o endereço de Gazef pois planejava desafiar o homem para um duelo al-
gum dia. No entanto, essa informação foi coletada de boca a boca, então era um pouco
imprecisa.
Ele execrou as informações que o informante lhe dissera, então inspecionou cuidado-
samente a casa.
Era muito menor do que as residências nobres, parecia mais a moradia de um plebeu.
Porém, era mais do que suficiente para Gazef e o casal de caseiros que moravam com ele.
Ele não se opunha a idéia de sair vagando até desaparecer em algum lugar. Na verdade,
tal pensamento ainda era bastante atraente.
Ele procurou em si mesmo o que deveria fazer em seguida, mas encontrou apenas um
vazio no coração. Seu objetivo foi destruído e totalmente aniquilado, sem deixar vestí-
gios para trás.
Ele olhou para a mão direita, que ainda segurava sua Katana. Ele ainda usava a camisa
de cota de malha por baixo das roupas.
Foi o medo que manteve a espada na mão durante sua jornada à Capital Real. Ele sabia
que sua lâmina era inútil contra aquele monstro que poderia defletir seus melhores ata-
ques com a unha do dedo mindinho, mas ficar desarmado continuava assustando-o.
Sendo esse o caso, por que ele ainda estava segurando sua espada? Ele poderia tê-la
deixado na casa de Gazef. Foi porque ele ainda estava com medo?
Nesse caso, por que ele estava segurando sua Katana? No fim, a resposta não veio.
Enquanto caminhava, Brain recordou a primeira vez que ele veio para a Capital Real.
Alguns edifícios permaneceram os mesmos, como a Guilda dos Magistas ou o Palácio
Real, mas havia muitos edifícios novos que estavam ausentes de suas memórias. En-
quanto Brain saboreava a diferença entre suas memórias e a realidade, ele notou um
alvoroço à sua frente.
Brain estava prestes a ignorar e ir para outro lugar quando um homem velho chamou
sua atenção. O velho entrou na multidão, como se estivesse deslizando entre as massas.
Talvez até mesmo Brain não fosse capaz de se mover como o velho. Era uma técnica
digna de alguma divindade, que exigia uma compreensão aguda da vontade de sua con-
traparte, ou neste caso, os fluxos de força e movimento de toda a multidão.
Brain empurrou os outros para fora do caminho, e quando chegou ao centro, ele viu o
instante em que o velho atingiu o queixo de um homem mais jovem.
Quê? Eu... eu conseguiria bloquear esse golpe? Seria difícil... eu acho. Ele distraiu a atenção
daquele outro? Será que estou imaginando coisas? Mas aquilo foi um golpe incrível. É algo
digno de estar num tomo...
Ele grunhiu para si mesmo enquanto relembrava o soco que acabara de ver em sua
mente.
Era certo que ele não tinha conseguido analisar completamente, e era muito difícil com-
parar espadachins e pugilistas na mesma escala. Mesmo assim, esse breve vislumbre fez
com que Brain percebesse que o velho diante dele era incrivelmente habilidoso.
Por tudo o que sabia, aquele velho podia até ser mais forte que ele mesmo.
Brain mordeu o lábio inferior enquanto comparava o perfil do rosto do velho à lista de
expoentes marciais em sua memória. No entanto, ele não encontrou nenhum que fosse
correspondente.
Seus instintos lhe disseram que o velho homem tinha olhos na parte de trás da cabeça,
então não se atreveu a segui-lo diretamente. No entanto, se seguisse o jovem, ele não
teria que se preocupar em ser visto. Analisando por outro ângulo, ele ainda estaria se-
guro, mesmo que o menino fosse descoberto.
Enquanto os seguia, Brain sentiu várias outras presenças. Todavia, Brain não se impor-
tou.
Os dois falaram perto do ponto de virada de um beco. Assim, Brain se escondeu na curva
e os espionou.
Até parece... Um velho desse porte nunca aceitaria um pirralho como discípulo.
Se alguém fosse comparar os dois, o menino seria uma pedrinha, enquanto o velho era
uma rocha gigantesca. Os dois viviam em mundos completamente diferentes.
...Que triste. Não saber o quanto é inferior a alguém. Desista logo, garoto.
Essas palavras foram dirigidas ao menino, mas também foram uma crítica sincera de
um tolo que já se considerou invencível — indubitavelmente, seu eu passado.
Ele continuou ouvindo — embora não tivesse interesse em fofoca — e ao que pareceu,
o velho estava disposto a treinar o jovem. Brain não tinha idéia do que aquele garoto
tinha a oferecer ao ponto de interessar àquele incrível homem.
Fala sério... Eu já julguei mal alguém de novo? Não, não pode ser. Esse garoto tem pouca
habilidade como guerreiro. É certo que ele não tem talento algum!
Como o velho o treinaria? Ele só podia ouvi-los daqui, mas não conseguia ver o que
estava acontecendo. Curioso, Brain escondeu sua presença e se apressou para espioná-
los. Mas antes que ele soubesse—
Parecia um enorme carnívoro aproximando sua bocarra sedenta por sangue, exalando
seu hálito por todo o corpo. A torrente de intenção assassina tingia o mundo de uma cor
diferente. Ele não conseguia nem piscar, muito menos se mexer. Por um momento, ele
pensou que seu coração havia parado de bater.
S-se eu já fiquei assim. Aquele moleque então, será que ele... morreu?
Brain se arrastou pelo chão, nervosamente ansiando ver os dois. O que ele viu o chocou
até o cerne, a ponto de ele esquecer seu medo por um momento.
Suas pernas tremiam como as de Brain. Mas ele ainda estava de pé.
Como isso é possível? Como esse pirralho sem talento ainda tá em pé!?
Brain não conseguia entender por que o jovem ainda podia ficar de pé enquanto o medo
reduzia suas pernas a uma poça de geleia trêmula.
Ele tinha algum tipo de item mágico ou Arte Marcial que resistisse ao medo? Ou era
algum Talento?
Claro, não havia como garantir que ele não possuísse tal item. No entanto, seus instintos
lhe disseram que nenhum dos itens acima se aplicava quando ele olhou para o garoto de
pé, mesmo todo trêmulo. A resposta era difícil de acreditar, mas seria a única possível.
O garoto parecia ter tido algum treinamento, mas não tinha muitos músculos. Depois
de observar o modo como o garoto se movia enquanto o seguia, Brain concluiu que o
garoto levava algum jeito para a coisa, mas nem tanto assim. E ainda assim, esse garoto
comum estava em pé, enquanto ele estava se arrastando no chão.
Brain sabia que estava chorando, mas não conseguiu enxugar as lágrimas.
Brain se apoiou no chão e tentou se obrigar a ficar de pé. Porém, o tsunami mortífero o
deixara imóvel. Suas pernas se recusaram a mover, como se estivessem sob o controle
de outra pessoa. Tudo o que ele podia fazer era levantar a cabeça e observar os dois.
O garoto ainda poderia ficar de pé contra aquele velho e sua onda de intenção assassina.
Mesmo aquelas costas esguias pareciam longe demais para ele alcançar.
“Eu sou...”
Quando a onda de sede de sangue se dispersou como névoa, ele conseguiu se pôr de pé.
Esse fato frustrou Brain.
O velho e o menino pareciam que treinariam mais, mas Brain não conseguia mais se
conter. Reunindo coragem, ele saiu correndo da esquina e gritou:
“—Espere! Por favor, espere! Eu, eu tenho algo para perguntar a vocês dois.”
O jovem se virou quando ouviu aquele grito desesperado. Seus ombros estremeceram
e houve uma expressão de surpresa no rosto. Em sua posição, Brain provavelmente teria
feito o mesmo.
“Primeiramente, por favor, me peço que me desculpem. E-eu não podia esperar mais.”
Os dois olhares suspeitos para ele, mas Brain já esperava algo assim.
“Por favor, permitam que este que vos fala diga como se chama. Este que vos fala se
chama Brain Unglaus. Por favor, este que vos fala sabe que isso foi muito rude e reza que
seja perdoado. Este que vos fala realmente sente muito por isso.”
Depois de esperar por um tempo suficientemente longo para transmitir sua sinceridade,
Brain levantou a cabeça e sentiu que a cautela com relação a ele havia diminuído um
pouco.
Quando viu a dúvida nos olhos do garoto, Brain perguntou mais uma vez, como se esti-
vesse tossindo sangue.
Seus olhos se abriram. Ele tipicamente fingia um olhar sem vida, mas essa pequena mu-
dança indicava uma enorme agitação emocional dentro dele.
“Só queria saber... Aquilo foi mais do que a maioria das pessoas é capaz de suportar.
Mesmo eu... perdão, mesmo este que vos fala não poderia suportar aquilo. Mas você se
provou diferente. Suportou aquilo de pé. Encarou de peito aberto. Como fez aquilo?
Como conseguiu?”
Sua excitação o fez repetir-se, mas ele não podia reprimir. Quando confrontado com o
poder esmagador de Shalltear Bloodfallen, ele tivera tanto medo que fugiu. No entanto,
esse garoto havia enfrentado o mesmo grau de intenção assassina e se manteve firme.
Ele queria saber qual era a diferença entre eles.
Brain parecia ter transmitido toda sua sinceridade para o garoto. Climb estava confuso,
mas considerou cuidadosamente o assunto antes de responder:
“...Eu não sei. Não entendo muito bem. Não tenho idéia de como pude suportar aquela
tempestade sedenta por sangue. Ainda assim, talvez... talvez tenha sido porque eu estava
pensando em minha suserana.”
“...Sua suserana?”
“Sim. Enquanto eu pensar na grande pessoa a quem sirvo, terei forças para continuar.”
Como alguém pode se manter de pé apenas por isso, Brain quase gritou. Mas antes disso,
o velho explicou calmamente seu significado.
Brain não pôde acreditar. Seu objetivo, a coisa que ele não abandonaria — era sua sede
por se tornar mais forte. Mas isso era algo que ele não mais sentia. Esse sonho tinha sido
facilmente destruído, e tudo que o restou foi fugir com medo.
O rosto de Brain ficou sombrio, ele abaixou a cabeça olhando para o chão. Então, as
próximas palavras do velho o fizeram levantar a cabeça novamente.
“...Algo construído por si mesmo é frágil. Pois quando cair, será seu fim. Não confie em
si mesmo para tudo. Se puder construir sua confiança com outra pessoa e se doar para
os outros, então você não cairá mesmo se sofrer um revés.”
Ele não conseguia pensar em nada. Isso porque ele havia abandonado todo o resto, ex-
ceto sua busca pela esgrima. Poderia ser que as coisas que ele havia descartado em sua
busca por força fossem realmente as coisas mais importantes?
Ele riu de sua vida cheia de erros. Nem ele pôde evitar a reclamação amarga que depois
escapou dele.
“Vai ficar tudo bem. Mesmo alguém sem talento como eu conseguiu fazê-lo. Alguém
como o senhor pode certamente fazer isso também, Unglaus-san! Definitivamente não é
tarde demais!”
Não havia base para as palavras do jovem. No entanto, por mais estranho que pareça,
suas palavras aqueceram o coração de Brain.
Brain tinha presumido que garoto corajoso diante dele era um mero pirralho e com isso
o desprezou.
“Ah, sim. Disse que se chamava Brain Unglaus... é o mesmo Brain Unglaus que lutou com
o Stronoff-sama no torneio que teve tempos atrás?”
“Ah, não. Eu ouvi dos outros. Stronoff-sama disse que era um incrível espadachim, e que
estava no caminho para ser o homem mais forte do Reino. Depois de ver seus movimen-
tos e sua calma, agora percebo a verdade das palavras de Stronoff-sama!”
Inundado pela sinceridade da boa vontade de Climb, Brain se esforçou para balbuciar
uma resposta.
“...Er, obrigado... muito obrigado. Eu sinto que tenho um longo caminho a percorrer,
mas... fico realmente grato que alguém como você me elogie.”
“Hm... Unglaus-san.”
“Senhor, por favor, me chame de Unglaus. Não há necessidade de usar qualquer hono-
rífico pra um perdedor como eu.”
“Nesse caso, eu sou Sebas Tian, mas espero que me chame de Sebas... Então, Unglaus-
kun.”
Ser endereçado como “-kun” envergonhou Brain um pouco, mas dada a diferença em
suas idades, tal termo era apropriado.
“Mas você não ia treinar ele— perdão. Sebas-sama, o senhor não o treinaria? Creio que
interrompi enquanto estavam no meio de uma sessão...?”
“Certamente. Essa era a minha intenção original, mas parece que temos convidados. Eu
pretendia chamar eles— ah, chegaram. Creio que demoraram um pouco por estarem se
preparando para a batalha.”
Sebas olhou para o lado. Brain demorou um pouco mais para olhar na mesma direção.
Três homens se revelaram lentamente. Eles usavam cotas de malha e carregavam pu-
nhais afiados em mãos protegidas por luvas de couro reforçado.
“Nem pensar! Eles querem vir depois de sentirem aquela sede de sangue? Quão forte
esses caras são!?”
Se fosse esse o caso, então cada um deles provavelmente estava no mesmo nível de
Brain — não, eles seriam mais fortes que ele. Poderia ser que suas habilidades de ignorar
tal fato fossem porque eram guerreiros treinados e não eram adeptos de seguir os ou-
tros?
“Eu confio que está ciente de que eu apenas a dirigi para vocês dois, não?”
“...Eh?”
“A intenção assassina dirigida ao Climb-kun foi para treiná-lo. No seu caso, foi porque
eu não sabia quem você era, e quis testá-lo. Me serviu bem para sentir sua vontade de
lutar, hostilidade e assim por diante. Mas aqueles senhores ali, eu os via como inimigos
desde o início, então não direcionei minha intenção assassina para eles. Seria ruim as-
sustá-los.”
Brain ficou chocado além da capacidade de expressar quando ouviu Sebas casualmente
explicar a surpreendente verdade. Ser capaz de controlar com precisão a intenção assas-
sina daquela intensidade estava além do que ele sabia ser possível.
“Eu posso adivinhar. Mas não tenho certeza. Por isso, desejo capturar um ou dois deles
para questionamento. Contudo—”
“Parece que eu acidentalmente envolvi vocês dois nisso. Posso incomodá-los a deixar
este lugar?”
“Antes disso, gostaria de fazer uma pergunta, se o senhor permitir. Eles são... crimino-
sos?”
“Talvez eu atrapalhe, mas quero lutar também. Como um homem que protege a ordem
pública da Capital Real, é meu dever defender o povo.”
Não é como se a gente tivesse certeza que o Sebas é o cara do bem aqui...
Pensou Brain para si mesmo, interpretando o advogado do diabo com essa declaração.
De fato, dada sua atitude honesta e objetiva, Sebas certamente parecia estar certo em
relação àquele bando. No entanto, eles não podiam ter certeza disso.
Até mesmo Brain poderia imediatamente concluir a quem ajudar, é claro que seria o
homem que salvou uma criança de um bando de baderneiros bêbados ao invés de um
bando de homens suspeitos.
“Assim, eu tenho quase certeza que o senhor não precisa de ajuda, mas... Sebas-sama.
Por favor, permita que eu... er, não é isso— por favor, permita que este quem lhe fala
ajude.”
Brain tomou o seu lugar ao lado de Climb. Sebas não precisava da ajuda deles. Na ver-
dade, ele até disse que seria melhor se fossem embora. No entanto, ele queria aprender
com Climb, alguém que lutava pelos outros. Ele queria escolher o caminho que o seu eu
passado nunca escolheria. Ele queria proteger o garoto cujo coração era forte, mas a es-
grima era fraca.
“Aquilo é, veneno... Usar punhais de dois gumes como aqueles deixa bem claro que de-
vem saber o que estão fazendo... são assassinos?”
Os punhais que estavam usando eram chamados de Rompe-Malha. Havia sulcos escul-
pidos no corpo das lâminas, refletiam um brilho oleoso de algum líquido desconhecido.
O fato de que esses homens pareciam priorizar agilidade e facilidade de movimento —
diferentemente dos espadachins profissionais — era uma indicação melhor da verdade
do que os murmúrios autodirigidos de Brain.
“Climb-kun, é melhor tomar cuidado. A menos que tenha um item mágico que resista a
veneno, não seja arranhado por aquilo mais de uma vez.”
Alguém com o nível de proeza física de Brain era praticamente imune ao veneno, mas
Climb poderia sucumbir a toxinas fortes.
Sebas deliberadamente levantou a voz alto o suficiente para que eles ouvissem, e os
movimentos dos homens congelaram. Eles tinham sido claramente abalados pela expo-
sição do seu plano de cerco.
“Por mim, tudo bem. Seria mais seguro derrotar os que estão na frente e depois os que
viessem por trás.
Parece que Brain compartilhava a opinião de Sebas. No entanto, o próprio Sebas rejei-
tou as palavras de Brain.
“Ah, mas isso abriria uma brecha para que fujam. Que tal isso— eu vou lidar com os três
na frente, os dois que virão na retaguarda, posso deixá-los para vocês?”
Brain acenou com cabeça, Climb também o fez. Esta luta pertencia a Sebas, e foram eles
dois que pediram a Sebas para participarem. Eles deveriam ouvir Sebas enquanto o ve-
lho homem não cometesse algum erro fatal.
Depois de dizer isso para Climb, Brain virou as costas para os homens. A razão pela qual
ousou abaixar a guarda foi porque Sebas estava por perto. Quando deixou a retaguarda
para Sebas, ele se sentiu tão seguro como se fosse defendido por uma densa muralha de
castelo.
“Bem, pode ser meio vergonhoso... mas por favor, permita-me ser o oponente dos— Ora,
por favor, não joguem nenhum projétil nesses dois, entendido?”
Olhando para trás, Brain viu Sebas com três punhais presos entre os dedos da mão di-
reita. Ele abriu a mão e os punhais que eles atiraram contra Brain e Climb, que estavam
vulneráveis, caíram no chão.
Que novidade. Qualquer um perderia a vontade de lutar depois de ver seus punhais serem
apanhados desse jeito. Vocês finalmente perceberam o quão poderoso o Sebas-sama é? Que
pena, descobriram isso tarde demais.
Eles estavam todos dançando na palma da mão do velho. Mesmo se dividissem os 3 não
seria de ajuda alguma.
“Surpreendente.”
“O Stronoff? Hm. Bem, aquele senhor é alguém que este... eu mesmo... foi mal, mas estou
acostumado a falar num tom mais informal. Mesmo que o Stronoff e eu juntássemos
força pra ir contra ele, ainda assim a gente perderia... oh, eles chegaram.”
Os outros dois homens deram a volta e apareceram atrás deles. Os dois estavam vesti-
dos da mesma maneira que os três primeiros.
O som de uma espada deixando a bainha veio do lado de Brain e, um momento depois,
Brain sacou sua própria lâmina.
“Preferiram tomar coragem pra sair do esconderijo em vez de jogar mais facas, pois
suas intenções foram descobertas.”
Depois de examinar seus movimentos, Brain sentiu que um deles era mais fraco do que
o outro e indicou para o jovem ao lado dele. O jovem assentiu e ergueu a espada. Seus
movimentos não hesitantes eram aqueles que só se podia encontrar em pessoas que ha-
viam lutado por suas vidas. Brain ficou aliviado pelo garoto não ser um recém-chegado
que nunca tinha lutado a sério.
O Climb-kun deve ter a vantagem, mas... o complicado é que o cara usa veneno, pode ser
uma vitória bem acirrada.
Mesmo que Climb tivesse experiência real de combate, Brain não sentia que ele era um
guerreiro banhado em sangue, ou que havia enfrentado usuários de veneno. Até onde
sabia, essa poderia ser sua primeira vez fazendo isso.
Até mesmo Brain passava maus bocados contra monstros que usavam ácidos corrosi-
vos ou venenos potentes. Quando os combatia, ele tornava-se excessivamente cauteloso
e não conseguia exercer toda a sua força.
Melhor matar esse cara o quanto antes pra ir ajudar ele? Serviria de algo? Ou será que
isso machucaria seu orgulho? Será que devo lutar contra os dois em seu nome? Ou o Sebas-
“Que seja. Vou te usar como sacrifício pra compensar o tempo perdido.”
♦♦♦
Três acertos.
Sebas entrou no alcance dos três homens, eles não puderam nem reagir, muito menos
se defenderem. Então Sebas socou três vezes e a luta acabou.
Mas é claro. Sebas ocupava o pináculo do poder de combate de Nazarick. Ele podia lidar
com assassinos desse calibre apenas com a ponta do dedo mindinho.
Brain havia dominado seu inimigo do começo ao fim, o que o deixou à vontade.
O assassino parecia estar procurando uma chance de fugir, mas Brain não o deu essa
oportunidade. Na verdade, ele até parecia estar brincando com seu oponente... não, isso
não era meramente uma brincadeira. Sebas sentiu que Brain estava passando por seu
repertório de movimentos para refazer suas habilidades enferrujadas.
Interessante, acho que o ouvi dizer algo sobre “compensar o tempo perdido”. Além disso,
ele parece estar preocupado com o Climb-kun. Assim, ele não está lutando a sério para
poder vir em seu auxílio a qualquer momento. Ele parece ser um bom sujeito.
A batalha estava em um vai e vem. O fato de seu adversário usar veneno o deixou um
pouco desconfortável, mas não parecia haver necessidade de resgatá-lo de imediato. Se-
bas se sentia desconfortável em envolver um estranho — particularmente alguém a
quem ele favorecia — em assuntos que só diziam respeito a si mesmo, mas—
Se ele não tivesse dito que queria se tornar mais forte, eu teria ido ajudá-lo. Uma luta pela
vida de alguém é uma boa prática. Mas eu vou ajudá-lo caso esteja em perigo.
Climb apunhalou reto, medindo a distância entre os dois. Ele notou que seu inimigo
estava recuando lentamente e não queria deixar o homem escapar.
O estilo de luta habitual de Climb era defender com o escudo e atacar simultaneamente
com a espada. Ser forçado a lutar apenas com a espada era uma experiência tortuosa. A
lâmina envenenada também o deixou muito nervoso. Rompe-Malhas eram armas espe-
cializadas em ataques perfurantes, então ele sabia que só precisava se preocupar com
estocadas. Mesmo assim, o fato de não poder se permitir ser atingido pela arma fazia
seus movimentos ficarem rijos.
Ele acalmou sua respiração, que estava em desordem por sua fadiga física e mental.
Ainda bem que não sou apenas eu. Esse cara parece cansado também.
A testa de seu inimigo estava coberta de suor. O homem usava sua agilidade para zom-
bar de seu inimigo, que era uma maneira de lutar verdadeiramente típica de assassinos.
Assim, ferir qualquer um de seus membros faria com que ele perdesse a vantagem e
perturbasse o equilíbrio do poder de luta.
Esta foi a fonte da tensão de ambas as partes. Claro, todas as batalhas uniformemente
combinadas eram assim, mas estava muito mais óbvio nesta luta.
“Huuuh!”
Com uma exalada forte, Climb golpeou em direção ao inimigo. O golpe não foi muito
rápido pois não colocou muita força. Isso porque se usasse muita força e o inimigo se
esquivasse, ele acabaria ficando com uma abertura fatal.
Um punhal veio voando diretamente para Climb, que por sua vez cortou através do ar
com sua espada.
Ele teve sorte. Ele conseguiria desviar desde que prestasse atenção.
No entanto, ainda não poderia respirar aliviado. O assassino já havia baixado sua pos-
tura e esgueirando-se para o alcance de um ataque.
Droga!
Ele não conseguiu evitar o ataque subsequente. Ele golpeou com muita força ao desviar
o punhal. Sua espada estava em uma posição ruim, era tarde demais para conseguir in-
terceptar seu inimigo. Ele pensou em fugir, mas a agilidade do assassino era superior à
sua.
Não havia mais nada a ser feito. Talvez ele pudesse usar o braço como escudo—
Assim que Climb decidiu o que faria, o assassino cambaleou para trás agarrando-se ao
rosto.
Parece que uma pedrinha do tamanho de um feijão atingiu o assassino logo acima do
olho esquerdo. As percepções de Climb, aumentadas pela situação perigosa, confirma-
ram esse fato.
Ele sabia quem havia jogado mesmo sem olhar para trás. A voz de Sebas atrás dele era
a melhor prova disso.
“O medo é uma emoção importante. Mas não deixe que ele o governe. Eu tenho o obser-
vado lutar e agora sinto que seu estilo de luta é simples e conservador. Se o seu inimigo
estivesse disposto a sacrificar um braço, você certamente estaria morto. Se suas habili-
dades físicas são inferiores às de seu oponente, então deve derrotá-lo com seu espírito.
A força de vontade de alguém pode às vezes superar a fraqueza da carne.”
Climb respondeu “sim, senhor” em seu coração e ficou surpreso ao se ver muito mais
relaxado. Não era como se dependesse dos elogios e observação de alguém para dar tudo
de si, mas ficou aliviado por saber que alguém o estava observando.
Claro, seu medo da morte não desapareceu completamente, mas mesmo assim...
“Se... se eu morrer, por favor, diga à Renner-sama... Sua Alteza... sobre a minha gloriosa
batalha.”
Climb sentiu um brilho nos olhos do assassino que era diferente de antes. Fazia pouco
tempo, mas nessa luta onde a vida e mortes estavam em jogo, ele, de algum modo, se
sentiu conectado com o espírito do assassino.
O assassino percebeu que Climb estava preparado para morrer e, com isso, decidiu co-
locar sua vida em risco também.
Ele deu um passo à frente sem dizer uma palavra, encurtando a distância em um único
movimento.
Ele até poderia ter entendido a velocidade de Climb. Porém não conhecia sua técnica.
Climb estava muito mais confiante neste ataque descendente. O golpe foi muito mais rá-
pido e forte que todos os outros movimentos dele.
O golpe no ombro foi interrompido pela cota de malha e, por isso, não cortou o homem
em dois. Entretanto, facilmente quebrou sua clavícula e esmagou sua carne junto com
sua omoplata.
O assassino desabou pesadamente no chão. Ele estava babando devido a dor intensa e
uivava em agonia.
“Magnífico.”
Com isso, o assassino ficou em silêncio, como uma marionete cujos cordéis foram cor-
tados. Ele deve ter desmaiado.
Pelo canto do olho, ele viu que Brain já tinha tomado conta do outro assassino. Ele ace-
nou casualmente para Climb celebrando a vitória.
“Então, vou começar o interrogatório. Se tiverem alguma dúvida, não hesitem em per-
guntar.”
Climb nunca tinha ouvido essa técnica antes, mas ele franziu a testa para o que o homem
estava dizendo.
Eles eram assassinos treinados pelo Seis Braços, os mais fortes combatentes da Oito
Dedos. Eles aparentemente seguiram Sebas para matá-lo. Brain perguntou a Climb:
“...Eu não sei muito a respeito, mas a Oito Dedos é aquela grande organização criminosa,
é isso? Acho que eles têm conexões com alguns mercenários...”
“Sim, e o Seis Braços é o mais assustador de todos. O nome Seis Braços refere-se aos
seis lutadores que compõem a força de combate mais forte da organização. Ouvi dizer
que cada um deles pode rivalizar com um aventureiro de ranque adamantite. Ainda as-
sim, não sei exatamente quem são essas seis pessoas, pois não tenho certeza sobre os
detalhes de sua organização.”
O homem passou a dizer que Succulent, aquele que visitou a casa de Sebas, era um mem-
bro do Seis Braços, conhecido como “Diabo das Ilusões”. Aparentemente, seu plano era
eliminar Sebas e depois tirar proveito da jovem senhorita, a quem ele servia.
Ao ouvir isso, Climb sentiu um vento frio passar por ele. A fonte desse frio era Sebas.
“Já me decidi. Primeiro, vou destruir o dito lugar problemático. Além disso, parece que
esse Succulent também estará lá, de acordo com este homem, é claro. É melhor apagar
as brasas, antes que as faíscas façam um incêndio.”
O fato dele ter declarado sua intenção de abrir caminho até o quartel-general inimigo
indicava que estava confiante em derrotar um aventureiro adamantite — em outras pa-
lavras, um homem cujo poder de luta estava no auge da realização humana.
Ele foi capaz de derrotar três assassinos habilidosos em um piscar de olhos, até mesmo o
renomado Unglaus-sama demonstra respeito a ele. Que tipo de homem o senhor é, Sebas-
sama? Será que é um aventureiro adamantite aposentado?
“...Também ouvi dizer que há outros cativos lá. Seria melhor ir o quanto antes.”
Sebas estava em uma situação em que o tempo não estava do seu lado, mas sim com o
inimigo.
“Irei imediatamente. Sinto muito, mas estou sem tempo. Posso incomodar vocês dois
para levarem esses assassinos para o posto de guarda mais próximo?”
“Por favor espere, Sebas-sama! Se o senhor não se importar, poderia me deixar... pode-
ria deixar este que lhe fala ajudá-lo? Claro, só se o senhor estiver disposto.”
“Eu também. Proteger a paz da Capital Real é meu dever como fiel servidor de Renner-
sama. Se os cidadãos do Reino estão sendo oprimidos, minha espada deve agir em seu
auxílio.”
“...Eu não acho que o Unglaus-kun tenha problema, mas pode ser um pouco perigoso
para você.”
“Climb-kun... Creio que o Sebas-sama acha que você pode atrapalhar, não? Embora, em
vista dele, eu também não passe de um peso morto.”
“Nada disso. Não foi isso que eu quis dizer. Apenas estou preocupado com você. Espero
que entenda que eu não posso protegê-lo como fiz agora a pouco.”
“...O que farei a seguir pode não trazer honra para você ou sua mestra, está ciente disso?
Sinto que haverá outras chances para provar seu valor em batalhas, você não acha?”
“Se eu ficar de braços cruzados só por causa do perigo, isso só prova que não mereço
servi-la. Assim como minha mestra salvou o povo comum, eu também gostaria de fazer
tudo o que puder para ajudar os que estão em apuros.”
“Que bom. Sendo assim, não há mais nada a ser dito. Conto com a ajuda de ambos.”
bordel fica logo atrás dessa porta. De acordo com o assassino, deve haver
“Faz sentido. As entradas também podem servir como rotas de fuga, e aquele cara disse
que é gerenciado por pelo menos duas pessoas. Já que vamos nos separar, devemos dei-
xar o senhor segurar a porta principal, Sebas-sama, enquanto Climb e este que vos fala,
ficamos encarregados da entrada. O que o senhor acha?”
“Eu também não tenho objeções. Ainda assim, o que faremos depois de entrarmos, Un-
glaus-sama? Vamos procurar juntos?”
“Me chame de Brain. Este quem lhe fala também pede humildemente que o senhor faça
o mesmo, Sebas-sama. Então... comumente, devemos nos mover em pares por ser mais
seguro, mas pode haver túneis secretos que nem o assassino ouviu falar. Devemos vas-
culhar o interior o mais rápido possível, enquanto o Sebas-sama faz seu ataque pela
frente. Além disso, geralmente há passagens que só o chefe sabe.”
“...Sim, já corremos muito risco só por entrar. Mas isso pode dar um resultado melhor.”
“Eu poderia pedir para o senhor procurar no interior, Ungl— Brain-sama? O senhor é
mais forte que eu, afinal de contas.”
Era mais provável encontrar inimigos ao vasculhar o interior do edifício. Ele assumiu a
tarefa que seria mais perigosa. Portanto, era melhor deixar para Brain, que era muito
mais forte que Climb.
Eles já haviam discutido esse assunto no caminho para o bordel, mas havia algumas
decisões que só podiam ser feitas depois de ver o lugar pessoalmente. Eles divulgariam
os detalhes aqui e ninguém contradiria a declaração de Sebas.
Sebas deu um passo à frente, movendo-se para a porta de metal de aparência sólida.
Climb nunca seria capaz de mover a porta, mas para Sebas era pouco mais que uma folha
de seda.
As defesas estavam fadadas a serem mais pesadas neste lugar, mas estavam preocupa-
dos com Sebas, que avançaria sozinho. Afinal de contas, o atacante era alguém que até
mesmo Gazef Stronoff — renomado como o mais poderoso guerreiro das nações vizi-
nhas — e Brain Unglaus — que poderia lutar no mesmo nível que Gazef — não poderia
esperar derrotar mesmo se unissem forças. Isso não estava mais dentro da esfera da
habilidade humana.
“Então vamos prosseguir. De acordo com o assassino, o sinal secreto na outra entrada
é bater quatro vezes na porta. Duvido que tenham esquecido, mas um lembrete não fará
mal algum.”
“Obrigado, Sebas-sama.”
Seus métodos eram perfeitamente sólidos. Ambos provavelmente teriam feito o mesmo
se estivessem no lugar de Sebas. Mesmo assim, uma emoção de medo perfurou suas cos-
tas, porque a expressão de Sebas e suas palavras fizeram parecer que ele tinha uma per-
sonalidade destoante de sua aparência.
Ele era um gentil cavalheiro e um guerreiro de sangue frio. Ele continha tanto a empatia
quanto antipatia dentro de si em forte disparidade.
Eles tiveram uma premonição de que se Sebas entrasse com esse sorriso, ele poderia
acabar matando todos que encontrasse.
“Eu sinto que algumas mortes serão inevitáveis, mas pode ser bom evitar mortes des-
necessárias. Somos poucos em número, afinal. Ainda assim, se o senhor encontrar al-
guém no comando que parece ser da Oito Dedos, posso incomodá-lo para tentar capturá-
“Eu não sou um assassino em massa e não vim aqui para um massacre. Por favor, relaxe.”
♦♦♦
Sebas achava que destruir esse bordel deveria acabar com a interferência deles em sua
vida. Se as coisas corressem bem e ele conseguisse obter documentos secretos ou algo
parecido, eles poderiam acabar ocupados demais lidando com as consequências em vez
de se preocupar com Tsuare.
No pior cenário, ele poderia dar à Tsuare uma chance de escapar nesse curto intervalo
de tempo que conseguiria comprar. E quem sabe, poderia surgir alguma outra solução
melhor.
“Há aquele comerciante em E-Rantel que se aproximou de mim para uma conversa cor-
dial. Me pergunto se ele poderia me ajudar?”
Mesmo que ela conseguisse se recompor, Tsuare ainda precisaria de alguém de confi-
ança para ajudá-la. Essa era a única maneira que ela teria uma vida melhor.
Sebas se virou para encarar a pesada porta de aço mais uma vez. Ele se lembrou daquele
dia em que Tsuare foi descartada enquanto tocava a superfície da porta. Era feita de ma-
deira e reforçada com placas de metal, tornando-a grossa e pesada. Ficou imediatamente
aparente que um ser humano comum teria muitos problemas para quebrá-la sem o uso
de ferramentas.
Ele não estava preocupado com o homem chamado Brain Unglaus. Mesmo que ele cru-
zasse lâminas com Succulent, dificilmente perderia. No entanto, Climb era um assunto
diferente. Não havia como Climb conseguir derrotar Succulent.
Tinha sido idéia de Sebas invadir o bordel, então Climb, como alguém que oferecera
ajuda, deveria estar preparado para sua própria morte. No entanto, Sebas não pôde dei-
xar de pensar que o jovem e compassivo que só queria ajudar acabaria perdendo a vida
por nada.
“Seria melhor se eu sozinho capturasse esse Succulent. Esse seria o curso mais ideal dos
eventos. Espero que não se encontrem com ele.”
Se Succulent fosse o lutador mais forte aqui, era muito provável que ele fosse colocado
contra Sebas. No entanto, se ele fosse um guarda-costas, ele poderia ser designado para
escoltar sua carga para a segurança.
“Eu não sou adepto de abrir fechaduras. Infelizmente não há como evitar. Terei que
fazer do meu jeito...”
Sebas murmurou para si um pouco frustrado. Depois abaixou sua postura e esticou a
mão direita até ficar como um fio de uma lâmina, e então moveu a mão esquerda para a
frente com o punho fechado enquanto se posicionava. Sua postura estava imaculada, tão
estável quanto as montanhas e tão pitoresca quanto um cedro de mil anos.
“Yeeart!”
Seu braço afundou na porta de metal, na dobradiça. Não parou por aí, o braço ainda
fazia ruídos de moagem enquanto perfurava o metal da porta.
Dentro havia uma passagem que terminava em duas portas duplas. Na frente estava um
homem corpulento e barbudo. Sua boca estava aberta e ele tinha um olhar retardado no
rosto.
“A porta estava enferrujada, então tive que usar um pouco de força para abri-la. Seria
bom lubrificar as dobradiças.”
Enquanto o homem ainda estava atônito em choque, Sebas entrou sem qualquer hesi-
tação.
No entanto, o homem que encarava Sebas não se incomodou com eles. Em vez disso, ele
se dirigiu a Sebas:
“...Er... B-bem-vindo?”
O homem sorriu para Sebas de uma maneira simpática, ignorando as perguntas a gritos
feitas por seus colegas na retaguarda. Seu instinto de sobrevivência dizia que a melhor
escolha seria agir com boa vontade para com Sebas. Ou não; talvez ele tivesse reagido
assim porque se enganara pensando que Sebas era o mordomo de um dos fregueses da-
qui.
Sebas sorriu em resposta. Um sorriso gentil e compassivo. No entanto, não havia ne-
nhum traço de boa vontade em seus olhos. Era mais como o brilho mortífero e fascinante
que reluzia ao longo do gume de uma espada afiada.
Um *Thump*. Ou melhor, era mais um *Splat*. Um som nauseante ecoou pelo interior.
Até agora a pouco, um homem musculoso de armadura estava à sua frente. Ele pesava
85 quilos no mínimo. Mas agora girava no ar como uma espécie de piada, voando para o
lado a velocidades invisíveis a olho nu. Seu corpo impactou violentamente contra a pa-
rede próxima e um som molhado, como lama jogada na parede, ressoou.
Depois de admoestar-se para não exagerar da próxima vez, Sebas passou pelo cadáver
e se dirigiu para dentro.
Ele abriu as portas e entrou além sala. Era uma sala requintadamente mobiliada. Pare-
cia mais que ele estava andando por uma casa vazia do que invadindo uma base inimiga.
Seus olhos se arregalaram e suas mandíbulas caíram enquanto olhavam para a cena
atrás de Sebas, para os enormes jorros de sangue que tinham pintado toda a parede de
vermelho.
Sebas examinou a informação que obteve de Tsuare e do assassino, depois tentou des-
cobrir a estrutura do edifício. Suas lembranças eram nebulosas e ela não se lembrava de
nada importante, mas dissera a Sebas que o verdadeiro estabelecimento estava locali-
zado no subsolo. O assassino não havia ido no subsolo, então sua informação a partir
daqui seria imprecisa.
Ele olhou para o chão. No entanto, o alçapão que levava ao subsolo estava astuciosa-
mente oculto, e Sebas não conseguiu encontrá-lo.
Ainda assim, se ele não pudesse encontrá-lo, então tudo o que tinha que fazer era per-
guntar a alguém que sabia onde estava.
“Hiiiiieee!”
O homem a quem ele se dirigiu respondeu imediatamente com um grito rouco. Parece
que ele não tinha intenção de lutar.
Isso aliviou Sebas. Sempre que pensava em Tsuare, ele não conseguia controlar seus
punhos, e acabava matando sua oposição em um único golpe.
Já que ele não tinha intenção de lutar, quebrar as duas pernas deveria ser o suficiente.
“Haiiiiiiieeeee!”
O outro homem desabou no chão. Seus olhos pareciam ter virado para trás, então tudo
que podia ser visto eram suas escleras. Aparentemente, a pressão extrema exercida por
Sebas foi demais e com isso ele desmaiou. O outro homem olhou para ele com inveja.
“Ah... Como eu estava dizendo, gostaria de fazer uma pergunta. Como tal— eu gostaria
de ir ao subsolo. Poderia me dizer como chegar lá?”
“...M-mas, mas...”
O homem estava com muito medo de trair sua organização. Sebas podia ver o medo em
seus olhos. Muito parecido com aqueles assassinos, este homem parecia ter medo de
represálias de sua organização. Sebas recordou o homem que ele conheceu naquela
noite e como ele fugiu com o dinheiro de Sebas. A retribuição em questão provavelmente
era sinônimo de “morte”.
O homem ainda estava hesitando em falar ou não quando Sebas cortou sua relutância
com suas próximas palavras.
“Há duas pessoas que podem falar aqui. Eu não necessariamente tenho que perguntar
a você, entendeu?”
A testa do homem era como uma represa de suor oleoso e suas costas estremeceram.
Sebas olhou para onde o homem havia indicado. Olhando mais de perto, havia uma pe-
quena fresta no chão, separando parte do chão do resto.
Sebas sorriu e o homem percebeu que aconteceria com ele depois daquelas palavras.
Seu rosto perdeu a cor e sua tremedeira parecia sem fim. Ainda assim, se agarrou a uma
fraca esperança e clamou:
“Mas eu te disse, né? Por favor! Eu faço qualquer coisa, tenha piedade!”
“Tá... Tá de sacanagem!?”
“Você pode tomar as coisas por esse lado, se quiser. Porém, o resultado ainda será o
mesmo, não?”
“...Oh... Deus...”
Que direito os vilões tinham de pedir ajuda aos deuses? Mais precisamente, os deuses
de Sebas eram os 41 Seres Supremos. O argumento do homem era como um insulto para
eles.
Suas palavras, tão frias e duras como aço, pulverizaram toda a esperança e fizeram o
homem consciente de sua própria morte.
Ele escolheria lutar ou escolheria fugir? Dado apenas um instante para decidir, o ho-
mem escolheu imediatamente — ele escolheu fugir.
Ele encontraria um destino indescritível se ousasse combater Sebas, isso era óbvio.
Nesse caso, ele poderia fugir. Fazer isso lhe daria uma fraca possibilidade de sobrevivên-
cia.
Ao fazer isso, ele prolongou sua vida por alguns segundos... ou melhor, alguns décimos
de segundo.
Um momento depois, o corpo sem cabeça do homem lançou um gêiser de sangue de seu
pescoço, cobrindo o chão com o líquido carmesim.
Essa técnica foi praticamente divina. Apenas a façanha de decapitar alguém com um
chute circular teria exigido força e velocidade incríveis, mas o mais impressionante foi
que os sapatos de Sebas estavam imaculados, sem mancha alguma.
Sebas, com seus sapatos imaculados, foi em direção ao outro homem inconsciente. Ele
levantou a perna e a bateu com força. Houve um som como galhos secos quebrando. O
homem se contraiu várias vezes e então seu corpo ficou imóvel.
“...Apenas lembre-se de tudo que fez até agora, verá que é um destino justo, não? Espero
que encontrem a paz. Seus corpos serão usados para pequenas compensações por seus
pecados.”
Seu plano era mutilar os cadáveres e organizá-los nos degraus como um aviso para as-
sustar qualquer um que pretendesse fugir pelas escadas e deixá-los incapazes de avan-
çar ou recuar. Sebas faria isso, já que não seria bom destruir a saída.
“Entendo... se eu destruir esta escadaria, eles não poderão escapar por aqui.”
♦♦♦
A única mobília neste quarto quase vazio era um armário e uma cama.
O colchão não era um simples costurado com palha, mas um verdadeiro colchão de al-
godão. Era bem feito, do tipo que casas nobres poderiam usar. No entanto, este colchão
foi projetado para funcionalidade e por isso parecia simples, sem qualquer decoração.
Sua aparência originalmente era, na melhor das hipóteses, mediana, mas graças aos
quilos ganhos de fartos banquetes o tornara muito mais feio. Independentemente de
onde olhasse, ele parecia um porco.
Aliás, os porcos eram animais inteligentes e fofos que amavam a limpeza. A palavra
“porco”, neste caso, era um termo depreciativo usado para descrever pessoas estúpidas,
grosseiras e imundas.
♦♦♦
“Uhhh...”
Ele levantou lentamente o punho, cujos nós dos dedos estavam agora manchados de
sangue.
Ela estava tentando proteger o rosto com as mãos até agora, mas agora seus braços
estavam murchos na cama. Seu cabelo se espalhava bagunçado no colchão, como se flu-
tuasse na água.
O colchão rangia com cada pancada de seu punho contra a carne. A pele já inchada da
mulher se partiu, manchando os dedos de Staffan com sangue. O sangue espalhado gru-
dou no colchão, coagulando em manchas de carmim.
“...Uuuh...”
A mulher não se debateu mais, apesar do espancamento. Não houve resposta de seu
corpo.
Uma rodada de socos sem parar como essa era capaz de matar. Entretanto, a mulher
havia sobrevivido, mas não porque Staffan foi misericordioso. A mulher se agarrava à
vida porque o colchão havia dissipado a força dos golpes. Se ela tivesse sido espancada
deitada em uma cama mais dura, poderia estar morta agora.
Staffan tinha sido brutal, mas não por saber desse efeito do colchão. Pelo contrário, foi
porque a morte da mulher não o preocupava. Pois apenas pagaria uma quantia e tudo
seria resolvido.
Na verdade, Staffan havia espancado várias mulheres até a morte neste lugar.
Claro, ele precisava pagar pela limpeza toda vez que matava alguém, o que era incô-
modo para sua carteira. Assim, ele inconscientemente não usou toda a força que queria.
Quando olhou sedento para o rosto imóvel da mulher, Staffan lambeu os lábios.
Este bordel era perfeito para satisfazer fetiches sexuais peculiares. Bordéis normais
não permitiriam que seus clientes fizessem tais coisas. Bem, talvez eles pudessem, mas
Staffan não sabia de nenhum desses lugares.
No entanto, os escravos tinham sido o único caminho para alguém como Staffan — com
suas preferências sexuais — satisfazer seus desejos. Sem eles, Staffan tinha sido forçado
Não havia dúvida de que ele teria cometido um crime e teria sido preso.
Staffan estava praticamente lacrimejando em gratidão ao seu nobre mestre, que lhe re-
comendara este lugar. Naturalmente, era para que ele pudesse usar seu poder para o
benefício de seu mestre.
Um olhar de alívio veio sobre os olhos de Staffan. Era difícil imaginar que ele pudesse
ser tão grato ao seu suserano, dada sua personalidade e suas inclinações sexuais.
Contudo—
As brasas de uma chama ardiam nas profundezas de sua pelve — as chamas da ira.
Essa emoção foi dirigida a mulher que o privou de escravos para satisfazer suas luxúrias.
“—Aquela puta!”
Seu rosto ficou vermelho de raiva e seus olhos ficaram com os capilares inchados de
sangue.
Ele afundou a mulher abaixo dele na cama com soco após soco.
Seu punho atingiu a bochecha e uma quantidade surpreendente de sangue jorrou entre
os lábios inchados da mulher. Talvez ela tivesse cortado o interior de sua boca com a
carne sendo impactada contra seus dentes.
“—Huu... huu...”
Depois de mais alguns golpes, Staffan ficou ofegante e seus ombros subiram e desceram.
Seu corpo e testa estavam escorregadios de suor.
Nada lhe agradava mais do que estuprar uma mulher espancada e ensanguentada.
Quanto mais bonita fosse, melhor. Não havia melhor maneira de satisfazer seus desejos
sádicos do que destruir algo bonito.
Staffan pensou nos traços arrogantes que pertenciam à jovem milady da casa que ele
acabara de visitar. Ela era tão bonita quanto à Princesa, que era conhecida como a mu-
lher mais bela do Reino.
Claro, Staffan estava muito consciente que não teria a chance de abusar de uma dama
da alta classe. As únicas pessoas com quem Staffan podia satisfazer seus fetiches eram
nesses resíduos humanos que haviam sido despejados no bordel. Só serviam para serem
usadas e depois descartadas.
Uma mulher tão bonita certamente seria comprada por um rico e poderoso nobre por
uma quantia enorme. Ela então seria levada para o seu domínio e viveria em isolamento,
a fim de evitar que sua venda se tornasse de conhecimento público.
“Como eu gostaria de poder espancar uma mulher dessas— espancá-la até a morte.”
Staffan olhou para a mulher esmagada abaixo dele. Seu peito nu estava se movendo
ligeiramente. Ele sorriu lascivamente quando confirmou esse fato.
Staffan se abaixou para agarrar os seios da mulher, deformando a carne macia entre os
dedos.
A mulher não reagiu. Ela estava à beira da morte e não pôde responder a essa dor trivial.
A mulher que Staffan estava espremendo diferia de uma boneca apenas pela suavidade
de seu corpo.
“Me salve!”
“Tenha piedade!”
Ele deveria ter fodido essa puta enquanto ela ainda tinha forças?
Staffan continuou espremendo seus seios, com uma vaga sensação de arrependimento
em seu coração.
A maioria das mulheres que foram enviadas para esse bordel não estava mais em sã
consciência. Elas escolheram fugir da realidade. Quando alguém levava isso em conside-
ração, a mulher escolhida para servir Staffan hoje foi melhor do que a maioria.
Staffan imaginou Tsuare. Ele não tinha interesse no que aconteceu com a funcionária
do bordel que fôra descartada.
No entanto, quando ele pensou no mordomo que encontrou durante a sua visita, Staffan
não pôde reprimir o riso zombeteiro em seu coração.
Aquela coisa já havia sido usada tantas vezes que nem dava para contar, por homens,
mulheres e até não-humanos. Não havia sentido em protegê-la. E, ainda assim, aquele
velho mordomo dissera que estava disposto a pagar centenas de moedas de ouro por ela.
O verdadeiro milagre foi Staffan não cair em gargalhada lá mesmo.
Ele procurou através de suas memórias e se lembrou de seus lamentos. Ela tinha sido
bastante normal pelos padrões das garotas enviadas para esse bordel.
Staffan sorriu lascivamente e começou a saciar sua luxúria bestial. Ele agarrou uma das
pernas nuas da mulher imobilizada e a abriu bem. Sua perna magra e emaciada era ma-
gra o suficiente para que Staffan pudesse envolvê-la com uma mão.
Assim, ele agarrou sua ferramenta, agora firme e pulsante com o desejo ardente que
consumia seu corpo e—
“Huh!?”
As solas dos sapatos do velho — Sebas — ecoaram nitidamente quando ele entrou na
sala. Staffan ficou sem palavras diante de seus movimentos naturais e casuais.
O que o mordomo daquela casa estava fazendo aqui? Por que ele veio a este quarto? A
mente de Staffan ficou em branco diante dessa situação inexplicável.
Sebas foi até Staffan. Ao se aproximar, ele viu a mulher esmagada sob o peso do homem.
“Ah!”
Um *thwap* ressoou nos ouvidos de Staffan, e então sua visão tremeu descontrolada-
mente.
Uma batida depois, a bochecha direita de Staffan ardia pela dor latejante que o preen-
chia.
Ele tinha sido atingido— não, neste caso, seria mais apropriado dizer que ele havia sido
esbofeteado. Demorou um pouco, mas Staffan finalmente se deu conta.
Um outro *thwap* ressoou no rosto de Staffan. Logo foi seguido por muitos mais.
“Bhare—!”
Staffan sempre foi quem bateu nos outros. Ninguém jamais bateu nele. Esses poucos
golpes o deixaram em lágrimas.
Ele levantou a mão para proteger seu rosto enquanto tropeçava para trás.
“Nhão vaish she safar dishoo! Idhiota! Qhuem bensa que euh souh!?”
Ele gostava de usar a violência, mas sempre usava nos mais fracos. Mesmo que Sebas
parecesse ser apenas um idoso qualquer, Staffan não ousou levantar a mão para ele. Era
covarde a tal ponto que só faria o seu movimento quando estivesse absolutamente certo
de que sua vítima não poderia revidar.
Talvez tivesse percebido a natureza covarde de Staffan, mas Sebas perdeu o interesse
por ele e olhou de volta para a garota.
“Que trágico...”
Ele reuniria todos neste lugar para ensinar a esse velho uma dolorosa lição. Como Sebas
se atreveu a atacar alguém assim!? Ele não maneiraria na lição por ele ser um velho.
Staffan se certificaria de que ele ficasse cheio de dor e medo.
A mestra do mordomo teria que assumir a responsabilidade pelos erros de seu servo.
Ele a faria suportar o fardo da dor que o velho lhe causara. Staffan ensinaria aquele velho
o quão perigoso era o vespeiro que ele tinha perturbado.
De relance, havia várias portas em ambos os lados. Era natural que ninguém lhe res-
pondesse. Este lugar atendia clientes com gostos exóticos — perigosos, na verdade. As-
sim, todos os quartos eram acusticamente isolados.
Mesmo assim, não havia como os funcionários não terem ouvido seu grito.
Ele tinha visto vários deles quando foi para o quarto de antes. Cada um era corpulento
com músculos volumosos. Como poderia um homem velho como Sebas se comparar a
eles?
Virando-se para trás, Staffan viu Sebas parado serenamente atrás dele.
“...Havia três que pareciam empregados do térreo e mais dez no subsolo. Havia outros
sete como você.”
Staffan ficou totalmente chocado. Impossível, ele pensou, mas o silêncio dentro do bor-
del provava a verdade das palavras de Sebas.
“Enfim, não acho que haja necessidade de poupar sua vida. Sendo esse o caso, por favor,
morra.”
Sebas não sacou uma espada nem preparou qualquer tipo de arma. Ele simplesmente
caminhou até Staffan em silêncio, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Essa
indiferença só serviu para assustar Staffan ainda mais, porque ele sabia que Sebas real-
mente o queria morto.
“Esphere! Esbhereee!! O qwê qbuer... uh... dhinheero? Teh douh doto meuh bhinehiro!”
“...Sua fala está muito embolada. Mas acredito que está tentando me oferecer um incen-
tivo financeiro, é isso? Entendo... não estou interessado.”
O que fiz para merecer isso? Por que eu tenho que morrer?
Staffan considerou tudo o que ele tinha feito até agora. O que ele fez de errado?
Sebas suspirou.
“...Entendo.”
Assim que disse isso, Sebas chutou Staffan no intestino, que por sua vez foi arremessado
longe.
“Então é isso que querem dizer quando falam que algo não vale a pena ser mantido vivo.”
Staffan foi preenchido com uma dor imensurável quando vários de seus órgãos internos
se romperam. A agonia era tal que um homem poderia se contorcer e sofrer até que mor-
resse, mas Staffan permaneceu consciente, embora sua mente fosse um borrão.
Isso dói!
Isso dói!
Ele queria gritar e rolar no chão, mas estava imóvel pela dor intensa.
Staffan queria gritar por ajuda, mas sua garganta não responderia.
Uma lágrima escorreu em seus olhos e sua visão ficou turva. Ainda assim, ele podia ver
as costas de Sebas.
Me salve!
No fim, Staffan Heivish agonizava com a dor indescritível em seu abdômen enquanto
morria lentamente.
Parte 2
“Climb, é melhor matar todo mundo. Não tenho nada aqui pra amarrar ninguém, se al-
gum deles conseguir soar o alarme, vai ferrar tudo. Mesmo se for pra desmaiar todo
mundo, alguém ainda pode acordar antes da hora. Tudo aqui tá jogando contra nós, é
muito arriscado tomar conta de um lugar que a gente nem conhece... huh, aconteceu al-
guma coisa?”
Climb balançou a cabeça para afastar a inquietação. Seu coração palpitava forte, mas
ele tentou o seu melhor para ignorar.
“Tem certeza? ...Hm, você parece diferente. Tem agido de forma estranha desde que a
gente chegou aqui, mas agora tem o rosto firme de guerreiro. Eu sei bem como é, sente
Brain deu um tapinha nas costas de Climb, depois bateu na porta quatro vezes com a
mão que não segurava a espada.
O som de passos pesados veio de trás da porta. Logo depois eles ouviram o som das
fechaduras sendo destravadas — três, para ser preciso.
Brain já havia entrado antes que as pessoas dentro pudessem gritar de surpresa. Houve
o som de um corpo sendo cortado, seguido por um objeto pesado batendo no chão.
Ele entrou a tempo de ver Brain abater seu segundo homem. Havia mais uma pessoa
dentro da sala, um homem de armadura de couro e carregando uma espada curta. Climb
correu para ele e encurtou a distância em um instante.
O homem tentou perfurar Climb, mas Climb facilmente a desviou com sua espada.
Depois disso, Climb levantou a espada e a desceu com força sobre o homem.
O homem tentou bloqueá-la com sua adaga, mas uma mera espada curta não suportaria
um golpe com o peso total de Climb o impulsionando. A espada de Climb desviou a es-
pada curta e sua lâmina afundou no ombro do homem, encravando até sua laringe.
O homem gritou de dor quando desabou no chão, Climb mal pôde acreditar que o corpo
humano pudesse conter tanto sangue. Seu oponente se contorcia e tremia no chão en-
quanto se agarrava à vida.
Depois de verificar que tinha desferido um golpe mortal, Climb adentrou correndo para
o fundo, seguindo o fluxo da batalha, enquanto permanecia alerta. Nenhum inimigo saiu
do esconderijo para encontrá-lo. Por trás, ele podia ouvir Brain subindo as escadas rumo
ao segundo andar.
A mobília aqui era simples e comum. Climb garantiu que não havia inimigos aqui antes
de passar para a próxima sala.
Um minuto se passou.
“O mesmo com o segundo andar. Nem camas tinham lá, eles não devem morar aqui... eu
tenho certeza que deve ter uma passagem secreta em algum lugar, esses caras não fica-
vam aqui.”
“Achou algo lá? Duvido que isso fique no segundo andar, mas não sei bem...”
“Que nada, dei uma boa olhada lá, não vi nada suspeito. Deve estar no primeiro andar
mesmo, Climb-kun.”
Climb e Brain trocaram olhares e depois olharam para o recanto mais profundo.
Climb não havia aprendido nenhuma habilidade ladina, por isso não conseguia detectar
portas secretas só de olhar. Se houvesse alguma farinha aqui, e eles tivessem tempo, eles
poderiam ser capazes de espalhá-la completamente para encontrar a passagem escon-
dida.
As partículas de farinha cairiam nas junções das portas secretas e facilitariam a sua lo-
calização. No entanto, eles não tinham a farinha e o tempo para espalhá-la. Portanto,
Climb tirou os itens mágicos da sua bolsa de cintura.
Os sinos de mão dado a ele por Gagaran da Rosa Azul. Ela disse: “É perigoso se aventurar
sem um amigo ladino, mas às vezes vai ter que ir. Se um dia rolar isso, ter um item como
esse pode fazer uma enorme diferença”.
Climb olhou para os desenhos de cada um dos sinos e escolheu o que ele precisava.
[Sino D e t e c t o r de Portas Secretas]
O item mágico que ele selecionou foi chamado de Bell of Detecting Secret Doors.
Climb sentiu Brain olhando com interesse para o sino e assim o tocou. O sino produziu
uma nota nítida, mas que só o seu detentor podia ouvir.
Em resposta ao sino, um canto do chão brilhou com uma luz branca pálida e pulsante,
dizendo-o que havia uma porta secreta ali.
“Caramba, esse é um item mágico útil. Os meus só servem pra aprimoramento; são úteis
apenas em batalhas.”
“Um guerreiro...”
Depois disso, tudo o que teriam que fazer era abrir a porta secreta e passar. Contudo,
Climb estreitou os olhos e observou a porta. Então suspirou e alcançou os três sinos no-
vamente.
Este sino tinha diferentes padrões do anterior. Ele o tocou assim como fez com o outro.
Não custava nada ser cauteloso. Como guerreiro, Climb não conseguia encontrar, nem
desarmar, armadilhas, e não havia nada que ele pudesse fazer contra seus efeitos. Talvez
se tivesse um magic caster consigo, ele poderia ser capaz de se recuperar de veneno ou
paralisia, mas ele e Brain eram apenas guerreiros. Havia, aparentemente, algumas Artes
Marciais que poderiam atrasar os efeitos de veneno e coisas do tipo por um tempo, mas
Climb não as tinha aprendido e nem tinha poções antídoto consigo. Ele teve que consi-
derar ser envenenado como uma condição fatal.
Este item mágico tinha um número limitado de usos por dia, mas seria melhor usá-los
sem hesitação do que o risco de cair em uma armadilha.
Climb enfiou a ponta da espada no espaço entre a porta secreta e o chão e a pressionou.
O piso de madeira subiu e caiu na outra direção. Havia uma balestra armada com virote,
colocada dentro da porta. Sob a luz da lâmpada, sua ponta brilhava com um brilho estra-
nho que não era metálico por natureza.
Se ele tivesse aberto a porta secreta sem pensar, o projétil envenenado teria sido dis-
parado em sua direção.
Climb deu um suspiro de alívio e depois checou para ver se poderia removê-la. No en-
tanto, foi instalada minuciosamente e não pode ser removida sem ferramentas.
Uma escadaria se estendia para baixo, mas ele não conseguia enxergar seu compri-
mento devido ao ângulo de observação. A dita escadaria estava apoiada em blocos de
pedra e parecia muito sólida.
“Eu não levo jeito para lutar em ambientes fechados. Prefiro espaços amplos, talvez seja
melhor esperar o inimigo aparecer.”
“É, quando se trata de combate um contra um, ficar esperando no topo da escada é me-
lhor. Mas acontece que, não sei se vai dar pra te ouvir se eu entrar muito fundo nisso aí.
Reforços podem aparecer a qualquer momento, ia ser um pé no saco ter que segurar
muitos aqui. Melhor a gente ir junto.”
“Sim. Obrigado.”
Por segurança, Brain cutucou as escadas com a espada enquanto descia, avançando
passo a passo com cuidado.
Depois de saírem das escadas, descobriram que a passagem diante deles estava reves-
tida de pedra cortadas e as paredes também tinham sido reforçadas com alvenaria. Uma
porta ficava vários metros à frente deles, e os arredores eram reforçados com chapas de
aço.
Brain não achava que um túnel de fuga seria equipado com uma armadilha mais letal
que uma balestra, mas tinha ouvido falar de armadilhas de fossos, que poderiam tirar
até mesmo guerreiros fortemente armadurados da luta. Evitar armadilhas desse tipo es-
tava como prioridade absoluta.
Embora fosse apenas uma curta distância, Brain ainda se deu este trabalho e avançou
com cautela. Eventualmente, eles chegaram à porta. Climb estava esperando na escada,
para evitar ser apanhado caso algo acontecesse.
E então parou.
Assim que Climb estava ficando preocupado, imaginando se algo havia acontecido com
ele, Brain o encarou com uma expressão amarga no rosto dizendo:
“...Trancado.”
“Tem algo aí que ajude com isso? Caso contrário, terei que tentar na força bruta.”
As paredes eram revestidas com gaiolas e caixotes grandes o bastante para levar seres
humanos. Talvez este fosse um depósito. Ainda assim, parecia grande demais para ser
um.
As portas do outro lado não estavam trancadas. Climb se concentrou para ouvir e assim
ele ouviu os sons de um burburinho à distância.
“O que acha do lugar? Parece bem grande... O lado ruim é que pode acabar lutando com
vários de uma vez.”
“Caso venham todos para cima de mim, irei rumo a saída e luto perto das escadas.”
“Certo. Vou dar uma verificada os arredores, já, já tô de volta. E Climb, não invente de
morrer aqui.”
Climb entregou os três sinos para Brain, que os colocou na bolsa da cintura. Então, o
semblante de um guerreiro severo tomou conta dele. Com um breve “Vou nessa”, ele
passou pela porta destrancada e se dirigiu para as profundezas do bordel.
Ele esperava encontrar alguma informação sobre outras instalações da Oito Dedos. Se
conseguisse encontrar mercadorias roubadas ou contrabandeadas, melhor ainda. Claro,
uma investigação profunda teria que esperar depois que tivessem tomado o controle do
lugar, mas antes disso, ele deveria inspecionar o melhor que pudesse.
Havia caixotes de todos os tamanhos e ele se aproximou do maior. Parecia ter cerca de
dois metros de altura.
Ele verificou o grande caixote procurando por armadilhas. Naturalmente, Climb não
desenvolveu espontaneamente nenhuma habilidade de detecção desde então, então
tudo o que podia fazer era imitar, desajeitadamente, o que os ladinos faziam para ganhar
a vida.
Ele não achava que contivesse algo, mas como estava nos domínios de uma sociedade
secreta, poderia encontrar algo. Quem sabe, até mesmo poderia conter uma forma de
vida contrabandeada ilegalmente ou algo assim.
Mas como esperado, não houve som algum. Climb estendeu a mão e tentou abrir o topo
do caixote.
—Não abriu.
Ele procurou por um pé-de-cabra ou uma haste, mas a rápida investigação na área não
revelou ferramentas do tipo.
Depois disso, ele tentou abrir um caixote com cerca de um metro cúbico de tamanho.
O caixote abriu com bastante facilidade. Ao observar o interior, ele viu roupas de muitas
cores e variedades. Havia de tudo um pouco, de ponchos a vestidos de luxo.
“O que é isso? Há algo escondido sob essas roupas... não parece... Roupas de reposição,
talvez? Ou são algo como roupas de trabalho? Uniformes de empregada...? Onde estas
coisas seriam utilizadas?”
Climb não tinha idéia do propósito daquelas roupas. Ele pegou uma peça e olhou de
perto, mas parecia ser apenas mais uma peça comum. Se quisesse vinculá-la a um crime,
na melhor das hipóteses seria algo roubado, mas não constituía evidência suficiente para
fechar o bordel.
Como não conseguia descobrir, decidiu deixar o assunto de lato. Logo depois, Climb
passou para outro caixote de tamanho similar. Só então, um baque alto ecoou foi ouvido.
De onde tinha vindo? Ele vasculhou tudo e se certificou de que não havia ninguém.
Será que alguém estava escondido o tempo todo, usando 「Invisibility」 para se escon-
der?
Chocado com sua própria conclusão, Climb olhou apressadamente para a fonte do som.
Tinha vindo do caixote de dois metros que verificara agora a pouco, o que ele não con-
seguira abrir. Um lado estava colado contra a parede, assim, as tábuas opostas se abri-
ram.
Isso expôs o interior. Não continha nada exceto dois homens. Havia um buraco na parte
de trás do caixote, revelando um túnel onde deveria haver uma parede sólida. Parece
que a passagem secreta estava ligada ao caixote.
Um deles parecia exatamente o homem que Sebas descrevera. Era Succulent. Ele era o
maior obstáculo para essa operação de aquisição e o maior prêmio de todos.
Era um membro do Seis Braços, cuja destreza era comparável àquela dos aventureiros
adamantite. Em outras palavras, ele era um inimigo imbatível para o Climb.
“Fugimos graças ao 「Alarm」nos avisando lá, mas aí damos de cara com esse sujeito...
melhor criar outra saída, não?”
“Bem, agora é tarde demais para essas coisas...” O homem atrás dele respondeu com
uma voz estridente.
“Considerando as circunstâncias, eu vou ficar bem puto se quiser dormir com ele.”
“Não seja tão mente suja, Succulent. Não faria algo assim bem aqui. Ah, lembrei. Ele é o
lacaio daquela putinha, só os deuses sabem o quanto eu odeio ela.”
O homem atrás dele tinha um olhar nauseante de luxúria nos olhos, mas Succulent pa-
recia estar avaliando a força de Climb como guerreiro, muito parecido com o modo de
uma serpente observar sua próxima refeição antes de dar o bote.
Um calafrio subiu pela espinha de Climb e ele sentiu uma pontada no ânus.
Succulent virou-se para encarar Climb, ignorando os gritos internos do mesmo. Sua
postura não expunha fraquezas, ele parecia um obstáculo ainda mais formidável para
Climb agora.
A onda de pressão que se aproximava forçou Climb a dar um passo para trás.
Quando havia uma enorme disparidade de força entre dois oponentes, a batalha não
demoraria muito. No entanto, Climb teve que assumir essa árdua tarefa.
“SOCORROOOOO—!”
Ele gritou com toda a força, como se estivesse tentando expelir todo o ar em seus pul-
mões.
Não havia como ele ganhar lutando sozinho. Capturar essas pessoas e impedir sua fuga
contaria como uma vitória para ele. Permitir que alguém tão forte quanto este homem
— em outras palavras, alguém que provavelmente teria muitas informações importan-
tes — escapar será uma derrota ainda maior.
Sendo esse o caso, por que ele deveria hesitar em gritar por ajuda?
Agora que Climb tinha feito isso, Succulent estava em uma corrida contra o tempo. Em
outras palavras, ele pode acabar tendo que usar todos os seus trunfos logo de início.
“Cocco Doll-san. Capturar ele pode ser meio complicado. É melhor dar um fim nele antes
que os amiguinhos dele cheguem.”
“Como ousa!? Você não é um membro do Seis Braços? Quer me dizer que não pode der-
rotar um pirralho desses? Essa desgraça de apelido de Diabo das Ilusões é só enfeite?”
“Colocando desse modo... Que seja, farei o possível. Mas não vá se esquecer, o único
meio de vencer aqui, é você escapando. Estamos entendidos?”
Climb permaneceu em guarda contra Succulent, tentando encontrar a razão pela qual
ele era chamado de Diabo das Ilusões. Para portar um epíteto assim, suas habilidades
não seriam muito diferentes do que o nome sugeria. Sendo esse o caso, ele provavel-
mente poderia discernir essas habilidades se soubesse os nomes. Infelizmente, a apa-
rência e equipamento de seu inimigo não lhe diziam nada.
Climb sabia que as probabilidades estavam contra ele, mas mesmo assim bradou em
voz alta para enrijecer sua determinação.
Huh?
A lâmina pareceu tremular. Ele não estava vendo coisas. A oscilação desapareceu com
rapidez suficiente, mas Climb tinha certeza do que acabara de testemunhar.
Essa provavelmente era a fonte do epíteto de “Diabo das Ilusões”. Seu inimigo prova-
velmente usou algum tipo de habilidade. Climb precisava ter cautela e permanecer alerta.
De repente, a dor floresceu do outro lado do corpo, e ele quase foi jogado para longe.
“Gwaargh!”
Climb recuou vários passos e colidiu contra a parede. Ele não teve tempo para pensar
sobre o que havia acontecido — Succulent já estava de frente para ele novamente.
A lâmina moveu como da última vez. Climb levantou a espada para proteger a cabeça e
rapidamente desviou para a esquerda para fugir do golpe.
Climb recuperou sua postura depois ter cambaleado para longe, então, sem pensar, ten-
tou um golpe perfurante.
Climb ignorou Succulent que almejava a saída e olhou para Cocco Doll. Ele imaginou
que Succulent seria prejudicado pelo simples fato de que sua presença aqui era unica-
mente para proteger Cocco Doll.
Succulent parou de almejar a saída e colocou-se entre Climb e Cocco Doll, estalando a
língua enquanto o fazia. Depois disso, ele olhou entre Climb e a porta levando a saída,
depois olhou para Cocco Doll, com o rosto torcido.
“Droga, quase cai na armadilha dele. Sinto muito, mas eu tenho que matar esse pirralho
agora.”
“Não se atreva! Se mantivermos o garoto vivo, podemos usá-lo para chantagear a puti-
nha dourada, esqueceu?”
“Ele me fez de bobo. Ficou fingindo que guardava a porta, fazendo escândalo falando
que ninguém ia sair. Esse merdinha... tentou ferrar minha mente.”
...Perfeito! Ele mordeu a isca. Parece que não sabe o que está acontecendo lá fora. Agora
eles não vão tentar fugir.
Succulent sabia que Cocco Doll tinha apenas um guarda-costas, tentar fugir enquanto
Climb ainda podia lutar seria tolice. Isso porque acabariam sendo flanqueados se Climb
tivesse colegas esperando na saída da escada. Justamente por isso que Succulent não
podia deixar Cocco Doll fugir sozinho enquanto não lidasse com Climb.
O que confundiu Succulent foi a declaração de Climb em voz alta, a de que defenderia a
saída, para logo depois abandonar a posição assim que surgiu a oportunidade de atacar
Cocco Doll. Com isso, Succulent tinha certeza de que havia emboscadores esperando do
lado de fora, preparados para fechar o cerco e capturar Cocco Doll. Essa certeza limitava
as opções táticas ao seu dispor.
Succulent foi forçado a pensar na necessidade de eliminar Climb. Claro, ele estava ope-
rando sem conhecimento das condições do lado de fora. Caso contrário, ele o teria enga-
nado e fugido há muito tempo.
Climb havia ganho a aposta, mas o jogo não estava nem perto de acabar, ele ergueu a
espada em resposta à súbita onda de intenção assassina.
“!”
Climb já estaria morto se aquele pervertido não tivesse declarado seu desejo pelo corpo
de Climb. Até mesmo uma cota de malha não oferecia imunidade completa a violentos
ataques cortantes.
Mas que golpe estranho foi aquele? Será um golpe super rápido em cima de outro golpe?
Não parece que é isso...
Gazef Stronoff possuía uma Arte Marcial única, o 《Corte de Luz Sêxtuplo》, que lhe
permitia infligir seis cortes simultaneamente. Talvez Succulent estivesse usando uma
versão mais fraca disso, talvez algo como um 《Corte de Luz Duplo》?
Caso fosse isso, Succulent provavelmente usava alguma Arte Marcial desse porte, onde
seu primeiro ataque era feito em velocidade normal e depois seguido por um segundo
golpe rápido.
Tem algo errado aqui. Se eu puder descobrir o segredo dessa técnica, eu devo ser capaz
de lidar com isso... Ainda estou em desvantagem, não vou aguentar ficar na defensiva. Hora
de atacar.
Climb engoliu a seco e começou a correr. Seus olhos foram de Succulent para Cocco Doll.
Ele é o guarda-costas aqui, tenho certeza que ele vai odiar ver alguém indo rumo a quem
deve proteger, mesmo que seja de brincadeira. Eu trabalho nisso todos os dias, sei bem
como se sente.
Climb se aproximava tentando aplicar sua própria experiência de trabalho ao seu ini-
migo.
Diabo das ilusões... Se isso for verdade... então talvez aquele golpe por si só seja uma ar-
madilha... Mas ainda vale a pena ter certeza.
Ele se aproximou e clivou para baixo. Como esperado, o golpe foi facilmente desviado.
Segurou o reverberar do impacto em seu braço e o golpeou novamente. O golpe foi fraco,
mais fraco ainda por não ter levantado a espada, mas isso foi o suficiente.
“Esse seu braço direito é uma ilusão! Seu braço de verdade assim como a espada estão
invisíveis!”
Em outras palavras, anteriormente ele havia bloqueado a ilusão, enquanto a espada in-
visível o atingira.
“...É isso aí. É só uma combinação de magias de invisibilidade e ilusão. Eu treinei como
ilusionista e esgrimista. Depois de descobrir, o truque perde a graça, não é? Pode rir se
quiser.”
Como ele poderia rir disso? Parecia simples, a princípio, e ele se perguntou por que não
havia percebido antes. No entanto, uma lâmina invisível era um verdadeiro terror em
uma batalha de vida ou morte, onde cada golpe poderia ser o último. A ilusão de que ele
podia ver só contribuiu para o engano.
“Eu suponho que estou inferior a você em força bruta, pois segui dois caminhos ao
mesmo tempo. Contudo...”
Por tudo o que sabia, ele estava observando um braço invisível e a mão real já poderia
ter preparado uma adaga de arremesso.
Climb começou a suar frio quando percebeu o temível poder das ilusões.
“Soa como uma mentira. Não tenho motivo algum para acreditar em você.”
“É como eu disse...”
“Mas enfim, pirralho. Não precisa acreditar em mim. Eu já disse o que me cabe... Infeliz-
mente, eu não posso me aprimorar com magia e nem te enfraquecer com elas. Mas... será
que pode discernir a realidade de uma ilusão?”
“「Multiple Vision」!”
O do centro parecia o original, mas Climb não tinha como ter certeza.
O objetivo de Climb era ganhar tempo, mas era muito arriscado permitir que um magic
caster se aprimorasse.
Climb esbravejou, e usou uma Arte Marcial para melhorar seus sentidos, prontamente
iniciou seu ataque a Succulent.
“「Scintillating Scotoma」!”
“Uuurgh!”
Climb avançou girando a espada em um amplo ataque. Claro, apenas um dos Succulents
estava ao seu alcance. Para pegar todos os Succulents ao alcance de seu balanço, seria
necessário ficar extremamente próximo, onde ele não seria capaz de fazer sua investida
de espada.
Sua espada atingiu um dos Succulents, que se dividiu lateralmente em dois. Entretanto,
seu inimigo não vomitou sangue, nem a espada encontrou resistência quando passou
direto através do corpo de Succulent.
“—Palpite errado.”
Um calafrio subiu de suas entranhas, um ardor quente veio de sua garganta. Climb re-
flexivamente levantou a mão esquerda para agarrar a origem do calor em seu corpo.
Dor veio através da mão que segurava sua garganta e sangue fresco jorrou, trazendo
uma sensação repugnante de roupas úmidas. Se não tivesse sentido a intenção assassina
de Succulent, ou se não tivesse prontamente usado sua mão para se salvar, sua garganta
teria sido cortada. Embora feliz por ainda estar vivo, ele cerrou os dentes e reprimiu a
dor enquanto golpeou com a espada mais uma vez.
Novamente, a lâmina não encontrou resistência alguma, a única coisa que cortou foi o
ar.
Da cota de malha que usava e até as batidas do próprio coração, todos eram um ruído
sem sentido. Tudo o que ele precisava ouvir era o som feito pelo homem diante dele.
O som não veio das espadas erguidas que vinham em sua direção. O som de algo cor-
tando o ar veio do espaço vazio bem na frente dele, rumo ao rosto.
Climb apressadamente virou a cabeça para o lado— e, quando o fez, um rastro de calor
minou de sua bochecha, seguida pela sensação de dor quando sua carne foi cortada. Um
líquido quente e escaldante escorreu por sua bochecha até o pescoço.
“Quase!”
Climb cuspiu o sangue em sua boca enquanto depositava todas suas esperanças em seu
próximo ataque.
Como já usara a mão esquerda como escudo, agora não podia sentir nada exceto a dor
pulsante. Sequer sabia se seus dedos poderiam se mover. Pelo que sabia, os nervos po-
deriam ter sido cortados. No entanto, Climb apertou a mão esquerda pela empunhadura
da espada, na esperança de espremer um pouco mais de força para o próximo golpe.
A dor inundou o corpo de Climb e ele rangeu os dentes. Sua mão esquerda ainda podia
se mover e ainda era possível erguer sua lâmina. Parecia que estava inchada e latejante,
mas provavelmente eram delírios advindos da dor.
Segurando a empunhadura da espada com as duas mãos, usando todas as suas forças,
ele ergueu a espada para uma posição alta e golpeou ferozmente.
Sangue esguichou. Houve a sensação de atingir algo duro. Sangue fresco jorrou como
uma fonte. Parece que finalmente atingiu o corpo real de Succulent.
Pelo o que parecia, o golpe de Climb fôra letal, pois seu rival caiu pesadamente no chão,
Climb não podia acreditar que havia derrotado um homem a par com aventureiro de
ranque adamantite, mas a verdade inegável era que Succulent estava no chão. Climb lu-
tou contra a alegria crescente em seu coração e olhou fixamente para Cocco Doll.
Talvez ele tivesse relaxado mentalmente, mas a dor na bochecha, no braço esquerdo e
no resto do corpo o deixava aturdido.
Se ele pudesse ter capturado Succulent vivo, então não haveria espaço para queixas. No
entanto, isso era pedir demais de Climb. Mesmo assim, capturar um homem que era pro-
tegido por um membro do Seis Braços provavelmente renderia um valor incontável em
informações importantes.
Climb deu um passo à frente, a fim de prendê-lo. No entanto, algo no rosto de Cocco Doll
o deixou desconfiado.
Ele perdeu toda a força do corpo. Sua visão apagou-se por um momento e, quando vol-
tou, estava de cara no chão. Ele não tinha idéia do que aconteceu. A dor em sua barriga
era como uma barra de ferro em brasa enfiada em sua carne, e a dor estava começando
a se espalhar. Ele ofegou pesadamente, e um par de pés apareceu diante de seus olhos,
que só conseguiam olhar para o chão.
Ele se esforçou em olhar para cima, mas tudo o que viu foi Succulent ileso.
“Por sinal, aquilo que usei foi o 「Fox Sleep」. É uma ilusão usada ao ser ferido. A dor
que senti não foi brincadeira não, viu? Mas pensou que tinha acabado com minha raça,
né?”
Ele moveu o dedo, traçando uma linha no peito. Deve ter sido o caminho que a espada
de Climb percorreu quando o atingiu.
Climb ofegava e engasgava. Ele podia sentir sangue brotando de seu abdômen, enchar-
cando suas roupas e cota de malha.
Climb tentava unir os pedaços de sua consciência que haviam sido rasgados pela dor.
Ele lutou com um homem a par com um aventureiro adamantite. Foi uma batalha he-
roica. Mas diante desse desenrolar de eventos, ele não teve escolha a não ser desistir. A
diferença em suas habilidades era grande demais. Essa era a verdade crua.
Ele não se permitiria morrer. Ele não se permitiria perder a vida sem que Renner o
ordenasse.
Seu rugido estava em algum lugar entre um gemido e um ranger de dentes, a fim de
estimular seu espírito indeciso, que estava prestes a se render a dor.
Climb lutou fortemente para se lembrar de Renner. Ele precisava voltar ao seu lado
hoje—
“Sem tempo a perder, pirralho. Mas não se preocupe, vou acabar com sua dor agora
mesmo. Adeus.”
Ele havia sido fatalmente ferido. Sua morte era apenas uma questão de tempo. Ainda
assim, Succulent tinha a sensação de que seria melhor acabar com ele agora.
“Dá um tempo, Cocco Doll-san. Pode ter amigos deles atrás daquela porta, não enten-
deu? Além disso, mesmo que o levemos, ele não vai resistir até chegarmos no local. Se
esqueça dele logo.”
“Então, pelo menos tire a cabeça dele. Eu quero colocá-la em um buquê e enviar para a
putinha dourada.”
Succulent originalmente havia desprezado sua presa moribunda com olhos arrogantes.
Aqueles olhos agora se arregalaram.
Impossível.
Succulent tinha ceifado mais vidas que pudesse contar em seus dedos, estava certo de
que havia desferido um golpe mortal no garoto. Não havia como ele ainda estar de pé
depois disso.
No entanto, a visão diante dele voou em face da experiência que Succulent havia acu-
mulado.
Um longo e fino rastro de saliva escorria do canto da boca do garoto, e seu rosto pálido
e exsanguinado parecia desprovido de toda humanidade.
Sua súbita perda de ar paralisou Succulent enquanto o olhar ardente de Climb o mirava.
Ele estava com medo. Ele estava com medo de como esse jovem tornara o impossível
possível.
Como poderia ele — como membro do Seis Braços — ter medo de alguém tão fraco?
Como ele poderia aceitar isso?
Succulent avançou em direção ao seu oponente. Ele tinha certeza de que uma única es-
tocada terminaria o trabalho.
♦♦♦
♦♦♦
Ouviu-se um som estridente quando a lâmina veio cortante de cima e depois houve um
agudo som de metal.
A única razão pela qual Succulent pôde bloquear o golpe do garoto foi porque seus mo-
vimentos estavam letárgicos pelo aproximar da morte.
Seu inimigo estava morrendo. Succulent tinha sido distraído por esse fato, e seus olhos
escuros se arregalaram.
Por ser parte esgrimista, Succulent treinou por incontáveis horas para escapar de ata-
ques assim. Então o fato de precisar usar sua espada para bloquear o ataque de Climb
foi extraordinário.
Essas palavras passaram pela mente de Succulent com cada vez mais frenesi.
Não, não era apenas isso. A velocidade da lâmina de Climb tinha sido ainda mais rápida
do que quando ele estava ileso.
Isto foi alguém que se tornou mais forte durante a batalha. Não era impossível, mas
Succulent nunca tinha presenciado ninguém assim antes.
Ele até começou a sentir que o jovem havia eliminado algum tipo de limitação.
Pelo seu tom, ninguém seria capaz de dizer quem saíra vitorioso da batalha que se se-
guia.
♦♦♦
O impacto de sua aterrissagem grosseira ressoou através de suas costas e agitou suas
entranhas. Sua cota de malha de orichalcum absorveu parte do impacto, mas a súbita
perda de ar de seus pulmões o deixou incapaz de respirar por um momento.
O que tinha acontecido? Succulent — que sofrera o golpe — não conseguiu explicar,
mas Cocco Doll que observava a situação havia percebido.
O menino prontamente chutou Succulent assim que seu golpe foi bloqueado.
Succulent não tinha idéia do que estava acontecendo, mas se levantou rapidamente.
Para esgrimistas — para quem a mobilidade era o seu maior trunfo — ficar de bruços
no chão seria uma sentença de morte.
“Droga! Você me chutou! Soldados fazem o que o treinamento manda, não fique inven-
tando truquezinhos...!”
Diferente do currículo de combate padrão dos soldados comuns, o estilo de luta suja e
incomum de Climb fez Succulent sentir que estava enfrentando um aventureiro. Assim,
ele não poderia ser subestimado.
No começo, ele achava que a luta estava na palma da mão. Matar um pirralho como esse
deveria ter sido fácil como roubar doces de crianças. No entanto, ele agora sentia que a
compostura escapava de seu ser.
Quando se levantou, Succulent viu o jovem que se tornara uma ameaça iminente cair
no chão, e deu um suspiro de alívio.
O rosto do jovem estava horrífico, como se a série de golpes tivesse apagado a chama
de sua vida. Ou melhor, foi exatamente o que aconteceu. Esta deve ter sido uma última
fagulha de sua vida, como a luz de uma vela antes de se apagar. Isso explicava de onde
tirara tanta força.
Quando viu a condição de Climb, Succulent começou a se sentir aliviado, mas logo o
sentimento foi substituído por confusão e raiva.
Mas—
♦♦♦
Climb estava de bruços no chão, o rosto coberto de suor, a pele tão pálida que era pra-
ticamente branca. Ainda assim, ele estava respirando. Dito isto, a ferida em sua barriga
era fatal, e ele morreria em poucos minutos se não fosse tratado imediatamente.
Assim que entrou na sala, Brain sentiu que não poderia relaxar.
“Se eu fizer isso, ele que vai me matar. Esse aí não é igual ao pirralho. Eu preciso me
concentrar para vencê-lo. Se eu me distrair e não tomar cuidado, será o meu fim.”
Respondeu Succulent. Brain sabia exatamente quem era o homem. Ele parecia exata-
mente a descrição que lhe havia sido fornecida. Além disso, era o único segurando uma
lâmina manchada de sangue. Brain havia suspeitado dele desde o início, e suas suspeitas
acabaram de ser confirmadas.
Sem dizer nada, Brain correu em sua direção, sacou sua espada e cortou. Não houve
hesitação em seus movimentos. Succulent saltou antes mesmo do golpe se conectar, a
Katana cortou o ar. Entretanto, Brain só fez isso para afastar seu oponente de Climb. Ele
ficou em pé sobre o já caído Climb. Brain firmou seus pés para que pudesse proteger
bem o rapaz.
Suas palavras foram rápidas e cheias de tensão. Se Climb não tivesse nada do tipo, ele
teria que encontrar outra maneira de salvá-lo.
Ele olhou e viu que as mãos de Climb haviam soltado sua espada e começado a se mover.
Um grande peso foi tirado dos ombros de Brain. Depois de responder a Climb, ele olhou
ferozmente para Succulent.
“...Com uma katana dessas, não me admira que seja convencido assim. E pensar que
carregaria uma arma tão valiosa do Sul... Não sei se já ouvi falar de você... como se chama?”
Climb era um camarada — um irmão de armas. Como alguém poderia responder com
calma quando o irmão estava à beira da morte?
Seu antigo eu não vivera por nada além de aprimorar sua esgrima. Quanto tempo fazia
desde que se importara com outra coisa?
...Agora eu entendo.
Sua ambição, seu sonho, seu objetivo, sua vida, seu modo de vida— tudo havia sido des-
truído além da recuperação pelo monstro chamado Shalltear Bloodfallen, e as partes
quebradas de seu coração, aparentemente foram preenchidos pela pessoa chamada
Climb.
Mais cedo, quando confrontado com a cruel sede de sangue do misterioso Sebas, Brain
ficou de joelhos, mas Climb — embora mais fraco que ele — permaneceu de pé. Foi exa-
tamente naquela ocasião, quando Brain se encheu de admiração, que Climb ganhou lugar
em seu coração. Isso porque Brain tinha visto uma centelha de brilho masculino dentro
de Climb que ele mesmo não tinha.
Ele parou diante de Climb, e encarou fixamente Succulent. Climb agora via nas costas
de Brain a mesma determinação que Brain o havia visto mais cedo?
Seu antigo eu teria rido disso. Seu antigo eu teria rido de quão fraco ele havia se tornado.
No passado, ele acreditava que essas coisas não passavam de fraquezas para um guer-
reiro. Ele acreditava que tudo que um guerreiro precisava era ser tão afiado quanto uma
espada.
“Então é assim que você sempre viu a vida... Entendi, Gazef... Parece que, mesmo agora,
eu ainda não sou páreo pra você.”
“Foi mal. Eu não vejo motivo pra te dizer, mas como insiste... eu sou o Brain Unglaus.”
“Não, Cocco Doll-san, Não tenho dúvidas. Armas valiosas indicam o nível de um guer-
reiro. Uma Katana dessas certamente combina com alguém como ele.”
“A maioria das pessoas que encontrei hoje me reconheceram... É, acho que meu antigo
eu teria ficado orgulhoso. Mas agora eu nem sei se ligo pra isso.”
Brain não sabia o porquê Succulent sorria para ele tão amigavelmente. Logo após se
indagar, suas dúvidas foram respondidas.
“Hey, Unglaus! Não há nenhum sentido nessa luta, não é? Alguém forte como você é
digno de fazer parte de algo maior. Por que não se tornar um de nós? Você é bem forte,
vai ser fácil se tornar membro do Seis Braços. Você é como eu, né? Quer se tornar forte
a todo custo. Eu posso dizer só de olhar seus olhos.”
“Não é? Vamos deixar as coisas a panos limpos, a Oito dedos é um lugar legal. É ótima
para quem é forte. Eles vão dar todos os itens mágicos que quiser, tão poderosos quanto
quiser. Olha isso aqui, uma cota de malha de orichalcum! Já essa espada aqui é de
mythril! Anéis! Roupas! Botas! Todos são itens mágicos! O que me diz, Brain Unglaus?
Junte-se a nós, junte-se ao Seis Braços.”
“Como assim?”
“Ora seu! ...Hmph. Bem, se você diz isso, então sua força também não é nada especial!”
“Pode apostar que sim. Eu sei bem que não sou nada especial. Saberia se tivesse visto
um monstro de verdade.”
Brain estava com pena de Succulent e sua atitude arrogante. Ele realmente era como
um sapo em um poço. Assim, Brain decidiu dar-lhe um aviso sincero.
“O mesmo vale pra sua força. A gente até pode ser parecido. E justamente por isso que
te aviso — A gente não é nenhum um pouco especial.”
Brain se virou e olhou por cima do ombro para Climb, que havia bebido sua poção de
cura.
“Além disso, aprendi mais uma coisa. A força obtida por alguém é maior do que a obtida
quando se luta por si mesmo.”
“Eu não tenho idéia do que está falando... Que pena, Unglaus. É uma pena que eu tenha
que matar o espadachim gênio que já esteve no mesmo nível do poderoso Gazef Stronoff.”
“Será mesmo que consegue? Acha que pode vencer apenas lutando pra livrar o seu da
reta?”
“Claro que eu posso. Será bastante fácil. E depois que eu te matar, vou matar esse pir-
ralho aí. Sem mais brincadeiras e joguetes. Eu vou com tudo.”
Climb parou.
Sorrindo, Brain ficou surpreso com isso, por quanto ele ainda tentava ser útil. Então,
acrescentou:
Brain sorriu em resposta e embainhou sua espada. Então, abaixou a postura e inclinou
a espada e a bainha em sua cintura.
“Por favor, tenha cuidado. Succulent usa ilusões. O que o senhor vê pode não ser o real.”
“Valeu pelo aviso... sim, um adversário bastante complicado. Mas não se preocupe, tudo
ficará bem.”
Brain ficou onde estava, olhando silenciosamente para Succulent. Ele havia criado cinco
duplicatas ilusórias do nada, ele brilhava com o que parecia ser um brilho mágico. Além
disso, ele parecia ter vestido algum tipo de capa sombria. Brain não tinha idéia de que
tipo de magia Succulent usara.
“Obrigado por me dar tempo para me preparar. Os magic casters são mais poderosos
que os guerreiros quando podem se preparar. Será seu fim, Unglaus!”
“Hm? Que isso, não foi nada. Pois depois de falar com ele... bem, eu tenho certeza que
não vou perder.”
“...Fala demais para alguém que vende a lâmina por uns trocados! Olha só, vai ficar para
proteger esse pirralho de merda. Que gentil da sua parte.”
Climb sentiu-se culpado por dar tempo ao inimigo para se preparar. Portanto, Brain fez
uma declaração, alta o suficiente para que Climb pudesse ouvir.
“—Um golpe.”
“Quê?”
Quando seu oponente entrou no alcance de ataque, Brain deu meia volta, ignorando
completamente como estava expondo suas costas indefesas a Succulent que se aproxi-
mava. E então — com Climb no meio — Brain sacou com uma velocidade incrível e cor-
tou o ar vazio.
♦♦♦
Succulent estava ali. Ele colidiu no chão e ficou imóvel. Sua espada caiu no chão.
O poderoso corte de Brain havia lançado Succulent voando, esmagando-o contra a pa-
rede com uma força tremenda e, logo em seguida, ele desabou no chão. Se Brain não o
tivesse atingido com o dorso da espada, Succulent estaria no chão cortado em dois.
Mesmo a cota de malha de orichalcum que ele usava não fez diferença, tão poderoso foi
aquele golpe.
“...Meu 《Campo》 pode pegar qualquer coisa — até mesmo alguém invisível. A ilusão
na frente era pra chamar a minha atenção, então ia me atacar por trás... Bem astuto, pena
que usou contra a pessoa errada. Fora que, atacar o Climb-kun foi uma má escolha. Deixe
eu adivinhar, queria matar ele primeiro pra depois zombar da minha cara, né? Ficou tão
focado em atacar ele, que não prestou atenção em mim. Por acaso já se esqueceu contra
quem tá lutando?”
Mas outra pessoa disse “Bom trabalho” além de Climb, e as duas vozes se misturaram.
Era Sebas, isso não era nada de especial. Em vez disso, era de onde vinha a voz que sur-
preendia.
Em seu lugar estava Sebas, e ao lado dele estava a forma inerte de Cocco Doll.
“Agora mesmo. Creio que é porque vocês estavam focados em Succulent e não me no-
taram.”
“M-mesmo?”
Meu 《Campo》 tava ativado. Pode ter um raio pequeno, mas era pra eu ter sentindo
alguém mais chegando. Eu não senti nada... Até agora, apenas aquele monstro, Shalltear
“Enfim, já resgatei as pessoas presas. Ah, Climb-kun... me desculpe, mas algumas pes-
soas resistiram, não tive alternativa senão matá-las. Espero que me perdoe... mas antes
disso, eu devo curar suas feridas.”
Sebas veio diante de Climb e colocou as mãos em sua barriga. Foi um breve contato —
ele tirou a mão logo após tocá-lo. Porém, os resultados foram claramente óbvios. O rosto
de Climb ainda estava pálido depois de beber a poção, mas agora ele estava de volta a
um estado saudável.
“Não, eu não sei usar o poder dos deuses. Em vez disso, infundi meu ki em você para
curar.”
Brain exclamou. Agora ele entendia por que Sebas não estava armado nem armadurado.
Sebas apenas sorriu como afirmativo.
“Bem, pretendo ir imediatamente até o posto de guarda mais próximo, explicar a situa-
ção e voltar com alguns homens. Espero que os senhores possam vigiar a fortificação
enquanto isso. Pelo que sabemos, a Oito Dedos pode enviar reforços.”
“...Bem, já que estou aqui, não fará mal algum ficar mais um pouco.”
“Não vejo problemas também. No entanto, eu poderia incomodá-lo para não mencionar
minha participação? Eu vim a este país para fazer negócios e, para ser honesto, não de-
sejo continuar interferindo no submundo de uma nação estrangeira.”
“Se quiser, pode falar meu nome. Qualquer coisa, o Stronoff me dá cobertura.”
“Farei como os senhores dizem. Protejam aqui por um pouco mais de tempo.”
Parte 3
Suas feridas estavam completamente curadas, mas ele estava cansado além da conta.
Os combates levaram bastante tempo, e ainda teve que coordenar as coisas depois do
fato. No final, as coisas funcionaram não porque Climb tinha o apoio de Renner, mas por-
que os soldados tinham medo da Oito Dedos e não ousavam lidar com as coisas com
muita ansiedade. O maior problema foi a questão de assumir responsabilidade.
Afinal, o responsável pode se tornar um alvo da Oito Dedos — ser usado como exemplo.
Esta não era uma probabilidade distante, mas uma possibilidade distinta. Portanto,
Climb simplesmente anotou os eventos e pediu aos soldados que enviassem para Renner.
Depois de receber sua aprovação, ele assinou seu nome e o de sua mestra Renner como
responsáveis.
Claro, havia desvantagens em fazê-lo, mas havia pelo menos dois méritos para essa
abordagem.
Ela tinha agido contra uma organização que corrompia o coração do Reino, e ainda cap-
turaram o responsável pelo tráfico de escravos. Além disso, seu subordinado havia lide-
rado uma investida contra esse sindicato do crime. Isso certamente impulsionaria a opi-
nião pública de Renner, que de outra forma permaneceria dentro do Palácio.
A segunda seria que eles poderiam proteger Sebas e a mulher que ele havia resgatado
do abuso naquele bordel.
Agora que Climb e Renner tinham recebido os créditos, isso impediria Sebas e aquela
mulher de chamar a atenção, e também evitaria que se tornassem alvos prioritários da
Oito Dedos.
Quanto a Brain, ele disse que falaria com Gazef por conta própria e insistiu que Climb
não se preocupasse.
Renner já havia dito que não havia necessidade de bater e que ele deveria entrar dire-
tamente. No entanto, ele estava atrasado e, além disso, era indelicado adentrar no quarto
de uma dama sem avisar. Desde do dia que acidentalmente viu Renner em uma camisola
de seda pura, ele fez questão de bater toda vez que a visitava.
Ele tomara banho e se esfregara, mas não tinha certeza que havia tirado totalmente o
fedor de sangue, afinal, seu nariz estava acostumado a isso.
Segundo a normativa, ele jamais deveria entrar nos aposentos de Renner neste traje,
mas era imperativo que relatasse os eventos do dia para sua mestra com suas próprias
palavras.
O mais importante era as pessoas que estavam trancafiadas naquele lugar. Atualmente
estavam sob a custódia do posto de guarda, mas era preciso levá-las para algum lugar
seguro o mais breve possível. Algumas estavam feridas, então ele teve de providenciar
sacerdotes e outros curandeiros para ajudá-las.
A Renner-sama é tão gentil. Ela certamente ajudará o povo que estiver em necessidade.
Climb sentiu seu coração ficar pesado quando pensou em todas as coisas que reportaria
à sua mestra, coisas essas que a encheriam de preocupação. Ele não pôde deixar de pen-
sar em como seria melhor se ele fosse mais forte. Graças a ela que ele pôde levar uma
vida boa servindo uma mestra tão altruísta, mesmo assim, ele não tinha mais nada que
pudesse oferecer.
...Que estranho. Ela ainda não respondeu... será que não ouvi?
Ninguém estava de pé em frente à porta, então Renner não deveria estar dormindo
ainda. Poderia ter acidentalmente adormecido sem informar o guarda?
Desta vez, Climb ouviu uma voz calma concedendo-lhe a entrada de dentro do quarto.
Isso colocou seu coração à vontade e ele entrou. Ele já havia decidido a primeira coisa
que faria.
Climb podia ouvir uma raiva distinta na voz de Renner, o que o surpreendeu. A mestra
de Climb raramente ficava com raiva. Mesmo quando insultada, ela nunca mostrava sua
raiva na frente de Climb. Foi por isso que ele estava ciente de que Renner estava real-
mente preocupada.
“Eu estava realmente preocupada com você! Quando pensei nos tipos de coisas que a
Oito Dedos poderia ter feito com você, então... o que aconteceu? Recebi um breve relató-
rio, mas pode me explicar os detalhes?”
Climb entregaria seu relatório de pé, mas Renner insistiu que ele se sentasse.
Assim, Climb se sentou. Havia uma xícara de chá na frente dele, e Renner serviu-lhe uma
xícara de chá quente de seu item mágico Warm Bottle.
Depois narrou toda a situação para Renner, e o porquê de algumas pessoas precisarem
da ajuda dela.
Climb ficou brevemente perplexo com a primeira pergunta que Renner havia feito de-
pois de ouvir os procedimentos. No entanto, ela perguntou, então ele teve que responder.
“Eu senti pena. Se eu fosse mais forte, poderia salvar essas pessoas do sofrimento.”
“Eu sei que sim... Você deve ter sentido pena delas, Climb.”
“Sim.”
“...O avisarei quando chegar a hora. Vamos deixar isso de lado por enquanto; preciso
contar-lhe uma coisa. Amanhã, talvez até depois de amanhã, pretendemos lançar ata-
ques contra as bases da Oito Dedos, aquelas indicadas no pergaminho que a Lakyus nos
deu. Você pode imaginar como suas defesas se tornarão mais fortes com o passar do
tempo, graças ao ataque ao bordel.”
“Que isso, não precisa se desculpar. Pense nisso como se estivéssemos decidindo sobre
um curso de ação. Só para saber, gostei de como você se impôs, Climb. Você capturou
Succulent, um membro do Seis Braços, e trouxe Cocco Doll, o chefe da Divisão de Escra-
vatura. Isso deve fragilizar nossos oponentes. Portanto, quero aproveitar essa vitória.”
“Nós os derrotaremos novamente antes que eles façam qualquer estardalhaço na Capi-
tal!”
“Entendido! Vou descansar agora e reunir minhas forças para as operações de amanhã!”
“Isso mesmo, Climb. Sinto que amanhã será um dia muito emocionante. Descanse bem,
e tenha isso em seu coração.”
♦♦♦
Depois de terminar o chá agora frio, Renner se levantou. Ela caminhou até uma campa-
inha. Se a agitasse, o sino na sala adjacente tocaria. Enquanto pensava no rosto da serva
esperando no cômodo ao lado, ela sorriu friamente. Que sorte que ela estava de plantão
hoje.
Renner ficou diante do espelho e segurou o rosto com as duas mãos. Então ela esfregou
para cima e para baixo suas bochechas. Ela era apenas humana, e isso não mudaria a
forma de seu rosto. Foi apenas uma forma de autoafirmação.
Renner sorriu novamente. Ela passou por uma variedade deles antes de se decidir por
um sorriso puro e inocente.
Depois que os preparativos foram concluídos, Renner tocou a campainha. Logo, uma
empregada bateu na porta e entrou.
“Você poderia fazer algo por mim? Poderia me ajudar a ferver um pouco de água
quente?”
“Imediatamente, Renner-sama.”
Agora que sua presa mordera a isca, o sorriso de Renner ficou ainda mais alegre.
“Hm, não ficou sabendo? O Climb-kun foi incrível hoje! Ele foi fantástico!”
Ela falava como uma criança. A atitude que se encaixava em uma princesa tola que va-
zava informações importantes sem nem perceber.
A empregada odiava Climb, e ela tentou o seu melhor para esconder seu descontenta-
mento. No entanto, ela não conseguia manter suas emoções fora de suas palavras.
—Morra.
Renner fingiu que não tinha ouvido a resposta da empregada, afinal, Renner era uma
princesinha inocente. Ela não sentia as más intenções dos outros e não ligava para as
grosserias que recebia. Afinal era uma princesa ingênua, inocente e tola.
“Sim! Ele foi tãããão incrível! O Climb derrotou um monte de caras maus! E então resga-
tou um monte de gente que os bandidos prenderam! Ele as enviou para... ah, sim, acho
que ele as enviou para um posto da guarda. Agora podemos punir os nobres que ajuda-
ram os bandidos a fazer coisas ruins!”
A empregada acreditava que a princesa não tinha a menor idéia e não suspeitaria de
nada. Assim, Renner começou a emaranhar aquela mulher estúpida em seu esquema. Ela
manipulava todos, como uma grande marionetista. Todo esse curso de ação fazia parte
do previsto.
O grupo estava olhando para uma porta aberta. A sala do outro lado era escura como
um breu, e eles sentiram que todos os ocupantes anteriores haviam partido há muito
tempo. Uma olhada ao redor não mostrou mais ninguém.
Esta foi uma situação bastante estranha. De fato, o bordel deveria ter sido despido e
tomado pelo posto de guarda. Dito isto, alguém deveria estar a cargo de vigiar, mesmo
que o lugar estivesse vazio. De fato, se alguém olhasse ao longo das ruas vazias, seria
possível ver sinais de fogo onde o guarda noturno estaria posicionado.
Todavia, não havia ninguém aqui. Isso porque esse grupo usou sua influência para se
livrar temporariamente das sentinelas.
O homem de rosto firme como uma rocha — Zero — encarou ferozmente o bordel es-
vaziado e rosnou:
“Olha só isso. Até preciso me desculpar com o Cocco Doll. Emprestei o Succulent do Seis
Braços, aí o lugar foi tomado facilmente justo no dia que prestei os serviços da minha
divisão... Que piada.”
Uma risada desdenhosa veio de trás dele. Zero se virou e fixou a fonte daquela risada
com um olhar afiado. A mulher em trajes de seda conhecia a personalidade de Zero, e
disse apressadamente:
“Ah, bem... Então chefe, o que devemos fazer agora? Matar o Succulent para ele não abrir
o bico? Se sim, ele deve estar no posto de guarda. Todos aqui só sabem usar força bruta,
teremos que contratar assassinos de outros departamentos... o que me diz?”
“Não precisa disso tudo. Ele tem lá seus usos. Vou pedir ao Conde para libertá-lo... Pena
que vai custar uma nota. Melhor ir fazendo uma lista do que o Conde gosta.”
“Ele tem suas próprias conexões. Se ele precisar de algo, damos um jeito usando as nos-
sas conexões. Considere como uma forma de desculpas. E a lista de convidados? Fique
sabendo que os guardas a pegaram, não?”
“Está informação não é precisa. Ou melhor, ouvi dizer que eles não desvendaram deta-
lhes concretos.”
“Eu gostaria de colocar minhas mãos nisso. Podemos usá-lo para todos os tipos de chan-
tagem.”
“Não seja idiota. Isso só deixaria as outras divisões ainda mais desconfiadas de nós. Já
tem uns por aí suspeitando que armamos tudo isso. Se alguém encontrar essa lista em
algum lutar, apenas dê ao Cocco Doll alguns dias depois e peça desculpas. Até porque, a
lista deve estar codificada, não nos serve em nada.”
“Enfim, olharemos isso depois. Meu palpite é que, se existir, deve estar escondido em
algum cofre... Realmente é como falou antes, quem quebrou essa porta realmente fez um
feito e tanto. Olha só esse buraco, como fizeram? Eu duvido que usaram armas... seria
magia?”
“Foi um punho.”
Todos os olhos foram para o corpo de Zero. Zero repetiu-se — que essas marcas foram
feitas por um punho.
“Bem, você não é uma boa comparação, chefe... mas o nosso inimigo pode derrubar uma
porta reforçada com aço. Mesmo que o Succulent seja o mais fraco de nós, o que importa
é que ele derrotou um membro do Seis Braços. Seria lógico considerar seja lá quem for
como nosso inimigo, não?”
“O que está insinuando? Só porque o Succulent perdeu, então o inimigo é muito forte?”
“Ele não passa de um fracote se alguém desvendar aquelas ilusões. Só é bom quando
luta contra gente medíocre, não passa de um saco de pancadas se for alguém minimante
decente. Não sabiam disso?”
“Tudo que precisava ser dito, já foi. Eu perguntarei novamente — o que devemos fazer?
Recuar? Eu não acho que o confronto com o nosso adversário valerá as perdas poten-
ciais.”
As palavras de Zero estavam atadas a uma raiva que não pôde suprimir totalmente.
“Nossa reputação será prejudicada se não fizermos de exemplo quem atacou este lugar.
Que se dane as perdas. Todos os Seis Braços marcharão juntos para eliminar esse intru-
sor. Rei Undead, Davernoch.”
O homem de robe estendeu a mão. A dita mão não pertencia a uma criatura viva, e se-
gurava uma esfera que irradiava uma aura bizarra em resposta às emoções do dono.
O homem até então silencioso em armadura de placas bateu no peito com um estrondo
retumbante de metal.
“Primeiro, vamos resgatar o Succulent, preciso fazer umas perguntinhas. Depois disso...
encontre um bom torturador. Vamos mostrar ao atacante o verdadeiro significado do
inferno. Nós vamos fazê-lo se arrepender de sua tolice!”
Era o pôr do sol quando tudo terminou e Sebas voltou para casa.
Mas e agora, o que ele deveria fazer quanto à Tsuare? Sebas achava que a melhor opção
seria levá-la a algum lugar seguro, mas Sebas sabia que havia apenas um lugar realmente
seguro em todo o mundo.
Enquanto Sebas agonizava sobre o assunto, seus pés o trouxeram de volta para casa.
Assim que ele estava prestes a abrir a porta, sua mão parou. Alguém estava atrás da
porta. Ele sentiu que era Solution, mas Sebas não tinha idéia do porquê dela fazer isso.
Havia algum tipo de emergência? Sebas teve um mau pressentimento, mas ainda assim
abriu a porta. O que ele viu a seguir desafiou suas expectativas e o deixou sem movi-
mento.
Solution — que fazia o papel de uma herdeira mercante — estava usando seu uniforme
de Empregada na presença de Tsuare, uma humana que não sabia nada sobre a verdade.
Foi porque ela não precisava atuar mais, ou havia algum motivo que exigisse que ela
usasse seu uniforme?
Se fosse o primeiro, isso significaria que algo havia acontecido com Tsuare. Se fosse o
último—
Sebas, que podia permanecer calmo diante de um poderoso inimigo, mesmo que fosse
tão forte quanto um Guardião de Andar, estava realmente ansioso e tenso quando ouviu
que seu mestre o esperava.
Seus passos estavam pesados, como um criminoso condenado caminhando para a gui-
lhotina.
Muito obrigado.
Falando nisso, já que os Volumes 5 e 6 serão como um único volume gigante, eu fiquei
me perguntando, “precisa mesmo de posfácio neste volume?” aí discuti isso com a Edi-
tora-san e no final ela disse que alguns leitores desejariam isso, e que eu deveria escre-
ver alguma coisa...
Mas alguém realmente espera pelo posfácio? Será que minhas palavras finais são real-
mente interessantes...? Hm, a Editora-san queria que eu me esforçasse para escrever
algo interessante?
Algo interessante... Bem, para lidar com as inúmeras questões que surgiram nos Volu-
mes 5 e 6, passei todos os meus dias de folga entre agosto e o final de novembro em casa,
a fim de apressar o lançamento do livro... E foi isso.
Além disso, como o Volume 6 incluirá um CD Drama, assim como o Volume 4, o tempo
é ainda mais apertado do que o normal. É um ritmo realmente alucinante...
Mas essa é a vida de um escritor de meio período! Hm. Não é nada interessante, né?
Joguei um balde de água fria nos sonhos de todos, eu sei.
O manuscrito já está completo, se nenhum imprevisto acontecer, ele deve ser colocado
à venda em janeiro de 2014. Espero que possamos nos encontrar novamente no próximo
posfácio.
So-bin-sama, que faz ilustrações, Chord Design Studio, que faz o design do livro, Ohaku-
sama, que faz revisão, F-da-sama, a editora, assim como todos que ajudaram a fazer
OVERLORD o que ele é hoje — obrigado a todos. Além disso, obrigado por toda sua ajuda,
Honey. Finalmente, obrigado a todos vocês, leitores, por comprarem este livro! Vocês
têm a minha sincera gratidão!
Maruyama Kugane
Ilustrações
Glossário
Glossário
-Magias, Habilidades & Passivas-
Tradução livre de seus nomes Lailah:ライラ - é equivalente a palavra hebraica para
“noite” (laylah )לילה, que também é um nome de um anjo.
Alarm:..............................................................................Alarme. Succulent: ...........Nome vindo do francês para “delicioso”.
Continual Light: ................................................Luz Contínua.
Floating Board: ....................................... Prancha Flutuante.
Fly: ........................................................................................ Voar. -Raças & Monstros-
Fox Sleep: ....................................................... Sono de Raposa.
Heal: ....................................................................................Curar. Air Giant: ............................................................Gigante do Ar.
Invisibility: ........................................................Invisibilidade. Basilisco Gigante:Em grego: βασιλίσκος; transl.: basilís-
Kage Hisomi: ........................................ Esconder na Sombra. kos, “pequeno rei”.
Message: .................................................................. Mensagem. Elder Lich: ............................................................. Lich Ancião.
Multiple Vision: ............................................. Visão Múltipla. Gargoyle: Gárgula - O termo é originário do gargouille
Puppeteer’s Palm: .......................... Palma do Marionetista. francês, que em inglês provavelmente significa “garganta”
Scintillating Scotoma: ........................ Escotoma Cintilante. ou é conhecido como “esôfago”.
Yami Watari: ........................................... Travessia Sombria. Shoggoth:Vem dos Cthulhu Mythos, são seres amorfos,
uma massa protoplásmica viva que compõe os Shoggoths
é formada por um colóide translúcido, semi-fluido de as-
-Itens- pecto viscos.
Tradução livre & Curiosidades Skeletal Dragon: ................................... Dragão Esquelético.
Ubbo-Sathla:Vem dos Cthulhu Mythos, também conhe-
Axe Cyclone: ................................................Ciclone Machado. cido como a Fonte Unbegotten. É descrito como uma
Bell of Detecting Secret Doors: Sino Detector de Portas enorme massa protoplasmática que repousa em uma
Secretas. gruta bem abaixo da terra congelada. O ser é de uma
Bell of Opening Locks: ......... Sino Abridor de Fechaduras monstruosa fecundidade, gerando espontaneamente or-
Bell of Removing Traps: .... Sino Removedor de Armadi- ganismos unicelulares primordiais que fluem incessante-
lhas. mente de sua forma disforme.
Exchange Box: ............................................ Caixa de Câmbio. Undead: ................................................................... Morto-Vivo.
Nameless Spellbook: ... Livro das Magias Desconhecidas.
Vampire Blade: .......................................... Lâmina Vampira.
Warm Bottle: .................................................. Garrafa Morna. -Honoríficos & Tratamentos-
-Nomes-
Escuridão. Esse nome da equipe do Momon vem de 漆黒 (Shikkoku), é quase que uma
correlação com a equipe Espada das Trevas do Volume 2, 漆黒の剣 (Shikkoku No Ken).
Mas traduzir o nome da equipe do Momon para Trevas, ou traduzir o nome do finado
grupo para Espadas da Escuridão... ficaria meio estranho no meu ponto de vista. Então
fiquem cientes dessa correlação de nomes.
Papa-virgem. No original, o termo é algo como “Colhedora de Cereja”, que faz alusão à
gíria チェリーボーイ (Cherībōi) ou seja, Menino Cereja. Na cultura japonesa, são ho-
mens com pouca ou nenhuma experiência sexual. Não é um termo usado por aqui, então
foi adaptado para “virgenzinho”. Para não perder o sentido, adaptei o “papa-anjo” que
temos aqui, para algo mais específico, e assim surgiu “papa-virgem”. Já que no fim não
especificou preferência dela por idade, mas sim por ser virgem.
Ainda na Gagaran. Ela fala usando o pronome “Eu” como “Ore” (俺=おれ). “Ore” soa
informal e rude. Entre amigos é normal usar, mas, se usado em demasia, soa como se
fosse alguém mandão, masculino, superior. No caso, ela usar o “Ore” é no sentido de dar
ênfase a seu lado masculino. E como há 68 tipos de dizer “Eu” em japonês, não é fácil
adaptar isso.
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O Reino Re-Estize está sendo ameaçado pela “Oito Dedos”, uma organiza-
ção criminosa que governa o submundo do Reino. Sendo o tipo de mordomo
que é leal a seu mestre, Sebas vai para o Reino coletar informações sob o co-
mando de Ainz.
Climb está ansioso por causa sua de fraqueza, apesar de sua lealdade à
Princesa Dourada.
Após sua derrota humilhante nas mãos de Shalltear Bloodfallen, Brain re-
torna à Capital Real como uma casca vazia do guerreiro que já foi.
Com o Reino como palco, esses três homens juntos enfrentam a organiza-
ção clandestina, cada um com seus próprios motivos!
ISBN: 978-4047292598
ISBN: 978-4047292598
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