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O CONHECIMENTO

“No vigor de sua constituição ontológica, o homem deseja ardentemente


conhecer” (Aristóteles)

- O que é o conhecimento?

É a fabricação do ideal sobre a terra.

O conhecimento é “meio” de convivência, caminho de busca da realidade presente.

- o primeiro conhecimento é o mito

- do mito diferencia-se o senso comum ou o bom senso;

- conhecimento religioso

- conhecimento filosófico

- conhecimento científico

COMO SE ELABORA O CONHECIMENTO DE FILOSOFIA E DE CIÊNCIA?

Passos:

Primeiro passo: a intuição sensível

A intuição é ato de apresentação ou de percepção da realidade

Segundo passo: a memória

Conservar e lembrar o que já esteve ao alcance da intuição sensível

Terceiro passo: a experiência

Síntese ordenada do material das intuições sensíveis e da memória e ponto de


partida para conhecimentos mais elaborados.

Segundo Aristóteles as ciências se dividem em três classes:

- as ciências produtivas – ensinam a fazer alguma coisa que ainda não


é;

- as ciências práticas – não ensinam a produzir, mas a agir;

- a ciência contemplativa - filosofia


O conhecimento da filosofia e da ciência, aponta o certo e o errado, o bem e o mal, o
falso e o verdadeiro. Discute, julga, valoriza.

Reflexão:

Qual a competência da filosofia e da ciência hoje?

O QUE PERGUNTAVAM OS PRIMEIROS FILOSÓFOS?

- Por que os seres nascem e morrem?


- Por que os semelhantes dão origem aos semelhantes?
- Por que tudo muda?
- Por que a doença invade os corpos, rouba-lhes a cor e a força?
- De onde vêm os seres?

A religião, as tradições e os mitos explicavam todas essas coisas, mas suas explicações
foram perdendo força – não convenciam nem satisfaziam a quem desejava conhecer a
verdade sobre o mundo.

O Nascimento da Filosofia

O final do século VII e início do século VI a. C. foi marcado por um “novo” processo
histórico, decorrente da passagem do saber mítico ao pensamento racional, ou seja, a
filosofia grega nasceu procurando desenvolver o logos
( saber racional ) em contraste com o mito ( saber alegórico )

Homem: o ser que pergunta

Normalmente perguntamos sem refletir sobre o próprio perguntar, sem indagar


pelo significado dessa operação da inteligência que se acha na raiz de todo
conhecimento e de toda ciência. E ao perguntar pelo perguntar, convertemos essa
operação, que nos parece tão banal, tão quotidiana, em tema filosófico, a partir do
momento em que passamos a considerá-la do ponto de vista da crítica radical.

Se compararmos, nesse aspecto, o comportamento humano com o do


animal, verificaremos que o animal não pergunta, não indaga, limitando-se a responder.
Mas, por que o animal não pergunta? Não pergunta porque não precisa perguntar. E
por que não precisa perguntar? Porque, para viver e reproduzir-se, dispõe do instinto
que o torna capaz de fazer, embora inconsciente e sonambulicamente, tudo o que é
necessário para sobreviver e assegurar a sobrevivência de sua espécie. O animal não
pergunta, limita-se a responder aos estímulos e provocações do contexto em que se
encontra, a responder imediatamente, fugindo do perigo, quando é ameaçado, e
atacando a presa quando está com fome.
Entre o animal e o contexto em que vive não há ruptura, não há solução de
continuidade. Porque o animal é natureza dentro da natureza, instinto, espontaneidade
vital, inconsciência(...)

Em contraste, o homem pergunta. E por que pergunta? Porque precisa


perguntar. Mas, por que precisa perguntar? Precisa perguntar porque não sabe e
precisa saber, saber o que é o mundo em que se encontra e no qual deve viver. Para
poder viver, e viver é conviver, com coisas e com os outros homens, precisa saber como
as coisas e os outros homens se comportam, pois sem esse conhecimento não poderia
orientar sua conduta em relação às coisas e aos homens. Para o ser humano o
conhecimento não é facultativo, mas indispensável, uma vez que sua sobrevivência dele
depende. Mas, para que esse conhecimento lhe seja realmente útil e lhe permita
transformar a natureza, pondo-a a seu serviço, e lhe permita, também, transformar sua
própria natureza, pela educação e pela cultura, para que esse conhecimento possa
tornar-se o fundamento de uma técnica realmente eficaz, é indispensável que não seja
meramente empírico, mas científico, ou epistemológico, como diziam os gregos.
Ora, o que está na origem do conhecimento, tanto filosófico quanto
científico? Na origem desse conhecimento está a capacidade, ou melhor, a necessidade
de perguntar, de indagar, o que são as coisas e o que é o homem. E qual é o
pressuposto, ou a condição, de possibilidade da pergunta? Se pergunto é porque não
sei, ou me comporto como se não soubesse. A pergunta supõe, conseqüentemente, a
ignorância em relação ao que se pretende ou precisa saber, pressupondo também, e ao
mesmo tempo, a consciência da ignorância e o conhecimento, por assim dizer, em oco,
daquilo que se desconhece e precisa conhecer. A mola do processo é a contradição.
Não sei e sei que não sei, e essa consciência da ignorância, a ciência da insciência, é o
que me permite perguntar, quer a pergunta se dirija à natureza, quer se enderece aos
outros homens.

ROLAND CORBISIER, Introdução à filosofia, t. 1.p.125-27.

OS PRÉ-SOCRÁTICOS - os primeiros filósofos gregos

Período que abrange o conjunto das reflexões filosóficas desenvolvidas desde Tales de
Mileto até o aparecimento de Sócrates.

A FILOSOFIA NA ANTIGUIDADE

Do mito à filosofia: os pré-socráticos

“Um dos papéis do filósofo é denunciar os


mitos que impedem a visão da verdade racional”
( CORDI, 1999 P.7)
“Não houve época na cultura ocidental em
que não tivéssemos filósofos buscando a verdade e
combatendo a ignorância, o obscurantismo, a
dominação do homem pelo homem, as guerras e
outros atos irracionais que infelicitam a humanidade.
(IDEM)

Nos séculos VI a V a C, as civilizações grega conheceram o apogeu econômico,


político e visão cultural. Foi nesse período glorioso, que surgiu na cultura grega o
confronto entre mito e filosofia.

Tanto o mito quanto a filosofia são explicações que visam responder aos
questionamentos sobre o sentido da vida, a natureza do homem e do universo, assim
como justificar as normas políticas, éticas e religiosas da própria comunidade.

Os pré-socráticos: período que abrange o conjunto das reflexões filosóficas


desenvolvidas desde Tales de Mileto (623 – 546 a C) até o aparecimento de Sócrates
(468 – 399 a C).

O seu objetivo é descobrir uma ordem invisível que transforme os fatos de


enigma em conhecimento, i.é., queriam descobrir, com base na razão e não na
mitologia, o princípio substancial (a arché, em grego) existente em todos os seres
materiais, ou seja, pretendiam encontrar a “matéria-prima” de que são feitas todas as
coisas.

Eis alguns pré-socráticos:

Tales de Mileto ( sec. VI a C. ) considerado o primeiro filósofo, afirma ser a água


o princípio de todas as coisas. Segundo ele, todo ser provém do estado de umidade e a
própria terra flutua sobre a água.

Anaximandro de Mileto ( sec. VI a. C. ) observando em meio a tantos elementos


no mundo natural, afirma não ser possível eleger uma única substância material como
princípio do universo, por isso afirma ser o apeíron, o indeterminado, o infinito, o
indefinido o elemento que determinaria a origem do universo.

Heráclito de Éfeso (sec. VI – V a. C.) concebia a realidade do mundo


como algo dinâmico, em permanente transformação. Para ele, o fogo é o elemento
primordial, que explicaria a origem do universo. A tensão, o combate entre os opostos,
a mudança e a dialética são os princípios do universo, enquanto o Logos ( ou Razão )
governa o mundo e mantém sua ordem. A noção de devir, de vir a ser, é essencial em
seu pensamento. Na concepção de Heráclito, “Tudo flui, nada persiste, nem permanece
o mesmo. O ser não é mais que o vir-a-ser”.

Parmênides de Eléia ( sec. V a. C. ) para ele, o princípio primordial das


coisas é o ser uno, idêntico, imutável, eterno ... Tudo o que existe sempre existiu e nada
pode transformar-se em algo diferente de si mesmo, afirma Parmênides, que,
discordando da filosofia de Heráclito, afirma ser a “mudança e a diversidade
apenas ilusões dos sentidos”. Com isso, constrói os princípios da identidade e da
contradição, que serão usados depois na lógica.

ATITUDE FILOSÓFICA E QUALIDADE DE VIDA

Muito se tem falado sobre a filosofia. Nem sempre o que se ouve a respeito dela
corresponde a realidade. Uns a definem como filosofia de vida, outros como sabedoria
e outros ainda como sendo uma coisa que não nos leva a nada. Raras vezes ouvi alguém
falar dela com paixão ou amor. Qual a razão de tamanha aversão à filosofia? Podemos
responder a esta indagação de várias maneiras:
Primeira, pensar, é um ato que não foi incorporado ao nosso dia-a-dia. Isto
muito nos entristece, porque não existe nada mais humano em nossa vida o que o ato
de pensar. Pensar constitui-se na nossa principal característica, ou melhor, caracteriza
nossa essência. Pensamos para poder escolher, deliberar, opinar, mudar o rumo da
história, de nossa vida. Posso afirmar sem nenhum constrangimento, que existe muitas
pessoas que ganham com nossa resistência ao pensar. Mas se há ganho para uns, há
perdas para muitos.
Segunda, pensar é um ato que para muitos, só deve ser executado frente a uma
atividade que possa nos trazer respostas ou melhor, um resultado prático e imediato de
preferência, em forma de ganho, lucros. Nossa cultura nos ensinou a valorizar o
pragmatismo, o imediatismo, melhor dizendo.
Terceira, pensar é um ato que demanda tempo. “Tempo é dinheiro”. Não posso
perder tempo com devaneio, ou seja, não posso perder dinheiro.
Li um artigo na revista Veja, de autoria de Roberto Pompeu de Toledo, não
lembro agora o número, em que o autor fazia algumas colocações muito pertinentes.
Ele reconhecia o esforço da sociedade na busca de melhorar a educação, seja por
exigência da Globalização, onde ou você se informa ou não consegue acompanhar a
evolução; seja ainda por uma questão de competitividade, como a oferta de mão de
obra qualificada. Uma coisa ele deixava bastante claro, que a educação estava
melhorando, principalmente em relação ao aspecto quantitativo. Ele apontava o
significativo aumento do número de escolas e porque não dizer, até mesmo de
instituições de nível superior, mas segundo ele, no que concordamos plenamente,
ainda falta muito, falta ensinar o homem a pensar. Nesse aspecto, podemos afirmar
sem medo de errar, a filosofia é uma ótima aliada. Precisamos incentivar, ensinar
nossos alunos a pensar a realidade, pensar o mundo e os problemas que nos rodeia,
pois somente assim sairemos dessa atitude passiva e contemplativa que em nada
enaltece nossa posição de ser pensante e partir em busca de nossas realizações, de
nossa felicidade. Mas isso só será possível quando nos conscientizarmos de somos nós
mesmos os maiores beneficiados com essa atitude.

Profª Maria das Graças Sousa


SÓCRATES CORPORATIVO: você já pensou em se tornar filósofo?

Abraham Chachamovits é engenheiro da computação, mestre em


composição e regência, filósofo e pós-graduado em lógica e inteligência artificial .Foi
vice-presidente de tecnologia da informação da Nextel Internacional e diretor de
tecnologia e arquitetura da BCP, em entrevista concedida à revista EXAME-VOCÊ s.a. de
novembro /2001 afirma: “ O filósofo é o profissional que toda empresa realmente
necessita” Porém, salienta ele, nem todas as empresas modernas têm consciência da
importância da filosofia, isso porque elas vivem em um mundo competitivo, onde a
ação tem sido mais valorizada do que a reflexão. “ (...) A pressão por resultados dita
o ritmo do dia-a-dia dos negócios. Diante dessa realidade, como seria colocar um
filósofo no comando de uma organização, se perguntaria as pessoas? Abraham
Chachamovits , afirma ser essa a única saída para as empresas que desejam ter uma
vida financeira saudável por muito tempo. Segundo ele,” o filósofo é aquele profissional
capaz de fazer as pessoas terem uma compreensão mais elevada do mundo, em virtude
de sua formação humanista. O objetivo do filósofo é conseguir fazer com que a pessoa
transcenda seus limites.” e as empresas devem buscar profissionais sensíveis e que
tenham um sentido de ética desenvolvi Quando interrogado sobre quem é esse
filósofo que ele tanto defende dentro das empresas, Chachamovits responde: “quando
falo em filósofo, não estou fazendo alusão a alguém que tenha necessariamente
formação acadêmica em filosofia. Refiro-me, isso sim, à pessoa que não está
totalmente presa às questões mundanas de uma organização, como a produção e o
lucro. Defendo a tese de que os líderes devem ter uma formação mais humanista, pois,
quanto mais completo for o ser humano, maior a chance dele liderar as pessoas com
sucesso. (...) O filósofo almeja fazer com que a pessoa transcenda seus limites, e não
apenas gere bons resultados financeiros a empresa”. O filósofo age sempre pensando
no crescimento do grupo, jamais ele liderará para fins próprios. Ele também terá que
enfrentar muitos obstáculos, mas ele deve ter consciência de que só terá resultados
positivos se for um questionador. O questionamento e a reflexão vão fazer com ele
verifique a verdade das coisas – e não só as impressões. (...) E é justamente neste ponto
que o entrevistado afirma estar o diferencial do filósofo. O filósofo é aquele
profissional que pode ajudar a constituir uma empresa de sucesso e de resultados
duradouros.

Bibliografia:Você s.a. (edição 41) novembro /2001 Ano 4

Profª Maria das Graças Sousa


O HOMEM PRECISA FILOSOFAR

Maria das Graças dos Santos Sousa

Aristóteles, filósofo grego, já afirmava que todos os homens têm por natureza o
desejo de conhecer. Mas não é bem isso o que se tem observado. A filosofia tem sido
“esquecida” ao longo do tempo. Aliás, a prática do filosofar em nosso país, é restrita a
um pequeno grupo de estudiosos de filosofia o que, diga-se de passagem, nem sempre
é bem visto pelos estudiosos de outras ciências. Várias são as razões que justificam
esse “esquecimento”, entre elas podemos citar: Primeira, nossa tradição cultural.
Fomos colonizados pelos portugueses, e entre esses povos, a filosofia não era
valorizada; segunda, no mundo competitivo em que vivemos, a ação tem sido mais
valorizada do que a reflexão; terceira, a filosofia em detrimento das ciências exatas,
não nos fornece uma resposta imediata, única e/ou objetiva; quarta, a falta de
incentivo dos educadores para o exercício da leitura, do pensar o mundo, a realidade.
Não estamos aqui nos referindo a leitura de livros ou textos filosóficos, pois
acreditamos estar filosofia embutida ou implícita em todas as leituras que visam a
compreensão da realidade.
A filosofia é a busca do sentido e explicação da realidade. Aliás, a primeira
pergunta que o homem fez, ao abandonaras explicações mitológicas ao as verdades
prontas ou do senso comum, foi questionar-se sobre a origem das coisas ( “Qual a
origem de todas as coisas?”) Essa pergunta marcou o surgimento da filosofia,
distinguindo o homem pensante do não pensante. Portanto, é inconcebível hoje, que o
homem fique a margem da realidade, preso ao imediatismo das explicações prontas.
Em novembro de 2001, a revista Você, veiculou uma entrevista com o consultor
americano Abraham Chachamovits, engenheiro de computação, filosofo e pós-
graduado em lógica e inteligência artificial, com o título: SOCRATES CORPORATIVO..
Entre outras idéias, ele afirma ser o filosofo a profissão do futuro. “O filosofo, é aquele
profissional capaz de fazer as pessoas terem uma compreensão mais elevada do
mundo (...) o objetivo do filosofo é conseguir fazer com que a pessoa transcenda seus
limites”. Quando o entrevistado é questionado sobre quem é esse filosofo que ele
tanto defende dentro das empresas, ele responde: “quando falo em filosofo, não estou
fazendo alusão a alguém que tenha necessariamente formação acadêmica em
filosofia, refiro-me, isso sim, a pessoa que não está totalmente presa às questões
mundana em uma organização, como a produção e o lucro. Defendo a tese de que os
lideres devem ter uma formação mais humanista, pois quanto mais completo for o
homem, maior a chance de ele liderar as pessoas com sucesso”. O filosofo pensa na
satisfação do ser humano, na sua transcendência e não apenas no excelente resultado
financeiro da empresa. Nesse sentido. O filosofo é a pessoa mais indicada para chefiar
uma empresa, por ser um profissional sensível e com conhecimento de ética
desenvolvimentista.
Ficamos muito feliz quando lemos esta entrevista. Isto, de certa forma vem a
reforçar nossa idéia de que a filosofia não somente é necessária a todas as pessoas
desejosas de saber, como também ela está sendo reconhecida e valorizada em outros
campos do saber. Nenhum conhecimento, nenhuma atividade ou profissão teria
sentido, ou existiria se não existisse o homem. Este é um convite que fazemos a todos
os nossos alunos, não se prendam ao objetivismo ou ao imediatismo do saber sem
fundamento. Ou fundamentamos nosso conhecimento, ( e é justamente nessa busca de
sentido que a filosofia se faz presente) ou ele se perderá ao longo do tempo. O homem
é um filosofo, porque seu papel é realizar atos que o engrandeça, que o faça
transcender-se.
Os pré-socráticos e a ciência

A ciência se inicia com problemas.


Um problema significa que há algo errado ou não resolvido com os fatos.
O seu objetivo é descobrir uma ordem invisível que transforme os fatos de
enigma em conhecimento. (...)
Aqui somos forçados a viajar séculos para trás, para os tempos em que nossos
pais, os gregos, começaram a pensar sobre o mundo e a se fazerem as perguntas com
que os cientistas lutam até hoje. Porque as perguntas que eles fizeram não admitiam
uma resposta única e final. Eram como portas que, uma vez abertas, vão dar numa
outra porta, muito maior, é verdade, que por sua vez dá em outra, indefinidamente. E
aqui estamos nós abrindo portas com as perguntas que geraram as nossas chaves.
Vamos seguir o seu pensamento.
Você notou que a nossa experiência cotidiana, que o que vemos, ouvimos,
sentimos, é um fluxo permanente de impressões que não se repete nunca? “Tudo flui,
nada permanece. Não se pode entrar duas vezes num mesmo rio” dizia Heráclito de
Éfeso.
A despeito disso – e aqui está algo que é muito curioso – nós somos capazes de
falar sobre as coisas, de ser entendidos, de ter conhecimento.
Nunca mais haverá nuvens idênticas àquelas que produziram o temporal de
ontem. A despeito disto serei capaz de identificar nuvens como nunca existiram antes e
dizer que delas a chuva virá. Também nunca mais terei uma laranjeira como aquela que
morreu de velhice. Mas serei capaz de identificar uma outra da mesma qualidade e de
prever quanto tempo levará para começar a dar os seus frutos.
Como explicar que o meu discurso sobre as coisas não fique colado às suas
aparências? Parece que, ao falar, eu sou capaz de enunciar verdades escondidas,
ausentes do visível, expressivas de uma natureza profunda das coisas. Tanto assim que,
quando falo, pretendo que estou dizendo a verdade não apenas sobre aquele momento
transitório, mas também sobre o passado e o futuro. Laranjas são doces, a água mata a
sede, as estrelas giram em torno da Terra, o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos
quadrados dos catetos: estas não são afirmações sobre o sensório imediato. Elas têm
pretensões universais.
Esta foi a grande obsessão da filosofia grega: estabelecer um discurso que
falasse sobre a natureza intima das coisas, que permanece a mesma em meio à
multiplicidade de sua s manifestações. (...)
A leitura da filosofia grega nos introduz, passo a passo, às diferentes fases desta
busca, a partir dos filósofos milesianos que achavam que as coisas mantinham sua
unidade em meio à multiplicidade porque, lá no fundo, todas se reduziam a um mesmo
suco, uma mesma essência. Progressivamente houve uma passagem desta posição, que
explica a unidade em termos de substância, para uma outra que considera que a
questão fundamental são as relações e funções.

Rubem Alves. Filosofia da ciência, p. 40-41

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