0 Colar de Pérolas como uma estratégia geopolitica
Publicado em setembro 12, 2018, por pucminasconjuntura
Barbara Moreira Fonseca do Patrocinio
Resumo: 0 presente artigo objetiva explanar 0 conceito do Colar de Pérolas,
estratégia expansionista utilizada pela China para aumentar sua influéncia ao longo
das principais rotas petroliferas do Mar Vermelho e do Golfo Pérsico até 0 Mar do Sul
da China. Além disso, pretende-se também informar o leitor a respeito da situagao
vigente no Pacifico Asidtico apés a intensificacdo da postura expansionista chinesa na
regido. Para tanto, o artigo teré trés enfoques principais: a explanagao do conceito do
Colar de Pérolase sua importéncia geopolitica, o aprofundamento a respeito de quatro
principais “pérolas” que fazem parte do Colar, escolhidas devido ao valor estratégico
que 0 domfnio de cada uma confere ao Estado que a controla e, por fim, as possiveis
razées por trds das recentes pretensdes chinesas e os possiveis desdobramentos da
postura expansionista adotada pelo pats.
Afinal, o que é 0 Colar de Pérolas?
A expresso “colar de pérolas” foi utilizada pela primeira vez em um
documento interno do Departamento de Defesa dos Estados Unidos intitulado
“Energy futures in Asia". (VAZQUEZ, 2013). A propria China nunca utilizou esse
termo oficialmente. 0 conceito de “colar de pérolas” é visto de forma geral como uma
iniciativa politica e militar que objetiva proporcionar a marinha chinesa facil acesso
a diversos portos estrategicamente distribuidos ao longo das principais rotas
petroliferas desde o Mar da Arabia até o Mar do Sul da China,
Em outras palavras, o Colar de Pérolas pode ser entendido como uma série
de bases aéreas e navais, portos comerciais e centros de inteligéncia
estrategicamente posicionados pela China para formar um “cordio", de modo a
encurralar a India e quatro importantes peninsulas: a Indochina, a Indostanica, a
Arabica e o Chifre da Africa, (VAZQUEZ, 2013). Essa estratégia de “estrangulamento”
busca aumentar a ja predominante influéncia chinesa na regido e vem causando
certa consternago aos demais paises do Pacifico Asiatico, que se veem cada vez
mais a sombra do avango chings no cendrio internacional.
A adogao dessa estratégia representa ainda a manifestago da crescente
influéncia geopolitica chinesa, visto que o incremento ao acesso a portos e
aeroportos, assim como 0 esforco para o desenvolvimento de relagdes diplomaticas
especiais e a modernizacao de suas forcas militares em bases estrategicamente
localizadas evidencia a aspiracdo chinesa de obter um destaque cada vez maior no
cendrio internacional. (PEHRSON, 2016). Ou seja, mais que uma estratégia
expansionista, o Colar de Pérolas pode ser entendido como parte da doutrina militar
que compée a grand strategy da China nos dias atuais. (A grand strategy de um
Estado pode ser definida como uma teoria de meios e fins a respeito de como um
ator poderia gerar condigdes mais favordveis para garantir a propria seguranca).
(POSEN, 1984).
No entanto, a China alega que seu investimento em infraestrutura maritima
possui motivagGes exclusivamente econémicas, e afirma ainda que traria beneficios
colaterais, também no setor econémico, para os Estados nos quais as bases esto
alocadas. Ainda assim, a importancia geoestratégicali] das localidades escolhidaspela China para a construgio de suas bases denota nitidamente a ideia de projecao
de poder. (PEHRSON, 2016) fii).
As pérolas do Colar e sua importancia estratégica
Sao consideradas pérolas que formam o Colar as bases militares, centros de
inteligéncia e portos localizados em regides estratégicas que proporcionam & China
a possibilidade de maximiza¢o de seu poder, assim como lacos diplomaticos
firmados com paises centrais nessa rota, llustradamente, a construcao de um porto
de Aguas profundas em Sittwe, Mianmar, 6 uma pérola, assim como a construgaio de
uma base naval em Gwadar, no Paquistao. Cada pérola no Colar é, portanto, uma
amostra da influéncia geopoliticafiil] chinesa ou uma clara marcago de presenca
militar. (PEHRSON, 2016).
Em suma, dos projetos de construcdo de bases e portos aos estabelecimentos
de lagos diplomaticos, as pérolas esto distribufdas do inicio da costa da China
continental até os litorais do Mar Ardbico e do Golfo Pérsico. (PEHRSON, 2016). A
China vem, notoriamente, buscando firmar relagdes estratégicas e intensificando
sua presenca ao longo das regides da rota que a conecta ao Oriente Médio.
Assim, como modo de ilustrar a dimensao da possibilidade de maximizago
de poder proporcionada pelo controle das areas estratégicas distribufdas ao longo
do Colar de Pérolas, nesta seco ser feita uma discussdo acerca dos quatro
componentes do Colar mais relevantes para a China no que concerne as suas
intengdes de projecdo de poder.
O primeiro deles é 0 porto de Gwadar, no Paquistio. Uma vez que quase trés
quartos das importagdes de petréleo da China terao de atravessar 0 Oceano Indico
€0 Estreito de Malacca, o porto de Gwadar, majoritariamente finan
6 um ponto relevante em nivel geoestratégico. Além disso, a presenga em Gwadar
representa ainda possiveis “postos de escuta e monitoragio” tanto da atividade
naval estadunidense no Golfo Pérsico quanto da atividade indiana no Mar Arabico,
alertando também para uma possivel cooperagio de ambos os Estados no Oceano
Indico. (CARRIGO, 2007). De forma resumida, 0 porto de Gwadar permite a
intensificagio dos fluxos econémicos entre a China e o Paquistdo, além de
proporcionar 0 acesso aos mercados da Asia Central tanto no que concerne as
importagdes de petréleo e gis natural pela China, quanto no que diz respeito as
exportagdes de produtos chineses para esses mercados. (CARRICO, 2007).
Outra pérola importante é a regio do Sri Lanka, devido a sua proximidade
coma india e o Oceano Indico. A india é a principal rival da China enquanto poténcia
regional no Pacifico Asiatico, e 0 Oceano Indico, que abriga quatro chokepoints[iv)
maritimos importantissimos para 0 comércio internacional, também é
extremamente relevante. Quem domina esses chokepoints- 0 estreito de Ormuz, 0
estreito de Malacca, a regiao do Bab el-Mandeb e 0 Canal de Mocambique — pode
usuftuir de todas as rotas do Indico e até mesmo forgar seus rivais a tomarem rotas
alternativas que gerem aumentos exponenciais dos custos de transporte, fazendo
com que percam a rentabilidade. (VAZQUEZ, 2013).
Outra pérola que chamaa atengao por sua importancia estratégica é o Djibuti,
que est localizado bem ao lado de Bab el-Mandeb, critico chokepoint maritimo.
Além disso, seu acesso para o porto da Etiépia e outras rotas de crescimento das
economias da Africa Oriental faz com que ele seja uma escolha estratégica
interessante para a China. A China tem se mostrado fortemente envolvida nodesenvolvimento de projetos de construgao nessa regiao. Mais relevante ainda &
constatar 0 interesse chinés de consolidagao da sua autossuficiéncia na protegio dos
seus interesses econdmicos e de seguranca no exterior por meio da intensificagao
da sua presenga nessa pérola. (SAFFEE, 2017)
Por fim, ha a regido do Mar do Sul da China, que é considerada uma area
estratégica para todos os paises do Sul Asiatico. A regia é rica em recursos minerais
€ naturais, sendo também considerada uma rota maritima central para o comércio
mundial devido a safda estratégica para o Oceano Pacifico. Controlar essa regio
traria para a China estabilidade enquanto poténcia, e poderia também contribuir de
forma positiva para questes de seguranca doméstica. A relevancia estratégica da
regiao do Mar do Sul da China fica ainda mais evidente quando analisada a partir de
trés elementos centrais: a perspectiva geografica, 0 aspecto comercial e a
significativa presenga de recursos naturais. Controlando o Mar do Sul da China, os
chokepoints da regido seriam também facilmente controlados, sobretudo 0 estreito
de Malacca, onde passam cerca de 60.000 embarcacdes por ano. (Maritime Security
East Asia). Além disso, a China teria controle ndo somente sobre o fluxo de
embarcagdes comerciais, mas também sobre o fluxo de embarcacdes militares. Vale
ressaltar ainda que o principal recurso que transita pelo Mar do Sul da China é 0
petréleo, e cerca de 13 bilhdes de barris de petréleo passam pelo Mar do Sul da China
todos os anos, 0 que corresponde a aproximadamente 40% de todo o petréleo
produzido no mundo. 0 petréleo é um recurso de fundamental importancia para a
seguranga energética chinesa e para a manutengao de seu crescimento econdmico,
que demanda cada vez mais por recursos. (CONDON, et all, 2017)
Desse modo, é possivel constatar que a China vem ocupando inimeros
territérios estratégicos e intensificando sua presenga ao longo das principais rotas
maritimas petroliferas por meio da efetivagao do Colar de Pérolas, e as regides
discutidas acima apenas ilustram uma pequena fracao da dimensao das aspiracdes
politicas chinesas sobre a regio. £ evidente que a postura maximizadora chinesa
transparece a partir da execucao desse projeto de poder no Pacifico Asiatico,
sobretudo por meio do controle de pontos tao estratégicos para a regiao.
Razées por tras da estratégia do Colar de Pérolas e os possiveis
desdobramentos da intensificagao da postura expansionista chinesa
Ao analisar a efetivagao de uma postura expansionista chinesa mais incisiva,
especialmente no que se diz respeito ao avango chinés sobre o Mar do Sul da China,
Gevidente que a estratégia geopolitica do Colar de Pérolas serve perfeitamente para
ilustrar a pretensao chinesa de se consolidar como hegemonia regional.[v] No
entanto, ainda é possivel levantar algumas questdes relativas a essa pratica, como:
o que a China pretende obter ao adotar uma titica de “estrangulamento” dos demais
paises da regiao? Ou, ainda, por que hd todo um enfoque na questao do transporte
pelas rotas maritimas? Esta secdo buscaré responder a essas questes.
£ evidente que ha uma demanda crescente por energia para manter o ritmo
de crescimento chinés. 70% das necessidades energéticas da China sdo atualmente
supridas por carvao, sendo 25% supridas por petrdleo, 3% por gas natural, e os
liltimos 2% por outras fontes de energia, incluindo nuclear e hidrelétrica.
(PEHRSON, 2016). No entanto, existem previsdes que indicam que o consumo de
petréleo crescerd a uma taxa média anual de 5,8% nos préximos 10 anos. Em 1985,
a China era o maior exportador de petréleo do leste asiatico; em 1993, a Ctornou-se uma grande importadora de petréleo; e em 2004, a China ultrapassou 0
Japao para se tornar o segundo maior importador de petrdleo do mundo, Cerca de
40% de toda a nova demanda mundial por petréleo é atribuida as crescentes
necessidades energéticas chinesas. (PEHRSON, 2016).
Assim sendo, é interessante notar que o Colar de Pérolas esté sendo
implementado na medida em que o petréleo estrangeiro se torna um centro de
gravidade critico para as necessidades de energia da China. Ou seja, uma boa
hipétese que justificaria a adoco de uma estratégia geopolitica de “cerco”
“estrangulamento” pode ser a necessidade cada vez maior pelo controle do petrdleo
e de suas rotas, devido a sua importancia para o crescimento chinés.
E possivel constatar ainda que mais de 70% das importagées de petréleo da
China vém do Oriente Médio e da Africa, todas transportadas pelo mar. (PEHRSON,
2016). Embora a China procure obter linhas de fornecimento mais seguras e tente
reduzir a dependéncia de um numero limitado de fornecedores de energia, 0
transporte maritimo do Oriente Médio e da Africa ainda é o principal modo de
importagao de petréleo. (PEHRSON, 2016). Isso justifica a relevancia do papel que 0
transporte maritimo possui na estratégia chinesa, uma vez.que é 0 modo mais vidvel
de fornecimento de energia. Ainda que existam registros de tentativas alternativas
para a obtengio energética, sobretudo na Asia Central, as rotas maritimas
internacionais, através do Estreito de Malacca e de outros chokepoints, continuam
sendo predominantemente a melhor saida para importacio de petréleo do Oriente
Médio e Africa,
Aestratégia do Colar de Pérolas, assim como o comportamento expansionista
chinés no Mar do Sul da China, pode ser interpretada como uma tentativa de
maximizagao de poder que ilustra a pretenso chinesa de atingir o status de
hegemonia regional. A questdo é que a China no 6 0 tinico ator relevante na regio
do Pacifico Asiatico, que conta também com a presenga da Coreia do Sul, do Japao e
da Coreia do Norte. A maneira como os demais atores relevantes da regido, assim
como outras poténcias geograficamente distantes desse conflito ~ como os Estados
Unidos ou algumas poténcias europeias ~ reagirao & nova atitude da China poderia
inclusive gerar reconfigurages na balanga de poder do Pacifico Asiatico. 0 fato 6
que a recente postura chinesa afetard a dindmica daquela regiao de alguma forma.
Conclusio
0 equilibrio da balanga de poder em toda a regidio do Colar de Pérolas se
alteraré na medida em que a China cresca em forga e estatura. Até entdo, as
mudangas nessa balanga tem sido principalmente de cardter econémico,
diplomatico e de soft power [vi], no geral. (PEHRSON, 2016). £ importante lembrar
que, ainda que haja certa polarizagao do conflito entre uma China expansionista e
desenvolvimentista e uma tentativa estadunidense de se manter como tinica
hegemonia regional no cenério internacional, os Estados da regiao do Colar nao sao
obrigados a “escolher um lado” e podem manter relades diplomaticas
simultaneamente com ambos os paises.
A estratégia do Colar de Pérolas ilustra de forma exemplar as pretensdes
chinesas em relago a controle das regides estratégicas para a garantia da
efetivagao dos seus interesses. 0 Colar pode ser ainda a manifestagao da grand
nos dias atuais, uma vez. que faz uso de meios e fins visando gerar
jas para garantir sua prépria seguranga. (POSEN, 1984). De umaforma ou de outra, é interessante analisar a implementagao do Colar de Pérolas a
partir das implicacées geopoliticas para os paises envolvidos, e a opsaio chinesa por
adotar uma estratégia de “estrangulamento” pode ser justificada pela necessidade
do controle absoluto das rotas petroliferas como meio mais seguro de garantir seus
interesses energéticos e de seguranga, além de se manter a frente na posigao de
poténcia regional.
Referéncias
CARRIGO, Manuel Alexandre Garrinhas. Uma “pérola” perto de um mar de petréleo:
A importancia do Porto de Gwadar para a China. Revista Militar, 2007. Disponivel
em: . Acesso em: 25 de agosto de 2018.
CONDON et all, Maritime Security in the Asia-Pacific: A Navigational Map forthe New
US. Administration, Washington D.C,, University of Washington, 2017.
CORREIA, Pedro de Pezarant. Geopolitica e Geoestratégia. Belo Horizonte, 2012.
DINIZ, Eugenio. Politica Internacional: Guia de estudos das abordagens realistas €
da balanga de poder. Belo Horizonte: Editora Puc Minas, 2007.
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. Acesso em: 29 de
agosto de 2018.
MEARSHEIMER, John. The Tragedy of Great Power Politics, updated edition.
Chicago, University of Chicago, 2014.
NYE, Joseph S. 0 Paradoxo do Poder Americano: por que a tinica superpoténcia do
mundo nao pode prosseguir isolada. Sao Paulo: UNESP, 2002a.
PEHRSON, Christopher J. String of Pearls: Meeting the Challenge of China's rising
power across the Asian littoral. U.S. Government, 2016.
POSEN, Barry R. The Importance of the Military Doctrine. Cornell Uiversity Press,
1984.
SAFFEE, Ahmad. Chinese Naval Base in Djibouti: Possibilities and Implications.
Institute of Strategic Studies, 2017.
TIEZZI, Shannon. The Maritime Silk Road Vs. The String of Pearls. The Diplomat,
2014. Disponivel em: . Acesso em: 25 de agosto de 2018.
VAZQUEZ, Daniel Day. A Rota da Seda, 0 Colar de Pérolas e a competi¢ao pelo Indico.
Revista de Geopolitica, 2013.
Notas[i] A definigao de geoestratégia utilizada ¢ a formulada por Pedro Correia: “estudo
das constantes e das variveis do espago que, ao objetivar-se na construao de
modelos de avaliagao e emprego de formas de coasio, projeta o conhecimento
lade estratégica’. (CORREIA, 2012).
Fonte: String of 2017. Disponivel em:
<. Acesso em: 29 de
agosto de 2018.
“Geopolitica” conforme 0 conceito originalmente formulado por Haushofer,
como “o estudo da influéncia da terra nos processos e instituigdes politicas”.
(CORREIA, 2012).
iv] Pontos estreitos e de dificil acesso nas rotas maritimas.
{v] Para Diniz, “Um Estado tio poderoso que domina todos os outros Estados na
regio; em esséncia, a tinica grande poténcia da regio". (DINIZ, 2007).
[vi] Segundo Joseph Nye, o uso de instrumentos dos Ambitos da cultura, ideologia e
politica para obtengao dos resultados desejados,a habilidade de alcancar objetivos
por meio de influéncia em vez da coergao. (NYE, 2002).‘86 17 paises resistem a China e mantém relagées diplomaticas com Taiwan
El Salvador rompeu relagées com Taipé, optando por ficar ao lado de Pequim.
Desde 2016, outros quatro paises tomaram a mesma decistio: Séo Tomé e Principe,
Panamé, Repiiblica Dominicana e Burkina Faso.
Susana Salvador
22 Agosto 2018
Didrio de Noticias
Taiwan acaba de ficar ainda mais isolada, com a decisao de El Salvador de
cortar relagdes diplomaticas com a ilha que Pequim reclama como sua. 0 presidente
salvadorenho, Salvador Sanchez Cerén, é 0 mais recente governante a reconhecer a
existéncia de uma s6 China, 0 que faz que apenas 17 paises mantenham ainda
relagdes diplomaticas com as autoridades de Taipé.
El Salvador fala numa deciso que trara "grandes beneficios” para o pais,
enquanto Taiwan, formalmente chamada Republica da China, avisa que nao entrar
numa "competico por dinheiro" com o gigante asidtico e rival, a Republica Popular
da China.
"Depois de uma avaliago cuidadosa, anuncio que 0 meu governo tomou a
decisao de romper as chamadas relagdes diplomaticas mantidas até hoje entre a
Repiiblica de El Salvador e Taiwan e estabelecer relacdes diplomaticas entre a
Repiiblica de El Salvador ea Reptiblica Popular da China’, disse o presidente Salvador
Sanchez Céren numa mensagem televisiva, revelando ainda que o chefe da
diplomacia, Carlos Alfredo Castafieda, estava em Pequim para o restabelecimento das
relagdes diplomaticas com a China.
“A Reptiblica de El Salvador une-se a outros 177 paises que aprovaram a
resolugio 2758 da Assembleia Geral da ONU que reconhece a existéncia de uma sé
China, que o governo de Repiiblica Popular da China é 0 tinico legitimo representante
de toda a China e que Taiwan é parte inaliendvel do territ6rio chinés", acrescentou 0
presidente salvadorenho, destacando que em causa est a segunda maior economia
mundial
Uma decistio que deixa Taiwan, de 24 milhées de habitantes, mais isolada
frente ao gigante asiatico de 1,379 bilhao de pessoas. Mantém relagdes diplomaticas
com apenas 17 paises em todo 0 mundo - que no total representam cerca de 53
milhdes de habitantes.
Entre esses paises, seis sdo ilhas do Pacifico (Kiribati, Ihas Marshall, Nauru,
Palau, Ilhas Salomio e Tuvalu) e quatro nagdes das Caraibas (Haiti, Sao Cristévaio e
Nevis, Santa Liicia e Sao Vicente e Granadina). Hé ainda quatro pafses da América
Central (Belize, Guatemala, Honduras e Nicarégua) e um da América do Sul
(Paraguai). Na Africa, 0 tinico bastiio ¢ a Suazilandia (ou Reino de Eswatini),
enquanto na Europa o Vaticano é o tinico, mas influente, aliado.
A Unio Europeia, assim como 47 paises, mantém relagdes nao oficiais a nivel
governamental com Taiwan. Em Portugal, funciona um Centro Cultural e Econémico
de Taipé,Historia
A ilha de Taiwan (ou Formosa, como foi batizada pelos navegadores
portugueses) esteve pela primeira vez sob controle chinés apés uma vaga de
migracdo chinesa no século XVII, tendo sido cedida aos japoneses apés a guerra de
1895. No final da II Guerra Mundial, a entao Reptiblica da China assumiu 0 controle
da ilha, que se tornaria o refiigio do presidente Chiang Kai-shek e dos nacionalistas
do Kuomintang, derrotados em 1949 pelos comunistas de Mao Tsé-tung. Cerca de
dois milhdes de militares e altos quadros, mais as familias, instalaram-se entdo na
‘ha.
A Repitblica da China nunca renunciow a sua reivindicacao de ser 0 tinico
governo legitimo de toda a China, mas a nivel internacional acabaria substitufda pela
comunista Repiiblica Popular da China como verdadeira representante do povo
chines (em 1971 nas Nagdes Unidas). Em 1979, os EUA reconhecem formalmente a
Reptiblica Popular da China, apesar de se comprometerem a defender Taiwan de
uma reunificagao pela forga (0 que ainda hoje é valido, com o presidente norte-
americano, Donald Trump, a trabalhar para expandir as relades com a ilha).
As relagées entre Pequim e Taipé tinham vindo a estreitar-se nos iiltimos
anos, atingindo ponto alto quando o anterior presidente de Taiwan, Ma Ying-jeou,
€ 0 seu homélogo chinés, Xi Jinping, se encontraram em Singapura, em novembro de
2015, na categoria de lideres dos respetivos partidos - 0 Kuomitang e 0 Partido
Comunista Chinés, Desde que Ma chegara ao poder, em 2008, tinham sido iniciadas
ligagdes aéreas diretas, assinados acordos comerciais ¢ intensificado as relagdes que
comecaram a desenvolver-se com Deng Xiaoping.
Mas tudo mudou com o regresso ao poder em Taiwan do nacionalista Partido
Democritico Progressista, da presidente Tsai Ing-wen, que se opde a ideia de uma s6
China - acordada entre o Partido Comunista Chinés e o Kuomintang no Consenso de
1992, que se opunha A ideia de independéncia de Taiwan. Uma ideia que veio
ganhando mais forca apés as primeiras eleigdes presidenciais diretas na ilha, em
1996.
A"diplomacia do délar"
Se até 2016, para ndo prejudicar 0 didlogo com Taipé tendo em vista uma
eventual reunificago, Pequim optou por abster-se de sua ofensiva diplomatica, tudo
10 de Tsai Ing-wen, pré-independéncia. A China voltou entao a
recorrer Aquela que é sua principal arma - a economia -, com a promessa de apoio
financeiro aos paises que optem por cortar relagdes diplomaticas com a ilha.
Segundo 0 ministro dos Negécios Estrangeiros de Taiwan, Joseph Wu, 0
governo de El Salvador estava a pedir uma "soma astronémica em ajuda financeira
para a construgao de um porto que, na opinido de Taipé, deixaria ambos os paises
endividados. Além disso, Sanchez Céren queria alegadamente dinheiro para financiar
a sua campanha, no préximo ano, e j4 corriam rumores de que os salvadorenhos
estavam a considerar estabelecer lagos com Pequim em troca de investimentos
ajuda. O chefe da diplomacia chinesa, Wang Yi, disse, contudo, que a decisao de El
Salvador foi tomada "sem condicdes prévias
"O governo taiwanés é totalmente contra competir na diplomacia do délar
com a China’, disse Wu, indicando que foi fetta uma tiltima tentativa de manter as
relagdes diplomaticas durante a visita, na semana passada, de Tsai Ing-wen ao Belize€ ao Paraguai (e paragens nos EUA). "Taiwan nao vai vergar-se sobre pressio. A
pressao s6 nos torna mais determinados e unidos’, disse a presidente, no regresso a
casa.
Taiwan nao tem capacidade de responder aos pedidos de ajuda financeira na
mesma moeda que a China, a segunda maior economia mundial (e a caminho de ser
a primeira). Taiwan, apesar de um PIB per capita que era em 2016 o triplo do chinés,
05 saldrios sao inferiores aos de outras economias asiaticas que apostaram no setor
tecnolégico ~ 44% das exportagdes em 2016 foram de componentes tecnolégicos,
mas esse mercado enfrenta agora a concorréncia de outros pafses, incluindo da
propria China continental. 40% das exportagdes de Taiwan vio também para 0
gigante asiatico e para Hong Kong, 0 que deixa o pais dependente.
Perda de apoios na América Central
Em 2007, a Costa Rica foi a primeira nago da América Central a transferir 0
seu apoio para a China - até entio, todos os paises da regio apoiavam Taiwan, numa
heranga dos tempos da Guerra Fria, Em causa, nao s6 as ajudas generosas que este
garantia (entre 2012 e 2017 foram cerca de 50 milhdes de délares em cooperacao),
como até um interesse reduzido da parte de Pequim na regio, mais interessada nas
matérias-primas da América do Sul
Uma década depois da Costa Rica, foi a vez de o Panama tomar a mesma
decisio de renunciar ao apoio taiwanés a favor do chinés. E um ano depois, chega a
deciso de El Salvador. Os restantes quatro paises da regiao (Belize, Guatemala,
Honduras e Nicargua) mantém-se, por enquanto, aliados de Taipé.
A juntar-se aos paises centro-americanos, a Repiblica Dominicana e Burkina
Faso (Africa) também cortaram relagées com Taiwan j4 neste ano, seguindo os
passos de Sio Tomé e Principe, que o fizera no final de 2016.
Apressio chinesa nao se aplica apenas a pafses: neste ano Pequim exigiu que
companhias aéreas estrangeiras que voam para Taiwan deixassem de apresentar
este territério como nao sendo chinés, sob pena de deixarem de ter acesso aos
aeroportos do pais. Assim, algumas companhias norte-americanas optaram por
manter s6 a referéncia ao aeroporto internacional de Taipé, sem acrescentar Taiwan,
enquanto as europeias optaram por colocar "Taiwan, Chin:
A reunificacao com Taiwan é a etapa que falta concluir apés o regresso de
Hong Kong em 1997 ¢ de Macau em 1999, até ento sob controlo britanico e
portugués (respectivamente). Tal como Deng ficou com os méritos de negociar a
restitui¢o dos dois territérios do delta do rio das Pérolas, Xi Jinping gostaria de
juntar a reunificagao com Taiwan ao seu legado.