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A Musica, as Palavras ¢ a Constitui¢io do Sujeito: Ressonancias na Clinica do Autismo ¢ da Psicose Infantil* Bianca Lepseh Vivarelli** Resumo Neste trabalho buscamos fundamentar na psicandlise a afir- magao de que a musica, enquanto estrutura simbélica, produz, no sujcita do inconsciente, efeitos de linguagem a partir dos quais cle pode fazer-se representar, entendendo os sons musicals, os sons das palavras ¢ os atos de um sujeito come significantes. Através de um caso clinico, pensaremos também no lugar do musicoterapeuta e da miisica num Servigo de Satide Mental Infanto-Juvenil da Rede Mu- hicipal de Satide da Cidade do Rio de Janeiro, cuja orientagio clinica é psicanalitica. Palavras-chave: Som, Musica, Linguagem, Sujeito, Autismo. Abstract Tn this paper we try to ascertain in psychoanalysis the assump- tion that music, as a symbolic structure, creates, in the subject of the unconscious, effects of language from which he can represent himself, understanding the musical sounds, the sounds of the words and the acts of a subject as a signifiers. With a case study, we will also consider the roles of music and the music therapist in the public service of mental health in the city of Rio de Janeiro. F Trabalho escrito a partir de monografia apreseriiada pels autora, sob o titulo A mixica ea dispasi~ tive analitico; ressondncias na clinica do autismg ¢ da psicose infantil, ao Curso de Especializagio om Paicanilise ¢ Sside Mental do Programa de Pés-Craduagito em Psicandlive da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, em 2003. ** — Musicoterupeuta formada pelo CBM/RJ. Especialista em Peicandlise / UERJ. Musicoterapeuta do Centro de Atenglo Prico-Social Infanto-Juvenil (CAPSi) Peqeeno Hans/ItJ. Professora ¢ regents auniliar do Coral das Meninas Camtoras de Prirspolis:RJ, Membro da Consissio Cicmifica da AMT-RI desde 2000, Enderepo: Rua Senador Muniz Freire, 44/408, Vila Isabel. Rio de Janeiro — RJ, CEP; 20541 -40, Tel: (21) 2238 4805. Email: biancavivarellii@terra.combr =hy— Key-words: Sound, Music, Language, Subject, Autism. Intredugiio Em minha formagao académica como musicoterapeuta tive, desde muito cedo, a oportunidade de estar em contato com os con- ecitos da teoria psicanalitica de Freud, Espalhadas pelos quatro anos do curso, as cadeiras dentro da drea de Psicologia foram ministra- das, em sua maioria, por uma professora que também ¢ psicanalista. Freud, que para mim ¢ra aquele “que explicava”, passou a ser aquele que suscilava questiies, ¢, por isso mesmo, aquele que mais me fala- va de perto no que diz respeito ao manejo da clinica. A ética da psicandlise, que leva em conta a verdade do desejo, que opera de forma a fazer o sujeito trabalhar e se responsabilizar por seu desejo ¢ que oferta uma escuta a este sujeito na aposta de que todo saber esta do lado dele e nito daquele que pretende trati-lo, mostrou-s¢ como aquela que deveria nortear meu trabalho clinico. Grande parte dos autores que pensam teérico-clinicamente a musicoterapia circunscrevem sua pritica dentro do campo das tera- pias. Existe até mesmo uma tendéncia dentre os profissionais a con- siderarem a musicoterapia como uma musicopsicoterapia. Barcellos ressalta a importancia de se delinear a pritica clinica da musicotera- pia de maneira a diferencia-la de outras atividades que também uti- lizam a misica, pois estas “podem vir a ter efeitos terapguticos, mas a Unica que tem objetivos terapéuticos ¢ se constitui como terapia é a Musicoterapia”.'™ Esta tendéncia explica-se com a propria origem da musicotera- pia como disciplina, como bem localizou Abreu". Na Europa, com Dalcrose, desenvolveu-se uma terapia educativa musical. Paralela- mente, nos Estados Unidos da América, os hospitais que tratavam os combatentes da Primeira Guerra Mundial contratavam miusicos a fim de oferecerem um alivio para seus sofrimentos, a musica entendida 124 BARCELLOS, Lia Rcane Mendes, 1999, p. 44, 125 ABREU, Francisca Mariana, 2003, —f— como recurso terapéutico. Existe também uma afirmativa no senso comum de que a misica faz bem, que proporciona prazer, relaxam- ento, que pode ser fonte de descarga ¢ alivio para as tensdes... En- fim, de que a misica comporta em si a qualidade de ser terapéutica. “Quem canta seus males espanta...”, © psicanalista Carlos Augusto Nicéas reconhece, tanto na psi- coterapia como na psicanilise, efeitos terapéuticos. Esses efeitos podem se produzir toda vex que um que soffe se dirige a um outro que acolbe a sua demanda de cura, E, portanto a relag’o do sujeito com a pa- lava que conveca, imediatamente, a ago terapéutics, desde que a palavra poe em aperapSo-a funelio da Outro. 2 Ao falar sobre as intersegdes e diferengas entre psicoterapia e psicandlise, Jacques-Alain Miller escreve que o que existe em ca- mum entre elas “é que ambas admitem a existéncia de uma reali- dade psiquica”.'*” A principal diferenga estaria na posigdo que cada qual, psicoterapeuta ¢ psicanalista, adotam, ou seja, nas respostas que cada um da a demanda de um sujeito. Para o autor, as psicotera- pias sdo terapias pela imagem, pela identificagdo com o mestre, com aquele que sabe o que o sujeito precisa; “o que é essencial, e que faz psicoterapia, é o assujeitamento ao Outro”,'* Na psicanalise existe uma recusa radical do analista em ser o mestre, Na medida em que o analista pode ser situado pelo sujeito no lugar do grande Outro para quem ele, sofrendo, dirige uma demanda, seu desejo é um desejo de saber, é um desejo que da lugar a questio do desejo deste sujeito, que permite que ele va além da identificagdo, O desejo do analista, afirma Miller, “é apenas a outra face da paixiio da ignorancia. E preciso, efetivamente, que o analista s¢ mostre hab- itado por um desejo mais forte do que o desejo de ser o mestre”.'* 126 NICEAS, Carlos Augusto Riots apud Fortes, J, 1997, p. 24. (7777) 127 MILLER, Jncques-Alain apod Forbes 1, 1997, p.12. 128 Mhid., 1997, p. 13. 129 Thi. 1997, p. 15. =—— Nesta busca por alivio o sujeito supGe no outro um saber que ird cuni-lo ¢ isso coloca em operacao o campo da transferéncia. Nicéas (apud Forbes, 1997) acredita que (..) pelas respostas dadas & suposiglo- de saber que os destina ao lugar do ‘Outro na transferéncia, analista ¢ terapeuta maniém radicalmente distintos Mo analitico ¢ intervengde psicoterapéutica. Enquanto a interpretagdo de um sustenta a demanda no nivel do deseja, © outro, nutrindo de sentido o sintoma, sutura a demanda com a significagia,! Quando comecei minha clinica como musicoterapeuta, deparei- me com um impasse: de um lado estavam anos de formag&o académi- cae, do outro, a convocagao ética que me fazia a psicanalise, 4 qual estava irremediavelmente destinada a responder. Assumindo o compromisso de buscar fundamentacdo, passei a freqilentar grupos de estudos juntamente com outres colegas musi- coterapeutas, busquei andlise ¢ iniciei um trabalho de supervisdo. A cada nove trabalho, a cada novo paciente, a questao se recolocava: como fazer meu trabalho? ‘Comego entio, em julho de 2001, a trabalhar no CAPSI (Centro de Atengao Psicossocial Infanto-Juvenil) Pequeno Hans, uma uni- dade de atengao diaria em satide mental da Rede Municipal de Saiide do Rio de Janeiro, No CAPSI atende-se a uma clientela bastante es- pecifica: criangas ¢ adolescentes autistas, psicéticos ¢ portadores de grave sofrimento psiquico, incluindo deficiéncias diversas de base neurolégica, O trabalho clinico que la ¢ realizado fundamenta-se na psicandlise. Sustenta-se o dispositivo clinico ampliado dentro do qual um trabalho psicanalitico srictu sensu acontece, A partir das articulagdes que foram surgindo em meus estudos e do trabalho clinico no CAPS! Pequeno Hans muitas questées se apresentaram. Quais seriam as condigdes de possibilidade de uma clinica da musicoterapia orientada pela teoria e pela ética psicanaliticas? Como fazer isso. com todo o rigor que cada qual, musicoterapia ¢ 130 NICEAS, Carkes Augmito Nicéas apd Farbes, 1 1997, p. 27. —12— psicanalise, exigem, sem se tratar de uma adaptacao, de uma leitura ou de uma prevaléncia de uma sobre a outra? ‘Qual o lugar que pode ter um musicoterapeuta dentro de um dispositivo psicanalitica? De que maneira avangar, dentro de um trabalho clinico, para além da fungéio terapéutica da misica? ‘Como a psicandlise escuta a misica? Como o sujeito escuta a miisica? ‘Qual o estatuto da miisica na escuta de um sujeito? De que maneira mtsica ¢ palavra se articulam? ‘© presente trabalho propée-se a pensar ¢ a dialogar com estas vastas questdes, buscando ir na directo da construcio de uma nova ¢ Tigorosa fundamentagdo para a musicotcrapia. A Masica e as Palavras Por que o homem no s¢-contenta em falar, por que ¢ preciso que ele cante? Se hi um parentesco entre a fala.c 0 canio, qual sera cle?! ‘Qual sera o parentesco entre a fala e o canto? Qual sera o parentesco entre palavra e musica? Ao refietir sobre as palavras ¢ a musica, Lévi-Strauss" recorre 4 obra de um pensador do século XVIII chamado Michel-Paul-Guy de Chabanon (1730-1792), um fildsofo que era a0 mesmo tempo vio- lonista ¢ compositor. Chabanon, demonstrando uma espantosa mod- ernidade para sua época, deseobre na misica “propriedades idénti- cas 45 que a lingilistica estrutural atribuird 4 lingua™."* Contudo, na avaliagdo de Lévi-Strauss, Chabanon nado consegue perceber uma analogia entre a miisica e as palavras. Mas, apesar de consideri-las como dominios estranhos entre si, Chabanon enuncia sobre a primeira, principios sobre os quais mais tarde Ferdinand de Saussure fundaria a lingilistica estrutural. 131 DIDEER-WEILL Alain, 1999 132 LEVI-STRAUSS, Claude, 1997, 133 CHABANON, Michel-Paul-uy do, 1729-1792 apud LEVL-STRAUSS, Claude, 1997. p20, = Considerando as relagdes entre melodia e harmonia, Chabanon assim resume: “Sucesso, eis a melodia; simultaneidade, eis a har- monia™.'* Desta forma, antecipa-se ao que Saussure estabeleceria como relagao fundamental para a andlise da linguagem: a relagao entre o eixo das sucessividades ¢ 0 eixo das simultaneidades. A doutrina de Saussure, de acordo com Garcia-Roza™, gira em tomo do conceito de signo lingiistico, O signo saussuriano ¢ repre- sentado pela unido de duas partes indissocidveis: o significado e 0 significante - “um conceito ¢ uma imagem acistica (ow impressao psiquica do som)". Assim, temos: Signo= Significado Significante Garcia-Roza segue colocando que, para Saussure, a significagado do signo lingilistico advém, primordialmente, da relagdo isolada en- tre o significado e o significante. Saussure confere uma certa au- tonomia a esta relagdo, apesar de também considerar um conceito de valor onde um signo deve ser pensado em sua relacdo com os demais signos do sistema, A lingilistica de Saussure surgiu alguns anos apés Sigmund Freud ter criado a Psicanilise. Mas, para Jacques Lacan, “Freud havia inventado a nova lingilistica, antes que esta nascesse”. Lacan afirma que “quando realiza uma analise do inconsciente, a qualquer nivel, Freud sempre faz uma andlise do tipo lingilistico”, consid- erando a “Interpretacdo das Sonhos” como um “verdadeiro tratado de lingtlistica’,"7 P. 79. As comeinuapiex de Chabarsoa niastram-se bastante atuais. No Diciondrio- duica; edigao concisa, editado por Stanley Sadie — Rio de Janeina: Jorge Zahar Ed, 1994, snsontramos as seguintes definiptes: para harnonia -“combieaglo de notas soando simultancarsente"; ‘em secesso, mum determinado padrio ritmico, para formar uma unidade idcutifickvel”, (p. 407 ¢ 592). 0 grifa € nosso, 135. GARCIA-ROZA, Luis Alfredo, 1984, 136 bid, 1984, p. 184, 137 LACAN, Jacques aped LETTE, Nina, 1994, p.3$. —illd— Nina Leite", ao pensar na articulagdo entre a Lingistica ¢ a Psicandlise, aponta que o retorno que Lacan realiza 4 obra de Freud utilizando-se, de maneira subvertida, de conceitos da Lingilistica “nio se trata de uma tradugdo de termos”. Para a autora, “esta refer- éncia ndo se faz deixando intactos os conceites da Lingilistica, mas sim pela via de submeté-los a um tratamento 4 luz da hipotese do inconsciente”."” Assim, a concepgdo lacaniana de signo lingiistico aparece in- vertida: Signo= Significante Significado Conforme o exposto por Garcia-Roza,"" Lacan quebra a uni- dade do signo lingiistico postulada por Saussure, desfazendo a sold- agem que o lingilista considerava existir entre significado e signifi- cante quando passa a tomé-los como dois conceitos distintos que se articulam paralelamente e que aparecem separados por uma barra resistente 4 significagdo. E a relacdo entre os significantes que ira determinar um significado. Lacan"! postula que a relacio entre os significantes se da at- ravés de dois mecanismos como os descritos por Roman Jakobson ¢ Morris Halle sobre o funcionamento da linguagem, a metafora ¢ a metonimia, identificando-os com os mecanismos de condensagao ¢ deslocamento apontados por Freud como regentes do funcionamento do inconsciente. Afirma que: © inconsciente & no fundo dele estruturado, tramado, encadcado, tecido de linguagem, E no somente o significants desempenha ali um papel tio grande quanto 0 significado, mas ele desempenha ali o papel fundamental ‘O que, com efeito, caructeriza a linguagem ¢9 sistema do significante como ans 139 LENTE, Nina Leite, 1994, p.34, 35. 140 GARCIA-ROZA, Luis Alftedo, 1954 TL LACAN, Jacques, 1988. 142 Thid., 1985, p. 139, aa Lévi-Strauss"? considera que a miisica é de fato uma lingua; porém, uma lingua que desconhece o diciondrio. Para o antropdlogo, “a musica € uma linguagem, uma vez que a compreendemos, mas cuja originalidade absoluta, que a distingue da linguagem articulada, deve-se ao fato de que ¢ intraduzivel”.™ No entanto, como bem nos lembra Didier-Weill'*, as palavras sio potencialmente portadoras deste carater intraduzivel do musical. Palavras ¢ musicas sio feitas de uma mesma matéria prima - de som; de significante. O autor chega a dizer que vivemos em um mundo onde a linguagem ¢ clivada entre a palavra e a misica, Lacan'** nos diz, em seu Seminario III sobre as psicoses, que na descoberta analitica no devemos nos ater ao achado de um signifi- cado, Devemos buscar ir mais longe, ir até o significante. Uma sig- nificagado sempre remete a outra significado ¢ nisso Lacan considera oO esquema-de Saussure discutivel, pois, para o lingilista, existe uma correspondéncia biunivoca entre significado e significante. Para o psicanalista ha uma autonomia do significante, que possui leis que lhe sao proprias, independentemente do significado. Isso faz com que, para se compreender o fenémeno da linguagem, seja preci- so fazer urna distingdo do significante e do significado, O significado desliza sob o significante. E o significante, enquanto tal, ou seja, em si mesmo, fora de uma cadeia associativa, nado significa nada, j4 que €do deslizamento dos significados sob a cadeia significante que sur- gird o fendmeno da significagio. Partindo das conceituagdes que, por parte da miisica, Chabanon faz a respcito da harmonia e da melodia e, por parte da psicanilise, Lacan faz sobre a metéfora ¢ a metonimia, poderiamos tecer uma analogia entre a estrutura da musica e a estrutura do inconsciente. Considerando a misica como uma linguagem e, numa definiggo mais abrangente, como o resultado de uma combinagio entre as al- turas ¢ as durages dos sons, ¢, baseando-nos no aforismo lacaniano de que “o inconsciente € estruturado como uma linguagemi”, que ar- 143 LEVI-STRAUSS, Clande apod DIDIER-WEILL, Alain, 1599. 144 Pid, 1900, p, 242, 145 DIDIER-WEILL, Alain, 1997 146 LACAN, Jacques, 1588, — 16— ticulagdes, ento, poderiam ser feitas entre musica e inconsciente? Vimos que Lacan, dentro do campo da Psicandlise, declara Freud como o “inventor” de uma nova lingilistica. Por sua vez, Lévi-Strauss’ dentro do campo das Artes, descobre em Chabanon a enunciacao de principios lingiisticos a partir de reflexdes sobre a miisica, nfo sobre a lingua, equiparande as formulagdes do filésofo as idéias existentes na Lingilistica moderna. Partindo disto, o autor chega a afirmar que “na historia das idéias, uma ‘sonologia’ antecipa e prefigura a fonologia”.'"* E na histéria de um sujeito, como poderiamos pensar os adven- tos da misica e da palavra? Seria possivel, diante disto, levantar a hipdtese de que o som da palavra antecederia, num tempo mitico, qualquer efeito de signifi- cagdo? Rousseau, fildsofo iluminista contemporineo de Chabanon, as- sociava a origem da mitsica 4 da linguagem articulada. Segundo Lévi-Strauss,'” este cra um ponte de divergéncia entre os dois filo- sofos. Para Rousseau’*’ a primeira linguagem do homem seria a lin- guagem das paixdes. “Ela ¢ figurada. E insepardvel do canto, ¢ mais préxima da poesia que da prosa”.'*! Em seu Ensaio sobre a origem das linguas diz que: Com as primeiras vores, se formaram as primeiras amticulagdes ou os pri- meiros sons, segundo o género da paicko que ditava uns ou outros, A célera. arranca gritos ameagadores, que a lingua ¢ © palaio articulam, mas a voz da ccrmura é mais suave, ¢ a glote que a modifica, © essa vor se toma um som, $6 0s scus tons sho mais freqlientes, mais raros, as inflenies mais ou menos agudas segundo o senlimento que se ucrescenta, Assim, a cadéncia e ‘os sons nascem com as silabas; a paix3o faz falar todos os Gxgos, ¢ adorna avaz com todo scu brilho, Assim, os versas, os canios, a palavra tém uma origem comum.!® 147 LEVI-STHAUSS, Clade, 197. 148 Pid, 1977, p. 75. 149 LEVE-STRAUSS, Clavde, 1997. 150 ROUSSEAU, spud NEF, F, 1995, 151 bid, 1995, p. 127. 152 Mid, 1995, p. 126127. 0 grit # nosso. —HF— Retornando & pergunta enunciada por Didier-Weill sobre qual © parentesco entre a fala ¢ o canto, encontramos a afirmagie de que a voz materna ao mesmo tempo em que nos passa a sua fala, passa também a sua miisica, Didier-Weill situa o som desta “sonata ma- terna” como uma “mediagiio entre o que a precede ¢ 0 que a sucede: © que a precede remete ao significante do Nome do Pai que sustenta © simbdlico, o que a sucede ¢ 0 inconsciente por vir da crianga re- ceptora do som”.'* O autor coloca, portanto, a via significante como precedendo o som da sonata materna, ou seja, a misica pode ter efei- tos significantes, pois incide em um campo estruturado pelo Outro. A sonata matema “introduz no mundo a existéncia do signifi- cante”.'* E pela miisica desta voz que se realiza a transmissio do simbélico que vai inaugurar um sujeito. O lugar da mae neste pri- meiro momento ¢ o lugar do grande Outro, que é o lugar da lin- guagem, Mas © que estariamos aqui chamando de “misica da voz da mae?” Scriam as modulagdes ¢ inflexdes desta voz, seu timbre, o rit- mo da sua elocugdo, a cadéncia de um fraseado. A voz habita as pa- lavras ¢ 0 bebé recebe © banho de linguagem que o transforma num sujeito através desta voz, antes mesmo de significar o que esta sendo falado. Desta maneira, o banho de linguagem é um banho sonoro ¢ a melodia da voz materna é o meio através do qual os significantes sdo transmitidos. Somos levados entdo a concordar com Rousseau quando diz que o canto e as palavras tém uma origem comum, a lin- guagem:; eles ¢stdo na constituicdo, na origem do préprio sujeito. Podemos, portanto, afirmar que a misica pode ter o efeito de uma estrutura simbolica para um sujeito, estrutura da qual ele pode langar mao para fazer-se representar, Didier-Weill nos diz que a misica é “a mediadora de uma pura articulagdo Iégica entre o Outro ¢ o sujeito”.!* A musica, por ser uma linguagem, esté no campo do Outro ¢ recoloca em cena esta 153° DI WEILL, Main, 1999, p.! 14 apud LACAN, 1999, p.231. 188 DIDEER-WEILL, Alain 1997, p, 259, dimensio do Outro. Didier-Weill postula que um dos caminhos pos- siveis para se compreender esta relago primordial do sujeito com o Outro parte de uma reflexdo tedrica sobre a musica. Oadvento do sujeito ndo coincide com o nascimento da erianga. Ao falar sobre a constitui¢ao do sujeito, Lacan diz que a crianga, a principio, “se esboga como assujcito”.'* E dessa maneira que ¢x- perimenta a condi¢io de dependéncia dos cuidados e caprichos de um outro, que é a mae. Essa mie dia seu filho aquilo que ela supde ser sua necessidade. O tempo da necessidade no assujeito € um tempo mitico, jd que, no momento em que a mie interpreta seu choro como, por exemplo, fome, dando-lhe o scio, acontece o atravessamento pelo significante, © encontro com a linguagem, inaugurando-se ¢ estruturando-se ai um sujeito, Sobrepondo-se ao traumatico do encontro com a marca significante que o som entrard como passivel de significar ¢ que a musica matema poderd afetar o filho, pois ineidiré sobre um campo estruturado pelo significante que incide no momento do encontro da boca com o seio, O que esse sujeito recebeu da mie nesse primeira momento 56 podera ganhar um significado depois, E uma significagao que ja es- tava ld, mas o sujeito nao sabia, uma significagdo que se desencadeia num segundo momento, 4 posteriori. Portanto, cabe ao sujeito marcado pelo significante um ato de se constituir enquanto tal a partir do que lhe causou, ou seja, o prap- rio significante, para entdo alcar a significado. Um sujeito, entao, se constitui a partir do que lhe causa, o significante, mas também a partir de seu ato, A Masica ¢ o Dispositivo Analitico As questées desenvolvidas neste trabalho, conforme exposto an- teriormente, surgem principalmente a partir da experiéncia clinica que se desenrola no CAPSI Pequeno Hans com sujeitos = criangas ¢ adolescentes — autistas e psicdticos. 188 LAGAN, Jacques, 1999, p.195, —ho— Esta clinica desenvolvida no CAPS! segue, segundo Elia™, a orientagdo indicada pela psicandlise ¢ propde uma modificagfo do dispositive psicanalitico somente em sua configurac3o — espaco, tempo, outros sujeitos além do analista e do paciente nesta config- uragdo espaco-temporal — preservando sua estrutura com as exigén- clas ¢ticas e metodoldgicas da psicanalise, “que se fundamentam na palavra e/ou no ato sob transferéneia, desde que o operador chamado de analists corala em seu lugar, capaz de tomar esta fala e este ato Nesta proposti de dispositivo varias criangas e varios técnicos freqtientam um mesmo espago/tempo, num regime de penmanén- cias-dia onde se experiencia a pratica da psicandlise entre muitos, visando como eixo do trabalho propiciar a emergéncia do sujeito. N&o existe um projeto terapéutica com propostas pré-estabelecidas como as de oficinas. O que se faz, como disse a mae de um paciente numa reuniao de pais, é “seguir as pistas" que estes sujeitos nos dao. A instituigio tem como eixo principal a proposta de ouvir os sujeitos enio de dirigir-s¢ 4s doengas. A psicanalista Katia Santos'** membro da equipe do CAPSI ¢ integrante da referida pesquisa expde que nesta proposi¢ao de tra- balho, (...) concebs-se um dispositive clinic cm que todos ox téenicos deixariia seus saberes especificos para mergulhar no trabalho direto com as crianeas c os jovens: © com eles aprender a inventar as intervengées, ¢ também, com cles eriar © novo. © analista deixa o lugar de tinico responsivel pela con- dupto do trabalho com o sujcito, do Gnico que detém a responsabilidade dos efeitos terapéuticos ¢ transferciciais (..) abre-se a possibilidade de en- soniro com a intervengdo analitica que pode se presentificar como estando sustentada por qualquer integrate da equipe.!" Chegando ao CAPSI, senti-me entdio convocada a “mergulhar” no trabalho com estas criangas e adolescentes. De fato, neste tra- 137 ELIA, Leciano F. 2002. 15S Ibid 2002, p. 8. 15% Santos, Kiltia Wainstock Alves dos, 2001 160 Phid., 2001, p39. — 120— balho, cria-se o novo, e acredito que esta foi uma dimensdo colocada para a equipe, para os pacientes ¢ para mim. Era a primeira vez que um musicoterapeuta integrava a equipe. Seguramente, antes da minha chegada, a miisica cra empregada como recurso de trabalho e talvez até mesmo como intervengdo. Havia in- strumentos musicais que eram utilizados pelas criangas e pelos téc- nicos durante as permanéncias. Como vimos, no CAPS! Pequeno Hans niio se trabalha com a proposigdo de uma equipe multidiscipli- nar, mas com a de que cada técnico possa despojar-se de seu saber especifico, operando de forma a colocar o sujeito diante da tarefa de formular suas préprias interrogagdes. Entao, qual seria o lugar do musicoterapcuta neste dispositive psicanalitico? Como realizar um trabalho com musica que se inclua no campo da ética da psicandlise? Escutemos, pois, para melhor il- ustrar o trabalho da musicoterapia neste dispositivo psicanalitico, o relato de um caso clinico. Caso Clinico Ken é um menino autista de cinco anos de idade que é aten- dido desde que tinha um ano ¢ sete meses no CAPS! Pequeno Hans. Ken chegou ao servico através de seu pediatra, com uma historia de alheamento que teve inicio aos quatro meses de idade, Durante um passeio junto com a mae ¢ a avd, Ken comega a chorar e assim permanece por dez dias, salvo os poucos momentos em que dormia. Foram feitas uma série de investigagdes pelos médicos e apds o déci- mo dia, o menino silenciou passando a ficar completamente alheio. Segundo Amaral,"! sua psicanalista, a mie de Ken atribuia-lhe uma surdez ¢ uma cegueira intermitentes, pois em alguns momentos ela acreditava que o menino ouvia e enxergava, mas em outros, parecia- Ihe inteiramente ausente. Através do atendimento psicanalitico que é feito também com esta mie, foi revelado que Ken ocupava para ela o lugar de um presente incestuose para sua propria mae. O avd de Ken 161 AMARAL, Nyragha, 2001, —121— era falecido ¢ sua mde desde entdo ocupava seu lugar na familia, As marcas paternas evidenciavam-se como inexistentes nesta relagio avé-mic-filho, com o que contribuiu o afastamento de fato do pai de Ken. De acordo com relatos da equipe, quando chegou ao CAPSI, Ken era uma crianga completamente hipoténica. Ficava deitado de brugos, com a boca encostada no chio, babando bastante, sem emitir sons ou esbogar qualquer movimento. Quando comecei a trabalhar no CAPSI - Ken, assim como sua mae, jd vinham sendo atendidos ha dois anos - deparei-me com um menino que andava por todos os cantos, que subia nas mesas e cadei- ras, que pulava e que enxergava ¢ ouvia. Inicialmente pude observar que Ken raramente emitia sons vocais; produzia sons rogando os dentes e/ow os dedos em superficies porosas, que geram sons inter- mitentes, ou fazendo vibrar os libios, com a lingua para fora, ob- servando as gotinhas de saliva que eram expelidas neste movimento. Gostava muito de passar os dentes por uma portinha de metal que era toda trangada e que ficava na parte de baixo de uma mesa, Passi a aproximar-me de Ken utilizando os mesmos sons que cle produzia. Num jogo especular, ds vezes repetia o som que ele fazia e, oulras vezes, incrementava este som com algum novo elemento ritmico, sempre dentro do universo sonoro de Ken. Permaneciamos por algum tempo neste “didlogo”. Ken sorria e, por vezes, gargal- hava. Ken tem o habito de chupar o dedo polegar e este movimento passou a ser acompanhado por sons vocais murmurados que ainda néo apresentavam uma variagdo intervalar, ou seja, ainda ndo se fazia presente uma oposig¢do sonora. Como tempo, Ken passou a mostrar grande interesse pelo violdo, aproximando-se quando eu comecava a tocar durante a permanéncia, Encostava o ouvido no corpo do instrumento, dedilhando as cordas e passando a lingua ¢ os dentes por elas, repetindo o movimento que faz com os outros objetos. Por vezes emitia, murmurando, sons que eslavam em consondncia com as notas tocadas por mim. —12— Certo dia, logo apds seu aniversdrio de quatro anos, Ken come¢a, no meio da permanéncia, a cantarolar, com a boca fechada, a melo- dia de “Parabéns pra vocé”, bastante ritmada ¢ afinadamente. Passo a cantar também, ora junto com ele, ora deixando-o cantar sozinho; ora com a letra, ora murmurando assim como ele, ora acompan- hando com o violao, ora a cappella. Vale lembrar que apés dois anos de afastamento, seu pai, que é marinheiro ¢ trabalha distante, envia um cartio dando-Ihe parabéns. A mie, que com os efeitos do seu trabalho, vem podendo dar um outro lugar a este homem, mostra ao filho o cartaéo enviado pelo pai. A partir de entao, inicia-se uma reaproximacdo do pai de Ken ¢ de toda sua familia. Desde este episddio, esta passa ser a maneira de Ken estar na permanéncia: cantando Parabéns pra vocé. Quando comego a cantar também esta misica, Ken interrompe o que quer que esteja fazendo para escutar minha voz ¢ muitas vezes tem o movimento de aproxi- mar-se, olhando nos meus olhos, encostando o rosto ou a orelha em minha boca. Sorrindo, ele pula ¢ mostra um grande jibilo. Passei a improvisar, utilizando como base a melodia de Parabéns pra voce, letras que nomeassem as partes de seu corpo, colocando em palavras cantadas aquilo que ele estava fazendo. As vezes, Ken entra no jogo ¢ pega minha mao para colocd-la em uma parte de seu corpo. ‘Gradativamente, Ken foi substituindo o murmurar por silabas tais como “ca, ca, ca...”, “ean, can, can...”, “gan,gan, gan...”, “la,lala..."; depois, comecou a pronunciar fragmentos de palavras do texto da misica, tais como “ida” (querida) e “dade” (felicidades). Hoje, Ken canta a misica na sua integra, palavra por palavra, sempre muito afinadinho e ritmado. Quando introduzo outras pala- vras na melodia, buscando nomear aquilo que Ken esté fazendo no momento, ele fica observando bastante minha boca e tenta “imitar” os sons que estou articulando. Atualmente, Ken comecou a cantarolar a melodia, sem letra ainda, de uma nova can¢So. Por enquanto, a equipe ndo conseguiu identificar de qual musica se trata, Vemos, entdo, que ha agora novos significantes-sons fazendo parte de seu repertério, —23— O caso clinico de Ken nos mostra que a clinica que se propde a ter uma diregdo analitica possibilita o nascimento de um sujeito a partir da suposigdo de que ele desde sempre ld esteve ¢ da escuta de sua verdade, Ken é recebido no dispositive elinico da CAPSI como um sujeito ao inconsciente, sujeito aos efeitos da linguagem e da pa- lavra e é a partir do trabalho analitico que ele passa a poder enxergar, ouvir, ter sustentagao de seu corpo, andar, cantar e, porque ndo dizer, passa a poder falar, Partimos da premissa que Ken esta entrando na linguagem porque canta. Marcamos este momento como a primeira vez em que Ken simboliza: ao invés de nos pegar pela mio ou de sentar em nosso colo como se féssemos uma cadeira, ele emite um som. E através deste som que ele chega até alguém. A miisica, pelo fato de pertencer ao campo do Outro, pode ser tomada como um ato de lin- guagem. Q Outro passa a ser algo separado dele a partir do momento em que precisa, com um som, alcangd-lo, Ken deixa de ser, portanto, incluido no Outro e em seu Fantasma. Acclinica com criangas autistas e psiedticas coloca interrogagdes a respeita do modo particular como estes sujeitos se constituem. De acordo com Amaral, verifica-se uma concomitincia entre a estru- turagdo e o desencadeamento do quadro clinico. Ha o encontro com a linguagem, porém a crianga “neste caso o faz sem a chance de en- contrar o sentido”. Mas, a partir do trabalho no CAPSI e através do empréstimo de significantes por meio de palavras e/ou de sons musicais colocados por mim e pela equipe, Ken avanga no que pod- eriamos supor ser um “ensaio” para a fala. Ao escutarmos a milsica que Ken escolhe como suporte para este esboco da fala - o Parabéns pra yocé, cangdo que cantamos no dia em que comemoramos o nascimento de uma pessoa, lembrando que cla aparece no momento em que seu pai comega, de alguma ma- neira, a ser incluido em sua histéria, podemos, para além deste fato, pensar no enderegamento transferencial que vem no bojo deste canto 4 Cslas pessoas que, com sua aposta, viabilizaram o nascimento do 162 AMARAL, Nymph, 2001, p.2. —124— sujcito Ken. Reconhecemos também que Ken se dirige transferen- cialmente a mim, ¢ no é por acaso que isso se faz musicalmente. Foi preciso, do meu lado, algo do desejo do analista para escutar musica, e nela significantes,a partir daqueles sons que Ken fazia, Foi preciso supor em Ken um sujeito ¢ apostar que este sujeito era suscetivel de advir pela musica. Lacan afirma que: A pantir de momento em que a crianga comega simplesmente a poder opar dois fonemas, cles jd siie dois vocdbulos, E, posto que existem dots, aquele que os pronuncia ¢ agusle a quem eles sto dirigides, isto é objein, a nis, jf existem al quatro clemenios, 9 que ¢ suficienie para comer em si virtualmente toda a combinatérin da qual iri surgir a onganizasio do sig- nificante. Em minha escuta, reconheci nos sons de Ken esta oposigio, dan- do a eles o valor de significante; Ken passou a nos dirigir estes sons agora temos a inclusdo do musicoterapeuta no seu trabalho e na “composic¢do” de suas miisicas. Referéncias Bibliograficas ABREU, Francisca Mariana. A musicoterapia no acolhimento ao sofrimento psiquico — O tragico na clinica. Monografia de conclusio do Curso de Especializagiio em Nivel de Residéncia em Satde Men- tal. Inédita. Rio de Janeiro, 2003. AMARAL, Nympha. 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