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O Mundo Dos Valores
O Mundo Dos Valores
EDUCAÇÃO
Introdução
Você já parou para pensar sobre o que significa o mundo dos valores?
Essa expressão literal pode ser compreendida sob diversas perspectivas.
Entretanto, no que tange ao campo filosófico, mais especificamente ao
campo da filosofia da educação, você pode considerar que ela retrata
as possíveis relações e diferenças entre alguns conceitos, como: ética,
moral, cultura e também valores. Por vezes, esses termos, conceitos e
definições causam certa confusão e equívocos, pois são utilizados no
cotidiano como sinônimos. Para compreender tais termos, é necessário
contextualizar e retomar alguns elementos que organizam a área da
filosofia. Essa área pode ser decomposta em subáreas. Uma delas é a
filosofia do ser, que contempla disciplinas como a metafísica, a ontologia
e a cosmologia. Outra é a filosofia do conhecimento, que abarca áreas
como a lógica e a epistemologia. E, por fim, há a filosofia do trabalho, que
está relacionada a questões da ética. Neste capítulo, você vai identificar a
diferença entre ética e moral, bem como as possíveis relações existentes
entre moral e cultura. Por fim, vai reconhecer o mundo de valores que
se apresenta no cotidiano.
óbvio sobre as relações da sociedade com a ética e os valores. Você vai visu-
alizar muitos comportamentos em que se destacam a falta de ética e a perda
de valores. Alguns teóricos diriam que esse cenário reflete a escassez de um
entendimento universal sobre o que é a ética, por exemplo.
Você acredita que existem diferentes éticas, isto é, a ética para a política,
a ética para o âmbito empresarial, universitário, etc.? Se a resposta for sim,
você pode considerar que tal diversidade de definições seria responsável pela
redução do conceito de ética a uma esfera específica. Ou seja, apenas uma
gama de experts em determinada área saberia o significado de certas regras,
normas, valores e, por conseguinte, eles seriam os únicos a avaliar as ações dos
sujeitos. Entretanto, observar e delatar posturas inadequadas é algo complexo
e que demanda uma extensa reflexão sobre os próprios valores e os códigos
inerentes à vida social.
Muitas situações ocorridas na sociedade podem despertar um forte senti-
mento de indignação e ocasionalmente proporcionar ações solidárias, visando a
coibir injustiças. Para essas e outras situações, como o sentimento de admiração
ou mesmo o de culpa, aflora o senso moral. Para compreender melhor o senso
moral, imagine a seguinte situação: um parente muito próximo encontra-se com
uma doença terminal. Ele está sendo mantido vivo pois aparelhos conservam
o funcionamento de seus órgãos. Nesse cenário, a pessoa possivelmente sente
muitas dores e sofre muito.
Com base nessa situação, você consideraria que o mais sensato seria a
possibilidade de provocar a morte dessa pessoa, a fim de romper com todo o
sofrimento? Você acredita que teria o direito de desligar os aparelhos? Essas
dúvidas estariam relacionadas à moral e à ética? É justamente isso que você vai
ver neste capítulo. Em especial, você vai conhecer reflexões e conceitos acerca
das diferenças entre moral e ética e do seu papel na sociedade e no cotidiano.
Situações como essa exposta, e outras ainda mais ou menos limitantes,
colocam as pessoas em posições de decisão, expressando seu senso moral.
Além disso, permitem refletir sobre a existência de uma consciência moral,
pois demandam um aprofundamento diante e além de decisões. Isto é, é
preciso identificar e avaliar a responsabilidade pelas consequências geradas
a partir das decisões.
Esses e outros exemplos, para Chauí (1993, p. 335), indicam que:
Por fim, você pode considerar ainda que a moral precisa ser imposta e é
caracterizada de forma externa ao sujeito. Já a ética é aprendida e se expressa
com base no interior do indivíduo. A ética não é estanque, tendo um caráter
evolutivo (CHAUÍ, 1993).
Os seres humanos são diferentes dos animais pois não apresentam apenas
ações instintivas, ou seja, ações mediadas por reflexos, não raciocinadas e
ligadas ainda a uma visão de estímulo-resposta, mas têm inteligência con-
creta e inteligência abstrata. Contemplando os aspectos sociológicos, você
deve conhecer alguns acontecimentos históricos que definiram mudanças
na sociedade.
Na época da Revolução Francesa, por exemplo, lutava-se por mudanças
sociais e atacava-se duramente a sociedade feudal e as restrições impostas
por ela. Havia o esforço de mostrar que a sociedade medieval era irracional e
injusta, surgindo discussões sobre o comércio, a família e a religião. Para os
iluministas, a sociedade feudal atentava contra a natureza dos indivíduos, que
são dotados de razão e destinados à liberdade (TESKE, 1999, p. 33).
A Revolução Francesa (Figura 1) foi um momento histórico que marcou
uma grande e significativa transformação social. Ela fomentou o desenvol-
vimento e a criação de leis a partir de uma nova visão, isto é, com base em
uma perspectiva racional e humana, ocasião em que o ensino passou a ser
laico e terreno.
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Para Durkheim:
[...] fato social é toda a maneira de agir, pensar e sentir, fixada ou não,
suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior: ou então,
que é geral no âmbito de uma sociedade, tendo ao mesmo tempo uma
existência própria, independente de suas manifestações individuais
(DURKHEIM, 1984, p. 39 apud TESKE, 1999, p. 39).
Para Durkheim:
Dizer que alguma coisa é natural ou por natureza significa dizer que
essa coisa existe na natureza. Significa dizer, portanto, que tal coisa
não depende de ação ou intenção dos seres humanos. Assim como é
da natureza dos corpos serem governados pela lei natural da gravi-
tação universal, como é da natureza da água ser composta por H 2O
(DURKHEIM, 1984, p. 39 apud TESKE, 1999, p. 39).
Cultura vem do verbo latino colere, que significa cultivar, criar, tomar conta e cuidar.
Assim, cultura significa o cuidado do homem com a natureza. Cultura também já foi
entendida como o cultivo ou a educação do espírito das crianças para tornarem-se
membros excelentes ou virtuosos da sociedade pelo aperfeiçoamento e refinamento
das qualidades naturais (caráter, índole, temperamento). “A partir do século XVIII, cultura
passa a significar os resultados daquela formação ou educação dos seres humanos,
resultados expressos em obras, feitos, ações e instituições” (CHAUÍ, 1993, p. 292).
não se ocupa dos seres, mas das relações que se estabelecem entre os seres e
os sujeitos que os apreciam (ARANHA; MARTINS, 1993, p. 273).
Como você viu anteriormente, a sociedade necessita de acordos. Configu-
rado com base nesses acordos, o mundo permite a existência do homem. Além
disso, esses valores demonstram o que o homem, a partir de suas escolhas,
quis para a organização social. Essa situação é diferente, evidentemente, da
dos animais, que nascem prontos, ou seja, a sua natureza os força a fazer as
coisas e não há questionamentos ou justificativas. O homem, por sua vez,
não nasce pronto, ele aprende e escolhe como será a sua vida, ele determina,
opta, raciocina, reflete.
Você ainda deve considerar importantes aspectos relacionados ao interesse
próprio. Tais aspectos auxiliam no processo de elucidação dos fatores e das
justificativas que levam os indivíduos a escolher ou não determinados com-
portamentos em situações vivenciadas em suas mais diversas relações. Veja
o que afirma Wood (2008, p. 19):
além de serem voltados para seus próprios interesses, os seres humanos são
também racionais. Somos capazes de encontrar meios efetivos de satisfazer
nossos próprios interesses. Se sou um egoísta racional, sei que é da natureza
humana que eu sempre cuide de mim. Também me dou conta de que as outras
O mundo dos valores 13
pessoas também estão cuidando de si próprias, e não só evitam que eu tenha
o que quero, mas tentarão tomar o que possuo. Assim, para que eu possa
ter parte daquilo que desejo, assumo compromissos (WOOD, 2008, p. 19).
Com isso, pode-se afirmar que o mal e o bem também são uma escolha
para o homem. O homem, imerso em sua razão, atribui justificativas às causas
que não dependem apenas dele, sendo envolvido num complexo processo de
decisão. Nesse sentido, portanto, há uma reflexão sobre liberdade e também
sobre fontes de angústias diante dela.
Liberdade e fontes de angústia são debatidas porque para escolher é preciso
atribuir valor, e para atribuir valor é necessário seguir alguma referência. En-
tretanto, muitas das escolhas realizadas não possuem referências para permitir
a atribuição de valores de forma única e correta. Em virtude disso, e diante das
situações vivenciadas pelo sujeito, é necessário estabelecer uma hierarquia de
valores, cujo objetivo consiste em sustentar as escolhas, considerando ainda
os cenários instituídos e que também são passíveis de serem alterados.
Portanto, os valores morais são inerentes à condição humana. Eles servem
para nortear as escolhas humanas, além de permitirem a reflexão para a dis-
tinção sobre os bons ou os maus comportamentos (ARANHA; MARTINS,
1993). Para ilustrar esse pensamento, considere o exemplo da transparência.
Esse conceito está muito em voga atualmente. Sem aprofundar muito a questão,
você sabe que a transparência pressupõe que entidades governamentais sejam
obrigadas a explicitarem suas atividades, investimentos e resultados. A ideia
é que tornem público o que está sendo feito. Assim, o valor empregado está
calcado na transparência da gestão pública.
Por outro lado, se você pensar num jogo de cartas, o fundamental reside
no fato de que se deve valorar justamente o contrário, isto é, a confidenciali-
dade em detrimento da transparência. Portanto, a complexidade dos valores
acaba sendo a garantia de sua liberdade. Afinal, se os valores indicassem
uma verdade absoluta, sua consequência seria o próprio fim da liberdade,
isto é, o fim da possibilidade de escolha, considerando as circunstâncias
envolvidas.
Nesse ponto da reflexão, você deve notar que a moral tem um forte caráter
social, estando amparada nos conceitos de cultura, história e natureza humana.
Você já sabe que ela é adquirida como herança e preservada pela comunidade.
Se a comunidade não preservar a moral, ela será inevitavelmente alterada. Isso,
por sua vez, vai gerar uma mudança no código de conduta moral da sociedade
(ARANHA; MARTINS, 1993).
14 O mundo dos valores
O mundo dos valores denota muitas vezes que os indivíduos sabem que
não estão fazendo a coisa certa. Isto é, o sujeito tem plena ciência de que está
transgredindo normas, mas julga que o seu comportamento é normal, já que
é realizado por todos, sendo comum. Esse raciocínio envolve a justificativa
de que tal comportamento também é feito pelos outros, logo há necessidade
de repetir o ato a fim de não ficar para trás, ou ainda ser considerado um tolo
(ARANHA; MARTINS, 1993).
Como você viu, o mundo dos valores contempla indiscutivelmente os
preceitos da ética e da moral. Assim, é preciso romper com a visão distorcida
que justifica certos comportamentos a partir do dito “jeitinho brasileiro”,
uma vez que cada um é responsável por seus atos e compreende as dimensões
relacionadas à ética, à moral e aos valores.
Por fim, resta que as regras e condutas morais sejam postas em prá-
tica por cada sujeito, mas que também sejam debatidas constantemente
sob a ótica da ética. Isso contribui para o objetivo principal de evoluir e
melhorar a convivência dos seres humanos, de forma a tornar a sociedade
mais harmônica.
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Leituras recomendadas
GLOBO.COM. Doente terminal pode ter aparelho desligado. 2006. Disponível em: <http://
g1.globo.com/Noticias/Brasil/0,,AA1345635-5598,00-DOENTE+TERMINAL+PODE+TE
R+APARELHO+DESLIGADO.html>. Acesso em: 9 maio 2018.
SAVATER, F. Ética para amador. Barcelona: Ariel, 2004.
TANJI, T. Por que a Revolução Francesa influencia o mundo até hoje?. 2016. Disponível
em: < https://revistagalileu.globo.com/blogs/Maquina-do-Tempo/noticia/2016/07/
por-que-revolucao-francesa-influencia-o-mundo-ate-hoje.html>. Acesso em: 9 maio
2018.