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Aspectos psicolégicos do paciente coronariopata portador de hipertensao arterial BELLKISS WILMA ROMANO O controle da hipertensao arterial e da doenca arterial 4 em ansiedade, depressdo, interagdo social, manifestacao corondria implica a intervencao em fatores de risco afetiva e outros pardmetros de ordem exclusivamente psi ‘multivariados, que compreende a mudanga no estilo de vida. quica. Para isso é preciso que a reducio de peso, de sddio, de Alcool e de tabaco e o exereicio fisico sejam entendidos como _Palavras-chave: hipertensdo/coronariopatia/Psicologia, tendo embutida a compreensdo do significado psicolégico _ hipertensdofcoronariopatia/aspectos psiquicos. que essas substincias estavam assumindo na vida dessas pes- soas. Com essa orientagao, compulsoriamente interferir-se- HiperAtivo 1999;1:57-60 Instituto do Coragao — HC-FMUSP Endereco para correspondéncia: Av. Dr. Enéas de Carvalho Aguiar, 44 — CEP 05403-900 — Sao Paulo— SP INTRODUGAO E nesse ponto que os aspectos psicolégicos tornam-se importantes — alids, muito mais do que se pode avaliar & A partir dos resultados apontados no Estudo de primeira vista. Ingenuamente, poder-se-ia supor que estari- Framingham, muitos outros estudos epidemiol6gicos suce- am vinculadas &s medidas antiestresse, conforme nomeadas deram-se, de forma a tornar indiscutivel que a hipertensio nos Consensos citados. Mas a contribuicao/interferéncia do arterial € um fator de risco para a doenga aterosclerstica _ pardmetro ps{quico é mais embutida do que aparenta. Se no, coronéria*, acelerando a aterogénese em cerca de duas a vejamos. trés vezes™. Actescente-se que também aumenta a probabili- dade da ocorréncia de hipertrofia do miocérdio e de disfungio + CONTRIBUIGAO/INTERFERENCIA DO renal, PARAMETRO PSIQUICO Como € alta a prevaléncia de hipertensio arterial na po- pulacdo adulta em geral (1:4 segundo o Fifth Joint Na instalagio do mal Committee), pode-se afirmar que cerca de 35% dos eventos. A experiéneia clinica aponta que o paciente faz imediata- cardiovasculares sejam desencadeados por ela". mente e sem relutancia a ligago entre as alteragdes de seu ‘Ocorre que a ago médica no tratamento da hipertensiio estado emocional, situacées cotidianas e problemas familia- arterial focalizado primariamente no controle da pressio san- res com a elevagio de pressio. guinea, sem considerar em profundidade outros fatores que __Classicamente também esta descrita a personalidade com- contribuem para a doenga aterosclerética, tem seus efeitos _petitiva, host, dependente de trabalho e da preméncia de tem- muito limitados®:". po para pacientes que apresentam doenca coronéria. Uma vez reconhecida essa ligagio — hipertensio ar- terial e prevaléncia de doenga arterial coronéria —€ obri- No conhecimento que o paciente tem sobre o mal gal6rio que haja atuagdo na busca da redugdo dos riscos _Zerwic e colaboradores"™” avaliaram 0 quanto os pacien- multivariados para ambos os males", Em decorréncia, tes coronariopatas conheciam sobre sua doenca. Curiosamen- firmam-se os Consensos para controle de hipertensiio ete, quando se falava sobre fatores de risco para a populacao fatores de risco, enfatizando a ago por meio de medidas _ em geral, cerca de 80% conseguiram nomear pelo menos um ndo-farmacolégicas °:"*" associadas as farmacolégicas. dentre os seguintes fatores: fumar, hipertensao arterial © HiperAtivo, Vol 6, Ne 1, Janeiro/Margo de 1999 87 ROMANO BW Aspectos psicotbgicos do paciente coronarlopata portador de hipertensio arterial hipercolesterolemia, Mas apenas 64% dos que eram fuman- tes reconheceram 0 fumo € 15% dos que eram hipertensos reconheceram a hipertenso como fatores de risco em seu caso especifico. Is ue os Esse dado ¢ relevante quando se discute mudanga de esti- lo de vida e aderéncia a0 tratamento. Dessa forma, fica refor- cada a tese de que, além das informagdes gerais, 0 paciente deve receber atencio e orientagdes individualizadas sobre seu perfil de risco e sobre seu tratamento. Particularmente tratan- do-se de pacientes hipertensos que podem nao perceber 0 aumento de seu risco para doenca cardiovascular". Na reducio de peso E também freqiiente os préprios pacientes associarem seus estados emocionais & ingestio aleatéria de alimentos. Alias, . Esta, por sua vez, esté diretamente relacionada (pela mie que alimenta, segundo a Psicanéli- se). Assim, em programas de emagrecimento, deve ser consi derado 0 componente psicol6gico do si - Em nosso meio,"® desde as primeiras orientagdes sobre redugio de peso, conta-se com a presenga de um psicélogo para esclarecer sobre: compensacao alimentar na presenca de nervosismo, estresse, insatisfagto, solidio e outras situagées. As recomendagdes do nutricionista e do psicélogo também pressupdem a valorizacao das atividades de lazer e/ou profis- sionais, além do exercicio fisico como recursos para aliviar ‘as tensGes do dia a dia, para preencher horirios livres de for- ‘ma a no ocorrer a supervalorizagao do alimento. No uso de alcooV/tabaco Atualmente, tanto 0 dlcool como 0 tabaco slo estudados como drogadicao, sendo-thes reservado um capitulo dentro da psicopatologia"”. J4 vai longe, entao, a época em que a sociedade os reconhecia como glamurosos. CO paciente faz uso de drogas quando sua estrutura interna € fragil. E pelo uso do Alcool e do fumo que buscam esquivar- ‘se do.contato com seus problemas emocionais. Evitam a emer- ‘géncia de seus intensos sentimentos de angiistia e ansiedade ‘com 0s quais ndo se sentem capazes de lidar. Frente a situa- ‘des conflitivas, principalmente que envolvam interac s0- cial e exposigao de afeto, o paciente precisa do alcool/tabaco para enfrentar 0 mundo. Assim, as orientagdes para dlcool/tabaco devem sempre estar alicergadas em duas fases distintas 58 HiperAtivo, Vol 6, N° 1, Janeiro/Margo de 1999 ‘Na atividade fisica e no controle do estresse Na vida moderna, a atividade fisica foi substitufda por atividades intelectuais, resultando em um ser com estresse mental e com ansiedade". O combate ao sedentarismo é um método muito ttl tanto para modificar os fatores de risco como para intervir nos as- pectos psiquicos, retroalimentando-se num circulo. Assim, ‘quanto mais sedentério, menos o paciente tem vontade para iniciar a atividade fisica, ficando mais deprimido, sentindo- se menos capaz.de intervir no rumo da doenga ¢ em sua vida, ficando mais “doente”, com menos vontade de intervir, mais sedentério, ‘Ao lado de promover mudangas no peso, concentracao de lipides, tolerancia & glicose, pressdo arterial e capacitagao fi- siva, aatividade fisica efetivamente reduz.a ansiedade, 0s efei- tos hipocondrfacos e a depressio” 7"). Com esse beneficio, 0s pacientes sio capazes de reassumir sua produtividade, além de melhorar seu relacionamento social e familiar. A c- us se capaz. Me~ Ihorando sua auto-imagem, modifica-se “como penso que sou visto pelos outros”, descobre-se onde esté represada a hosti- lidade. Enfim, 0 corpo “fala”, “traduzindo” o estado de espf- tito, ‘Além de perceber a tensao fisica, 0 paciente deve ser ori- entado a identificar outros pontos de estresse (em casa, no trabalho) e desenvolver suas habilidades para alteré-los™. Na mudanea de estilo de vida (ou o lugar da doenca na vida do paciente) © paciente quer melhorar? EET "Por exemplo, paciente sulher, 40-50 anos, ilhos erescidos. Para ela a doenga pode ser uma forma de manter a atengao € 0s cuidados da familia sobre ela. Um paciente do sexo masculino pode utilizar-se da doenga para justificar seus fracassos no trabalho e até garan- tir o recebimento da aposentadoria. Essas pessoas esto dis- postas a afastar a doenga de suas vidas? Por esses pontos é que a recidiva nos padrbes de habitos anteriores € comum: porque hébitos sto determinados por caracteristicas sociais e de personalidade. essa forma, os programas para mudancas de habitos de- te, val 2 Esse aspecto esté intimamente ligado a qualidade de vida, partindo-se do pressuposto de que esse conceito resulta de dois aspectos: subjetivo e objetivo. Ou seja, a avaliago que © paciente faz de sua vida, ¢ os resultados obtidos em seus ‘exames médicos, ROMANO BW ‘Aspectos psicolégicos do paciente coronariopata portador de hipertensao arterial No caso dos hipertensos com doenga coronéria, 0 acom- panhamento deve ser redobrado, porque alguns estudos com- provam que, apés cirurgia com revascularizacao do miocérdio, cr lgaeno sje oe aque dvd cue fatalmente, se agregados a sentimentos de menos-valie, com- prometerdo todo 0 processo de mudanga de estilo de vida Na aderéncia ao tratamento Se tudo o que foi detalhado acima for ponderado, pode-se chegar a uma compreensio global dos motivos pelos quais 0 paciente adere ou ndo ao tratamento. Claro que, no exemplo dos outros t6picos, estio, neste artigo, sendo privilegiados os aspectos psicolégicos. Hé os farmacoecondmicos, os efeitos colaterais, o tempo em que 0 paciente durante o qual fard uso da droga, a idade, 0 exo, etc. Mas, em sfntese, a aderéncia ao tratamento esta intima- ‘mente ligada aos graus de depressiio™ ¢ hostilidade™ A efetividade das intervengdes implicam em combinar componentes cognitivos, comportamentais e afetivos. Este t6pico, por isso, mereceria um artigo especial, por- «que € um dos assuntos mais estudados no mundo. Na familia Qualquer reflexio seria incompleta se nao contar com a inclusdo de familiares”. O paciente ndo é um ser isolado. E. 2 familia funcionaré primeiro como Eoadjuvante’ da equipe ‘io $6 como incentivador mas como part cipante dos vérios aspectos da vida do paciente. Em segundo lugar, os membros da familia geralmente compartilham dos mesos fares dericoes mina dios se bsnGia AAs orientagées da equipe para a familia permite que » jam discutidos dividas e mitos, além de propiciar a oportuni- dade de ser avaliada a dinimica familiar. Serd de grande valia se as orientagbes aos pacientes pude- rem também ser dadas em grupo (de pacientes). © grande zganho € poder reconhecer-se dentro de uma “outra fami que compartitha dificuldades e solugdes. Além disso, 0 paci- ente socializa-se e cria lagos afetivos com outros pacientes, ‘em varios estigios da doenga e do processo de reabilitago. Dessa férma, procurou-se salientar que as “medidas ‘comportamentais” para controle da hipertenslo nfo esto € nem devem ser localizadas em uma 6 intervencio. Se as, “medidas antiestresse” no tém eficdcia comprovada (con- forme apontado pelo Consenso Brasileiro de Hipertensio e outros”) & porque ‘ nio haverd terapéutica medicamentosa que seja eficiente € nem eficaz, porque nao conduz a aderéncia consciente ao tratamento, Hé de ter-se a colaboragao, a compreensao, a par- ticipagio do doente. ‘Alids, essa & a codigo imprescindfvel para ser definida qualidade de vida: a relevancia do que o paciente quer para Psychological aspects of the hypertensive coronary heart disease patient BELLKISS WILMA ROMANO The management of arterial hypertension and coronary disease means on multivaried risk factors interventions, that result in changing lifestyle. To get reduction on body weight, sodium and alcohol intake, smoking cessation and physical exercises compliance, it has 10 be also understood that there are psychological meanings underlying those substances intake/use at those people's life. Observing that guideline, necessarily we had to influence the course of anxiety, depression, social and affective behavior, and other psychic parameters. Key words: hypertension/coronary heart disease/Psychology, hypertension/coronary heart disease/psychological aspects. HiperAtivo 1999;1:57-60 HiperAtivo, Vol 6, N2 1, Janeiro/Margo de 1999 59 ROMANO BW ‘Aspectos psicolégicos do paciente coronariopata portador de hipertensdo arterial REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS 1. Bodanese LC. O tratamento da hipertensdo arterial modifi- ca o prognéstico do paciente com e sem doenga arterial coronariana manifesta? Atherosclerosis 1995;6:34-5. 2. Robertson WB, Strong JP. Atherosclerosis in persons with hypertension and diabetes mellitus. Lab Invest 1968;18:538-41. 3, Wilson PWF, apud Palhares MY. Prevengdo da hipertensio arterial sistémica priméria. Rev Cardiol SBC/MG 1997:3:15-21 4, Messerli FH, Ventura HO, Blizardi DJ, et al. 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