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PSICOPATOLOGIA FENOMENOLÓGICO-EXISTENCIAL

Psicopatologia [de psic(o)- + patologia.] se define como patologia das doenças mentais ou
como o estudo das causas e natureza das doenças mentais.
• Psic(o) – vem do grego – psyché – que significa alento, sopro de vida, alma.
• Patologia, afecção, dor, pato, que também provém do grego – pathos – que significa
“doença, paixão, sentimento”.

LUDWIG BINSWANGER: uma psicopatologia fenomenológica

A Psicopatologia como um Campo Diferenciado do Saber.

Binswanger defendeu a ideia:

• de se especificar a psicopatologia em um campo diferente do das ciências naturais


(que entendiam o homem como um sistema de funções de ordem orgânica ligadas a
processos naturais no tempo).

Binswanger propõe que se examine, a questão mais fundamental:

• A do Ser,
• e das relações do fenômeno psicopatológico com a existência do que padece.

Dessa forma a análise existencial abriria a possibilidade de um olhar sobre a totalidade


da existência do homem.

➢Método Fenomenológico x Método Psicopatológico

Binswanger adverte:
• é importante que não se cometa o engano de realizar uma psicopatologia meramente
descritiva ou meramente subjetiva.
• Uma fenomenologia psicopatológica busca o sentido, a significação da palavra, a
experiência vivida.
• É no fenômeno particular, que a pessoa se faz conhecer e, inversamente, é o fenômeno
que faz o psicoterapeuta penetrar na pessoa.

O fenomenólogo, analisando a experiência psicopatológica vivida,

• busca se familiarizar com as significações que a expressão verbal do doente despertam


nele.
• ele busca os sinais desta experiência psicopatológica e o que se pode descobrir nela.

“o ser-psiquiatra depende, como referência,


• do encontro e da compreensão com o outro tomado em sua totalidade,

Entende-se a psiquiatria como uma ciência do homem,

• cuja missão enquanto ciência é discriminar o que se aplica ao doente ou ao sadio,


• e buscar a maneira como a presença do doente pode ser modificada em uma presença
sadia”.

quando a presença perturbada fica limitada em torno da:


• corporalidade, temos o Dasein hipocondríaco ou o bulímico;
• na temporalidade temos o melancólico ou o maníaco;
• na espacialidade encontramos o agorafóbico, o claustrofóbico.

Ocorre aí o que Binswanger vai chamar de formas de existência frustrada, onde o indivíduo
se fecha em si mesmo e perde o eixo comum com o mundo do outro (mundo humano).

A PSICOTERAPIA para L. Biswanger

• seu pensamento atravessa 4 fases – psicanálise; fenomenologia de Husserl;


fenomenologia hermenêutica de Heidegger e retorno a Husserl.

Para a psicoterapia se dar é preciso:


• Desconstruir a relação unilateral no sentido de quem se beneficia em uma psicoterapia é o
paciente;
• Desconstruir a ideia de que o paciente não está bem e o psicoterapeuta está bem

médico saudável no lugar de cuidador, o paciente (ser-doente) no lugar de sofredor e a


terapia como um processo de mão única do paciente para o terapeuta e o terapeuta como
quem oferece a cura para que o paciente melhore.
(nesse tipo de relação o cuidado clínico não se dá)

• Desconstrução da verticalização da relação médico – paciente.


• Não se pode ter uma conduta pré-estabelecida (levar o paciente de um ponto x para o
ponto y ou curar alguma coisa).
• Terapia significa confiança (fiar com) costurar junto (como se no ato de constante entrega
e devolução do fio fosse sendo construído um tecido, o tecido da confiança).

Confiança só se consegue de graça no sentido de que não temos como produzir confiança
tecnicamente.

O psicoterapeuta precisa conseguir em algum momento dar esse presente ao paciente e


receber esse presente do paciente.

A psicoterapia daseinsanalítica não tem o intuito de “consertar” algo.

• Ainda em Heidegger em Três formas de existência malograda (interrompido) (1956) –


extravagância, excentricidade e amaneiramento.
• Proporção e Desproporção Antropológica: para pensar a psicopatologia fenomenológica -
quando o ser está “estranho, desconectado” há uma desproporção (altura – auto
percepção/identidade e amplidão – como é compreendido pelos outros)
• Desproporção horizontal: é visto pelos outros como alguém muito mais “maravilhoso” do
que ele realmente enxerga a si mesmo.
Desproporção vertical: o ser acha que é a pessoa “mais incrível” do mundo, mas ninguém o
vê assim. • Proporção antropológica para Biswanger seria então quando existe uma
aproximação da forma que nos vemos com a maneira que somos vistos = saúde.
Como isso se dá?

Extravagância – vagar por fora (vagando fora do eixo). Alguém que perde, de certa maneira
a medida do ser-com-o-outro. Não consegue reestruturar as relações a cada vez. Trata o
outro como objeto.
Pai de filha com doença terminal. Caixão de aniversário. Tudo vira coisa na medida em que
o ser perde a capacidade de reconhecer o humano do outro. Não há empatia. Não há
dados emocionais. A relação fica técnica e se reduz a deduções lógicas.

Excentricidade – fora do centro – patologia da identidade. Desproporção do eixo vertical.


Aquele que não consegue se manter o mesmo nem minimamente. Não consegue manter
uma identidade que permaneça no tempo. É aquele colado no outro.

O Excêntrico não consegue encerrar o contato, ele permanece porque ele é aquilo, já que
não pode ser nada além daquilo. Ele é aquilo que ele está sendo a cada vez, radicalmente.

Por não ter uma identidade ele é tragado a cada vez pela identidade que se apresenta, é
influenciado e modificado. (o talentoso Ripley)

Amaneiramento – é a pessoa que de certa maneira tem um compromisso com assumir uma
personalidade que ela considera uma personalidade que ela deveria ser. (caso do Zürg
Zund 1947 – 3 mundos: rua, agressivo; pais, caóticos, briguentos e bagunceiros e avós,
organizados, calmos, serenos, afetuosos).

Inventa um modo de ser racional, social. Presta muita atenção o tempo todo para que ele
não cometa nenhum deslize. No final do dia está sempre esgotado. Está sempre tentando
parecer ser algo que ele somente parcialmente é.

OBJETO da Psicoterapia
• Desproporções antropológicas (daseinsanálise → antropologia existencial)... Porque isso é
importante para nós?
• Se por um lado a analítica do Dasein é a analítica da constituição ontológica (existenciais e/ou
existenciários) e seus modos de ser, por outro lado, na clínica o que temos é uma pessoa específica,
que tem a sua história, sua condição de mundo e suas demandas.

Cultura, valores éticos, morais, projetos de sentido, identificações

Nosso objeto de trabalho então é esse ser-aí, que não é um ser aí na sua estrutura ontológica formal,
mas é o ser-aí implicado hermeneuticamente dentro de um mundo.

Nesse sentido o nosso objeto de trabalho é ôntico. Não no sentido que o ser-aí é ôntico, mas no
sentido de que a psicoterapia é uma ciência (psicologia é uma ciência ôntica) Nesse sentido o objeto é
ôntico, pois não dá para fazermos uma ciência ontológica... Seria filosofia…
Estamos pensando então em um conjunto de propriedades (nível ôntico dos entes
intramundanos) que são definidos por categorias e propriedades (mundo).
• Nesse sentido descrevemos o modo de ser do ser-aí…
• “Sandra” é descolada, extrovertida, animada, baixa, magra, filha única, órfã de pai, cursa
artes cênicas.

Mas não estamos falando da Sandra, um ser-aí. Estamos falando do ser-aí na Sandra.

• O objeto da psicoterapia então não é o ser-aí, o cliente é a Sandra!


• É alguém que tem características de modo de ser.

MEDARD BOSS: uma psicopatologia de inspiração Daseinsanalítica

Medard Boss (1903-1990), médico psiquiatra suíço.


• foi analisado por Freud e foi, também, sócio de Jung.
• Acreditava que a psicopatologia muito se enriqueceria por um pensamento que não
permitia a colocação da distinção (separação) cartesiana sujeito-objeto e que, por outro
lado, aproximava a medicina da psicologia.

A Daseinsanalyse de Boss

A concepção Daseinanalítica de Boss observa que:


• o homem pode se relacionar de diferentes modos, mas não pode não se relacionar;
• mesmo a indiferença é um modo de relação;
• os homens estão sempre e primordialmente co-existindo perto das mesmas coisas de um
mesmo mundo, contribuindo primariamente em comum, embora cada um a seu modo,
para manter aberto este mundo.

A Inspiração Daseinsanalítica na Psicopatologia

Para BOSS a “psicopatologia de inspiração daseinsanalítica”:

• “o modo de ser-doente só pode ser compreendido a partir do modo de ser-sadio e da


constituição fundamental do homem normal, não perturbado” (BOSS; CONDRAU, 1997, p.
29).

A essência fundamental do homem sadio caracteriza-se pela liberdade (do ponto de vista
Sartreano).

• Na doença ocorre uma privação mais acentuada do existir (liberdade existencial).

O MODO DE SER-DOENTE CLASSIFICAÇÃO DAS PATOLOGIAS PSÍQUICAS

1) Ser-doente caracterizado por uma perturbação evidente da corporeidade do existir


humano;
2) Ser-doente caracterizado por uma perturbação pronunciada da espacialidade do seu ser-
no-mundo;
3) Modo do ser-doente caracterizado por uma limitação da disposição própria à essência da
pessoa/ perturbação prevalente na realização da afinação existencial; e
4) Modos de ser-doente concernentes a limitações na realização do seraberto e da
liberdade.

classificação das patologias psíquicas

• 1)SER-DOENTE CARACTERIZADO POR UMA PERTURBAÇÃO EVIDENTE DA


CORPOREIDADE DO EXISTIR HUMANO.
Qualquer redução corpórea toca sempre e imediatamente o ser-nomundo, e por isso todas
as possibilidades de relação com o mundo.

• 2)SER-DOENTE CARACTERIZADO POR UMA PERTURBAÇÃO PREVALENTE NA


ESPACIALIDADE E NA TEMPORALIDADE DO SEU SERNO-MUNDO.
Nas psicoses orgânicas e demência senil da psiquiatria clássica, os pacientes estão
reduzidos na amplitude de sua abertura espaçotemporal, ou seja, a dimensão temporal,
(passado, presente e futuro) está praticamente reduzida ao presente.
• Em relação à espacialidade podemos citar a agorafobia e a claustofobia.

3) MODO DO SER-DOENTE CARACTERIZADO POR UMA LIMITAÇÃO DA DISPOSIÇÃO


PRÓPRIA À ESSÊNCIA DA PESSOA/ PERTURBAÇÃO PREVALENTE NA REALIZAÇÃO
DA AFINAÇÃO EXISTENCIAL.
A afinação se refere ao humor (tonalidades afetivas). Podemos citar:
• Melancolia
• Mania
• Psicose maníaco-depressiva (Transtorno afetivo-bipolar)
• Depressão

4) MODOS DE SER-DOENTE CONCERNENTES A LIMITAÇÕES NA REALIZAÇÃO DO


SER-ABERTO E DA LIBERDADE.
• Citamos a esquizofrenia. Existiria no esquizofrênico uma dupla incapacidade:
• Torna-se incapaz de se engajar totalmente na abertura do seu existir, não respondendo
ao mundo, conforme os significados habituais presentes para as outras pessoas;
• não consegue preservar seu si-mesmo capaz de manter uma relação livre com o que
aparece (TOC).

• Na medida em que Boss desloca o entendimento da doença para a compreensão da


experiência do ser-doente, considera, então, a psicopatologia como redução ou perda das
possibilidades constitutivas dos modos do existir humano enquanto Dasein.

NO INTERESSE DA TÉCNICA TERAPÊUITCA

TÉCNICA TERAPÊUITCA? A análise existencial é uma forma de compreensão da


existência humana.
Compreender é projetar sentido. O que a coisa pode ou não significar. Quando
compreendemos já nos apropriamos de uma possibilidade (quando o sentido se mostra).
Pois, somos desprovidos de sentido, precisamos de sentido “para ser”.
A supervalorização de uma técnica pode vir a considerar o homem enquanto objeto para ser
calculado, controlado... O que dificultaria a compreensão do paciente como um ser e como
um ser em seu mundo.

O que diferencia a terapia existencial não é o que o terapeuta faria especificamente, ao se


deparar com
• Ansiedade;
• Resistência agressiva;
• Ou diante da história de vida…

Mas o que faria no contexto de sua terapia (a compreensão se dá na relação terapêutica


possível).

O contexto significa considerar o paciente não como um conjunto de dinamismos psíquicos


ou de mecanismos, Mas como um ser humano que está
• Tomando decisões,
• Entregando-se,
• Dirigindo-se para alguma coisa nesse exato momento.
O contexto é dinâmico, instantaneamente real, e presente!

IMPLICAÇÕES REFERENTES À TECNICA TERAPÊUTICA EXISTENCIALISTA

• As contribuições verdadeiramente importantes da psicoterapia existencial estão na


compreensão mais aprofundada da existência humana.

Por isso INVESTIGAMOS

• Facilitar ao indivíduo uma atitude mais autêntica em relação a si próprio


Trata-se de um processo gradual de auto-compreensão com a finalidade do sujeito vir-a-ser
mais verdadeiro e coerente consigo próprio, para que possa responder às situações com
sentimento de domínio e maior percepção de controle pessoal.

• Promover uma abertura cada vez maior das perspectivas do indivíduo em relação a
si próprio e ao mundo.
Esta abertura, que consiste num trabalho focalizado na relação do indivíduo consigo
mesmo, pode ser promovida através da facilitação de uma auto-avaliação das suas
crenças, valores e aspirações que sirva para atingir maior clareza na exploração das suas
experiências.

• Clarificar como agir no futuro em novas direções.


facilitar a abertura a novas possibilidades de vir-a-ser, diferentes das desenvolvidas até aí e
de acordo com o seu projeto, em relação ao qual se facilita o confronto.

• Facilitar o encontro do indivíduo com o significado da sua existência.


promover o confronto e a re-avaliação da compreensão que o indivíduo tem da vida, dos
problemas que tem enfrentado e dos limites impostos ao seu estar-no-mundo.
• Promover o confronto com e a superação da ansiedade que emerge dos dados da
existência.
da inevitabilidade da morte, da liberdade de escolha em situação, da solidão e da falta de
sentido para a vida.

• Trata-se de facilitar ao indivíduo o desenvolvimento de maior autenticidade em relação a si


próprio;
• uma maior abertura das suas perspectivas sobre si próprio e o mundo;
• de ajudar a clarificar como é que poderá agir no futuro de forma mais significativa;
• O centro é a responsabilidade da liberdade de escolha do indivíduo;
• A palavra-chave é construção, uma vez que se trata de desafiar o indivíduo a ser o
construtor da sua existência.

O objetivo da terapia é que o paciente sinta sua existência como uma coisa real:
• Se conscientize de suas potencialidades e se torne capacitado para agir apoiado nelas.
• A tarefa da terapia é iluminar a existência.
• A função do terapeuta é de estar lá com toda a conotação de dasein (ser-com), presente
no relacionamento…
...ENQUANTO O PACIENTE DESCOBRE (DESVELA) E APRENDE A SOBREVIVER A
SEU MUNDO-PRÓPRIO.

“A VERDADE SOMENTE EXISTE SE O PRÓPRIO INDIVÍDUO A PRODUZIR


ATIVAMENTE”

ENSAIOS DA CLÍNICA

• O não-saber não diz respeito ao abandonar, mas se configura à ausência de situações


prévias (já dadas). Pois, se eu já sei, não estou atuando em uma perspectiva
fenomenológica.

• O não-saber possibilita o aproximar-se daquilo que se mostra. Que é o que caracteriza o


saber-fazer clínico. Por não saber posso me inclinar naquilo que se mostra

• O psicoterapeuta só pode dar o que ele não tem... como um campo de abertura para que
o paciente alcance seu próprio caminho.

• Experimentamos um mundo paradoxal: nem tudo cabe na razão.


Ilusão do homem: pensar que ele é, o que em ato, ele não é (Kierkegaard)

Necessidade = limita
Possibilidade = ilimita

É preciso
• Estarmos abertos a experiência do ver.
• Ver o que se mostra no modo e no tempo do seu mostrar.
• Poder ir aos poucos no tempo.
• Aprender a ver sem as linguagens dos símbolos já dados.
• Poder deixar aparecer por meio das questões. • O importante sempre é compreender a
experiência (eu preciso perguntar).
• Perguntar e dar espaço para que o outro chegue à sua própria situação.
• A arte de bem perguntar é puxar os fios soltos e ajudar a pessoa a enrolar o que estava
desenrolado, bagunçado.
• Somente quando aparece, quando o paciente pode ver é que pode articular outros modos
de relação.
• É preciso deixar aparecer quais as consequências que o paciente consegue atravessar.
• É a relação clínica que importa. Onde transformações acontecem. É na relação clínica que
acontece a possibilidade da medida existencial.

• É no repetir que se abre a criação. A escuta e a fala.


• Essa repetição, não é uma mera repetição. É uma repetição que dá frutos.
• Quando estamos na impaciência, estamos em nós mesmos. E aí, não vemos o que está
em jogo.
• Então, quanto mais despidos estamos daquilo que pensamos como natural, mais
podemos ver.
• Clínica é saber aguardar. Saber é pelo sabor, pelo incorporar. Estar na relação com
tranquilidade.

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