Professional Documents
Culture Documents
DE REVISÃO
Em casos de instabilidade tratados cirurgicamente, ativi- Já que a maioria das lesões subtalares ocorre em combina-
dades esportivas são permitidas aproximadamente após três ção com as lesões ligamentares laterais do tornozelo, sinto-
meses da cirurgia. Uma órtese para o tornozelo pode ser ne- mas agudos das lesões subtalares são similares a ela e podem
cessária durante as atividades esportivas por seis a oito estar mascaradas. Lesão do ligamento subtalar pode ser sus-
meses pós-operatórios. Os resultados de reconstruções ana- peita se houver sensibilidade na parte lateral da articulação,
tômicas têm sido significativos18,33-35,51,52. mas isso pode ser difícil de diferenciar da articulação tibio-
talar devido a sua proximidade e do edema que vão mascarar
a anatomia.
LESÕES LIGAMENTARES E INSTABILIDADE Avaliação clínica da instabilidade subtalar é muito difícil
SUBTALAR e não confiável. Uma avaliação da mudança do ângulo entre
o calcanhar e a tíbia com inversão passiva e a eversão do
Biomecânica
calcanhar pode ser feita comparando esse ângulo com o lado
As articulações inferiores do tálus são as articulações ta- não lesado55, mas a sensibilidade e a especificidade desse
localcânea e talonavicular. A articulação talocalcânea apre- teste são desconhecidas.
senta articulações distintas separada pelo seio do tarso. A
articulação talonavicular é formada pela cabeça do tálus e Radiografias de AP, lateral e de vista de mortalha devem
sua articulação com o ligamento mola e a superfície articu- ser tiradas para verificar se há fraturas. Além disso, radio-
lar do navicular. As importantes estruturas que contribuem grafias em estresse (gaveta anterior e testes de estresse em
para a estabilidade da articulação subtalar são: ligamento inversão) algumas vezes podem ser benéficas na avaliação
calcâneo fibular (LCF), ligamento talocalcâneo lateral, o li- dos ligamentos laterais do tornozelo.
gamento cervical, o ligamento talocalcâneo interósseo e uma Se há suspeita de uma lesão maior da articulação subtalar,
porção do retináculo extensor inferior53. radiografias em estresse do subtalar59, artrografia subtalar58
A articulação subtalar move-se à semelhança de um para- ou tomografia em estresse55 podem mostrar mobilidade am-
fuso ao redor do eixo de rotação que forma um ângulo de 10º pliada. Entretanto, esses “achados” não são incomuns em
a 15º com o plano sagital e um ângulo de 45º com o plano pessoas sem sintomas; então, a interpretação desses estudos
horizontal do pé54,55. A função principal da articulação sub- não é clara. O uso desses exames especiais depende da polí-
talar é permitir que o pé se acomode ao solo durante a mar- tica de tratamento escolhida para essas lesões. Se o trata-
cha em superfícies irregulares. A amplitude de movimento mento não está sendo eficiente, radiografias em estresse não
da talocalcaneonavicular tem sido estimada em 24º56, mas a são necessárias, porque os resultados não vão alterar o trata-
mobilidade média durante a fase de apoio da marcha é ape- mento. Se a cirurgia é considerada, radiografias em estresse
nas aproximadamente de 6º57. podem ajudar no planejamento cirúrgico.
Rev Bras Med Esporte _ Vol. 5, Nº 1 – Jan/Fev, 1999 17
Classificação das lesões subtalares não é muito sensível ou específico. A melhor maneira de
Lesões agudas da articulação subtalar podem ser classifi- tentar diferenciar a instabilidade tibiotársica da instabilida-
cadas pelo mecanismo da lesão e pelo grau de lesão58. A le- de subtalar é através da radiografia em estresse, mas isso
são pode ocorrer em flexão plantar ou dorsiflexão. Supina- também pode ser difícil devido à ampla sobreposição de va-
ção forçada com o pé em flexão plantar vai causar lesão pri- lores normais.
meiramente no ligamento talofibular anterior (e possivel- Nos pacientes com suspeita de instabilidade crônica sub-
mente no ligamento cervical) seguida por ruptura do liga- talar e do tornozelo, reparação anatômica tardia (encurta-
mento calcaneofibular e da cápsula lateral (tipo I) ou rom- mento e reinserção) dos ligamentos tem dado bons resulta-
pendo o ligamento talocalcâneo interósseo (tipo II). Quando dos34,51. Se o procedimento de reconstrução é considerado, o
o tornozelo está em dorsiflexão, rupturas do ligamento cal- único processo que inclui ambos os ligamentos calcaneofi-
caneofibular, do ligamento cervical e do ligamento talocal- bular e talofibular anterior é a reconstrução de Chrisman-
câneo interósseo (tipo III) ocorrem; o ligamento talofibular Snook. Por essa razão, o procedimento de Chrisman-Snook45,60
anterior permanece intacto porque não está sob tensão com o pode dar melhores resultados a longo prazo do que outros
tornozelo em dorsiflexão. O tipo IV de lesão subtalar é a processos reconstrutivos61. Se a cirurgia é indicada, preferi-
ruptura de todos os componentes cápsulo-ligamentares me- mos reparar os ligamentos subtalares e tibiotársicos.
diais e laterais do tarso posterior associados à lesão subtalar.
Essa lesão é provavelmente produzida por supinação força- LESÕES DO LIGAMENTO DELTÓIDE
da do retropé com o tornozelo inicialmente dorsiflexionado Biomecânica
passando para flexão plantar58.
O ligamento deltóide, em forma de leque, é composto de
Tratamento e reabilitação uma camada superficial vertical e uma camada mais profun-
da, menor e mais horizontal62. A parte superficial consiste
Reparações cirúrgicas agudas das lesões do ligamento sub- anteriormente do ligamento tibionavicular, o ligamento tibio-
talar devem ser consideradas cientificamente improváveis e calcâneo no meio (originando-se 1 ou 2cm acima da ponta
raramente indicadas. Isso é verdade especialmente para pa- do maléolo medial e inserido no sustentaculum tali do calcâ-
cientes com lesões parciais dos ligamentos sem instabilida- neo) e, posteriormente, o ligamento tibiotalar superficial. A
de subtalar ou com instabilidade subtalar leve. Nesses casos camada horizontal mais profunda do ligamento deltóide con-
o programa de reabilitação funcional é recomendado. O pro- siste dos fortes ligamentos tibiotalares posterior e anterior. A
grama é o mesmo utilizado para lesões ligamentares laterais camada mais profunda é mais importante para a estabilidade
do tornozelo descritas anteriormente. Rapidamente, isso in- do tornozelo do que a camada superficial62. Durante a mobi-
clui um programa inicial para reduzir edemas e prevenir le- lidade do tornozelo, entretanto, todas as partes do ligamento
sões futuras seguidas de amplitude precoce de exercícios de deltóide funcionam como uma só unidade, dando suporte
mobilidade e, finalmente, carga corporal e treinamento neu- estático para o tornozelo durante a abdução, eversão e pro-
romuscular do tornozelo30. Para lesões parciais e leves o pe- nação (eversão, rotação externa e abdução) do pé. Os liga-
ríodo de incapacidade do paciente pode ser limitado de mentos tibionaviculares e tibiocalcâneos dão estabilidade li-
duas a três semanas. gamentar medial para ambas as articulações subtalar e tibio-
Tratamento de lesões graves do ligamento subtalar pode társica, enquanto os ligamentos tibiotalares profundos são
ocorrer através de meios não operatórios com curto período responsáveis somente pela estabilidade medial da articula-
de imobilização seguido de programa de reabilitação funcio- ção tibiotársica.
nal. Existe, entretanto, grande incidência de instabilidade com Lesões isoladas do ligamento deltóide são muito raras. Em
lesão de alto grau. Por causa disso, para lesões graves, pelo uma série de 281 lesões agudas de tornozelo estudadas por
menos um autor recomenda reparação aguda de ambas as Brostrom11, somente 3% destas estavam localizadas no lado
estruturas ligamentares laterais do tornozelo e dos ligamen- medial. Quase todas as lesões do lado medial eram rupturas
tos subtalares para prevenir instabilidade crônica58. parciais do ligamento. Rupturas completas do ligamento del-
tóide ocorrem mais freqüentemente em combinação com fra-
Instabilidade subtalar crônica turas de tornozelo. Na revisão de Harper63, dos 42 pacientes
É difícil de separar a instabilidade subtalar da instabilida- com rupturas do ligamento deltóide completas, todas esta-
de do ligamento lateral do tornozelo e, na verdade, esses pro- vam associadas a outras lesões. Quase todos os pacientes desse
blemas podem coexistir. Os sintomas de ambas são episó- estudo tinham ruptura dos ligamentos da sindesmose com ou
dios crônicos de falseio do tornozelo durante as atividades, sem outras lesões associadas. Na classificação das fraturas
com histórico de lesões reincidentes e/ou dor, edemas e rigi- de tornozelo descritas por Lauge-Hansen64, o ligamento del-
dez. Sensibilidade sobre a articulação subtalar pode ajudar a tóide ou fratura do maleolar medial acontece como uma le-
verificar o envolvimento dos ligamentos subtalares, mas isso são padrão ao redor do tornozelo de modo circular. As três
18 Rev Bras Med Esporte _ Vol. 5, Nº 1 – Jan/Fev, 1999
maiores características dos mecanismos de lesão do ligamento Tratamento e reabilitação
deltóide ocorrem devido à pronação-abdução, pronação-ro- Rupturas do ligamento deltóide isoladas, que estão geral-
tação externa e supinação-rotação externa do pé64-66. O pri- mente localizadas na parte anterior do ligamento, podem ser
meiro componente descreve a posição de um pé apoiado e o tratadas com programa de reabilitação funcional e o prog-
segundo indica a mobilidade relativa do pé quando a perna nóstico é, geralmente, sem exceção, excelente ou bom. Oca-
gira sobre o pé apoiado. Então, na lesão em pronação-abdu- sionalmente, entretanto, rupturas do deltóide podem resultar
ção, o pé fica apoiado em pronação quando o corpo cai para em dores crônicas e sensibilidade no lado ântero-medial do
a face lateral do pé, exercendo grande força de abdução no ligamento deltóide. É muito raro haver ruptura completa iso-
tornozelo e no ligamento deltóide. Desde que as forças ne- lada do deltóide. A maioria delas ocorre com fraturas e/ou
cessárias para lesionar o forte ligamento deltóide são gran- ruptura da sindesmose. Há controvérsias sobre como tratar
des, a lesão geralmente continua pela sindesmose e pela ação rupturas do deltóide completas nesse sentido. Muitos auto-
do maléolo lateral na parte lateral do tálus. res recomendam reparação cirúrgica do ligamento deltóide
na hora da estabilização das fraturas que a acompanham e/
Diagnóstico
ou estabilização das lesões da sindesmose69. A base para isso
Nas lesões do ligamento deltóide, dor, sensibilidade e ede- é prevenir outros tecidos interpondo-se entre as extremida-
mas estão sempre presentes no lado medial do tornozelo. des do ligamento roto e também prevenir a cicatrização.
Equimoses podem aparecer depois de um ou dois dias. Numa Hamilton70 defende o procedimento operatório baseado no
ruptura do deltóide completa, pode haver um defeito palpá- fato de que não existe procedimento de reconstrução satisfa-
vel debaixo do maléolo medial. Geralmente, o paciente não tório para corrigir insuficiência crônica dessa estrutura. Há,
é capaz de andar ou apoiar o membro lesionado. Se a lesão entretanto, muitos relatórios que dizem que reparação cirúr-
do ligamento deltóide existe, é muito importante avaliar o gica das estruturas laterais e da sindesmose sem reparação
tornozelo, verificando se há lesão da sindesmose ou fratura. do ligamento deltóide dá resultados satisfatórios63,71,72. Har-
Exame clínico e palpação do osso e das estruturas ligamen- per63 verificou que o ligamento deltóide cicatrizava suficien-
tares indicam quais as regiões que estão lesadas. A parte pro- temente sem reparação, desde que uma boa redução do espa-
ximal da fíbula tem que ser examinada também para que se ço articular medial, a sindesmose e o maléolo lateral fosse
descarte o diagnóstico de ruptura completa da sindesmose. obtida, e essa redução era mantida após a cirurgia. Nenhuma
Teste clínicos em estresse de ruptura do ligamento deltóide evidência de instabilidade ligamentar ou osteoartrite foi no-
geralmente não são possíveis por causa das lesões da sindes- tada em seus 36 pacientes que foram acompanhados por um
mose associadas ou fraturas. ano ou mais. A resposta, entretanto, parece ser a redução
Radiografias são necessárias para avaliar as estruturas ós- anatômica exata da mortalha do tornozelo. Enquanto isso
seas e a sindesmose. O mínimo que se deve fazer é radiogra- puder ser feito sem reparação direta do ligamento deltóide,
fia de AP, lateral e visão da mortalha (um AP com o tornoze- os resultados parecem ser satisfatórios. Estes resultados tam-
lo em aproximadamente 20º de rotação interna). Se houver bém foram verificados por Stromsoe et al.73.
suspeita de fratura fibular proximal, isso também deve ser O tratamento pós-operatório imediato das rupturas do del-
radiografado. Lesões do ligamento deltóide são mais facil- tóide suturadas ou não depende das condições das fraturas
mente vistas em radiografias medindo a amplitude do espa- existentes ou da lesão da sindesmose. Em alguns pacientes
ço medial em ambas: AP e as da mortalha. Uma distância de que têm um parafuso de sindesmose, carga total deve ser
4mm ou mais é anormal e indica ruptura completa do liga- evitada até que este seja removido, geralmente de seis a dez
mento deltóide e da sindesmose; o tamanho da dilatação do semanas depois de operado. Reabilitação desses tornozelos
espaço da articulação medial máximo é de 2 ou 3mm com o segue diretamente as orientações dadas previamente na par-
ligamento deltóide intacto67,68. O que se deve ter em mente é te de lesões ligamentares laterais do tornozelo.
que em rupturas de deltóide isoladas o espaço medial não Os critérios para retornar à atividade esportiva depois de
vai ampliar-se porque o maléolo lateral vai segurar o tálus uma lesão subtalar são similares àqueles utilizados na lesão
na posição. Da mesma forma, lesões da sindesmose sem le- do ligamento lateral da articulação tibiotársica. No caso da
sões de deltóide não terão amplitude no espaço medial. Nes- lesão subtalar, entretanto, deve ser lembrado que o retorno
se caso, a articulação tibiofibular inferior deve ser cuidado- às atividades pode ser duas ou três vezes mais demorado que
samente avaliada para verificar se há lesão da sindesmose. nos casos de lesão isolada do ligamento lateral da articula-
Radiografia em estresse em eversão, artrografias ou resso- ção tibiotársica. Instabilidade mecânica residual também é
nância magnética podem ser usadas em casos difíceis, mas muito mais freqüente em lesões subtalares.
isso raramente é necessário, desde que o diagnóstico seja
sempre feito por exame clínico e radiografias simples. Para Instabilidade medial crônica do tornozelo
lesões de deltóide isoladas, o tratamento não é operatório e Ruptura do ligamento deltóide isolada completa é possí-
não será alterado por esses estudos. vel, mas é muito rara. Mais ainda, instabilidade medial do
Rev Bras Med Esporte _ Vol. 5, Nº 1 – Jan/Fev, 1999 19
tornozelo não pode existir como algo isolado70. Qualquer terna violenta do pé enquanto o tornozelo está em dorsifle-
aumento do espaço medial sugerindo insuficiência do del- xão. Lesões parciais isoladas da sindesmose ocorrem com
tóide deve ser associado com diástase da sindesmose ou fra- alguma freqüência; isso é muito mais comum para a lesão
tura desviada da fíbula70. Portanto, instabilidade medial crô- associada com uma fratura e/ou lesão do ligamento deltóide.
nica do tornozelo é geralmente resultado de uma redução A freqüência das rupturas da sindesmose é diretamente rela-
primária inadequada e fixação de outras estruturas, mais a cionada ao tipo e nível de fraturas fibulares associadas. Se a
insuficiência do ligamento deltóide. O melhor tratamento para fratura fibular é uma avulsão transversa no nível da articula-
instabilidade medial crônica é preveni-la através de uma boa ção do tornozelo ou abaixo dela (tipo A de fratura na clas-
redução primária de todas as estruturas envolvidas. Recons- sificação de Weber), lesão ligamentar da sindesmose ou fra-
truções tardias do deltóide ou da sindesmose geralmente ge- tura com avulsão ocorrem muito raramente. Se a fratura fi-
ram resultados insatisfatórios. bular é espiral, começando no nível da sindesmose (Weber –
tipo B), ruptura da sindesmose ou fratura com avulsão acon-
RUPTURAS DA SINDESMOSE TIBIOFIBULAR – tecem em aproximadamente 50% dos casos. Finalmente, se
“LESÕES ALTAS DE TORNOZELO” a fratura fibular ocorre em qualquer lugar entre a sindesmo-
se e a cabeça proximal da fíbula (Weber – tipo C), a ruptura
Biomecânica da sindesmose ou fratura com avulsão ocorrem na maioria
A sindesmose tibiofibular é uma estrutura que mantém a dos casos65,74. Isso é predito por Lauge-Hansen em sua clas-
relação entre a tíbia distal e a fíbula. A sindesmose consiste sificação de mecanismo de lesão das fraturas de tornozelo.
de ligamentos tibiofibulares inferior, posterior e anterior e Nesse esquema de classificação, lesões ligamentares ou fra-
da membrana interóssea. Os ligamentos tibiofibulares poste- turas ocorrem quando o padrão de lesão continua em torno
rior e anterior são unidos superiormente e medialmente à do tornozelo de modo circular. O mais característico meca-
tíbia e inferiormente e lateralmente à fíbula62. A face mais nismo de lesão da sindesmose ocorre proveniente da prona-
distal do ligamento tibiofibular inferior, posterior, é chama- ção-rotação externa do pé66. O primeiro componente descre-
da de ligamento tibiofibular transverso74. ve a posição de um pé apoiado e o segundo termo indica a
Há um pequeno sulco na tíbia distal onde a fíbula gira mobilidade relativa do pé em relação às rotações da perna
sobre seu eixo vertical durante a flexão plantar e dorsal do sobre o pé apoiado. Então, na lesão de pronação-rotação ex-
tornozelo. Os ligamentos tibiofibulares inferior, posterior e terna o pé é apoiado em pronação com as rotações do corpo
anterior são responsáveis por prender a fíbula no sulco. A e provoca a rotação externa relativa do pé. Isso exerce muita
membrana interóssea funde-se nos ligamentos tibiofibulares força, primeiro no ligamento deltóide, depois no ligamento
posterior e anterior em, aproximadamente 1 a 2,5cm sobre o tibiofibular inferior anterior, na diáfise acima da sindesmose
domo do tálus75. Desse lugar ele continua pela parte superior e finalmente no ligamento tibiofibular inferior posterior. Já
conectando superfícies ásperas adjacentes da tíbia e fíbula. que as forças necessárias para romper completamente o forte
O ligamento tibiofibular inferior anterior controla a rotação ligamento deltóide são tão grandes, a lesão geralmente con-
externa e o deslocamento posterior da fíbula com relação à tinua através da sindesmose como se fosse um braço de ala-
tíbia, mas todas as três estruturas ligamentares tibiofibulares vanca forte do maléolo lateral sobre a parte lateral do tálus.
previnem o deslocamento lateral excessivo da fíbula. O des-
locamento lateral da fíbula vai causar aumento da mortalha Diagnóstico
do tornozelo. Uma ruptura isolada da sindesmose pode ser difícil de de-
Diástase da sindesmose ocorre com ruptura parcial ou to- tectar. Dor e sensibilidade são localizadas primariamente na
tal do complexo ligamentar da sindesmose76. Lesões da sin- parte anterior da sindesmose e na membrana interóssea. O
desmose completas isoladas são raras e há relativamente pou- paciente sempre será incapaz de abrir os membros sobre o
ca informação na literatura sobre diástase do tornozelo na tornozelo lesado. Rotação externa passiva e ativa no pé vão
ausência de fratura. Fritschy77 relatou somente 12 casos de ser doloridas. A melhor maneira de testar a sindesmose é
ruptura da sindesmose isolados numa série de mais de 400 através da rotação externa do pé com o tornozelo em dorsi-
rupturas ligamentares de tornozelo. Várias dessas lesões ocor- flexão; isso é chamado de teste de rotação externa. Isso es-
rem em esquiadores de slalom em competições mundiais onde tressa a sindesmose por ação do tálus como um braço de
têm que transpor um obstáculo. Em todas elas a ruptura ocorre alavanca contra o maléolo lateral. Na lesão da sindesmose,
quando uma rotação externa súbita do tornozelo leva o tálus dor ocorrerá sobre a articulação e o ligamento tibiofibular
a pressionar novamente a fíbula; isso abre a articulação tibio- inferior anterior. O teste de compressão pode causar dor tam-
fibular distal. bém. Esse teste é feito comprimindo a tíbia e a fíbula juntas
Rupturas parciais dos ligamentos tibiofibulares inferiores, sobre o ponto médio da panturrilha. Se a lesão da sindesmo-
entretanto, não são comuns. Assim como as rupturas isola- se está presente, o paciente terá dor na articulação tibiofibu-
das acima, elas ocorrem mais comumente numa rotação ex- lar inferior.
20 Rev Bras Med Esporte _ Vol. 5, Nº 1 – Jan/Fev, 1999
Radiografias de visão de mortalha, lateral e AP são neces- Lesões da sindesmose são mais comumente associadas a
sárias para excluir fraturas, avulsões ósseas e para avaliar a fraturas do maléolo e/ou a rupturas do ligamento deltóide.
possibilidade de a sindesmose estar aumentando. Parâme- Nesse caso, outras lesões poderiam ser tratadas primeiro e a
tros radiográficos aceitáveis que indicam diástase da sindes- sindesmose deverá estar estabilizada como acima descrito.
mose são controvertidos. Medidas podem ser bastante alte- É importante que a fratura da fíbula seja reduzida exatamen-
radas pelo volume de rotação da perna. Os parâmetros mais te e trazida ao comprimento total. Esse geralmente é o me-
comumente usados são uma dilatação do espaço de articula- lhor procedimento realizado para estabilizar fraturas com uma
ção maior que 5mm ou uma sobreposição tibiofibular de placa tubular de 1/3 ou semitubular e parafusos corticais de
menos de 10mm, ambas medidas com visão AP. Entretanto, 3,5mm. Um dos parafusos para a placa pode, às vezes, ser
um estudo recente78 indica que os indivíduos apresentam uma usado para estabilizar a sindesmose também. Se a abertura
considerável quantidade de variáveis em medidas absolutas, medial persistir em mais de 2mm na visão da mortalha, o
mas a proporção de medidas para a largura fibular era mais espaço articular medial deve ser explorado para invaginação
consistente. Noventa por cento dos diagnósticos eram obti- de tecidos moles. Após a cirurgia, uma pequena tala de gesso
dos através de intervalos da relação óssea normal: uma so- é utilizada. Em muitos casos, o gesso pode ser trocado por
breposição tibiofibular em relação à proporção da largura uma bota com salto por duas a quatro semanas e exercícios
fibular maior que 24% e um espaço tibiofibular em relação à de amplitude de movimento podem ser iniciados. Isso é man-
proporção da largura fibular menor que 44%, ambos medi- tido pelas próximas quatro semanas. Carga parcial dos mem-
dos com radiografia AP. Radiografias em estresse em rota- bros é geralmente permitida pelo mesmo tempo. Recomen-
ção externa, ambas em dorsiflexão e flexão plantar, podem damos que o parafuso da sindesmose seja removido depois
apontar as diástases, mas sua utilidade é questionável77. Es- de seis a oito semanas. A retirada geralmente é fácil e pode
tudos recentes têm defendido o uso da ressonância magnéti- ser feita com anestesia local em ambulatório. A retirada é
ca para avaliação da sindesmose79. Atualmente, este tem-se recomendada porque o parafuso pode começar a soltar e que-
tornado o exame de escolha para casos difíceis. brar dentro da articulação. Em seis semanas a carga total é
permitida e um programa de reabilitação seguindo as orien-
Tratamento e reabilitação tações normais para a reabilitação do tornozelo, descritas
previamente neste capítulo, é iniciado. A volta à prática es-
Rupturas parciais da sindesmose geralmente envolvem o portiva geralmente não é possível antes de quatro a seis me-
ligamento tibiofibular anterior e não têm abertura do espaço ses.
articular tibiofibular distal. Essas lesões são tratadas não
operatoriamente com tratamento funcional, como descrito CONCLUSÕES
na parte de lesões agudas do ligamento lateral do tornozelo.
Essas “lesões altas do tornozelo” geralmente demoram mais Lesões agudas do tornozelo são lesões comuns na prática
a resolver que as mais comuns. Pode levar várias semanas ou esportiva e o tempo de incapacidade devido a elas é signifi-
meses até que os sintomas permitam voltar à participação cativo. Felizmente, o tratamento funcional tem dado bons
nos esportes. resultados na maioria dos casos e o tempo de inatividade
Rupturas completas isoladas da sindesmose ocorrem, mas tem sido minimizado.
elas são relativamente raras. Entretanto, diástase tibiofibular A maior área potencial de problemas de incapacitação são
ou lesão completas da sindesmose não tratadas são lesões as lesões da sindesmose não identificadas e não tratadas, com
potencialmente sérias que resultam geralmente em um longo ou sem lesão do ligamento deltóide. Muito cuidado tem que
tempo de incapacidade. Se toda a sindesmose está rompida, ser tomado para avaliar cuidadosamente a sindesmose em
a fíbula pode encurtar e rodar externamente, levando a arti- todas as lesões de tornozelo. Problemas potenciais posterio-
culação a uma incongruência e subseqüentes mudanças ar- res são o desenvolvimento de instabilidade dos ligamentos
tríticas70. Então, um diagnóstico correto e tratamento ade- laterais do tornozelo e/ou ligamentos subtalares. A maioria
quado são essenciais. Uma ruptura completa tem uma indi- deles pode ser bem tratada com treinamento proprioceptivo
cação clara para intervenção cirúrgica com colocação de um e funcional com órtese ou imobilização com bandagens, ou
parafuso de sindesmose temporário para estabilizar a articu- com reparação cirúrgica tardia nos casos refratários.
lação80. Durante a fixação desse parafuso, o tornozelo pode
ser mantido em 30º de dorsiflexão, desde que nessa posição REFERÊNCIAS
a parte mais larga do tálus esteja presa na mortalha do torno-
1. Brooks SC, Potter BT, Rainey JB. Treatment for partial tears of the lat-
zelo e não obstrua a articulação. O parafuso deve ser coloca- eral ligament of the ankle: a prospective trial. Br Med J 1981;282:606-
do a aproximadamente de 1 a 2cm dos ligamentos tibiofibu- 7.
lares e direcionados ântero-medialmente e perpendiculares a 2. McCulloch PG, Holden P, Robson DJ, Rowley DI, Norris SH. The value
essa articulação81. of mobilization and nonsteroidal anti-inflammatory analgesia in the man-
Traduzido do original: Renström PAFH, Lynch AS. Ankle ligament injuries. Traduzido para a língua portuguesa por:
Rev Bras Med Esporte 1998;4:71-80. Dr. Arnaldo José Hernandez
Membro do Conselho Editorial da Revista Brasileira de Medicina do Esporte
Médico Especialista em Medicina do Esporte pela Escola de Educação Física da
USP
Médico Assistente Doutor do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
USP – Grupo de Joelho
Presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia do Joelho – 1999/2000
Ex-Presidente da Sociedade Paulista de Medicina Desportiva – 1992/1993