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Poema XXXIV

Vamos apresentar o poema 34 de Alberto Caeiro, um dos


principais heterónimos de Fernando Pessoa.
Fernando Pessoa filho de Maria Madalena Pinheiro
Nogueira Pessoa, nasceu em lisboa, no dia 13 de junho de
1888 e morreu dia 30 de novembro de 1935, vítima de
uma cirrose hepática. Durante a sua vida foi
,principalmente, poeta, escritor e tradutor. Os seus
escritos inserem-se no movimento modernista, que
surgiu entre a década de 90 do séc. XIX e a primeira
guerra mundial (1914-18).
Em 1914 surge o aparecimento dos seus três principais
heterónimos, sendo eles Alberto Caeiro (autor deste
poema), Ricardo Reis e Álvaro de Campo, concebidos
como individualidades distintas do autor e com biografias
distintas criadas por Pessoa.
Alberto Caeiro da Silva (poeta da Natureza e do real
objetivo), nasceu a 1889, em lisboa e morreu a 1915,
vítima de tuberculose. .
Caracterizado como louro de olhos azuis e de estatura
média, ficou órfão de pais quando ainda era novo, e
por isso, viveu quase toda a sua vida pobre e frágil na
quinta da sua tia-avó idosa, no Ribatejo, onde
escreveu primeiramente, “O Guardador de Rebanhos”
e depois o “O Pastor Amoroso”. Voltou no final da sua
curta vida para Lisboa, onde escreveu “Os Poemas
Inconjuntos” antes de morrer. Não exerceu qualquer
profissão e estudou apenas até ao 4º ano.
É considerado o Mestre dos outros heterónimos e do
próprio Fernando Pessoa ortónimo, pois consegue
submeter o sentir ao pensar o que lhe permite:
 viver sem dor;
 envelhecer sem angustia e morrer sem
desespero;
 não procurar sentido para a vida e para as coisas
que o rodeiam,;
 sentir sem pensar;
 e ser um ser uno (não fragmentado).
, com liberdade estrófica e métrica e ausência de rima
e com o predomínio do presente do indicativo,
abordada vários temas:
Subjetivismo: -atitude anti lírica; - atenção à eterna
novidade do mundo; -poeta da Natureza.
Sensacionismo: -poeta das sensações verdadeiras; -
poeta do olhar; -predomínio das sensações visuais e
auditivas.
Anti metafisico: -recusa do pensamento e da
compreensão; -recusa do mistério e do misticismo.
Panteísmo naturalista: -Deus abrangente.
Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa...

Que pensará o meu muro da minha sombra?


Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas...
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente...

Que pensará isto de aquilo?


Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tivesse, seria gente,
E se fosse gente, tinha feitio de gente, não era a terra.
Mas que me importa isso a mim?
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixava de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos...
Entristecia e ficava às escuras.
E assim, sem pensar, tenho a Terra e o Céu.
Acho tão natural que não se pense
Que me ponho a rir às vezes, sozinho,
Não sei bem de quê, mas é de qualquer cousa
Que tem que ver com haver gente que pensa...

1) O sujeito poético caracteriza-se como alguém que


considera o ato de não pensar como seu traço
constitutivo, sentindo-se distanciado da “gente
que pensa”. Por vezes, tem um sentido tão forte
do absurdo que constitui “haver gente que
pensa”, que se põe “a rir (…) sozinho”.
Interrogação retórica
Que pensará o meu muro da minha sombra?
Pergunto-me às vezes isto até dar por mim
A perguntar-me cousas... Pensar
E então desagrado-me, e incomodo-me
Como se desse por mim com um pé dormente... 1

1) Estes versos exprimem o descontentamento do


“eu” consigo mesmo por se ter surpreendido a
perguntar “coisas”, isto é, a pensar, o que
significa ter-se traído, por momentos, a si próprio,
caindo no erro que crítica nos outros. Mesmo que
momentânea, esta contradição provoca-lhe um
desagrado desconforto quase físico.
Que pensará isto de aquilo ?
Nada pensa nada.
Terá a terra consciência das pedras e plantas que tem?
Se ela a tivesse, seria gente,
2 E se fosse gente, tinha feitio de gente, não era a
terra.
Mas que me importa isso a mim ? Int. retórica 1
Se eu pensasse nessas cousas,
Deixava de ver as árvores e as plantas
E deixava de ver a Terra,
Para ver só os meus pensamentos...
Entristecia e ficava às escuras.
3 E assim, sem pensar, tenho a Terra e o Céu.

1) As interrogações retóricas dos versos 10 e 15


salientam a indiferença do sujeito poético face ao
ato de pensar e marcam o seu afastamento
relativamente a essa problemática.
2) O vocábulo “gente” surge no poema como elemento
oposto à “terra”; esta existe espontânea e
naturalmente, ao passo que aquela se caracteriza
pela “consciência”, que o sujeito poético rejeita. A
repetição acentua o desfasamento entre as duas
realidades.
3) Este verso surge formulando como a conclusão do
poema e, em particular, da argumentação iniciada
no verso 15, relativa ao que o sujeito poético
perderia se “pensasse” e ao que ganha não
pensando. Assim, pensar significaria deixar de ver a
realidade para “ver só” as construções abstratas dos
“pensamentos”, que se interporiam, como uma
cortina, entre o “eu” e “as árvores”, “as plantas” e a
“Terra” deixando-as “às escuras”. Pelo contrário, não
pensando, nada se interpõe entre o seu olhar e a
realidade das coisas do mundo; em suma, não
pensar é libertar de subjetividade a visão do real.

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