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RO Segismundo Spina, para explicar a teoria da influéncia provencal do amor cortés, ‘<0 cavaleiro, que j4 ndo andava fora, com tanta frequéncia, vivia mals na companhia da mulher ¢ da familia, O bara, no seu lar mals palaciano, comecou a constituir uma corte, onde tinham ocastio de flo- rrescer as gracas femininas e onde eram mandados os filhos ¢ filhas dos vassalos a aprender as artes ¢ as ‘maneiras (..); comecava a florir de novo a ura, a poesia, as artes manuais, a arquitectura surgiram para a vida, Nasce entio a cortesia e, portanto, o amor cortés». «eNeste tipo de cantiga, 0 trovador empreende a confissio, dolorosa e quase elegiuea, de sua angust- ante experiéneia passional frente a uma dama inacessivel a0s seus apelos, entre outras razies porque de superior estirpe social, enquanto ele era, quando muito, um fidalgo decaido, Uma atmosfera plangente, suplicante, de litania, varre a cantiga de ponta a ponta. Os apelos do trovador colocam-se alto, num plano de espiritualidade, de identidade ou contemplagao platénica, mas entranham-se-Ihe no mais fundo dos sentidos: o impulso erdtico situade na raiz das siplicas transubstancia-se, purifica-se, sublima-se, Tudo se passa como se o trovador «fingisse», disfargando com o véu do espiritualismo, obediente as regras de con- veniéncia social e da moda literaria vinda da Provenca, 0 verdadeiro e oculto sentido das solicitagies diri- gidas A dama, A custa de «fingidos ou incorrespondidos, 0s estimulos amorosos transcendentalizam-se, ‘gracas ao torturante softimento interior que se segue A certeza da inti! siplica eda espera dum bem que nunca chega. Fa coita (= sofrimento) de amor que, afinal, ele confessa. ‘As mais das vezes, quem usa da palavra é 0 préprio trovador, dirigindo-a em vassalagem e subser- viencia A dama de seus cuidados (mia senhor ou mia dona = minha senthora), ¢ rendendo-the o culto que 0 «servico amoroso> Ihe impunha, E este orfenta-se de acordo com uns rigide eédigo de comportamento Gico: as regras do «amor cortés», recebidas da Provenga. Segundo elas, ¢ trovador feria de mencionar ‘comedidamente 0 seu sentimento (mesura), 2 fim de nao incorrer no desagrado (sanha) da bem-amada; teria de ocultar 0 nome dela ou recorrer a um pseudénimo (senha), e prestarthe uma yassalagem que apresentava quatro fases: a primeira correspondia a condigho de fenhedor, de quem se consome em susp ros; a segunda é a de precador, de quem ousa declarar-se ¢ pedi; entendedor € 0 vamorado; drut, 0 amante. O lirismo trovadoresco portugués conheceu as duas dltimas fases, mas o drut (drudo em portu- gués) encontrava-se exclusivamente na cantiga de eseérnio e maldizer. Também a senha era desconhecida ddo nosso trovadorismo. © trovador, partanto, subordina todo o seu sentimento as leis da corte amorosa, € ao faré-lo, conhece as dificuldades interpostas pelas convencdes e pela dama no rumo que o levaria 2 con- secugio dum bet impossivel. Mais ainda: dum bem (¢ «fazer bent» significa corresponder aos requestos do trovador) que ele nem sempre deseja aleancar, pols seria por Zim ao seu (ormento masoquista, ou i ‘dumm outro maior. Em qualquer hipétese, s6 lite resta sofrer, indefinidamente, a coita amorasa. E ao tentar exprimir-se, a plangéneia da confissio do sentimento que o avassaia — apoiada numa melopeia prépria de quem mais murmura suplicstemene do que fala ~ vai num crescendo até a dltima estrofe (a estrofe era chamada, na lirica trovadoresca, «ie cobra); podia ainda receber @ nome de cobla ou de satho. Visto uma ideia obsessiva estar empolgans . o trovador, a confissio gira em torno dum mesmo rdcleo, para cuja expresso o enamorado no acha pals vras muito variadas, tho infenso e macigo € 0 sof ‘mento que 0 tortura, Ao contrario, parece que seu espirito, eaminhando dentro dum cireulo vicioso, acaba monotonamente, apenas mudando 0 grax: de lamento, que aumenta em avalanche até a0 fim. O estribitho ou refrdo, com que o trovador pode rematzr cada estrofe, diz bem dessa angustiante ideia fixa para a qual ele nao encontra expresso diversa. Quando presente o estribitho, que € recurso tipico da poesia popular, a cantiga chama-se de refrio. Quando ausente, a cantiga recebe o nome de cantiga de maestria, por tratar-se dum esquema estr6fico mais difill,intelectualizado, sem 0 suporte facllitador daquele expediente repetitive.» MASSAUD MOISES, op. cit, pp. 2528 de tre estrof F tiga t 20 ou! eres queo natur forma todos domé regras pectiv lessen espelh cesplen cavala era ur captur e repr fante para ¢ tho fo Order F natur dal, o <0 carfcter repetitive do nosso lrismo explica-se por razdes de ordem psicol6gica e artistica. Em pri- eiro lugar, a nossa poesia é mais do coracio que a poesia Provencal. Nesta, como vimos, a inteligéncia ea imaginagao suprem muitas vezes a falta de emocio. Por isso, a poesia se alonga, num recrelo dos sentides, através de sels e sete estrofes e mais ainda. O trovador compraz-se no jogo da sua fantasia, sente-se a divi- séria entre o artista eo homem, A nossa cantiga d'amor d-nos uma impressio diferente e de maior ver- dade psicoligiea. © amor, entre nés, é uma siplica apaixonadamente triste, E nao hii nada que exprima tio bem esse carfeter de prece do que a tautologia, a repeticio necessiria do apelo para alcangar um dom, que nio ‘chega mais. Por isso 0 nosso lirismo € por vezes um documentério precioso de poesia pura: todo se exala hum suspiro, numa queixa, numa efusio exelamativa. F uma vor. que vem dos longes da alma, A emogio tio se pulveriza em cintilagdes de forma artistica; sempre uno, o turbithio emocional permanece até 20 fim substancialmente 0 mesmo, com uma ou outra modificacéo levissima de forma, Isto dit cantiga d'a- ‘mor um cunho de obsesséo, de monotonia pungente, que resultaria fastidiosa se fosse desenrolnda em mals de trés ou quatro estrofes, Talvez por isso mesmo os trovadores limitassem a este mimero a reparticio estrfiea das cantigas. Para exprimir esta devoradora monotonia do nosso sentimentalismo os trovadores tinham jana can- tiga tradicional dois elementos que habilmente utilizaram: o paralelismo ¢ o refri, que se completam um 20 outro, Se o paralelismo exige que, pelo menos no inicio, as estrofes se assemelhem, o refr, que é muitas ‘vezes um verdadeiro mote e a alma da cantiga, determina necessariamente um mesmo teor para os versos ‘que o precedem. Por outras palavras: devendo todos as versos da estrofe confluir no refra, e sendo este, naturalmente, 0 mesmo para cada estrofe, é inevitivel a repetigao da ideia, com ligeiras variantes de forma» M. RODRIGUES LAPA, op it. pp. 1521133 © AMOR CORTES: FESTA E JOGO «0 espirito Kidico da cavalaria desabrocha nas gratuidades do amor cortés. Desde hi dois séculos, todos os poemas, todos os romances compostos para seu uso, convidavam 0 cavaleiro a amar. Os clérigos domésticos das cortes principescas haviam utilizado os recursos da anilise escotistiea para codificar em rregras precisas os ritos complexos, que na sociedade dos nobres deviam governar comportamento res- pectivo do gentil-homem e da mulher bem-nascida, Os livros que & noite todo o senhor ordenava que Ihe lessétit, rodeado da sua casa, a imaginéria que os ilustrava, a que ornamentava o marfim dos cofres e dos espelhos, difundiam largamente as prescrigbes desse ritual. Todo 0 homem, se queria ser recebido nas ‘assembleias cavaleirescas, devia conformar-se a ele. Era obrigado a escolher uma dama e a servi-la. No ‘esplendor da sua juventude, o rei Eduardo II de Inglaterra aspirava a tornar-se no seu tempo o modelo da cavalaria, Era casado ¢ a rainha dava-Ihe belos filhos. Ela possufa todas as virtudes da perfeita esposa € era um bom casamento, Eduardo foi um dia ao castelo da senhora de Salisbury, cujo marido, seu vassalo, capturado ao seu servigo, se encontrava entio na prisio por sua causa. Eduardo solicitou o amor da dam ¢ representou durante um serao, diante das gentes da sua escolta, o jogo do coracéo cativo, do amor triun- fante mas impossfvel. Com efeito, «Honra ¢ Lealdade proibiam-Jhe por 0 seu coracao em tal falsidade, para desonrar tio nobre dama ¢ tio leal cavaleiro como era seu marido. Por outro lado, Amor obrigava-o tio fortemente que vencia e dominaya Honra e Lealdade>, E foi talvez para a dama eleita que fundou a Ordem da Jarreteira, que ordenou as festas e escolheu a divisa. Festa e jogo, 0 amor cortés realiza a evastio para fora da ordem estabelecida ¢ a inversio das relagies naturais. Adiltero por principio, comeca por desforrar-se das servidées matrimoniais. Na sociedade feu- dal, o casamento visava aumentar a gléria e a riqueza duma casa, O negécio era tratado friamente, sem curar dos impulsos de coragao, pelos mais velhos das duas linhagens. Fstes fixavam as condigbes da troca, da aquisigéo da esposa, que devia tornar-se, para o futuro senhor, guardia da sun morada, ama dos seus sp ceriados ¢ mae dos seus filhos. Era preciso sobretudo que fosse rica, de boa estirpe e fiel. As leis sociais BO ameagavam com as piores sangées a esposa adiiltera e aquele que tentasse desvid-la. Mas concediam toda 1 liberdade aos homens. Complacentes, damas nao casadas oferecem-se em cada castelo aos cavalciros andantes das narrativas corteses. O amor cortés nao foi portanto simples divagacio sexual, E eleigio. Rea- liza a escotha que o processo dos esponsais proibia. No entanto, o amante nao escolhe uma virgem, mas a muther de outro. Nao a toma por forga, conquista-a, Perigosamente. Vence pouco a pouco as suas resistén- cias. Espera que ela se renda, que the ceda as seus favores. Para esta conquista desenvolve uma estratégia ‘inuciosa, que aparece de facto como uma transposicao ritualizada das técnicas da cagada, da justa, do assalto das fortalezas. Os mites da perseguigao amorosa decorrem como cavalgadas na floresta. A dama leita é uma torre cercada. Mas esta estratégia coloca o cavaleiro em posicio de serviddo, O amor cortes inverte, ainda aqui, as relagdes normais. No real da vida, 0 senhor domina inteiramente a esposa. No jogo amoroso, serve a ddama, inclina-se perante os seus caprichos, submete-se &s provas que ela decide impor-Ihe. Vive ajoelhado diante dela, ¢ nesta postura de devotamento se encontram desta ver traduzidas as atitudes que, na socie- dade dos guerreiros, regulavam a subordinacio do vassalo ao seu senhor. Todo 0 yocabulirio e todos os estos da vida cortés saem das formulas e dos ritos da vassalidade. Em primeiro lugar, a prépria nocio de servico e 0 seu conteddo. Como o vassalo para com o senhor, o amante deve ser leal para com a dama. Empenhou a sua £6, nio pode traf-la, e este lago niio é daqueles que se desatam, Mostra-se valente, com bate por ela, ¢ so as vit6rias sucessivas das suas armas que 0 fazem avancar mos seus eaminhos. Final- mente, deve rodeé-la de atencio. Faz-Ihe a corte, o que quer dizer que a serve ainda, tal como os vassalos rreunidos em corte feudal em redor do seu senhor. Mas, como 0 vassalo, 0 amante entende que por esse ser- vico obters um dia recompensa e ganharé sucessivos dons. Neste plano, o jogo do amor sublima o impulso sexual ¢ transpde-no, Nao que ele se queira inteira- mente desencarnado. Os esforgos da Igreja para domar a vida cortés chegaram a suscitar no século XIIL alguns poemas que desviavam a atitude amorosa do seu objectivo carnal ¢ a transferiam para 6 mi cismo, Esta fransmutagio religiosa ¢ abstracta culminou cerca de 1300 no dolce stil nuovo, Mas, no comum dos ritos de corte, o amor vive da esperanca dum triunfo final que levaré a dama a entregar-se toda, uma vit6ria secreta e perigosa sobre a proibicao maior € sobre os castigos prometidos aos amplexos adiilteros. Contudo, enquanto a espera dura, e convém que se prolongue por muito tempo, 0 desejo tem de satisfazer- -se com pouco, Ao amante que quer conquistar a eleita, importa que se domine. De todas as provas que © amor Ihe impée, a que tem 0 mais claro simbolo das necessidades do prazo consentido € «a experiéncia> {que as cangées dos trovadores celebram: a dama ordena a0 cavaleiro que se deite ao lado dela, em comum rnudez, mas que domine o seu desejo. O amor reforga-se nesta disciplina e mas alegrias imperfeitas dos afa- 20s comedidos. Os seus prazeres tornam-se ento sentimento, A centelha amorosa nio reiine corpos, mas coragées. E quando Eduardo contemplou Joana de Salisbury, poe-se a «pensar», Os clérigos ao service dos principes feudais tinham procurado em Ovidio os ornamentos duma psicologia do amor terrestre. ‘Além disso, no préprio momento em que as regras da cortesia se impunhiam pouco a pouco a cavalaria do Ocidente, 0 eulto de Maria invadia a cristandade latina, Nos progressos da sua conquista, a espiritualiza- ‘gio do instinto sexual ¢ a transferéncia dos valores femininos para a pledade enriqueceram-se com uma rmiitua permuta. A Virgem depressa surgi como a Dama por exceléncia, Nossa Senhora, que cada um de amor. Quiseram-se dela imagens elegantes, graciosas, sedutoras. Para melhor ati coracio dos pecadores, as Virgens do século XIV mostram-se toucadas, penteadas, ataviadas como prince- sas corteses. Ia fantasia divagante de certos misticos aventurou-se por vezes na contemplacao dos seus encantos corporais. Inversamente, a dama eleita esperon do seu amante sinais de devogio, laudes que fos- sem buscar as suas metéforas aos cantos do amor mistico. Os reflexos duma piedade que se tornava um caso sentimental aureolaram as alegrias mundanas. ‘© amor cortés continuou a ser um jogo, um divertimento secreto. Vive de piscadelas de otho cdéimpli- ces. Discreto, dissimula-se sob aparéncias enganadoras. Maseara-se sob 0 esoterismo do trobar clus, dos gestos simbélicos, das divisas de duplo sentido, duma linguagem que s6 os iniciados sabem decifrar. Por esséncia, e nas formas que exprime, é todo ele fuga para fora do real, como a festa. E um intermédio apai- xonante, mas de total gratuidade, que nao compromete o fundo da pessoa» (GEORGES DUBY, 0 Tempo das Catedais (1979), pp, 252255 fa: ac tor qu ui ali ed qui ef qu mu 20 pos 3 = Tome 6 salar, (provenca disso, a7 gus: aveis 15 — vena cen 23 porge View donas, senhor, en cas d’el-rei, fremosas e que parecian ben e vidonzelas muitas u andei e,mha senhor, direi-vos ia ren: ‘a mais fremosa de quantas eu vi long’estava de parecer assi Come vés; e muitas vezes provei* se veeria de tal parecer alga dona, senhor, quero-vos al dizer: i» amais fremosa de quantas eu vi long'estava de parecer assi Come vés; e, mha senhor, preguntei por donas muitas, que of loar de parecer, nas terras u andei, ee 5 e,mha senhor, pois mas foron mostrar, _ ‘a mais fremosa de quantas eu vi if Tong’estava de parecer assi Son Aises de Santiago (CV S34/CBN 890) 1 coin; 2 ~ experiment, sTAO DE ACTIVIDA DES Em trabatho de grupo, propde-se que os alunos 1. coniultando livros de historia, enciclopédias ¢ outros ¢ ainda o vol. J de Aula Viva, elaborem wm texto com as caractertsticas da sociedade feudal europeia desde o séc. XI até ao séc. XIV (inclusive), com especial desiague para as relacdes entre os vassalos ¢ os senhores, os cavaleiros ¢ os reis (poderdo pedir a ajuda aos professores de Histéria); 2. depois da leitura dos varios textos e do seu aperfeicoamento e enriquecimento pela discusséio aberta, registem o texto final; 3. encontrem, nos poemas subordinados ao titulo «ldeatizacdo postica da mulher», elementos comuns ‘quanto & forma e ao contetido; 4. concluam se 0 modelo de mulher af poetizado corresponde a aspectos de uma realidade social ou é pura invenedo de poetas, apoiando-se ainda na leitura do HORIZONTE CULTURAL 0 FENOMENO DA POETICA DO AMOR CORTES: POSSIVEI EXPLICACOES Para a explicagio do aparecimento duma poesia que glorifica o amor como sentimento transfigurar a pessoa humana tém sido apresentadas varias teses, Afirmam uns que 0s poetas occitinicos (provencais) terdo conhecido a poesia clissica, sobretudo a «Arte de Amar» de Ovidio, e que terao trans- posto alguns dos seus t6picos como o elogio das virtudes da mulher que corresponderia ao elogio dos sobe- anos, o da nobreza de alma que conquista. No caso do amor cortés, pela exaltacio amorosa, 0 vilio pode- ria tornar-se cortés. Todavia os antigos consideravam o amor como um elemento perturbador, enquanto ‘6s trovadores cantavam 0 seu poder ideal. Procuram outros encontrar correspondéneia na poesia drabe na qual perpassa um certo platonismo, exaltando o amor ideal, Mas os drabes atribuem quer A mulher quer av homem o grau de sublimidade através da forea do amor, ‘Ainda outros procuram no folclore o fundamento para a explicagio da poesia cortés. Nao i david de que as festas pagis da Primavera e das flores de Maio exprimem uma alegria erdtica muito forte que se casaria bem com 0 conceito de amor livre ¢ anticonjugal da poesia provencal, Mas 0 carficter aristocré- fico da cangio provencal nio pode ser explicado apenas por essa influéncia popular. Ha que encontrar outras hipéteses. ‘A liturgia eatética estaria na base desta poesia. A Igreja sempre celebrou o culto de Nossa Senhora como a mulher perfeits ¢ ideal, diante da qual o eristio se deveria prostrar e 2 qual deveria adorar. Mas, ‘como jé se sabe, 0 amor cortés cantado pelos provencais trazia consigo 0 estigma do amor adulterina, 0 ‘que obriga a encontrar ainda outras influéncias, "Ao mesmo tempo e no mesmo espaco ~ na Provenca — apareceu uma heresia poderosa que fot comba- ‘ida, em tipo de cruzada, pela Igreja, mas defendendo um conceito de amor muito préximo do dos trova- dores: os citaros. Provinda do maniqueismo, defendia a dualidade radical dos seres: 0 bem e o mal, Deus ¢ ‘0 Diabo. Rejeitando quase tudo o que a Igreja Catélica defendia, tinha uma concepgio estranha acerea do ccasumento: os puros ou perfeitos obrigavam-se a abster-se de todo o contacto com suas mulheres se fossem easados, ou nao casavam, 0s imperfeitos tinham o direito de se casar mas vivian condenados pelos puros. (© casamento era um pacto com 0 Diabo, Nao podendo exciuir a unio sexual necesséria para a continua- fo da espécfe humana, cantavam o amor livre, fora de todos os lagos matrimonials. Hi, efectivamente, ‘uma relacio entre o amor dos trovadores e 0 amor dos cétaros. Em ambos 0s casos, procurava-se um esquecimento do corpo a fuga ao amor interessado do casamento. A aparigio da amada perfeita ~ na teoria cétara, a alma era bissexual antes de encarnar no corpo miserdvel - salvava o trovador, abafando todos os desejos corporais. Mas ha diferencas assinalaveis porque 0s cétaros afirmaram sempre a superio- ridade do homem sobre a mulher. Hi que procurar ainda outras fontes. Por manifesta falta de espaco no 0 fazemos aqui, convidando os alunos 2 uma investigagdo sobre este assunto, Mesmo assim, em jeito de conclusao, transcrevemos as palavras de Denis de Rougemont in O Amor ¢ 0 Ocidente, p. 98-107, com supressées «Uma heresia neomaniquefsta, vinda do Préximo Oriente pela Arménia ¢ pela Bulgéria bogomil, a dos «homens bons» ou Cétaros, ascetas que condenavam 0 casamento mas fundaram uma . D.San- iti ra ld de nora $6 anscrt, ano do rd sido cerca de fox meus hos ver. 1. Caracterizar 0 trovador, fazendo o levantamento de todas as expressdes ¢ palavras que nos mostrem os seus sentimentos. 2. Apresentar os motivos desses sentimentos. 3. Organizar um dossier de textos sobre a condicdo da mulher medieval, apoiando-se na leitura do HORIZONTE CULTURAL 0 culto eavatheiresco da mulher ideal nao deve, também, tomar-se & letra, Tratava-se de uma con- vengio limitada a um cérculo muito restrito de homens, cada um dos quals se consagrava ao servigo de determinada mulher, nao Ihe importando proceder em relacao as outras como Ihe aprouvesse, a comecar pela sua propria, «Ser casado», diz a primeira regra do manual de amor cortés redigido por André, eape- lio do rei de Franca, «no constitui justifieagio para nfo se ficar apaixonado». Recomendagio supérflua ‘numa époea em que 0s casamentos eram arranjados pelos pais, por razées de conveniéncia, quando mul- tas veres os futuros esposos eram ainda criancast Casadas, frequentemente, aos doze ou treze anos, ¢ por vezes com um rapaz de eatorze ou um homem de sessenta, submetidas a uma autoridade marital que, embora suavizada no decurso dos séculos, continu- ava a receber o sustenticulo forte do direito, da religiso e dos costumes, expostas com excessiva frequéncia aos perigos, entio muito grandes, do parto, seriam as mulheres do século XIll mais infelizes que as de hoje? Do mesmo modo que a igualdade dos sexos ¢ 0 conforto material nio asseguram o éxito de todos os casais modernos, também cremos que a desigualdade e as atribulagdes da vida medieval nao imposstbilita- rama felicidade conjugal, A vida, tal como a encarava a mulher medieval, era dura para os homens tam- bém. A sua propria sujeigio, quinhio de todas as outras mulheres, nao constituta injustiga pessoal, mas antes um inforténio na prépria ordem das coisas. E se ninguém contestava que 0 marido podia bater na ‘mulher «com conta, peso e medida», nao faltam provas de que mulher por vezes Ihe pagava na mesma moeda. 'A vida da mulher nio se limitava A asa, A igreja € aos fithos. Existiam dangas para todas as classes, ceangées para todos as gostos, faibulas para as poucas mulheres que sabiam ler ¢ para as muitas que que- iam ouvir. Um dos seus jogos favoritos, a eabra-cega, parecer-nos-ia pueril se nio nos lembréssemos des- sas jovens casadas de doze anos. As mulheres eram por vezes mais dotadas que os homens para o desporto elegante da caga com falco; Joao de Salisbury constata o facto e explica-o, dizendo que «os piores elemen- {os estio sempre mais dispostos a rapina». Se a moda variava menos que em nossos dias, ftas, produtos de beleza e eremes custavam relativamente pouco e vendiam-se muito, Fora dos conventos, as profissées permitidas as mulheres eram poucas; ocupavam-se em mungir, fiar, preparar cerveja, Acrescentemos os casos em que a vitiva do tecelio continuava no oficio do marido, em ‘que a mulher do mercador se ocupava dos negécios enquanto 0 marido viajava, em que a filha do senhor administrava as terras do castelo, esperando que se the encontre um companheiro digno, ROBERTO S. LOPES — Nascimento de Europa, Lisboa, Cosmas (1955) pp. 349-380. oa E DE ede una ethos, da ens n= ho. 0 ini ig, Lene ‘a es Carotina sigdo em vis pct. Pe dio de adores. i de om ‘Ma senhor fremosa, direi-vos fa ren: ‘vés sodes'mha morte e meu mal e meu ben! E mais... porque vo-lo-i eu jé mais a dizer?” Mba morte sodes, que* me fazedes morrer! + Vés sodes mha mort'e meu mal, mba senor, ce quant’eu no mund’ei de ben e de sabor!* Ermais... porque vo-lo-ei eu ja ma ‘Mha morte sodes, que me fazedes morrer! Mha mor’e mina cpita sodes, non & ial, © 08 vossos olhos mi fazen ben e mal! mais... porque vo-lo-i eu jé mais a dize?.. ‘Ma morte sodes, que me fazedes morrer! Senor, ben me fazen soo de me catar,® pero ven-m’en coita grand’; € vos diet ar: E mais... porque vo-lo-ci eu jé mais a dizer? ‘Mha morte sodes, que me fuzedes morrer! ‘Nuno Eanes Cerz (CA 386)CBN 106) adizer?.. PERFIL BIOGRAFICO. De Nunes Eanes Cerzeo quse nada se sabe. Segundo Carolina Michatlis (CA, Ip. 580), seria ‘um trovador possvelmente um ei. PERFIL POETICO £ autor de cantigas de amor. Conecedor dos segredos da ane potce, consriu poems sexundo ssquemas novos, iberando-se do expan dos ati- Fclalismos foams Culvou especies pouco wsndat ‘em Portugal, como o descordo insero ne pig. 84 T= a0it,2~ porque hed vllar a det lo?:3~ porque: 4 ~prazer;5~ Senhora, facem-me em ws de me ola ‘Senhor, eu vivo coitada vida, des quando vos non vis Eu vivo por v6s tal vida «que nunca estes olhios meus mais, pois vs queredes assi, 's dormen, mh senhor; , por Deus, ‘por Deus, ' senhor ben talhada,' que vos fez de ben comprida,* 5" querede-vos de min doer” {querede-vos de min doer ‘ou ar” leixade-m'ir morre. ‘V6s sodes tan poderosa ‘ow ar leixade-m'ir morrer. Ca, senhor, todo® m"é prazer de min que meu mal e meu ben mn quant’i v6s? quiserdes fazer. cen v6s € todo; fe] por‘ en, 1» por Deus, mha senhor fremosa, querede-vos de min doer (ou ar leixade-mm'ir morrer. T formosa: 2 ter dé; 3 pelo comrérios#~ pare respi D.Dinis (CV 1851CBN S17) in (efore-se ao v. 7) 8~ comprida de ben=perfelta; 6 tudo; 7 a esse 1. Ler expressivamente os poemas subordinados ao tema: indiferenca cruel da «senhor» e a aspiragao & samorte de amor». 2, Justificar com elementos textuais a aftrmacao de que as nossas cantigas de amor stio um repetir mond- ono da necessidade de «ver a «senhor 3. Indicar as etapas do percurso lirico do texto «Como moire quem nunca ben». 4. Comentar a nogiio da «coita» de amor com base nos textos poéticos e na leitura do HORIZONTE CULTURAL 0 tema da «morte de amor» , «expressiio bem pertinente ao conceito ¢ também a pratiea de um amor @ ‘em oposicao a ordem social estabelecida, ele préprio criador de ordem nova, tem entre nds repereussio {que o pendor feminino da nossa sensibilidade, romantica avant la lettre, néo podia deixar de agravar>. LHERNANI CIDADE, © Concito de Poesia como Expresso da Cultura “Mais sentimentais ¢ menos intelectuais do que os provencais, os nossos trovadores softem a «coita» de ‘amor, Nio Ihes basta o cantar das perfeicbes idealizadas, a aspirago ao inacessivel nao os satisfaz, O canto do amor doura a poesia mas esvazia a vida de sentido e leva a loucura ¢ a «morte». ‘A nossa cantiga de amor 6 um repetir mondtono da necessidade vital de «ver» a «senhor>, de a sentir presente. Realidade e ficgao entrelagam-se e aquela sobrepée-se, por vezes, a esta, Todavia, a afirmagio da ‘ ANTONIO JOSE SARAIVA ¢ OSCAR LOPES, op it, 5657 ed Mc que que que he vac af agu oje pp patio: 5 lenpo de fi does 1p re Os que non aman nen saben d’amor fazen perder aos que amor an; vvedes por qué: quand’ant’as donas van, juan que morren por elas d’amor elas saben pois que non € si, € por esto perg’eu' €.05 que ben Jealment’aman, segundo meu se. Ca, se elas soubessen os que an ben verdadeiramente grand’amor, alguen se doeria sa senhor, ‘mais por'aqueles que o jurad’an ccuidan-s’elas que todos taes son, € por esto perg’eu ¢ 0s que ben Tealment’aman, segundo meu sen. E aqueles que jé medo non an que Ihis faca coita sofrer amor, vveen ant’elas ¢ juran melhor ‘ou tan ben come os que amor an elas non saben quaes creer, € por esto perg’et € 0s que ben Tealment’aman, segundo meu sen. Eos ben desemparados* damor jjuran que morren con amor que an, seend’ant'elas, ¢ menten de pran,? ‘mais, quand’ar veen os que an amor, jiéelas cuidan que veen mentir, ‘por esto pery’eu € 0s que ben Tealment’aman, segundo meu sen, oan Bavece (CV 699/CBN 1041) T= perco; 2~os que ndo amam; 3 ~ cloramente SUGESTAO DE ACTIVIDADES PERFIL BIOGRAFICO De Joan Baveea pouco ese, Segundo Cato lina Michal, tra sido um segrel galego da corte dd D. Afonso X. Ours, porém, considera um ogni, E possivel qu o apelito tena oiger numa lun, denancudora da vida qe levava: tavern = = bobo, PERFIL POETICO ‘Segundo José Joaquim Nunes, pretendeu . Aceste ideal de amor corresponde certo tipo idealizado de mulher, que atingiu mais tarde a mixima depuracio na Beatriz. de Dante ov na Laura de Petrarca: 0s cabelos de oiro, 0 sereno ¢ lumninoso olhar, a mansidao e a dignidade do gesto, o riso subtil e disereto. As cantigas de amor oferecem-nos uma e6pia bem rude e desfigurada do retrato original pintado pelos trovadores provencais, referindo-se ao (olhar) da «senhor», ao seu «prez» ou «bon rilr>, ete. também com os provencais que os poetas dos Cancioneiros peninsulares aprendem a objectivar paisagens. A descricio das flores de Malo, da brisa exeitante da Primavera, do cantar malicioso dos rouxi- iis so temas obrigat6rios dessa lirica cortes.(. Resultado da influéncia provencal ¢ ainda o esbogo de anélise introspectiva que se encontra em alguns dos trovadores peninsulares. © sentimento dos contrastes do amor ~ do querer e do nao querer, da imide e da violéncia impulsiva do desejo, do doce-amargo da saudade - siio temas muito correntes entre «0s Provengais, que os transmitiriam a Petrarea, em quem por sua ve7 iro aprendé-los Bernardim Ribeiro ¢ Camoes. OS poetas dos Cancioneiros galego-portugueses néio os desconhecem, mas repetem-nos um pouco como formulas decoradas e reduzem-nos quase sempre a breves esquemas verbais exprimindo tnk- dade na contradigio, como prazer-pesar, viver-morrer, bem-mal. Basta um breve confronto para revelar que as qualidades caracteristicas da poesia trovadoresca pro- veneal se degradam ao serem adaptadas & lingua e 2o estilo dos trovadores peninsulares. A nitidez descri- tiva, a introspecci, o britho e a justeza das analogias e imagens, tudo isto se embacia nas paginas dos nos- 50s Cancioneiros. As imagens quase aqui nao existem até ao ponto de brilhur pela singularidade um poeta ‘que diz ser a sua dama como um rubi entre as pedras; 0 retrato da dama é extremamente vago ¢ convenci- ‘onal; s6 numa ou nontra pastorela se encontram alusoes descritivas ao mundo das plantas e aves; a anil dos sentimentos estereotipa-se. Por ontro lado, a poesia occitinica caracteriza-se por uma grande varie- dade de temas, mas a monotonia domina o conjunto dos cantares de amor recolhides nos Cancioneiros peninsulares, exceptuando um ou outro poeta, como Airas Nunes, que descreve a Primavera, que nota 0 contraste entre a constincia dos sentimentos e a mudanca das estacoes, ou como Joao Garcia de Guilhade, que se arma de ironia no jogo do amor. Mas a diferenca entre o lirismo provencal ¢ o dos Cancineiros peninsulares revela-se prineipalmente ta estrutura formal, O género proveneal earacteristico, a cansé (cangio), nio se aclimatou na Peninsula, 2 rio ser muito mais tarde, no século XVI, por influéncia de Petrarca, As cantigas de amor sem refréio nem repetigdes ~ conhecidas pelo nome de «eantigas de meestria» por serem aquelas que exigiam maior conhe- ‘cimento da técnica provencal - constituem minoria. O refréo encontra-se, efectivamente, na maior parte das cantigas de amor, assim como o paralelismo, embora atenuado e por vezes mascarado. O poeta galego- “portugues $6 por excepgao desenrola um pensamento com principio, meio e fim ao longo de uma série de estrofes; prefere o processo de repetir em eada estrofe, variando palavras e rimas, a mesma ideia. ANTONIO JOSE SARAIVA ¢ OSCAR LOPES. op. cir. p. 57-60 & eo 20 HORIZONTE CULTURAL «Outras cantigas fazen os trobadores que chamam fengoens, porque son feltas per mancira de razom que um aja contra outro, en que diga aquelo que por ben tever na prima cobra ¢ 0 outro responda-the nia outra, dizend’o contrairo. Estas se poden fazer d'amor, ou d'amigo, ou d'escarnho, ou de maldizer, pero ique deven de seer de meestria, E destas poden fazer quantas cobras quiseren, fazendo cada um a sua parte; se i ouver d'aver flinda, fazem ambos senhas (ou duas) ea non convén de fazer cada um a mais cobras nen mais findas que 0 outro.» (CBN. Arte de Tovar, Tit IC. VIL Joseph Anglade in op. cit., pags. 61-62, define assim a tenson provencal: «C'est une sorte de discussion ‘poétique sur une question quelconque. (..) L'origine n'en est sans doute pas tout & fait popuaire; i faut la chercher peut-étre dans la coutume qui consiste & organiser un concours de poésie sur un theme donné. (..) Une question importante se pose & propos de la tenson: une tension a-t-elle pour auteurs les deux per~ sonnages qui sont mis en se’ne? Ou n'ayons-nous affaire ici qu’a une fiction et Ie méme podte exposait-il tour A tour ses propres idées et celles de Son interlocuteur? II semble bien qu'il faille admettre dans beau- coup de cas deux auteurs différents.» © lais 6 uma «cangio de cardcter lirico, cuja melodia musical é seu elemento primordial. Os iais foram primitivamente composigées cantadas por jograis da Gra-Bretanha, século XIT> 'SEGISMUNDO SPINA, A Lica Trovadeyesea pAUL-412 Carolina Michaélis classifica-as como . (0s alumos podem ler narrativas do ciclo bretio no 1! vol. deste manual. Descordo € um «tipo métrico isossilibico, das cantigas d'amor, em que o poeta, variando os metros, procurava mostrar a inquietagio do seu espfrito ocasionada pelo objecto da sua paixio. Essa irregulari- dade estr6fica supunha variedade na melodia musical» : SEGISMUNDO SPINA. opt. p.394 a mesma definigio que J. Anglade escreve em Les Troubadour, pig, 71: «Pour mieux marquer sa tristese om son core de voir ses sentiments amoureux non protégés, un troubadour composait un des- ort, est 4 dire, une posse lyrique d'un rythme et d'une melodie assez libres: cette composition margu Vétat deson me» ‘Celso Cunha afirma in Dicionério das Literaturas Portuguesa, Galega ¢ Brasileira, pigs. 413-414: «As snco composigbes galego-portuguesas do género assemelham-se ao descort comum provengal, isto é, sio Cantos magoados em qué a dseordéncia dos sentimentos do trovador e da dama se retrata,expre mente, na desigual forma dos versose da estrofe» eg oro — | onsecro | amasulio:o amigo feminine: a dona, a asenbor» i { ‘a natureza amiga econfiderte ‘montana ocampo | wemida ‘a narrezaconvencionads || 1 desrigo das flores de Malo, de bisa da Prise ‘era ¢ do cana do rouxinal x Io, vei, ods cio cod, i, pee ee ace ‘avtocaracterizagio | fremosn, delgada, talhada, | autocaracterizagio | servidor, enlouquecido, dosuio | ten poste tote ae | a +} | | qualdades fisicas: femosura, | \ | | ‘eld, co delgado | cu casos dieaanene ps infra | cantina | ontdades mora: Donia, | | CARACTERIZACAO | ‘ges do sujeito como mentiroso, traldor, fre- | ditecta: ‘ealdade, compride de ben dootjeao froooexs eu induectanente ves Gere. | amu | qualidade soca: bo 0, m3) | terengio do mii. | teat coma, faurmaitea | | vanes genic oo, i | rt valor emcee | t — al | | Regn do amor cons | | | sofrer quando cla quisee | | Vassiagen | jd mene | | revacioxamenro | pan deigunss mores | fapet ose pez | | eeoaseincocne | tint ms tis | doraoto | nomi (feahlor | | pretarslgem | rewior | | ‘enencedor | | ACORTE, || =o ambien conssto | a sociedade contest sé. XIEIV ‘sega de amare de ser ‘amg de mest (ram) ‘made | | oseotimento | atristezadaaustnciado | osentimento | cota de amor tones moron | amigo | torso | oamorintee | ‘stad do paste, 0 | cme ea vinganga, ef. + t camciga de mesa caicionlprlelinmo prt cantga de esto | srkuTURA contig de elise. antgn com doe, mozdote, ids, atainda |

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