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Hélio Martins de Araujo Costa* (in memoriam) Os helmintos constituem um grupo muito numeroso de animais, incluindo espécies de vida livre e de vida parasité- ria, Apresentam os parasitos distribuidos nos filos Platy- helminthes, Nematoda e Acanthocephala (Tabela 21.1) Alguns Gordidceos, representantes do filo Nematomorpha ¢ conhecidos como “crina de cavalo”, parasitos essencial- mente de invertebrados, podem ocasionalmente causar para- sitismo passageiro no ser humano sem graves conseqiéncias, As ocorréncias de helmintos no homem sio muito co- muns, A exemplo: cerca de 20% da populagao humana do mundo esta parasitada por ancilostomideos, o que equiva- lea mais de 1 bilhio de pessoas. A situago & equivalente em relagdo ao Ascaris lumbricoides, Estas infecgdes, em geral, resultam, para o hospedeiro, em danos que se mani- festam de formas variadas. ‘No Brasil, a situago ndo é diferente, justficando lembrar a antoldgica figura do “Jeca Tatu”, criada por Monteiro Lobato. “O jeca nao é assim, estd assim.” FILO PLATYHELMINTES s Platyhelminthes (gr. Platy = chato) so os represen- tantes mais inferiores dos helmintos, os quais se caracteri- zam por apresentarem simetria bilateral, uma extremidade anterior com érgios sensitivos e de fixagdo e uma extremi- dade posterior; pela auséncia do exo ou endoesqueleto; so achatados dorsoventralmente, sem celoma, com ou sem tubo digestivo, sem anus, sem aparetho respiratorio, siste- ma excretor tipo protonefridico, com tecido conjuntivo en- chendo os espagos entre os drgéos. Podem ser de vida li- wre, ecto ou endoparasitos. Seus representantes esto dis- tribuidos, segundo estudos mais recentes, em trés (Turbe- llaria, Trematoda, Cestoda) ou quatro classes (Turbellaria, Monogenea, Trematoda, Cestoda). Apesar dos avangos em sistematica molecular ainda nao & consenso entre 0s pesqui- sadores. Assim, adotamos ainda a classificagio dos Platyhelminthes com divisio em trés classes por ser a mais ifuundida. * Copituo atvalizado polos Professores Alan Lane de Melo e Marcos Pezzi Guimardes. Capitulo 21 CLASSE TREMATODA Sao ecto ou endoparasitos. Os adultos néo possuem epiderme e cilios externos; corpo ndo-segmentado e recoberto por uma cuticula; com uma ou mais ventosas; pre~ senca de tubo digestivo; anus geralmente ausente; herma- froditas ou nao; evolucdo simples ou com hospedeiro inter- mediario. Habitualmente so achatados dorsoventralmente, as ve- zes recurvados, com face ventral céncava, de contomo oval ou alongado; outras vezes parecem volumosos, com extre~ midade posterior alongada e a anterior afilada e truncada, ou globulosos ¢ recurvados dorsoventralmente. A forma tipi- caéade folha (Fig. 21.1), A classe Trematoda compreende ainda trés grandes gru- pos de parasitos: Aspidogastrea, Monogenea e Digenea, das quais interessa-nos a tltima por conter representantes que afetam o homem. Os trematédeos digenéticos possuem érgios de fixagdo comumente representados pelas ventosa oral e acetabulo (ou ventosa ventral). O corpo € revestido por uma cutic la, de natureza acelular, possivelmente resultante de célu- las mesenquimais. Pode se apresentar lisa ou com espi- hos, escamas ou cerdas, recobrindo 0 corpo ao todo ou em part. Logo abaixo da cuticula encontramos fina camada mus- cular. Abaixo da camada muscular, e enchendo todo o espa- 60 interno, encontramos o mesénquina ou parénquima. Nes- te encontram-se os sistemas digestivo, reprodutor, excretor € nervoso. sistema nervoso central é representado por dois gin alios cerebrais interligados por comissuras, um pouco aci- ma ou atras da faringe. Do cérebro partem trés pares de ner- vvos-tronco que se dirigem para a frente e trés pares dirigi- dos posteriormente. Sao pobres em drgdos dos sentidos. Terminagdes bulbosas com emissio de cerdas podem ser encontradas, sobretudo no nivel das ventosas. O sistema digestivo € simples, com abertura bucal situa- da anteriormente ou na face ventral, em alguns casos segui- 185 dos de pré-faringe, faringe e esdfago que se bifurca e origi- na os cecos intestinais. sistema excretor é representado por dois tubos protoneffidiais, um em cada lado, dirigidos posteriormente; fundem-se na porgdo terminal, originando uma vesicula ex- cretora que se abre para o meio exterior através do poro exeretor. A célula em flama é a unidade exeretora e varia em ‘ndimero, conforme a espécie. Os trematédeos ndo possuem propriamente um sistema circulat6rio, contudo, em alguns deles (Paramphistomidae, Cyclocoelidae) podem ser observados ductos mesenquimais Nos Digenea, podem ocorrer espécies hermafroditas (mondicas) e espécies com sexos separados (didicas). Apre~ sentam usualmente dois testiculos (mas podem ser numero- Sos), com canais eferentes, os quais se ligam para formar o canal deferente; este, ja dentro da bolsa do cirro (quando presente), forma a vesicula seminal e, em continuagao, se diferencia em canal ejaculador, envolvido pelas glindulas prostaticas, e, finalmente, formando o cirros ou pénis, que se abre para 0 meio exterior pelo poro genital masculino, no ‘trio genital. © aparelho genital feminino é constituido por um ovatio, do qual parte 0 oviduto que se comunica com 0 oétipo, no percurso recebendo 0 viteloduto e o canal de Laurer, que se comunica com 0 exterior pelo gonoporo; 0 odtipo é envol- vido pelas glindulas de Meblis ou glandulas da casca e se continua originando o iitero, geralmente com alcas, na par- te final, onde se diferencia em metratermo, que se abre no trio genital pelo poro genital feminino. As glindulas vitelogénicas so freqiientemente constituidas por numero- sos foliculos situados nos campos laterais do trematédeo. A autofertilizagao pode ocorrer nos trematédeos, contu- do a fertilizagao cruzada parece ser 0 processo habitual. Poucos trematédeos sto viviparos, prevalecendo as es- pécies oviparas. O nimero de ovos depositados varia con- sideravelmente com a espécie. Alguns, como Fasciola hepatica, depositam milhares de ovos. Nos Digenea, 0 ovo é geralmente oval e de coloragao clara ou marrom — escura, com opérculo em uma das extre- midades. Em algumas espécies, 0 ovo, ao ser eliminado, ja contém uma larva (miracidio) desenvolvida, como em Schisto-soma; em outras, 0 ovo & eliminado néio-embrionado (Fasciola, Eurytrema) e o miracidio € formado apés a elimi- nago do ovo para o meio exterior. O miracidio necessita al- cangar um molusco para dar continuidade ao ciclo ¢ pode fazé-lo de dois modos: nos casos em que 0 miracidio é libe- rado na 4gua (Schistosoma, Fasciola) ele penetra ativamen- te em um molusco aquético (Biomphalaria, Lymnaea) ou quando 0 miracidio permanece dentro do ovo (Eurytrema, Platynosomum), hé necessidade de 0 ovo ser ingerido por um molusco de habito terrestre (Bradybaena, Subulina) para dar continuidade ao ciclo. Os moluscos s4o os primeiros hospedeiros intermediarios. A evolucdo no hospedeiro in- termediario pode passar pelas fases de esporocisto, rédia, cercdria, mesocercaria e metacercéria. A formagao de metacercéria algumas vezes exige um segundo hospedeiro fermedirio, Quando a forma infectante € a cercéria, a in- fec¢do do hospedeiro definitivo se da pela penetracao na pele ou em mucosa (Schistosoma); quando a forma infectante a metacercéria, a infeceao do hospedeiro definitivo se dé pela ingestio (Fasciola). 186 ‘As cereérias ou metacercirias, resultantes de um dnico ovo, so numerosas, com isto aumentando a possibilidade da infecgao do hospedeiro definitive, no qual se completa © desenvolvimento € ocorre a formagao de novos ovos. CLASSE CESTODA Sio endoparasitos desprovidos de epiderme, de cavide- de geral e de sistema digestivo; os drgiios de fixagao esto localizados na extremidade anterior. O corpo é, em geral, alon- gado e construido por segmentos; algumas vezes Jembram trematédeos (Fig. 21.2). ‘Um cestédeo tipico apresenta-se com trés regides distin- tas: a mais anterior constituida pelo escélice, no qual se en- contram os érpios de fixagdo; a segunda porgo, o colo ou © pescoco, suporta 0 escélice, e € 0 elemento de ligagio com a terceira regio, que é o estrdbilo, nitidamente segmentado nas formas polizéicas. Esta classe compreende duas subclasses: Cestodaria e Eucestoda, esta tiltima com varias ordens, das quais interes- sam-nos Pseudophyllidea e Cyclophyllidea, por incluirem cespécies que parasitam o homem. A semelhanga dos trematédeos, os bertos por uma cuticula, a qual repousa diretamente sobre © mesénquima, que nos Taeniidae € rico em corpiisculos caledrios (carbonato de calcio). O sistema nervoso é, basi- camente, constituido por ganglios na base do escélice e ner- oe a Fig. 21.1 — Morfologia de um Trematoda tipico: Eurytrema coelomaticum parasito de ductos pancredticos de ruminantes. Vo-ventasa oral, Faring s-2séfago;c-ceco; pg-poro genital: be-bolsa de ciros; w-ventosa vert |Hesticulo; ov-ovéro; 00-o6tpo (onde ocore a fecundagao) circundedo pe las glandulas de Mehis(cuja secregdo entra na formagao da casca do ov); de-ducto excretr, utter (cheio de oves); pe:poro excreta: gv-glénduls vilelogénicas;ulitero(cheio de oves). Capitulo 24 vos laterais, interligados por comissuras. Nao ha érgios sensoriais especiais. O sistema excretor é protoneffidial, com células flama. Canais excretores percorrem lateralmente 0 corpo do cestédeo e se interligam na parte posterior da proglote, no tiltimo segmento, formando a vesicula excreto- Ta € 0 poro excretor. So, geralmente, hermaftoditas, No Cyclophyllidea ocorre protandria, isto é, os drgiios genitais masculinos se desenvolvem antes dos érgios genitais femi- ninos. Nos Pseudophyllidea, em geral, os érgios genitais ‘masculinos ¢ fernininos desenvolvem-se concomitantemente. Na maioria dos cestédeos hé um conjunto de érgios genitais masculinos e femininos por segmento (Taenia, Hymenolepis). Mas em muitos outros ocorrem dois con- juntos de érgdos genitais masculinos e femininos, por segmento (Fig. 21.3). © aparelho genital masculino pode apresentar dois ou mais testiculos, as vezes algumas dezenas, com canais eferentes que se unem ¢ formam 0 canal deferente, o qual pode se dilatar ¢ formar uma vesicula seminal antes de alean- gat a bolsa do cirro ou dentro dela; em seguida, se diferen- ciando em canal ejaculador, com glandulas prostiticas; 0 segmento final ¢ o cirro ou pénis, que pode ser dotado de espinhos. O aparelho genital masculino, em alguns cest6- deos, abre-se pata o exterior através do poro genital mascu- lino em uma das bordas laterais (Cyclophyllidea); em muitos outros cestédeos, o poro genital € encontrado na face ven- tral (Pseudophyllidea). Os drgios femininos compdem-se de: ovario, freqiente- mente com dois lobos interligados medianamente; 0 oviduto origina-se no ovario € atinge o o6tipo; em tomo deste e tio as glindulas de Mehlis (glindulas da casca); 0 iitero tem origem no odtipo ¢ pode exteriorizar-se num poro uterino (Pseudophyllidea) ou terminar em fundo-de-saco (Cyclophyllidea). As glandulas vitelogénicas podem situar- se abaixo do ovario, como nos Himenolepididae e Taenii- dae ou externamente aos testiculos (ou em mistura com Fig, 21.2 — Alguns tipas de escdleces de Cestode. A) Cyclophylides — com quatro ventosas, ostroe acileas (T. sollum); 8) Tetraphylidea — com quatro botrdias (Tetrarhyncha, parasiio de peixes), C) Pseudophylidea — com dois pseudobotridas (Diphylobathium latum) (segundo Pessoa, 1977) eles), como nos Pseudophyllidea. A vagina liga 0 poro genital feminino ao oviduto, antes formando o receptéculo seminal Nos cestédeos dotados de gonoporos, 0s ovos sao produzidos, completam seu desenvolvimento e sao elimina- dos para o meio exterior, regularmente; nos cestédeos des- providos de gonoporo, os ovos serio eliminados para 0 ex- terior com ruptura do proglote. Pode ocorrer autofertilizagao da proglote, com espermato- 26ides e évulos produzidos pelos drgios genitais do segmen- to; outras vezes pode ocorrer fertilizagao de um segmento por espermatozbides produzidos em outros segmentos do mesmo cestédeo ou fertilizagio entre cestédeos diferentes. A forma do ovo é variavel. Em Pseudophyllidea é ovéi- de ou eliptico, com ou sem opérculo; em algumas espécies, Fig. 21.3 — Morfologia de Cestoda: A) Hymenclepsis diinuta (parasito habitual do ileo de ratos) mostrando ventosas @ um rudimento de rostro inermo (égdo apical) (J. Parasitol 59:667, 1973). 8) Uma proglot: a) cuticul;b) vaso excretor;¢)testiculos;o) canal oferente; e) canal deferent;f)bolsa do ras) atrium genital h) evan; eto; )elnduls vitelogénicas;k) vagina iter Fig. 21.4 — Tipas de larvas do Costoda (Cyciophylidea). A) Cisticerco: um escélex, dentro de uma vesicula medindo cerca de Sm, cheia de liquide; 8)

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